Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV OBJETIVOS 1- Descrever a hanseníase considerado o ciclo evolutivo, história da doença, tratamento, complicações e sequelas. 2- Relacionar o padrão de resposta imunológica e os padrões da doença. (Th1 e Th2) REFERÊNCIAS • Clínica Médica da USP. Vol 7. 2 ed. • Ministério da Saúde; Guia prático sobre a hanseníase, 2017 • Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico – Hanseníase, 2021 • Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Boletim epidemiológico - Hanseníase em Minas Gerais, 2021 • Organização Mundial da Saúde. Diretrizes para o diagnóstico, tratamento e prevenção da hanseníase, 2019. • FOSS, N. T. Aspectos imunológicos da hanseníase. Medicina (Ribeirão Preto), [S. l.], v. 30, n. 3, p. 335-339, 1997. CONCEITO A hanseníase é doença infectocontagiosa, de evolução lenta, transmissível e de caráter crônico, que acomete principalmente os nervos periféricos e a pele (sinais e sintomas dermatoneurológicos). Pode gerar incapacidades físicas e deformidades se não for tratada na fase inicial. É considerada uma doença com potencial incapacitante quando não tratada, então é de notificação compulsória e, mesmo sendo tratável, gera um impacto psicossocial, pelos preconceitos O curso da doença é lento, podendo levar anos até que haja manifestação clínica, sendo por isso considerada uma doença infecciosa crônica. Quando ocorre a manifestação clínica, há o aparecimento de sinais e sintomas dermatoneurológicos, que são lesões na pele e nos nervos periféricos. Se não tratada na forma inicial, a doença quase sempre evolui, torna-se transmissível e pode atingir pessoas de qualquer sexo ou idade, inclusive crianças e idosos. A hanseníase é considerada doença tropical negligenciada por persistir endêmica, quase exclusivamente em populações em condição de pobreza nos países em desenvolvimento, mesmo após a introdução de tratamento eficaz e gratuito há mais de 3 décadas. BREVE HISTÓRICO A hanseníase é conhecida desde os tempos bíblicos, existindo relatos da doença em tomo de 600 a.C. na China, na Índia e no Egito. Acredita-se que tenha sido introduzida na Europa, trazida da Índia, pelas tropas de Alexandre, o Grande, em 300 a.C. e, nas Américas, durante o processo de colonização e tráfico de escravos africanos. A denominação hanseníase é uma homenagem ao médico norueguês Gerhard Armauer Hansen, que identificou, em 1873, o bacilo Mycobacterium leprae como o causador da doença. No Brasil, os primeiros casos foram notificados no final do século XVII, na cidade do Rio de Janeiro. A principal estratégia adotada para a profilaxia da hanseníase no passado foi o isolamento compulsório do doente em leprosários, instituído no Brasil em 1923. Com a introdução da sulfona na década de 1940 e sua adoção na terapêutica da hanseníase por constatar-se eficaz, o isolamento deixou de ser obrigatório, mas somente foi extinto oficialmente em 1962. Obs: Em virtude do alto estigma associado à doença, em 29 de março de 1995, pela Lei Federal “ISSO PEGA?” Problema 06: 2 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV n° 9.010, tornou-se obrigatório o uso da terminologia hanseníase em substituição ao termo lepra. EPIDEMIOLOGIA MUNDIAL Em 2019, foram reportados à Organização Mundial da Saúde (OMS) 202.185 casos novos da doença no mundo. Desses, 29.939 (93%) ocorreram na região das Américas e 27.864 foram notificados no Brasil. Diante desse cenário, o Brasil é classificado como um país de alta carga para a doença, ocupando o segundo lugar na relação de países com maior número de casos no mundo, atrás apenas da Índia. NACIONAL Entre os anos de 2015 e 2019, foram diagnosticados no Brasil 137.385 casos novos de hanseníase. Destes, 