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1 Carlos Pereira de Novaes SISTEMA DE DRENAGEM URBANA 2 SISTEMA DE DRENAGEM URBANA 3 GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA GOVERNADOR Dr. César Augusto Rabelo Borges SECRETARIA DE EDUCAÇÃO Dr. Eraldo Tinoco SECRETARIA DE CULTURA E TURISMO Dr. Paulo Renato Dantas Gaudenzy UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA REITORA Professora Anaci Bispo Paim VICE-REITOR Professor José Onofre Gurjão B. Cunha PRÓ-REITOR DE GRADUAÇÃO Professor Sérgio Tranzillo França PRÓ-REITORA DE EXTENSÃO E CULTURA Professora Ana Angélica M. R. Gonçalves PRÓ-REITOR DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO Professor Edson Miranda dos Santos PRÓ-REITOR ADMINISTRATIVO Senhor Eutímio Oliveira Almeida DEPARTAMENTO DE TECNOLOGIA Professora Maria do Socorro Costa São Mateus COLEGIADO DE ENGENHARIA CIVIL Professora Riseuda Pereira de Sousa 4 Carlos Pereira de Novaes Professor Adjunto de Hidráulica e Hidrologia do Departamento de Tecnologia da Universidade Estadual de Feira de Santana - BA e Mestre em Hidráulica e Saneamento pelo Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos - USP SISTEMA DE DRENAGEM URBANA Universidade Estadual de Feira de Santana Feira de Santana, Estado da Bahia 2000 5 EDITORAÇÃO Núcleo de Editoração Gráfica da UEFS ENDEREÇO Universidade Estadual de Feira de Santana. Departamento de Tecnologia. Km 3 , Br 116 , Campus Universitário. CEP: 44 031-460. E-mail: carlospdenovaes@gamil.com Tel. : (075) 32248056 Ficha catalográfica: Biblioteca Central Julieta Ca rteado Novaes, Carlos Pereira de. N815 Sistema de drenagem urbana / Carlos Pereira de Novaes -Feira de Santana: UEFS - Universidade Estadual de Feira de Santana, 2000. 224 páginas. : il. ISBN 85-7395-012-9 1. Sistema de Drenagem Urbana. I.Título CDU 626.862.4 6 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho: A Deus, emanador de toda luz do universo. A Jesus e Maria, sua Mãe, pelas lições de amor sem fim. A Sathya Sai Baba, pelo amor, brandura e suavidade de sua presença. Aos meus pais, Accacio José de Novaes e Maria Per eira de Novaes, cujas presenças redivivas invadem meu lar. Ao meu Anjo protetor. Aos meus padrinhos, José Leal da Cunha e Zezé Car doso e famílias. As minhas madrinhas, Mira e Dona Lila e respectiva s famílias. Ao Dr. Walter Logatti e a Escola de Engenharia Civ il de Araraquara. Ao professor Antônio Marozzi Riguetto. Ao caboclo Tibiriçá, guia espiritual de meu pai. À vovó Catarina e à falange dos Pretos Velhos de U mbanda. Aos amigos da espiritualidade. Aos amigos Bira, Maria Augusta, Maura e Seo João. Aos meus irmãos Flávio e Antônio e suas respectiva s famílias Aos meus sobrinhos Laerte, Mariângela e família. A minha afilhada Rafaela. Aos amigos e professores Areobaldo de Oliveir a Aflitos e Laura Cruz de Mendonça. Aos amigos Cescé, Caguto, Loredo, Alexandre e dema is integrantes da Banda Reculhamba de Feira de Santana. Salve Xangô e Iemanjá. 7 AGRADECIMENTOS À Universidade Estadual de Feira de Santana, dirigida pelo Magnífico Reitor Professor José Carlos Barreto de Santana. Ao Departamento de Tecnologia da Universidade Estadual de Feira de Santana, dirigido pela Professora Cristina Maria Rodrigues da Silva. Ao senhor Nivaldo Assis da Silva Filho e demais funcionários da Gráfica da Universidade Estadual de Feira de Santana. Aos alunos da matéria Drenagem Urbana. 8 Prefácio do autor É com muita honra que apresentamos aos nossos queridos leitores e alunos, uma edição de notas de aulas do curso de drenagem urbana, na forma de um livro, publicado pela Universidade Estadual de Feira de Santana. Foi idéia do autor editar as presentes notas de aulas na forma de um livro-texto, de forma a facilitar a compreensão do curso de drenagem urbana e subsidiar, didaticamente, os trabalhos dos alunos, durante o seu aprendizado. O conteúdo do livro é eminentemente técnico e didático e foi elaborado para que os nossos alunos possam acompanhar o desenvolvimento do curso de drenagem urbana de uma maneira direta e direcionada ao desenvolvimento das aulas, evitando, assim, perdas desnecessárias de tempo. Não é pretensão do autor substituir o conteúdo do presente texto pelo de outros livros, também dedicados a este assunto. Não. Decidimos elaborá-lo a partir do momento que se verificou a abrangência dos assuntos estudados, que envolvem matérias muito diferentes, cujos conteúdos dificilmente seriam dados sem um texto didático auxiliar e, ao mesmo tempo, didático e funcional, que servisse de base ao aluno de uma forma prática e rápida, pois o conteúdo da matéria drenagem urbana é muito extenso e tem muitos detalhes, para ser ministrado na forma tradicional e sem a ajuda de texto didático auxiliar, dentro do período letivo, que é de somente quatro meses, aproximadamente. O texto, dada à extensão da própria matéria, abrange desde os estudos básicos dos assuntos mais ligados ao seu desenvolvimento, como hidráulica e hidrologia, até a parte prática, com um pequeno projeto de drenagem urbana, sugerindo também, quando necessário, alternativas de leituras de outros livros que tratam do assunto, com as matérias complementares, para dar uma maior e melhor compreensão ao leitor, sobre os assuntos expostos. Evidentemente, que por se tratar de um livro-texto didático, aplicado ao desenvolvimento de uma matéria optativa na estrutura do curso de engenharia civil, o mesmo exige, do aluno, o conhecimento, prévio, de algumas matérias, tidas como pré-requisitos, como, por exemplo, mecânica dos fluidos, hidráulica e, principalmente, hidrologia, cujos conteúdos individuais são muitos extensos, cabendo, ao leitor, colaborar e fazer, às vezes, uma revisão desses assuntos. Um outro detalhe, didático, do livro, é que todos os exercícios contidos no mesmo não têm respostas. Por quê? A resposta é muito simples, dentro do nosso humilde entendimento: as respostas dão ao aluno, que tenta aprender o conteúdo da matéria, uma pseudobase, ou mesmo, às vezes, uma presunção, de conhecimento, que o aluno, na realidade, não tem, ainda. Neste aspecto, os exercícios sem respostas são mais eficientes, pois o que prevalece, sempre, é a dúvida e, portanto, a prudência, em relação ao assunto estudado. É como na própria vida profissional de qualquer um de nós, os problemas vão aparecendo normalmente, precisando de respostas imediatas, firmes, sem vacilações, que só a experiência e o tempo podem oferecer, através do exercício constante da própria profissão. É claro que, em sala de aula, cabe, ao professor, a correção dos exercícios e a elucidação das dúvidas que, porventura, os alunos tiverem. Agradecendo a atenção do leitor, nos despedimos, informando que este livro está à disposição na Livraria Interuniversitária da Universidade Estadual de Feira de Santana, cujo endereço, e-mail ou telefone para contato, deste professor, se encontram na contracapa.9 Sumário Capítulo 1 Introdução à drenagem urbana 13 1.1 Introdução 13 1.2 Micro e macrodrenagem urbana 16 1.2.1 Microdrenagem urbana 16 1.2.2 Macrodrenagem urbana 20 1.3 Canais de macrodrenagem em localidades litorâneas 22 Capítulo 2 Escoamentos em canais a céu aberto 23 2.1 Introdução 23 2.2 Canais em regime uniforme 25 2.2.1 Equação de Bernoulli ou do movimento 25 2.2.2 Equação de continuidade 26 2.2.3 Equação de perda de energia 27 2.3 Aplicação da fórmula de Manning a alguns tipos especiais de canais em regime uniforme 29 2.3.1 Escoamento em sarjetas triangulares simples 29 2.3.2 Escoamento em galerias circulares 31 2.3.2.1 Tubos de concreto simples ou armado 33 2.3.3 Escoamento em galerias com seção retangular e funcionando com seção parcial 35 2.3.4 Escoamentos em canais revestidos e com seção trapezoidal 35 2.4 Perda de carga ou energia em poços-de-visita 37 2.4.1 Dimensionamento de um poço-de-visita 27 2.5 Capacidade máxima de escoamento das grelhas 43 Capítulo 3 Escoamento em canais com regime variado 45 3.1 Escoamento variado ou permanente não-uniforme 45 3.2 Equação de Bernoulli ou energia 45 Capítulo 4 Análise do escoamento em relação ao número de Froude 53 4.1 Escoamento subcrítico, crítico e supercrítico. 