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FARMACODINÂMICA: INTERAÇÃO FÁRMACO- RECEPTOR Da administração ao efeito terapêutico O medicamento, na maior parte das vezes, é administrado por via oral, que é a via mais comum e utilizada. Esse medicamento estando em uma forma farmacêutica sólida precisa passar pelos processos de desintegração, desagregação e dissolução, que fazem parte da fase farmacêutica. Uma vez o fármaco em solução, tem-se os processos farmacocinéticos e a distribuição do fármaco faz com que ele chegue no seu local de ação para que se tenha o efeito farmacológico. O mecanismo envolvido na produção do efeito farmacológico está relacionado com a farmacodinâmica. Receptor ou alvo farmacológico Macromolécula com a qual o fármaco interage para produzir o seu efeito farmacológico O receptor ou alvo farmacológico não necessariamente é um receptor propriamente dito, há várias macromoléculas que podem funcionar como alvos farmacológicos, como enzimas, receptores acoplados a proteína G, canais iônicos, quinases e receptores nucleares. Fármacos que não atuam se ligando a uma macromolécula específica Alguns fármacos são chamados de estruturalmente não específicos e não atuam através da ligação a um receptor, por exemplo. Os antiácidos, como o carbonato de cálcio, funcionam através de propriedades químicas com a neutralização do ácido estomacal. Os agentes quelantes, como o dimercaprol, são utilizados, por exemplo, na intoxicação por mercúrio, se ligam ao mercúrio dependendo apenas das propriedades físico-químicas. E os diuréticos osmóticos, como o manitol, atuam inibindo a reabsorção de sais e de água. Receptor ou alvo farmacológico: sítio de ligação O sítio de ligação é o local onde o fármaco se liga ao receptor. Cada sítio possui características químicas singulares que são determinadas pelas propriedades específicas dos aminoácidos que compõem o sítio. No receptor da imagem está identificado o sítio ortoestérico e o sítio alostérico. O sítio ortoestérico é o sítio de ligação no qual o ligante endógeno se liga, por exemplo, em um receptor muscarínico, o local onde a acetilcolina se liga, seu ligante endógeno, é chamado de sítio ortoestérico. Porém, em um receptor se pode ter outros sítios de ligação diferentes, que são chamados de sítios alostéricos. Grupamento farmacofórico Para que se tenha a ação daquele determinado fármaco, tem-se um componente da molécula que é chamado de grupamento farmacofórico, que é grupo funcional ou grupos funcionais que caracteriza a subunidade estrutural responsável pela atividade farmacológica do fármaco. Na imagem tem-se como exemplo a atorvastatina, que é utilizada no tratamento da dislipidemia. Na figura da esquerda mostra a atorvastatina ligada a enzima na qual ela atua. Então o grupamento farmacofórico da atorvastatina é essencial para essa interação com a enzima e para a produção do efeito farmacológico. Estereoquímica X Interação fármaco-receptor Dentro do estudo dos fármacos e da interação fármaco-receptor, a estereoquímica ganhou uma relevância grande quando se teve o início da utilização da talidomida por gestantes e depois o nascimento de uma série de crianças com problemas congênitos. A talidomida era vendida como mistura racêmica e, depois da observação dos efeitos teratogênicos, foram estudados os enantiômeros da talidomida e foi observado que o enantiômero R é responsável pelo efeito hipnótico/sedativo, mas o enantiômero S é oxidado, levando à formação de espécies eletrofílicas reativas do tipo areno-óxido, que são teratogênicas. Aqui se tem outro exemplo: o propranolol, que é um antagonista beta- adrenérgico. Pensando no reconhecimento molecular de um ligante com um único centro assimétrico, existe uma teoria que indica que esse reconhecimento envolve a participação de pelo menos 3 pontos. No enantiômero S tem-se três pontos de interação (interação hidrofóbica, ligação de hidrogênio e interação do tipo íon dipolo), porém o antípodo correspondente, enantiômero R, perde uma interação, com isso tem-se uma afinidade menor pelo receptor beta-adrenérgico. Nesse caso, o enantiômero responsável pelo efeito terapêutico é o S, que é chamado de eutômero. A antípodo, que tem menor afinidade ao receptor, échamado de distômero. Teoria da ocupação (Clarck, 1930) “Uma molécula de fármaco reage com uma molécula do receptor, sendo a intensidade do efeito farmacológico proporcional à fração de receptores ocupados, sendo máxima quando todos os receptores estiverem ocupados”. Dessa forma, o efeito depende da ocupação dos receptores. A teoria de Clarck não explica porque alguns fármacos nunca produzem efeitos máximos ou nunca produzem qualquer efeito mesmo que todos os receptores estejam ocupados. Interação fármaco-receptor Fármaco [F] + receptor [R], tem-se uma constante de