75.987 ocorreram no sexo masculino (55,3%). A maior frequência foi observada em pardos, com 58,7%, seguido dos brancos, que representaram 24,3%. Na variável escolaridade, houve predomínio dos casos novos de hanseníase em indivíduos com ensino fundamental incompleto (42,2%) no Brasil. Dados preliminares de 2020 mostram que o Brasil diagnosticou 13.807 casos novos de hanseníase, sendo 672 (4,9% em menores de 15 anos). MINAS GERAIS No período de 2016 a 2020, foram notificados 5.044 casos novos de Hanseníase no estado de Minas Gerais. Quando comparamos 2020 com o ano de 2019, a queda no número de casos foi de aproximadamente 37%. Como um dos principais fatores para essa queda, provavelmente está a pandemia de Covid-19, que trouxe a necessidade de priorização das atividades das equipes de saúde e redução das atividades presenciais devido a necessidade de distanciamento social. Entre os 5.044 casos notificados no período de 2016 a 2020, a maior parte (2.833 casos novos) ocorreram no sexo masculino (56,2%). O restante dos casos (2.211 casos novos), foram registrados no sexo feminino, que corresponde a 43,8% Com relação à escolaridade, observamos que a maior proporção de casos ocorre entre pacientes que possuem de 1ª a 4ª série do ensino fundamental incompleto, seguido pela 5ª a 8ª série do ensino fundamental incompleta. AGENTE ETIOLÓGICO O Mycobacterium leprae é um bacilo álcool- ácido resistente (BAAR), fracamente gram- positivo. Além disso, é um parasito intracitoplasmático de macrófagos e apresenta trofismo pelas células de schwann. É uma bactéria que possui uma alta infectividade, mas baixa virulência e patogenicidade. Após a invasão orgânica, esse bacilo vai entrar em incubação em cerca de 2 a 5 anos. TRANSMISSÃO O homem é considerado a única fonte de infecção da hanseníase, o único reservatório natural, então para ser transmitido deve haver contato direto com pessoas doentes. O que se acredita é que o bacilo é transmitido principalmente pelo ar (eliminado em grande quantidade pelas vias aéreas superiores: 185000 bacilos em 10 min de fala), e essa transmissão ocorre principalmente após contatos íntimos e prolongados com o portador (50% do contágio em países endêmicos acontece com pessoas que convivem intimamente com portadores). M. leprae tem alta infectividade e baixa patogenicidade, ou seja, infecta muitas pessoas, mas apenas poucas adoecem por tratar-se de bacilo pouco tóxico. Profissionais de saúde envolvidos nos cuidados da pessoa com hanseníase não apresentam maior risco de infecção. 3 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV Soluções de continuidade na pele eventualmente podem ser porta de entrada da infecção. Secreções orgânicas como leite, esperma, suor e secreção vaginal podem eliminar bacilos, mas não possuem importância na disseminação da hanseníase. O período de incubação varia de 2-40 anos, mas em geral é de 2-5 anos, isso ocorre porque a reprodução do bacilo é binária simples a cada 14 dias, demorando mais pra que a carga bacilar cause manifestações clínicas. O tempo de transmissibilidade é determinado pelo início da doença até a primeira dose de rifampicina. FISIOPATOLOGIA Após a infecção, o bacilo vai ser fagocitado por macrófagos e vai haver a apresentação às células T em associação com complexo de histocompatibilidade principal (MHC) classes I e II. Nesta etapa, há interação entre o macrófago e os linfócitos T, capazes de reconhecer o antígeno através de receptores de superfície, desencadeando a resposta imune celular. A partir daí, vai haver diferentes padrões de reações de reposta do hospedeiro que vai definir a forma de apresentação da hanseníase. Padrão Th1: O hospedeiro vai desenvolver uma resposta imune celular