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POLÍTICAS EDUCACIONAIS “A Faculdade Católica Paulista tem por missão exercer uma ação integrada de suas atividades educacionais, visando à geração, sistematização e disseminação do conhecimento, para formar profissionais empreendedores que promovam a transformação e o desenvolvimento social, econômico e cultural da comunidade em que está inserida. Missão da Faculdade Católica Paulista Av. Cristo Rei, 305 - Banzato, CEP 17515-200 Marília - São Paulo. www.uca.edu.br Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem autorização. Todos os gráficos, tabelas e elementos são creditados à autoria, salvo quando indicada a referência, sendo de inteira responsabilidade da autoria a emissão de conceitos. Diretor Geral | Valdir Carrenho Junior Professora | Sílvia Cristina da Silva Sumário UNIDADE 1 – HISTÓRICO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL INTRODUÇÃO ................................................................ 8 1. Educação, Estado e Sociedade ................................... 8 1.1 O conceito de educação ........................................... 8 1.2 O conceito de Estado à luz da educação .................. 11 1.3 Relacionando educação, Estado e sociedade ............ 12 2. A organização da educação brasileira: dimensões históricas, políticas, sociais, econômicas e educacionais ........................................................ 14 2.1 Histórico da organização do sistema de ensino no Brasil ................................................................. 14 2.2 O papel do Congresso Nacional na legislação educacional ............................................................ 17 2.3 Centralização e descentralização no sistema educacional .................................................................. 18 3. Escolas públicas e privadas na educação brasileira .... 20 3.1 Escola pública ......................................................... 20 3.2 Escola privada ........................................................ 21 3.3 Aspectos positivos e negativos entre a escola pública e privada na educação do Brasil .............................. 21 CONCLUSÃO ............................................................... 23 ELEMENTOS COMPLEMENTARES ................................... 24 REFERÊNCIAS ................................................................ 24 UNIDADE 2 – ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA A PARTIR DO ESTUDO DOS ARTIGOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, DA LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL E DAS LEIS COMPLEMENTARES DA EDUCAÇÃO INTRODUÇÃO .............................................................. 27 1. Constituição Federativa do Brasil (1988) ................... 28 1.1 Conceito de constituição .......................................... 28 1.2 Princípios constitucionais da educação ...................... 30 1.3 Evolução constitucional da educação ....................... 33 1.3.1 Regime jurídico da educação ................................. 34 2. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei no 9.394/96 .................................................... 35 2.1 Histórico da lei ........................................................ 35 2.2 Diretrizes mais importantes e maiores mudanças introduzidas pela lei ................................................. 36 3. Leis complementares da educação ........................... 39 3.1 Legislação infraconstitucional sobre educação ........... 39 3.2 Legislação educacional e a obrigatoriedade escolar ... 40 CONCLUSÃO ............................................................... 41 ELEMENTOS COMPLEMENTARES ................................... 42 REFERÊNCIAS ................................................................ 42 UNIDADE 3 – PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO INTRODUÇÃO .............................................................. 45 1. A história do Plano Nacional de Educação ................ 45 1.1 Um breve histórico .................................................. 45 1.2 Leis anteriores ao PNE e mudanças introduzidas ........ 46 2. Desafios do PNE 2014-2024 ................................... 49 2.1 Metas ..................................................................... 50 2.2 Principais desafios ................................................... 52 2.3 Algumas situações-problemas .................................. 53 3. Considerações sobre o PNE 2014-2024 ................... 55 3.1 Desdobramentos ..................................................... 55 3.2 Fragilidades ............................................................ 59 3.3 Apoio dos entes federados ....................................... 59 3.4 Análise crítica .......................................................... 60 CONCLUSÃO ............................................................... 61 ELEMENTOS COMPLEMENTARES ................................... 62 REFERÊNCIAS ................................................................ 62 UNIDADE 4 – A EDUCAÇÃO E OS DIREITOS DAS CRIANÇAS E DOS ADOLESCENTES NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE INTRODUÇÃO .............................................................. 66 1. O Estatuto da Criança e do Adolescente ................... 66 1.1 Conceito de Estatuto da Criança e do Adolescente .... 67 1.1.1 Contrapondo o ECA aos Códigos de Menores ........ 68 1.2 Considerações sobre o conceito de criança e de adolescente ..................................................... 68 2. A educação e os direitos das crianças e dos adolescentes ........................................................... 70 2.1 Linhas gerais do Direito da Criança e do Adolescente .. 70 2.2 A educação e os direitos das crianças ....................... 71 2.3 A educação e os direitos dos adolescentes ................ 72 2.4 A Lei no 13.010/2014 ............................................. 73 3. A efetivação do direito à educação impulsionada pelo ECA: abordagens práticas ........................................ 74 3.1 O ECA e as políticas públicas .................................. 74 3.2 A relação entre os Conselhos Tutelares e as escolas ... 75 3.3 Um brevíssimo balanço ............................................ 77 CONCLUSÃO ............................................................... 78 ELEMENTOS COMPLEMENTARES ................................... 79 REFERÊNCIAS ................................................................ 79 Unidade 1 Objetivos de aprendizagem da unidade • Compreender as relações entre educação, Estado e sociedade • Conhecer como se organiza a educação brasileira, seus aspectos históricos, políticos, sociais, econômicos e educacionais • Comprender as diferenças entre escolas públicas e privadas, identificando os pontos positivos e negativos entre elas Professora Mestre Sílvia Cristina da Silva HISTóRICO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 8 INTRODUÇÃO Prezado(a) aluno(a), É com muita alegria que damos início aos nossos encontros baseados no relevante tema da educação. Esta primeira unidade pretende abordar conceitos, processos, princípios e direitos referentes às políticas educacionais no Brasil, oferecendo-nos substrato para aprofundar nosso estudo nas unidades seguintes. Com esse escopo, organizaremos o conteúdo da seguinte forma: o primeiro tópico versará sobre a análise das relações entre educação, Estado e sociedade, cujo objetivo é, portanto, encarar o conceito de cada um desses elementos, correlacionando-os com o atual contexto de vida em sociedade. O segundo tópico vai expor a organização da educação brasileira, descortinando brevemente seus aspectos históricos, políticos, sociais, econômicos e educacionais. Para tanto, vamos analisar a história da organização do sistema de ensino no país, bem como identificar o papel do Congresso Nacional naquilo que concerne às legislações educacionais.Trataremos também a respeito das figuras de centralização e descentralização no sistema educacional. O terceiro tópico da unidade desenvolverá as diferenças entre escolas públicas e privadas a fim de desnudar os pontos positivos e negativos entre elas. Bom estudo para todos nós! 1. EDUCAÇÃO, ESTADO E SOCIEDADE Educação tende a criar autonomia do ser educado Fonte: Pexels. 