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A responsabilidade civil do transportador

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A responsabilidade civil do transportador
O transporte de pessoas
A responsabilidade do transportador é objetiva.
O Decreto n. 2.681 contém em si, implícita, a obrigação de o transportador levar, são e salvo, o passageiro até o local de seu destino, obrigação essa apenas elidível pelo caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva (não concorrente) da vítima. Dispõe, com efeito, o art. 17 do referido regulamento: “Art. 17. As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. 
A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas: 1ª) caso fortuito ou força maior; 
2ª) culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada”.
É mister lembrar que, sendo o transporte um contrato de adesão, a vítima (que não chegou incólume ao seu destino porque sofreu um dano no trajeto) não está obrigada a provar a culpa do transportador. Basta provar o fato de transporte e o dano para que se caracterize a responsabilidade deste pelo “inadimplemento contratual”. Entretanto, tomando-se como fundamento dessa responsabilidade o Decreto n. 2.681, de 1912, não haverá redução da indenização em caso de culpa concorrente. Porque só admite o referido decreto a exclusão da responsabilidade do transportador por culpa do viajante, não concorrendo culpa daquele.
De acordo, pois, com o Decreto n. 2.681, de 1912, a culpa concorrente da vítima não exonera o transportador da obrigação de compor os danos. Somente a culpa exclusiva da vítima pode exonerá-lo. Somente a culpa exclusiva da vítima pode exonerá-lo. A presunção de culpa representa a plena aceitação da teoria do risco, na criação dos riscos no seu próprio interesse. Tem prevalecido a tese da incidência do princípio da responsabilidade objetiva, sendo indiferente que o passageiro tenha contribuído também com culpa. Em tais hipóteses, não há de indagar da existência de culpa concorrente, porque a lei estabelece presunção de culpa do transportador.
Com a entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor mudou o fundamento da responsabilidade civil do transportador, que passou a ser o defeito do produto ou do serviço, causador de um acidente de consumo. Porém, o referido estatuto manteve o princípio da responsabilidade objetiva do prestador de serviços, admitindo como excludentes somente a comprovada inexistência do defeito e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (art. 14, § 3º), que rompem o nexo causal (sendo admissível, pelo mesmo motivo, a força maior).
Com efeito, ao tratar dos deveres do passageiro, o art. 738 dispôs que “a pessoa transportada deve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transportador, constantes no bilhete ou afixadas à vista dos usuários, abstendo-se de quaisquer atos que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço”.
Aduziu o parágrafo único: “Se o prejuízo sofrido pela pessoa transportada for atribuível à transgressão de normas e instruções regulamentares, o juiz reduzirá equitativamente a indenização, na medida em que a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano”. Verifica-se, assim, que a culpa concorrente da vítima constitui causa de redução do montante da indenização pleiteada, em proporção ao grau de culpa comprovado nos autos.
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”. Desse modo, havendo incompatibilidade entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil, nesse particular, prevalecem as normas deste. Sendo assim, não poderão mais os tribunais condenar as empresas de transporte a pagar indenização integral às vítimas de acidentes, em casos de culpa concorrente destas, como vinha ocorrendo, por exemplo, nas hipóteses de passageiros que viajam no estribo do vagão ou como “pingentes”, dependurados nas portas, que permanecem abertas, caracterizando a culpa do passageiro e também a da ferrovia, por não prestar o serviço com a segurança que dele legitimamente se espera, obrigando as pessoas que têm necessidade de usá-lo a viajar em condições perigosas, e por não vigiar para que tal não se verifique.
Dispõe o art. 734 do Código Civil: “O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade”. 
Embora não mencionadas expressamente, devem ser admitidas também as excludentes da culpa exclusiva da vítima e do fato exclusivo de terceiro, por extinguirem o nexo de causalidade.
O transporte terrestre
“A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”, e que, “em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar”.
Pode-se considerar, pois, que o transportador assume uma obrigação de resultado: transportar o passageiro são e salvo, e a mercadoria sem avarias, ao seu destino. A não obtenção desse resultado importa o inadimplemento das obrigações assumidas e a responsabilidade pelo dano ocasionado. Não se eximirá da responsabilidade provando apenas ausência de culpa. Incumbe-lhe o ônus de demonstrar que o evento danoso se verificou por força maior, culpa exclusiva da vítima ou ainda por fato exclusivo de terceiro.
Denomina-se cláusula de incolumidade a obrigação tacitamente assumida pelo transportador de conduzir o passageiro são e salvo ao local do destino.