efetiva, com formação de granulomas e lise bacilar associado a produção de citocinas (IL-2, IFN-γ e TNF- α),responsáveis pela manutenção da resposta imune celular. Padrão Th2: é meio que o oposto do que acontece no Th1. Então, não vai haver uma resposta celular efetiva e nem a formação de granulomas, havendo a multiplicação intracelular dos bacilos em macrófagos, associadas à liberação de citocinas supressoras de macrófagos (IL-4, IL-10). A M. leprae pode apresentar mecanismos de escape à oxidação intramacrofágica, pela produção dos antígenos PGL1 e LAM (lipoarabinomanana), com função supressora da ativação de macrófagos, proporcionando condições para que o bacilo fique protegido no citoplasma desta célula, multiplicando-se e formando globias (Células de Virchow) Além disso, o modo de resposta que esse hospedeiro vai agir ao patógeno, está controlado por alguns fatores próprios desse hospedeiro como alguns fatores do sistema HLA e alguns polimorfismos gênicos. Há uma maior associação da presença do HLA- DR3 na formação da forma tuberculoide e a presença do HLA- DQ1 e a ocorrência da forma virchowiana RESPOSTA IMUNOLÓGICA TH1 E TH2 Linfócitos T CD4+ são subdivididos em Th1 e Th2, com atividades imunorreguladoras específicas, que são mediadas pelas citocinas. Th1: produz as citocinas IL-2, IFN-γ e TNF-β, responsáveis pela manutenção da resposta imune celular. IL-2: ativa receptores dos linfócitos CD4+, estimulando a formação de clones celulares, responsáveis pela manutenção da produção de citocinas e, paralelamente, estimulam células NK, com ação de potencializar uma maior produção de IFN-γ. IFN-γ: age sobre macrófagos, estimulando a fagocitose e os mecanismos de ativação celular, levando a maior produção de TNF-α, que incrementa a ativação macrofágica. Th2: produz as citocinas IL-4, IL-5, IL-6, IL-8 e IL-10. IL- 4 e IL-10, que são supressoras da atividade macrofágica. IL-4: estimula linfócitos B, que se tornam produtores de imunoglobinas, e mastócitos, que passam a produzir mais IL-4, incrementando a resposta supressora macrofágica. Assim, dependendo da subpopulação de células T em atividade, durante o processo inflamatório, haverá predominância de mecanismos de defesa ou de disseminação da doença, RESUMINDO A infecção ocorre e 90% das pessoas se curam. 4 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV Quem não se curar vai apresentar a forma indeterminada (todo mundo começa com essa forma) e também pode se curar. Se ele não se curar, e ele tiver uma má resposta Th1, ele vai ter muitos bacilos no corpo e vai apresentar a forma virchowiana. Já se ele tiver uma boa resposta Th1, ele vai ter poucos bacilos no corpo e forma vai ser tuberculóide. Se ele apresentar uma forma mediana Th1, ele vai apresentar a forma dimorfa QUADRO CLÍNICO Principais sinais e sintomas: • Áreas da pele, ou manchas esbranquiçadas (hipocrômicas), acastanhadas ou avermelhadas, com alterações de sensibilidade ao calor e/ou dolorosa, e/ou ao tato; • Formigamentos, choques e câimbras nos braços e pernas, que evoluem para dormência – a pessoa se queima ou se machuca sem perceber; • Pápulas, tubérculos e nódulos (caroços), normalmente sem sintomas; • Diminuição ou queda de pelos, localizada ou difusa, especialmente nas sobrancelhas (madarose); • Pele infiltrada (avermelhada), com diminuição ou ausência de suor no local. Sinais e sintomas menos comuns: • Dor, choque e/ou espessamento de nervos periféricos; • Diminuição e/ou perda de sensibilidade nas áreas dos nervos afetados, principalmente nos olhos, mãos e pés; • Diminuição e/ou perda de força nos músculos inervados por estes nervos, principalmente nos membros superiores e inferiores e, por vezes, pálpebras; • Edema de mãos