53 4.2 Propriedades do escoamento crítico 57 4.3 Interpretações físicas do significado dos regimes de escoamentos subcrítico, crítico e supercrítico 60 4.4 Escoamento crítico em controles retangulares 64 4.4.1 Escoamento em bocas-de-lobo 66 10 Capítulo 5 Dissipação de energia em canais a céu aberto 69 5.1 Dissipadores de energia 69 5.2 Escadarias hidráulicas 69 5.3 Ressaltos hidráulicos ou escoamento bruscamente variado 73 5.3-1 Ressaltos hidráulicos simples 74 5.3.1.1 Forças relativas à variação de quantidade de movimento 75 5.3.1.2 Forças devidas às pressões efetivas no volume de controle do ressalto 76 5.3.1.3 Somatório de todas as forças consideradas na equação do ressalto hidráulico simples 77 5.3.1.4 Ressalto hidráulico simples em bacias de dissipação com controle do nível de jusante 84 5.3.1.5 Comprimento do ressalto hidráulico simples 85 5.3.1.6 Ressaltos em bacias de dissipação com blocos 86 5.3.1.7 Comprimento do ressalto em bacias com blocos 92 5.4 Bacia de dissipação com o escoamento variado e declividade adversa ou bacia de mergulho 96 Capítulo 6 Introdução à hidrologia aplicada à drenagem urbana 103 6-1 Introdução 103 6.2 Hidrologia aplicada aos problemas de microdrenagem urbana 105 Capítulo 7 Análise de precipitações intensas 107 7.1 Precipitações intensas 107 7.1.1 Determinação de precipitações intensas em locais que não dispõem de dados pluviográficos 110 7.2 Hietogramas de precipitações intensas 116 7.3 Precipitação intensa média na bacia de contribuição 121 Capítulo 8 Infiltração em bacias urbanas 123 8.1 Infiltração 123 8.2 Infiltração em microbacias urbanas 124 8.2.1 Determinação prática do índice de infiltração em bacias 125 8.3 Determinação de coeficientes de deflúvio ou run-off em microbacias urbanas 128 8.3.1 Considerações sobre coeficientes de run-off. 128 8.4 Precipitação efetiva sobre uma bacia 130 11 Capítulo 9 Estimativa de vazões de enchentes em bacias urbanas 131 9.1 Cálculo das vazões máximas prováveis que ocorrem em micro e pequenas bacias urbanas. 131 9.2 Método do hidrograma unitário 132 9.2.1 Determinação do hidrograma unitário para uma microbacia 133 9.2.2 Método do hidrograma unitário sintético 138 9.2.2.1 Método do hidrograma unitário sintético do Colorado 139 9.2.2.2 Cálculo da precipitação efetiva na bacia 145 9.2.2.3 Cálculo da hidrógrafa final de projeto 149 9.2.2.4 Método do hidrograma unitário sintético triangular 151 9.3 Método racional 155 9.3.1 Cálculo do tempo de concentração 155 9.3.2 Estimativa e adoção do coeficiente de deflúvio ou run-off 165 9.3.3 Estimativa do tempo de recorrência 166 9.3.4 Estimativa da intensidade de precipitação máxima provável 166 Capítulo 10 Análise estatística de vazões de enchentes 167 10.1 Estudo e análise de vazões de cheias que ocorrem em médias e grandes bacias 167 10.2 A utilização de métodos estatísticos na previsão de cheias 167 10.2.1 Extrapolação dos dados e inferência estatística de cheias, para maiores tempos de recorrência 168 10.2.1.1 Método de Gumbel 171 10.2.1.2 Método de Ven Te Chow 172 10.2.1.3 Método de Fuller 173 Capítulo 11 Um pequeno exemplo de drenagem urbana 177 11.1 Exemplo de um pequeno anteprojeto de uma galeria de microdrenagem urbana 177 11.2 Cálculo da galeria de drenagem de um loteamento 178 11.2 Descrição da planilha de cálculo de vazões para a verificação da necessidade de galerias de drenagem enterradas no loteamento 179 11.2.2 Cálculo da planilha de vazões máximas para a verificação da necessidade de galerias de drenagem enterradas no loteamento 187 11.2.3 Algumas considerações sobre o cálculo da planilha e sobre o sistema de drenagem 197 12 11.2.4 Detalhamento das galerias e dos poços-de-visita do sistema de drenagem da avenida 3 201 11.2.4.1 Dimensionamento do emissário 202 11.2.4.2 Detalhamento dos poços-de-visita 204 11.2.4.2.1 Detalhamento do poço-de-visita do ponto 13 204 11.2.4.2.2 Detalhamento do poço-de-visita do ponto 14 207 11.2.4.2.3 Detalhamento do poço-de-visita do ponto 15 207 11.2.5 Dissipador de energia ao final do emissário 212 11.2.6 Desenho do sistema de drenagem que passa pela avenida 3, do emissário final e da bacia de dissipação 213 11.2.6.1 Desenho e detalhamento das valas de todo o sistema drenagem do condomínio 214 11.2.7 Desenho, detalhamento e posicionamento das grelhas 214 11.2.7.1 Disposição das grelhas nos pontos 215 11.2.7.2 Dimensionamento de caixas-de-grelha simples, duplas ou em série com saídas laterais e do tubo conector da caixa-de-grelha com o poço-de-visita 218 11.2.7.3 Algumas palavras sobre confecções de grelhas feitas sob encomenda, caixa-de-grelha e bocas-de-lobo 222 11.3 Considerações finais sobre o livro e o exemplo 11.1 225 Lista de símbolos utilizados 226 Bibliografia 228 13 Capítulo 1 Introdução à drenagem urbana 1.1 Introdução Para se falar em drenagem urbana, primeiramente precisa-se falar em urbanismo, que significa, como o próprio nome indica, tornar o meio citadino em que vivemos mais interessante, belo, bonito e acima de tudo agradável aos nossos sentidos. Não se pode viver bem em um ambiente mal drenado, já que o acúmulo de águas paradas ou estagnadas tende a degradar o ambiente das cidades, pelas várias conseqüências que daí podem advir, tanto de ordem estéticas como sanitárias. É muito comum no nosso meio técnico e por que não dizer, também, político ou mesmo comunitário, as pessoas menosprezarem ou até mesmo desprezarem os assuntos ligados à drenagem urbana em si. Por quê? A resposta é muito simples: é porque os efeitos das obras de drenagem não aparecem à primeira vista, como um belo jardim. São obras escondidas, enterradas. São obras quesó aparecem, ou melhor, são mais necessárias, nos dias que chove mais intensamente. Mas veja como pode ficar um bairro mal projetado, em termos de urbanismo, após a passagem de um temporal? Totalmente destruído! Aí as pessoas e os meios de comunicação, de um modo geral, criticam a prefeitura ou a atuação do prefeito e as obras de drenagem são lembradas e valorizadas, novamente. No processo natural de urbanização moderna, infelizmente, o que vale e é mais importante é o aspecto financeiro dos negócios. Assim, à medida que os terrenos vão adquirindo valor expressivo, nas periferias de nossas cidades, os nossos bairros vão surgindo, de uma maneira totalmente desordenada e inadequada, em termos de urbanização e, obviamente, também, em termos de qualidade de vida de nossos cidadãos. O poder público, de um modo geral, é necessário que se diga, não presta a devida atenção a esse tipo, inadequado, de ocupação urbana, através de seus órgãos competentes e através, também, da aplicação de leis de zoneamento e de uso do solo urbano, mais adequadas e exeqüíveis, preferindo, mais tarde, tomar uma posição mais remediadora, ao invés de uma posição preventiva, que poderia minimizar muitos problemas. Assim, aos poucos, vão se destruindo, mais e mais, a cobertura vegetal da localidade e o próprio relevo original dos terrenos urbanos, além de outras características gerais e também originais da paisagem, o que, com o tempo, desestabiliza totalmente o equilíbrio do meio ambiente urbano. Daí, ter que se adotar, infelizmente, mais tarde, como já dissemos, medidas remediadoras e caras que nem sempre são saneadoras, para tentar diminuir os impactos ou as conseqüências advindas de projetos ou ocupações urbanísticas mal feitas, como, por exemplo, os grandes processos de erosões, das bacias urbanas, muitas vezes irreversíveis, os enchimentos das calhas dos rios que sangram estas bacias, com sedimentos oriundos dessas ocupações desordenadas e, conseqüentemente, as ocorrências de inundações em nossas cidades. 