A jurisprudência, inclusive a do Superior Tribunal de Justiça, tem considerado causa estranha ao transporte, equiparável à força maior, disparos efetuados por terceiros contra os trens, ou pedras que são atiradas nas janelas, ferindo passageiros, ou ainda disparos efetuados no interior de ônibus, inclusive durante assaltos aos viajantes, exceto se, no caso das pedras atiradas contra trens, o incidente se torna frequente e em áreas localizadas, excluindo a existência do casus.
A questão relativa a assalto no interior de composição ferroviária ou de ônibus é, entretanto, controvertida, havendo decisões no sentido de que tal fato, tamanha a habitualidade de sua ocorrência, deixou de configurar caso fortuito ou força maior, não sendo lícito invocá-lo como causa de exclusão da responsabilidade do transportador.
O contrato de transporte de pessoas abrange a obrigação de transportar a bagagem do passageiro ou viajante no próprio compartimento em que ele viajar ou em depósitos apropriados dos veículos, mediante despacho, hipótese em que o transportador fornecerá uma “nota de bagagem”, que servirá de documento para a sua retirada no local de destino.
O transporte de bagagem é acessório do contrato de pessoa, de modo que o viajante, ao contratar o transporte, pagando o bilhete de passagem, adquirirá o direito de transportar, consigo, sua bagagem, e o condutor assumirá a obrigação de fazer esse transporte. O passageiro só pagará o transporte de sua bagagem se houver excesso de peso, de tamanho ou de volumes.
O início do contrato de transporte do começo da obrigação de segurança: “A partir do momento em que um indivíduo acena para um veículo de transporte público, já o contrato teve início, diante da oferta permanente em que se encontra o veículo em trânsito. A responsabilidade pela integridade da pessoa do passageiro só se inicia, porém, a partir do momento em que esse mesmo passageiro incide na esfera da direção do transportador. Segue-se que o próprio ato do passageiro galgar o veículo já o faz entrar na esfera da obrigação de garantia”.
Observa que a responsabilidade contratual do transportador pressupõe a formação de um contrato de transporte, de modo que afasta essa responsabilidade quando se trata de um passageiro clandestino. Também essa responsabilidade supõe um acidente ocorrido durante a vigência do contrato, mantendo-se até o momento de sua cessação, ou seja, até o momento em que um passageiro deixa a condução e atravessao portão de saída da estação de desembarque. Assim, o transportador é responsável pelo acidente sofrido por um viajante no momento da descida de um ônibus, mesmo que se trate de um escorregão no estribo, ou mesmo quando já no solo se ainda não se havia desprendido inteiramente do veículo.
No tocante à responsabilidade das ferrovias, dois aspectos devem ser considerados: em relação às pessoas e coisas transportadas, e em face de terceiros, ambos com notória repercussão no alargamento do conceito de responsabilidade.
Prescreve o art. 735 do Código Civil: “A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”.
Ocorrendo um acidente de transporte, não pode o transportador, assim, pretender eximir-se da obrigação de indenizar o passageiro, após haver descumprido a obrigação de resultado tacitamente assumida, atribuindo culpa ao terceiro (ao motorista do caminhão que colidiu com o ônibus, por exemplo). Deve, primeiramente, indenizar o passageiro, para depois discutir a culpa pelo acidente, na ação regressiva movida contra o terceiro.
No tocante, ainda, à responsabilidade contratual, a do transportador, no caso das ferrovias, tem início quando o passageiro passa pela roleta e ingressa na estação de embarque. Daí por diante, estará sob a proteção da cláusula de incolumidade, respondendo a companhia de estrada de ferro pelos acidentes ocorridos com o passageiro ao subir ou descer do trem, por escorregar ou ser empurrado. Só não será responsabilizada se o dano decorrer de fato exclusivo de terceiro, estranho ao transporte.
Em certos meios de transporte distinguem-se perfeitamente o momento da celebração do contrato e o de sua execução. Nas viagens aéreas, por exemplo, é comum a passagem ser comprada com antecedência. Nestes casos, a responsabilidade do transportador só terá início com a execução da avença.
No transporte rodoviário, tendo em vista que a estação não pertence à transportadora, a execução se inicia somente com o embarque do passageiro, e só termina com o desembarque. Se o passageiro vem a se ferir em razão de queda ocorrida durante o embarque, porque o ônibus movimentou-se abruptamente, configura-se a responsabilidade do transportador, porque já se iniciara a execução do contrato. Do mesmo modo se a queda ocorrer por ocasião do desembarque.

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