1.1 O conceito de educação Falar sobre educação é, sem dúvida, um dos temas mais recorrentes na vida das pessoas, seja para designar a experiência pessoal de cada um nos trilhos da alfabetização, para qualificar os modos de alguém (boa ou má educação), como fundamento para discutir o contexto político atual ou para separar níveis de escolaridade (educação infantil ou superior, por exemplo): Histórico das políticas educacionais no Brasil 9 Unidade 1 Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender - e - ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. (BRANDÃO, 2007, p. 4). Trata-se de uma terminologia corriqueira no seio social e, assim sendo, torna-se um assunto confortável para muitos expressarem suas convicções, mesmo as que sirvam apenas para reforçar o senso comum. Claramente, o nosso objetivo será o de transpor essa superficialidade que ronda as terminologias de aparente simplicidade e de uso cotidiano para defini-las metodologicamente com um certo rigor. Conforme a etimologia da palavra, educar “é modificar num sentido determinado, é conduzir de um estado para outro” (PLANCHARD, 1962, p. 10). Curiosamente, o autor explica que, em latim, educatio designa a cultura das plantas, o adestramento dos animais, a alimentação e a formação dos homens. Para se referir à formação humana, o termo institutio era o empregado. Foi tão somente no século XVI que educar passou a ser utilizado exclusivamente para humanos, no sentido restrito que conhecemos. Segundo Planchard (1962, p. 11-12), a educação é uma atividade sistemática exercida pelos adultos sobre as crianças e os adolescentes a fim de prepará-los para a vida em determinado meio. Entende que há fatores que podem contribuir nesse processo, alguns de controle exclusivo dos educadores e outros que fogem de sua ação direta – é o que ele chama de fatores hereditários. Por fim, salienta que a educação está restrita ao ser humano, implica a determinação de um objetivo e tende a criar a autonomia do ser educado. Caso contrário, estaríamos diante de um mero adestramento (PLANCHARD, 1962). Na esteira do pensamento de Jean Piaget, a educação está vinculada às trocas de informações vindas do meio externo e às interações do sujeito com esse exterior. O processo de aprendizagem se relaciona com as ações dos sujeitos perante os objetos do mundo, e daí deriva a construção do conhecimento. Extrapola a mera ideia de que o conhecimento seja hierarquizado, no sentido de ser transmitido de cima para baixo, e atribui o poder de organização do pensamento ao sujeito em sua constante ligação com o objeto. O autor também visualiza na educação um leque de possibilidades. Depreende-se, com base nele, que a educação objetiva a formação de pessoas desbravadoras, criativas, críticas e ativas na busca pelo saber e, por conseguinte, na construção da própria autonomia. Em suas palavras: O objetivo principal da educação é compor a razão intelectual e moral; como não se pode moldá-la de fora, a questão é encontrar o meio e os métodos convenientes para ajudar a criança a constituí-Ia ela mesma, isto é, alcançar no plano intelectual a coerência e a objetividade e no plano moral a reciprocidade. (PIAGET, 1985, p. 84-85). Notamos, por assim dizer, que uma gama de pensadores se dedicou a associar a educação com a ideia de autonomia, ou seja, como forma de autoafirmação e autodeterminação do ser, uma vez que muitas são as particularidades que devem ser levadas em conta para que a educação sirva à liberdade e não à opressão. Ademais, o sistema social abarca uma pluralidade de concepções de vida boa e de bem-estar social, considerando-se questões de raça, gênero, etnia e religião, entre outras, e deve ser um estímulo tanto para a manutenção dos traços culturais específicos, como um instrumento pacificador das diversidades existentes. É com este escopo que, finalmente, invocamos Paulo Freire, um dos autores mais relevantes sobre educação no país e no mundo, que propõe um entendimento de educação politizado, dinâmico Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 10 e libertador. Rompe com aquilo que intitula educação bancária, na qual os educadores depositariam dado conhecimento em seus alunos como se uma via de mão única houvesse quando se trata da transmissão do saber, afastando educadores e alunos, sujeitos e objetos (FREIRE, 1987). Segundo ele, “o conhecimento não é algo dado e acabado, mas um processo social que demanda ação transformadora dos seres humanos sobre o mundo” (FREIRE, 2003, p. 111). Nesse sentido, o estudo de Costa (2015, p. 85) sobre o autor nos ajuda ao sintetizar que: A definição geral de educação apresentada por Paulo Freire pode ser escrita com as seguintes palavras: educação é uma concepção filosófica e/ou científica acerca do conhecimento colocada em prática. A teoria do conhecimento freireana, por sua vez, pode ser sintetizada assim: o conhecimento é um processo social criado por meio da ação-reflexão transformadora dos humanos sobre a realidade. Já a definição específica de educação defendida por Paulo Freire pode ser expressa nos seguintes termos: educação é o processo constante de criação do conhecimento e de busca da transformação-reinvenção da realidade pela ação-reflexão humana. [...] a razão de ser da educação libertadora está no seu impulso inicial conciliador. Daí que tal forma de educação implique a superação da contradição educador-educandos, de tal maneira que se façam ambos, simultaneamente, educadores e educandos. Na concepção “bancária” que estamos criticando, para a qual a educação é o ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos, não se verifica nem pode verificar-se esta superação. Pelo contrário, refletindo a sociedade opressora, sendo dimensão da ‘cultura do silêncio’, a ‘educação’ ‘bancária’ mantém e estimula a contradição. Daí, então, que nela: a) o educador é o que educa; os educandos, os que são educados; b) o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem: c) o educador é o que pensa; os educandos, os pensados; d) o educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente; e) o educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados; f) o educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os que seguem a prescrição: g) o educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, na atuação do educador; h) o educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos nesta escolha, se acomodam a ele; i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele; j) o educador, finalmente, é o sujeito do processo: os educandos, meros objetos. Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que nada sabem, cabe àquele dar, entregar, levar, transmitir o seu saber aos segundos. Saber que deixa de ser de “experiência feito” para ser experiência narrada ou transmitida.”. Fonte: FREIRE (1996, p. 58-59). O condão político da educação também merece ser destacado. Conforme Freire esclarece ao longo de suas reflexões, a educação tradicional serve a um sistema social, econômico e ideológico determinado, que mantém o status quo. Observa-se que a educação domesticadora pretende ser instrumento de uma sociedade uniformizadora.A proposta do autor é que se persiga aquilo que chama de educação libertadora a fim de transformar as relações intersubjetivas entre os opressores e oprimidos. Embora entenda que não será somente por meio da educação que tal libertação ocorrerá, indica o papel indispensável dela nesse processo. A educação, portanto, deve irromper qualquer ditame preestabelecido a fim de fornecer aos sujeitos elementos suficientes para uma vida de qualidade e dentro daquilo que o ser entenda por Histórico das políticas educacionais no Brasil 11 Unidade 1 vida de qualidade. Em outras palavras, o indígena, por exemplo, deve ter acesso a uma educação que valorize sua história e cultura, assim como uma criança da cidade deve ter acesso ao conhecimento que lhe permita seguir os seus interesses atuais e futuros. O papel da educação será, então, o de atenuar as diferenças, sem, contudo, mitigá-las, hierarquizá-las ou mesmo exterminá-las. Nessa senda, o conceito de educação popular parece permitir que as mais diferentes pessoas se valham de uma educação libertadora sem abrir mão de suas particularidades. Podemos dizer, então, que: A educação popular é uma prática social. Melhor, é um domínio de convergência de práticas sociais que têm a ver, especificamente, com a questão do conhecimento. Com a questão da possibilidade da construção de um saber popular. Da apropriação, pelas classes populares, do seu próprio saber. Aquilo que é a fala e a lógica que traduzem a passagem de sujeitos e classes econômicos, para sujeitos e classes políticos (BRANDÃO, 1983, p. 52-53). Mais um excerto merece destaque, pois resume sistematicamente o que podemos entender como educação popular e quais devem ser suas características para alcançar a almejada autonomia. Nessa toada, Brandão (1983, p. 53) assevera que: 1) a educação popular é, em si mesma, um movimento de trabalho pedagógico que se dirige ao povo como um instrumento de conscientização, etc.; 2) a educação popular realiza-se como um trabalho pedagógico de convergência entre educadores e movimentos populares, detendo estes últimos a razão da prática e, os primeiros, uma prática de serviço, sem sentido em si mesma; 3) a educação popular é aquela que o próprio povo realiza, quando pensa o seu trabalho político — em qualquer nível ou modo em que ele seja realizado, de um grupo de mulheres a uma frente armada de luta — e constrói o seu próprio conhecimento. Neste último caso, a educação popular realiza-se independentemente da presença do educador erudito. Ele pode participar aportando, com o seu conhecimento, informações e interpretações que, a partir dos seus problemas colocados pelas e nas situações de trabalho popular, explicitam e fortalecem o saber popular. 