14 Em um processo mal conduzido, de ocupação urbanística, podem ser muitos os motivos dos aumentos das cheias ou das enchentes: a) a ausência da cobertura vegetal original, que antes retinha a água da chuva no terreno das bacias e aumentava, também, a infiltração; b) a impermeabilização de grande parte das bacias urbanas, através da construção de edifícios, pátios, garagens e outros tipos de obras, diminuindo, drasticamente, a capacidade de infiltração, dos terrenos das bacias; c) a diminuição do tempo de concentração das bacias ou o aumento da velocidade do escoamento superficial, através da construção de obras com áreas cimentadas e mais lisas. É bom salientar que, nas condições naturais do terreno da bacia, essa velocidade é bem menor, fazendo com que a retenção das águas nas bacias e o tempo de concentração sejam bem maiores. Os fenômenos das enchentes ou das inundações podem ocorrer tanto devido ao aumento da magnitude das vazões de enchentes, como já foi dito, como, também, em função de processos de erosão do solo urbano e posterior deposição nos leitos dos córregos, aumentando, assim, o nível do seu leito e, conseqüentemente, o nível das suas lâminas líquidas, durante as enchentes. A erosão, do solo superficial das bacias, é causada, principalmente, por desmatamentos excessivos ou mal feitos e, a médio ou longo prazo, pela não reposição desta vegetação na região desmatada anteriormente, através de um processo eficiente. Sem vegetação, a água superficial da chuva carreia o solo, aumenta a declividade local do terreno, que, por sua vez, aumenta mais ainda a velocidade do escoamento superficial no terreno e, muitas vezes, pode levar a processos erosivos devastadores e irreversíveis, para o próprio meio urbano. O projeto urbanístico de drenagem bem adequado, de uma área, é um assunto cuja abordagem é multidisciplinar e necessita de estudos em diversas áreas do conhecimento humano e científico e demanda, ainda, muita pesquisa específica em diversas áreas afins ao mesmo. Um outro aspecto bem importante do urbanismo, no que diz respeito ao saneamento e higiene do meio, é a remoção da água estagnada ou empoçada nas depressões naturais dos terrenos e das ruas. Uma cidade tecnicamente bem drenada não deve permitir a existência de poças com águas estagnadas, geralmente ocasionadas pelo acúmulo das águas da chuva nas depressões das ruas e dos terrenos das bacias urbanas, cujos solos contêm boas percentagens de argila ou silte ou cuja pavimentação dificulta a infiltração da água, porque essas águas paradas normalmente são focos de inúmeras doenças e criatórios naturais de mosquitos. A televisão, ultimamente, vem mostrando, através de propagandas, que a Dengue, a Dengue hemorrágica e principalmente a Febre Amarela, que já foram muito combatidas no Brasil, desde o início do século XX, à época do Dr. Oswaldo Cruz, são transmitidas por um vetor único, o mosquito Aedes Aegypti, que necessita de águas, geralmente estagnadas, para o seu ciclo vital (29). O poder público, através de suas secretarias e órgãos governamentais competentes, deve combater, de todos os modos, incluindo aí, também, um bom sistema de drenagem, todos os focos propagadores dessas doenças no meio urbano. É de competência do estado e, também, da própria comunidade, não devemos esquecer, a inspeção, rotineira, o controle e, até, mesmo, a eliminação desses focos de contaminação, que, muitas vezes, necessitam de projetos específicos de drenagem, subsuperficial ou profunda, nos terrenos da 15 área em questão, ou, muitas vezes, requerem até o aterramento total da área contaminada por estes focos de mosquitos, por serem muito insalubres. Baseados em tais problemas, muitas vezes específicos, na área de saúde pública e de urbanização do meio, é que achamos que a matéria drenagem urbana deveria ser encarada com uma visão mais profilática e preventiva, o que infelizmente ainda não ocorre, nos nossos meios técnicos, administrativos e acadêmicos, ao invés de ser encarada somente com uma visão meramente terapêutica ou remediativa, como, infelizmente, ainda é vista, fazendo com que os engenheiros, arquitetos e outros técnicos ligados a esta área passem a exercer, também, o papel de sanitaristas do meio ambiente urbano, e não só a de meros técnicos, preocupados, apenas, com os aspectos estéticos, técnicos e financeiros da questão da drenagem urbana. 1.2. Micro e macrodrenagem urbana Levando-se em consideração somente à área de drenagem da bacia de contribuição como parâmetro para classificação do tipo de drenagem, pode-se dividir o estudo e, conseqüentemente, o projeto das obras de drenagem, em duas partes: a micro e a macrodrenagem urbana. 1.2.1 Microdrenagem urbana O micro drenagem compreende todos os equipamentos do sistema que captam as águas da chuva que escoam nas sarjetas e, também, as próprias sarjetas que, em dias de chuva, são os canais artificiais de escoamento da água da chuva, ajudando a levá-las ao seu destino final, que normalmente são depressões naturais da bacia, para posterior infiltração da água da chuva no terreno, quando este é constituído de solo permeável, ou os riachos da própria bacia ou, também, quando se tratam de sistemas de drenagens já construídos, os canais de macro drenagem, do qual falaremos mais adiante. Normalmente, o sistema de microdrenagem compreende, também, além das próprias calhas das ruas, as sarjetas, as bocas-de-lobo, as grelhas, as bocas-de-leão, os coletores ou galerias, os poços-de-visita e, também, os pequenos emissários, além de outros dispositivos, como pequenos bueiros, os rasgos, os sarjetões e as escadarias hidráulicas, vistas no capítulo 4 (5, 9). As sarjetas são os canais laterais que existem nas ruas, situadas entre a guia ou o meio-fio e a pista, para os escoamentos das águas pluviais, cujos formatos transversais mais encontrados são os dassarjetas comuns , cujas declividades acompanham o desenvolvimento transversal das ruas, conforme mostra a figura 1.1, abaixo, à esquerda, e as sarjetas triangulares simples , à direita da figura 1.1. As sarjetas, normalmente, são construídas com concreto, paralelepípedos ou com o pavimento das próprias ruas (figuras 1.2 e 1.3). Figura 1.1 Corte, sem escala, do esboço de uma rua, com os dois tipos de sarjetas mais comuns e encontradas em nossas ruas. Calçada Guia Sarjeta comum Sarjeta triangular simples 16 As bocas-de-lobo são aberturas para captação da água que escoa nas sarjetas e ficam localizadas, verticalmente, nas guias das ruas, construídas abaixo da calçada, conforme mostram os desenhos e a fotografia da figura 1.2. O comprimento longitudinal da boca-de-lobo fica, normalmente, em torno de 90 cm e a altura da sua abertura fica, também, em torno de 10 centímetros . As grelhas ou ralos são dispositivos de captação das águas das chuvas, construídos de ferro fundido, concreto armado ou ferro, sob encomenda (5). As grelhas, principalmente as de ferro fundido, são pré-fabricadas e trabalham dispostas horizontalmente nas próprias sarjetas, conforme mostra a figura 1.3. As grelhas, ao contrário das bocas-de-lobo, que são captações abertas, são captações pluviais semifechadas, e têm a vantagem de evitar, ou melhor, diminuir, a entrada de detritos para o sistema enterrado de drenagem. Devem, no entanto, permanecerem sempre limpas, necessitando assim de um sistema de varredura das ruas bem eficiente. Figura 1.2 Vista frontal e corte, sem escala, de uma boca-de-lobo. À direita, fotografia de uma boca-de-lobo dupla, construída sob a calçada. Vista frontal As bocas-de-leão, como são conhecidas em algumas cidades do Brasil, são captações pluviais que combinam ambos os sistemas das bocas-de-lobo e das grelhas, trabalhando ao mesmo tempo, isto é, captam água tanto nas aberturas das guia como nas sarjetas, conforme mostra a figura 1.4. Figura 1.3 Perspectiva e corte, sem escala, e fotografia de uma grelha de ferro fundido e sua localização na sarjeta. Fotografia Rua Meio-fio Sarjeta Corte Boca-de-lobo Boca-de-lobo Tubo de ligação Grelha Sarjeta Sarjeta Grelha Rua Calçada Tubo de ligação Fotografia Perspectiva Corte 17 Existem alguns sistemas alternativos de captação das águas pluviais que não se situam nas sarjetas, como, por exemplo, a boca-de-leão reentrante, construída na própria calçada, conforme mostra a fotografia da figura 1.4. Tais sistemas, no entanto, são mais raros de serem observados em nossas ruas. A escolha do melhor tipo de captação de águas pluviais que deve ser empregada em anteprojetos de drenagem urbana fica a critério do projetista, em