e pés com cianose (arroxeamento dos dedos) e ressecamento da pele; • Febre e artralgia, associados a caroços dolorosos, de aparecimento súbito; • Aparecimento súbito de manchas dormentes com dor nos nervos dos cotovelos (ulnares), joelhos (fibulares comuns) e tornozelos (tibiais posteriores); • Entupimento, feridas e ressecamento do nariz; • Ressecamento e sensação de areia nos olhos. CLASSIFICAÇÃO OMS O sistema de classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) foi projetado para uso em situações nas quais há pouca ou nenhuma experiência clínica ou suporte laboratorial, sendo baseado no número de lesões cutâneas presentes. O Brasil também utiliza essa classificação. Entretanto, alguns pacientes não apresentam lesões facilmente visíveis na pele, e podem ter lesões apenas nos nervos (hanseníase primariamente neural), ou as lesões podem se tornar visíveis somente após iniciado o tratamento. CLASSIFICAÇÃO DA HANSENÍASE SEGUNDO A OMS Hanseníase paucibacilar (PB) Até 5 lesões cutâneas (sem bacilos detectáveis em esfregaços de pele). Hanseníase multibacilar (MB) Mais de 5 lesões cutâneas (pode apresentar esfregaço cutâneo positivo) Contar apenas as lesões cutâneas pode levar à classificação incorreta de muitos pacientes com hanseníase PB em vez de hanseníase MB, levando a subtratamento em alguns casos. MADRI A classificação de Madri classifica a doença em quatro subtipos: hanseníase indeterminada e tuberculóide - paucibacilares; dimorfa e virchowiana - multibacilares. Hanseníase Indeterminada (HI): Todos os pacientes passam por essa fase no início da doença, entretanto, ela pode ser ou não perceptível. 5 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV A lesão de pele geralmente é única, mais clara do que a pele ao redor (mancha), não é elevada (sem alteração de relevo), apresenta bordas mal delimitadas, e é seca (“não pega poeira” – uma vez que não ocorre sudorese na respectiva área). Há perda da sensibilidade (hipoestesia ou anestesia) térmica e/ou dolorosa, mas a tátil (habilidade de sentir o toque) geralmente é preservada. A baciloscopia é negativa. Essa fase é não transmissível e não incapacitante. A maioria das pessoas com HI evolui para cura espontânea, enquanto uma pequena parcela permanece com a doença crônica e, após cerca de 5 anos, dependendo do padrão de resposta imunológica predominante, pode evoluir para as diferentes formas do espectro da hanseníase. Hanseníase Tuberculóide (HT): É a forma da doença em que o sistema imune da pessoa consegue destruir os bacilos espontaneamente. Mais frequentemente, manifesta-se por uma placa (mancha elevada em relação à pele adjacente) totalmente anestésica ou por placa com bordas elevadas, bem delimitadas e centro claro (forma de anel ou círculo). Com menor frequência, pode se apresentar como um único nervo espessado com perda total de sensibilidade no seu território de inervação. Nesses casos, a baciloscopia é negativa e a biópsia de pele quase sempre não demonstra bacilos, e nem confirma sozinha o diagnóstico Hanseníase Virchowiana (HV): É a forma mais contagiosa da doença. O paciente virchowiano não apresenta manchas visíveis; a pele apresenta-se avermelhada, seca, infiltrada, cujos poros apresentam-se dilatados (aspecto de “casca de laranja”), poupando geralmente couro cabeludo, axilas e o meio da coluna lombar (áreas quentes). Na evolução da doença, é comum aparecerem caroços (pápulas e nódulos) escuros, endurecidos e assintomáticos (hansenomas). Quando a doença encontra-se em estágio mais avançado, pode haver perda parcial a total das sobrancelhas (madarose) e também dos cílios, além de outros pelos, exceto os do couro cabeludo. A face costuma ser lisa (sem rugas) devido a infiltração, o