1.2 O conceito de Estado à luz da educação Estado é mais um desses termos de uso tão recorrente que conceituá-lo torna-se uma tarefa longe de simples. Nas preciosas lições de Dalmo Dallari (1998, p. 44- 45), “Estado é a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território”. O autor explica que a noção de poder está implícita na ideia de soberania; a politicidade reside na “referência expressa ao bem comum, com a vinculação deste a um certo povo”; e a territorialidade é o parâmetro que limita a ação jurídica e política do Estado. Importa revelar que a roupagem do Estado será distinta conforme o modelo econômico a ser levado a cabo em dado momento histórico. Nesse ínterim reside a dicotomia entre Estado liberal e Estado social. Numa breve síntese, sabe-se que o Estado nasce com o Estado Absoluto, fruto do desenvolvimento de uma economia mercantil, a qual necessitava de uma base monetária comum. Refere-se à ruptura com o poder centralizador da Igreja e começa a dar os primeiros passos para a despersonificação do poder. O Estado liberal de direito passa a respeitar a separação dos poderes, o primado da lei e a proteção dos homens. O liberalismo, em linhas gerais, limitava a atuação do Estado à manutenção das instituições militares, policiais, educativas e judiciárias, permitindo que o restante se desdobrasse sob a lógica do capital (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 404). Essas características são decisivas para a definição das políticas públicas que determinado governo pretenderá executar. Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 12 No entendimento marxista, o Estado é uma “dedução lógica da valorização do capital” cujas funções decorrem dos conflitos entre as classes sociais e será seu papel presidir tais conflitos historicamente criados, seja gerando condições materiais de produção, seja salvaguardando um sistema geral de leis, seja regulamentando os conflitos entre trabalho assalariado e capital (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 404). Após as pautas sociais, calcadas nesse pensamento marxista do início do século XX, o Estado acabou por absorver funções que não necessariamente seguiam as lições do liberalismo clássico. Com isso, inaugurou-se um Estado que também se ocupa em garantir o bem-estar social, configurando o Estado do bem-estar social ou o Estado Providência ou um Estado chamado social-liberal. Nessa esteira, o Estado democrático de direito acabou por correlacionar as obrigações da Administração Pública aos diplomas legais existentes, essencialmente à constituição do país. Ou seja, mesmo que os Estados estejam revestidos pela ideologia liberal, ainda assim é sua função, em maior ou menor medida, efetivar, garantir e promover os direitos enunciados como fundamentais. Cumpre-nos ainda entender o conceito neoliberal e, por conseguinte, perceber suas heranças nas políticas atuais. O termo neoliberalismo emergiu nas décadas de 1930 e 1940 diante da recessão econômica decorrente da Segunda Grande Guerra e da quebra da Bolsa de Nova York. Reapareceu com força somente nas décadas de 1970 e 1980, com os governos de Margaret Thatcher, na Inglaterra, e de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, como uma resposta diversa à tendência imposta no pós-guerra diante do estado interventor para garantir democracia, soberania, justiça social, etc. (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2009, p. 97). Ganhou relevância mundial até os dias de hoje devido principalmente à adoção e à imposição dos organismos financeiros internacionais, como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial. O neoliberalismo é, então, a corrente doutrinária que se opõe à aquela mescla entre liberalismo e governos sociais (social-liberalismo), retomando as lições do liberalismo clássico, dentre elas a minimização do Estado, a economia com plena liberação das forças de mercado e a liberdade da iniciativa privada (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2009, p. 97). Trata-se da tentativa de promover um estado minimalista com três tarefas principais – policiamento, justiça e defesa nacional – que leve a cabo um projeto de desestatização, privatização e desqualificação dos serviços e das políticas públicas (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2009, p. 88). Resumidamente, para uma concepção social-liberal de educação a ênfase do Estado está na escola pública, laica, universal e obrigatória, ou seja, cunhada na democracia popular, almejando uma formação para a cidadania. Já segundo os ditames neoliberais, a ênfase se situa no ensino privado, com vistas à formação de uma elite intelectual que vise a atender às demandas de mercado, mediante um governo limitado, favorável às privatizações e às iniciativas privadas (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2009, p. 87). 1.3 Relacionando educação, Estado e sociedade A última tarefa deste tópico será a de correlacionar os conceitos estudados anteriormente, a fim de promover uma análise da conjuntura em que estamos inseridos e inseridas. Uma vez que a sociedade compreende cada indivíduo, observadas as suas singularidades, a educação, em seu processo de socialização, poderá acumular para uma vida comum pacífica e digna ou, por outro lado, ser um instrumento perigoso a favor da força dominante e homogeneizador. Emoutras palavras, a vida em sociedade poderá ser facilitada (ou dificultada) conforme o tipo de educação a que uma pessoa for submetida. Histórico das políticas educacionais no Brasil 13 Unidade 1 Sob outro prisma, entendendo o Estado como o locus de harmonização de conflitos, tensões e contradições na sociedade e sendo a forma mais poderosa de organização com o objetivo de regular a vida social (CERICATTO, 2011, p. 54), ele também será reflexo da educação a que a sua população tiver acesso. A bandeira da educação aparece como primeiro passo na resolução dos mais diversos conflitos sociais, embora, desde logo, como Paulo Freire já nos alertou, sozinha também não será capaz de solucionar tudo. Entretanto, quando falamos em um ambiente sustentável a pauta o correlaciona a uma educação ambiental; a luta pela igualdade de gênero perpassa um debate de educação antipatriarcal e não sexista; pleitear os direitos fundamentais ante as instituições de poder refletem uma educação cívica, etc. É nesse sentido que se propõe essa relação entre os conceitos: a vida, atualmente, faz-se em sociedade, a qual organiza-se dentro de um Estado. Contudo, o tipo de vida, a forma de viver sempre estará atrelada à educação de um povo, guardadas todas as peculiaridades dos indivíduos que o compõem. Cabe à sociedade fixar os objetivos da educação que ela fornece às gerações ascendentes. Aliás, é o que ela faz sempre de modo soberano, e de duas maneiras. Fixa-os inicialmente de uma forma espontânea por meio dos imperativos da linguagem, dos usos, da opinião, da família, das necessidades econômicas, etc., isto é, por intermédio das formas múltiplas da ação coletiva através das quais as sociedades se conservam e se transformam, plasmando cada nova geração no molde estático ou imóvel das gerações precedentes. A seguir, fixa-os de maneira reflexiva por meio dos órgãos do Estado ou das instituições particulares, consoante os tipos considerados de educação. [...] Por um lado, não é bastante fixar os objetivos para poder atingi-los, porque ainda resta examinar o problema dos meios [...]. (PIAGET, 1985, p. 10). Não obstante, os pensadores citados anteriormente se preocuparam em perseguir uma educação que liberte, calcada no respeito pelo outro e pela diversidade, a saber, uma educação sempre preocupada em construir sujeito, sujeitos de direito, muito mais do que meros receptores de informações. Uma educação que também elimine o analfabeto político. Sempre atentos ao fato de que a burocracia que envolve as políticas de educação, por melhor intencionadas que sejam, pode seguir caminhos diferentes do esperado pela sociedade e tornando-se vítimas de políticas de governo. Para além disso, compreendem que a educação extrapola o espaço da escola. O estado, territorialmente falando, torna-se o próprio local da educação. A política, por sua vez, será a matéria de interesse da educação. Por tudo, urge uma educação para a cidadania. Esse é mais um conceito que muito nos interessa, uma vez que a educação não deve ver nos seus interlocutores meros educandos; para além disso, trata- se de cidadãos. Para arrematar, então, vale trazer à lume, mais uma vez, os ensinamentos de Freire (1987, p. 25-30): [...] se faz necessário, neste exercício, relembrar que cidadão significa indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado e que cidadania tem que ver com a condição de cidadão, quer dizer, com o uso dos direitos e o direito de ter deveres de cidadão. [...] Que a alfabetização tem que ver com a identidade individual e de classe, que ela tem que ver com a formação da cidadania [...]. É preciso, porém, sabermos primeiro, que ela não é a alavanca de uma tal formação – ler e escrever não são suficientes para perfilar a plenitude da cidadania –, segundo, é necessário que a tornemos e a façamos como um ato político, jamais como um que fazer neutro. Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 14 2. A ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DIMENSÕES HISTóRICAS, POLÍTICAS, SOCIAIS, ECONÔMICAS E EDUCACIONAIS No Congresso Nacional, são votadas leis que impactam ensino no País Fonte: Wikipedia. 2.1 Histórico da organização do sistema de ensino no Brasil Dada a amplitude do conteúdo, nossa intenção, como já demonstrado, é dar uma pincelada em momentos históricos mais relevantes para que possamos oferecer um panorama geral de forma dinâmica e sucinta, mas sempre convidamos todas e todos a buscarem um aprofundamento nos temas propostos. Saviani (2004, p. 2) propõe que a periodização da história da escola pública no Brasil envolve duas etapas: os antecedentes e a história propriamente dita. A primeira engloba o período da pedagogia jesuítica (1549-1759); o das aulas régias no período pombalino (1759-1827); e o que conjuga diversas tentativas de responsabilizar o poder público pela educação (1827-1890). A segunda etapa surge com a implantação dos grupos escolares, em 1890. Desdobram-se os seguintes períodos: • 1890-1931: criação das escolas primárias com base no ideal do iluminismo republicano; • 1931-1961: regulamentação das escolas superiores, secundárias e primárias, em âmbito nacional, com base no modelo pedagógico renovador; • 1961-2001: regulamentação unificada da educação nacional em nível municipal, estadual e federal, na ordem pública e privada, segundo uma concepção produtivista de escola. O primeiro momento da educação no Brasil faz alusão à Companhia de Jesus, por meio da qual os jesuítas promoviam a catequização indígena. Não podemos nos furtar da reflexão sobre a violência dessa ocupação territorial, uma vez que a educação, nos moldes medievais europeus, serviu ao genocídio indígena e ao processo de aculturação, tristes legados que ocupam até hoje nossa organização social, principalmente no que diz respeito à educação. Somente com a reforma de Marquês de Pombal esse modelo foi afastado, e a partir de então a educação deveria servir aos interesses da Coroa portuguesa. Com a chegada da família real, vale lembrar que foram inauguradas academias militares e as primeiras universidades do país. Ao longo das décadas de 1920 e 1930, floresceram movimentos mais interessantes para a educação. Com a necessidade de mão de obra minimamente qualificada para operar máquinas no Histórico das políticas educacionais no Brasil 15 Unidade 1 momento de industrialização, um modelo de ensino voltado para o tecnicismo foi impulsionado em detrimento do estudo de línguas e artes, por exemplo. Referente aos anos 1920, podemos destacar o movimento dos escolanovistas, como uma crítica à escola tradicional e com vistas à universalização do acesso ao ensino (SALES, 2009). Nos anos 1930, no governo de Getúlio Vargas criou-se o Ministério da Educação e Saúde Pública e foram sancionados decretos para organizar as universidades e o ensino secundário. Somente na Constituição de 1934 ficou assegurado que a educação era direito de todos, mas com a Constituição de 1937, que inaugurou o Estado Novo, o texto maior retrocedeu e não mais dispôs aquilo. Sobre essa constituição, explicam Shiroma, Moraes e Evangelista (2002, p. 26) que: Demarcavam, enfim, os termos de uma política educacional que reconhecia o lugar e a finalidade da educação e da escola. Por um lado, lugar da ordenação moral e cívica, da obediência, do adestramento, da formação da cidadania e da força de trabalho necessárias à modernização administrada. Por outro, finalidade submissa aos desígnios do Estado, organismo político, econômico e, sobretudo, ético, expressão e forma “harmoniosa” da nação brasileira. Em 1946, com a Nova República, nova Carta Magna foi promulgada com traços mais democráticos e liberais, estabelecendo que o ensino primário era obrigatório e a educação, sim, direito de todos. Isso teve uma inspiração ideológica no documento, da década de 1930, denominado “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, que pleiteava,dentre outras coisas, uma política nacional de educação (GARCIA, 2009, p. 33). Quer conhecer um texto bastante interessante sobre a educação, mas que data de 1932? Então confira o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. O documento inspirou a política educacional de outrora e merece ser lido levando em conta a sua eventual aplicabilidade nos dias de hoje. Ele está disponível em: <http://www.histedbr.fe.unicamp.br/ revista/edicoes/22e/doc1_22e.pdf>. Fonte: Elaborado pela autora. Nos idos da década de 1950, Vargas voltou ao poder, época em que houve uma abertura para as teorias de Jean Piaget nas escolas brasileiras. O governo de Juscelino Kubitschek foi voltado para a industrialização, priorizando pouco a educação e incentivando, sobremaneira, o ensino técnico. Com base em Paulo Freire, em 1962 foram criados o Plano Nacional de Educação e o Programa Nacional de Alfabetização, com um viés de redemocratização da educação. Contudo, já logo em 1964, o país entrou em seu período mais sombrio, o da ditadura, desmantelando as propostas anteriores. Em linhas gerais, os governos militares investiram na modernização das universidades e expandiram o período obrigatório da Educação Básica. Contudo, as repressões violentas e as perseguições dentro dos ambientes acadêmicos – e em quaisquer outras instituições – marcaram um período lastimável para nossa política. Nos anos 1980 teve início o lento processo de redemocratização que culminou na Constituinte Federal (CF) de 1988, que buscava “resgatar uma dívida de exclusão do ensino, de educação, de oportunidade de conhecer e saber com a sociedade brasileira” (BARBOSA, 2012). O artigo 6º dispõe que: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988). Entramos, finalmente, no momento atual da educação no país. Vale ressaltar que para cada legislação educacional que estudarmos, seguiremos fazendo uma retomada histórica – esta foi apenas Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 16 uma linha do tempo para nos situarmos na complexidade que envolve a educação, uma vez que já nasceu no território nacional como forma de dominação e opressão. Para auxiliar você a ter uma visualização mais ampla do todo, segue uma cronologia esquematizada e resumida com algumas datas e respectivos acontecimentos relevantes para a história da educação no país. Fatos marcantes da história de educação no país Fonte: Elaborado pela autora. 1549 •Jesuítas no Brasil (ensino religioso /catequização) 1759 •Expulsão dos jesuítas por Marques de Pombal (ventos iluministas, contraposição à ideias religiosas 1808 •Família real no Brasil. Novas escolas para suprir as necessidades do governo português 1822 •Independência (elimina‐se o privilégio estatal, permitindo a iniciativa privada para a educação) 1824 •Primeira constituição 1827 •Lei das Escolas de primeiras Letras (foi a única lei geral sobre a educação pública até 1946) 1834 •Ensino Primário sob a jurisdição das províncias 1889 •Proclamação da república (proibição do ensino religioso nas escolas e educação descentralizada) 1891 •Constituição 1920 ‐30 •Industrialização e urbanização; expansão do ensino público 1934 •Constituição federal (exigência para elaborar as diretrizes da educação nacional e um plano nacional) 1937 •Estado novo ‐ Leis orgânicas do Ensino (Reforma Capanema) 1945 •Fim da ditadura Vargas 1946 •Constituição federal (é competência da união legislar sobre as diretrizes e bases das educação nacional) 1961 •Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 4.024 (Ensino primário; ensino médio (ginasial e colegial); ensino superior 1964 •Regime Militar 1967 •Constituição Federal (União é competente para legislar sobre diretrizes e bases da educação) (governo opta por organizar educação por leis específicas) 1968 •Lei n. 5540 /1968 (Reforma do Ensino Superior) 1971 •Lei 5692/ 1971 (Reforma do Ensino 1º e 2º graus) 1985 •Fim da ditadura 1988 •Promulgação da CF/88 1990 •ECA 1996 •Lei nº 9.394 LBD (educação básica e superior) Fonte: Elaborado pela autora. 