função das vantagens e desvantagens de cada uma. As grelhas, por exemplo, embora tenham um bom rendimento e possam ser construídas ou compradas a preços relativamente baixos, entopem facilmente, com os detritos carregados pela própria chuva, se não houver uma boa varredura das ruas. Têm, no entanto, a vantagem de evitar, ou melhor, minimizar, os problemas de entupimento das galerias enterradas do sistema de drenagem. Figura 1.4 Perspectiva e corte transversal, sem escala, de uma boca-de- leão comum. À direita, fotografia de uma boca-de-leão reentrante, na calçada. Perspectiva Fotografia É interessante notar que, em alguns sistemas de drenagem, a captação da água da sarjeta é feita de forma diferenciada, na própria calçada, conforme mostra a fotografia da boca-de-leão reentrante, da figura 1.4, onde a grelha é de concreto armado. Tais tipos de captação normalmente são construídos, ou para proteger a própria grelha de pancadas de veículos pesados que trafegam nas ruas, já que as grelhas de concreto armado pré-moldado são mais frágeis que as de ferro fundido, ou são construídas com as galerias enterradas sob as calçadas. Ao se projetar um sistema de drenagem urbana, deve-se tomar muito cuidado ao adotar-se bocas-de-lobo e bocas-de-leão em ruas ou avenidas que tenham o tráfego pesado, por onde podem trafegar caminhões carregados, por exemplo, pois esses podem vir a danificá-las, ao estacionarem junto às guias, destruindo a sua laje superior, que é removível e feita para a sua própria limpeza. Em ruas com o tráfego pesado, deve-se utilizar, preferencialmente, grelhas pesadas de ferro fundido (5) ou de ferro comum, sendo, nestes casos, projetadas e construídas especialmente para essas finalidades. Galerias ou coletores de águas pluviais, como também são chamadas, são tubulações enterradas que conduzem a água da chuva sob a rua, de um poço-de-visita para o outro. As galerias, normalmente, são construídas ou com tubos pré-moldados, de concreto simples, quando os seus diâmetros internos são menores que 600 milímetros , ou de concreto armado, quando se trata de galerias com diâmetros internos iguais ou maiores que 600 milímetros (5). Boca-de-lobo Guia Grelha Sarjeta arjeta Sarjeta Grelha Boca-de-lobo Calçada Tubo de ligação Rua Corte . 18 Os poços-de-visita, em sistemas de drenagem, são grandes câmaras subterrâneas, projetadas e construídas nos cruzamentos e no meio das ruas e avenidas, que, efetivamente, escoam grandes vazões de água das chuvas, conforme mostra o desenho da figura 1.5. A sua construção visa facilitar o acesso dos funcionários da inspeção às galerias. Os mesmos, normalmente, são construídas ou de alvenaria de tijolos maciços ou de concreto armado, e têm as suas entradas de acessos fechados com o telar ou suporte, e o tampão, normalmente construídos de ferro fundido ou de concreto armado, conforme mostra a fotografia, à direita da figura 1.6. Os poços normalmente são projetados e construídos entre os diversos trechos de galerias enterradas do sistema de drenagem e permitem a inspeção e a limpeza tanto da tubulação das galerias como das tubulações oriundas das grelhas ou bocas-de-lobo, conforme mostra a figura 1.5. Os poços-de-visita, sempre que necessário, devem ser construídos nos cruzamentos de ruas ou avenidas que escoam as águas das chuvas, para receberem as tubulações oriundas das grelhas ou bocas-de-lobo neste ponto, conforme mostra o esboço da figura 1.5. Deve-se projetar e construir, também, poços-de-visita em trechos longos e retilíneos de galerias enterradas, bem como em determinados pontos das ruas, onde haja mudanças de direção das galerias, já que estas, normalmente, são executadas através de trechos retos e o direcionamento das ruas, em muitos locais, pode ser sinuoso. Figura 1.5 Esboço de uma planta baixa e corte frontal, sem escala, de um trecho de um sistema de drenagem, em um cruzamento de ruas, onde aparecem as galerias, as captações situadas nas sarjetas e o poço-de-visita. Planta baixa. Grelha e caixa de grelha A Poço-de-visita Galeria de montante Galeria de jusante Sarjeta Ligação da grelha ao Guia ou meio-fiopoço-de-visita A Corte AA Telar e tampão Grelha e caixa de grelha Sarjeta Calçada Rua Poço-de-visita Ligação da grelha ao ao poço-de-visita 19 Figura 1.6 Corte longitudinal de um esboço de um poço-de-visita, onde aparecem as câmaras de entrada e de inspeção, ambas com degraus de ferro fundido fixados à parede, e as partes finais e iniciais das galerias de montante e de jusante. À direita, uma fotografia do telar e do tampão de entrada. Tampão Fotografia do Câmara de entrada telar e do tampão Laje Degraus de ferro Conexão da boca-de-lobo Câmara de inspeção Galeria de montante Fundo inclinado Galeria de jusante Os emissários, em sistemas de drenagem urbana, são grandes galerias enterradas, com o formato circular, quadrado ou retangular, conforme mostra a fotografia da figura 1.7, e são muito utilizados em grandes sistemas de macro- drenagem urbana, principalmente em grandes centros urbanos. Quando utilizados em anteprojetos de microdrenagem, geralmente são tubulações terminais, que permitem o transporte final da água proveniente da chuva, desde o último poço-de-visita até a seu destino final que, normalmente, é um riacho ou um outro local adequado para este fim. É muito comum, instalar-se, ao final dos emissários, que normalmente apresentam grandes velocidades médias de escoamentos, em dias de chuvas fortes, dispositivos para a dissipação da energia hidráulica do escoamento, de modo a evitar-se a erosão das margens do riacho receptor, constituído ou de uma bacia de dissipação construída com grandes pedras, conforme mostra a figura 1.7, ou através de uma bacia de dissipação horizontal, com o tamanho apropriado, conforme mostra o desenho da figura 11.16 (10). 1.2.2 Macrodrenagem urbana Denomina-se macrodrenagem todo o sistema de captação de águas das chuvas oriundas de grandes bacias de drenagens que se localizam fora ou à montante dos centros urbanos, ou localizadas dentro dos próprios centros urbanos, cuja drenagem natural, normalmente, é caracterizada pela presença de pequenos rios, normalmente perenes ou intermitentes. Denomina-se macro- drenagem, também, a drenagem artificial de grandes áreas, localizadas nos sítios urbanos, cujas vazões máximas, em dias de chuvas fortes, podem ser muito grandes, daí a própria denominação: macrodrenagem. Os sistemas de macrodrenagem urbanos normalmente são constituídos de grandes galerias subterrâneas ou de canais a céu aberto. As galerias, que normalmente têm o seu formato retangular, são fechadas superiormente, com 20 grandes lajes construídas de concreto armado, quando se trata da drenagem de áreas em zonas centrais de grandes centros urbanos, onde a construção de canais, com o escoamento a céu aberto, podem trazer problemas, não só ao tráfego dos automóveis, como à circulação dos transeuntes, conforme mostra a fotografia da figura 1.7. Figura 1.7 Saída de uma galeria retangular de macrodrenagem urbana, tipo emissário, localizada na praia da Pituba, em Salvador-BA . A grande maioria dos sistemas de macrodrenagem de nossas cidades, no entanto, são constituídos de grandes canais construídos com o escoamento a céu aberto, com o formato retangular, conforme mostra a figura 1.8, ou com o formato trapezoidal, e, normalmente, revestidos, com alvenaria de grandes pedras, concreto armado e mais modernamente, com a estrutura em gabiões, que são, em poucas palavras, grandes gaiolas construídas com tela de arame anticorrosivo e preenchidas com grandes pedras, com a granulometria mínima apropriada ao seu trabalho, de modo a evitar a movimentação do leito ou base do canal, em dias em que o mesmo escoa grandes vazões de enchentes. As grandes galerias de macrodrenagem subterrâneas normalmente são evitadas nos sistemas de drenagens dos pequenos centros urbanos, devido, principalmente, às dificuldades inerentes à sua manutenção, o que não ocorre com os canais a céu aberto, que são mais fáceis de serem limpos. Figura 1.8 Fotografia do escoamento de canal de macrodrenagem de um centro urbano, com o formato retangular, construído com gabiões. Fazem parte do sistema de macrodrenagem urbana, também, embora não sejam tão comuns assim de serem observados, devido ao seu alto custo, os grandes emissários submarinos, que despejam as águas pluviais bem longe das praias, para serem carregadas pelas correntes marítimas. Normalmente são observados no esgotamento de cidades grandes litorâneas, como o Rio de Janeiro e Salvador ou em outros pontos estratégicos. 