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Descomplicando a Mobilidade Urbana: Manual de Ações para Gestores Públicos Descomplicando a Mobilidade Urbana Manual de Ações para Gestores Públicos 2021 APRESENTAÇÃO “Transporte não é uma fi nalidade em si, mas um meio que permite às pessoas acesso a qualquer necessidade: emprego, mercados e bens, interação social, educação e uma série de outros serviços que contribuem para vidas saudáveis e plenas” CNM, 2016. MOB.inc é uma jornada. Já estava escrito em seu manifesto que esta essência implica em movimento. Implica em chegadas e partidas e em recomeços. Este livro surge como o pró- ximo passo da 1ª Jornada MOB.inc - Mobilidades e Caminhos para Inclusão Social. Evento promovido, virtualmente, em julho de 2020 pela COPPE/UFRJ, HIT e CAPES e que prometia uma busca contínua pelo ponto zero da revolução na mobilidade a partir da inclusão social. Como energia motriz para essa busca, a rede MOB.inc partiu do princípio de fortalecer as relações criativas entre pesquisadores, membros da sociedade e órgãos governamentais entusiastas dos temas da mobilidade urbana e inclusão social nas cidades brasileiras. Como primeiro passo, a Jornada desenrolou-se ao longo de 5 dias, contando com várias dinâmicas ligadas ao tema no intuito de promover a cocriação entre os participantes. Durante este pe- ríodo, cada equipe escolheu um vetor de transformação (governança, tecnológico ou aca- dêmico) para desenvolver novas práticas de mobilidade e transporte capazes de construir cidades mais inclusivas e sustentáveis. Buscando este objetivo, uma das equipes teve a ideia de um Manual que pudesse descom- plicar e auxiliar gestores públicos na proposição de planos e políticas de uma forma clara e objetiva. Surge, então, o “Descomplicando a Mobilidade Urbana: Manual de Ações para Gestores Pú- blicos”, um material colaborativo, com diferentes temas e autores a cada capítulo. APOIO Desenhado com a intenção de amparar gestores públicos interessados em desenvolver uma agenda da mobilidade, capaz de enfrentar os desafios que serão encontrados na maioria dos municípios brasileiros e de abrir possibilidades de melhorias no planejamento urbano, este Manual aborda Marcos Legais e Ações Práticas que podem ser realizados ao longo dos próximos 4 anos de gestão. Os capítulos que tratam dos Marcos Legais incluem planos de mobilidade urbana, ferra- mentas de participação popular, planejamento cicloviário, taxação de veículos individuais pelo uso do solo e planos de educação para a segurança no trânsito. Já nos capítulos que envolvem as Ações Práticas, foram levantadas questões sobre ruas completas, condição e qualidade das calçadas, transporte público coletivo, transporte público sob demanda e o uso de aplicativos ligados à mobilidade urbana. Sabemos que devido à grande extensão do nosso país, torná-lo um lugar acessível, inclusivo e sustentável mediante a mobilidade urbana pode demandar tempo, dedicação e investi- mento, tanto dos gestores públicos quanto dos pesquisadores e profissionais que atuam nessa área, assim como da própria população. “Metrópoles sufocam, são necrópoles que não se tocam Então se chocam com o sonho de alguém São assassinas de domingo a pausar tudo que é lindo Todos que sentem isso são meus amigos, também” Emicida - Cananéia, Iguape e Ilha Comprida Entendemos, também, o quanto é desafiador essa caminhada, por isso, o nosso papel, por meio desse manual, é tornar este caminho menos tortuoso e te dar suporte e incentivo para essa empreitada. Estamos aqui para te ajudar a implementar as ações no seu município! Este livro é um esforço coletivo de mais de 70 autores. Espalhados pelo Brasil e convocados através da Rede de participantes do primeiro evento MOB.inc, reuniram-se entusiastas e especialistas em diversas áreas e localidades para desenvolverem, dentro dos temas que mais se identificassem, trabalhos combinados neste produto final. Sabemos que o Brasil é muito grande e que não conseguimos (ainda) incluir a todos, mas as figuras abaixo mostram onde estamos e quais os próximos passos para continuarmos nessa caminhada da inclusão também de dentro para fora da rede. Felizmente, o trabalho não termina por aqui, a Rede MOB.inc continua! Queremos estar cada vez mais próximos da transformação da mobilidade em todas as cidades do Brasil e da América Latina. Por isso, estamos à disposição para receber e colaborar com qualquer pessoa que se alinhe com o propósito de uma mobilidade inclusiva. Aqui deixamos o nosso convite: Não precisa fazer tudo sozinho. Aqui andamos juntos porque queremos ir longe. Deu certo? Compartilhe conosco suas experiências. Deu errado? Conta sobre as suas limitações durante esse processo. Vem fazer parte da nossa rede! Acesse nosso site https://mobinc.online/, increva-se e nos acompanhe também nas redes sociais, siga @redemobinc no Instagram e fique por dentro das novidades sobre mobilidade urbana com foco na inclusão social. Esperamos vocês! 2021 OS ORGANIZADORES Cléo Adário “Sou graduada em Arquitetura e Urbanismo (UFJF/MG), e atualmente mestranda em Planejamento Urbano e Regional (PPG.au - UFV/MG). Busco aprofundar meus estudos na temática da Mobilidade Urbana e a relação entre os deslocamentos diários da população e suas vivências e percepções do espaço urbano. Acredito que um assunto tão fundamental como este merece cada vez mais a atenção de uma parcela diversifi cada de pesquisadores e dos próprios habitantes que, direta ou indiretamente, compõem a rede urbana. ” Isabella Martins “Considero que através da mobilidade urbana é possível mudar realidades, por isso pesquiso sua relação com o desenvolvimento sustentável e os aspectos envolvidos nesse processo. Graduada em Engenharia Civil (UVA-RJ) e mestre em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), estou atualmente como Coordenadora Geral de Planejamento em Mobilidade Urbana na Prefeitura de Cabo Frio – RJ, além de ser responsável técnica do Plano de Mobilidade Urbana e também corresponsável pelo Programa de Calçadas Acessíveis do município. Atuo em áreas multidisciplinares buscando aperfeiçoar o desenvolvimento profi ssional através do planejamento e do conhecimento. Sou inspetora técnica do CREA – RJ e membro atuante em conselhos e comissões municipais. Acredito que unir a pesquisa acadêmica à vivência prática da administração pública é fundamental para potencializar os investimentos e melhorias para a re(criação) da mobilidade do nosso país.” Lívia Almeida “Sou graduanda em Engenharia Civil pela UFRJ, na área de construção civil, realizando um trabalho de conclusão de curso na área de reabilitação predial e urbana. Busco aprofundar meus estudos na área dos transportes e de Mobilidade Urbana através de um mestrado e me interesso muito pela conexão da reabilitação urbana e da mobilidade com o conceito de cidades inteligentes.” Lucas Adleer “Graduado em Engenharia Civil pela UFRN e atual chefe do setor de projeto viário da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana de Natal-RN (STTU), sempre fui fascinado pelos desafios relacionados à mobilidade urbana nos centros urbanos. Tive a oportunidade de realizar um ano de estudos em engenharia urbana em Paris, na França, experiência esta que me fez abrir ainda mais os olhos para possibilidades mais sustentáveis de deslocamento em nossas cidades.” Matheus Oliveira “Energizo o papel de professor na COPPE combinando novos métodos de coleta e análise de dados, os modelos organizacionais da indústria 4.0 no setor de transportes e, finalmente, a teoria econômica da regulamentação dos mercados a procura de compreender como gerar valor público para um sistema de transporte Inteligente. Dentro desse conceito, estão as iniciativas do Hub de Inovação Tecnológica em Transportes e do Ubuntu_ labe que buscam alinhar o tripé Pesquisa, Ensino e Extensão ao redesenho do pensamento científico, do planejamento de transportes e da responsabilidade cidadã através do empoderamentodo indivíduo na cidade, na expansão do acesso à cidadania e na valorização de saberes científicos, tradicionais e experienciais.” Victor Hugo Abreu “Sou graduado em Engenharia Civil (POLI/UFRJ) e mestre e doutorando em Engenharia de Transportes (PET/COPPE/ UFRJ). Atualmente, atuo como professor de Elaboração de Projetos (MBE/COPPE/UFRJ) e pesquisador colaborador do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. Acredito que o setor de transportes e o desenvolvimento sustentável devem andar em harmonia para o estabelecimento de um sistema que permita à sociedade satisfazer suas necessidades de acesso à bens e serviços de uma maneira consciente e compatível com a saúde pública e dos ecossistemas, reduzindo a poluição ambiental, o esgotamento dos recursos naturais e as mudanças climáticas.” Quem participou do Manual? COLABORADORES Organização do Livro Cléo Nicolau Adário Lima Nascimento Isabella Martins de Almeida Lívia Beatriz Machado de Almeida Lucas Adleer Epifanio de Freitas Pereira Matheus Henrique de Sousa Oliveira Victor Hugo de Souza Abreu Organização do Seminário MOB.INC Dario Almeida José Brandão de Paiva Neto KwanYin Gil Mariana de Souza Carneiro Matheus Henrique de Sousa Oliveira Ycaro Batalha Revisão Cléo Nicolau Adário Lima Nascimento Isabella Martins de Almeida Joana André Matias Ribeiro José Brandão de Paiva Neto Kelisson de Souza Nogueira Lívia Beatriz Machado de Almeida Lucas Adleer Epifanio de Freitas Pereira Mariana de Souza Carneiro Matheus Henrique de Sousa Oliveira Victor Hugo de Souza Abreu Direção de Arte Duda Itajahy João Sarmento Raquel Nobre Diagramação e finalização Duda Itajahy João Sarmento Ilustrações Raquel Nobre AUTORES Plano de Mobilidade Urbana Allan Barbosa Moreira André Kessel Akerman Brenda Veneranda Fernandes Silva Cristiano Souza Marins Dario Neves de Almeida Enilson Santos Gabriela Katie Silva Morita Guilherme de Oliveira Pucci Haydée Svab Isabella Martins de Almeida Ígor Godeiro de O. Maranhão Jady Medeiros Silva Juliana Trento Silmara Vieira da Silva Matheus Frota Braga Ferramentas de participação popular: legislações, implementação, acom- panhamento e boas práticas brasileiras Luís Otávio Rocha Castilho Maria Lígia Chuerubim Anáiram Lima Costa Maria Eduarda Sousa Cavalcante Regulamentação e Implantação de Um Plano Cicloviário Anáiram Lima Costa António Carlos de Mattos Miranda Carolina Rezende Felipe de Bem Diogo Gomes Pereira Batista Gabriela Binatti Souza José Carlos Assunção Belotto Kelisson de Souza Nogueira Luiz Emerson da Cruz Saldanha Renan Couto Lisboa Pereira Silvana Nakamori Cobrança dos veículos individuais pelo uso do solo: estacionamento rotativo e pedágio urbano Jessica Helena de Lima Marina Leite de Barros Baltar Tainá Souza Pacheco Victor Hugo Souza de Abreu Programas e Ações de Educação e Conscientização para Segurança no Trânsito Brian Egídio Silva Teixeira Camila Souza Dantas Mota Juliane Érika Cavalcante Bender Muriel Syriani Veluza Ruas completas e mobilidade urbana para transporte público e ativo Arthur Marques de Almeida Xavier Bruno de Oliveira Lázaro Danton Wilson de Figueiredo Ribeiro Filho Leonardo Filipe dos Santos Lúcia Rejane de Almeida Xavier Luiza Bandeira Rodrigues de Carvalho A Calçada como Instrumento de Promoção da Caminhabilidade Amanda Fernandes Ferreira Bruna Martins de Oliveira Camila Padovan da Silva Camila Silva Coelho Kericles Silva Ricardo Machado Becker Rodrigo de Carvalho Transporte Público Coletivo Ana Maria Santos Torquato Evelyn Cortez Alves Gabriela Souza Conrado Guilherme Expedito de Andrade Maria Laura Lopes Luciano Mariana Marçal Thebit Mateus Bernardo de Oliveira Matheus Rondon Navas Raphael Geraldo Estanislau Vaz Ribeiro Thiago Assis Dutra Lucena Transporte Público sob Demanda Amanda Fernandes Ferreira Bianca Gonçalves Lara Deborah Cristina da Rocha Mirian Greiner de Oliveira Pinheiro Renato Guimarães Ribeiro O uso dos aplicativos como instrumento de mobilidade urbana Thais Ohana Ferreira de Araújo Gabriel Guanabarã Lemos Marques SUMÁRIO MARCOS LEGAIS Plano municipal de mobilidade urbana 23 Ferramentas de participação popular: legislações, implementação, acompanhamento e boas práticas brasileiras 59 Regulamentação e implantação de um plano cicloviário 89 Cobrança dos veículos individuais pelo uso do solo: estacionamento rotativo e pedágio urbano 135 Programas e Ações de Educação e Conscientização para segurança no trânsito 157 AÇÕES PRÁTICAS Ruas completas e mobilidade urbana para transporte público e ativo 181 A calçada como instrumento de promoção da caminhabilidade 209 Transporte Público Coletivo 259 Transporte público sob demanda 299 O uso dos aplicativos como instrumento de mobilidade urbana 319 GLOSSÁRIO Olá, caro leitor! Esta seção pretende explicar melhor alguns conceitos que serão retomados algumas (senão, muitas!) vezes ao longo de todo o manual. É possível que você não esteja tão familiarizado com alguns termos mais “técnicos” que são recorrentes nos estudos e projetos de mobilidade e transportes, por isso elaboramos esta seção. Com isso, não há melhor começo do que falar de um termo presente no próprio título deste manual… A Mobilidade urbana é a “condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano” (Brasil, 2012), que varia de acordo com o(s) modo(s) de transporte adotado(s) no decorrer desses deslocamentos. Como o foco deste manual está na mobilidade de pessoas nas cidades, falaremos principalmente do caminhar, da bicicleta, do transporte público (ônibus, trem, metrô, VLT etc) e do carro e moto. Recentemente, temos visto uma evolução desse primeiro conceito e está cada vez mais comum discutir sobre Mobilidade urbana sustentável, isto é, atributos do desenvolvimento sustentável são incorporados à mobilidade, passando a apresentar um foco em três eixos: econômico, social e ambiental (Carvalho, 2016). Dessa forma, tem-se procurado promover soluções que tragam uma maior justiça social por meio da redução das desigualdades socioespaciais, além de priorizar tecnologias menos danosas ao meio ambiente. Ainda sobre o assunto de “justiça social”, podemos incluir também um conceito que será bastante mencionado por aqui e que é muito comum na fala de diversos urbanistas 一 o Direito à Cidade. Este termo foi primeiramente proposto por Henri Lefebvre em 1968, em seu livro “O direito à cidade”, e traz como ideia fundamental a demanda coletiva por um acesso digno e igualitário à vida urbana. Destaca-se, aqui, a palavra “acesso”, sendo possível relacioná-la com o que os capítulos do presente Manual irão tratar, evidenciando a importância do mesmo como um direito universal de toda a população. Dentro dessa temática, tem-se falado também sobre Mobilidade Ativa, termo que caracteriza os deslocamentos não motorizados, ou seja, que ocorrem com uso da força física do usuário, e que se dividem, popularmente, entre o uso de bicicletas e o caminhar. O estímulo a este tipo de mobilidade tem sido relacionado, ainda, ao modelo de cidades compactas, mais densas, bem conectadas e diversificadas, buscando uma melhora na qualidade de vida dos usuários do espaço urbano (Vargas, 2015). Um outro termo que você verá muito frequentemente é Externalidade, que nada mais é do que um efeito colateral. Neste Manual, discutiremos sobretudo as três principais externalidades negativas relacionadas à mobilidade urbana, isto é, que trazem prejuízos às nossas cidades. São elas: os atrasos no tempo de viagem devido aos congestionamentos, a poluição atmosférica e os acidentes de trânsito. Já quando falamos de Acessibilidade, a ideia presente no senso comum é de que se trata das melhorias no espaço urbano a fim de propiciar um deslocamento mais adequado para as pessoas com algum tipo de deficiência motora. Contudo, esse conceito vai além disso, significa também que “os serviços de transporte devem atender todos os cidadãos, ou seja, toda a população tem o direito de usufruir asoportunidades e os equipamentos das cidades” (Carvalho, 2016). Em outras palavras, é a facilidade com a qual o cidadão consegue acessar os serviços de ensino e saúde, lazer, oportunidades de emprego, etc. Com relação também à qualidade do espaço urbano para seus usuários, mais especificamente para os pedestres, encontra-se o termo Caminhabilidade, consistindo na análise das condições da infraestrutura urbana sob a ótica do pedestre, observando se ela é adequada, segura, confortável e agradável para se caminhar (Park, 2008). Sendo assim, esta definição propõe um modelo de cidade focado nas pessoas e na facilidade para se deslocar no ambiente urbano (Vargas, 2015). Outro conceito importante é o de Oferta, que diz respeito à disponibilidade do modo de deslocamento. Muito usado quando falamos do sistema de transporte público, uma outra maneira de expor essa definição é quando falamos de uma rede de ônibus por exemplo: a oferta seria a quantidade e a frequência desse sistema ao dispor do cidadão. Logo, uma maior oferta implica que há uma maior quantidade de veículos circulando e a intervalos de tempo menores, e vice-versa. Uma definição, de certa forma, complementar à anterior é o da Demanda. Nada mais é do que a procura por determinado meio de transporte. Exemplificando: trata-se da quantidade de pessoas que utilizam a rede de ônibus ou metrô. Daí, fica evidente a relação próxima entre oferta e demanda - deve haver um equilíbrio entre as duas, de modo que elas sejam compatíveis entre si para um bom funcionamento do sistema. Falando agora do espaço viário, temos que definir Capacidade da via, que corresponde ao “número máximo de veículos que poderá passar por um determinado trecho de uma faixa ou pista durante um período de tempo determinado, sob as condições reais predominantes na via e no tráfego” (DNIT, 2006). Assim, quando uma via atinge e ultrapassa sua capacidade, o tráfego sobre ela fica comprometido, ou seja, passamos a observar lentidão e congestionamentos. Com a popularização da bicicleta nos últimos anos, também temos alguns conceitos relacionados à infraestrutura cicloviária que devem ser bem conhecidos. O primeiro deles é o de Ciclovias, que são vias exclusivas para bicicletas, segregadas fisicamente da via de tráfego dos veículos automotores. Aplicável a vias arteriais com velocidade igual ou superior a 50km/h e oferecem baixo risco ao ciclista. O segundo é o de Ciclofaixas: espaços segregados da via de tráfego comum por meio de pintura e/ou auxílio de recursos de sinalização, sem barreira física. Aplicável em vias coletoras com velocidade de até 40km/h e oferecem moderado risco ao ciclista. Por fim, o terceiro é o de Ciclorrotas, são caminhos recomendados para a bicicleta onde dividem espaço com automóveis. Para segurança do ciclista há a necessidade de uma sinalização horizontal indicativa com o pictograma da bicicleta. Aplicável em vias de até 30km/h e oferecem alto risco ao ciclista. Por fim, quando falamos de processos urbanos, tem sido trazido à tona o conceito de Gentrificação: “o termo refere-se a processos de mudança das paisagens urbanas, aos usos e significados de zonas antigas e/ou populares das cidades que apresentam sinais de degradação física, passando a atrair moradores de rendas mais elevadas” (Alcântara, 2018). REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, M. F. (2018). “Gentrificação”. In: Enciclopédia de Antropologia. São Paulo: Universidade de São Paulo, Departamento de Antropologia. Disponível em: <http://ea.fflch.usp.br/conceito/ gentrifica%C3%A7%C3%A3o>. BRASIL. (2012). “Decreto-lei no 12.587, de 3 de janeiro de 2012 Institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana e determina outras providências”. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília. CARVALHO, C. H. R. (2016). Mobilidade urbana sustentável: conceitos, tendências e reflexões. Brasília: Ipea. (Texto para Discussão, n. 2194). Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT (2006). Manual de Estudos de Tráfego. Publicação IPR - 723. Rio de Janeiro. LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. Tradução de Rubens Eduardo Frias. 5ª ed. São Paulo: Centauro, 2008. Disponível em: <https://nemouem.files.wordpress.com/2013/10/direito-c3a0-cidade-lefebvre.pdf>. PARK, S. (2008). Defining, measuring, and evaluating path walkability, and testing its impacts on transit users’ mode choice and walking distance to the station. Berkeley. Dissertation, University of California Transportation Center. UC Berkeley. VARGAS, J. C. B. (2015). Formas urbanas e rotas de pedestres. 126f. Tese (Doutorado) Curso de Engenharia de Produção, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 21-61634 CDD-363.125 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Descomplicando a mobilidade urbana [livro eletrônico] : manual de ações para gestores públicos / organização Cléo Adário ... [et al.]. -- 1. ed. -- Belo Horizonte, MG : Mob.Inc, 2021. PDF Outros organizadores : Isabella Martins, Livia Almeida, Lucas Adleer, Matheus Oliveira, Victor Hugo Abreu. Vários colaboradores. Bibliografia ISBN 978-65-00-20402-5 1. Acessibilidade urbana 2. Engenharia de transportes 3. Inclusão social 4. Mobilidade urbana 5. Planejamento urbano 6. Políticas públicas I. Martins, Isabella. II. Almeida, Livia. III. Adleer, Lucas. IV. Oliveira, Matheus. V. Abreu, Victor Hugo. Índices para catálogo sistemático: 1. Mobilidade urbana : Problemas sociais 363.125 Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129 RESUMO Ao decidir colocar um projeto em prática é importante compreen- der quais as barreiras e difi culdades serão encontradas ao longo do caminho, o mesmo acontece ao decidir elaborar e implantar um Plano de Mobilidade Urbana (PlanMob). Felizmente, o objeti- vo deste manual é te ajudar a deixar esse caminho menos tortuo- so e dar suporte a essa empreitada. Este capítulo apresenta infor- mações importantes da Política Nacional da Mobilidade Urbana e aborda benefícios e desafi os na elaboração e implementação do Plano de Mobilidade Urbana. Através dele você poderá conhecer as experiências de planejamento de algumas cidades brasileiras, identifi cará a importância de fazer um plano voltado para a rea- lidade da sua cidade, contemplando as características do espaço e da população. Por fi m, conhecerá as ferramentas necessárias para implementar o PlanMob em seu município. Capítulo 1 PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA ALLAN BARBOSA MOREIRA Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro allanmoreira@id.uff.br DARIO NEVES DE ALMEIDA Universidade Federal do Rio de Janeiro darioalmeida@pet.coppe.ufrj.br GABRIELA KATIE SILVA MORITA Pece - Escola Politécnica da USP gabrielaks.morita@gmail.com ISABELLA MARTINS DE ALMEIDA Universidade Federal do Rio de Janeiro isabellamartins@pet.coppe.ufrj.br JULIANA TRENTO Faculdade de Engenharia de Sorocaba julianatrento12@gmail.com ANDRÉ KESSEL AKERMAN Fundação Getulio Vargas andre.akerman@gmail.com CRISTIANO SOUZA MARINS Universidade Federal Fluminense cristianosouzamarins@yahoo.com.br GUILHERME DE OLIVEIRA PUCCI Universidade Presbiteriana Mackenzie guipucci1@gmail.com ÍGOR GODEIRO DE O. MARANHÃO Universidade Federal do Rio de Janeiro igormaranhao@pet.coppe.ufrj.br SILMARA VIEIRA DA SILVA BR Cidades-Núcleo DF silmara.cidades@gmail.com BRENDA VENERANDA FERNANDES SILVA Universidade Estadual de Campinas brenda.f@live.com ENILSON SANTOS Universidade Federal do Rio Grande do Norte enilsonsantos451@gmail.com HAYDÉE SVAB ASK-AR Consultoria hsvab@hsvab.eng.br JADY MEDEIROS SILVA Universidade São Judas Tadeu (USJT) jady.mms@gmail.com MATHEUS FROTA BRAGA Centro Universitário Christus mattheusfrota@gmail.com | 25CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA 1.1 Introdução A Lei 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de MobilidadeUrbana - PNMU, conceitua Mobilidade Urbana como condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano. Também pode ser defi nida pelo deslocamento de um ponto a outro, no ambiente urbano, a pé, por bicicleta, transporte público coletivo (metrô, ônibus, trem), transporte de cargas ou por veículos privados (carro, moto). Esse deslocamento pode ser realizado por diversos motivos (lazer, trabalho, escola, cultura), diversidade de usuários (gênero, idade, renda) e em diferentes períodos do dia (manhã, tarde, noite). Ao intervir em todas essas questões, a Política de Mobilidade Urbana efetiva-se como um instrumento da política de desenvolvimento urbano. Assim, para o desenvolvimento de cidades mais democráticas, sustentá- veis, conectadas e seguras é importante atuarmos pelo aprimoramento da mobilidade urbana, levando em consideração o conceito de direito à cida- de criado pelo fi lósofo e sociólogo Henri Lefebvre, em 1968. A elaboração e implementação de políticas públicas de mobilidade que universalizam o acesso seguro, confortável e equitativo da população aos serviços básicos e equipamentos sociais nos diferentes territórios da cidade, além de pro- mover o bem-estar social, melhora a qualidade ambiental e dinamiza a economia urbana. 1.2 Plano de Mobilidade Urbana Um dos primeiros passos para a gestão efi ciente e efi caz da mobilidade urbana é a elaboração do Plano de Mobilidade Urbana, também conhecido por PlanMob, que é o instrumento por meio do qual efetiva-se a PNMU. O PlanMob deve contemplar em seus princípios, objetivos e diretrizes uma mobilidade mais sustentável, equitativa, efi ciente, segura e democráti- ca. A Lei Federal 12.587/2012 determina ainda que o PlanMob seja integrado e compatível com o Plano Diretor de cada município. A elaboração e instituição do Plano de Mobilidade Urbana é obrigatória para os municípios: • com mais de 20 mil habitantes; • que integrem uma região metropolitana, região integrada de desenvolvimento econômica ou uma aglomeração urbana com população total acima de 1 milhão de habitantes; • e para os que compõem áreas de interesse turístico, como cidades litorâneas cuja mobilidade é alterada por conta da chegada frequente de turistas em períodos como férias, feriados ou fi nais de semana. O prazo para a elaboração e aprovação do PlanMob, de acordo com a Lei nº 14.000, de 19 de maio de 2020 é: • até 12 de abril de 2022 - para municípios com mais de 250.000 (duzentos e cinquenta mil) habitantes; e • até 12 de abril de 2023 - para municípios com até 250.000 (duzentos e cinquenta mil) habitantes. 26 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 27CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA A elaboração do PlanMob, que defi ne as metas para curto, médio e longo prazo, resulta em um projeto de lei que deve ser aprovado pela Câmara Municipal. Sua aprovação faz com que a gestão municipal tenha a obrigação de cumprir o proposto, sob pena de improbidade. A condição legal corrobora com a continuidade das ações previstas e o PlanMob efetiva-se como importante instrumento para orientar o orçamento públi- co municipal no que se refere aos investimentos e à gestão da mobilidade urbana como um todo. Além dos aspectos administrativos, jurídicos e de gestão, a aprovação do Plano confere ao município o poder de pleitear recursos federais destina- dos à mobilidade urbana. Caso o PlanMob ainda não tenha sido aprovado, a verba poderá ser solicitada somente para a elaboração do próprio plano. Contudo, ainda que seu município não se enquadre em nenhum dos crité- rios de obrigatoriedade estabelecidos na PNMU, a elaboração do PlanMob é fundamental para o desenvolvimento sustentável e orientado das cidades. 1.3 Benefícios A elaboração e implementação do PlanMob trazem consigo uma série de benefícios para a cidade e seus habitantes. Além de tornar o espaço urbano mais acessível e equitativo, tornar o deslocamento fl uido e seguro e aprimo- rar a infraestrutura viária, podemos elencar outros impactos positivos para qualidade de vida e para a gestão municipal, dentre eles: • Inclusão social, por ampliar a oferta e o acesso ao transporte público, aumentar a capilaridade para os deslocamentos ativos, diminuir a segregação espacial e barreiras urbanas, reduzir custos tarifários e integrar diferentes modos e rotas de deslocamento no o sistema mobilidade urbana. • Saúde coletiva, por ofertar condições adequadas aos deslocamentos ativos, reduzir os riscos de colisões e atropelamentos e reduzir a poluição do ar; • Segurança pública, por tornar os espaços públicos acessíveis, mais atrativos e amigáveis para a população; • Qualidade ambiental, pela priorização de modos de transporte que não emitem poluentes atmosféricos¹; • Orçamento público, por reduzir os custos de saúde pública com acidentados no trânsito e doenças crônicas² e por possibilitar transferência de recurso da união para o município investir na mobilidade urbana; • Economia, por aumentar o acesso das pessoas aos serviços e comércios estimulando o consumo, trabalho e renda, bem como por reduzir perdas de produtividade dos trabalhadores³; 1. De acordo com os dados do Sistema de Informações da Mobilidade Urbana - 2020, da ANTP, os modos de transporte motorizados individuais são os principais emissores de gases entre os modos de transporte. 2. De acordo com os dados do Sistema de Informações da Mobilidade Urbana - 2020, da ANTP, o Brasil gasta mais de 140 bilhões de reais por ano com acidentes de trânsito, poluição é ruído. 3. Segundo ANTP (2019), Pero & Stefanelli (2015) e Monteiro (2013), a permanência em trânsito além do tempo ideal, ocasionada por congestionamentos, teria impactos diretos sobre a produtividade do trabalhador. 28 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 29CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA A médio e longo prazo, a implementação de uma política muni- cipal de mobilidade urbana se traduz na oportunidade de efetivar o desenvolvimento urbano orientado ao transporte sustentável (DOTS)4, estimulando, por exemplo, a ocupação urbana mais com- pacta, com densidade sustentável, diversidade de usos e melhoria dos espaços públicos de forma conjugada a um sistema de deslocamento de pessoas e cargas, acesso a bens e serviços de maior qualidade e melhor funcionalidade. 1.3.1 Como medir esses benefícios? Um aspecto relevante quanto a elaboração de planos de forma geral é a utilização de métricas na escala municipal para o desenvolvimento local e, no caso do PlanMob, melhoria das condições de mobilidade urbana. A adoção de indicadores deve favorecer comparações de resultados entre municípios ou regiões, por exemplo. Mas o objetivo principal é poder ava- liar a efetividade das estratégias adotadas, medir os impactos positivos e negativos e, com base em dados, calibrar rumos e orientar ações por setor, utilizando indicadores específi cos para cada tipo de ação. Para isso, os instrumentos de quantifi cação devem se aproximar da realidade e da escala do município, para que os agentes envolvidos se apropriem dessas métricas e tenham foco na gestão por resultados. É possível encontrar alguns exemplos de metas e indicadores de mobilidade urbana no portal dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU5. Neste contexto de métricas e indicadores, o emprego de dados aber- tos é um dos principais instrumentos para a transformação e inovação em políticas públicas no geral, permitindo que os cidadãos se informem e participem das ações realizadas pela Prefeitura. Assim, é necessário incluir informações da política de mobilidade em plataformas já existentes, como o Portal da Transparência, bem como mantê-las atualizadas. 