2.2 O papel do Congresso Nacional na legislação educacional O Congresso Nacional é o órgão máximo do exercício do poder legislativo e adicionalmente possui a função fiscalizadora. É formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal (sistema bicameral). O Senado é composto por 81 senadores eleitos para mandatos de oito anos, e a cada quatro anos há uma renovação da representação dos senadores por estado de um terço e posteriormente de dois terços, alternadamente. A Câmara, por sua vez, se compõe de 513 deputados federais eleitos para o exercício político de quatro anos, que são os representantes do povo por meio do sistema proporcional, de acordo com a população de cada estado (os senadores representam os estados, como entes federados da nação, sendo eleitos três por unidade da Federação). Na esfera municipal, vale dizer, o Poder Legislativo é exercido pela Câmara de Vereadores, e no âmbito estadual, pela Assembleia Legislativa (câmara de deputados estaduais). Em ambas não existe a figura dos senadores, já que estes representam os entes federados. As Casas, como são conhecidos o Senado e a Câmara de Deputados, trabalham por períodos legislativos – o primeiro começa em 2 de fevereiro e termina em 7 de julho, e o segundo vai de 1º de agosto até 22 de dezembro. Pode haver sessões extraordinárias, fora desse período, se forem convocadas e a depender da pauta. O Poder Legislativo é um dos que compõe o todo da organização política ao lado do Poder Executivo e do Poder Judiciário, como classicamente definiu Montesquieu. A função original do Legislativo é a do estabelecimento de normas gerais e de aplicação erga omnes (mandatória a todos) dentro do território de um estado. Então, é sob a égide dele que os políticos gozam da prerrogativa de propor leis e dessa forma representar os interesses da população. Em outra perspectiva, cabe ao Legislativo fiscalizar o Poder Executivo e até mesmo julgar, em situações específicas, certas pessoas como o presidente da República e os outros membros do Poder Legislativo. Incluem-se como atribuições dele: Convocar plebiscitos; Elaborar o Plano Plurianual; Definir a Lei de Diretrizes Orçamentárias; Declarar estado de sítio; Autorizar referendos; 2001 •Lei 10.172 Plano Nacional de Educação ‐ vigência de 10 anos 2006 •Lei 11.274 (ensino fundamental com 9 anos de duração, a partir dos 6 anos) 2009 •EC 59 (educação básica obrigatória dos 4 aos 17 anos) 2014 •PNE 2014‐2024 2015 •Início da elaboração da Base Nacional Comum Curricular 2017 •Lei 13.415 ‐ alteração no currículo do Ensino Médio Histórico das políticas educacionais no Brasil 17 Unidade 1 2.2 O papel do Congresso Nacional na legislação educacional O Congresso Nacional é o órgão máximo do exercício do poder legislativo e adicionalmente possui a função fiscalizadora. É formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal (sistema bicameral). O Senado é composto por 81 senadores eleitos para mandatos de oito anos, e a cada quatro anos há uma renovação da representação dos senadores por estado de um terço e posteriormente de dois terços, alternadamente. A Câmara, por sua vez, se compõe de 513 deputados federais eleitos para o exercício político de quatro anos, que são os representantes do povo por meio do sistema proporcional, de acordo com a população de cada estado (os senadores representam os estados, como entes federados da nação, sendo eleitos três por unidade da Federação). Na esfera municipal, vale dizer, o Poder Legislativo é exercido pela Câmara de Vereadores, e no âmbito estadual, pela Assembleia Legislativa (câmara de deputados estaduais). Em ambas não existe a figura dos senadores,já que estes representam os entes federados. As Casas, como são conhecidos o Senado e a Câmara de Deputados, trabalham por períodos legislativos – o primeiro começa em 2 de fevereiro e termina em 7 de julho, e o segundo vai de 1º de agosto até 22 de dezembro. Pode haver sessões extraordinárias, fora desse período, se forem convocadas e a depender da pauta. O Poder Legislativo é um dos que compõe o todo da organização política ao lado do Poder Executivo e do Poder Judiciário, como classicamente definiu Montesquieu. A função original do Legislativo é a do estabelecimento de normas gerais e de aplicação erga omnes (mandatória a todos) dentro do território de um estado. Então, é sob a égide dele que os políticos gozam da prerrogativa de propor leis e dessa forma representar os interesses da população. Em outra perspectiva, cabe ao Legislativo fiscalizar o Poder Executivo e até mesmo julgar, em situações específicas, certas pessoas como o presidente da República e os outros membros do Poder Legislativo. Incluem-se como atribuições dele: • Convocar plebiscitos; • Elaborar o Plano Plurianual; • Definir a Lei de Diretrizes Orçamentárias; • Declarar estado de sítio; • Autorizar referendos; • Regular as tributações; • Conceder anistia. Ao Congresso Nacional recai a elaboração legislativa, que abrange leis naquilo que versa sobre a educação com a finalidade de obedecer às disposições do artigo 214 da Lei Maior, o qual transcrevemos a seguir: Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: I - erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III - melhoria da qualidade do ensino; IV - formação para o trabalho; Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 18 V - promoção humanística, científica e tecnológica do País; VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto. (BRASIL, 1988). 2.3 Centralização e descentralização no sistema educacional A descentralização é a distribuição de competências de uma para outra pessoa, física ou jurídica (DIPIETRO, 2004, p. 349). Podemos falar em descentralização administrativa e em descentralização política, conforme descrito a seguir. • Descentralização política – o ente descentralizado executa funções próprias, fundamentadas pela própria CF. “As atividades que exercem não constituem delegação ou concessão do governo central, pois delas são titulares de maneira originária.” (DIPIETRO, 2004, p. 350). • Descentralização administrativa – as funções dos tais entes descentralizados só passam a ter valor jurídico com a anuência do ente central. Ocorrem quando o Estado unitário estabelece relações de subordinação com pessoas jurídicas locais. Quando se refere à centralização, o Estado estará atuando diretamente, se valendo de seus órgãos, fruto de meras repartições internas – desconcentrações –, mas que dele não distinguem. Situação diversa é a figura da descentralização, pois nela o Estado atua indiretamente ao utilizar “parcelas personalizadas da totalidade do aparelho administrativo estatal” (MELLO, 2009, p. 150). Os conceitos de desconcentração e descentralização não se confundem, porque o primeiro reflete o fenômeno de distribuir internamente competências decisórias – é o caso do Ministério da Educação, por exemplo –, ao passo que no segundo entram em cena pessoas jurídicas diferentes. A esse respeito, merece atenção o que ensina Mello (2009, p. 151): “Descentralização e desconcentração são conceitos claramente distintos. A descentralização pressupõe pessoas jurídicas diversas: aquela que originariamente tem ou teria titulação sobre certa atividade e aqueloutra ou aqueloutras às quais foi atribuído o desempenho das atividades em causa. A desconcentração está sempre referida a uma pessoa só, pois cogita-se da distribuição de competências na intimidade dela, mantendo-se, pois, o liame unificador da hierarquia. Pela descentralização rompe-se uma unidade personalizada e não há vínculo hierárquico entre Administração Central e a pessoa estatal descentralizada. Assim, a segunda não é ‘subordinada’ à primeira.”. Fonte: Elaborado pela autora. A gestão da máquina pública definitivamente não é tarefa simples, por isso as diferentes instâncias do Estado precisam se orquestrar para elaborar, votar, aplicar, avaliar ou mesmo suspender políticas públicas. É com esse escopo, portanto, que os conceitos acima demonstrados são aplicados em matéria educacional. Afinal, como fazer com que a educação atinja a todos cidadãos do Brasil? A centralização do poder, nesse caso, seria causadora de mais exclusões. Logo, com o fito de democratizar o processo de tomada de decisões e de garantir a eficácia social do direito à educação, a descentralização vem à tona. Histórico das políticas educacionais no Brasil 19 Unidade 1 Sobre os princípios de centralização e descentralização em matéria educacional, Garcia (2009, p. 20-23) já afirma que a opção por políticas centralizadoras ou descentralizadoras se correlaciona com o modelo de Estado que se almeja consolidar (liberal, autoritário, neoliberal), convergindo com a responsabilidade que o governo demonstrará na manutenção do serviço. Para Casassus (apud GARCIA, 2009, p. 10-21), Estado centralizador remonta à ideia de unidade, já “descentro” relaciona-se à diversidade. O autor procura demonstrar que cada governo apresentará razões/interesses específicos ao abdicar de sua centralização, pois sempre será uma estratégia de simultaneamente fortalecer o poder central. Descentralização e desconcentração não são um fim em si mesmo, mas processos instrumentais de obtenção de êxito na área política, econômica, técnico-pedagógica e administrativa. De uma política de descentralização espera-se que, por intermédio destes processos instrumentais, seja alcançada no plano político, maior participação e mais democracia; no plano econômico, a expectativa é de mais recursos; melhor qualidade, no técnico-pedagógico; e no plano administrativo, maior eficiência nos processos educacionais (CASASSUS, 1990, apud GARCIA, 2009, p. 21). Existem três modalidade de descentralização educacional: • Regionalização – com o objetivo de transcender as desigualdades, tem a intenção de oferecer oportunidades iguais de acesso à educação e garantir a permanência no ensino; • Municipalização – fomenta a participação das prefeituras e da sociedade civil nos mais diversos aspectos, desde matérias de financiamento até a administração dos recursos; • Nuclearização – é a transferência da responsabilidade administrativa e das decisões político- administrativas para órgãos representativos da sociedade, como por exemplo associações. A Constituição brasileira de 1988 adota um complexo sistema de repartição de competências em busca de garantir o equilíbrio federativo, de forma que questões mais amplas fiquem sob o respaldo da União, questões regionais para os estados, e os assuntos de interesse local sejam de competência municipal. Por mais complicado que seja separar os interesses, a CF/88 encarou tal missão, definindo as competências da União (art. 21 e 22), das que poderão ser delegadas (art. 22, parágrafo único), áreas de competência comum com atuações paralelas de cada um dos entes federados (art. 23) e ainda setores de competência concorrente em que o Estado estabelece políticas gerais e os estados e municípios ficam com a competência suplementar. Alguns artigos merecem nossa atenção, como os que se destacam abaixo: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...] XXIV - diretrizes ebases da educação nacional. [...] Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação. [...] Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: [...] IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação; § 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. § 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 20 § 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. [...] Art. 30. Compete aos Municípios: [...] VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental. (BRASIL, 1988). Para além destes, a CF/88 dispõe dos artigos 205 ao 214 as obrigações referentes à educação ao declarar que é direito de todos e dever do Estado (e da família) promovê-la, elevando-a à categoria de serviço público essencial. Na unidade seguinte, trabalharemos detidamente a abordagem constitucional sobre a educação. 3. ESCOLAS PÚBLICAS E PRIVADAS NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA Educação pública de qualidade é desafio a ser vencido Fonte: Visualhunt. 3.1 Escola pública A escola pública no Brasil surgiu para obedecer a interesses específicos dos colonizadores europeus e se institucionalizou, primeiramente, para oferecer a educação em caráter de privilégio para uma elite específica. A educação, em termos europeus, na verdade só ganhou certa relevância quando a burguesia, já instalada no poder, percebeu sua importância para garantir o pleno desenvolvimento industrial e como ela serviria para a manutenção do mesmo poder, fruto da Revolução Francesa. Vale dizer que foi a própria burguesia que pugnou por uma escola pública: Histórico das políticas educacionais no Brasil 21 Unidade 1 a burguesia organiza uma ação mais efetiva do Estado, através de criação de escolas públicas para todos os níveis e programas de assistência material, alimentar e médico, criam-se ainda programas de bolsa de estudo, subsídios e empréstimos para que os alunos “carentes” tenham acesso ao estudo. Dentro desta ótica, o homem revolucionário do século XVIII terá pouca consistência moral. O ideário liberal o forjará romanticamente, mas agora, para colocá-lo a serviço da civilização burguesa, com o intuito de conquistar novos mercados. Esse enfoque romântico, dado pela educação liberal, é uma maneira de suavizar a fúria e a voracidade do homem burguês na busca do lucro. (SILVA, 2007, p. 31). No Brasil, o processo não foi diferente. Somente em meados do século XX que a educação recebeu algum destaque, e justamente obedecendo ao interesse pátrio em se modernizar, desde logo, com ênfase ao ensino tecnicista. A escola pública brasileira, portanto, é formada pela Educação Infantil, pelo Ensino Fundamental obrigatório de nove anos e pelo Ensino Médio. Completa o ciclo da educação no Brasil o Ensino Superior. Existem também as modalidades da educação no Brasil, como Educação de Jovens e Adultos (EJA), Educação Especial e Educação Profissionalizante. 3.2 Escola privada É constitucionalmente prevista a livre iniciativa em matéria de educação, desde que obedecidas as determinações nacionais sobre o assunto, como demonstra a literalidade do artigo 209: O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação de qualidade pelo poder público. (BRASIL, 1988). Em face da lógica do mercado e dos princípios do capitalismo de transformar tudo em mercadoria, a educação acaba por ser mais uma manifestação da política neoliberal. O Brasil é um país que possui uma pluralidade de níveis e modalidades educacionais. Sendo assim, a oferta desses serviços encosta nos interesses dos empreendimentos privados. Por mais que haja uma confluência de despesas de todos os entes da Federação em prol da educação, como sabemos, ainda não é suficiente. Por isso, surgem cada vez mais escolas privadas, de todos os níveis. A escola privada é o exercício cidadão da liberdade de ensinar e da liberdade de aprender: as liberdades de aprender e de ensinar (das pessoas) traduzem-se na liberdade de escola, criada e definida pelas pessoas que são titulares dessas liberdades, isto é, na liberdade de escola privada [...] liberdade de escola atribuída aos próprios titulares da liberdade de ensinar e de aprender, isto é, às pessoas e às famílias (em primeiro lugar), e depois às diversas instâncias privadas da sociedade civil (expressão da liberdade e da sociabilidade pessoal); logo, liberdade de escola privada. (PINTO, 1993, p. 767). 3.3 Aspectos positivos e negativos entre a escola pública e privada na educação do Brasil A dicotomia entre escola pública e a escola privada vem de longa data e segue tanto argumentos de cunho econômico como ideológico. No sentido econômico, já procuramos demonstrar como determinada concepção de Estado e economia atingem diretamente as políticas públicas sociais voltadas para a educação. Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 22 A atual conjuntura política do Brasil demonstra a sequência dada a um projeto neoliberal de educação, contudo atrelado aos avanços jurídicos da Constituição de 1988. Vale salientar que conquistas jurídicas podem ter pouco, ou quase nenhuma, aplicabilidade social se não houver algum esforço em concretizá-las. Embora o Estado não questione o seu papel como irradiador da educação, a máquina pública segue lançando mão tanto da descentralização em matérias educacionais – tanto é que os munícipios gozam de grande parte da responsabilidade no assunto – como das escolas privadas, que passam a atender à parcela da população que não usufrui da educação pública, essencialmente nos ensinos fundamental e médio. A lógica da educação no país segue com o investimento do governo nas universidades públicas, relegando os níveis inferiores. Com isso, baseando-se no critério econômico, a educação, sistematizada como está, exclui por duas vezes: não dá acesso às pessoas com baixa renda a uma educação de qualidade nas primeiras fases de sua educação; depois as deixa sem acesso ao ensino superior público e gratuito, pois não conseguem concorrer em pé de igualdade com aqueles que tiveram sua formação inicial no ensino privado. Para que a educação pública brasileira atinja patamares de qualidade e atenda às necessidades dos alunos e da sociedade, há que haver uma convergência de esforços e iniciativas. É o que defende a diretora do Instituto Crescer, Luciana Allan, no artigo “Como alcançar uma educação pública de qualidade?”. Ela utiliza o termo “ecossistema educacional” para identificar que esse é um desafio que envolve diversos atores e instâncias. Confira o texto, no qual a autora identifica dez pistas consideradas por ela como essenciais para dar conta dessa tarefa. O material está disponível em: <https://exame.abril.com.br/ blog/crescer-em-rede/como-alcancar-uma-educacao-publica-de-qualidade/>. Fonte: Elaborado pela autora. Famosas medidas tentam mitigar essa problemática no ensino superior público e privado: cotas raciais e sociais, PROUNI, REUNI, FIES e outras medidas de financiamento estudantil. Por tudo, no que toca ao aspecto econômico, apenas a parte da população que detenha mínimas condições financeiras pode escolher entre uma educação básica pública ou privada. No mais, inexistindo o caráter pecuniário, o restante fica à mercê da qualidade da educação pública a que tiver acesso. Sob o prisma ideológico, o giro proposto pelo neoliberalismo, em décadaspassadas, para fomentar a escola privada em detrimento da pública foi o de que a escola pública estaria atrelada ao Estado, sendo impossível variar a opção pedagógica, acabando por ferir a liberdade de aprendizado das pessoas. Outro ponto colocado como favorável nas escolas privadas era o de que a escola pública se vincularia a um estado, dito neutro, e, por sua vez, também ofereceria uma educação neutra, a qual, na verdade, poderia esconder uma intenção doutrinadora do conhecimento. O exercício da tal liberdade de aprender e ensinar só seria exercido no seio da escola privada, pois a burocratização da pública a impediria de buscar esse ideal. Histórico das políticas educacionais no Brasil 23 Unidade 1 É sempre de bom tom pontuar que os argumentos escondem uma intenção política de privatizar e afastar do Estado algumas funções, contudo, vale a reflexão posta. Tenho dito várias vezes mas não é mau