afinidade para a formação do complexo fármaco-receptor [FR], que gera então o efeito farmacológico. Tem-se também uma constante de dissociação (K-1), onde leva ao desligamento do fármaco ao receptor. K1 é a constante de associação. Quanto menos a constante de dissociação de equilíbrio (Kd), maior a afinidade do fármaco pelo receptor. Quando [F] = Kd, metade dos receptores estarão ocupados e metade estarão livres. Dessa forma, o efeito produzido será metade do efeito máximo, como mostrado nos gráficos. Pensando na equação [FR] em equação de efeito, o [FR] produz o [E], então substitui. Quando todos os receptores estão ocupados [Rt] tem-se o efeito máximo [Emax] e quando [F] é igual a Kd tem-se metade do efeito máximo (CE50). Modelo chave-fechadura (Fischer, 1894) A teoria de Clarck se baseia nesse modelo, que é um modelo estático e fala sobre a complementaridade necessária entre o fármaco e o receptor, mas vê o fármaco e o receptor como estruturas rígidas. Não explica porque certas “chaves” não abrem a “fechadura” e certas “chaves” só abrem parcialmente. O agonista endógeno (natural) se liga ao seu receptor, então ele tem afinidade e a atividade intrínseca é responsável pelo efeito observado. Quando se tem um agonista modificado, um fármaco que vai produzir um efeito semelhante ao do agonista endógeno, ele também tem afinidade e atividade intrínseca para produzir uma determinada resposta. O antagonista, então, funciona como se fosse uma chave falsa, pois ele tem afinidade e se liga ao receptor, porém não produz nenhum efeito quando está sozinho, pois tem atividade intrínseca igual a 0, ele apenas impede que o agonista se liga, por isso ele bloqueia aquela determinada resposta que seria produzida pelo agonista. Teoria da atividade intrínseca (Ariens, 1954) Para produzir um efeito não é necessária somente a formação da complexo fármaco- receptor. O efeito farmacológico é proporcional a: Afinidade: ligação do fármaco ao receptor para formar o complexo FR (Clarck). Atividade intrínseca (α): capacidade de ativar o receptor. Pode variar de 0 a 1. Conceitos oriundos da teoria de Ariens Fármacos agonistas totais Têm afinidade pelo receptor. Produzem efeito máximo (α = 1). Fármacos agonistas parciais Têm afinidade pelo receptor. Não produzem efeito máximo (0 < α < 1). Fármacos antagonistas Têm afinidade pelo receptor. Não produzem efeito algum (α = 0). Impedem a ligação do agonista ao receptor. Teoria de Stephenson (1956) Estímulo = ocupação fracional X eficácia. Fármacos com pequena eficácia nunca produzem efeito máximo mesmo que todos os receptores estejam ocupados. Esse é o caso dos agonistas parciais. Em alguns tecidos, agonistas com grande eficácia podem produzir efeito máximo ocupando pequeno número de receptores, isso ocorre com fármacos de grandeeficácia. Os receptores que não são ocupados são chamados de receptores de reserva. Teoria do encaixe induzido (Koshland et al., 1958) Diferentes agonistas podem induzir diferentes graus de modificação conformacional, pois os agonistas podem produzir uma modificação conformacional quando se ligam ao receptor. Isso gera alterações estruturais no receptor que permitem o reconhecimento do ligante e ativação da via de sinalização daquele determinado receptor. Modelo de dois estados (reversível) Equilíbrio dinâmico das formas ativa e inativa do receptor. Então se tem o receptor livre inativo (R), o receptor livre ativo (R*), o complexo fármaco-receptor inativo (FR) e o complexo fármaco-receptor inativo (FR*). Nesse modelo foi introduzido os receptores livres na forma ativa, que são os receptores que têm atividade constitutiva, ou seja, têm atividade intrínseca ou basal na ausência de qualquer ligante. Assim, esse receptor está na forma ativa mesmo sem nenhum ligante. Novo conceito Agonista inverso Agonistas inversos têm eficácia negativa, reduzem a atividade inicial constitutiva observada naquele receptor. Grande número de substâncias previamente classificadas como antagonistas são agonistas inversos. Tem-se o receptor na forma inativa (R) e o receptor na forma ativa (R*), o antagonista não vai deslocar o equilíbrio para nenhum lado. O agonista total desloca o equilíbrio dos receptores para a forma ativa, enquanto o agonista inverso desloca para a forma inativa. Olhando o gráfico que mostra a resposta em função da concentração do fármaco, é possível ver que se tem uma resposta inicial, que seria a resposta constitutiva do receptor, e um antagonista tem afinidade pelas duas formas do receptor (inativa e ativa) e não vai produzir nenhuma alteração (linha roxa). Um agonista parcial tem afinidade também pelas duas formas, mas mais pela forma ativa do receptor, então desloca o equilíbrio um pouco para esse lado, produzindo uma determinada resposta que não é máxima (linha azul). O agonista