21 Tanto a concepção inicial, como o dimensionamento dos equipamentos da micro e da macrodrenagem, obedecem a critérios diferenciados, como será visto e discutido neste e nos próximos capítulos deste livro. O dimensionamento dos canais de macro-drenagem, por exemplo, deve ser executado, preferencialmente, utilizando-se dados de vazões de enchentes dos rios que sangram os centros urbanos, o que na prática de engenharia de recursos hídricos raramente ocorre, infelizmente, devido a uma grande falha de nossas Prefeituras Municipais, que não fazem medições sistemáticas ou mesmo estimativas das vazões das enchentes dos nossos riachos urbanos, principalmente em épocas mais chuvosas. Não havendo dados sobre vazões máximas de enchentes, é necessário que os engenheiros projetistas recorram a métodos hidrológicos que utilizam dados sobre precipitações intensas que, estatisticamente, podem ocorrer na região da bacia de drenagem, levando-se em consideração índices de infiltrações ou coeficientes de run-off hipotéticos, para estes cálculos. Essas metodologias, muito utilizadas em anteprojetos, sempre levam o projetista a ter grandes imprecisões, nos cálculos das vazões máximas de enchentes, principalmente quando estes métodos são utilizados indiscriminadamente em bacias urbanas com grandes dimensões, levando, fatalmente, o projetista a vir fazer cálculos geralmente muito imprecisos, que podem onerar ou prejudicar as obras de drenagem. É opinião do autor que as Prefeituras Municipais, principalmente as de centros mais desenvolvidos, que têm problemas com inundações dos riachos urbanos, deveriam fazer medições sistemáticas tanto de chuvas intensas como das vazões dos riachos que cortam os nossos centros urbanos, de forma a monitorar, melhor, essas informações hidrológicas e facilitar a confecção dos diversos projetos, principalmente daqueles ligados à drenagem urbana. O dimensionamento da microdrenagem, por outro lado, já não requer, do projetista, o mesmo rigor utilizado para o projeto da macrodrenagem, pois os escoamentos produzidos pelas microdrenagens, mesmo em dias com chuvas intensas muito fortes, não trazem tantos danos às nossascidades, admitindo, normalmente, um dimensionamento mais simples, através de métodos também bem simples, como por exemplo, o método racional. Fazem parte da macrodrenagem urbana, também, os bueiros, que são instalações singulares, isto é, instalações construídas especialmente para que os escoamentos provenientes das águas da chuva, que escoam através de pequenos riachos, sejam canalizados adequadamente e não causem grandes danos ao meio urbano. Os bueiros normalmente são tubulações com grandes diâmetros, construídos com chapa de aço inoxidável corrugada ou com tubos de concreto armado ou, às vezes, também, de estrutura de concreto armado moldada no próprio local de execução. Os bueiros são muito utilizados também para substituírem as pontes, conforme mostra a figura 2.4. 1.3. Canais de macrodrenagem em localidades litorâ neas Um aspecto muito importante que, geralmente, é analisado e discutido em anteprojetos de macrodrenagem urbana e incluído no escopo da presente publicação é o que diz respeito à influência das marés altas nas inundações de nossas cidades litorâneas, quando estas ocorrem simultaneamente com o as cheias, dos riachos que cortam estas localidades litorâneas ou próximas ao 22 mar. Normalmente estes dois fenômenos, às vezes concomitantes, provocam inundações muito difíceis de serem controladas, pois elas acumulam não só os efeitos dos excessos de vazões, nas calhas dos rios, provocadas pelas chuvas torrenciais na bacia de contribuição, como também o efeito da maré alta, que tende a suspender e, portanto, remansar, a água no próprio rio, dificultando o escoamento natural desses rios, trazendo grandes dificuldades na vida dessas cidades litorâneas. Sob o prisma de uma visão mais acurada em hidráulica, esses tipos de escoamentos são de natureza eminentemente não-permanente, sendo assim fenômenos muito complexos de se analisar, já que tanto as hidrógrafas das ondas de cheias do riacho como as oscilações das marés, são fenômenos totalmente independentes um do outro, fazendo com que a análise real do escoamento no riacho seja um fenômeno que transcende a visão propedêutica do presente livro. No presente capítulo, aborda-se o fenômeno das cheias nos escoamentos de canais ou rios próximos do mar, tratando-os como se fossem escoamentos permanentes variados, de forma a simplificar o entendimento do fenômeno e a resolução do problema, relativo ao projeto hidráulico do canal, junto ao mar. Quando as cheias ocorrem concomitante com a maré baixa, conforme mostra o desenho superior da figura 1.9, o remansamento das águas do rio, que se verifica quando o canal ou rio se aproxima do mar, faz-se bem próximo a este, fazendo com que o efeito da maré, ou seja, o efeito de remansar e de levantar as águas do rio ou canal, seja quase desprezível, quando o rio corta alguma localidade litorânea ou próxima do mar. Quando as cheias dos rios ocorrem com a maré alta, que é a situação mais desfavorável, no ponto de vista de projeto, conforme mostra o desenho inferior da figura 1.9, o escoamento variado passa a existir numa extensão bem mais ampla do canal ou rio, fazendo com que este deva ser analisado e projetado sob a premissa de um escoamento variado ou não-uniforme, já que a análise do fenômeno real, como já dissemos, anteriormente, é muito complexa, não comportando no escopo desta edição. Figura 1.9 Cortes longitudinais dos escoamentos uniformes e variados de um mesmo canal sob a influência ou efeito das marés baixas e altas. a ) Corte do escoamento do canal com maré baixa. Escoamento uniforme Escoamento variado Maré baixa ⇒ Sentido do escoamento Mar b ) Corte do escoamento com maré alta. Escoamento uniforme Escoamento variado Maré alta ⇒ Mar 23 Capítulo 2 Escoamentos em canais a céu aberto 2.1. Introdução Dá-se o nome genérico de hidráulica dos canais, à parte ou ao estudo, específico, da hidráulica, relativo aos escoamentos livres, que se processam com a superfície dos fluidos em movimento, sob pressão atmosférica. Em drenagem urbana, a grande maioria dos escoamentos é, normalmente, livre ou sujeito à pressão atmosférica, tais como, os escoamentos em canais, galerias parcialmente cheias, sarjetas etc. Em hidráulica dos canais, pode-se classificar ou dividir, quanto ao tipo de movimentação, o estudo dos escoamentos livres em dois tipos principais: os escoamentos permanentes e os escoamentos não-permanentes (12 , 26). Escoamento permanente, em uma maneira bem simplificada de falar, é o escoamento em que não se verificam variações das velocidades ao longo do tempo. Pode-se citar, como exemplo, o escoamento em uma sarjeta, quando a intensidade da chuva é relativamente constante. Verifique que as condições do escoamento na sarjeta não variam, ou seja, são permanentes ou permanecem aproximadamente constantes, com as suas velocidades constantes. Escoamento não-permanente, por outro lado, é o escoamento em que se verificam variações das velocidades, ao longo de sua trajetória, tanto em termos de posição como em termos de tempo. Pode-se citar, como exemplo, o escoamento em uma sarjeta, quando uma determinada chuva intensa está terminando. Verifique que a vazão do escoamento, na sarjeta e, portanto, as suas velocidades médias, vão diminuindo, tanto em termos de posição, como em relação ao tempo, ou seja, não permanecem constantes. O estudo dos escoamentos permanentes e livres pode ser dividido, também, em dois tipos: escoamentos permanentes não-uniformes ou variados e escoamentos permanentes uniformes. Define-se como escoamento permanente não-uniforme ou escoamento variado o escoamento em que as velocidades médias permanecem inalteradas ao longo do tempo, embora variem ao longo de sua própria trajetória. Veja, como exemplo, o escoamento de um canal ou de um rio, quando estes se aproximam de um lago. Verifique que a velocidade média da água, ao longo da trajetória, vai se acalmando ou diminuindo, à medida que o escoamento se aproxima do lago, em virtude do aumento da área molhada do escoamento, até que o nível das águas do rio fique praticamente quase horizontal. Por que o rio São Francisco tem em suas margens uma cidade com o nome de Remanso? É porque ali, no local, existia um remanso natural, que é um trecho do rio onde existe um abrandamento, ou seja, um amansamento da velocidade da água e portanto da turbulência do escoamento. Atualmente, não só o remanso, como o próprio nome desta cidade, se deve à interferência do nível do lago da Barragem de Sobradinho neste trecho do escoamento do rio. O remanso é um tipo de escoamento permanente e não-uniforme. 