repetir agora que não foi a educação burguesa a que criou a burguesia mas a burguesia que, emergindo, conquistou sua hegemonia e, derrocando a aristocracia, sistematizou ou começou a sistematizar sua educação que, na verdade, vinha se gerando na luta da burguesia pelo poder. A escola burguesa teria de ter, necessariamente, como tarefa precípua dar sustentação ao poder burguês. Não há como negar que esta é a tarefa que as classes dominantes de qualquer sociedade burguesa esperam de suas escolas e de seus professores. É verdade. Não pode haver dúvida em torno disto. Mas, o outro lado da questão está em que o papel da escola não termina ou se esgota aí. Este é um pedaço apenas da verdade. Há outra tarefa a ser cumprida na escola apesar do poder dominante e por causa dele – a de desopacizar a realidade enevoada pela ideologia dominante. (FREIRE, 1987, p. 28). A conjuntura atual do país não é, todavia, de fácil análise, uma vez que a educação precisa resolver, via de regra, dentro das escolas, muitos outros problemas sociais. Com efeito, a escola precisa resolver a questão da fome de seus alunos; da falta de material; da violência sofrida em casa e dentro da escola entre os próprios alunos e entre alunos e professores. Deve enfrentar também o desafio das drogas, da criminalidade, da dependência, etc. São diversas as situações que compreendem o grande tema da educação, afinal é basicamente impossível realizar um único direito social, sem pensar em todo um conjunto de condições que permitam a vida digna dos cidadãos que serão educados. CONCLUSÃO Diante de todo o conteúdo tratado na unidade, trabalhamos com conceitos mais amplos e genéricos que serviram para introduzir os grandes temas da disciplina das políticas educacionais. No primeiro tópico foram percorridos os conceitos de educação e de Estado. Entendendo a educação como um processo de socialização entre o indivíduo e a sociedade e como ferramenta para a autoafirmação do ser, sua promoção é ao mesmo tempo forma de promover a cidadania, caminho único para se fortalecer a democracia brasileira e pontapé inicial para expurgar as mazelas sociais do país. No segundo tópico expusemos um breve histórico da implementação de um sistema educacional no país e das legislações educacionais até chegar nos dias atuais. Além disso, explicamos o funcionamento do Poder Legislativo em âmbito nacional, por meio da atuação do Senado e da Câmara dos Deputados, ou seja, por meio do Congresso Nacional. Por último, foram aplicados os princípios de centralização e descentralização em termos de políticas educacionais, descortinando os artigos da Constituição Federal que demonstram matérias de competência exclusiva da União e outros em que esta delega ou concorre com os estados e municípios. O terceiro tópico conceituou a escola pública e a escola privada, demonstrando características de cada uma delas, delineando seus aspectos positivos e negativos. Cumprida essa temática inicial, estamos preparados para seguir nos aprofundando sobre a educação no Brasil. Ainda temos muito mais a conversar sobre esse tema. Unidade 1 Histórico das políticas educacionais no Brasil 24 ELEMENTOS COMPLEMENTARES #LIVRO# Título: Eu sou Malala Autoras: Christina Lamb / Malala Yousafzai Editora: Companhia das Letras Sinopse: Quando o Talibã tomou controle do vale do Swat, uma menina levantou a voz. Malala Yousafzai recusou-se a permanecer em silêncio e lutou pelo seu direito à educação. Mas em 9 de outubro de 2012, uma terça-feira, ela quase pagou o preço com a vida. Malala foi atingida na cabeça por um tiro à queima-roupa dentro do ônibus no qual voltava da escola. Poucos acreditaram que ela sobreviveria. Mas a recuperação milagrosa de Malala a levou em uma viagem extraordinária de um vale remoto no norte do Paquistão para as salas das Nações Unidas em Nova York. Aos dezesseis anos, ela se tornou um símbolo global de protesto pacífico e a candidata mais jovem da história a receber o Prêmio Nobel da Paz. Eu sou Malala, escrito em parceria com a jornalista britânica Christina Lamb, é a história de uma família exilada pelo terrorismo global, da luta pelo direito à educação feminina e dos obstáculos à valorização da mulher em uma sociedade que valoriza filhos homens. O livro acompanha a infância da garota no Paquistão, os primeiros anos de vida escolar, as asperezas da vida numa região marcada pela desigualdade social, as belezas do deserto e as trevas da vida sob o Talibã. REFERÊNCIAS ALLAN, Luciana. Como alcançar uma educação pública de qualidade. Exame, 9 mar. 2017. Disponível em: <https://exame.abril.com.br/blog/crescer-em-rede/como-alcancar-uma-educacao-publica-de- qualidade/>. 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Unidade 2 Objetivos de aprendizagem da unidade • Definir Constituição Federal e seus princípios, especialmente os que envolvem a educação • Conhecer a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) • Identificar as mais importantes leis referentes à educação • Conhecer a trajetória da legislação educacional e as mudanças na obrigatoriedade escolar de 1961 até hoje Professora Mestre Sílvia Cristina da Silva OrgaNIzaçãO Da EDuCaçãO BraSILEIra a PartIr DO EStuDO DOS artIgOS Da CONStItuIçãO FEDEraL DE 1988, Da LEI DE DIrEtrIzES E BaSES Da EDuCaçãO NaCIONaL E DaS LEIS COMPLEMENtarES Da EDuCaçãO Organização da educação brasileira a partir do estudo dos artigos da Constituição Federal de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e das leis complementares da educação 27 Unidade 2 INtrODuçãO Bem-vindo(a), caro(a) aluno(a), a mais uma unidade sobre a educação nacional! Pretendemos descortinar a viagem histórica do direito à educação nas diversas constituições brasileiras a fim de chegarmos à atual disposição sobre o assunto, seja no que concerne à própria Constituição Federal, seja naquilo que dispõe a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e perpassando alguns diplomas legais diversos para assim compreendermos, de forma geral, a organização da educação no país. Para atingir tal objetivo, o primeiro tópico versará sobre a Constituição Federal. Você consegue definir constituição? É a legislação basilar do sistema democrático de direito, contudo, nem todos sabem realmente dizer em que ela consiste. Assim, almejamos conceituar esse termo, explicar o que são princípios constitucionais e, detidamente, enfrentaremos os princípios que envolvem a educação em si. Para além disso, serão analisados os artigos sobre educação em cada uma das constituições brasileiras. No segundo tópico, nosso encontro será com a Lei nº. 9.394/1996, um dos diplomas mais importantes para a organização da educação pátria, conhecida como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A princípio será apontado o histórico dela, seguido pela exposição de seus ditames mais importantes e finalmente serão ilustradas as maiores mudanças inauguradas pela lei. Ao terceiro e derradeiro tópico da unidade fica a incumbência de elencar algumas das mais importantes leis referentes à educação de ordem infraconstitucional e fazer um breve apanhado histórico sobre a legislação educacional e as mudanças na obrigatoriedade escolar de 1961 até o presente momento. Um excelente percurso a todos! Unidade 2 Organização da educação brasileira a partir do estudo dos artigos da Constituição Federal de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e das leis complementares da educação 28 1. CONStItuIçãO FEDEratIVa DO BraSIL (1988) Constituição Federal, a lei maior do país Fonte: IPERGS ([s.d.]). 1.1 Conceito de constituição A constituição é o diploma principal dos ordenamentos jurídicos atuais do qual se desdobram todas as outras leis. Trata-se da “lei fundamental e suprema de um Estado, contendo normas e princípios relativos à estruturação do Estado, à forma de Estado, à forma e sistema de governo, ao modo de aquisição e exercício do poder, aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana” (RUSSO, 2010, p. 24). A constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria, então, a organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado. (SILVA, 2005, p. 37-38). A terminologia, ao longo dos tempos, tem sido tomada por diversas acepções, como vários autores já sistematizaram. Em outras palavras, constituição pode ser conceituada segundo um sentido sociológico, político, formal ou material, jurídico ou cultural (LENZA, 2012, p. 73-77): a) sentido sociológico – é o sentido defendido por Ferdinand Lassale, cuja teoria é conhecida por asseverar que a constituição será apenas uma folha de papel, caso não tenha um efetivo poder social. b) sentido político – Carl Schmitt distingue a constituição das leis constitucionais: a primeira refere-se à decisão política fundamental – ou seja, a estrutura e órgãos do Estado, direitos individuais, a democracia em si –, ao passo que as leis correspondem aos demais dispositivos. Logo, a constituição acaba por ser fruto de uma decisão política do titular do poder constituinte. c) sentido formal ou material – ainda na esteira do autor supracitado, materialmente falando, o que importa para definir se uma norma