5. Acesse as metas e indicadores do ODS 11 - Cidades e comunidadessustentáveis em: http://portalods.com.br/ ods/ods11-cidades- e-comunidades- sustentaveis/ 4. Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS) é um modelo que busca reorientar as políticas e estratégias de planeja- mento e desenho urbano (EMBARQ, 2015) Como é possível perceber, esses benefícios vão além da pasta de mobi- lidade e transportes, englobando também saúde, meio ambiente, segurança, orçamento etc. Mesmo considerando a grande diversidade de municípios brasileiros e de seus cidadãos, os impactos positivos tra- zidos pelos Planos de Mobilidade Urbana aos municípios são muitos. Desta forma, independentemente da obrigatoriedade do município de ela- borar o PlanMob, é visível que se trata de uma medida interessante e opor- tuna para a melhoria das cidades brasileiras. Para isso, é essencial compre- ender como essa melhoria pode ser traduzida em números e o que fazer com esses dados. Além de permitir que a sociedade civil acompanhe o que está sendo feito, a atualização e publicização dos indicadores é essencial para o monitora- mento da política de mobilidade e sua melhoria, identifi cando gargalos, desafi os e novos problemas que demandam atenção. Desta forma, é essen- cial mensurar os benefícios do PlanMob e utilizar essas informações de for- ma transparente e atualizada. Diante disso, deve-se também atentar para os desafi os e difi culdades de elaborar e implementar o PlanMob, como aborda a seção a seguir. 30 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 31CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA 1.4 Desafi os de elaborar e implantar o PlanMob Ao decidir colocar um projeto em prática, seja ele qual for, é importante compreender quais as barreiras e difi culdades que serão encontradas ao longo do caminho. O mesmo acontece ao decidir elaborar e implantar um Plano de Mobilidade Urbana. Felizmente, o objetivo desse manual é justamente deixar esse caminho menos tortuoso e dar suporte a essa empreitada. Quando se resolve elaborar um PlanMob, a primeira difi culdade que pode surgir é justamente entender “O que é um Plano de Mobilidade Urbana?” e “Qual a importância de elaborar um PlanMob para minha cidade?”. Bem, se você já chegou até aqui e leu atentamente os itens anteriores, então essas dúvidas já foram sanadas e nós podemos seguir para os próximos desafi os. No caso de municípios que integram aglomerados urbanos, uma solu- ção encontrada pode ser a formação de consórcios para a busca de recursos de forma conjunta. Um exemplo foi a parceria fi rmada entre alguns muni- cípios da região metropolitana do Rio de Janeiro, o estado do Rio de Janeiro e o Banco Mundial para a construção conjunta de planos locais para nove municípios da região dentro de um mesmo contrato. Ao mesmo tempo em que há o aspecto positivo de elaboração do plano com recursos que prova- velmente não estariam disponíveis se cada um desses municípios fossem buscar sozinhos, há também uma garantia de visão estratégica regional conjunta através dessa elaboração concomitante (Maranhão, 2017). 6. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços 7. Fundo de Participação Municipal Dentre as barreiras críticas para a elaboração do PlanMob, uma das primeiras a ser considerada pela administração pública é a falta de recur- sos fi nanceiros: seja para elaboração própria do plano, contratação de equipe especializada, ou mesmo para coleta de dados essenciais. Esse pro- blema é evidenciado na medida em que grande parcela dos municípios brasileiros tem em sua maior fonte de receita as transferências estaduais de ICMS6 e federais do FPM7 (Maranhão, 2017). Neste contexto, além da possibilidade de captação de recurso fede- ral para a elaboração do PlanMob a prefeitura poderá efetivar coope- ração técnica ou convênio com instituições de ensino superior, esta- belecer parcerias com instituições não governamentais ou mesmo integrar projetos com organismos de cooperação internacional que atuam no Brasil com foco na temática urbana e ambiental. O próximo item na lista de obstáculos que deve chamar a sua atenção é a disposição ou não de uma estrutura administrativa adequada e a exis- tência de corpo técnico capacitado e dedicado à implementação da polí- tica de mobilidade urbana. É estratégico que o município defi na um “grupo de trabalho composto por dirigentes públicos e técnicos multidisciplina- res” (WRI, 2017) que serão responsáveis por organizar e executar as ativida- des de elaboração do PlanMob. A escala do município e a sua capacidade de gerir recursos tem impac- to direto na organização desse grupo de trabalho. Muitos municípios não irão dispor de tempo, dinheiro ou pessoal capacitado para avançar na ela- boração do PlanMob. Assim, é necessário que o gestor avalie esses aspectos e decida se irá formalizar comissões responsáveis para executar as atividades do Plano ou se irá contratar uma equipe terceirizada para dar suporte ao município ou até mesmo elaborar o PlanMob. 32 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 33CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Além da possibilidade de captação de recurso federal, de formalizar parceria com instituições de ensino superior ou organismos nacionais ou internacionais, a administração municipal poderá investir na qualifi cação ou requalifi cação dos técnicos multidisciplinares que estarão envolvidos no planejamento e gestão do transporte e da mobilidade do município. Nesse sentido existem diversas cartilhas, programas e guias produzidos pelo governo federal e por entidades como ITDP e o World Resources Institute – WRI (item 1.6) para auxiliar o corpo técnico do município. O Programa Nacional de Capacitação das Cidades (Capacidades) é um exemplo de iniciativa por parte do Governo Federal que capacita agentes públicos em todas as esferas de governo, inclusive municipal. O Programa também presta assessoria ao desenvolvimento de planos, programas e ações locais em áreas diversas, dentre as quais pode-se destacar as de mobilidade, trânsito e transporte8. Ainda é importante considerar que, assim como as cidades, os bairros e os habitantes também são diversos. Há diferentes realidades dentro de um mesmo município e nesses espaços há pessoas de diferentes clas- ses sociais, gêneros, idades, profi ssões, religiões, dentre várias outras características, as quais interferem na forma como a população acessa o município e seus serviços. A exemplo do modo em que homens e mulhe- res se deslocam pela cidade, bem como os modos de transporte utilizados e os horários mais convenientes para cada grupo, para citar apenas algumas diferenças na forma em que todos os cidadãos e cidadãs se locomovem pelo ambiente urbano. Os municípios de pequeno e médio porte podem encontrar difi cul- dades para elaborar o Plano de Mobilidade por conta dacomplexidade do levantamento das informações necessárias à sua elaboração. Essa situ- ação acabou obrigando alguns municípios a contratar empresas de con- sultoria que realizassem os estudos pertinentes ao PlanMob (Machado e Piccinini, 2018). Porém, é relevante destacar que esse processo não deve ser genérico e ocasionar a simples replicação de um Plano já elaborado por outra cidade, visto que o Plano só terá efetividade à medida que consi- derar todas as particularidades do município. 8. Acesse o “Programa Nacional de Capacitação das Cidades (Capacidades)” em: http://www. capacidades.gov.br/. Além desses aspectos, é sempre relevante que os responsáveis pela elabo- ração do PlanMob compreendam a realidade local. As cidades brasileiras são muito diferentes. Características geográfi cas, demográfi cas, ambien- tais e culturais, que dentre muitas outras, demandam que a organização do espaço e a regulação dos transportes sejam adequadas às características próprias. Mas, mesmo diante da diversidade de cenários, há questões comunsem todo o Brasil que devem ser consideradas quando o assunto é elaborar e implementar o PlanMob. Destacam-se aqui os problemas relacionados à falta de transporte público coletivo de qualidade; falta de acessibilidade; a priorização do transporte individual motorizado em detrimento do trans- porte não motorizado, dentre outros. A ausência ou inadequação de legislação urbanística atual, como o Plano Diretor ou a Lei de Zoneamento, Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo Urbano, também pode difi cultar a elaboração do PlanMob. É importante integrar e atualizar, sob os mesmos princípios e objetivos, as políticas de ordenamento territorial e as políticas de mobilidade. 34 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 35CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA É fundamental que no PlanMob sejam considerados e equacionados os diversos interesses representados por esses atores sociais. Para isso ocor- rer na tomada de decisões, é necessário compreender o poder de infl uência e relevância dos atores junto a opinião da sociedade. Grupos que são constituídos por população em situação de vulne- rabilidade, com baixa infl uência social e capital, devem ser consultados e informados com maior frequência. Por outro lado, grupos de atores com alta infl uência devem ser inteirados do que está acontecendo, porém precisam ser geridos a fi m de evitar que induzam o processo de forma a atender interesses próprios em detrimento dos interesses coletivos. O Plano de Mobilidade é um instrumento de uma política setorial, e pode-se tornar difícil, por exemplo, estabelecer áreas com redução de estacionamento se a Lei de Zoneamento, por outro lado, obriga a cons- trução de um espaço com número mínimo de vagas. É necessário que haja articulação entre as legislações vigentes para promover a integração entre as políticas públicas setoriais (por exemplo: habitação, meio-ambien- te, saúde). Por fi m, temos a necessidade de engajamento da gestão pública e de agentes sociais envolvidos na política de mobilidade urbana. Os gestores públicos são importantes para: mediar os confl itos que eventualmente irão surgir; garantir a continuidade de elaboração bem como de implantação do Plano e envolver todos os agentes sociais que são impactados diretamente ou indiretamente pela política local de mobilidade urbana. Os principais agentes sociais envolvidos na política local de mobilida- de urbana, por sua vez, compõem a sociedade civil. Evidenciar a questão da mobilidade urbana para que a própria população compreenda a importân- cia, seus direitos e deveres frente a gestão das prefeituras é fundamental para o sucesso de elaboração e implantação do Plano de Mobilidade. Entre esses atores, geralmente estão presentes: • Comunidades de bairro, comerciantes e associações; • Entidades e ativistas ambientais; • Entidades Acadêmicas; • Movimentos sociais. • Representantes dos setores secundário e terciário da economia; • Representantes do setor de turismo; • Poder legislativo; • Poder executivo e corpo técnico da prefeitura; • Ministério Público; Apesar da diversidade de barreiras que deve ser superada para elaborar o Plano de Mobilidade Urbana, ele é uma ferramenta importante para garantir o direito à cidade, diminuir desigualdades e melhorar a qualidade de vida das diferentes populações. O item a seguir apresentará um cenário geral sobre o número de muni- cípios que elaboraram o PlanMob e ainda alguns exemplos destacando aspectos benéfi cos e difi culdades enfrentadas. 36 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 37CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA 1.5 Quem já fez e como fez? Nesse sentido, avaliar os desafi os de elaborar e implantar o Plano, já tratados neste documento, pode ser um caminho de refl exão e superação a essa defasagem, considerando ser possível que parte expressiva dos muni- cípios segue omissa muito mais por faltar-lhes a compreensão de como fazer e por terem difi culdades de enfrentar simultaneamente as urgências dos diversos setores da administração pública, do que por não terem inte- resse em solucionar os problemas de mobilidade de sua população. Conhecer iniciativas que superaram difi culdades e alcançaram bons resultados, mesmo ainda tendo desafi os a transpor, pode auxiliar as admi- nistrações públicas a encontrar um caminho na elaboração de seus Planos de Mobilidade Urbana. Nesse sentido, este guia apresenta a seguir três experiências de municípios de diferentes regiões do Brasil e com diferentes escalas populacionais que podem inspirar caminhos a outras administra- ções, a partir de como fi zeram. O Brasil possui atualmente 5.569 municípios mais o Distrito Federal e, des- tes, 3.476 se enquadram nos termos da lei e devem elaborar seus PlanMob (IBGE, 2019; MDR, 2019). No levantamento realizado pela Secretaria Nacional de Mobilidade e Serviços Urbanos (SEMOB) identifi cou-se que, até o mês de dezembro de 2019, apenas 321 municípios afi rmaram possuir Plano de Mobilidade Urbana, sendo 53% com mais de 250 mil habitantes (MDR, 2019). Este total equivale a 37% da população brasileira, ou seja, 63% não possui diretrizes de mobilidade urbana adequadas ao planejamento do seu muni- cípio. O levantamento identifi cou ainda que 839 municípios declararam possuir plano de mobilidade urbana ou estar em processo de elaboração do mesmo, o que demonstra que há uma parcela relevante de gestores sensibilizados quanto à importância de elaborar os seus planos. A pesquisa destaca que desses 839 municípios a maioria possui acima de 250 mil habi- tantes, o que é coerente se levarmos em consideração os problemas nos deslocamentos cotidianos (MDR, 2019). Destaca-se que mesmo com todos os incentivos temporais e fi nanceiros proporcionados pelos programas federais, como o Avançar Cidades, é notó- rio que a adesão dos municípios no que tange a elaboração dos seus Planos de Mobilidade Urbana ainda não foi sufi ciente. Torna-se assim, importante compreender por que apenas 14% dos respondentes, ou seja, apenas 321 declararam possuir o PlanMob elaborado. 38 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 39CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Figura 1. Estações de bicicletas em Fortaleza/CE. Fonte: Bicicletar, 2020. Figura 2. Rede cicloviária de Fortaleza/CE. Fonte: Google Maps, 2020 1.5.1 Experiência de Fortaleza/CE Para uma cidade com população superior a 1 milhão de habitantes, Fortaleza possui um grande conjunto de aspectos positivos a serem ressaltados no que se refere ao Plano de Mobilidade Urbana. A cida- de apresenta a maior densidade demográfi ca do país, índice superior ao da cidade de São Paulo, segundo dados do IBGE de 2010, e a região metropolitana de Fortaleza é a maior do Norte e Nordeste e a 6ª do Brasil no que se refere à população, com 4.074.730 milhões de pessoas (O POVO, 2018). Após a exposição de todos esses dados é de se imaginar a magnitu- de dos desafi os encontrados na capital cearense e a necessidade de uma boa mobilidade urbana. A publicação do Plano de Mobilidade Urbana de Fortaleza data de 2015 e, posteriormente, foi integrado ao Plano Mestre Urbanístico e de Mobilidade, o Fortaleza 2040. De 2015 para 2020, a cidade de Fortaleza avançou em diversas áre- as. Foram implantadas 162 estações de bicicletas públicas compartilha- das, número que representa pouco mais que o dobro dos equipamen- tos disponíveis até o fi nal de 2019, quando totalizava 80 estações, e cerca de 320km de rede cicloviária na cidade, sendo 195 km de ciclofaixas, 111 km de ciclovias, 10 km de ciclorrotas e 0,2 km de passeio compartilhado (Figuras 1 e 2). A cidade também implementou um conjunto de ações para o fomento do transporte ativo e para a redução de acidentes graves, atuando na redução das velocidades de algumas de suas vias, de 60km/h para 50km/h ou 40km/h, na construçãode 34 travessias elevadas para pedestres e 44 prolongamentos de calçadas no entorno de escolas e unidades de saúde e na implementação de nova sinalização horizontal e vertical (Figura 3), pintura de faixas de retenção para motociclistas, implantação de placas alertando a proibição de estacionamento nas áreas de esquinas para melhorar a visibilidade, além de tachões que reduzem gradualmente a velocidade do condutor. 40 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 41CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Figura 3. Exemplo de travessia eleva- da em Fortale- za/SC. Fonte: Mobilidade Fortaleza, 2020 Figura 4. Intervenção temporária em Fortaleza/SC. Fonte: Prefeitura de Fortaleza, 2018 Também foram aplicadas intervenções temporárias nas ruas, para tor- ná-las espaços mais seguros e convidativos (Figura 4), foi realizada a valida- ção do bilhete único, facilitando a troca entre ônibus, trem e bicicleta com- partilhada e a construção de mais de 100 km de corredores exclusivos para o transporte público, e dois corredores de BRT que totalizam 17,4 km. Todas essas iniciativas e ações contribuem para a melhoria e a segu- rança do ir e vir das pessoas. Exemplos disso é o recebimento, em 2018, do prêmio de cidade mais inspiradora em compartilhamento de bicicletas do Brasil. A cidade também foi agraciada em 2019 com Sustainable Transport Award (Prêmio de Transporte Sustentável) de cidade exemplo de mobilida- de urbana no mundo. A conquista em 2020 do prêmio Visão Zero da FIA Foundation, organização da Federação Internacional de Automobilismo, criada para divulgar e estimular ações que visam a redução das mortes no trânsito. Além disso, em 2020, Fortaleza conseguiu atingir a meta da ONU de reduzir pela metade as mortes no trânsito. E mesmo se destacando nas ações relacionadas à mobilidade urbana nos últimos anos, vemos que ainda há diversos aspectos a serem melho- rados. Em Fortaleza, por exemplo, entre os anos de 2015 e 2019 ainda não haviam sido instaladas as estações de monitoramento do ar que estavam previstas no Plano de Mobilidade Urbana de 2009 e que faziam parte do Projeto de Monitoramento da Poluição do Ar. Outro exemploa dimi- nuição da cobertura vegetal, entre 2013 e 2017, que impactou negativa- mente no conforto térmico para a utilização do transporte ativo. Assim, é possível compreender que planejamento adequado da mobilidade urba- na possui papel fundamental no desenvolvimento urbano sustentável. As cidades são organismos que se encontram em constante mudança e é papel gestor público compreender as necessidades da população que ali vivem e agir para efetivação e promoção das melhorias nesse espaço urbano. 42 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 43CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Figura 5. Divisão modal do município de Joinville/SC em 2010. Fonte: JOINVILLE (2017) Figura 6. Confi guração da rede cicloviária de Joinville/SC. Fonte: Secretaria de Pla- nejamento Urbano e Desenvolvimento Sustentável (2017) 1.5.2 Experiência de Joinville/SC Entre as cidades com mais de 500 mil habitantes e menos de 1 milhão habi- tantes, destaca-se Joinville, a maior cidade do estado de Santa Catarina, com uma série de aspectos positivos relacionados à sua mobilidade urbana a serem ressaltados. O PlanMob foi desenvolvido pelo município em conjun- to com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e a Embarq Brasil, empresa que presta cooperação técnica para implantação dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da Mobilidade. A cidade que nos anos 80 tinha a bicicleta como um dos meios de transporte mais utilizados viu isso desaparecer completamente nas décadas que se seguiram. As ruas estreitas e lotadas de carros eram desestimulantes para os ciclistas. Apesar disso, o índice de uso desse meio de transporte é bastante alto se comparado a outras cidades (Figura 5), o que torna evidente o seu grande potencial de crescimento. Foi nessa perspectiva que o Plano de Mobilidade Urbana de Joinville (2016) buscou aprimorar a divisão entre os diferentes modos de transpor- te, aumentando a parcela de utilização dos transportes não motorizados, tais como o caminhar a pé e o uso da bicicleta. Entre os anos de 2015 e 2020, Joinville ampliou sua infraestrutura ciclável para diversas áreas da cidade, conforme pode ser observado na Figura 6. É importante ressaltar que, de forma complementar ao desenvolvi- mento do PlanMob, e observando a necessidade de investir na melhoria das calçadas e vias, a cidade de Joinville elaborou também um Plano Diretor de Caminhabilidade. Odesenvolvimento de um plano de ação voltado à conservação e melhoria das calçadas pode incentivar e promover segu- rança para os pedestres na cidade. 44 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 45CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Figura 7. Pirâmide inversa de prioridade no trânsito. Fonte: ITDP, 2012. 1.5.3 Experiência de Cacoal/RO Cacoal fi ca localizada em Rondônia, na região norte do Brasil, tem uma população estimada de 85 mil habitantes e teve seu Plano de Mobilidade Urbana elaborado em 2017 por consultoria contratada através de licitação. A cidade passou por intensas transformações socioespaciais nas últimas 4 décadas em decorrência da expansão de atividades agrícolas e industriais. Essas mudanças geraram grande demanda por oferta de infraestruturas públicas e ocasionaram também a expansão da mancha urbana, levando a população a realizar deslocamentos cada vez maiores para a efetivação de suas necessidades cotidianas. Esta urbanização, associada à defi ciência da cobertura do transporte público e a precária infraestrutura voltada aos modos ativos induziu ao grande crescimento do transporte motorizado individual. O PlanMob da cidade visou então a democratização do acesso à mobi- lidade, privilegiando os modos ativos e o transporte coletivo. Considerou 7 diretrizes temáticas ao longo de um horizonte de 15 anos: o sistema viá- rio, os modos não motorizados, o transporte público, transporte de cargas, a estrutura de gestão e as políticas integradas. Na escala de prioridades, o acesso à cidade através da qualifi cação da macro e microacessibilidade das centralidades de bairro, estimulando o desenvolvimento socioeconômico em áreas residenciais pela diversifi ca- ção de atividades. Como estratégia, o plano pautou a ampliação da oferta de infraestrutura viária e de transporte, levando em consideração caracte- rísticas existentes do município, e priorizando a sustentabilidade através de regulamentação normativa e contrapartidas sociais para amenizar o impac- to do transporte individual motorizado. Por último, foram feitas propostas, plano de ação e monitoramento da implementação visando contemplar as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Ações como a integração tarifária, programas educati- vos, rede pedonal, rede cicloviária, estruturação do sistema de transporte coletivo, entre outras. 1.6 Como elaborar um PlanMob? Agora que já sabemos o que é um PlanMob, qual a sua importância, seus objetivos, diretrizes e conhecemos alguns exemplos, é necessário dar um passo à frente e também entender como podemos elaborá-lo. Este texto fala sobre os primeiros passos para fazer isso acontecer. Dentre as diretrizes apresentadas pela Política Nacional de Mobilidade Urbana e instituída pela Lei Federal 12.587, destaca-se a integração do Plano de Mobilidade Urbana às demais políticas setoriais e instrumentos legais do município, como o Plano Diretor e a Lei de Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo Urbano, por exemplo. Destaca-se ainda a importância de priorizar os modos de transpor- te não motorizados sobre os motorizados, seguindo como referência a pirâmide inversa de prioridade na mobilidade urbana (Figura 7). 46 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPALDE MOBILIDADE URBANA | 47CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Além das diretrizes previstas em lei, o Governo Federal disponibiliza cartilhas para auxiliar na elaboração do PlanMob. Como exemplo, temos a publicação “Programa de Apoio à Elaboração de Planos de Mobilidade Urbana – Manual de apoio aos municípios de até 100 mil habitantes” (Brasil, 2017)9 que é direcionada às cidades de pequeno porte. Esse manual simpli- fi ca tanto as informações sobre a estrutura do PlanMob, quanto apresenta uma metodologia simplifi cada para ser aplicada aos municípios com popu- lação inferior a 100 mil habitantes e auxiliá-los a construir o Plano9. Para os municípios de médio e grande porte, o Governo Federal desenvolveu o “Caderno de Referência para Elaboração de Plano de Mobilidade Urbana” (Brasil, 2015)10, que aborda o passo a passo para elabo- rar o PlanMob. O método apresentado neste caderno é baseado no guia “Sete Passos – Como Construir um Plano de Mobilidade Urbana”11, produzi- do pelo WRI (2017) e totalmente voltado à realidade das cidades brasileiras. Os 7 passos contam com 26 atividades técnicas e institucionais, complementadas por outras referências e exemplos de boas práticas e que direcionam a elaboração do PlanMob. Para facilitar a compreensão das etapas de elaboração desse documento, iremos falar sobre cada um dos passos, destacando atividades essenciais que devem ser colocadas em prática ao decorrer desse processo. 1.7 Sete passos para elaborar o Plano de Mobilidade Urbana Passo 2 Defi nição do escopo Para começar a preparar o PlanMob é necessário que o gestor público defi na um Grupo de Trabalho (GT) que será responsável pela organiza- ção das atividades referentes ao Plano. É interessante que essa equipe seja multidisciplinar e possa contar com o apoio e participação de outras Secretarias e órgãos públicos para abranger aspectos diversos do planeja- mento do sistema de transportes. O GT será responsável por elaborar uma base de dados com informações e fontes de consulta sobre o município, a exemplo de estudos prévios, pro- jetos, e legislações ligados à mobilidade urbana e ao planejamento/desen- volvimento urbano. Nesse momento deve-se conhecer as informações que existem sobre o município que possam ser transformadas em um pré-diag- nóstico sobre a área de interesse. Além disso, o poder público deve anunciar para a população que está ela- borando o PlanMob. Tal divulgação precisa informar e também atrair inte- ressados(as) na elaboração desse documento. A participação de pesso- as e grupos envolvidos, direta ou indiretamente, na elaboração do Plano garante que interesses e necessidades diversas sejam considerados e que o PlanMob seja construído de forma participativa e democrática. (ITDP, 2012). Através de diálogos com a população, defi ne-se uma visão de cidade. A pergunta “que tipo de cidade queremos para todos?” (WRI, 2017) pode orientar os diálogos com a população e auxiliar a estabelecer um modelo a ser seguido. Esses diálogos também podem levantar quais as necessi- dades e problemas enfrentados pela população que se transformam em objetivos para o PlanMob, bem como podem apontar áreas de inter- venção de maior interesse para os moradores do município. Os objetivos, por sua vez, serão transformados em metas mensuráveis e executá- veis em horizontes de ações de, geralmente, curto, médio e longo prazo. Outro ponto a se atentar é a preocupação com o meio ambiente, as áreas de abrangência territorial e as relações com os outros planos existentes na cidade. Passo 1. Preparação 9. Acesse o “Programa de Apoio à Elaboração de Planos de Mobilidade Urbana – Manual de apoio a municípios de até 100 mil habitantes” em: <http://www.capacidades. gov.br/biblioteca/detalhar/ id/344/titulo/programa-de- -apoio-aelaboracao-de-pla- nosde-mobilidade- urbana>. 10. Acesse o “Caderno de Referência para Elaboração de Plano de Mobilidade Urbana” em: <https://it- dpbrasil.org/planmob//>. 11. Acesse o “Sete Passos – Como Construir um Plano de Mobilidade Urbana” em: <https://wribrasil.org.br/pt/ publicacoes/sete-passos- -como-construir-um- plano-de-mobilidade- urbana>. 48 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 49CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Neste passo devem ser estabelecidas as parcerias e convênios que irão auxiliar a elaborar o Plano. De acordo com o porte do município, capacidade do corpo técnico e disponibilidade de recursos, pode-se optar por elaborar o PlanMob exclusivamente com as equipes e recursos locais do município ou contratando uma equipe especializada. Independente da escolha, é importante formalizar as parcerias e defi nir o que será feito atra- vés de um Termo de Referência (TR). Este documento determina quais ser- viços técnicos serão realizados, orienta os profi ssionais envolvidos e explicita os recursos disponíveis (WRI, 2017). O TR também defi ne como será o plano de comunicação e sistemática de participação popular, e deve deixar claro como a população irá fazer parte da elaboração do PlanMob e como todos os atores se envolverão no processo. Nessa etapa também é gerado um cronograma detalhado contendo todos os detalhes das atividades, produ- tos, responsáveis, datas e eventos previstos no TR. Após a elaboração e a aprovação do Plano de Mobilidade, chega-se à implementação do PlanMob. Neste passo é importante observar: i. Boa comunicação e cooperação intersecretarial; ii. Gestão democrática que conte com mecanismos claros de participação cidadã; iii. Cumprimento de cronograma sempre observando as estratégias de curto, médio e longo prazos. Eventualmente, neste ponto percebe-se a necessidade de informações adi- cionais ou fontes de fi nanciamento complementares para o planejamento e execução da diretriz. Esses projetos complementares podem ser execu- tados diretamente pela administração pública, ou indiretamente, a partir de contratações (licitações, termo de cooperação, encomenda tecnológica). Na implementação do PlanMob, metas e indicadores são refi na- dos e podem ser revisados. É importante destacar que o monito- ramento dos indicadores deve ocorrer de forma simultânea à implementação das diretrizes do plano, com objetivo de verifi car o progresso de execução e evolução das propostas. Os dados do monitora- mento devem ser disponibilizados de forma transparente e em linguagem acessível para a sociedade civil e demais atores ligados ao tema. É neste passo em que se elabora um diagnóstico amplo sobre a situação de mobilidade urbana do município ou área de interesse. Esse diagnós- tico pode contar com pesquisas de demanda e oferta do sistema de trans- portes (por exemplo, pesquisas Origem-Destino, pesquisas embarque, entre outras); análises sobre Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças (FOFA) referentes ao cenário atual de mobilidade do município (ITDP, 2012); levan- tamento de variáveis socioeconômicas e todas as informações que comple- mentam o pré-diagnóstico realizado nos Passos 1 e 2. As conclusões desse diagnóstico devem gerar cenários que “representem as possibilidades de evolução da mobilidade urbana, nos horizontes de ação estabelecidos” (WRI, 2017). Dessa forma, de acordo com as alternativas apontadas em cada cenário, torna-se possível prever quais impactos e desa- fi os serão gerados no decorrer da implantação do PlanMob. É importante que o método de tomada de decisão dos cenários tenha sido bem descrito no TR, para que a avaliação seja bem feita e resulte em propos- tas concretas e viáveis para o município. O produto dessa atividade é um relatório e quadro síntese, que pode ser dividido por temas, com informações sobre os cenários para subsidiar um programa de ação e, posteriormente, o projeto de lei. O quinto passo gira em torno da elaboração do relatório executi- vo. Esse documento sintetiza todos os resultados alcançados nas etapas anteriores e deve ser avaliado sob a luz da visãode cidade e objetivos determinados no Passo 2. Nesse momento é importan- te que o poder público divulgue amplamente as audiências públi- cas de forma a atrair a população para participar do processo de avaliação e revisão das diretrizes e propostas do PlanMob. A partir desse debate são realizados os ajustes necessários que depois deverão resultar na aprovação integral do PlanMob pela Câmara dos Vereadores, sociedade civil e demais atores envolvidos. Passo 3. Procedimentos gerenciais Passo 5. Aprovação Passo 6. Implementação Passo 4. Elaboração 50 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 51CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA Como nem todas as propostas do PlanMob serão implementadas, é preciso sempre avaliar a partir dos indicadores de moni- toramento e revisar periodicamente o Plano. Na avaliação é preciso considerar dados qualitativos e quantitativos para verifi - car se metas e objetivos estabelecidos estão sendo atingidos. Aspectos sociais, econômicos e políticos precisam ser levados em conta nesta avaliação, que se recomenda que seja feita pelo menos a cada 5 anos. Esse período pode ser reduzido a depender do inte- resse da Administração Pública. O objetivo fi nal da avaliação do Plano é gerar subsídios para a sua revisão e atualização, a partir de parâ- metros comparativos. A PNMU estipula o prazo máximo de 10 anos para a revisão do PlanMob. Mudanças na realidade local, não somente relacionadas à mobilidade urbana, como também aos aspectos socioeconô- micos, culturais, uso do solo e novas tecnologias podem ocorrer, e devem ser considerados na revisão do plano. No processo de revi- são e atualização do plano, todos os critérios e passos para a ela- boração devem ser executados novamente, considerando, claro, o plano anterior para que não se parta do zero. Referências _______. Lei nº 14.000, de 19 de Maio de 2020. Altera a Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana., 19 mai 2020. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Lei/L14000.htm>. Acesso em: 12 dez. 2020. _______. Lei n. 12.587, de 3 de jan. de 2012. Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana, Brasília, DF, jan 2012. Disponivel em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2012/lei-12587-3- janeiro-2012-612248-norma-pl.html>. Acesso em: 12 dez. 2020. 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Avaliação e revisão 52 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 53CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA GUDMUNDSSON, H. (2007) ‘Sustainable urban transport in Scandinavia’, In: 86th Transportation Research Board Conference. Danish Transport Research Institute, Copenhagen. IBGE (2020). Estimativas da população residente para os municípios e para as unidades da federação brasileiros com data de referência em 1º de julho de 2020. Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística - IBGE, Rio de Janeiro, Brasil. 13p. IBGE (2020). Estimativas de população enviadas ao TCU, Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística – IBGE, Rio de Janeiro, Brasil. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/ sociais/populacao/9103-estimativas-de-populacao.html?=&t=resultados>, acesso em 10 dez 2020. ITDP (2012) Planes Integrales de Movilidad - Lineamientos para una movilidad urbana sustentable, Instituto de Políticas para el Transporte y el Desarrollo, México. 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Acesso em 10 dez. 2020 56 | CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA | 57CAPÍTULO 1 - PLANO MUNICIPAL DE MOBILIDADE URBANA RESUMO O aumento crescente da população nas cidades torna os desafi os urbanos para os gestores públicos cada vez mais complexos e multidimensionais, o que conduz à necessidade do trabalho conjunto entre o poder público, as instituições privadas e a sociedade. No cenário brasileiro, onde a mobilida- de urbana se confi gura como uma das principais adversidades do cotidiano urbano, torna-se cada vez mais necessário pensar em diferentes alternati- vas e inovadoras formas participativas de se fazer a gestão da mobilidade urbana. Com base nesta problemática, a participação popular é indicada e referenciada legislativamente, como uma ferramenta para a gestão demo- crática. No presente manual, discutem-se os principais marcos regulató- rios existentes na legislação brasileira, e são indicados caminhos possíveis a serem seguidos no processo de criação, implantação e monitoramento de um dispositivo ou instrumento de participação popular, a partir de seis passos, adaptáveis às diferentes realidades das cidades brasileiras. Por fi m, são apresentados estudos de casos que caracterizam boas práticas em duas diferentes regiões do país. Capítulo 2 FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR: LEGISLAÇÕES, IMPLEMENTAÇÃO, ACOMPANHAMENTO E BOAS PRÁTICAS BRASILEIRAS LUÍS OTÁVIO ROCHA CASTILHO Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG castilholuiis@gmail.com ANÁIRAM LIMA COSTA Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais - CEFET/MG anairamlcosta@gmail.com MARIA LÍGIA CHUERUBIM Universidade Federal de Uberlândia - UFU marialigia@ufu.br MARIA EDUARDA SOUSA CAVALCANTE Universidade Federal do Ceará - UFC brianegidio@yahoo.com.br | 61CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR 1. Introdução O processo de urbanização brasileiro, acelerado a partir da década de 1950, foi pautado no tardio incremento industrial, no intenso fl uxo migratório campo-cidade e na dispersão espacial da malha urbana (Maricato, 2003; Izaga, 2009). Este processo resultou em expressivas desigualdades socioes- paciais, associadas diretamente às questões de acessibilidade e mobilidade urbanas, como também de estrutura e de formação territorial, decorrentes do tratamento inadequado das questões urbanas (Mont’alvão Neto, 2009). Atualmente, cerca de 85% da população brasileira reside em áreas urbanas, das quais 30% vivem em municípios com mais de 500 mil habi- tantes (Brasil, 2015a, 2019). Este cenário de crescimento urbano também é apontado pela ONU (2012), que prevê, para 2050, mais de 70% da população mundial vivendo em áreas urbanas1. Com base nesta problemática, o conceito de “Direito à Cidade” surge com o objetivo de se estabelecer novos caminhos para a gestão dos territórios urbanos, a partir de princípios baseados na sustentabilidade, na democra- cia e na justiça social 2. O exercício do “Direito à Cidade” busca regulamentar as atividades urbanísticas, como por exemplo a mobilidade urbana (Silva, 2010), entendendo a participação popular como essencial à garantia dos direitos democráticos (Azevedo, 2014). No cenário brasileiro, a partir da década de 1980, a pauta do “Direito à Cidade” ganhou destaque a partir de articulações políticas direcionadas à gestão democrática, bem como à função social da propriedade (Bassul, 2002; Brasil, 2004). Estas articulações resultaram na inclusão de três artigos na Constituição Federal: artigo 24, que estabelece a competência para a União, os Estados e o Distrito Federal de legislarem sobre o direito urbanísti- co; e, os artigos 182 e 183, direcionados à Política Urbana (Brasil, 1988). Os artigos 182 e 183 da Constituição foram regulamentados por meio da Lei nº 10.257, que sancionou o Estatuto da Cidade, estabelecendo as diretri- zes gerais da política de desenvolvimento urbano no país: o desenvolvimen- to sustentável; a gestão democrática da cidade; e, a oferta de transportes adequados às necessidades da população e às características locais (Brasil, 2001). A Constituição e o Estatuto da Cidade consolidaram o Plano Diretor como instrumento básico da política de desenvolvimento urbano. A partir de então, além da obrigatoriedade da elaboração de planos diretores para municípios com mais de 20.000 habitantes, é exigido um conteúdo míni- mo a ser apresentado pelos planos, com a fi nalidade de promover a função social da propriedade. Todavia, ainda que os termos “transporte” e “mobilidade urbana” 3 sejam mencionados no Estatuto da Cidade, essa lei discutiu as diretrizes associadas à política de mobilidade urbana, determinando, apenas, a obri- gatoriedade da elaboração do plano de transporte urbano para os municí- pios com população superior a 500 mil habitantes (Brasil, 2001). Assim, outro importante marco no país se refere à Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), estabelecida por meio da Lei nº 12.587 (Brasil, 2012). Em ambas as legislações federais é prevista e indicada a participação popular na gestão urbana brasileira. 1. Fala do Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, em uma mensagem para a 24ª sessão do Conselho de Governança do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-HABITAT). 2. Carta Mundial pelo Direi- to à Cidade. Fórum Social das Américas, 2004; Fórum Mundial Urbano, 2004; V Fórum Social Mundial, 2005. 3. O termo mobilidade urbana foi adicionado ao corpo do Estatuto da Cidade a partir da alteração trazida pela Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. 62 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 63CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR O estabelecimento e o acompanhamento destes canais de participa- ção popular é o foco do presente capítulo, que propõe um passoa passo, visando direcionar e facilitar a implantação de canais de efetiva participação popular. Para tanto, também são apresentados exemplos de boas práticas brasileiras, visando dar direcionamento para uma agenda democrática e participativa na gestão da mobilidade urbana. Neste contexto, cabe aos gestores públicos proporem medidas que visam reduzir os efeitos das desigualdades socioespaciais no cotidiano das cida- des. Um dos caminhos previstos legalmente ocorre em função da participa- ção popular na gestão da mobilidade urbana, a partir da proposição de leis, conselhos, comissões ou outras instâncias participativas. 2. Política Nacional de Mobilidade Urbana Sustentável A Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) está fundamen- tada na ação democrática e na participação popular, para permitir a coor- denação e a integração dos investimentos e das ações de mobilidade em diferentes esferas da sociedade (Brasil, 2004). A Política foi elaborada a partir de conferências municipais realizadas em 3.457 municípios brasileiros, que resultaram na 1ª Conferência Nacional das Cidades, em 2003, por meio da qual foram estabelecidos princípios e diretri- zes da PNDU, e que resultou em outras conferências do Conselho Nacional das Cidades (Concidades) (Brasil, 2004; Tonella, 2013). No Brasil, o Ministério das Cidades e a Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana (SeMOB), extintos por Decreto Presidencial em 2019, apresentaram como objetivo fundamental a estruturação da Política de Mobilidade Urbana Sustentável (PNMU), com foco na implementação de políticas públicas que atendessem às principais demandas das cidades brasileiras, de forma a contribuir tanto ao desenvolvimento quanto à mobi- lidade urbana, atrelados às questões socioeconômicas e ambientais. E, ain- da, integradas à ampla participação social e à universalização do acesso ao transporte público, com a proposta de possibilitar o desenvolvimento insti- tucional e a modernização da regulação do sistema de mobilidade urbana (Brasil, 2004). 64 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 65CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR 4. Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS) é um modelo que busca reorientar as políticas e estratégias de planeja- mento e desenho urbano (EMBARQ, 2015) Em termos constitucionais, o Plano Diretor reafi rma as diretrizes do novo marco regulatório da política urbana nacional, como disposto no Estatuto da Cidade: Art. 2º - I - Garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutu- ra urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações (Brasil, 2001). Desse modo, as cidades brasileiras devem, a partir de então, propor programas de mobilidade para pessoas com defi ciência ou mobilidade reduzida; incentivar o deslocamento de pessoas e a circulação de mercado- rias por diferentes modos de transportes, principalmente os não-motoriza- dos; estimular a utilização do transporte coletivo, garantindo o conforto, a segurança e a tarifa acessível aos usuários; dentre outros (Brasil, 2004, 2012). 2.1. Marcos regulatórios da Política Urbana Nacional A efi cácia das políticas públicas em diferentes níveis governamentais está diretamente relacionada aos interesses e projetos desenvolvidos em con- junto com a sociedade civil, com especial destaque ao desenvolvimento da questão urbana e aos movimentos sociais, conforme o capítulo 2 da Constituição, que destaca a incorporação das demandas da população em inúmeros setores, por meio da criação de instituições e debates participati- vos (Brasil, 1988; Tonella, 2013). No contexto político, a questão urbana teve ênfase com as lutas sociais que visavam a derrubada da ditadura militar ao longo dos anos de 1970 e 1980. O movimento contou com o apoio de associações instaladas em bair- ros periféricos, classes profi ssionais distintas e pessoas de diferentes etnias e gênero, que resultaram na proposta de Emenda Popular da Reforma Urbana concretizada na Assembléia Nacional Constituinte de 1986 (Tonella, 2013). 5. Acesse as metas e indicadores do ODS 11 - Cidades e comunidades sustentáveis em: http://portalods.com.br/ ods/ods11-cidades- e-comunidades- sustentaveis/ A estrutura jurídica que compõe o Estatuto da Cidade compreende o Pla- no Diretor, que visa orientar o crescimento e o desenvolvimento urbano; a Lei de Parcelamento de Uso e Ocupação do Solo (Brasil, 1979), que defi ne como os terrenos de cada zona da cidade devem ser ocupados; os Planos Regionais, que estabelecem as diretrizes para o Plano Diretor no âmbito das subprefeituras, para de permitir a articulação das políticas setoriais com as questões urbanísticas-ambientais, em seus aspectos físicos e territoriais; e, por fi m o Código de Obras e Edifi cações, que defi ne as regras para lotes e construções de edifi cações, priorizando aspectos urbanísticos, ambientais e de vizinhança (Brasil, 2001). Os marcos regulatórios que regulamentam o desenvolvimento urbano no Brasil estão, portanto, de acordo com a Nova Agenda Urbana, aprovada no ano de 2016 pela ONU, bem como com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, também da ONU, tendo por fi nalidade assegurar o Direito à Cidade, a democratização do espaço público e a sustentabilidade urbana. 66 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 67CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR É previsto ainda o Sistema Nacional de Desenvolvimento Urbano, que visa estabelecer mecanismos de cooperação federativa; compatibilizar as agen- das de cidades de pequeno, médio e grande porte em diferentes Estados; e, ainda, o programa de assistência técnica para a qualifi cação, o fortaleci- mento e o aumento da capacidade de gestão (Brasil, 2015b; ONU, 2017). Os desafi os da adoção do DOTS pelos gestores estão associados a questões que contemplam o fi nanciamento, o planejamento e a gestão compartilha- da do território, em especial, no que se refere às políticas de uso e ocupação do solo e de mobilidade (ITDP, 2017). 6. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços 7. Fundo de Participação Municipal O direito à cidade visa garantir aos cidadãos o acesso à infraestrutura urba- na, como saneamento básico, habitação, coleta de lixo, transporte, dentre outros. Em termos práticos, representa o estreitamento entre o poder públi- co e a população, por meio da incorporação das demandas dos cidadãos no processo de gestão pública. Mais recentemente, tem-se introduzido nesta temática o conceito de Desenvolvimento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTS), que busca incentivar o desenvolvimento humanizado das cidades, estimular a mobi- lidade sustentável e promover a maior equidade social no acesso às opor- tunidades urbanas. Este conceito se baseia na qualifi cação do transporte sustentável (ativo e coletivo); no desenvolvimento urbano orientado pela utilização das redes de transportes coletivo de média e alta capacidade; pela distribuição equilibrada das oportunidades urbanas no território; e, por fi m, pela harmonia entre as atividades como habitação, comércio e serviços. Para a implementação de um projeto de DOTS, a estrutura e o sistema de mobilidade urbana devem estar alinhados com certos princípios e obje- tivos fundamentados em políticas urbanas. Dentre eles, tem-se a avaliação do potencial das redes de transportes público; a implementação de proje- tos em áreas com a presença de estações intermodais; o estabelecimento de empreendimentos adequados ao transporte sustentável; e, o monitora- mento, avaliação e participação cidadã (Brasil, 2015c; ITDP, 2017). Inicialmente, é necessário defi nir qual dispositivo 4 de participação popular será efetivado pelo município. As legislações federais quetratam do tema não estabelecem um dispositivo obrigatório, apresentando algumas sugestões para assegurar a participa- ção popular. O Estatuto da Cidade, em seu artigo 43, apresenta: órgãos colegiados; debates, audiências e consultas públicas; e conferências como instrumen- tos para assegurar a gestão democrática. A Política Nacional de Mobilidade Urbana, por sua vez, acrescenta, em seu artigo 15, outros dispositivos: ouvi- dorias e procedimentos sistemáticos de comunicação, de avaliação da satis- fação dos cidadãos e dos usuários, e de prestação de contas públicas (Brasil, 2001, 2012). 3. Implementação e Acompanhamento do Dispositivo de Participação Popular: um passo a passo Nesta seção é apresentado um protocolo básico que contempla as etapas essenciais à implementação e ao acompanhamento de dispositivos de participação popular. Ressalta-se, no entanto, que este compreende uma sugestão de ordem, o que implica que o mesmo possa ser adaptado às diferentes realidades das cidades brasileiras, tendo como foco ou elemento comum o estímulo ao envolvimento da população. 3.1. 1º passo: processo de defi nição do dispositivo Para a defi nição do dispositivo a ser utilizado, devem ser considerados os objetivos e as diretrizes básicas para a política de participação popular, bem como as especifi cidades sociais, o nível de partilha das decisões que se almejam e os fatores da articulação política local. As diversas opções de dispositivos e seu caráter estão dispostos no Quadro 1. 4. No presente documento, as ferramentas de participa- ção popular são nomeadas como “dispositivo” ou “instrumento”, sendo estas palavras empregadas como sinônimos. 68 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 69CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Quadro 1. Tipos de dispositivos e caráter Fonte: Brasil, 2001, 2012. Elaboração própria. Previsão legal • Órgãos colegiados • Consulta pública • Ouvidorias • Procedimentos de avaliação • Procedimentos de prestação de contas Tipos de dispositivos • Conselho • Comitê • Comissão • Junta • Audiência • Conferência • Reunião Caráter • Deliberativo ou consultivo • Consultivo • Deve ser fornecido continuamente, através de meios presenciais, por telefone e pela internet. É importante, também, verifi car o nível de participação popular dese- jado. Existem diferentes níveis de participação, onde, em um primeiro nível, tem-se as categorias onde não há participação da sociedade civil. No segundo nível, encontram-se as categorias que não proporcionam uma ver- dadeira participação, havendo uma simples ilusão da participação, porque neles, as concessões são limitadas e expressas por meio da consulta e de informações manipuladas, confi gurando uma pseudoparticipação. Por fi m, em terceiro nível, ocorre a participação efetiva, onde o Poder Público com- partilha os espaços decisórios com a sociedade (Arnstein, 1969; Souza, 2011; Indi, 2014). A Figura 1 esquematiza os níveis de participação. 70 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 71CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Figura 1. Níveis de participação social Fonte: Adaptado de Arnstein (1969) e Souza (2011). Quadro 2. Legislação, objetivos gerais e previsões mínimas Fonte: Elaboração própria. 3.2. 2º passo: processo de legislação do dispositivo Após a defi nição do dispositivo que será utilizado, é necessário implemen- tar a estrutura jurídica que regulamentará as funções e os papéis do dis- positivo. Nesta etapa, será necessária a criação e a publicação de decretos municipais, para dar a devida publicidade e a legalidade ao dispositivo de participação. Outras legislações complementares podem ser editadas pela secreta- ria, empresa ou órgão que será diretamente responsável pelo dispositivo, observando a correta publicidade de tais determinações. Outra importante defi nição a ser realizada nesta etapa refere-se ao recorte territorial que será utilizado para escolha dos membros e para a recepção de suas demandas. Este recorte deve ser defi nido e apresentado de forma clara em todos os momentos do processo de implementação do dispositivo. Preferencialmente, o recorte territorial deverá ser aquele já estabelecido e utilizado pela cidade, como regional administrativa, bairro, entre outros. No Quadro 2 estão descritas as previsões mínimas que as legislações devem abordar. Legislação • Decreto municipal • Portaria Objetivo geral • Criar, consolidar e estabelecer regras Previsões mínimas • Tipo de dispositivo • Caráter de consulta • Finalidade • Objetivos • Competência • Composição • Recorte territorial (bairros, regionais etc.) • Processo de composição dos membros • Tempo de mandato • Regras gerais de funcionamento • Regras gerais e específi cas de funcionamento • Infraestrutura prevista • Regras gerais e específi cas do processo de composição dos membros, como processo de escolha, apuração e divulgação dos selecionados • Estabelecer normas gerais e regimentos 72 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 73CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR 3.3. 3º passo: processo de escolha dos membros do dispositivo Aqueles contínuos, como as ouvidorias e os demais canais integran- tes do sistema de comunicação, de avaliação por parte dos usuários e de prestação das contas públicas, devem ser abertos a todos os usuários e não podem ser restringidos a um determinado grupo, ainda que este seja repre- sentativo. As audiências, as consultas públicas e as conferências também devem ser abertas a quaisquer interessados, visando acolher todas as sugestões, as opiniões e as reclamações dos usuários. Os órgãos colegiados, por sua vez, podem ser restritos a um determina- do grupo, desde que esse seja representativo da população local. Para tanto, é necessário um processo público, aberto e transparente, para a escolha, por parte da população, de seus representantes legais. Tal processo pode se dar por meio de eleição aberta presencial, de seleção virtual ou por meio de outra ferramenta, garantindo sempre a livre candidatura e a escolha realiza- da por parte da população. Este processo deve ser divulgado, regulamenta- do e regido por uma legislação própria, conforme item 3.2. 9. Acesse o “Programa de Apoio à Elaboração de Planos de Mobilidade Urbana – Manual de apoio a municípios de até 100 mil habitantes” em: <http://www.capacidades. gov.br/biblioteca/detalhar/ id/344/titulo/programa-de- -apoio-aelaboracao-de-pla- nosde-mobilidade- urbana>. 10. Acesse o “Caderno de Referência para Elaboração de Plano de Mobilidade Urbana” em: <https://it- dpbrasil.org/planmob//>. 11. Acesse o “Sete Passos – Como Construir um Plano de Mobilidade Urbana” em: <https://wribrasil.org.br/pt/ publicacoes/sete-passos- -como-construir-um- plano-de-mobilidade- urbana>. O processo de escolha dos membros que irão compor o dispositivo deve ser estabelecido levando em consideração os objetivos e o caráter do instrumento. 3.4. 4º passo: estrutura organizacional para acompanhamento do dispositivo Para o monitoramento do funcionamento do dispositivo de participação popular da Política de Mobilidade Urbana, sugere-se a criação de um setor exclusivo no contexto do organograma do poder público municipal, com equipe capacitada para a análise de desempenho do dispositivo de partici- pação popular, estando o setor vinculado à secretaria ou à empresa/órgão responsável pela gestão da mobilidade urbana no município. Tal setor tam- bém deverá ser responsável pelo processo de seleção dos membros, acom- panhando todo o processo de desenvolvimento do dispositivo. Indica-se que o setor esteja ligado às diretorias e/ou a presidência, de modo a encaminhar as demandas recebidas de maneira direta aos setores responsáveis. Esta indicação visa tornar os processos e aanálise das solicita- ções oriundas mais ágeis, conforme a Figura 2: Ressalta-se que as demandas devem ser acompanhadas desde sua captação até o seu encerramento, com a implantação da medida técnica necessária. 74 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 75CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Figura 2. Proposta-resumo de organograma Fonte: Elaboração própria. Figura 3 Ciclo de comunicação. Fonte: Adaptado de Manual de BRT (2008)5 e ITDP (2020). 3.5. 5º passo: processo de comunicação e mobilização social para funcionamento do dispositivo Com relação à comunicação, é importante identifi car o público-alvo e diversifi car, ao máximo, as formas e as ferramentas de comunicação, nota- damente com a utilização de materiais físicos impressos; redes sociais ofi - ciais da secretaria ou empresa/órgão e da Prefeitura; divulgação em mídias de rádio e televisão; dentre outros. No que se refere ao processo de mobilização social, é essencial que este envolva os líderes comunitários, as associações de bairros e as demandas parlamentares, que servirão de orientação para as demandas e referências pessoais de cada comunidade. O processo de recebimento das demandas por parte do setor respon- sável também é decisivo ao sucesso do dispositivo de participação. Além disso, devem ser criados canais de comunicação diretos entre os membros do dispositivo e o setor responsável. Para o estabelecimento de tais canais, as ferramentas utilizadas devem ser aquelas de conhecimento da comu- nidade, tal como o aplicativo WhatsApp e troca de mensagens via e-mail. Sugere-se, também, a criação de números telefônicos corporativos e contas de e-mails exclusivos para o recebimento e acompanhamento de deman- das encaminhadas pelos membros dos dispositivos. Estes canais de comu- nicação e mobilização também devem ser utilizados para a divulgação de informações úteis às comunidades locais. Apresenta-se como referência o ciclo de comunicação recomenda- do pelo ITDP (2020), que parte da identifi cação do público-alvo para que possa ser desenvolvida uma mensagem que será distribuída e captada por este público-alvo, de forma a engajar a população no acompanhamento do dispositivo de participação e, assim, gerar o marketing do sistema, que se retroalimenta, conforme ilustra a Figura 3. 5. Disponível em: <http:// itdpbrasil.org/manual-de- -brt-guia-de-planejamen- to/> acesso em: dezembro, 2020. 76 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 77CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR 3.6. 6º passo: processo de resolução das demandas apresentadas O processo de participação popular também envolve a resolução das demandas apresentadas pelos membros, quando há possibilidade técni- ca e capacidade fi nanceira. Neste sentido, afi rma-se que, além de ouvir a sociedade, é necessário atendê-la em suas demandas, de modo a legitimar o processo participativo (Monteiro e Miranda, 2019). Para tanto, recomenda-se o direcionamento de uma parcela do orça- mento para o atendimento das demandas apresentadas pelos membros e que forem julgadas pelo corpo técnico como relevantes para a cidade. Este direcionamento auxiliará no empoderamento dos membros e trará benefí- cios à sociedade local, que será diretamente benefi ciada. Tão importante quanto a implantação de soluções técnicas para aten- dimento das demandas, é apresentar respostas, mesmo que negativas, aos membros e no menor tempo possível. O processo de abertura, acompanha- mento e resposta das demandas deve ser transparente e as informações repassadas sempre que possível. 4. BOAS PRÁTICAS BRASILEIRAS Nesta seção são apresentados estudos de casos que caracterizam boas práticas em duas diferentes regiões do país: Belo Horizonte/MG, na região Sudeste e Fortaleza/CE, na região Nordeste. Estes exemplos são descritos com o objetivo de incentivar que iniciativas semelhantes sejam desenvolvi- das e implementadas em diferentes cidades do país, com o apoio de ges- tores, com a fi nalidade de superar os obstáculos mais comuns relativos à efetivação da participação popular. 4.1. Comissão Regional de Transportes e Trânsito - CRTT, de Belo Horizonte - MG Estabelecida em 1994, as Comissões Regionais de Transportes e Trânsito - CRTT de Belo Horizonte são instâncias de caráter consultivo, sugestivo, opi- nativo e informativo, administradas pela Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte - BHTRANS (Belo Horizonte, 2018). Na capital mineira, o processo de regulamentação da CRTT se deu por meio da publicação do Decreto nº 16.635, que consolidou, as normas para o funcionamento da comissão (Belo Horizonte, 2017). Para escolha de seus membros, foram editadas duas Portarias da BHTRANS 6 , que estabeleceram as normas para o processo eleitoral. Os representantes eleitos procedem de vários territórios da cidade, e para a defi nição das áreas que seriam repre- sentadas adotou-se dois recortes territoriais já utilizados na gestão da cida- de: as Regionais Administrativas e os Territórios de Gestão Compartilhada. A utilização de tais recortes auxiliou na divulgação do processo e na identi- fi cação do público-alvo. O processo mais recente para a eleição dos membros foi realizado em 2017 após uma ampla divulgação, tendo contado com 1.145 votos, elegendo 198 membros para as 240 vagas disponíveis (Belo Horizonte, 2020). O pro- cesso de eleição foi coordenado por setor encarregado, exclusivamente, do processo de participação popular na gestão da mobilidade urbana do muni- cípio: a Assessoria de Mobilização Social, dentro da estrutura organizacional da BHTRANS. Esta assessoria está vinculada diretamente à Presidência da BHTRANS em seu organograma atual. 