24 Define-se escoamento permanente uniforme, quando a velocidade da águas, em movimento, no canal, permanece inalterada, tanto em termos de espaço, quanto em termos de tempo, quando a vazão de escoamento do canal permanece inalterada. Este é o caso mais comum, de escoamento, para observar-se. Olhe o escoamento da maioria dos canais artificiais que sangram os nossos centros urbanos. Você já observou que tanto a área molhada como a lâmina líquida, desses canais, são constantes e uniformes, ao longo da sua trajetória? Isto demonstra, pela equação da continuidade, que as velocidades, ao longo da trajetória e ao longo do tempo, são, aproximadamente, constantes, sendo o regime de escoamento desses canais uniforme.Uma outra classificação de escoamentos, importante, em hidráulica dos canais, é se o regime do escoamento é subcrítico, crítico ou supercrítico (12). Este tipo de classificação, leva em conta a influência que o número de Froude Fr, que é um número adimensional e que representa a razão entre as forças inerciais, Fi, e gravitacionais, Fg, que existem nos escoamentos, exerce, na classificação do próprio escoamento livre. Se as forças inerciais, Fi, são proporcionais ao produto da massa pela aceleração ma, pela segunda lei de Newton (28 e 41), tem-se, em termos dimensionais: ∆V Fi ∝ m . a ∝ ρ . L 3 . ------ ∝ ρ . L 2 . ∆V 2 .......( 2.1 ) ∆t Na equação 2.1, Fi é a força, ρρρρ é a massa específica do fluido, ∆V representa a dimensão de velocidade e L e ∆∆∆∆t representam, respectivamente, as dimensões de comprimento e de tempo. Se, por outro lado, as forças gravitacionais Fg são proporcionais ao produto da massa m pela gravidade g, tem-se: Fg ∝ m . g ∝ ρ . L3 . g .......( 2.2 ) Dividindo-se a expressão 2.1 pela 2.2, tem-se o que, em hidráulica, é a definição do número de Froude Fr, ou seja, a razão entre forças inerciais Fi e gravitacionais Fg do escoamento. Assim: ∆V2 Fr = ---------- .......( 2.3 ) g . L Em hidráulica, é muito comum tomar-se a dimensão de velocidade do escoamento ∆∆∆∆V como a sua própria velocidade média VM e a dimensão de comprimento L como a própria altura média da lâmina líquida do escoamento yM, sendo comum, também, tomar-se o número de Froude Fr como a raiz da equação 2.3. Assim: VM Fr = ------------- .......( 2.4 ) g . yM 25 Se o número de Froude Fr de um escoamento é igual a 1, diz-se que o escoamento é crítico. Para números de Froude menores que 1, diz-se que o escoamento é subcrítico. Para números de Froude maiores que 1, diz-se que o escoamento é supercrítico. A teoria está mais explicitada no capítulo 4. Por exemplo, se o escoamento de um canal tem velocidade média igual a 1 m/s e se a altura da sua lâmina liquida média é igual a 0,30 m, tem-se: 1 Fr = ----------------- = 0,58 ......( 2.5 ) 9,8 . 0,30 Portanto, se Fr é igual a 0,58 o escoamento é subcrítico. Um outro aspecto, muito interessante, em hidráulica dos canais, e que deve ser mais explicado, é sobre a baixa influência do número de Reynolds Re no escoamento de canais. Normalmente, quase todos os escoamentos, em grandes canais a céu aberto, têm altos raios hidráulicos R e, portanto, altos números de Reynolds Re. Assim, é muito comum admitir-se, de uma maneira quase que generalizada, que os escoamentos em canais são, normalmente, escoamentos turbulentos lisos ou rugosos (12 e 38). 2.2. Canais em regime uniforme A utilização da equação de Bernoulli para os escoamentos em canais com o regime de escoamento uniforme é muito semelhante à utilizada nos escoamentos em condutos forçados ou sob pressão, conforme é mostrado nos próximos itens. Assim, tem-se: 2.2.1. Equação de Bernoulli ou do movimento É a equação que leva em conta a energia total do escoamento do canal, por unidade de peso do fluido em movimentação, nas seções consideradas do escoamento livre do canal (12 e 38). Sejam duas seções de um canal, trabalhando em regime uniforme de escoamento, conforme mostra o desenho da figura 2.1. Figura 2.1 Corte longitudinal do escoamento uniforme e configuração gráfica das energias consideradas. Energia cinética Superfície da água V1 2 / 2g ∆H12 V2 2 / 2g P1 / γ 1 2 H1 ∆L12 P2 / γ H2 z1 α z2 Plano referencial ∆x12 Fundo do canal 26 Levando-se em conta que a energia total, por unidade de peso, do escoamento uniforme H, em qualquer seção do escoamento, é o somatório da energia de posição ou potencial z, da energia de pressão ou piezométrica P/γγγγ e da energia cinética média V2/ 2g, tem-se: P V2 H = z + ----- + ------- ......... ( 2.6 ) γ 2. g Se no escoamento livre de canais, a energia de pressão por unidade de peso do fluido P/γγγγ, equivale à própria altura da lâmina líquida ou: P ------- = y ..........( 2.7 ) γ Portanto, tem-se que a energia total por unidade de peso do fluido H, é dada pela equação: V2 H = z + y + -------- ......... ( 2.8 ) 2. g Assim, pode-se dizer que a perda de energia total ∆∆∆∆H12 entre as duas seções consideradas no escoamento é igual a: V1 2 V2 2 ∆H12 = ( z1 + y1 + ------- ) - ( z2 + y2 + -------- ) .........( 2.9 ) 2. g 2. g Tendo-se que no regime uniforme de escoamento, a altura da lâmina y, nas duas seções do escoamento do canal, são iguais, tem-se: y1 = y2 .........( 2.10 ) Logo, pode-se escrever, através da equação 2.9: V1 2 V2 2 ∆H12 = ( z1 + ------- ) - ( z2 + -------- ) .........( 2.11 ) 2. g 2. g 2.2.2. Equação da continuidade Se a vazão Q que escoa pelo canal, ao longo do tempo, é constante, pode-se afirmar, pela equação da continuidade no regime permanente (38), que o produto da velocidade média V pela área molhada do escoamentodo canal A, também é constante. Logo: Q = V1 . A1 = V2 . A2 ..........( 2.12 ) 27 Se ambas as áreas A das seções 1 e 2 da figura 2.1, são iguais, portanto, pode-se afirmar, através da equação 2.12, que a velocidade média V e a energia cinética média do escoamento V2/2g, em ambas as seções consideradas, são iguais. Portanto, através da equação 2.11, tem-se: ∆H12 = z1 - z2 = ∆z12 ..........( 2.13 ) Chamando-se de So a perda de carga unitária ou perda de energia ∆∆∆∆H12 por unidade de comprimento do canal ∆∆∆∆L12, tem-se ( 12 ). ∆H12 ∆z12 - So = -------- = --------- = sen (α) .........( 2.14 ) ∆L12 ∆L12 Portanto, pode-se afirmar que, no regime uniforme de escoamento em canais, a perda de carga total ∆∆∆∆H12 é igual ao desnível geométrico entre as seções consideradas ∆∆∆∆z12, conforme mostra a equação 2.13, e que a perda de carga unitária S0, será esta energia dividida pelo comprimento do canal ∆∆∆∆L12. 2.2.3. Equação de perda de energia O equacionamento da perda de energia, nos escoamentos de canais funcionando com o regime uniforme, onde os regimes de escoamentos mais comuns são normalmente turbulentos lisos ou rugosos , caracterizados por altos números de Reynolds, Re, como já foi exposto no item 2.1, é muito bem definido utilizando-se a fórmula de Manning (12 e 38), ou seja: n . V -------------- = R2/3 ..........