possui caráter constitucional ou não é o seu conteúdo. Então, questões que envolvam a estrutura da sociedade, bem como seus alicerces fundamentais, serão normas materialmente constitucionais. Para Schmitt, seria Organização da educação brasileira a partir do estudo dos artigos da Constituição Federal de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e das leis complementares da educação 29 Unidade 2 isso a constituição em si. Por outro lado, formalmente falando, o que passa a ser relevante não é seu conteúdo, mas a forma com que uma norma entra no ordenamento jurídico. «As normas constitucionais serão aquelas introduzidas pelo poder soberano, por meio de um processo legislativo mais dificultoso, diferenciado e mais solene do que o processo legislativo de formação das demais normas do ordenamento» (LENZA, 2012, p. 74). d) sentido jurídico – reflete o entendimento de Hans Kelsen, segundo o qual a constituição habita o mundo do dever ser, e não o do ser, entendendo-a como resultado da vontade racional do homem, e acaba por consagrar a verticalidade hierárquica das normas, sendo constitucional o vértice da pirâmide normativa, a qual oferecerá validade a todo resto do ordenamento. e) Sentido cultural – é o entendimento de que a constituição é fruto de um fato cultural, produto da sociedade. Um adendo merece ser feito a respeito da explicação de Canotilho (2015,p. 88-89) de que, conforme dispõe o artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, a constituição tem como referente a sociedade – sendo assim uma constituição da sociedade –, por isso diz-se que ela é um corpo jurídico aplicável a um corpo social. Logo, a expressão constituição da República exprime a ideia de que a constituição não se refere só ao Estado, mas à comunidade política como um todo (à res publica). Somente no século XIX ocorreu essa alteração para a constituição do Estado. Indo um pouco mais além, Lenza (2012) assevera serem três os fatores que explicam essa mudança: • o fato de nos processos constituintes americano e francês a constituição passar, de fato, a “constituir” a ideia tanto dos EUA como do Estado-nação francês; • o Estado liberal cunhar cada vez mais a diferença entre Estado e sociedade; • o entendimento de constituição como ordem, herança germânica. Esta passa a ser a ordem do Estado e com isso surge uma questão filosófica-política na qual o Estado seria o ordenador da sociedade, ao passo que a constituição seria apenas a lei. Na sequência do nosso estudo, é importante caracterizar as constituições, por isso vamos à suas classificações. Elas podem ser divididas, quanto ao seu conteúdo, em materiais e formais; quanto à sua forma, em escritas e não escritas/costumeiras; quanto ao seu modo de elaboração, em dogmáticas ou históricas; quanto à sua origem, em promulgadas e outorgadas; quanto à estabilidade, em imutáveis, rígidas, flexíveis ou semirrígidas; e quanto à extensão, em sintéticas ou analíticas. Agora nos resta, então, entender cada uma dessas qualificações. Um conjunto de normas será materialmente constitucional quando dispuser acerca da estrutura do Estado e seus poderes, bem como estabelecer os direitos fundamentais. Por outro lado, um conjunto de normas será formalmente constitucional quando for fixado pelo poder constituinte, independentemente do teor das normas. A codificação do direito na seara constitucional poderá se dar pelos diplomas escritos, como habitualmente se acostumou. Mas também existem normas constitucionais baseadas nos costumes, na jurisprudência e em determinadas leis escritas (por exemplo, a Constituição do Reino Unido). Sobre o modo de elaboração, serão dogmáticas aquelas que exprimirem o resultado de uma sistematização por meio de um órgão constituinte com base na teoria política e no direito de uma época específica. A elaboração histórica é fruto de lentas e constantes mudanças na organização social de determinado povo. Unidade 2 Organização da educação brasileira a partir do estudo dos artigos da Constituição Federal de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e das leis complementares da educação 30 Originariamente, uma constituição poderá ser promulgada, ou seja, derivada da vontade popular (diretamente ou por intermédio de seus representantes), ou, ainda, outorgada, quando imposta arbitrariamente por uma pessoa ou um grupo. No que tange à estabilidade: i) imutáveis são os diplomas que não preveem qualquer forma de alteração do próprio texto; ii) rígidos são os textos constitucionais que determinam especificamente um procedimento solene e mais complexo para alterar seu teor; iii) flexíveis são, via de regra, as constituições não escritas, que se valem do processo legislativo, como se fosse qualquer outra norma, para promover mudanças; iv) semirrígidas correspondem a um sistema misto em que para algumas normas requer-se o procedimento solene e complexo, ao passo que para outras o legislativo ordinário poderá dar sequência na alteração. Ainda nesse ponto, vale salientar a existência das chamadas cláusulas pétreas na CF de 1988, expostas no art. 60, parágrafo 4º, que são matérias que não podem ser suprimidas, nem por emenda à Constituição, a saber: Artigo 60 § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. (BRASIL, 1988). Finalmente, no que diz respeito à extensão, podemos dizer que uma constituição é sintética se o poder constituinte optar por um diploma resumido e simplificado; todavia, se o poder constituinte almejar um regulamento detalhado das matérias mais importantes para a estrutura do Estado, estaremos diante de uma constituição analítica. A Constituição brasileira é formal, escrita, dogmática, promulgada (democrática ou popular), rígida (mas também com um núcleo super-rígido, composto pelas cláusulas pétreas) e analítica. Fonte: Elaborado pela autora. Quanto aos seus elementos (SILVA, 2005, p. 44-45), podemos elencar os seguintes: orgânicos – que estabelecem os órgãos e as estruturas do Estado; limitativos – responsáveis por impor restrições aos poderes estatais e assegurar garantias aos indivíduos; socioideológicos – que delineiam responsabilidades ante os direitos sociais; de estabilização constitucional – que configuram os instrumentos para manter a ordem e prescrevem medidas para situações de crise; e formais de aplicabilidade – que designam de que maneira a própria constituição deve ser aplicada. Por tudo, a constituição é a ordem jurídica fundamental do Estado (CANOTILHO, 2015, p. 1435). 1.2 Princípios constitucionais da educação Por mais que seja uma discussão bastante extensa na seara jurídica o que são os princípios e quais suas diferenças entre as leis ou normas jurídicas, daremos uma pincelada no tema para nos situarmos. Antes de mais nada, lei e norma são sinônimos? A resposta é não, pelo menos para a doutrina jurídica, embora na linguagem comum assim sejam utilizados. Organização da educação brasileira a partir do estudo dos artigos da Constituição Federal de 1988, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e das leis complementares da educação 31 Unidade 2 [...] é preciso evitar a confusão entre lei e norma. A norma é uma prescrição. A lei é a forma de que se reveste a norma ou o conjunto de normas dentro do ordenamento. Nesse sentido, a lei é a fonte do direito, isto é, o revestimento estrutural da norma que lhe dá a condição de norma jurídica. (FERRAZ JR., 2003, p. 233). Exemplifica ainda o autor: Por exemplo, uma prescrição que determina: “o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato” pode ser uma cláusula de uma proposta oferecida pelo corretor de seguros ao cliente ou pode vir prescrita em lei (ver artigo 768 do Código Civil de 2002: “O segurado perderá direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato”). No primeiro caso, a prescrição não é lei, é apenas um enunciado prescritivo que faz parte de um negócio que está sendo discutido. No segundo caso, a prescrição tem caráter de norma jurídica legal e esse caráter deriva do revestimento na forma da lei. (FERRAZ JR., 2003, p. 233). Ainda nas lições de Ferraz Jr. (2003, p. 233), o termo revestimento implica que a norma será formada conforme uma série de procedimentos que visam a uma promulgação solene e oficial, ao passo que a lei tem o “condão mágico de transformar a mera prescrição em direito”. Nesse debate mais uma figura nos interessa: os princípios. Estes diferenciam-se das normas e leis por representarem textos mais abertos, flexíveis e genéricos, e indicam uma forma de agir para o aplicador do direito. Trata-se de enunciados com maior teor de abstração e têm a possibilidade de incidir em uma pluralidade de situações (BARROSO; BARCELOS, 2008, p. 337). Desse modo, vale dizer que a constituição passa a ser “um sistema aberto de princípios e regras, permeável a valores jurídicos suprapositivos, no qual as ideias de justiça e de realização dos direitos fundamentais desempenham um papel central” (BARROSO; BARCELOS, 2008, p. 338). Resumidamente, podemos dizer que os princípios “contêm relatos com maior grau de abstração, não especificam a conduta a ser
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