6. Portaria BHTRANS DPR Nº 068/2017 e N° 074/2017. 78 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 79CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Figura 4. Reuniões realizadas pela CRTT. Fonte: Belo Horizonte, 2020. Figura 5. Porcentagem de demandas encerradas e abertas apresentadas pela CRTT. Fonte: Belo Horizonte, 2020. Elaboração própria O acompanhamento das demandas dos membros se dá por meio de reuniões pré-agendadas, chamadas ordinárias, que visam estabelecer espa- ços de discussão e de identifi cação e combinação de demandas; e, também, a partir de reuniões extraordinárias, que objetivam a discussão de assuntos pontuais e locais. Entre a posse dos membros, em 31/08/2017, e outubro de 2020, data de fornecimento dos dados aqui trabalhados, foram realizadas 200 reuniões ordinárias e 283 reuniões extraordinárias, conforme ilustra a Figuras 4, (Belo Horizonte, 2020). Outro importante ponto a ser observado e valorizado na participação popu- lar, é o atendimento das demandas apresentadas pelas comunidades locais. No caso belo-horizontino, foram apresentadas, entre agosto/2017 e dezem- bro/2020, 3.562 demandas, com cerca de 84% destas demandas encerra- das, ou seja, com respostas apresentadas e soluções técnicas, caso exista, implantadas, conforme Figura 5 (Belo Horizonte, 2020).Diante disso, deve-se também atentar para os desafi os e difi culdades de elaborar e implementar o PlanMob, como aborda a seção a seguir. Ainda em relação ao atendimento das demandas apresentadas pelos membros da Comissão, os dados fornecidos apontam que suas solicita- ções foram responsáveis pela implantação de novas sinalizações de trânsi- to em 1.018 pontos da capital. Além disso, outras 13 novas linhas de ônibus foram criadas em Belo Horizonte a partir das demandas apresentadas (Belo Horizonte, 2020) Por fi m, resta pontuar que, visando aperfeiçoar as demandas apresen- tadas e aproximar os membros da CRTT às questões técnicas relativas aos transportes e ao trânsito, a equipe responsável por parte do poder público realiza constante processo de capacitação dos membros, de modo a apri- morar o exercício dos membros, qualifi cando as demandasidentifi cadas, com potencial para reduzir a repetição de solicitações.. 80 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 81CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Figura 6. Relação entre as dimensões da participação social no PMCFor. Fonte: Fortaleza, 2019. 4.2. Plano Municipal de Caminhabilidade de Fortaleza Para o Plano Municipal de Caminhabilidade de Fortaleza - PCMFor, a Prefeitura propôs estratégias de participação popular, publicadas na inter- net por meio do Caderno de Participação Popular (Fortaleza, 2019). Ainda que o PCMFor até o momento de elaboração do presente documento não tenha sido encaminhado à Câmara Municipal pela Prefeitura, julga-se que o material elaborado pela equipe técnica do poder público municipal é um interessante material de referência. O PCMFor terá como objetivo estabelecer diretrizes e ações estraté- gicas de forma a contribuir para a qualifi cação das calçadas em Fortaleza, norteado, resumidamente, pelos princípios da acessibilidade, da priorização do pedestre e da segurança nas travessias. O documento, deverá servir de parâmetro para toda e qualquer intervenção futura no espaço urbano no que se refere aos passeios, as calçadas e aos acessos no município (Fortaleza, 2019). Para a construção do Plano foi defi nida a estratégia de utilização de diversos dispositivos da participação da sociedade civil, atingindo diferentes níveis de participação. Dos dispositivos convencionais da participação popular, tem-se como pro- posta metodológica a realização de ofi cinas participativas e cursos, consul- tas públicas, fóruns e audiências públicas (Fortaleza, 2019). Destaca-se que o PCMFor (Fortaleza, 2019), ao apropriar-se das novas tecnologias, implementou dispositivos inovadores para a promoção da participação popular, como a gamifi cação, técnica que usa elementos de jogos, por meio da interação entre os participantes, para a resolução de problemas e situações reais; e o laboratório vivo, prática que baseia-se em uma perspectiva de cocriação de soluções com os usuários, por meio da experimentação e avaliação de cenários baseados de situações reais. Para a defi nição do escopo do Plano, foi formada, em 2018, a Rede Interdisciplinar e Intersetorial, composta por membros do corpo técnico da Prefeitura, membros da sociedade civil organizada, representantes de universidades e cidadãos difusos. A Rede representa a primeira dimensão da participação social na elaboração do Plano. A segunda dimensão seria composta por cidadãos, em geral, a partir dos dispositivos elencados, visan- do a heterogeneidade de visões e demandas para a elaboração do PCMFor (Fortaleza, 2019). A Figura 6 representa essa estrutura. A proposta metodológica também defi niu a estratifi cação dos dispo- sitivos a serem aplicados à segunda dimensão de participação, a partir do afunilamento do processo de desenvolvimento do PCMFor, de acordo com as etapas, representadas na Figura 7. Para a etapa diagnóstica, foram pro- postas audiências públicas, a aplicação de questionários online e in loco, e a realização de ofi cinas; para a etapa de defi nição de proposições, fóruns e audiência pública; o dispositivo de audiência pública também foi proposto na etapa de regulamentação; e, por fi m, a etapa de consolidação está base- ada na comunicação e divulgação da participação popular (Fortaleza, 2019). 82 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 83CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Figura 7. Proposta de etapas de participação no PMCFor. Fonte: Fortaleza, 2019. Por último, o Caderno de Participação também evidencia a necessidade de mobilização e divulgação para que os processos participativos de discussão de políticas públicas possam realmente ser efetivos. Para tanto, as estratégias adotadas foram a elaboração e distribuição de materiais informativos, como cartilhas e banners; a utilização das redes sociais da Prefeitura para a divulgação das ações e eventos; e, o envio de mensagens via listas de transmissão em aplicativos, como WhatsApp. Para que seja alcançada a efetivação da participação popular em proces- sos de construção e revisão de políticas públicas, deve haver o necessário planejamento por parte do poder público para a inserção qualifi cada dos dispositivos de participação no decorrer do processo de desenvolvimento, identifi cando o público-alvo e delineando as melhores estratégias de apro- ximação da sociedade civil. Referências Arnstein, Sherry R. A ladder of citizen participation. Journal of the American Institute of planners, 35(4), 216-224, 1969. Azevedo, K. F. M. S. de. A importância da participação popular no planejamento urbano. Urbanismo, planejamento urbano e direito urbanístico: caminhos legais para cidades sustentáveis. VASQUES et al. (Org.). 1 ed. CNEC Edigraf. Uberaba - MG, 2014. 91-100. Bassul, J. R. Reforma urbana e Estatuto da Cidade. Revista Latinoamericana de Estudos Urbanos Regionais - EURE (Santiago), Santiago, 28(84), 133-144, 2002. Belo Horizonte. Decreto nº 16.635/2017, de 22 de junho de 2017. Consolida e estabelece normas de funcionamento das Comissões Regionais de Transportes e Trânsito - CRTT do Município de Belo Horizonte e dá outras providências. Belo Horizonte - MG. Belo Horizonte. Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte - BHTRANS S/A. Comissão Regional de Transportes e Trânsito - CRTT. Belo Horizonte - MG. Belo Horizonte. Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte - BHTRANS S/A. Relatórios internos. 2020. Belo Horizonte - MG. Brasil. Lei n° 6.766, de 18 de dezembro de 1979. Dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências. Brasília - DF. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília – DF. Brasil. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Brasília - DF. Brasil. Ministério das Cidades. Cadernos MCidades 6 - Política nacional de mobilidade urbana sustentável. Brasil, Brasília - DF, 2004. 72p. Brasil. Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012. Institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Brasília – DF. 84 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 85CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Cartilha sobre as exigências de aquisição mínima de produtos manufaturados e serviços nacionais. Ações de Mobilidade Urbana do Programa de Aceleração do Crescimento - PAC. Brasil, Brasília - DF, 2015. 22p. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística. IBGE Cidades. Rio de Janeiro - RJ. 2015a. 2019. Brasil. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Acompanhando a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável: subsídios iniciais do Sistema das Nações Unidas no Brasil sobre a identifi cação de indicadores nacionais referentes aos objetivos de desenvolvimento sustentável. Brasília: PNUD, 2015b. 291 p. Brasil. Lei nº 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Institui o Estatuto da Metrópole, altera a Lei n° 10.257, de 10 de julho de 2001, e dá outras providências. Brasília – DF. 2015c. Fortaleza. Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente. Plano Municipal de Caminhabilidade de Fortaleza - Caderno de Participação Social. Fortaleza: SEUMA, 2019. 34 p. Indi, A. F. Participação popular no transporte público de passageiros: caso dos Comitês de Transporte Coletivo do Distrito Federal. 2014. ITDP. Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento. Guia de implementação de políticas e projetos de DOTS. Versão 1.0, Brasil. 2017. Izaga, F. G. Mobilidade e centralidade no Rio de Janeiro. 2009. (Tese, Doutorado em Urbanismo) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro - RJ, 2009, 281p. Maricato, E. Metrópole, legislação edesigualdade. Estudos Avançados, 17(48), São Paulo - SP: Editora USP, 2003. Mont’alvão Neto, A. L. Deslocamentos urbanos e desigualdades sociais: um estudo do movimento diário da população de Belo Horizonte. 2009. (Dissertação Mestrado em Sociologia) – Faculdade de Filosofi a e Ciências Humanas – Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte – MG. 2009. 134 p. Monteiro, I. K. S, Miranda L. I. B. Participação popular na elaboração do “plano estratégico de desenvolvimento - Campina Grande 2035”. In.: Anais XVIII ENAPUR. Natal, 2019. Organização das Nações Unidas. Nova Agenda Urbana. Conferência das Nações Unidas sobre Habitação e Desenvolvimento Urbano Sustentável (Habitat III). Quito (Equador). Silva, J. A. Direito urbanístico brasileiro. São Paulo. Ed. Malheiros Editores, 6. ed., 2010. Souza, M. L. (2011). Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos. 8ª ed. – Rio de Janeiro; Bertrand Brasil. Tonella, C. Políticas urbanas no Brasil: marcos legais, sujeitos e instituições. Soc. estado., 28(1), 1-13, Brasília. 2013. 86 | CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR | 87CAPÍTULO 2 - FERRAMENTAS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR RESUMO Este capítulo visa à orientação de técnicos, gestores e políticos no sentido da inclusão da bicicleta como meio de transporte no planejamento da mobili- dade das cidades. Nesse contexto, primeiro apresentam-se ações de regula- mentação e implantação de planos cicloviários, com alguns detalhamentos, os quais incluem diretrizes de implantação e, ainda, recomendações para a execução de um diagnóstico da ciclomobilidade. Posto isso, são introduzi- dos diferentes tipos de infraestruturas cicloviárias e, também, de sistemas de bicicletas compartilhadas, enquanto, paralelamente, são trazidos alguns critérios para seleção e dimensionamento da infraestrutura e sistema mais adequado. Enfi m, evidenciam-se os potenciais econômico, social e de saúde associados à maior disseminação do uso das bicicletas. Capítulo 3 REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 91CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO ANÁIRAM LIMA COSTA DET/CEFET - MG anairamlcosta@gmail.com CAROLINA REZENDE FELIPE DE BEM PPGAU/UFF carolinadebem.arq@gmail.com GABRIELA BINATTI SOUZA PET/COPPE/UFRJ/ LABIKS gbinatti@pet.coppe.ufrj.br KELISSON DE SOUZA NOGUEIRA SEPLAN - MA kelissonnogueira@gmail.com RENAN COUTO LISBOA PEREIRA PET/COPPE/UFRJ renan.lisboa@pet.coppe.ufrj.br ANTÓNIO CARLOS DE MATTOS MIRANDA Cicloiguaçu - PR antonmir@gmail.com DIOGO GOMES PEREIRA BATISTA PPGAU/UFPB diogo.choia@gmail.com JOSÉ CARLOS ASSUNÇÃO BELOTTO UFPR/UTFPR jcbelotto@gmail.com LUIZ EMERSON DA CRUZ SALDANHA Planett/PET/COPPE/UFRJ luizsaldanha@pet.coppe.ufrj.br SILVANA NAKAMORI UFPR/UTFPR silvananakamori@gmail.com 1. INTRODUÇÃO Saiba mais sobre como Incluir a Bicicleta nos Planos (de Mobilidade) da sua Cidade!6 O objetivo deste capítulo é orientar técnicos, gestores e políticos para a inclu- são da bicicleta como meio de transporte no planejamento da mobilidade das cidades, a partir da regulamentação e implantação de um plano ciclovi- ário. A revolução da mobilidade nos centros urbanos não é tecnológica, mas comportamental. Os agentes públicos têm o dever de se posicionarem no debate sobre os modos ativos e sustentáveis de transporte. A revolução já começou. Você vai fi car de fora dessa? No Brasil, aproximadamente 30% dos deslocamentos diários1 nas grandes cidades são realizados a pé ou de bicicleta. Nas cidades pequenas (<100 mil habitantes) esse volume pode chegar a representar 73%2. Para curtas dis- tâncias (aprox. 5 km), a bicicleta pode ser considerada o meio de transporte mais rápido. Ela é a opção mais barata, acessível e efi ciente para tais deslo- camentos. Quando integrada a outros modos de transporte permite atingir destinos diferentes e mais distantes, além de aumentar a integração com sistemas de transporte público. Segundo dados da Pesquisa Perfi l Ciclista 20183 (TRANSPORTE ATIVO, 2018), 38% dos usuários da bicicleta que a utilizam como meio de transporte começaram e continuam a usá-la porque ela é mais rápida e prática. E 47,6% consideram que uma maior e melhor infraestrutura cicloviária os faria usar mais a bicicleta no dia-a-dia. Inúmeros são os impactos positivos gerados pela inclusão das bicicletas na mobilidade das cidades, tais como: econômicos (redução de custos com saúde e com deslocamento); sociais (democratização do acesso à cidade), por possuir melhor custo/benefício; maior movimentação nas ruas (geran- do segurança e inclusão social); ambiental (redução da poluição); e políticos (melhoria da imagem da cidade e satisfação de seus habitantes). A Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei Federal 12.587/2012), garan- te em suas diretrizes a prioridade dos modos ativos de transporte sobre os transportes motorizados. Também prevê a primazia dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual, além de promover a integração entre os modos e serviços de transporte urbano. A bicicleta é ainda, importante ferramenta para que as cidades avancem no cumpri- mento das metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável - ODS4, tornando o transporte mais sustentável. E tem papel signifi cativo na resi- liência das cidades5 durante grandes crises e/ou quando de eventos extre- mos, tal como a pandemia do COVID-19, com propagação mundial iniciada no ano de 2020. Este capítulo apresenta informações aos administradores sobre dife- rentes aspectos. No item 2 - O Planejamento Para a Bicicleta - são mos- tradas as ações possíveis de serem adotadas a curto, médio e longo prazos, com alguns detalhamentos. Apresentam-se Diretrizes para Implantação de uma Política Pública de Ciclomobilidade; recomendações e dicas para a execução de um Diagnóstico da Ciclomobilidade; exemplos de tipolo- gias para a construção de infraestruturas para as bicicletas e Sistemas de Bicicletas Compartilhadas. No item 3 - Esporte, turismo e lazer - são fei- tas abordagens sobre cada modalidade do uso da bicicleta nessas catego- rias, com destaque ao cicloturismo. Por fi m, o capítulo chega ao item 4 - Considerações Finais -, onde é apresentado um exemplo de ação com o intuito de gerar entusiasmo dos administradores e leitores deste manual para abraçar a mobilidade dos modos ativos em seus municípios. 1. https://www.mobilize.org. br/estatisticas/37/divisao- -de-modais-por-cidades-i. html 2. https://drive.google.com/ fi le/d/1p4vAAExPkiXmCER- gerhXLIe6vtNGVPbH/view 3. http://transporteativo.org. br/ta/?page_id=11570 4. https://ecf.com/sites/ ecf.com/fi les/The%20Glo- bal%20Goals_internet.pdf 5. http://transporteativo.org. br/ta/?p=13706 6. http://bicicletanosplanos. org/faca-sua-cidade/guia/ download/ 92 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 93CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO 2. O PLANEJAMENTO PARA A BICICLETA O gestor público municipal tem muita responsabilidade quanto à mobilida- de urbana, especialmente no que se refere às viagens por bicicleta. Afi nal de contas, a bicicleta é um meio de transporte! projetos voltados à Mobilidade Ativa, com recursos previstos nos instru- mentos de planejamento e no orçamento do município, os quais precisam ser traduzidos em rubricas específi cas na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO - e na própria Lei Orçamentária Anual - LOA - para infraestruturas, manutenção e projetos voltados aos modos ativos. É papel dos governantes municipais implantar sistemas cicloviários e ações que garantam a segurança e o conforto dos ciclistas nos deslocamentos urbanos. Entretanto, não será do dia para a noite que isso poderá aconte- cer, pois requer bastante planejamento e participação popular. É importan- te aliar-se aos grupos de interesse e aos ciclistas a fi m de entender suas demandas.A inclusão social deve ser o foco de toda ação pública. Interven- ções urbanas voltadas ao ciclista e ao pedestre visam a promover o direito de acesso à cidade para todos, garantindo mobilidade aos modos mais sus- tentáveis. Não faltam ciclistas nas ruas. É fato de que nos acostumamos a olhar apenas para os automóveis. Eles ocupam tanto espaço nas cidades que já não cabem mais nas vias. É preciso devolver as ruas para as pessoas e com- partilhar o espaço de forma responsável. Vamos lá! Caso você não esteja habituado com esse tema, não se preocupe: a gente descomplica! Antes de tudo, vale lembrar que existem três níveis de planejamento: o operacional, o tático e o estratégico. Por sua vez, estes níveis desencadeiam ações de curto, médio e longo prazos. No planejamento para bicicleta não poderia ser diferente (Ver Quadro 1). As ações de planejamento devem ser realizadas tendo por base evi- dências encontradas a partir do levantamento de dados do município ou da região alvo da intervenção. Por isso, é fundamental capacitar a equipe técnica para elaboração de projetos e implantações de sistemas cicloviários. Neste sentido, para fazer valer o compromisso com a Política Nacional de Mobilidade Urbana, que prioriza os meios de transportes ativos, é fun- damental que as prefeituras municipais se preocupem muito mais do que ter uma Secretaria de Transportes ou de Trânsito. Elas precisam criar um departamento específi co para cuidar do planejamento e da elaboração de Destaca-se que a regulamentação de um plano cicloviário é tarefa a ser construída conjuntamente entre o poder executivo, o poder legislativo, representantes das associações dos ciclistas, e/ou pessoas com notória espe- cialização e reconhecimento. A representação pública e a participação de pessoas com especialização sobre o tema devem ter número igual ao dos representantes dos outros poderes presentes na avaliação dos programas e planos. Devendo também ser observada a diversidade existente na socie- dade com a inclusão de grupos estruturalmente excluídos, como mulheres, negros e pessoas com algum tipo de defi ciência. 94 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 95CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO Quadro 1. Ações possíveis para o curto, médio e longo prazos. Fonte: Elaborado pelos autores. Vale dizer ainda que antes da aprovação dos programas e planos junto à Câmara Legislativa é importante abrir mais o leque de participação, com a convocação de segmentos diferentes de representantes de modos ativos, onde devem ser apresentadas e debatidas as diretrizes a serem incluídas nos programas ou planos. 2.1 Diretrizes para implantação de uma política pública de ciclomobilidade Diretrizes de um planejamento são pilares estruturantes para compor uma ação pública, que normalmente é desmembrada em planos e projetos. Representam os macro temas que devem constar para a efetividade e a solidez de um programa, visando a atingir os objetivos da referida política pública. Quadro 2. Diretrizes para implantação de um Plano Cicloviário. Fonte: NAKAMORI et al (2016) PONTO DE REFLEXÃO: É socialmente justo que os espaços urbanos dedi- cados aos automóveis ocupem, em alguns casos, até 40% dos espaços das grandes cidades? Conheça o Guia de Planejamento Cicloinclusivo elaborado pelo Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP, 2017). Figura 1. Vereadores aprovam lei que cria o Sistema Cicloviário de Belém na Câmara Municipal de Belém. Fonte: Câmara Municipal de Belém7 1. Infraestrutura e segurança 2. Educação de trânsito e ambiental. Formação profi ssional com a temática inclusiva nos currículos, principalmente dos cursos afi ns (Arquitetura e Urbanismo; Engenharia Civil). 3. Legislação, normatização, cidadania e cultura local. 4. Assessoria técnica em projetos sobre a temática. 5. Desoneração fi scal e aporte fi nanceiro para a viabilização da política. 6. Esporte, lazer e cicloturismo. 7. Não deslocamento (desenvolver as tarefas sem sair de casa). O Plano Cicloviário deve estar conectado e apoiado pela Política Pública de Ciclomobilidade e ambos ligados e balizados pelo Plano de Mobilidade Urbana, que por sua vez segue as diretrizes do Plano Diretor Municipal, ten- do como norte a melhoria da qualidade de vida urbana. Dando seguimento a tal orientação são apresentadas, no Quadro 2, sete diretrizes julgadas importantes para constar, apoiar e dialogar com a construção e operacionalização do plano cicloviário. As metas e ações de cada diretriz encontram-se detalhadas no livro Diretrizes para elaboração de política pública de Ciclomobilidade8. 7. https://www.cmb.pa. gov.br/vereadores-apro- vam-lei-que-cria-o-siste- ma-cicloviario-de-belem/ 8. https://observato- riodabicicleta.org.br/ acervo/diretrizes-para- -elaboracao-de-politi- ca-publica-de-ciclomo- bilidade/ 96 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 97CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO 2.2 Diagnóstico da Ciclomobilidade A primeira fase de um bom plano ou projeto é a compreensão da problemá- tica. Conhecer e entender o território e a condição de operação da mobili- dade urbana, mais especifi camente da ciclomobilidade do município é con- dição básica para construir ações de qualidade, gerando reconhecimento público e prestígio junto aos cidadãos. Falemos agora da construção do Diagnóstico de Ciclomobilidade. Usando uma metáfora, pode-se pontuar que “a pesquisa é a bengala dos bons projetos de mobilidade”. Ou seja, ela os mantém em pé, represen- tando o apoio para suas sustentações teóricas. No quadro a seguir elencamos uma série de itens considerados funda- mentais para compor a pesquisa prévia, com o objetivo de formar uma base robusta de análise para compor o diagnóstico e orientar a construção de um planejamento cicloviário. Esclarecemos que alguns dos itens propostos podem ser resolvidos com dados secundários oriundos de outras pesquisas. Isto é, desde que estejam atualizados e adaptados, a partir de uma análise crítica, para a rea- lidade local. Os itens indicados representam um ideal mínimo, na visão dos autores, mas podem sofrer alterações: com adaptação, inclusão ou exclu- são, dependendo da limitação ou disponibilidade da equipe responsável, do porte e das características do município alvo; e também dos objetivos que o plano tem a pretensão de alcançar. Os objetivos do diagnóstico no planejamento urbano são: • Conhecer o território e o público alvo; • Identifi car as potencialidades, assim como os problemas suas causas e consequências; • Relacionar que tipos de confl itos estão sendo vivenciados, percebendo onde e como estão, fornecendo subsídios para a proposição de intervenções e ações que visam alcançar os objetivos desejados; • Possibilitar o acompanhamento e monitoramento futuro, medindo a evolução da situação no tempo. A etapa do diagnóstico de um sistema de transportes fundamenta e confi gura a base para um processo planejado de mudança e de desenvol- vimento. Ele ajuda a identifi car a situação real, consolidando um conheci- mento. Com estes saberes é possível identifi car quais problemas devem ser abordados, quais propostas são importantes a serem elaboradas (ver MIRANDA, 2014). 98 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 99CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO Quadro 3. Itens para a pesquisa/diagnósti- co da ciclomobilidade municipal. Fonte: Elaborado pelos autores. Descrição do Item Comentários 1 Dados gerais do município. Conhecer as características do município, tais como topografi a, clima, demografi a, economia, sistema viário, frota de veículos, plano diretor etc. 2 Inventário da infraestrutura: ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas, paraciclos, bicicletários, sinalização,tratamento das interseções. Deve ser compilada e observada a quantidade (em metros, quilômetros ou n.º de unidades) para posterior georreferenciamento em mapa. A oferta de infraestru- tura segura, funcional e confortável é fator incentivador à ciclomobilidade. 3 Levantamento da legislação de políticas e projetos/ programas com relação direta ou indireta com a bicicleta, seja como esporte, transporte ou lazer. Conhecer o que já existe, para evitar retrabalho, criar sinergia e conhecer limitações ou oportunidades legais visando o planejamento. 4 Conhecer o percentual de uso da bicicleta no muni- cípio: realizar contagens volumétricas, considerando todos os modos. É fundamental saber quanto os deslocamentos por bicicleta representam no todo da mobilidade do muni- cípio, até para comparação entre o antes e o depois da implantação do plano cicloviário. 5 Pesquisa sobre o perfi l do ciclista. É necessário conhecer quem é o ciclista da minha cidade, suas características sociais, de gênero, raça, educacionais, como e para que usa a bicicleta etc. 6 Observar a existência de rotas de cicloturismo na área urbana e rural do município. O cicloturismo vem crescendo no mundo, rotas dessa modalidade de ciclismo estimulam a economia local, principalmente os pequenos negócios. Melhorias na infraestrutura do percurso são boas para moradores do entorno e atraem visitantes de outros municípios. 7 Cadastrar os grupos organizados e as associações de ciclistas. Os grupos organizados de ciclistas representam um dos públicos que mais se benefi ciarão de um plano cicloviá- rio. Assim, provavelmente terão interesse em multiplicar informações e trazer subsídios importantes aos novos usuários de bicicleta. Descrição do Item Comentários 8 Levantamento dos negócios ligados à bicicleta: bicicletarias, oferta de passeios guiados e pagos, fábricas de bicicletas, ou outros existentes no município. Conhecer a economia ligada à bicicleta no município é uma informação importante: os empresários do ramo trarão subsídios para o plano e serão parceiros na divul- gação de informações. 9 Levantamento de ocorrências e fatalidades de trân- sito, além da incidência de roubos de ciclistas no município, ao menos nos últimos três anos. Conhecendo onde acontecem as ocorrências, as infor- mações poderão apontar os trechos mais perigosos e colaborar nas soluções. A falta de segurança é um dos principais fatores inibidores do uso da bicicleta. 10 O município tem plano de mobilidade urbana? O plano cicloviário é uma parte do planejamento, de- vendo com ele interagir. O planejamento cicloviário tem de considerar as relações entre modos de transportes e seus compartilhamentos no sistema viário, além do uso comum de equipamentos urbanos. 11 Existência de um Sistema de Bicicleta Pública ou Comunitária em funcionamento ou projeto para implantação. Esta ação é tendência mundial. Nem todas as pessoas possuem sua própria bicicleta. Para a aquisição do hábi- to de pedalar e a conexão intermodal, a bicicleta pública desempenha papel importante. 12 Inventário dos grandes polos geradores de viagens do município. Georreferenciar os grandes pólos e sobrepor a infra- estrutura cicloviária dá ideia das conexões que faltam para integrar a demanda de viagens à infraestrutura existente ou à expansão projetada. Além da importância de integrá-los no processo de planejamento, ajudam a numerosas comunidades, pois com os projetos internos a bairros e regiões colaboram com o todo da mobilidade. 13 Pesquisa Origem/Destino. É importante conhecer quais são as origens e destinos dos ciclistas. Tal conhecimento, traduzido em desejo de viagens, auxilia a implantação de infraestruturas atendendo a necessidade real dos deslocamentos das pessoas. 14 Levantamento do calendário de eventos de lazer e provas de ciclismo esportivo. Os grupos organizados de ciclismo são constituídos por pessoas que usam a bicicleta de maneira intensiva, gerando demandas relacionadas a questões múltiplas. Assim, eles são potenciais fornecedores de informações e possíveis parceiros para o plano. 100 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 101CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO 2.3 Tipos de infraestrutura para bicicletas Você sabia que a construção de infraestruturas cicloviárias não é a única forma de garantir a mobilidade por bicicleta? Utilizar o sistema viário já existente, dotando-o de medidas de segurança de trânsito, pode ser a solução para equacionar a falta de recursos para inves- timento em obras de infraestrutura. Isso porque construir ciclovias isoladas, sem conectividade e qualidade de projeto, não atende às necessidades de deslocamento dos ciclistas. Figura 2. Ciclovia no canteiro de avenida em São Paulo-SP. Fonte: The City Fix Brasil.9 Figura 3. Passeio compartilhado entre pedestres e ciclistas. Fonte: Bicicreteiro.10 2.3.1. Espaços para a mobilidade cicloviária Que tal conhecer um pouco mais sobre as diversas infraestruturas ciclo- viárias das cidades? É fundamental saber diferenciá-las e entender suas aplicações. Os espaços cicloviários podem ser divididos em três categorias: os compartilhados; os parcialmente segregados; e os que são totalmente segregados (MIRANDA, 2007). Algumas confi gurações viárias ainda estão sendo postas em prática e sendo caracterizadas, à exemplo da Via Calma em Curitiba-PR. Apresentamos algumas defi nições a seguir: CICLOVIA Espaço totalmente exclusivo à circulação de bicicletas, separadas do tráfego adjacente por ilha de concreto; por canteiro gramado; por balizas; por blo- cos de concreto; por linhas da sinalização formadas por “tachões”; além de outros elementos físicos que impeçam a entrada na via exclusiva destinada aos ciclistas. Vale lembrar que as ciclovias podem ser junto a área de circulação do tráfego geral, como também sobre área de calçada, em áreas verdes de par- ques ou junto a leitos de rios. Quando sobre calçadas, diferencia de uma ciclofaixa por ter desnível ou obstáculo em relação ao espaço do passeio, gerando descontinuidade da superfície plana destinada à movimentação de pedestres. PASSEIO COMPARTILHADO Área pavimentada sobre calçada ou terrapleno lateral a uma via, onde é per- mitida a circulação de ciclistas e pedestres no mesmo espaço pavimentado. Em alguns projetos o pavimento das áreas compartilhadas é demar- cado por linha contínua, indicando onde é o espaço dos ciclistas e o espa- ço dos pedestres. Entretanto, na maioria dos casos, o espaço não possui tal segregação parcial, tendo apenas os ícones do pedestre e da bicicleta, como na Figura 3. 