( 2.15 ) So Na equação 2.15, n é o coeficiente de rugosidade e o seu valor varia em função da aspereza ou da própria rugosidade das paredes dos canais; V é a velocidade média do escoamento, em m/s ; So é a declividade do fundo do canal, em m/m , e R é o raio hidráulico do escoamento, em m, ou seja, a razão entre a área molhada A e o perímetro molhado do escoamento P. É comum apresentar-se os valores dos coeficientes de rugosidade da fórmula de Manning n na forma de tabelas, devido a sua grande variabilidade, que, entre outras coisas, pode ser função da rugosidade e de sua distribuição, quando se trata de canais revestidos e de outros fatores, como a presença de vegetais e a movimentação do leito do canal, quando o canal é natural (7, 12 e 33), conforme mostra, sinteticamente, a tabela 2.1. Como a velocidade média V, pela equação da continuidade em regime permanente, é igual a razão entre a vazão Q e a área molhada do escoamento A, tem-se: Q V = ------- ........( 2.16 ) A 28 Tabela 2.1 Alguns valores de coeficientes de atrito utilizados na fórmula de Manning, como função do material empregado na construção das paredes laterais ou no perímetro molhado de canais artificiais (32). Material n PVC 0,010 Madeira 0,013 Concreto alisado 0,012 Concreto não-alisado 0,014 Ferro fundido 0,015 Tijolos 0,016 Pedras brutas 0,020 Seixos 0,025 Pedregulho 0,029 Aço rebitado 0,018 Chapa corrugada 0,022 Terra em boas condições 0,025 Terra com plantas aquáticas 0,035 Observação quanto ao uso da tabela - Quando se utiliza a fórmula de Manning com unidades do sistema Inglês, deve-se multiplicar o segundo membro das equações 2.15 e 2.17 por 1,49 (12 e 38). Portanto, substituindo-se o valor da velocidade média do escoamento V na equação 2.15, tem-se como função da vazão Q: n . Q -------------- = A . R2/3 ..........( 2.17 ) So É bom lembrar, novamente, que quando se utiliza as equações 2.15 e 2.17, a velocidade média do escoamento V é em m/s ; a vazão Q é em m3/s; o raio hidráulico R é em m; o perímetro molhado P é em m; a área molhada A é em m2 e a perda de carga unitária S0 é em m/m . Exemplo 2.1 Qual é a vazão Q que escoa em um canal retangular, cuja largura b é de 1,00 m e a altura da lâmina líquida y é de 0,50 m, sabendo-se que a declividade longitudinal do escoamento, So, é igual a 0,001 m/m e que o coeficiente da fórmula de Manning, n, admitido para caracterizar as paredes do canal, é igual a 0,020, isto é: um canal revestido com alvenaria de pedras, conforme mostra a figura 2.2? Figura 2.2 Cortes longitudinal, frontal e fotografia de um escoamento de canal retangular de alvenaria de pedras. y = 0,50 m b = 1,00 y = 0,50 --------------- So = 0,001 m/m 29 Resolução - Se a área molhada do escoamento, A, é de 0,50 m2 e se o perímetro molhado do escoamento do canal, P, é igual a 2,00 m, tem-se que o raio hidráulico R, igual a (A / P) é igual a 0,25 m, substituindo-se os valores de n, So, A e R na equação 2.17, tem-se: 0,020 . Q ----------------- = 0,50 . 0,25 2/3 ..........( 2.18 ) 0,001 Portanto, resolvendo-se a equação 2.18, tem-se que a vazão escoada no canal, Q, é igual a 0,31 m3/s e a velocidade média do escoamento, V, pela equação de continuidade ou equação 2.16, é igual a 0,62 m/s . Exercício 2.1 A velocidade média do escoamento uniforme de um canal retangular com 0,50 metros de largura e com 0,20 metros de altura é igual a 0,86 m/s . Se o canal é totalmente construído e revestido com concreto alisado, qual deve ser a declividade S0 do mesmo? Exercício 2.2 Quais devem ser as dimensões da área transversal do escoamento de um canal retangular, construído e revestido com alvenaria de tijolos maciços, admitindo-se que a largura da base do canal b é o dobro da altura de lâmina líquida y, sabendo-se, também, que a declividade longitudinal do canal, ou do terreno, em que o mesmo vai ser construído, S0, é de 0,0025 m/m e que a sua vazão de projeto Q é de 500 l/s? 2.3. Aplicação da fórmula de Manning a alguns tipos esp eciais de canais em regime uniforme É comum, em drenagem urbana, o emprego da fórmula de Manning para o dimensionamento de pequenos e grandes canais, que têm as suas seções transversais com formatos especiais, como, por exemplo, os escoamentos das sarjetas e das galerias, que sintetizamos nos itens abaixo: 2.3.1. Escoamento em sarjetas triangulares simples Os escoamentos uniformes nas sarjetas, de uma forma geral, são muito difíceis de serem descritos quando utilizamos a equação de Manning, devido à grande variedade de tipos usuais de seções transversais de sarjetas, utilizadas em nossas ruas, e, conseqüentemente, de equações que caracterizam o termo A/R2/3 na equação 2.17 (5, 9, 43). O tipo de seção que se apresenta e que se utiliza, no presente livro, por simplificação, é um dos tipos mais freqüentes que observamos em nossas ruas, ou seja, uma sarjeta triangular simples , cujo declive transversal, aproximadamente constante, acompanhao próprio declive transversal dos pavimentos das ruas, podendo ser considerado como um canal com seção triangular simples , com a declividade transversal na ordem de 1 para 10, isto é, com o seu ângulo transversal αααα igual a 5,7º, conforme mostra a figura 2.3 (9). Caso se queira utilizar outro tipo de sarjeta, em anteprojetos, deve-se refazer todos os cálculos referentes ao uso na equação de Manning. 30 Figura 2.3 Corte transversal e fotografia de uma sarjeta triangular, com o declive transversal aproximadamente constante. Se, pelo desenho de uma sarjeta simples, mostrado na figura 2.3, a área molhada A, o perímetro molhado P e o raio hidráulico do escoamento R podem ser representados, aproximadamente, pelas equações abaixo, tem-se: A = 5,0 . y2 ..........( 2.19 ) P ≅ 11 . y ..........( 2.20 ) Portanto, R ≅ A / P = 0,45 . y ..........( 2.21 ) Substituindo-se os valores dos parâmetros referentes à rugosidade, à declividade, à área e ao raio hidráulico, isto é, n, So, A e R nas equações 2.15 e 2.17, tem-se, respectivamente, para o escoamento uniforme de uma sarjeta simples, as seguintes equações, referentes à velocidade média do escoamento V e à vazão escoada nas sarjetas Q: n . VS -------------- = 0,59 . y2/3 ..........( 2.22 ) So E, n . QS -------------- = 2,94 . y 8/3 ..........( 2.23 ) So Considerando-se que em uma rua ou avenida, com o aspecto comum e com uma única pista, isto é, com uma sarjeta em cada lado da rua, a vazão de cada sarjeta, QS, seja a metade da vazão total da rua, QR, tem-se, também: n . QR -------------- = 5,88. y 8/3 ..........( 2.24 ) So Exercício 2.3 Qual é a altura máxima da lâmina líquida e a velocidade média do escoamento em uma sarjeta triangular simples, semelhante à sarjeta mostrada no corte e na fotografia da figura 2.3, construída com alvenaria de paralelepípedos, sabendo-se que a sua vazão máxima de escoamento QS é igual a 100 l/s e que a declividade longitudinal da rua, considerada como igual à própria declividade da sarjeta So, é igual a 0,005 m/m? 10 y Calçada Nível da água y αααα ≅≅≅≅ 5,7 31 2.3.2. Escoamento em galerias circulares A maioria dos tubos usados em sistemas de drenagens são circulares, como os tubos de concreto simples ou armados, fabricados com ponta e bolsa, cujos diâmetros, internos, variam desde 150 mm a 1500 mm , ou os tubos de aço corrugado, muito empregados em bueiros, conforme mostra a figura 2.4. Figura 2.4 Fotografia de três bueiros de aço corrugado em paralelo. a) Funcionamento do tubo ou galeria à seção plena Quando o escoamento do tubo funciona à seção plena, ou seja, com a sua seção molhada totalmente tomada pela água e em regime uniforme de escoamento, os segundos membros das equações 2.15 e 2.17 são deduzidos com muita simplicidade. Assim, a área plena Ap , o perímetro pleno Pp e o raio hidráulico pleno Rp dos escoamentos ficam assim estabelecidos: Ap = π . D2 / 4 , Pp = π . D e Rp = D / 4 .........( 2.25 ) Portanto, rescrevendo-se as equações 2.15 e 2.17, tem-se que Vp e Qp podem ser estabelecidas através das seguintes equações abaixo: n . Vp -------------- = 0,40 . D2/3 ........( 2.26 ) So E, n . Qp -------------- = 0,31 . D 8/3 ........