nariz é congesto, os pés e mãos arroxeados e edemaciados, a pele e os olhos secos. O suor está diminuído ou ausente de forma generalizada, porém é mais intenso nas áreas ainda poupadas pela doença, como o couro cabeludo e as axilas.São comuns as queixas de câimbras e formigamentos nas mãos e pés, que entretanto apresentam-se aparentemente normais. “Dor nas juntas” (articulações) também são comuns. Espessamento dos lóbulos das orelhas, joelhos, cotovelos ou lesões papulonodulares acastanhadas indicam grande carga bacilar. Os nervos periféricos e seus ramos superficiais estão simetricamente espessados, o que dificulta a comparação. 6 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV A baciloscopia revela numerosos bacilos, que podem estar agrupados na forma de globias. Hanseníase Dimorfa (HD): É a forma mais comum de apresentação da doença (mais de 70% dos casos). Ocorre, normalmente, após um longo período de incubação (cerca de 10 anos ou mais), devido à lenta multiplicação do bacilo (que ocorre a cada 14 dias, em média). Caracteriza-se, geralmente, por mostrar várias manchas de pele avermelhadas ou esbranquiçadas, com bordas elevadas, mal delimitadas na periferia, ou por múltiplas lesões bem delimitadas semelhantes à lesão tuberculóide, porém a borda externa é esmaecida (pouco definida). Há perda parcial a total da sensibilidade, com diminuição de funções autonômicas (sudorese e vasorreflexia à histamina). É comum haver comprometimento assimétrico de nervos periféricos, as vezes visíveis ao exame clínico A baciloscopia da borda infiltrada das lesões é frequentemente positiva, exceto em casos raros em que a doença está confinada aos nervos. REAÇÕES HANSÊNICAS são complicações inflamatórias agudas que se apresentam como emergências médicas, sendo a principal causa de morbidade e incapacidade neurológica, podendo surgir antes, durante ou depois do tratamento poliquimioterápico A Reação Tipo 1 ou Reação Reversa caracteriza- se por exacerbação de lesões preexistentes, por meio de hiperestesia, eritema, edema e posterior descamação. Na evolução, lesões pré-existentes podem ulcerar e também podem ser visualizadas novas lesões. A neurite é frequente e pode levar a danos neurais múltiplos e graves, resultando em deformidades e perda de função. A Reação Tipo 2, também chamada de eritema nodoso hansênico (ENH) ocorre nas formas Virchowiana e Dimorfa-Virchowiana, com maior frequência após o início do tratamento (aproximadamente após 6 meses). Caracteriza-se por nódulos eritematosos, dolorosos, que podem ulcerar e evoluir com necrose e acometer todo o tegumento. Sintomas sistêmicos como febre, artralgia e fadiga, associados ao aumento de provas inflamatórias, podem estar presentes. 7 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV DIAGNÓSTICO O diagnóstico de hanseníase é essencialmente clínico e epidemiológico, sendo realizado por meio da análise da história, das condições de vida do indivíduo e do exame dermatoneurológico. Diante da suspeita de hanseníase, o exame deve incluir avaliação dermatológica de todo o corpo na busca de lesões de pele, além da sua caracterização. Além disso, deve ser realizado um exame neurológico avaliando função, força e palpação de nervos (avaliar alterações de tamanho e/ou sensibilidade e presença de espessamentos) Um exame sensorial de lesões de pele também deve ser realizado (avaliar sensibilidade térmica, seguida da dolorosa e, por fim, da tátil) O diagnóstico é estabelecido definitivamente quando pelo menos uma das características a seguir encontra-se presente, com ou sem história epidemiológica: • Lesão(ões) e/ou área(s) da pele com alteração de sensibilidade; • Acometimento de nervo(s) periférico(s), com ou sem