9. https://www.thecityfi xbra- sil.org/wp-content/uplo- ads/2016/10/ciclovia-1024x683. jpg 10. https://bicicreteiro.org/ os-ciclistas-e-as-calcadas/ 102 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 103CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO TRÁFEGO COMPARTILHADO Corresponde à via com característica local (onde a velocidade máxima é de 30 km/h), ou via de nível hierárquico superior, mas com menor volume de tráfego e velocidade dos motorizados controlada, condicionando todos os veículos a um modo de segurança para todas as pessoas e os usuários (MIRANDA, 2007). PONTO DE ATENÇÃO! A relação entre velocidade dos automóveis e inten- sidade do tráfego é decisiva para determinar qual infraestrutura deve ser adotada para os ciclistas. Vias com grandes congestionamentos tornam desconfortável andar de bicicleta. Vias com alta velocidade de automóveis ou com forte presença de caminhões são extremamente perigosas. Nesses casos é necessária a implantação de ciclovia. A seguir é apresentada a relação do fl uxo de veículos motorizados e as velocidades máximas praticadas em vias, defi nindo quando deve ser implantada uma ou outra infraestrutura. Figura4. Ciclofaixa em Fortaleza-CE, com tachões e área zebrada (buffer). Fonte: Folha de São Paulo.11 Figura 5. Ciclorrota em São Paulo-SP. Fonte: Vá de Bike.12 Figura 6. Via Calma. Fonte: Mobilize.13 Figura 7. Rua com tráfego compartilhado em zona de baixa velocidade na Alemanha. Fonte: Miameherald.14 CICLOFAIXA Existem muitas formas de organizar este tipo de infraestrutura, sendo a mais comum àquela construída na via, junto ao meio fi o, delimitada apenas por pintura ou parcial- mente segregada do tráfego geral lindeiro por tachões. CICLORROTA Constitui conjunto de vias interligadas, for- mando um caminho preferencial para as bicicletas. O importante da ciclorrota é a sua sinalização especial (através de pinturas nas vias e placas de orientação), além do fato dessa rota ligar pontos de origem/destino específi cos. VIA CALMA Representa um espaço semi-segregado na via, como se fosse uma ciclofaixa, mas a pintura que a defi ne em relação à área late- ral, destinada ao tráfego motorizado, é feita com tracejado, o que permite, em determi- nados casos, que automóveis possam cir- cular sobre ela, para acesso às residências e comércio, assim como para que os autos possam fugir de um imprevisto. Figura 8. Planejamento Cicloviário em função do fl uxo de velocidade nas vias. Fonte: Transporte Ativo (2015).15 11. https://abicicletanacida- de.blogfolha.uol.com.br/ fi les/2015/12/IMG_1833.jpg 12 http://vadebike.org/ wp-content/uploads/2011/12/ ciclorrota-moema.jpg 13. https://www.mobilize.org. br/midias/noticias/via-cal- ma-em-curitiba-30-kmh- -corredor-de-onibus-e-ci- clofaixa1.jpg 14. https://www.miamihe- rald.com/news/local/ community/miami-dade/ article204194634.html 15. http://www.ta.org.br/ site2/Banco/7manuais/ Arquivos3/fl uxo_velocidade. pdf 104 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 105CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO 2.3.2 Espaços para estacionamento: Paraciclos e Bicicletários Os estacionamentos para bicicletas são fundamentais para a guarda des- se veículo de forma segura. Ampliar a oferta dessas instalações de maneira acessível ao público promove a presença de mais pessoas utilizando bicicle- tas. Existem dois tipos de estacionamentos para este modo de transporte: paraciclos e bicicletários. BICICLETÁRIOS Destinados à média e grande ocupação, com controle de acesso. Essa con- dição confere maior segurança aos ciclistas. A existência de um local seguro e prático para estacionar estimula o uso da bicicleta. Podem ser instalados e mantidos em espaços públicos ou privados, sendo pagos ou gratuitos. Figura 9. Paraciclo instalado em passeio público. Fonte: CET - Companhia de Engenharia de Tráfego - Bicicleta.16 Figura 10. Bicicletário Público em Niterói - RJ. Fonte: Brasil de Fato RJ.17 PARACICLOS Constituem dispositivos para prender bicicletas. Eles podem ser fi xados no piso, na parede ou no teto de edifi cações. O objetivo é garantir segurança mínima contra furtos. Eles podem ter vários formatos, assim como abrigar um ou vários veículos. Na posição vertical garantem melhor aproveitamen- to do espaço. Na horizontal são mais acessíveis e práticos para acesso das mulheres, dos idosos e das crianças. Normalmente são instalados junto a pólos geradores de viagens, tais como: terminais de transporte coletivo; centros comerciais; grandes com- plexos escolares, como centros de ensino médio e universidades; supermer- cados; áreas centrais; grandes empresa; centros de convenções com uso permanente ao longo da semana; centros administrativos de um município; praças no centro de metrópoles, capazes de atrair grande quantidade de usuários etc. 16. http://www.cetsp.com. br/consultas/bicicleta/ estacionamento-de-bici- cletas/paraciclos.aspx 17. https://www.brasilde- fatorj.com.br/2017/09/23/ horario-de-funcionamen- to-do-bicicletario-publi- co-de-niteroi-gera-ques- tionamentos 106 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 107CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO 2.3.3 Procedimentos para uma boa estrutura cicloviária “Para uma boa qualidade de infraestrutura cicloviária, ela deve ser segura, atrativa, confortável, objetiva e coerente” (Jeroen, 2013). Os espaços livres públicos que comportam as infraestruturas urbanas possuem uma série de aspectos a serem considerados diante do tráfego de bicicletas. Nesse contexto, apresentaremos a seguir alguns importantes itens a considerar no ambiente viário, visando garantir qualidade nas via- gens de bicicleta. TRATAMENTO DAS INTERSEÇÕES OLHA O CONFLITO! Os cruzamentos são os locais onde ocorrem a maior parte dos acidentes fatais envolvendo ciclistas. Portanto, é muito importan- te que seja dado o tratamento correto nesses locais, principalmente nas vias mais largas e com maior tráfego. INTEGRAÇÃO INTERMODAL ANDAR DEMAIS, CANSA! O uso da bicicleta em distâncias curtas, de 3 a 5 quilômetros, pode substituir uma caminhada que levaria de 20 a 30 minutos, ou mesmo uma viagem em transporte público. Dependendo da distância total da viagem, a bicicleta pode ser o modo de transporte mais adequado. Contudo, em trechos maiores, muitas vezes o transporte coletivo é a úni- ca opção. Por isso, é importante integrar a bicicleta aos demais modos de transporte, através da instalação de paraciclos e de bicicletários próximos às estações de transporte público. MODERAÇÃO DE TRÁFEGO CALMA LÁ! A moderação de tráfego se traduz em um conjunto de estraté- gias que busca tornar a via mais segura para todos. Para tal, algumas medi- das são tomadas, tais como: redução da velocidade máxima da via; instala- ção de dispositivos físicos e de sinalização de fácil leitura, para instruir um deslocamento mais cauteloso; entre outras intervenções no espaço viário. Ponto de refl exão: E se a legislação municipal exigisse dos novos empreendimentos a previsão de um número mínimo de vagas de esta- cionamento de bicicletas, estimulando, assim, os modos de transporte mais sustentáveis? Exemplo: A cidade do Rio de Janeiro possui dois Decretos em relação ao tema, um que dispõe sobre a obrigatoriedade em destinar áreas para estacionamento de bicicletas em shopping centers e hipermercados no município21 e outro que estabelece procedimentos para autorização e instalação de bicicletários em logradouros públicos no Rio de Janeiro22. Conheça o Bicicletário da ASCOBIKE - Associação dos Condutores de Bicicletas de Mauá - São Paulo18 . Além do estacionamento, ele oferta outros serviços, como: banheiros; empréstimo e manutenção de bicicletas; pontos de hidratação; e serviço de assistência social. APRENDA A COMO FAZER PARACICLOS DE QUALIDADE! 19 E TAMBÉM A COMO NÃO FAZER 20. 18. https://www.mobilize. org.br/midias/pesquisas/ manual-de-bicicletarios- ---ascobike-maua---2009. pdf 19. https://uniaodeciclistas. org.br/guia-estaciona- mentos/ 20. https://asbicicletas. wordpress.com/2013/06/09/ bicicletario-paraciclo-co- mo-nao-fazer/ 21. http://www.ta.org.br/ site2/Banco/4leis/LeiR- JPark.pdf 22. http://www.ta.org.br/ site2/Banco/4leis/ReS- MAC505_221211.pdf 108 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 109CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO SINALIZAÇÃO OLHA ESSA. A sinalização viária tem a função de orientar os usuários da via sobre como devem circular de forma adequada, com regras sobre direitos e deveres para uma circulação segura entre todos os modos de transporte. Adotar o uso de sinalização especial, como horizontal, vertical e semáforos para ciclistas; é medida necessária para conferir qualidade de tráfego e guiar os ciclistas, assim como delimitar os espaços exclusivos ou preferenciais à circulação das bicicletas. INTERVENÇÕES EMERGENCIAIS ESSA É NOVA! Após a crise de saúdeproveniente do COVID-19, diversas cidades ao redor do mundo passaram a adotar estratégias para incentivar o uso da bicicleta, com a construção de ciclofaixas temporárias ou emergen- ciais. Ações estas para ampliar o espaço para ciclistas, concedendo maior suporte para o uso da bicicleta durante e após a pandemia. As estruturas foram compostas por dispositivos físicos, como balizadores e cones, visando demarcar os espaços cicloviários. A ideia é de que estes elementos possam se transformar em defi nitivos após o controle da pandemia e uma posterior “volta ao normal”. ILUMINAÇÃO É CLARO! A iluminação pública é determinante para um tráfego noturno mais seguro, sobretudo para as mulheres. As vias bem iluminadas aumen- tam a visibilidade e conforto para todos os usuários do local, reduzindo situações de confl ito no trânsito, principalmente nas intersecções. Além dis- so, ruas e calçadas bem iluminadas favorecem a percepção de segurança pública das pessoas, sendo importante fator de contribuição para diminuir ambientes propícios à criminalidade. PAVIMENTAÇÃO NEM SENTI! A pessoa ao andar de bicicleta está mais suscetível a qualquer tipo de irregularidade no piso. Essa situação infl uencia o esforço físico de pedalar, o equilíbrio, a velocidade e a atratividade da via. As irregularidades no pavimento geram situações desagradáveis de trepidação e insegurança no tráfego. É importante que a cicloestrutura possua um pavimento ade- quado, bem conservado, com superfície plana e com bom rolamento. Esta condição resulta em menor vibração, sem riscos de derrapagem ou situa- ções de insegurança ao equilíbrio e à boa condução da bicicleta. SOMBREAMENTO QUE CALOR! As pessoas que andam de bicicleta estão expostas ao sol e à chuva. Nas cidades mais quentes é importante que as vias para bicicle- tas possuam arborização plena, gerando benefícios ambientais para todo o meio urbano. Com isso é possível amenizar a temperatura, gerar mais venti- lação, dissipação da poeira e do ruído, além da percepção de bem estar. Ou seja, a vegetação favorece não apenas quem pedala, mas todos que circu- lam na via, independentemente do modo de transporte utilizado. 2.4 Bicicletas compartilhadas Espalhados em mais de 600 cidades ao redor do mundo23 (MEDDIN et al., 2020), com 92 sistemas implementados na América Latina e 48 no Brasil24 (LABIKS, 2020), os sistemas de bicicletas compartilhadas, ou siste- mas de bicicletas públicas, são caracterizados pela disponibilização de bici- cletas espalhadas pelo território (podendo ser posicionadas em estações próprias ou não), permitindo que uma mesma bicicleta seja utilizada por mais de uma pessoa várias vezes ao dia. 23. https://bikesharin- gworldmap.com/ 24. https://labiks.org/pt/ projetos/mapa/ 110 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 111CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO Priorizando a rotatividade de usuários, esses sistemas fornecem bicicle- tas para uso público, podendo ou não ter como intermediária uma empresa privada. Estando associados a uma tarifa, os usuários do sistema contribuem com o pagamento de um valor destinado a contribuir com a manutenção dos equipamentos e a sustentabilidade do sistema. Esse tipo de serviço tem se tornado cada vez mais importante para municípios que objetivam reduzir viagens em veículos motorizados individuais e ainda contribuem estimulando a mobilidade ativa e a integração entre diferentes sistemas de transporte. Implementados como parte de uma política de mobilidade urbana sustentável, esses sistemas permitem maior fl exibilidade no uso, pois ofe- recem autonomia aos usuários. Ou seja, é possível retirar a bicicleta em um determinado local e devolvê-la em outro, minimizando assim o compromis- so individual de manter uma bicicleta e reduzindo o impacto negativo da ausência de investimentos em sistemas de transportes. CARACTERÍSTICAS: Os sistemas de bicicletas compartilhadas se caracterizam pela existên- cia de estações (ou não) e bicicletas espalhadas por todo ou uma parte determinada do território da cidade. Além disso, os sistemas de bicicletas compartilhadas contribuem com a diversifi cação modal, promovendo o turismo, gerando empregos, fomen- tando a integração entre diferentes modos. Tudo isso associado a baixos custos e menores prazos de implantação (é possível planejar e implemen- tar um sistema durante o mandato de um único prefeito - de 2 a 4 anos). Também contribuem para uma cidade mais democrática. A longo prazo esse tipo de sistema pode se tornar um incentivo para a população, atrain- do novos usuários ciclistas que apoiem investimentos em infraestrutura voltada à mobilidade por bicicleta - p. ex.: City of Santa Monica - Bike Action Plan25 (CDD, 2011). TIPO DE SISTEMA • Com estações manuais • Com estações automáticas • Misto (com estações automáticas e manuais) • Híbrido (operação com e sem estação) • Sem estação (dockless) • Aumento da capacidade de retirada e devolução de bicicletas; • Custo de implantação mais baixo. • Alocação de estações manuais em pontos de maior demanda com possibilidade de funcionamento 24h das demais estações automáticas. • Sem restrição de horário de operação; • Menor custo operacional. • Flexibilidade para o usuário; • Baixo investimento inicial • Sem custo de implementação da estação; • Necessita da força de trabalho humano, que restringe os horário operacionais; • Custo de operação mais elevado. • Maior complexidade operacional. • Número limitado de vagas nas estações; • Custo de implementação mais elevado. • Custo de uso adicional ou multa: se estacionada em local inapropriado. • Impacto no espaço público: bloqueio no espaço da calçada • Difícil controle operacional na distribuição de bicicletas • Sistema Metrobici, Bucaramanga, Colombia.26 • Sistema EnCicla, Área Metropolitana Valle de Aburrá, Colombia. 28 • Sistema Bike Rio, Rio de Janeiro, Brasil 27 • Sistema Biketown, Portland, EUA. 29 • Sistema Omni, Costa Rica. 30 VANTAGEM DESVANTAGENS EXEMPLOS & REFERÊNCIAS Quadro 4. Exemplos, forças e fraquezas de diferentes tipos de sistemas de bicicletas compartilhadas. Fonte: Elaborado pelos autores. Para mais informações sobre forças e fraquezas dos diferentes tipos de sistemas acesse o Guia de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas (ITDP, 2018, p. 18). 25. https://www.smgov.net/ Departments/PCD/Plans/ Bike-Action-Plan/ 26. https://metrobicibga. wixsite.com/misitio 27. https://bikeitau.com.br/ bikerio/ 28. https://encicla.metropol. gov.co/ 29. https://www.biketownp- dx.com/ 30. https://omni.cr/bici/ 112 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 113CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO IMPLEMENTAÇÃO DE UM SISTEMA DE BICICLETAS COMPARTILHADAS Independentemente do tamanho da sua cidade, para que se tenha um sistema de bicicletas compartilhadas bem sucedido é necessário um bom alinhamento político, visando a garantia de disponibilidade de fundos, o direito de uso do solo e a coordenação entre vários órgãos municipais (ITDP, 2018). Para obter apoio político à implementação do sistema, é necessário que a cidade tenha clareza sobre os objetivos que se pretende alcançar com sua implementação. Com isso em mãos, é importante: proporcionar orientação quanto aos benefícios do uso da bicicleta; apresentar exemplos de projetos bem sucedidos; conhecer outros sistemas já implementados; e se articular com profi ssionais responsáveis por projetos semelhantes. De acordo com o Guia de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas (ITDP, 2018), as cidades devem começar o processo de planejamento do sistema de bicicletas compartilhadas seguindo 3 etapas: identifi cação de metas e métricas a alcançar; escolha do tipo de sistemae defi nição das diretrizes de planejamento; e desenvolvimento dos planos fi nanceiros e de negócios. As estações possuem espaços de estacionamento, terminais/totens e bicicletas. Elas podem ser manuais ou automáticas (com variações nes- ses modos), modulares, fi xas ou permanentes (construídas na própria via). Alguns sistemas ainda operam com tecnologia mista, com algumas esta- ções manuais e outras automáticas operando simultaneamente. As esta- ções manuais exigem a presença de um operador para retirada e entrega dos veículos, as estações fi xas dão autonomia ao usuário na utilização do mesmo e as estações móveis e modulares não necessitam de escavações e trincheiras, reduzindo tempo e custos de implementação e são removíveis. Os terminais (totens ou quiosques), geralmente eletrônicos, são onde os usuários podem obter informações e, em alguns casos, pagar pelo uso do sistema. Estes totens podem servir também como centro de comunica- ção entre as estações e espaços de estacionamento e controle. Cumprem, ainda, a função de ajudar os usuários a encontrar uma estação numa deter- minada rua. Figura 11 . Sistema Bike Rio - Estação. Fontes: Tembici 31 Figura 12. Sistema Bike Rio - Totem. Fontes: Vá de bike (dir.) 32 Um sistema de bicicletas compartilhadas bem sucedido deve ser: • Seguro, confi ável e acessível para todos usuários em potencial; • Flexível e adaptável às mudanças na tecnologia, tendências e modelos de operação; • Profundamente conectado ao transporte coletivo e outras modalidades de transporte; • Capaz de alavancar investimentos e mudanças do uso do solo que promovam a utilização de bicicletas; • Uma ferramenta para atender metas gerais de sustentabilidade defi nidas pela cidade. Quadro 5. O que um sistema de bicicletas compartilhadas precisa ter. Fonte: Guia de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas, ITDP, 2018.. 31. https://tembici.com.br/ bicicletas-compartilhadas 32. https://vadebike.org/wp- -content/uploads/2017/06/ Novas-laranjinhas-bicicle- tas-compartilhadas-Itau-bi- ke-sampa-rio-PE-POA-sal- vador-14-Foto-Willian-Cruz- -Va-de-Bike.jpg 114 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 115CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO MAS AFINAL, POR QUE IMPLEMENTAR UM SISTEMA DE BICICLETAS COMPARTILHADAS NA MINHA CIDADE? Ao optar por executar um sistema de bicicletas compartilhadas é preciso entender que, apesar dele não ser indispensável, é uma ferramenta para a melhoria da qualidade de vida nas cidades. Portanto, defi nir metas e objeti- vos claros e específi cos a serem alcançados a partir do uso destes sistemas, bem como estabelecer indicadores de desempenho que permitam avaliar seu avanço, são etapas essenciais do processo de implementação. Dentre as metas e os objetivos mais comuns, temos o aumento no número de viagens em bicicleta e a melhoria da qualidade do ar. Além dis- so, seu baixo custo e menor prazo de implantação, quando comparado a outros projetos de transporte, são algumas das vantagens oferecidas. QUANDO E COMO DEFINIR O TIPO DE SISTEMA? Através da realização de um estudo de viabilidade é possível estimar indi- cadores, avaliar possíveis investimentos e fontes de receita, assim como sugerir um modelo de negócio e estrutura organizacional que se adeque ao projeto. Ou seja, com metas bem delimitadas e entendimento do contex- to da cidade em relação ao uso da bicicleta, o passo seguinte é identifi car qual tipo de sistema é o mais adequado (com estação, sem estação ou um modelo híbrido), bem como sua localização, dimensões e diretrizes admi- nistrativas a adotar. Sistemas sem estação e os com estação geram diferentes demandas no contexto dos estudos de viabilidade. As etapas seguintes deste tipo de estudo são o projeto conceitual e o planejamento detalhado, que se baseiam na defi nição exata das estações, suas dimensões, tipos de equipamentos e software necessários. Dados base para o dimensionamento do sistema de bicicletas compar- tilhadas, utilizados pelo ITDP (2018), são: • Área mínima de cobertura do sistema: 10km²; • Densidade das estações: 10 a 16 estações por km²; • Número de bicicletas: 10 a 30 bicicletas para cada grupo de 1.000 habitantes (dentro da área de cobertura); e • Vagas para estacionamento das bicicletas: 2 a 2,5 vagas para cada bicicleta. IMPORTANTE! É válido lembrar que o tamanho do sistema deve ser defi nido levando em consideração a quantidade de bicicletas em operação, a distribuição geográfi ca das estações e a quantidade de vagas disponí- veis, ou seja, primeiro, verifi ca-se a quantidade de bicicletas desejadas, para então defi nirem quantas vagas devem ser colocadas à disposição e, poste- riormente, deve-se avaliar a distribuição das vagas nas próprias estações. A densidade das estações é um dos fatores determinantes de conforto, conveniência e comodidade do sistema para o usuário. Além disso, as esta- ções devem possuir um sistema de segurança e mecanismos de travamen- to à prova de furto, ter sinalização clara com instruções de uso, e a retirada e devolução das bicicletas deve ser prática e fácil para o usuário. Exemplo: O sistema ECOBICI, na Cidade do México (MARTÍNEZ e FERREI- RA, 2013), foi implementado como complemento à rede de transporte da cidade pelos seus benefícios com a saúde, o meio ambiente e a melhora na qualidade de vida. Além disso, anualmente, pesquisas são realizadas para medir seus impactos33 e os níveis de desempenho estabelecidos são revis- tos e atualizados, quando necessário. 33. https://www.ecobici. cdmx.gob.mx/sites/ default/fi les/pdf/reduc- cion_gei_y_co-benefi cios_ generados_por_la_imple- mentacion_del_progra- ma_ecobici_201020112012. pdf 116 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 117CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO COMO DEFINIR UM PLANO DE NEGÓCIOS E FINANCEIRO? O modelo de negócios defi ne a propriedade dos ativos e o fl uxo de receitas entre o governo e a operadora. Seu objetivo é equilibrar a prestação do ser- viço com a alocação de recursos. Para a defi nição de um plano de negócios e fi nanceiro, é necessário considerar a estrutura organizacional que engloba a propriedade dos ativos, a estrutura de contratação, que é consequência da propriedade dos ativos, e os níveis de serviço. A estimativa do investimento inicial e dos custos operacionais pode ser feita ao multiplicar o número de bicicletas, vagas e estações por um valor médio. O investimento inicial é geralmente expresso em termos de “custo por bicicleta”, defi nido como o custo total do sistema (inclusive estações, bicicletas, equipamento de redistribuição, centro de controle e outros equi- pamentos), dividido pelo número total de bicicletas no sistema. DIRETRIZES GERAIS DE PLANEJAMENTO Como forma de auxiliar as etapas de implementação e regulamentação do sistema de bicicletas compartilhadas, trazemos, com a Figura 13, cinco fases principais, baseadas no sistema e nos objetivos correspondentes; para que, ao ser lançado, o projeto do sistema seja sustentável em todas as esferas (social, econômica, ambiental), além de equitativo e de contribuir para a criação de uma rede de transportes multifacetada. Para saber mais sobre o tema acesse: • Como viabilizar fi nanceiramente um sistema de bicicletas públicas: exemplos e tendências (MORO, 2019) • Guia para a estruturação de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas (ES) (CASTELLANOS et al., 2019) • Guia de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas (ITDP, 2018) • Modelos de Negócio para Sistemas de Bicicletas Compartilhadas (MOON-MIKLAUCIC et al., 2019) • Sistemas de bicicletas compartilhadas em Belo Horizonte, Distrito Federal, Rio de Janeiro e São Paulo (ITDP, 2016) Figura 13. Diretrizes de planejamento. Fonte: Adaptada de ITDP, 2018. 118 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃODE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 119CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO 3. OUTROS USOS DA BICICLETA Alívio do estresse, melhora do condicionamento físico e busca por ati- vidades ao ar livre: esses são alguns dos vários motivos que levam à prá- tica do ciclismo. Por ser um meio de transporte democrático em relação ao preço e de baixo impacto nas articulações, a atratividade do ciclismo é grande entre as diferentes faixas etárias e classes de renda. Além do mais, os benefícios se estendem à socialização com outros praticantes e à melhora da qualidade de vida nas cidades (VOZNIAK, 2019). Assim, para a elaboração de políticas e ações voltadas às atividades ligadas ao ciclismo, é necessária a realização de um plano integrado e arti- culado entre os diferentes setores de planejamento: saúde, educação, meio ambiente, esporte, turismo e lazer. Ressalta-se que a pandemia do COVID-19 evidenciou a necessidade de estimular modos ativos, como a bicicleta, para deslocamento e lazer, visto que a ciclomobilidade pode ser praticada indivi- dualmente e ao ar livre. 3.1. As oportunidades para uso desportivo da bicicleta A visualização do ciclismo como atividade física permite abordagens pelas áreas da educação, saúde e esporte. Ao se deparar com demandas para estabelecimento de campanhas de conscientização no trânsito, como também para a consolidação de ações para incentivo ao esporte e hábitos mais saudáveis, a criação de marcos legais e parcerias com a sociedade civil e iniciativa privada surgem como oportunidades. As consequências da atividade física regular praticada, por exemplo, no transporte ativo, promove efeito positivo sobre a saúde e a longevidade (ERIKSSEN et al., 1998). Um estudo realizado por ANDERSEN et al. (2000), na Dinamarca, onde aproximadamente 46% da população utiliza a bicicleta para se transportar diariamente, revelou associação entre o transporte por bicicleta e uma redução de quase 40% no risco de morte por todas as cau- sas (ver também CARVALHO e FREITAS, 2012). No Brasil, não possuímos dados sufi cientes sobre os efeitos positivos ligados ao uso da bicicleta para o sistema de saúde, mas é possível compre- ender sua representatividade fi nanceira a partir do caso europeu. O relatório sobre a Economia da Bicicleta na União Europeia (NEUN e HAUBOLD, 2016) estimou que políticas cicloviárias evitaram gastos na casa dos 190 bilhões de Euros por ano com benefícios relacionados à melhora na condições de saúde física e mental de adultos e crianças e redução de acidentes entre bicicletas e veículos motorizados. O potencial econômico das bicicletas no Brasil é maior do que as con- siderações sobre as vantagens individuais que a sua utilização pode trazer ao orçamento doméstico de uma família. O estudo sobre a Economia da Bicicleta no Brasil (ALIANÇA BIKE e LABMOB, 2018) destacou a geração de 7 mil empregos no setor fabril, produzindo 5,1 milhões de bicicletas e 40,5 milhões de peças e acessórios em 2015. Deste montante de bicicletas pro- duzidas, quase 30 mil delas foram exportadas, gerando uma receita de R$ 2,9 milhões. Com relação ao fortalecimento de uma cultura da bicicleta nas cidades, é possível citar o caso do BIKE ANJO (2020), que promove ações de apren- dizado na bicicleta nos mais diferentes níveis de uso. Entre as diversas iniciativas desta organização, é interessante destacar campanhas e pro- jetos de nível nacional que estados e municípios podem se conectar para ações locais: De bike ao trabalho34, Bike na Periferia35 , Dia Mundial Sem Car- ro36 e Bike na Escola37. 34. http://debikeaotraba- lho.org/ 35. https://bikeanjo.org/ blog/bike-na-periferia 36. https://bikeanjo.org/ blog/2014/09/12/o-que-vo- ce-pode-fazer-pelo-dia- -mundial-sem-carro-2014/ 37. https://bikenaescola. org/ 120 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 121CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO Figura 14. Infográfi co do projeto Rodinha Zero Fonte: Aromeiazero, 2020. AÇÕES NAS ESCOLAS MUNICIPAIS PARA FOMENTAR O USO DE BICICLETAS DESDE A INFÂNCIA Estimular o uso de bicicletas para crianças e adolescentes combate o com- portamento sedentário e aumenta a sociabilidade e vínculos afetivos com parentes e amigos; além de consolidar uma mudança de comportamento dos futuros jovens e adultos que ocuparão as ruas e espaços públicos da cidade daqui a alguns anos (ver LACERDA, 2015; MARTIN et al., 2009). O Instituto Aromeiazero, por meio do projeto Rodinha Zero (AROMEIAZERO, 2020), possui um programa de suporte a escolas munici- pais com estratégias de aquisição de bicicletas de equilíbrio e didáticas para a iniciação e consolidação da bicicleta nos hábitos de toda a comunidade escolar. Assim como essa, muitas outras associações pelo Brasil apresentam iniciativas similares e podem ser procuradas ou estimuladas pelas mais dife- rentes secretarias na implementação de ações pró-bicicleta. DO LEGISLATIVO AO EXECUTIVO EM PROL DO CICLISMO DE ALTO RENDIMENTO O ciclismo de alto rendimento, por sua vez, tem diversas vertentes, sendo as mais conhecidas as de estrada e de pista. A competição em estrada é feita em percursos rodoviários, seja asfalto ou terra batida. O treinamento nor- malmente é feito nas vias públicas, já que os ciclistas chegam a alcançar 80 km/h; e para evitar que os atletas dividam espaço com automóveis e ônibus, o que muitas vezes acontece, é preciso delimitar períodos e trechos para a prática segura desta atividade. Nessa linha de raciocínio, a Lei Municipal Nº 5.719/2014 do Rio de Janeiro regulamentou as Áreas de Proteção ao Ciclista de Competição (APCCs)38, defi nindo trecho mínimo para a realização da atividade e o horário de fun- cionamento. Além disso, fi cou estabelecido que o Poder Executivo se res- ponsabiliza em promover campanhas educativas, no sentido de alertar os motoristas para a importância do cumprimento desta Lei. 3.2. Cicloturismo local e regional O conceito de cicloturismo vai além das viagens de vários dias em cima da bicicleta, ele também abrange passeios de poucas horas dentro de cida- des, em estradas asfaltadas ou em áreas naturais. Dessa forma, o cicloturis- mo abrange desde atividades turísticas de um visitante até os momentos de lazer de um residente, tornando necessária a atuação conjunta entre órgãos responsáveis pelo turismo, lazer e meio ambiente para estruturar planos de ação focados no nível local. SAIBA MAIS! Para compreender melhor o perfi l e hábitos de ciclistas na relação com viagens e passeios em ambientes urbanos e naturais, veja as pesquisas: O Cicloturista Brasileiro 2018: Relatório Geral (SALDANHA et al., 2019) e Perfi l do Ciclista de Montanha no Brasil (AMOBICI, 2020). 