( 2.27 ) So Onde, 4 . Qp Vp = ---------- ....... ( 2.28 ) π . D2 Exercício 2.4 Qual é a vazão plena Qp e a velocidade média plena Vp do escoamento uniforme de uma galeria circular, cujo diâmetro interno D é de 400 mm , sabendo-se que o tubo é de ponta e bolsa, pré-moldado e construído com concreto simples não-alisado e que a declividade para o assentamento da galeria ao fundo da vala S0 é igual a 0,001 m/m? 32 b) Funcionamento do tubo ou galeria com a seção parcialmente cheia Quando a galeria funciona parcialmente cheia, conforme mostra a figura 2.4, o estabelecimento de equações para o estabelecimento da área A e do raio hidráulico do escoamento R, para uso na fórmula de Manning, em função do diâmetro interno do tubo D e da altura da lâmina líquida y, se torna mais difícil. É bem mais simples, nesses casos, dimensionar-se a seção transversal semicircular desses escoamentos utilizando tabelas, onde aparecem às razões entre as diversas variáveis analisadas pela fórmula de Manning, com a seção do tubo trabalhando parcialmente cheia, e estas mesmas variáveis, com o tubo funcionando com a seção plena, conforme mostra os dados da tabela 2.2 (33). Dependendo do problema considerado, conhecendo-se a vazão Qp ou a velocidade média Vp, à seção plena, o diâmetro interno da tubulação D e a altura da lâmina do escoamento y, pode-se determinar a vazão escoada Q ou a velocidade do escoamento V na galeria, utilizando-se os valores das razões constantes Q/Qp e V/Vp, que aparecem na tabela 2.2, como função de y/D. Exercício 2.5 Quais são a vazão plena Qp, a vazão de escoamento Q e a velocidade média V do escoamento de uma galeria circular, cujo diâmetro interno é igual a 600 mm , sabendo-se que os tubos da galeria são de concreto armado não-alisado e que a declividade da tubulação S0 e a altura da lâmina líquida y são iguais a 0,0015 m/m e 0,20 m, respectivamente? Tabela 2.2 Valores de áreas sobre áreas plenas A/Ap , raios hidráulicos sobre raios hidráulicos plenos R/Rp, velocidades sobre velocidades plenas V/Vp e vazões sobre vazões plenas Q/Qp, para tubos circulares com a seção parcialmente cheia e em função da razão entre a altura da lâmina líquida e o diâmetro da tubulação y/D (33). y / D A / Ap R / Rp V / Vp Q/Qp Seção transversal do Escoamento na galeria. 0,10 0,052 0,254 0,401 0,021 0,15 0,094 0,327 0,517 0,049 0,20 0,142 0,482 0,615 0,087 0,25 0,196 0,586 0,700 0,137 0,30 0,252 0,684 0,776 0,196D 0,35 0,312 0,774 0,843 0,236 y 0,40 0,374 0,857 0,902 0,337 0,45 0,437 0,932 0,954 0,417 0,50 0,500 1,000 1,000 0,50 0,55 0,564 1,060 1,040 0,587 Galeria 0,60 0,627 1,111 1,073 0,673 Escoamento 0,65 0,688 1,153 1,100 0,757 0,70 0,748 1,185 1,120 0,836 0,75 0,805 1,207 1,134 0,913 0,80 0,858 1,216 1,139 0,987 0,85 0,906 1,213 1,137 1,030 0,90 0,948 1,192 1,124 1,066 0,95 0,982 1,146 1,095 1,075 1,00 1,000 1,000 1,000 1,000 33 2.3.2.1. Tubos de concreto simples ou armado Em drenagem urbana, normalmente, usam-se tubos pré-moldados de concreto simples ou armado, com ponta e bolsa, fabricados de acordo com as normas e especificações da Associação Brasileira de Normas Técnicas-ABNT. Até alguns anos atrás, os tubos de concreto simples, com ponta e bolsa, eram fabricados de acordo com a EB-6, de 1960, em duas classes diferentes, C-1 e C-2, cujos dados são mostrados na tabela 2.3 (5). Tabela 2.3 Algumas especificações de tubos de concreto simples com ponta e bolsa para galerias de drenagem pluvial e esgoto (ABNT - EB-6). Diâmetro Interno ( D ) ( mm ) Resistência Mínima ( kgf / m ) Classe C-1 Resistência Mínima ( kgf / m ) Classe C-2 Comprimento útil ( L ) ( m ) Peso por metro linear ( Kg ) L Bolsa 150 1 750 2 200 1,00 50 200 1 750 2 200 1,00 70 300 1 750 2 200 1,50 150 400 1 750 2 200 1,50 160 500 2 300 2 900 1,50 240 600 2 600 3 300 1,50 330 Ponta D Exercício 2.6 Qual é o diâmetro interno que deve ser utilizado em uma tubulação de concreto não-alisado, para escoar uma vazão Q de 0,22 m3/s, sabendo-se que a declividade da tubulação S0 é de 0,0025 m/m? Verifique, também, a altura da lâmina líquida e a velocidade média do escoamento. Os tubos feitos de concreto armado, com ponta e bolsa, normalmente utilizados em galerias com diâmetros D iguais ou maiores que 600 mm , eram fabricados de acordo com a EB-103, de 1957, em três classes diferentes, ou sejam, CA-1, CA-2 e CA-3, conforme mostram os dados da tabela 2.4 (5). Observação - Atualmente, as normas referentes à fabricação de tubos de concreto, com ponta e bolsa, já foram modificadas. Assim, a fabricação de tubos de concreto simples segue a norma NBR 9793 e a fabricação de tubos de concreto armado segue a norma NBR 9794, da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT. Em drenagem urbana só se deve utilizar tubos de concretos simples em instalações que requerem tubos com diâmetros internos de até 600 milímetros e em locais onde o trânsito de veículos seja leve ou que não provoque grandes tensões nos tubos enterrados, como nos sistemas de drenagem de parques, condomínios e loteamentos residenciais, com o recobrimento, mínimo, de solo sobre a manilha, igual ou superior a 1,00 metro . Em locais em que podem ocorrer movimentações de veículos pesados sobre o solo ou o pavimento, deve-se, sempre, prever eventuais sobretensões, provocadas por estas movimentações e utilizar tubos de concreto armado. 34 Tabela 2.4 Algumas especificações de tubos de concreto armado para galerias de drenagem pluvial e esgoto (ABNT- EB 103). Diâmetro Carga média de trinca Comprimento útil Peso por metro interno ( kgf / m ) linear ( mm ) CA-1 CA-2 CA-3 (m ) ( Kg ) 300 1400 2000 - 1,5 150 400 1750 2350 - 1,5 150 500 2050 2650 - 1,5 235 600 2400 3000 6000 1,5 325 700 2800 3350 6600 1,5 460 800 3200 4000 7300 1,5 650 900 3600 4650 8600 1,5 800 1000 4000 5650 9300 1,5 950 1100 4400 6650 10600 1,5 1200 1200 4800 7650 12000 1,5 1400 1500 6000 10650 14650 1,5 1850 2.3.3. Escoamento em galerias com seção retangular e funci onando com seção parcial As galerias quadradas ou retangulares, ao contrário das circulares, que são pré-fabricadas, geralmente são construídas “in loco” utilizando-se concreto armado. São muito empregadas nas obras civis de macrodrenagem das áreas centrais de grandes cidades, onde não se pode construir canais a céu aberto, devido à escassez de espaço, às dificuldades de locomoção da população e ao próprio trânsito dos veículos. No ponto de vista da utilização, da fórmula de Manning, as mesmas trabalham e são projetadas como se fossem canais com seção transversal retangular e com o escoamento uniforme, conforme mostra a saída do emissário com a bacia de dissipação de pedras, na figura 2.5. Figura 2.5 Corte de uma galeria retangular funcionando como um canal retangular e fotografia da saída de uma galeria tipo emissário. yG y Lâmina líquida b Tendo-se que a área molhada A, o perímetro molhado P e, portanto, o raio hidráulico do escoamento R das galerias, com o formato retangular, trabalhando parcialmente cheias, são respectivamente iguais a: A = b . y ....... ( 2.29 ) P = b + 2 . y ........ ( 2.30 ) 35 Portanto, tem-se: b . y R = -------------- ....... ( 2.31) b + 2 . y Substituindo-se os valores de A e R, das equações 2.29 e 2.31, nas equações 2.15 e 2.17, tem-se, respectivamente: n . V b . y 2/3 -------------- = (-----------------) ........( 2.32 ) So0,50 b + 2 . y E, n . Q b . y 2/3 ------------- = ( b . y ) . (---------------- ) .......( 2.33 ) So0,50 b + 2 . y Exercício 2.7 Quais devem ser as dimensões mínimas teóricas de uma galeria de águas pluviais com o formato quadrado, construída totalmente de concreto armado não-alisado, sabendo-se que a sua vazão máxima de projeto Q é de 8,50 m3/s e que a declividade de assentamento da mesma ao terreno S0 é de 0,0095 m/m? 2.3.4. Escoamento em canais revestidos e com seção trapez oidal É muito comum a utilização de canais trapezoidais em macrodrenagem urbana, que se adaptam tanto aos escoamentos de pequenas vazões, que ocorrem nas estações mais secas do ano, devido ao estreitamento da base b, como aos escoamentos de grandes vazões, que ocorrem nas estações mais chuvosas, devido à grande variabilidade de ângulos dos seus taludes αααα que o canal trapezoidal pode ter, principalmente
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