espessamento, associado a alterações sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas; • Baciloscopia positiva de esfregaço intradérmico EXAME HISTOPATOLÓGICO (BIÓPSIA DE PELE) Realizado a partir de material da biópsia coletada de lesão cutânea ou fragmento de nervo. A interpretação desses achados deverá ser realizada de acordo com o quadro clínico do paciente Hanseníase indeterminada: encontra-se, na maioria dos casos, um infiltrado inflamatório que não confirma o diagnóstico de hanseníase. A procura de bacilos (BAAR) é quase sempre negativa. Hanseníase tuberculoide: encontra-se um granuloma do tipo tuberculóide (ou epitelióide) que destrói pequenos ramos neurais, agride a epiderme e outros anexos da pele. A procura de bacilos (BAAR) é negativa Hanseníase virchowiana: infiltrado histiocitário xantomizado ou macrofágico e a pesquisa de bacilos mostra incontáveis bacilos dispersos e organizados em grumos (globias). Hanseníase dimorfa: infiltrado linfo-histiocitário, que varia desde inespecífico até com a formação de granulomas tuberculóides; a baciloscopia da biópsia é frequentemente positiva, sobretudo nos nervos dérmicos e nos músculos lisos dos pelos Obs: Resultados negativos para baciloscopia da biópsia NÃO excluem o diagnóstico clínico da hanseníase. BACILOSCOPIA DE RASPADO INTRADÉRMICO Consiste na pesquisa de BAAR no esfregaço da linfa coletada de áreas suspeitas. Na ausência de lesões cutâneas, a baciloscopia pode ser coletada dos lóbulos das orelhas, dos cotovelos ou dos joelhos. Paciente paucibacilar (hanseníase indeterminada ou tuberculóide): baciloscopia é negativa. Obs: Caso seja positiva, reclassificar o doente como MB. Paciente multibacilar (hanseníase dimorfa e virchowiana) : baciloscopia normalmente é positiva. Obs: Caso seja negativa, levar em consideração o quadro clínico para o diagnóstico e classificação desse doente. PROVA DA HISTAMINA A prova de histamina exógena consiste numa prova funcional para avaliar a resposta vasorreflexa à droga, indicando integridade e viabilidade do sistema nervoso autonômico de 8 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV dilatar os vasos cutâneos superficiais, o que resulta no eritema. Como resposta ao difosfato de histamina 1,5%, em áreas normais, são esperados três sinais típicos que caracterizam a tríplice reação de Lewis: 1. Sinal da punctura: lesões puntiformes avermelhadas que surgem quase que imediato (até 15 segundos) à escarificação por agulha de insulina dentro da gota aplicada sobre a área hipocrômica; 2. Eritema reflexo: eritema que atinge de 2 a 8cm ao redor da área com limites fenestrados percebido a partir de 30 a 60 segundos após a escarificação; 3. Pápula: caracteriza-se por lesão intumecida lenticular que surge após 2 a 3 minutos no local da punctura/escarificação. A prova de histamina endógena também permite avaliar a função vascular por meio da liberação de histamina endógena que consiste em traçar uma reta na pele do paciente utilizando-se de um instrumento rombo (tampa de caneta esferográfica, cotonete, chave, etc). Deve-se ficar atento às mesmas fases descritas acima, esperando-se um eritema reflexo linear e homogêneo de 0,5 a 1cm de largura junto ao traço. Nas lesões de hanseníase, esse eritema não acontece internamente e as manchas se tornam mais definidas em contraste ao eritema externo intenso. REAÇÃO DE MITSUDA Não é diagnóstico Avalia a capacidade do indivíduo em elaborar uma resposta imune aos antígenos do bacilo. É uma intradermorreação tardia à inoculação de solução de bacilos mortos pelo calor. A leitura é feita no 28º dia e é considerada positiva se o diâmetro for maior que 5mm. É negativa na forma virchowiana e positiva na tuberculoide. Na forma dismorfa