38. https://mail.camara. rj.gov.br/APL/Legislativos/ contlei.nsf/50ad008247b- 8f030032579ea0073d588/ bfc047925ad17fbd03257cac- 004de02f?OpenDocument 122 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 123CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO NO CICLOTURISMO, NÃO GANHA SÓ QUEM PEDALA Na Alemanha, onde cicloturismo movimenta anualmente mais de 11 bilhões de Euros39, passeios com duração menor que um dia (seja em cidades ou em áreas naturais) representam 82% deste total. Benefícios socioeconômi- cos provenientes do cicloturismo podem ser representados pelo aumento da demanda em baixas temporadas e pela geração de emprego e renda. Fortalecem, também, vínculos comunitários e fi xam a população residen- te em cidades e distritos fora dos grandes centros urbanos - evitando um espraiamento urbano e desafogando sistemas de transportes metropolita- nos. No entanto, é necessário que exista um processo participativo junto às comunidades locais na construção dos roteiros cicloturisticos. Apenas assim haverá um real engajamento em iniciativas que garantirão sua continuida-de, como manutenção, promoção e monitoramento dessa atividade. O DIÁLOGO ENTRE MUNICÍPIOS É MUITO IMPORTANTE! Em nível regional, rotas de cicloturismo podem se formar na conexão de cidades e distritos, como também dentro ou no entorno de Unidades de Conservação. Com custo relativamente baixo para a implementação de infraestrutura e para ações de engajamento e capacitação, recursos inter- nos e externos podem ser captados para sua instalação - ver Manual de Incentivo e Orientação para os municípios brasileiros (SOARES, 2010). No que se refere à gestão dessas rotas, o estabelecimento de Instâncias de Governança Regional permite a colaboração com atores envolvidos para as tomadas de decisão e orientação no desenvolvimento sustentável da atividade em uma região - ver Documento Orientador: Regionalização Instância de Governança Regional (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2019). CICLOTURISMO URBANO COMO PORTA DE ENTRADA DE NOVOS CICLISTAS (E DE TURISTAS, É CLARO!) A criação de roteiros urbanos de cicloturismo deve alinhar a rede cicloviária existente aos atrativos turísticos de uma cidade. Muitas vezes, as diferentes linhas de desejo para o turismo, trabalho e estudo podem convergir em um mesmo município - como costumam ser os casos de centros históricos e áreas naturais em zonas residenciais. O Circuito de Cicloturismo do Vale Europeu Catarinense foi a primeira rota turística desenvolvida especifi camente para a atividade. Por meio de ações entre o Consórcio Intermunicipal do Médio Vale do Itajaí, associações da sociedade civil e iniciativa privada, nove municípios de pequeno porte e baixa movimentação pelo turismo (em sua grande maioria) se uniram para estabelecer um dos destinos mais famosos do país atualmente. Diversas foram as transformações de 2006 para 2018, mas o destaque pode ser fei- to sobre o aumento da infraestrutura turística e de estabelecimentos de apoio para demonstrar o aquecimento econômico à escala local e regional: aumento de 54% de restaurantes e similares e mais que o dobro de meios de hospedagem (BUSARELLO, 2020). Assim, ao fomentar a promoção da cultura da bicicleta dentro do planeja- mento cicloviário, cria-se um ambiente favorável tanto para visitantes quan- to para os moradores (re)descobrirem a cidade. Estima-se que, dos ciclo- turistas que também utilizam a bicicleta para deslocamentos utilitários (trabalho, estudo, compras), cerca de 70% começaram a pedalar para fi ns de recreação40. 39. http://planett.com. br/wp-content/uplo- ads/2019/02/O-Poder-do-Ci- cloturismo.pdf 40. http://planett.com. br/wp-content/uplo- ads/2019/11/O-Cicloturista- -Brasileiro-2018-Relatorio- -Geral.pdf 124 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 125CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO O Instituto Municipal Curitiba Turismo lançou, em 2016, a Coleção de Roteiros Turísticos Curta Curitiba (IMCT, 2017). Entre os oito roteiros, dois deles são dedicados ao cicloturismo urbano: Curta Curitiba Pedalando e Poty by Bike. O principal destaque é o alinhamento entre atrativos turísti- cos, narrativas e infraestrutura cicloviária existente. Para o desenvolvimento destes materiais, houve a colaboração das secretarias municipais de trânsito, comunicação social e de planejamento e administração, assim como a Academia e a associação de ciclistas local (Ciclo Iguaçu). Contudo, atualizações constantes são necessárias para garantir a melhor experiência e segurança dos usuários - aproximando e incentivando prestadores de serviços relacionados à atividade e monitorando a situação da infraestrutura cicloviária. 3.3. Ruas abertas INICIATIVA QUE UNE TODAS ESTAS DEMANDAS Dada a importância do uso da bicicleta no esporte, turismo e lazer, e tendo em vista que as ruas são espaços públicos de circulação na cidade, as chamadas Ruas Abertas são instrumentos para a promoção da melhoria na qualidade de vida das pessoas. As vantagens dessa concepção incluem o aumento dos espaços comuns de convivência, o estímulo à prática de atividades de lazer em espa- ços públicos e ao ar livre, e a redução das emissões de poluentes. De acordo com o Relatório de avaliação de impacto da paulista aberta na vitalidade urbana (ANDRADE et al., 2019), as contribuições são benéfi cas nas dimen- sões ambiental, urbana, social e econômica. Além dos benefícios citados, Ruas Abertas permitem maior distancia- mento social, importante no período da pandemia do COVID-19. Dessa for- ma, o programa Open Streets42 da cidade de Nova York abriu cerca de 160 km para promover maior distanciamento nos deslocamentos, nas práticas de atividades físicas e no lazer. As principais difi culdades apontadas pelos gestores para a criação das Ruas Abertas são as articulações com os diferentes órgãos envolvidos, como as secretarias de transporte, cultura, esporte e lazer, e segurança. Outro obs- táculo pode ser a elaboração de um Projeto de Lei colaborativo para regu- lar o uso das Ruas Abertas em toda cidade: por exemplo, em São Paulo, o decreto que instituiu o Programa Ruas Abertas demorou cerca de 2 anos após as primeiras campanhas para tornar algumas ruas abertas ao lazer nos domingos e feriados. Desse modo, programas como o “Ruas Abertas”43 da Prefeitura de São Paulo, que restringe o fl uxo de veículos de 25 vias e as destina ao uso exclusivo de pedestres e ciclistas, facilitam a prática de atividades recreativas e esportivas ao longo de toda a extensão dessas vias, assim como estimulam um comércio itinerante e o da própria região. Outro exemplo é o programa “No Domingo, a Rua é Nossa”44 da Prefeitura de Belo Horizonte, que dire- ciona ações em 8 ruas de diferentes regiões da cidade para disponibilizar espaços para a comunidade praticar atividades físicas e de lazer. Uma Rua Aberta é aquela que permite a livre circulação de pedestres, ciclistas e outros modos ativos de transporte e impede o trânsito de veículos motorizados - ver Ruas Abertas: Guia para realizar ação no seu bairro (NOS- SA BH, 2019). O marco legal que possibilita a institucionalização das Ruas Abertas se dá por meio do inciso I do artigo 23 da Lei Federal nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012 - Política Nacional de Mobilidade Urbana.41 41. http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_ato2011- 2014/2012/lei/l12587.htm 42. https://www1.nyc.gov/ html/dot/html/pedestrians/ openstreets.shtml 43. http://www.capital. sp.gov.br/noticia/prefeitura- -institui-ofi cialmente-pro- grama-ruas-abertas 44. http://portalbeloho- rizonte.com.br/eventos/ evento-de-rua/cultural/ programa-no-domingo-rua- -e-nossa-2020 126 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 127CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO Figura 15. Eixão do Lazer, Brasília - DF Fonte: https://bora.ai/bsb/passeios/ domingo-e-dia-de-passear- -pelas-asas-de-brasilia. Em Recife, o projeto “Lazer na Rua” 45 tem a fi nalidade de, em 9 ruas da cidade, resgatar o usufruto dos espaços públicos, dando mais opções de lazer à população e incentivando o recifense a viver mais a sua cidade, através do estímulo à prática de atividades físicas, esportivas e de lazer ao ar livre. Destaca-se ainda o “Eixão do Lazer” em Brasília, apresentado na Figura 15, onde uma das avenidas mais tradicionais do Distrito Federal se fecha aos domingos e feriados com o objetivo de proporcionar o que já está expresso no próprio nome do projeto - lazer. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como vimos ao longo deste capítulo, para incluir a bicicleta como meio de transporte no planejamento da mobilidade urbana é preciso estar atento a vários aspectos. Além disso, é necessária a comunicação efi ciente e trans- parente com os diversos segmentos da sociedade, sendo imprescindível contar com o apoio e participação da mídia local. Por isso, gestor, estimule e forneça condições adequadas para a participaçãoda população no proces- so de elaboração dos planos de mobilidade ativa do seu município! Só assim haverá uma maior legitimidade e consistência para que vocês e o restante dos habitantes da sua cidade possam construir juntos esse legado! PARA SABER MAIS SOBRE O TEMA ACESSE O GUIA BICICLETA NA MÍDIA (RODAS DA PAZ, 2015). BOAS PEDALADAS! 45. http://www2.recife. pe.gov.br/servico/lazer-na- -rua-0 128 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 129CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO REFERÊNCIAS ALVES, Ana Flávia Brandão. O papel dos indicadores do índice de mobilidade urbana sustentável na fase de compreensão da problemática do processo de planejamento de Fortaleza. Dissertação de mestrado no Programa de Pós-graduação em Engenharia de Transportes, Universidade Federal do Ceará-UFC, Fortaleza 2014. ALIANÇA BIKE; LABMOB. Economia da Bicicleta no Brasil. Aliança Bike. Disponível em: https:// aliancabike.org.br/economia-da-bicicleta-no-brasil/. Acesso em janeiro de 2021. AMOBICI. Pesquisa sobre o perfi l do ciclista de montanha no Brasil. Florianópolis: GT CicloTrilhas, 2020. Disponível em: https://ciclotrilhasfl oripa.com/projetos/pesquisa-sobre-o-perfi l- do-ciclista-de-montanha-no-brasil/ ANDERSEN, Lars Bo et al. All-cause mortality associated with physical activity during leisure time, work, sports, and cycling to work. Archives of internal medicine, v. 160, n. 11, p. 1621-1628, 2000. ANDRADE, Victor; KANITZ, Marcela; HOPPE, Danielle; AMARAL, J. P.; STUCHI, Silvia; BUENO, Leonardo; VASCONCELLOS. Ligia; DRUMMOND, Rafael. Relatório de avaliação de impacto da paulista aberta na vitalidade urbana. São Paulo: PROURB-UFRJ, 2019. AROMEIAZERO. 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Mapa Latino-americano de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas. LABIKS, 2020 Disponível em: https://labiks.org/pt/projetos/mapa/ Acessado em janeiro de 2020. LABIKS. Sistemas de Bicicletas Compartilhadas na América Latina: Relatório Anual 2019. Plataforma Latino-Americana de Sistemas de Bicicletas Públicas e Compartilhadas, 2020. Disponível em: https://labiks.org/pt/projetos/relatorio-anual/ LACERDA, J.G. Bicicletas para Crianças: Saúde, Diversão e Trânsito. Rio de Janeiro: Transporte Ativo, 2015. Disponível em: http://www.ta.org.br/educativos/docs/Bicicleta_Criancas.pdf MARTIN, Luc J. et al. The use of group dynamics strategies to enhance cohesion in a lifestyle intervention program for obese children. BMC Public Health, v. 9, n. 1, p. 1-11, 2009. MARTÍNEZ, Hilda; FERREIRA, Lia. Estudio de la Reducción de Emisiones y los Co-Benefi cios Generados por la Implementación del Programa ECOBICI. (2010, 2011, 2012). Cidade do México: Ctsembarq, 2013. 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Curitiba: PROEC/UFPR, 2014. ____. Se tivesse que ensinar a projetar ciclovias. In: ANTP, Associação Nacional de Transportes Públicos. Transporte Cicloviário. Série Cadernos Técnicos, vol 7, 2007. Disponível em: Transporte Cicloviário 2007 [ANTP].pdf - Google Drive. Acesso em 12 dez 2020. MOON-MIKLAUCIC, Christopher; BRAY-SHARPIN, Anna; LA LANZA, Ivan De; KHAN, Azra; LO RE, Luca; MAASSEN, Anne. The evolution of bike sharing: 10 questions on the emergence of new technologies, opportunities, and risks. Washington: World Resources Institute, 2019. Disponível em: https://wrimexico.org/sites/default/fi les/the-evolution-bikesharing.pdf MORO, Aris. Como viabilizar um sistema de bicicletas compartilhadas: Exemplos e tendências. C40 Cities Finance Facility, 2019. Disponível em: https://c40cff.org/knowledge-library/como- viabilizar-fi nanceiramente-um-sistema-de-bicicletas-compartilhadas-exemplos-e-tendencias NAKAMORI, Silvana et al. Diretrizes para elaboração de política pública de ciclomobilidade: experiências do Programa Ciclovida da UFPR. Curitiba: PROEC/UFPR, 2016. Disponível em: https://observatoriodabicicleta.org.br/acervo/diretrizes-para-elaboracao-de-politica-publica-de- ciclomobilidade/ NEUN, M.; HAUBOLD, H. The EU Cycling Economy - Arguments for an integrated EU cycling policy. Bruxelas: European Cyclists’ Federation, 2016. Disponível em: https://ecf.com/sites/ecf.com/ fi les/FINAL%20THE%20EU%20CYCLING%20ECONOMY_low%20res.pdf NOSSA BH. Ruas Abertas: Guia para realizar ação no seu bairro. Belo Horizonte: Nossa BH, 2019 RODAS DA PAZ. Bicicleta na Mídia: ponha essa pauta pra rodar! Guia de apoio para jornalistas. Brasília: Rodas da Paz, 2015. Disponível em: http://www.rodasdapaz.org.br/wp-content/ uploads/2015/08/2015-jul_guia-apoio-jornalistas_Rodas-da-Paz.pdf SALDANHA, Luiz; DE CASTRO, Juliana; SOUZA, Heloant Abreu Silva de; TELLES, Rodrigo; GARCIA, Eliana; AMARAL, João Paulo; BALASSIANO, Ronaldo. O Cicloturista Brasileiro 2018: relatório geral. Rio de Janeiro: Coppe-UFRJ, 2019. SOARES, André. Circuitos de Cicloturismo: Manual de Incentivo e Orientação para os municípios brasileiros. Florianópolis: UDESC, 2010. TRANSPORTE ATIVO. Perfi l do Ciclista 2018. Rio de Janeiro: Transporte Ativo, 2018. TRANSPORTE ATIVO. Planejamento Cicloviário em Função do Fluxo e Velocidade nas Vias. Rio de Janeiro: Transporte Ativo, 2015. VOZNIAK, Luciano.Fatores que levam a prática de ciclismo e benefícios para a qualidade de vida de seus adeptos. Revista Renovare, v. 2, 2019. 132 | CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO | 133CAPÍTULO 3 - REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE UM PLANO CICLOVIÁRIO RESUMO Este capítulo explica a necessidade de se atuar na gestão da deman- da, em vez do aumento da oferta de infraestrutura viária, explicando o funcionamento de duas estratégias: o estacionamento rotativo e o pedágio urbano. Ao longo do capítulo, você entenderá o mecanismo de funcionamento dessas medidas, benefícios esperados e suas difi - culdades de implementação. Você também será apresentado a casos de cidades que foram bem-sucedidas na cobrança aos proprietários de veículos individuais motorizados pelo uso do solo urbano. Capítulo 4 COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 137CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO JESSICA HELENA DE LIMA Centro de Tecnologia Universidade Federal de Alagoas jessica.lima@ctec.ufal.br MARINA LEITE DE BARROS BALTAR Faculdade de Engenharia da Universidade Federal de Mato Grosso marinabaltar@ufmt.br VICTOR HUGO SOUZA DE ABREU Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós- Graduação e Pesquisa de Engenharia victor@pet.coppe.ufrj.br TAINÁ SOUZA PACHECO Universidade de São Paulo pacheco.taina@gmail.com 1. ENTENDENDO O PROBLEMA Se você está lendo esse livro, provavelmente você se preocupa e quer melho- rar os problemas de mobilidade na sua cidade. Primeiramente, parabéns por essa iniciativa. Talvez você esteja pensando em tentar angariar verba para a construção de um viaduto ou expansão viária? Bom, neste capítulo nós vamos te explicar por que talvez essa não seja uma boa ideia e por que você deveria pensar em duas soluções que talvez não sejam tão óbvias, num primeiro momento, mas que farão total sentido ao fi nalizar o capítulo, que são: os estacionamentos rotativos e o pedágio urbano. Vamos lá? Esse ciclo vicioso (veja a Figura 1) é agravado devido à falta de planejamento e ações que busquem uma mobilidade urbana sustentável. O espaço viário é o bem mais valioso que uma cidade possui e, embora construir novas infraestruturas viárias possa parecer uma solução viável, em longo prazo, essa prática acaba por incentivar ainda mais o uso dos carros e motos, agravando os congestionamentos e piorando a mobilidade em áre- as urbanas. Ao facilitar o uso do transporte individual motorizado, incentiva- mos o espraiamento das cidades, aumentando as distâncias entre moradia e trabalho e as fi las de congestionamento. Consequentemente, a efi ciência do sistema de transporte público diminui, tornando os carros mais atrativos para a população. Figura 1. O ciclo vicioso do congestionamento. Fonte: Adaptado de Rodrigues (2020). Estratégias de gerenciamento de demanda são essenciais para tra- zer melhoria na mobilidade. Elas buscam incentivar a utilização de modos de transporte mais sustentáveis e reduzir a quantidade de viagens feitas por automóvel, trazendo diversos benefícios tais como a redução de polui- ção ambiental (atmosférica, visual e sonora) e congestionamentos, melho- rando a qualidade de vida e promovendo o desenvolvimento econômico (EMBARQ Brasil, 2014). Neste capítulo serão apresentadas duas práticas de gerenciamento de demanda que têm sido aplicadas com sucesso em diversos países, a fi m de melhorar a mobilidade nas cidades e torná-las mais sustentáveis: o estacio- namento rotativo em vias públicas e o pedágio urbano. Ambas tratam da cobrança pelo uso do solo dos veículos individuais e estão de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana, Lei 12.587/2012, que tem como um dos objetivos promover o desenvolvimento sustentável com a mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades (Brasil, 2012). 138 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 139CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO 2. ESTACIONAMENTO ROTATIVO Nessa seção apresentamos um apanhado geral de informações relevantes sobre a utilização dos estacionamentos rotativos, bem como destacamos algumas experiências brasileiras. O QUE É? É a parte sinalizada para estacionamentos de veículos por período deter- minado, podendo ser gratuita ou paga (CONTRAN, 2008). Porém, manter o estacionamento gratuito é uma forma inefi ciente de gerir o espaço urbano, que é cada vez mais limitado, além de estimular a dependência dos auto- móveis. Dessa forma, nota-se a importância de aplicação de preços de estacio- namento e restrições de oferta com a fi nalidade de desencorajar o uso de veículos privados motorizados e aumentar a dinâmica dos estacionamentos, atendendo a um número maior de pessoas. Quando aplicado de forma con- sistente, a longo prazo, pode ser efi caz como meio de reduzir a quantidade de viagens de carro (McCahill & Garrick, 2010). Além de oferecer melhores condições de concorrência para serviços de transporte público, transpor- te ativo ou mobilidade compartilhada, limitando o congestionamento e a poluição do ar nas cidades, bem como garantindo o funcionamento seguro e tranquilo do tráfego nas vias (Marsden, 2014). Ademais, em todo o mundo, muitos bairros têm dois problemas sérios: estacionamento superlotado na via e serviços públicos insufi cientes. Cobrar pelo estacionamento rotativo busca amenizar ambos os problemas, pois, cobrando preços de mercado justos para estacionamento na via, é possí- vel gerenciar a demanda e utilizar a receita resultante para fi nanciar ser- viços públicos locais (Shoup et al., 2016). Nesse sentido, Shoup et al. (2016) identifi caram, por meio de um estudo de caso de um programa piloto em Pequim, que a cobrança do estacionamento na via pode fi nanciar impor- tantes investimentos públicos com um período de retorno de menos de três anos, constituindo-se uma forma efi ciente, justa e politicamente viável de melhorar o transporte, as cidades, a economia e o meio ambiente. Os principais objetivos do estacionamento rotativo pago são: aumento da oferta dinâmica de vagas, aumento da acessibilidade da área, restrição do uso do automóvel, melhoria na fi scalização e melhoria na disciplina dos estacionamentos. Portanto, a necessidade de implantação de estaciona- mento rotativo pago fi ca evidenciada pela existência de uma intensa uti- lização das vagas existentes, pela presença de guardadores de veículos ou ainda pela grande quantidade de estacionamentos irregulares (Miranda et al., 2005). Não se está falando apenas de fi xar um preço e cobrar pela vaga rota- tiva, as políticas de estacionamento precisam se adaptar rapidamente às possibilidades que novas tecnologias e oportunidades de mobilidade apre- sentam (Marsden, 2014). É necessário observar a necessidade de cada local. Ottosson et al. (2013), por exemplo, mostram o potencial de variar os preços por hora do dia, concluindo que a tarifação afeta a duração do estaciona- mento, porque os automóveis permanecem por menos tempo em média durante o dia em bairros com taxas maiores e mais tempo em bairros com taxas reduzidas. QUEM JÁ FEZ? O município é quem tem a responsabilidade de administrar esses espa- ços e é ele quem pode determinar seu funcionamento. É necessário defi - nir regras como preço por período, tempo máximo de permanência e dias e horários de funcionamento. Além disso, deve ser estabelecido o sistema de cobrança, que pode ser por ticket que estão disponíveis nos pontos de venda autorizados como o comércio local; em formato através de aplicativo no smartphone; ou ainda pelo sistema de parquímetro que pode ser car- regado online ou em postos autorizados. Em alguns casosa manutenção e gestão desse sistema é terceirizada. 140 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 141CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO Cidades de tamanhos diversos já adotam o sistema de estacionamento rotativo com sucesso. São Paulo (SP) tem a Zona Azul que possui 44.138 vagas disponíveis, nas quais os motoristas precisam do Cartão Azul Digital para estacionar. Visando permitir a rotatividade, é possível renovar a perma- nência do veículo apenas uma vez, sendo que o tempo de permanência varia por região, sendo, no geral, 60 minutos renováveis por mais 60. Também foram defi nidas áreas especiais devido à natureza do local. Em alguns par- ques, o tempo de permanência máximo de estacionamento é de 4 horas, e, no Estádio do Pacaembu, é de 6 horas já considerando a renovação. Cabe ressaltar que não é responsabilidade da Prefeitura indenização por acidentes, danos, furtos ou prejuízos que os veículos ou proprietários pos- sam sofrer nos locais delimitados como estacionamento rotativo. Existem estacionamentos diferenciados para pessoas com defi ciência e mobilida- de reduzida, idosos, caminhões e motos. Além disso, existem cartões espe- ciais para moradores que autorizam estacionamento contínuo de segunda a sexta-feira, das 17h às 10h, e sábado durante o dia todo (CET-SP, 2011) . Em Campo Grande (MS), o contrato de concessão para exploração dos serviços de administração, manutenção e operação dessas áreas iniciou em 2002. Havia inicialmente 2.200 vagas e estava prevista a expansão dessa área com o decorrer do contrato de concessão. A cobrança do estacionamento é feita por meio de parquímetros e sua instalação, manutenção e operação é responsabilidade da concessionária, assim como a arrecadação tarifária. Já em Juiz de Fora (MG), o estacionamento rotativo com 2.331 vagas funciona com tempo de permanência de 90 minutos, sendo possível reno- var uma vez. No sistema, é prevista a gratuidade para idosos com devida identifi cação de veículos que estacionarem nas vagas destinadas a eles. Existem três horários de funcionamento distintos: o diurno (segunda a sex- ta-feira das 8h às 18h), sábado (8h às 13h) e noturno (terça-feira a domingo das 18h às 2h). Há duas formas de pagamento: por meio do aplicativo “Vaga Inteligente” ou mediante cartões recarregáveis que precisam ser validados no parquímetro. O QUE APRENDEMOS COM ESSAS EXPERIÊNCIAS? Os principais resultados positivos apresentados em cidades que adotaram o estacionamento rotativo pago foram o ordenamento na ocupação das vagas de automóveis e a maior rotatividade de veículos estacionados. Com essa ação, o comércio da região de implantação é o maior benefi ciado devi- do à maior oferta dinâmica de vagas. Segundo a CET-SP (2011), é importante reconhecer as características das ati- vidades responsáveis pela demanda de estacionamento para, a partir daí, defi nir os seus critérios de funcionamento. É exatamente a falta de políticas que defi nam o melhor uso do estacionamento a responsável por um maior número de infrações de trânsito que dizem respeito a parada e/ou estacio- namento irregular. A fi scalização é essencial para o sistema funcionar de acordo com o espera- do. Além disso, é importante defi nir os locais para estacionamento de moto- cicleta e as vagas preferenciais de forma que atenda a demanda esperada. As motocicletas em algumas cidades não participam do sistema de cobran- ça, já em outras, elas possuem tarifação especial. Em relação às formas de pagamento, caso a Prefeitura opte pelo sistema de tickets, é necessário observar se a rotatividade está sendo mantida. No caso dos parquímetros, a manutenção deles é de fundamental importância para um bom funciona- mento do sistema. 142 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 143CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO 3. PEDÁGIO URBANO Nessa seção destacamos aspectos importantes em relação à utilização do pedágio urbano, bem como algumas experiências vivenciadas ao longo dos anos por diversas regiões do mundo. O QUE É? Trata-se de uma forma de arrecadar tributos que fi xa o direito de circular em alguma parte do território urbano. Costuma ser aplicado em grandes cidades, principalmente nas áreas centrais. O seu objetivo é usar o poder de mercado para reduzir as externalidades causadas pelos congestiona- mentos. Ou seja, os motoristas estariam, de fato, pagando pelos custos que impõem às outras pessoas ao utilizar as vias, principalmente, nos horários de pico. Um aumento no preço das viagens de automóvel em determinados horários poderia reduzir seu uso nesses horários, incentivando as pessoas a migrar para outros modos, como o transporte público. O pedágio urbano também gera recursos para que o transporte público possa ser ampliado em qualidade e capacidade, reduz a poluição ambiental e torna as vias mais seguras, acarretando uma maior efi ciência da rede de transportes de uma cidade. O pedágio urbano pode ser de três tipos: i. área, em que são taxados todos os veículos que circulam em determinada região; ii. cordão, em que são taxados veículos que ingressam em determinada região; e iii. corredor, em que o uso de uma determinada via é taxado. O uso do sistema de preços para controlar a demanda é visto como uma política efi ciente, sendo bastante utilizado em áreas como hotelaria (preços mais altos nos feriados e períodos de férias escolares) e energia (pre- ços mais altos nos horários de pico). Mesmo no setor de transporte há acei- tação do uso do sistema de preços em: aeroportos, pedágios em rodovias e tarifas variáveis para táxis e aplicativos em momentos de pico. QUEM JÁ FEZ? Cingapura foi pioneira na implementação do pedágio urbano já em 1975. O sistema era do tipo cordão, com pagamento ao cruzar a fronteira peda- giada, entre 7h30 e 9h30, e tráfego livre no interior da área. Os (As) moto- ristas deveriam adquirir passes diários (US$ 1,30 ou R$ 6,59) ou mensais, ambos pré-pagos, e deixá-los visíveis nos painéis dos carros. A fi scalização era manual em todos os 28 pontos de acesso ao centro da cidade. Hou- ve também um aumento da oferta de ônibus público em 33% e redução da oferta de vagas públicas de estacionamentos nas vias em 30% (FHWA, 2008). O resultado foi uma redução de 44% do número de veículos circulan- do na região central. O sistema sofreu modifi cações e aperfeiçoamentos até culminar com a implementação do Eletronic Road Pricing (ERP) em 1998 - sistema em vigor até hoje. A janela de cobrança foi estendida, passando a ser das 7h00 às 19h00, e a fi scalização passou a ser eletrônica, com portais nas entradas do centro da cidade. Os preços variam por hora do dia e por direção da via. Os carros precisam instalar um pequeno equipamento que se comunica com os portais, permitindo que a cobrança seja feita. Com o ERP, o fl uxo de veículos entrando na área de restrição caiu 24% e a velocidade média das vias aumentou 10 km/hora. O custo de implementação foi de US$ 200 milhões, ou R$ 1,01 bilhão, com receita anual superior a US$ 100 milhões, ou R$ 506,62 milhões, (apro- ximadamente 300.000 veículos pagantes por dia). Uma particularidade do sistema é que as tarifas são revisadas a cada três meses para garantir deter- minada velocidade média das vias (45-65 km/hora nas expressas e 20-30 km/hora nas demais), ou seja, é um sistema voltado ao nível de serviço, que adapta o preço conforme fl utuações na demanda. Outra particularidade é que o sistema cobra tarifa de todos os veículos, incluindo motocicletas e ônibus. Atualmente, Cingapura estuda a possibilidade de fi scalização via GPS, e não mais em portais. O objetivo é desinstalaros portais e tornar a fi scalização e controle do sistema mais ágil, permitindo que a população tenha informação em tempo real. 144 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 145CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO Outra cidade que implementou o pedágio urbano com sucesso foi Lon- dres. As ideias já estavam em discussão desde a década de 1960, mas sem- pre acabavam postergadas devido à difi culdade de determinar a área peda- giada, a tarifa ótima e como se daria o monitoramento e fi scalização. Na década de 1990, a capital britânica enfrentava grandes congestionamentos diariamente, resultando em velocidades médias de 14 km/hora durante o dia na região central. A população percebia os congestionamentos como um problema a ser enfrentado, mais urgente até do que o crime. Cons- ciente dessa barreira, o Departamento de Transporte de Londres criou um programa de estudo sobre o assunto, que culminou no grupo de trabalho Review of Charging Options for London (ROCOL). Seu relatório do ano de 2000 serviu como base para que o então candidato a prefeito, Ken Livings- tone, incluísse em seu plano de governo o compromisso com a implemen- tação do pedágio urbano. Como Livingstone foi eleito, a promessa saiu do papel após 18 meses de consultas públicas - vitais para a aceitação do pro- jeto por parte da sociedade civil. Em 2003, foi instalado um sistema de pedágio urbano do tipo área na região central de Londres, com uma cobrança diária de £ 5,00, ou R$ 33,50 (que subiu para £ 8,00, ou R$ 53,60, em 2008, e hoje está em £ 15,00, ou R$ 100,50) (TfL,2020). São taxados todos os veículos que circulam na região, entre 7h00 às 18h00, com algumas exceções. Os (As) motoristas devem registar seus veículos e fazer o pagamento da taxa antecipadamente ou no dia em que utilizaram a região de forma online, por SMS, por telefone ou nos correios. Usuários frequentes podem usar o Auto pay, sistema com descon- to. O sistema de monitoramento e fi scalização é feito por câmeras, que con- seguem ler a placa dos veículos trafegando na região central. Essa leitura é então cruzada com os dados de pagamento para verifi cação e acarretando multa para quem não realiza o pagamento. Os resultados alcançados pelo pedágio urbano em Londres são muito positivos e amplamente reconhecidos pela população. O volume de tráfego de veículos na área central se estabilizou em uma taxa 27% menor do que o que existia em 2002, antes da implementação do sistema. Isso signifi ca que 80 mil carros deixaram de entrar na região de cobrança todos os dias. Ainda, a utilização de bicicleta na região aumentou em 66% desde a introdução do pedágio (TfL,2020). O exemplo londrino mostra que a introdução de uma política de pedá- gio urbano requer não apenas uma modelagem bem feita e uma análise precisa dos padrões de trânsito e comportamentos de viagens, mas tam- bém uma avaliação adequada dos sistemas de controle e monitoramento, bem como dos desafi os práticos, tecnológicos e, principalmente, políticos. Cabe ainda mencionar que ter a política como uma promessa de campanha de um candidato eleito facilitou sua aceitação (LEAPE, 2006). A terceira cidade a ser destacada é Estocolmo, que lançou seu modelo de tarifação de congestionamento (do tipo cordão, assim como Cingapura) experimentalmente em 2006. O projeto foi feito em duas etapas, sendo que a primeira era um período de teste de sete meses, seguida por um plebisci- to que decidiria pela implementação defi nitiva ou não do pedágio urbano. A despeito das críticas iniciais, o projeto ganhou aceitação de mais de dois terços da população e dos partidos políticos, sendo aprovado e passando a funcionar defi nitivamente a partir de 2007 (Centre for Transport Studies Stockholm, 2014) . O sistema é do tipo cordão, com tarifas diferenciadas a depender do sentido do tráfego, monitoradas em 18 pontos de entrada à região central. Funcionando das 6h30 às 18h30 e com preços entre 1 e 2,5 euros (entre R$ 6,14 e R$ 15,34), a política levou à redução de 20% no volu- me de veículos. Além da preocupação com o congestionamento, a cidade de Estocolmo visava uma melhoria da qualidade do ar com a intervenção, o que que de fato foi atingido: houve uma redução de 10 a 15% na emissão de poluentes. 