total tem afinidade pela forma ativa do receptor, deslocando todo o equilíbrio para receptores na forma ativa, produzindo então resposta máxima (linha verde). Por fim, o agonista inverso desloca o equilíbrio dos receptores para a forma inativa, então reduz a atividade inicial (linha vermelha). Representação gráfica Curva concentração-resposta gradual Mede a intensidade do efeito em função da variação da concentração. Então, tem-se no eixo Y uma variação do efeito até que se atinja um platô, que é o efeito máximo e indica a eficácia daquele determinado fármaco, enquanto no eixo X se tem a variação da concentração que indica a potência daquele fármaco em produzir aquele determinado efeito, e essa potência está relacionada com a CE50. Essa curva tem uma determinada inclinação, que mostra quanto o efeito irá variar em função da concentração, se essa variação é maior ou menor. O gráfico A mostra a concentração, em escala linear, em função do efeito. Transformando o eixo X, concentração, em Log, tem-se o gráfico B, com uma curva sigmoide. Dessa forma, é mais comum a curva concentração-resposta gradual ser representada com o eixo X em logaritmo da concentração, pois permite visualizar melhor a variação do efeito em função da concentração, principalmente nas concentrações iniciais. Essa curva concentração- resposta permite, por exemplo, a comparação entre dois fármacos. No gráfico A tem-se o fármaco X e Y, os dois produzem o mesmo efeito máximo, porém, quando comparada a CE50 dos dois fármacos, é possível perceber que elas são diferentes, então eles têm potências diferentes. Quanto mais para a esquerda está a curva daquele determinado fármaco, mais potente ele será, pois ele precisará de uma concentração menor para produzir metade do efeito máximo. Assim, a CE50 do fármaco X é menor que a do fármaco Y, e por isso ele é mais potente. No gráfico B, tem-se fármacos com efeitos máximos diferentes, o fármaco X produz efeito máximo (100%) e é um agonista total, enquanto o fármaco Y não produz 100% da resposta máxima, então é um agonista parcial. Dessa forma, o fármaco X é mais eficaz do que o fármaco Y. Sempre que se for avaliar a eficácia/resposta, se observa o eixo Y; sempre que for avaliar a potência, se avalia a CE50, se observa o eixo X. Aqui se tem uma curva concentração-resposta de 3 fármacos (A, B e C). O fármaco A produz 100% de resposta, é um agonista total e a sua CE50 é -9 molar. O fármaco B também produz 100% de resposta, é um agonista total e sua CE50 é -7 molar, a curva do B está mais deslocada para a direita, o que mostra que A e B tem eficácia igual, porém A é mais potente que B. O fármaco C só produz 50% da resposta, então é um agonista parcial, e sua CE50 é -9 molar, então A é mais eficaz que C, porém A e C tem a mesma potência, pois apresentam CE50 similares. Então: A e C são equipotentes e são mais potentes que B. Variabilidade farmacodinâmica Curva dose-resposta quantal: efeito tudo ou nada Essa curva avalia o efeito tudo ou nada, então ou aquele efeito acontece ou não acontece. Esse tipo de curva dose-resposta é utilizado para avaliar a variabilidade da resposta entre os indivíduos. Nesse gráfico tem-se a porcentagem de indivíduos que responderam em função da concentração obtida daquele determinado fármaco. Em roxo se tem para cada dose do fármaco quantos indivíduos apresentaram resposta. Em vermelho se tem uma distribuição de frequência acumulativa, onde foram somadas as respostas de acordo com a dose. Assim, pode-se calcular a DE50, que é a dose na qual 50% dos pacientes apresentam aquela resposta, a dose eficaz mediana. No caso do gráfico, a DE50 é 10mg/L. Segurança O gráfico de dose- resposta é importante quando se está avaliando a segurança de um fármaco. Nos estudos em animais, é calculado o índice terapêutico que está relacionado com a segurança dos fármacos. No gráfico tem-se o efeito de hipnose e de morte. Na curva para hipnose se calcula a dose eficaz mediana (DE50), que é a dose na qual 50% dos animais apresentaram efeito de hipnose. Enquanto na curva da morte se calcula a dose letal mediana (DL50), que é a dose que causou morte em 50% dos animais. Dividindo a DL50 pela DE50, tem-se o índice terapêutico daquele determinado fármaco. O ideal é que o índice terapêutico seja o maior possível, pois assim a dose letal mediana e a dose eficaz mediana estão bastante afastadas. Fármacos de baixo IT Diferença menor que duas vezes entre a dose mínima efetiva e a dose mínima tóxica ou a dose terapêutica máxima. Diferença menor que duas vezes entre a menor e a maior concentração recomendada. Necessitam de monitoramento contínuo. As doses devem ser ajustadas em pequenos incrementos (<20%), pois é preciso observar a resposta do paciente a essas alterações.
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