pode ser positiva se tender à tuberculoide e negativa se tender à virchowiana. Indivíduos não expostos à hanseníase podem apresentar Mitsuda positivo TRATAMENTO O MS da saúde passou recomendar que, a partir de setembro de 2020, todos os novos casos de PB e MB passassem a iniciar esquema único de tratamento com 3 drogas (rifampicina, clofazimina e dapsona). Em 2021,O MS da saúde implementou de fato a ampliação do uso da clofazimina para o tratamento da hanseníase paucibacilar. Desse modo, a partir de 1 de julho de 2021, a associação dos fármacos rifampicina + dapsona + clofazimina, na apresentação de blísteres para tratamento da hanseníase, passou a ser denominada “Poliquimioterapia Única – PQT-U”, adulto ou infantil, sendo recomendada para o tratamento de todos os casos novos de hanseníase, tanto paucibacilares quanto multibacilares, com diferença apenas na duração do tratamento. 9 MÓDULO I: FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO ANA LUIZA A. PAIVA - TXXV Pacientes com hanseníase com resistência à rifampicina: claritromicina, minociclina ou uma quinolona (ofloxacina, levofloxacina ou moxifloxacina), além de clofazimina diariamente por 6 meses, seguidos por clofazimina mais um dos medicamentos de segunda linha diariamente por mais 18 meses. Obs: No caso de resistência à rifampicina e ofloxacina, uma quinolona não deve ser escolhida; portanto, o esquema recomendado é claritromicina, minociclina e clofazimina por 6 meses, seguido por claritromicina ou minociclina mais clofazimina por mais 18 meses (recomendação condicional, baseada na opinião de especialistas; nenhuma evidência recuperada). TRATAMENTO DOS EPISÓDIOS REACIONAIS Episódios reacionais hansênicos não contraindicam o início da PQT, não implicam na interrupção e nem indicam necessidade de reinício da PQT. Entretanto, após 5 anos do término do tratamento, caso ocorra a apresentação de episódio reacional, deve-se pesquisar recidiva ou reinfecção e manter a busca de focos ativos intra- domiciliares. Reação hansênica do tipo 1: prednisona 1 mg/kg/dia via oral ou dexametasona 0,15 mg/kg/dia Em caso de neuralgia, associar antidepressivo tricíclico em dose baixa (amitriptilina 25 mg por dia), associado a clorpromazina 5 gotas (5 mg) duas vezes ao dia, ou a carbamazepina 200 a 400 mg por dia. Reação hansênica tipo 2: iniciar talidomida 100 a 400 mg/dia via oral, de acordo com a gravidade do caso. Associar prednisona 1 mg/kg/dia via oral em casos de comprometimento dos nervos periféricos ou de outros órgãos que não a pele ou se houver ulcerações extensas. Para neuralgia, utilizar o mesmo esquema antiálgico da reação tipo 1. PREVENÇÃO DA HANSENÍASE A principal forma de prevenir as deficiências e as incapacidades físicas, é o diagnóstico precoce. A prevenção e o tratamento das incapacidades físicas são realizados pelas unidades de saúde, mediante utilização de técnicas simples (educação em saúde, exercícios preventivos...) As medidas de controle da hanseníase incluem o manejo clínico dos casos ativos e também o manejo dos contatos, ou seja, tratar quem tem a doença e examinar os contactantes próximos. Fora das áreas endêmicas, nenhum tratamento profilático é recomendado. Em áreas endêmicas, as diretrizes da OMS recomendam a profilaxia (com rifampicina em dose única) para adultos e crianças ≥ 2 anos. PREVENÇAO DA HANSENÍASE POR USO DE IMUNOPROFILAXIA A vacinação com BCG é parcialmente protetora para hanseníase; uma única dose parece ser 50% protetora, e 2 doses aumentam ainda mais a proteção. • A eficácia da revacinação BCG (segunda dose de BCG após uma dose ao nascer) não é clara, uma vez que dois grandes ensaios sobre a revacinação com BCG mostraram resultados conflitantes.
Compartilhar