146 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 147CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO Pontos relevantes de destaque no caso de Estocolmo são, além do teste seguido de referendo, a realização de vultosos investimentos no transporte público antes da implementação do pedágio urbano. Apenas o aumento de oferta e da qualidade do serviço não foram sufi cientes para deslocar a demanda para o transporte público, foi apenas com a tarifação que tal mudança ocorreu. Importante, ou fundamental, para a aceitação política do projeto foi a percepção da população de que a receita arrecadada com o sis- tema estava sendo investida em melhorias do transporte público e também do transporte individual, principalmente de quem morava longe da área de restrição. Um último exemplo a ser destacado foi o processo de implementação do pedágio urbano na cidade de Nova York. Em 2007, a administração Bloom- berg lançou o PlaNYC 2030, com objetivo de preparar a cidade para o cres- cimento populacional projetado, fortalecendo a economia, combatendo a mudança climática e aumentando a qualidade de vida dos residentes. Uma proposta central ao plano era a introdução de um pedágio urbano de US$ 8,00, ou R$ 40,53, para os veículos que entrassem na área de Midtown Manhattan nos dias úteis. Além de reduzir o congestionamento, a propos- ta tinha a intenção de levantar US$ 380 milhões (ou R$ 1,93 bilhão) por ano para o investimento em transporte público. O projeto foi abandonado em 2008 por conta da forte oposição de habitantes de bairros nas adjacências de Manhattan, que passariam a pagar uma taxa para acessar a ilha. Os oponentes conseguiram enquadrar o pro- jeto não como um problema de trânsito, mas um ataque às camadas mais pobres da população, que não teriam outra opção que não utilizar o carro em seus deslocamentos. Os dados mostram que esse argumento era fal- so, já que quase 60% dos residentes dos bairros que seriam afetados pelo pedágio urbano nem sequer tinham carros, e 97% não seriam afetados pela política por já utilizar o transporte público nas viagens ao trabalho. A ideia continuou viva e em debate na cidade, até que, em 2019, um projeto foi aprovado em negociações entre o Governador do Estado, Andrew Cuomo, e o Prefeito de Nova York, Bill de Blasio. O projeto agora precisa passar pela aprovação do governo federal e a expectativa é que possa ser implementado em 2022. O caso da cidade de Nova York mostra a importância do discurso polí- tico para a aceitação do pedágio urbano, e na necessidade de manter o debate sobre o tema para que a população seja convencida dos benefícios da política. 148 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 149CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO O QUE APRENDEMOS COM ESSAS EXPERIÊNCIAS? A implementação de uma política de pedágio urbano sempre vai gerar muita resistência, mesmo em cidades com problemas crônicos de conges- tionamento. As pessoas admitem que há um problema de trânsito, mas relutam em aceitar novas propostas que possam ajudar a resolver o pro- blema ou pelo menos minimizá-los, ainda mais quando a proposta envolve algum tipo de taxação. Além disso, há um pouco de desconhecimento das tecnologias empregadas nos sistemas de pedágio urbano. A palavrapedá- gio remete às cabines de estradas, então é comum que as pessoas imagi- nem que cabines seriam construídas em vias urbanas - o que só poderia ser ruim para o congestionamento. É preciso enfrentar o mito de que existe um direito inato de circular de automóvel pelas vias da cidade sem pagar o custo social que é devido. As vias são fi nanciadas por toda a sociedade, e quem as usa deve pagar o verdadeiro custo que impõe à toda população (e não, o IPVA não é sufi - ciente para isso). O pedágio urbano impõe custos a uma parcela minoritária da sociedade e traz benefícios para uma parcela majoritária. O problema é que os custos são concentrados, enquanto os benefícios são difusos. Assim, os grupos que conseguem se organizar mais e ter mais voz são os grupos contrários à essa política. Em campanhas que advogam pelo pedágio urbano, é possível fazer para- lelos com mercados já estabelecidos que usam o sistema de preços para controlar a demanda. Ainda, para reduzir o imaginário de perda, é preci- so enfatizar para onde vai a arrecadação do pedágio urbano e transformar essa arrecadação em investimento, melhorando a qualidade das viagens de quem depende de outros meios de transporte que não o automóvel. A batalha pela implementação do pedágio urbano é longa e árdua, mas é uma luta fundamental para o futuro das cidades, principalmente em um cenário pós pandemia, em que pode haver o crescimento do uso do trans- porte individual motorizado. PARA SABER MAIS Outras cidades que implementaram pedágio urbano: Hong Kong (1983- 1985), Roma (2001), Durham (2002), Valletta (2007), Milão (2008) e Gothenburg (2013). 150 | CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO | 151CAPÍTULO 4 - COBRANÇA DOS VEÍCULOS INDIVIDUAIS PELO USO DO SOLO: ESTACIONAMENTO ROTATIVO E PEDÁGIO URBANO 4. PARA CONCLUIR Este capítulo buscou mostrar a importância de se atuar na gestão da deman- da (e não da ampliação da oferta de infraestrutura viária) para melhorar, de forma duradoura, os problemas relacionados ao congestionamento nas cidades. Foram apontadas duas possibilidades que atuam sobre a intenção do uso do automóvel, desestimulando a sua utilização mediante a cobrança de taxas: o estacionamento rotativo e o pedágio urbano, trazendo exemplos de cidades que implantaram tais medidas. Vale lembrar que hoje os custos causados pelos usuários de transporte indi- vidual motorizado são maiores do que a sua contribuição, fazendo com que toda a sociedade arque com estes custos econômicos, sociais e ambien- tais, o que constitui uma enorme injustiça. Não é justo que a população que enfrenta um transporte público muitas vezes lotado e precarizado pague para que motoristas dirijam e estacionem gratuitamente pelas vias. REFERÊNCIAS BRASIL. (2012). Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012. Política Nacional de Mobilidade Urbana. Centre for Transport Studies Stockholm. (2014). The Stockholm congestion charges: an overview. Disponível em: https://www.transportportal.se/swopec/cts2014-7.pdf Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo - CET-SP. (2011). Boletim técnico n° 51 - Estudo de viabilidade de Zona Azul. São Paulo - SP, Brasil. Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN. (2008) Resolução n°302 de 18/12/2008. Defi ne e regulamenta as áreas de segurança e de estacionamentos específi cos de veículos. EMBARQ Brasil. (2014). Passo a Passo para a Construção de um Plano de Mobilidade Urbana. Porto Alegre, Brasil. Disponível em: https://wricidades.org/sites/default/fi les/ PassoaPassoPlanodeMobilidadeCorporativa.pdf Federal Highway Administration - FHWA. (2008). Lessons Learned from International Experience in Congestion Pricing. Final Report. Disponível em: https://ops.fhwa.dot.gov/ publications/fhwahop08047/intl_cplessons.pdf Leape, J. (2006) The London Congestion Charge. 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O desdobra- mento neste contexto consiste em: examinar os princípios básicos, que vão além de campanhas voltadas para os usuários de veículos automotores; incentivar a mobilidade ativa; e identifi car exemplos de intervenções educativas que possam ser implementadas em dife- rentes contextos e em todas as cidades brasileiras. Capítulo 5 PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO BRIAN EGÍDIO SILVA TEIXEIRA Fundação Getulio Vargas - FGV brianegidio@yahoo.com.br CAMILA SOUZA DANTAS MOTA Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual de Goias - PPGEO/UEG prof.camiladantas@gmail.com MURIEL SYRIANI VELUZA Observatório Social de Paranaguá e Paranaguá Criativa murielveluza@gmail.com JULIANE ÉRIKA CAVALCANTE BENDER Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais - CEFET/MG juliane.erika@gmail.com | 159CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO 1. INTRODUÇÃO A Organização Mundial da Saúde (OMS, 2013) estima que, anualmente, em todo mundo 50 milhões de pessoas sejam feridas em acidentes de trânsi- to e 1,3 milhão de pessoas morram em razão destas fatalidades. No Brasil, dados da Seguradora Líder, administradora do Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), apontam que, entre 2008 e 2018, foram mais de 485 mil indenizações por mortes no trânsito no país (Seguradora Líder, 2019). A OMS (2011) projeta que as lesões causadas no trânsito devem subir do décimo lugar em 2002 para o oitavo lugar até 2030.ção de vítimas e previdência social), mas famílias podem ter parte de sua renda mensal comprometida ao terem seus integrantes impossibilitados de trabalhar em razão de sequelas decorrentes de acidentes no trânsito (OMS, 2011). É estimado, ainda, que os acidentes de trânsito custam, anualmente, cerca de 518 bilhões de dólares (ou, 2,8 trilhões de reais) em todo o mundo (OMS, 2011). Para o caso brasileiro, Carvalho (2020) calcula que, em média, os aci- dentes nas aglomerações urbanas custaram entre R$9,9 bilhões a R$12,9 bilhões em 2014. Tendo em vista a necessidade de ação para conter o aumento do número de vítimas de acidentes no trânsito, a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou, em 2011, a Década de Ação pela Segurança no Trânsito, e, em 2015, foi lançada a Agenda 2030, estabelecendo 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que inclui metas relacionadas aos acidentes de tráfego. Por meio da Meta 3.6, por exemplo, governos de todo o mundo se comprometeram em reduzir pela metade as lesões e mortes no trânsito, necessitando, desta forma, adotar medidas de prevenção e cons- cientização. Recentemente, por meio de uma nova resolução, foi instituída a segunda Década de Ação pela Segurança no Trânsito (ONU, 2020). No Brasil, a faixa etária dos 18 a 34 anos (parte relevante da popula- ção economicamente ativa) representa 39% das vítimas fatais de acidentes de trânsito, com o gênero masculino apresentando uma maior propensão a estar associado a essas fatalidades (Seguradora Líder, 2019). Dessa forma, não somente os governos veem seus recursos sendo consumidos pelos aci- dentes (despesas hospitalares, atendimentos, tratamentos de lesões, remo- Ferraz et al. (2012) argumentam que de forma a reduzir a ocorrência e a gravidade dos acidentes, o corpo técnico de prefeituras e secreta- rias podem atuar em seis áreas, conhecidas em inglês como os seis E’s da segurança viária: • Engenharia (Engineering): projeto de novos trechos viários com ênfase na segurança, tratamento de locais com grande acidentalidade, redução dos limites de velocidade e melhoria das condições de visibilidade das vias; • Educação (Education): atividades contínuas de conscientização da população sobre o respeito às leis e à sinalização de trânsito, de capacitação para condução de veículos e de incentivo à locomoção a pé com segurança. Podem também ser realizadas ações em escolas a fi m de conscientizar as crianças sobre os perigos e de como agir corretamente no trânsito, seja como pedestres, acompanhantes ou futuros motoristas; • Esforço Legal (Enforcement): legislação, fi scalização, punição e documentação dos acidentes; • Engajamento (Engagement): engajamento da sociedade no processo de alcançar uma maior segurança no trânsito, com o envolvimento do governo, empresas, organizações não governamentais, clubes de serviço, associações, poder legislativo e judiciário; • Ambiente (Environment): compatibilização da velocidade e da geometria da via com os aspectos do ambiente ao redor desta; e • Avaliação (Evaluation): avaliação permanente da situação da segurança no trânsito por meio de levantamentos do número de acidentes, assim como a avaliação dos efeitos de medidas tomadas. 160 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 161CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO Ademais, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS, 2020) reco- menda que os países criem metas nacionais para minimizar o tempo decor- rido entre a ocorrência de um acidente e o atendimento por profi ssionais de saúde. Desse modo, este capítulo foca em medidas que podem ser desenvol- vidas no âmbito da educação, apresentando campanhas e ações realizadas nos campos da mobilidade ativa e criação de comitês temáticos. 1.1. Programas e ações de educação para o trânsito Para fi ns de defi nição, entende-se que um programa é um grupo de proje- tos e atividades relacionados e administrados de modo coordenado para a obtenção de benefícios que não estariam disponíveis se fossem gerencia- dos individualmente (PMI, 2017). Sendo assim, estabelecer um Programa de Educação para o Trânsito consiste em gerenciar esforços ordenados para a obtenção dos benefícios esperados no desenvolvimento de um comportamento seguro no trânsito. Dessa forma, a identifi cação destes benefícios auxilia na defi nição de metas e objetivos e devem se desdobrar em ações e projetos em áreas distintas, ensejando o estímulo ao comportamento seguro dos envolvidos no trânsito. Cabe ressaltar que ações focadas na educação para o trânsito podem auxiliar no cumprimento direto de três ODS e suas respectivas metas da Agenda 2030 (ONU, 2015), que, para realidade brasileira, são defi nidas como (IPEA, 2019): • ODS 3 - Saúde e Bem-estar - Meta 3.6: até 2030, reduzir pela metade as mortes e lesões por acidentes no trânsito; • ODS 4 - Educação de Qualidade - Meta 4.7: até 2030, garantir que todos os alunos adquiram conhecimentos e habilidades necessárias para promover o desenvolvimento sustentável, inclusive, entre outros, por meio da educação para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida sustentáveis, direitos humanos, igualdade de gênero, promoção de uma cultura de paz e não violência, cidadania global e valorização da diversidade cultural e da contribuição da cultura para o desenvolvimento sustentável; e • ODS 11 - Cidades e Comunidades Sustentáveis - Meta 11.2: até 2030, melhorar a segurança viária e o acesso à cidade por meio de sistemas de mobilidade urbana mais sustentáveis, inclusivos, efi cientes e justos, priorizando o transporte público de massa e o transporte ativo, com especial atenção para as necessidades das pessoas em situação de vulnerabilidade, como aquelas com defi ciência e com mobilidade reduzida, mulheres, crianças e pessoas idosas. 162 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 163CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO 1.2. Desafi os para implantação de programas e ações de educação para o trânsito 2. CAMPANHAS EDUCATIVAS Uma campanha atua como meio de educação informal e tem por objeti- vo somar esforços e mobilizar pessoas em direção a um resultado específi - co, estimulando a refl exão e adoção de novos comportamentos. A Figura 1 apresenta, simplifi cadamente, um fl uxo de ações que podem ser tomadas de forma a criar uma campanha educativa. Para a realização de uma campanha de educação no trânsito é neces- sário a identifi cação dos problemas, verifi cados no tráfego cotidiano de um município (ultrapassagens em locais proibidos, álcool e direção, entre outros). Em seguida, deve ser realizada a análise de dimensões do proble- ma, ou seja, quais são os grupos envolvidos (grupos críticos), os principais horários (horários críticos) e locais de maior incidência de acidentes (locais críticos). Partindo destes dados, é possível identifi car o público-alvo (pedes- tres, crianças, motoristas, etc.) para adaptação da linguagem e defi nição do foco da campanha, isto é, o que queremos expor às pessoas alcançadas pela campanha (legislação, dados estatísticos ou mortalidade). Ao implementar programas e ações em educação para o trânsito, verifi - ca-se que os desafi os são similares aos que ocorrem em outras áreas da prefeitura, entre eles: • Financiamento: ainda que o custo de uma ação de educação, quando comparado com uma intervenção na infraestrutura, seja demasiadamente inferior, investir em ações de educação possuem um custo associado que podem difi cultar a sua efetivação quanto à aprovação do orçamento do município. Uma alternativa para a falta de orçamento é o engajamento de outros setores como empresas e associações da região, relacionadas à área de transportes, que possamatuar como fi nanciamento complementar para realização das ações; • Continuidade: considerando que o trânsito se faz presente na vida dos habitantes de uma cidade diariamente, as ações de educação para o trânsito devem observar sempre que possível a continuidade da abordagem a temas relacionados à segurança viária com a população do município. A defi nição de metas estruturadas para acompanhamento ao longo do programa auxilia em sua continuidade; e • Mão de obra especializada: as ações e programas de trânsito devem priorizar em sua estruturação a participação de pessoas qualifi cadas em segurança no trânsito, entretanto, a depender do porte da cidade, a mão de obra pode não estar disponível. Cabe ao município a busca da qualifi cação dos responsáveis pela implementação das ações junto aos órgãos ou entidades do Sistema Nacional de Trânsito (SNT). O SNT corresponde ao conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Tem por fi nalidade ati- vidades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de con- dutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fi scalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalida- de (BRASIL, 1998). Figura 1. Exemplo de fl uxo de ações para criação de uma campanha educa- tivacongestionamento. Fonte: Adaptado do Ministério da Infraestrutura (2020). 164 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 165CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO A defi nição do material e formato de divulgação consiste na esco- lha do meio de veiculação da mensagem: internet, outdoor, panfl etos e/ ou redes sociais. Defi nida a frequência da campanha, ou seja, se esta será pontual ou ocorrerá ao longo de um período ou ciclo do ano, passamos para fase de execução da campanha. 2.1. Educação para o trânsito nas escolas O Capítulo VI do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que trata da educação para o trânsito, traz as diretrizes necessárias para as práticas educativas que atuam no órgão ou entidade municipal de trânsito, devendo ser trabalha- do em consonância aos objetivos apresentados no documento da Política Nacional de Trânsito. A proposta dessa seção é apresentar algumas suges- tões que possam ampliar as possibilidades de ações da educação para o trânsito nas escolas e experimentar a cidade como um local seguro para todos e todas. Dessa forma, as entidades de trânsito podem motivar a gestão das escolas a adotar uma política de segurança e estimular a nomeação de um responsável para os assuntos de trânsito na instituição de ensino, respon- sável por formar alunos e demais professores, envolvendo parcerias entre as Universidades/Faculdades para a elaboração de projetos de extensão e conteúdos alinhados à realidade da comunidade. Um instrumento que auxilia para a efetividade das ações é a defi nição dos indicadores que orientam a coleta dos dados que possibilitam a mensura- ção qualitativa ou quantitativa da campanha. Um exemplo de um indicador de qualidade é a aplicação de questionários de satisfação, enquanto para exemplos de indicador quantitativo podem ser citados: o número de pan- fl etos distribuídos para publicações impressas; o número de pessoas abor- dadas em uma campanha expositiva; ou ainda, para uma campanha reali- zada por meio de uma rede social, a quantidade de pessoas que curtiram a publicação. Garantir a qualidade da educação para o trânsito e para a mobilidade, abordando conhecimentos, habilidades, atitudes e motivações, assim como treinamentos periódicos, é importante para manter o conteúdo atualizado e parametrizado por padrões de qualidade, usando testes, processos e ava- liações de resultados — sugere-se, por exemplo, que a escola examine os alunos e permita a eles também uma autoavaliação. É importante o engajamento de toda a comunidade escolar: alunos, professores, pais, funcionários e outros membros que possam estar envol- vidos na cooperação comunitária em prol de um trânsito mais seguro. Isso signifi ca não apenas torná-los participantes, mas também protagonistas, sobretudo os alunos e alunas - englobando-os no planejamento das ativi- dades de educação em segurança no trânsito, tornando, dessa forma, mais fácil conectar o que aprenderam na escola a situações reais envolvendo o tráfego diário. Abaixo são apresentadas ações conjuntas que podem ser realizadas: • Motivar a gestão das escolas a adotar uma política de segurança e estimular a nomeação de um responsável para os assuntos de trânsito; • Buscar parcerias entre as Instituições de Ensino Superior para elaboração e execução de projetos de extensão nos cursos de graduação e pós-graduação, envolvendo assim diversas áreas afi ns, tais como: geografi a, arquitetura, enfermagem, engenharia, computação, pedagogia, entre outros; • Aproximar das Escolas Técnicas e Profi ssionalizantes e conciliar ações conjuntas, a exemplo: Institutos Federais de educação, Sest/Senat, entre outros; • Incluir outros profi ssionais da área, tais como: Polícia Rodoviária Federal, Batalhão da Polícia Militar de Trânsito, instrutores de trânsito e Guarda Municipal; e • Integrar outras instituições e empresas: concessionárias de rodovias, hospitais, Centros de Formação de Condutores (CFCs), Associações, organizações não governamentais, entre outros. 166 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 167CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO 2.2. Alguns exemplos de projetos que podem ser usados como inspiração para ações Realizado no estado de Goiás pela Universidade Estadual de Goiás (UEG), por meio do Programa Educando e Valorizando a Vida (EVV) e do Departamento Estadual de Trânsito de Goiás (DETRAN/GO), os concursos para as escolas 2019 premiam charges, HQs e redações sobre mobilidade urbana e trânsito, conforme ilustrado na Figura 2. Saiba mais em: Concurso Semana Nacional de Trânsito¹ . Também podem ser destacadas as palestras realizadas em parceria com a Secretária Estadual de Saúde do Estado de Goiás e a UEG, por meio do EVV, que ocorreram em escolas de ensino básico e em locais públicos, tais como shopping e feiras livres, conforme exposto na Figura 3. 2.3. Criação do Conselho Municipal de Trânsito Conforme o CTB: “o trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adota- rem as medidas destinadas a assegurar esse direito” (BRASIL, 1998, p. 1). Figura 2. Concurso de charges, HQs e redações em escola pública em 2019. Fonte: Cidade de Goiânia/GO, acervo pessoal dos autores. Figura 3. Palestras de Educação para o Trânsito em 2019. Fonte: Cidade de Anápolis/GO, acervo pessoal dos autores. 1. http://www.ueg.br/ noticia/43278_semana_ nacional_de_transito_ ueg_premia_charges_ hqs_e_redacoes_sobre_ mobilidade O Governo brasileiro por meio da “Terceira Conferência Ministerial Global sobre Segurança Viária: Atingindo Metas Globais 2030”, em 2020, reiterou o seu compromisso com a redução de acidentes para atingir os ODS, com- partilhando responsabilidades com outros países, entre elas a de: “Garantir o comprometimento e a responsabilidade política no mais alto nível e estabelecer estratégias e planos de ação regionais, nacionais e sub- nacionais para segurança no trânsito e contribuições de diferentes agên- cias governamentais, bem como parcerias multissetoriais para oferecer a escala de esforços exigidos em nível regional, nacional e subnacional para atingir as metas dos ODS, e que essas estratégias e esforços sejam transpa- rentes e públicos”(ONS, 2020, p. 1). Entendemos que, no âmbito municipal, as prefeituras e secretarias têm o papel de estimular e aplicar boas práticas em segurança viária, entre elas: criação de um conselho ou comitê multissetorial que possa entender os motivos de incidência de acidentes de trânsito na cidade. O objetivo deste Conselho é gerir, analisar, defi nir e implementar as ações que bus- quem melhoria na segurança do trânsito, considerando as características do município e sua composição de tráfego Os dados que podem subsidiar as ações deste Comitê fazem parte da análise de acidentalidade obtidos nas seguintes fontes: órgãos de trânsito locais, Polícia Militar ou Civil, Polícia Rodoviária Federal, secretarias munici- pais de saúde ou nos núcleos de secretarias estaduais de saúde, hospitais e Instituto Médico Legal (IML). Extraindo, também, informações como: local, 168 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 169CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO horário, tipo de acidente, condições ambientais, tipo de veículo envolvido e fator de risco envolvido (Ferraz et al., 2012). Alguns resultados do tratamen- to e consolidação desses dados podem ser: locais críticos (onde ocorrem um grande número de acidentes), eventos críticos (jogos, exposições, entre outros), datas críticas (feriados prolongados, carnaval, natal, etc.) e horários críticos (Ferraz et al., 2012). Uma vez consolidadas as análises citadas acima, o Comitê pode iden- tifi car as possíveis causas dos acidentes, tais como: falta de infraestrutura, sinalização, fi scalização, de medidas educativas e propor ações corretivas. Cumpre ressaltar que para o sucesso do Conselho/Comitê devem ser adota- dos critérios específi cos para a seleção dos integrantes, entre eles: interesse e engajamento com a causa, experiência, conhecimento e formação. Desta forma, a criação de um Conselho/Comitê é indicada não somen- te para as grandes cidades, mas também para municípios menores, que podem constituí-lo por meio de integrantes de outros órgãos governamen- tais (policiais, profi ssionais da área da saúde, membros da universidade, bombeiros, funcionários de secretarias relacionadas, entre outros) e, a fi m de democratizar as decisões a serem tomadas por este Comitê, sugere-se que este possua integrantes da sociedade civil. Podendo, desta forma, ser observada uma divisão que privilegie a maior participação percentual de integrantes da população, e, assim, reduzindo os custos e aumentando o alcance do debate. 2.3.1. Exemplos de Conselhos Municipal de Trânsito CONSELHO MUNICIPAL DE TRANSPORTE E TRÂNSITO (CMTT) EM SÃO PAULO O Conselho Municipal de Transporte e Trânsito (CMTT) foi instituído pelo Decreto 54.058, de 01 de julho de 2013, durante a gestão de Fernando Haddad (PT). O Conselho tem caráter consultivo e é formado por três ban- cadas: poder público, operadores dos serviços e usuários. As duas primeiras bancadas são formadas por indicados da Prefeitura (como indicados da Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes, por exemplo) e de organizações relacionadas aos setores da mobilidade (como o Sindicato dos Motoristas e Cobradores de SP, entidades de ciclistas, enti- dades de pedestres, Sinditaxi, etc). A bancada dos usuários é a mais demo- crática e heterogênea, sendo seus membros eleitos pela população. Ela é composta por cinco representantes de cada região da cidade e dez mem- bros representantes de temas ligados ao trânsito, transporte e mobilidade em geral. Outras cidades com composição do Conselho: • Conselho Municipal de Trânsito de Paranaguá/PR: Decreto municipal de composição do Conselho 2; • Conselho Municipal de Transporte e Mobilidade de Goiânia/ GO: Competências 3. 2.3.2. Exemplos de projetos de monitoramento de acidentes de trânsito para subsidiar atuação dos Conselhos PROJETO VIDA NO TRÂNSITO Projeto coordenado pelo Ministério da Saúde conjuntamente com a OPAS, tem por fi nalidade qualifi car os atores que estão envolvidos em implantar o monitoramento e a redução das mortes e lesões graves no trânsito, a partir da qualifi cação da informação, de ações planejadas, desenvolvidas e execu- tadas intersetorialmente. Mais informações em: Projeto de redução da morbimortalidade por acidentes de trânsito 4. 2. https://leismunicipais. com.br/a/pr/p/paranagua/ decreto/2014/163/1625/ decreto-n-1625-2014-com- poe-o-conselho-municipal- -de-transito 3. https://www.goiania. go.gov.br/conselho-munici- pal/conselho-municipal-de- -transporte-e-mobilidade- -de-goiania/ 4. http://bvsms.saude.gov. br/bvs/publicacoes/prog_re- ducao_acidentes.pdf 170 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 171CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO MANUAL PARA FORMAÇÃO DE SISTEMA DE DADOS Para a formação de um sistema confi ável de dados de acidente de trânsito em sua cidade, segue o link do manual que traz orientações práticas para direcionar estratégias, como monitorar resultados e avaliar impactos, a par- tir de experiências realizadas em todo o mundo. Mais informações em: Sistema de dados: um manual de segurança viá- ria para gestores e profi ssionais da área 5. 2.4. Ações focadas na mobilidade ativa Neste tópico, vale a constatação: “somos todos pedestres”. Afi nal, a forma mais simples de deslocamento das pessoas é realizada a pé, seja para ini- ciar um trajeto ou para fi nalizá-lo. O deslocamento a pé pode ser o único meio de locomoção, seja para um percurso de curta distância, ou para um longo trajeto. Neste contexto, para ampliar a dimensão da mobilidade ati- va, que inclui também veículos de propulsão humana, como a bicicleta - com uma frota estimada de 50 milhões veículos de duas rodas, de acordo com a Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo), considerando a produção nacional e o tempo de vida mínimo de sete a nove anos. Daí a importân- cia de criar e propiciar campanhas que garantam formas mais saudáveis e seguras de ocupar os espaços públicos e de se movimentar nas cidades. Portanto, é fundamental que exista um diálogo com os cidadãos desde cedo, construindo uma agenda social que responda às necessidades reais de cada região e contribuindo para que esse tema se converta em uma vari- ável importante no cotidiano das pessoas, desde a infância. Sendo assim, o poder público e as organizações responsáveis devem considerar o trânsito seguro e a educação em mobilidade como direitos do cidadão. Diante disso, esses tópicos podem constar nos currículos escolares de forma contínua e progressiva, buscando fi nanciamento específi co por meio de projetos na iniciativa privada e pública. Temos exemplos nacionais e no mundo que exemplifi cam a efi cácia de ações educativas, a exemplo dos projetos: BICICLETA NA ESCOLA Ocorre em Florianópolis - SC, em que membros do projeto ensinam crianças da rede municipal a pedalar com segurança. Esse trabalho permite conci- liar um aumento na atividade física a uma melhora na saúde infantil, como também no engajamento geracional às bicicletas. Saiba mais em: bicicleta na escola 6. ÔNIBUS A PÉ O objetivo é incentivar a ida a pé até a escola, de forma segura para as crian- ças, reduzindo o congestionamento do ônibus escolar. Esta ação motiva a comunidade a caminhar, promovendo um estilo de vida mais saudável para as crianças e despertando a consciência ambiental - por meio de um maior contato com a cidade e um conhecimento mais aprofundado da mesma Segurança é um conceito primário que diz respeito ao modelo do Ônibus a Pé, em que voluntários são treinados para um trajeto e assessora- dos pelas escolas, garantindo, assim, a segurança das crianças. Este treina- mento é resultadode uma ação conjunta desenvolvida diretamente com os diretores das instituições e com os agentes de trânsito. Saiba mais em: Guia do ônibus a pé 7 e Cartilha do bonde a pé 8. 5. https://www.paho.org/ bra/index.php?option=- com_docman&view=- download&alias=1480-sis- tema-dados-um-manu- al-seguranca-viaria-para- -gestores-e-profi ssionais- -da-area-0&category_slu- g=acidentes-e-violencias- -086&Itemid=965 6. https://www.mobilize.org. br/noticias/10429/professo- ra-de-fl orianopolis-leva-pro- jeto-bicicleta-na-escola-a- -holanda.html 7. https://criancasegura. org.br/wp-content/uplo- ads/2016/08/Guia-onibus- -a-pe.pdf 8. http://corridaamiga. org/wp-content/uplo- ads/2019/06/Cartilha-do- -Bonde-a-P%C3%A9.pdf A mobilidade ativa no meio urbano precisa ser levada a sério e ganha importância à medida que as cidades vão crescendo. Seja um município de pequeno, médio ou grande porte, precisamos ter atenção com o transpor- te urbano e a forma como se acessa as ruas nestes locais. Nesse contexto, surge um tema que vai além do Plano Diretor, a Agenda da Mobilidade, que precisa ser observada e pode ser modelada por meio da educação. Para isso, precisamos que cidadãos e organizações mudem o seu comportamento, não somente pela questão da mobilidade em si, mas também pela questão ambiental que isso implica. 172 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 173CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO BIKE ANJO O Bike Anjo é um projeto em que ciclistas experientes ensinam gratuita- mente pessoas de todas as idades a andar de bicicleta nas ruas com segu- rança, ou mesmo quem quer aprender a se equilibrar em duas rodas. Além do ensino, ajudam a escolher rotas mais tranquilas, passam conceitos de segurança e comportamento no trânsito e ensinam o básico para a utili- zação da bicicleta. A pessoa interessada preenche um formulário no site do Bike Anjo e é colocada em contato com um ciclista experiente em sua região para atendê-lo. Saiba mais em: Bike anjo 9. CONCURSO MISS CALÇADA A proposta do concurso Miss Calçada é premiar a melhor calçada da cidade. Originalmente, essa competição foi organizada pela ONG SampaPé, em São Paulo, entre os dias 7 e 13 de agosto de 2017, em alusão ao dia mundial do pedestre, no dia de 8 de agosto. A intenção é fomentar a concorrência de forma colaborativa pelo público caminhante, podendo ser estudantes, ido- sos ou clientes de algum estabelecimento comercial, por exemplo através de fotografi as postadas via redes sociais. É possível cada prefeitura criar os incentivos para premiar as melhores calçadas e, assim, estimular o maior número de pessoas a se inscreverem. Saiba mais em: Concurso miss calçada 10. 2.5. Agenda para a segurança no trânsito No trânsito, assim como em outras áreas, temos datas comemorativas que visam mobilizar toda a população em torno de um tema específi co. Reforçamos que as ações para a segurança no trânsito devem ser contínuas ao longo de todo o ano para a garantia da preservação do sistema. O calen- dário exposto na Figura 4 apresenta algumas datas que podem compor uma “Agenda de ações para promoção da segurança no trânsito”. As datas em negrito são explicadas nos próximos parágrafos. MAIO AMARELO É um movimento internacional de conscientização para a redução de aci- dentes no trânsito. Esta iniciativa é realizada neste mês em consideração à Década de Ação para Segurança no Trânsito, decretada pela ONU em 11 de maio de 2011. O objetivo desta campanha é colocar em pauta para a sociedade o tema do trânsito, estimulando a participação da população, de empresas, governos e entidades. No site do Movimento Maio Amarelo é pos- sível obter conteúdo para a realização de ações e eventos. Saiba mais em: Maio amarelo 11. Figura 4. Datas importantes para segurança no trânsito. Fonte: Elaborado pelos autores. 9. http://corridaamiga. org/wp-content/uplo- ads/2019/06/Cartilha-do- -Bonde-a-P%C3%A9.pdf 10. https://www.archdaily. com.br/br/875816/concur- so-miss-calcada-sp 11. https://maioamarelo.com/ 174 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 175CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO DIA DO PEDESTRE O dia do pedestre é comemorado no dia 08 de agosto. É uma data que deve ser lembrada principalmente pelo cuidado que os motoris- tas, motociclistas e ciclistas devem ter com quem está a pé e que divide o espaço nas ruas. Para realização da conscientização nessa data, recomenda-se o empre- go de conteúdo ou campanhas que reforcem comportamentos positivos dos diversos usuários das vias em relação aos pedestres. DIA NACIONAL DO CICLISTA No dia 19 de agosto é comemorado o dia do ciclista. A data foi estipulada em razão do atropelamento de um ciclista em Brasília em 2006. O Biólogo Pedro Davisón foi atropelado por um motorista alcoolizado que tinha sua Carteira Nacional de Habilitação suspensa e estava dirigindo em alta veloci- dade. Foi a primeira condenação em Brasília como crime doloso de trânsito. Quatros anos depois o criminoso foi condenado, em fevereiro de 2010. Saiba mais em: Dia nacional do ciclista 12. DIA MUNDIAL SEM CARRO O Dia Mundial sem Carro ocorre no dia 22 de setembro, trata-se de uma data de ação mundial em que são adotadas atividades que estimulam o uso do transporte público e ativo em detrimento do transporte individual. SEMANA NACIONAL DO TRÂNSITO O objetivo dessa semana é conscientizar a população sobre a importância da mudança de atitude no trânsito, evidenciando que cada um é responsá- vel pela segurança de todos e, por isso, deve perceber os riscos e proteger a própria vida e a dos demais ao seu redor. DIA MUNDIAL EM MEMÓRIA DAS VÍTIMAS DE TRÂNSITO O terceiro domingo de novembro, instituído pela ONU em 1995, marca o Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes de Trânsito. Nesta data são homenageadas, não só as pessoas que morreram em decorrência des- sas fatalidades, mas também familiares, amigos, equipes de emergência, policiais, enfermeiros e médicos que lidam diariamente com as consequên- cias traumáticas das mortes e lesões no trânsito. 3. CONCLUSÃO Este capítulo buscou delinear os conceitos, os desafi os e a importância da realização de programas com foco na redução da acidentalidade no trânsi- to. Foram apresentados exemplos reais de ações e projetos realizados em diferentes cidades brasileiras, provando que é possível a criação de esforços que busquem a construção de cidades mais seguras. É importante frisar que para executar com qualidade as ações educati- vas com foco em evitar e/ou diminuir as lesões e mortes causadas no trân- sito é necessária, sobretudo, uma colaboração coordenada e integrada com diversas áreas, tanto para mobilizar pessoas chaves na estrutura da gestão municipal, assim como para buscar outras parcerias com entidades públi- cas ou privadas, estadual ou federal que estão ligadas com a temática. Tais cooperações são fundamentais para ampliar as possibilidades de continui- dade dos programas e/ou projetos de educação para o trânsito no municí- pio, diminuir os gastos e expandir o contato com profi ssionais de diversos conhecimentos. 12. https://www.uol. com.br/carros/colunas/ pedala/2020/08/19/dia-na- cional-do-ciclista-e-ho- menagem-a-ciclista-atro- pelado-em-brasilia.htm 176 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 177CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO 4. REFERÊNCIAS Azevedo Filho, M. A. N. de. (2012). Análise do processo de planejamento dos transportes como contribuição para a mobilidade urbana sustentável. Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo. Obtido de http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/18/18144/tde-11122012-091904/pt-br.php. BRASIL. (1998). Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. 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Acesso em 10 dez 2020. 178 | CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO | 179CAPÍTULO 5 - PROGRAMAS E AÇÕES DE EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PARA A SEGURANÇA NO TRÂNSITO Capítulo 6 RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO RESUMO Este capítulo irá apresentar alguns fundamentos teóricos acerca das chamadas “ruas completas” e como elas atuam na promoção da mobi- lidade urbana inteligente e sustentável junto aos transportes público e ativo. Neste sentido, serão abordados os benefícios e as potencia- lidades das ruas completas, além das principais estratégias para sua implementação nas cidades brasileiras. Por fi m, também serão apre- sentados alguns exemplos exitosos de concepção, construção e ges- tão de infraestrutura viária urbana sob a ótica das ruas completas para o transporte público e ativo. | 183CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO ARTHUR MARQUES DE ALMEIDA XAVIER Universidade Federal do Rio Grande do Norte arthurmarques.ax@gmail.com DANTON WILSON DE FIGUEIREDO RIBEIRO FILHO Universidade Estadual de Campinas dantonwfrf@gmail.com LÚCIA REJANE DE ALMEIDA XAVIER Universidade Federal do Rio Grande do Norte xluciarejane@gmail.com LEONARDO FILIPE DOS SANTOS Universidade de Pernambuco leonardo.f ilipe.snts@gmail.com LUIZA BANDEIRA RODRIGUES DE CARVALHO Universidade de Pernambuco luizabandeirac@gmail.com BRUNO DE OLIVEIRA LÁZARO Universidade Federal de Uberlândia brunodeoliveiralazaro.engcivil@gmail.com 1. INTRODUÇÃO Problemas associados à mobilidade urbana têm sido constantes nas cida- des ao redor do mundo e, geralmente, são intrínsecos aos processos de urbanização, planejamento, uso, ocupação e gerenciamento do ambiente urbano (ONU, 2016; WRI Brasil, 2017; Maropo et al, 2020). Entre estes pro- blemas, pode-se destacar a acidentalidade viária, a falta de capacidade dos sistemas de transporte urbanos em atender às demandas populacionais e os impactos ambientais decorrentes do aumento da frota de veículos auto- motivos movidos a combustíveis fósseis (Villaça, 2001; Figueiredo, 2010). Neste sentido, novas abordagens têm sido propostas com o objetivo de otimizar a mobilidade urbana e a dinâmica de uso e ocupação do solo nas cidades, proporcionar uma urbanização inteligente e a minimização dos problemas associados aos transportes (Laplante e McCann, 2011). Assim, as ruas completas (complete streets) vêm ganhando destaque na comunida- de científi ca internacional (Mofolasayo, 2019). As ruas completas podem ser defi nidas como elementos de infraestrutura viária projetados, construídos e gerenciados para garantir a variedade de modos de transporte e a harmonia entre diferentes tipos de uso e ocupação do solo (McCann, 2013; Suzuki et al, 2013; Valença e Santos, 2017; Mofolasayo, 2019). A Figura 1 ilustra, de modo esquemático, estes elementos. Conforme pode ser visto na Figura 1, em termos de infraestrutura, as ruas completas devem, portanto, possuir mobiliários urbanos e edifi ca- ções com fachadas ativas e apresentar sinalização viária efi ciente. Além dis- so, também é importante que sejam implantadas vias exclusivas ou com- partilhadas para diversos modos de transporte e que a mobilidade local seja concebida dentro da escala do pedestre. Neste contexto, a variedade de modos de transporte nas vias é forte- mente recomendada aos gestores públicos e profi ssionais da área de mobi- lidade. Além disso, estes profi ssionais devem buscar a acessibilidade em todos os elementos associados ao transporte urbano e sua consonância com o uso e ocupação inteligente do solo (Brown et al, 2015; Suzuki et al, 2013; Zavestoki e Agyeman, 2015; Maropo et al, 2015).Figura 1. Esquema geral de elementos que constituem uma rua completa. Fonte WRI Brasil (2019). Adaptado pelos autores (2020). 184 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 185CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO 2. RUAS COMPLETAS PARA O TRANSPORTE URBANO Nessa seção serão apresentados casos específi cos de intervenções urba- nas bem sucedidas que estão dentro da lógica das ruas completas para infraestruturas particulares de transporte público e ativo. Também serão expostos os principais benefícios e desafi os enfrentados por cada uma des- sas intervenções, bem como métodos para gerenciá-las segundo a ótica das ruas completas. Dentre os vários benefícios da implantação de projetos de ruas comple- tas, pode-se ressaltar a democratização do uso do espaço urbano atra- vés da priorização dos transportes sustentáveis e a criação de vias e faixas exclusivas para transportes público e ativo (WRI, 2016), gerando impactos positivos na sustentabilidade, segurança, economia e capacidade das vias (NACTO, 2018). O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT, 2006) caracteriza a capacidade da via como a quantidade de veículos que passa num trecho da rua durante determinado tempo. Davis (2018) ressal- ta, porém, a importânciade mover pessoas ao invés de mover automóveis. Complementarmente, a NACTO (2018) avaliou a capacidade de deslocamen- to de pessoas através de alguns modos de transporte dentro dos mesmos parâmetros e observou os veículos motorizados de uso privado com menor capacidade de deslocamento de pessoas por hora. Por meio do redesenho viário voltado às ruas completas, é possível dupli- car a capacidade da via (Figura 2), transportando mais pessoas dentro do mes- mo espaço e permitindo maior fl uidez e efi ciência aos modos sustentáveis. Através de medidas como redução do espaço do automóvel, uso diver- sifi cado das edifi cações, fachadas ativas e inclusão do transporte sustentá- vel (público e ativo), é possível tornar o ambiente um espaço proveitoso, eco- nomicamente ativo, seguro, confortável e interessante para todos (Speck, 2017; Teixeira e Silva, 2018). Quanto mais acolhedor e atrativo for o trajeto realizado, maior será o número de pessoas na região, o que aumenta a sen- sação de segurança e benefi cia comerciantes locais. Figura 2. Diferentes capacidades da mesma via an- tes e depois do redesenho com foco em ruas completas. Fonte: Autores. 2.1 Faixas e pistas exclusivas para transporte público Uma das medidas mais comuns para se priorizar o transporte público é a criação de faixas ou pistas exclusivas. Essa proposta busca reduzir as inter- ferências e disputas por espaço nas vias entre o transporte público e outros modos, isso reduz o número de acidentes e o tempo de viagem, aumentan- do a confi abilidade no serviço e, assim, atraindo mais usuários (Lombardo et al, 2018; TCRP, 2003). 2.1.1 Faixas exclusivas: Trata-se do primeiro nível de segregação entre o transporte público e os demais veículos, ocorrendo através de sinalização vertical e horizontal, mas sem obstáculos físicos - segregação parcial do fl uxo de tráfego. Segundo NTU (2013), essa proposta se destaca pelo curto prazo na implantação (1 a 6 meses), pelo baixo custo (entre 100 mil e 500 mil reais por quilômetro) e por trazer resultados rápidos para os usuários do transporte público: estima-se que a redução de combustível seja de até 30%, a emissão de poluentes em até 40% e o tempo de viagem seja até 40% menor. 186 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 187CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO A implantação de faixa exclusiva junto à calçada (Figura 3) requer fi scali- zação para garantir o uso exclusivo da faixa diante da constante interação com veículos que precisem utilizar a faixa da direita (conversões, acesso a lotes, car- ga/descarga). A faixa exclusiva junto ao canteiro central já busca resolver essas questões (Figuras 4 e 5). Ela reduz as interferências com outros veículos, mas requer cuidados quanto à travessia segura para pedestres irem até as paradas e impede conversões à esquerda (SEDU/PR e NTU, 2002). Figura 5 Faixa exclusiva ao centro da via com pontos de embarque laterais alternados. Fonte Autores Figura 6 Faixa exclusiva no contrafl uxo junto à calçada. Fonte Fórum de Mobilidade Ativa, 2018. Tabela 1 Requisitos e critérios para faixa exclusiva Fonte: Autores. Outra alternativa é a faixa exclusiva no contra-fl uxo junto à calçada (Figura 6), ela é usada para reduzir itinerários em locais de via de mão úni- ca ou quando não há possibilidade de se implantar um binário próximo, por exemplo. Essa medida, entretanto, exige restrições e regulamentações quanto às conversões à direita, acesso a lotes adjacentes, carga/descarga e estacionamento junto à calçada (SEDU/PR e NTU, 2002). A tabela 1 compila requisitos para a implantação e os critérios de proje- to (Fonte MMB,1987; Ferraz e Torres, 2004; adaptado pelos autores, 2020) na priorização do Transporte Público Coletivo por ônibus, considerando opera- ção em faixas exclusivas. Figura 3 Faixa exclusiva junto à calçada. Fonte: Autores. Figura 4 Faixa exclusiva ao centro da via com plataforma de embarque no canteiro central. Fonte: Autores. Faixa exclusiva/ Operação Requisitos Fluxo mínimo de coletivos por hora Critérios de projeto Largura de faixa Faixa no fl uxo junto à calçada 25 coletivos por hora, tráfego geral com grande fl uxo operando em mais de 2 faixas, pontos de parada no trecho. Faixa de 3,25 a 3,50m. Superlargura nas curvas. Faixa no fl uxo junto ao canteiro central 25 coletivos por hora, signifi cativo volu- me de conversões à direita, necessidade de permissão de estacionamento e/ou carga e descarga junto à calçada, vias de duplo sentido. Faixa de 3,25 a 3,50m, canteiro central com largura de 2 a 3m nos pontos de parada. Faixa no contrafl uxo junto à calçada 20 coletivos por hora, via de sentido único com largura entre 9 e 12m. Largura da faixa acima de 3,25m. Não é permitido estacionamento junto à calçada. 188 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 189CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO 2.1.2 Pista exclusiva Diferente das faixas, a pista exclusiva apresenta barreiras físicas (canteiros, muretas, grades, etc.) separando o tráfego geral (Ex: corredores tipo BRT - Bus Rapid Transit). O maior nível de segregação implica em uma redução do tempo de viagem, da emissão de gases poluentes e economia de com- bustível ainda maiores que na faixa exclusiva, apesar de seus custos e tempo de implantação também aumentarem. 2.1.3 Exemplos exitosos A tabela 2 traz exemplos de aplicações de faixas e pistas exclusivas em cidades brasileiras com alguns dos resultados alcançados (NTU, 2013; ITDP, 2017 b). Tabela 2 Exemplos de melhorias por implantação de faixas e pistas exclusivas Fonte: Autores Figura 7 Pista exclusiva Fonte: Autores. As pistas exclusivas geralmente são implantadas nas faixas mais à esquerda das vias, o que traz as questões da impossibilidade de conversões à esquerda e retorno para os demais veículos, além da necessidade de pro- ver travessias seguras para pedestres e demais deslocamentos da mobilida- de ativa (NTU, 2002). Também é fundamental ter em mente que, dependendo do projeto e da área de implantação, essa pista pode representar uma barreira física, segregando áreas urbanas adjacentes (NTU, 2002) e a travessia de pedestres, usuários mais vulneráveis e ciclistas deve ser avaliada com muita atenção. A inserção de passarelas, por exemplo, pode representar um estímulo à traves- sia irregular e fugir do conceito de rua completa, ao forçar o pedestre a um caminho muito mais longo e exposto do que uma travessia no nível da rua. Cidade Rua/trecho Tipo de intervenção Resultados Goiânia Ruas 10 e 261, co- nectando a Praça Cívica e a Praça da Bíblia. Faixa exclusiva Aumento de 30% na velocidade dos ônibus e 84,7% dos usuários apoiam as faixas exclusivas. Rio de Janeiro 4 km da Av. Nossa Senhora de Copacabana tem 3,5 km nas ruas Barata Ribeiro e Raul Pompéia. Faixa exclusiva Redução de 50% do tempo médio de viagem e re- dução de 20% da frota necessária. São Paulo 13 km da Cidade Dutra, Interlagos, Washington Luis, até Campo Belo Faixa exclusiva Redução de 71% do tempo médio das viagens. Recife Corredores Leste-Oeste e Norte-Sul Corredores ex- clusivos (sistema BRT) Tempo de viagem reduzido em 28% para o Leste-O- este e 16% no Norte-Sul. 190 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 191CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO Assim, para que as intervenções e estratégias citadas sejam efetivas, é fundamental promover um amplo debate destas junto aos atores envolvi- dos. De igual forma, devem ser debatidos e amplamente divulgadas todas as fases do processo de implantação, fi scalização e monitoramento, além dos resultados e benefícios pretendidose alcançados. 2.1.4 Medidas complementares e difi culdades de implantação A implantação de faixas e pistas exclusivas pode ocorrer em conjunto com outras medidas que visem mitigar as desvantagens ou ampliar os benefí- cios aqui expostos. A pista exclusiva tem sido muito utilizada em operações de BRT, que naturalmente envolvem outras melhorias (modernização de veículos e paradas, pagamento antes do embarque, etc.). Com relação às faixas exclusivas, recomenda-se o uso de métodos de priorização semafóri- ca e prioridade em cruzamentos para o transporte coletivo. Estas são cita- das por Ferraz e Torres (2004) como ações importantes para obter maiores velocidades operacionais. Quanto às difi culdades de implantação, comumente são abrangidos aspectos técnicos, como o obstáculo de garantir zonas de carga e descarga e travessias de pedestres seguras, assim como organizar o acesso a lotes. Por isso, deve-se avaliar bem qual a solução e o projeto ideais para cada local e situação. Outra questão a ser considerada é a aceitação e percepção dos agentes envolvidos. Em Londrina, um dos principais pontos de debate ao se apre- sentar a proposta de faixa exclusiva foi a redução de estacionamento na via. Comerciantes se opuseram à medida que iria reduzir as vagas para seus clientes e difi cultar a carga e descarga de mercadorias, isso fez com que a proposta original fosse adaptada para permitir a carga e descarga nas ruas transversais. Além disso, em um dos trechos do projeto foi permitido o esta- cionamento junto ao canteiro em regime de teste (Dutra e Becker, 2015). 2.2 Vias exclusivas para pedestres Na tentativa de tornar as ruas ainda mais completas, consolidando em sua plenitude uma relação harmoniosa entre ciclista, condutor, pedestre, resi- dente, trabalhador, transporte público, ativo e individual, existe também a opção de criar vias exclusivas para pedestres, chamada “pedestrianização”. Assim, a criação de uma rua completa, envolve principalmente colocar o pedestre no centro da tomada de decisão, ao invés do carro, cujos usuários têm sido historicamente benefi ciados. Priorizar os condutores de automóveis fez com que muitas funções da cidade, como trabalho e moradia, por exemplo, fossem separadas, pois ape- sar deles conseguirem acessar estes serviços mesmo distantes, utilizando o carro, o mesmo não se pode dizer dos usuários de transporte público e ciclistas, os quais se tornam vítimas da desigualdade e segregação espacial (Dias et al. 2017, apud, Rolnik, 2012). Neste contexto, a pedestrianização de espaços públicos é uma das estratégias de desenvolvimento urbano que, além de contribuir para ruas mais completas, foi concebida a partir da ótica do pedestre, sem acentuar desigualdades. Os benefícios das zonas de pedestre contemplam diversos campos, dentre eles: economia, segurança e criminalidade. Notam-se ganhos consideráveis nos níveis de segurança nas zonas de pedestres, visto que os usos mistos e a existência de diferentes atividades no local o torna constantemente ocupado, o que difi culta a ação de crimi- nosos e vândalos (Soni et al., 2016). Além disso, nós somos muito sensíveis à inibidores, ou seja, em um espaço com muitas pessoas existe uma vigilância espontânea, na qual cada cidadão inibe o outro de cometer práticas consi- deradas negativas e imorais (Jacobs, 2000). 192 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 193CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO Além disso, nota-se, também, a diminuição do número de acidentes em áreas pedestrianizadas, uma vez que as velocidades dos veículos ten- dem a diminuir. Medidas de controle de velocidade, além de terem baixo custo, diminuíram em quase 60% o número de acidentes na Inglaterra (Soni et al. 2017, apud, Webster et al. 1996) e 80% na Holanda (Soni et al. 2017, apud, Schlabbach, 1997). Já na perspectiva econômica, apesar de historicamente sofrerem forte oposição de comerciantes (Soni et al, 2016), as zonas de pedestre contribu- íram para que cidades como Londrina e Bauru vivenciassem aumentos de quase 70% nas vendas do comércio e uma valorização dos imóveis locais (Januzzi, 2006). Os três principais tipos de pedestrianização foram descritos por Soni et al (2016), sendo elas: período total, período parcial e baseadas em modera- ção de tráfego. O que as difere é basicamente sua tolerância aos veículos, podendo restringí-los totalmente ou parcialmente com limitações de horá- rios, velocidade e estacionamento. Figura 8. Calçadão de Londrina - Paraná Fonte: Januzzi, 2006. Figura 9 Calçadão de Bauru - Sào Paulo Fonte: Januzzi, 2006. Em alguns casos, um nível de pedestrianização pode ser utilizado como transição ou ser adotado temporariamente, antes de avançar para outro mais rigoroso. Lembrando que não existe pedestrianização absoluta e sempre são abertas exceções para veículos públicos e de serviços, mesmo em zonas de pedestre. As fi guras 8, 9 e 10 revelam exemplos de “calçadões”, ou seja, zonas de pedestres, implementados em três diferentes cidades e regiões do Brasil, o que revela a alta adaptabilidade dessa intervenção e vai além de escala e características geográfi cas e físicas do município. Figura 9 Calçadão da Orla de Salvador - Bahia. Fonte Marcus Alves, 2019.1 1. Disponível em: <https://unsplash.com/ photos/-yrin-Mm_N4>. Acesso em: 24/01/2021. 194 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 195CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO A fi m de criar ruas completas via “pedestrianização”, algumas precau- ções são necessárias. Primeiramente, “pedestrianizar” não é isolar (Soni et al, 2016), o foco aqui é trazer vida e animação para uma região da cidade. A mobilidade não é o fi m, mas o meio. As pessoas não se movem pelo deslo- camento em si, mas pelo objetivo de satisfazerem suas necessidades, então “pedestrianizar” pode ser uma oportunidade de tornar aquela zona um fi m para muitas pessoas, um local de desejo para onde elas queiram ir. Alguns elementos não podem faltar para uma via de pedestres bem sucedida, que são, segundo Januzzi (2006): • Estrutura física restaurada e preservada; • Reforço da vida social através do estímulo ao setor terciário; • Fachadas ativas, que fazem as pessoas se voltarem para a rua, trazendo segurança; • Diversidade de população; • Espaços e atividades culturais; e • Acesso ao transporte público. E, fi nalmente, de acordo com Soni et al (2016), um alto potencial de pedestrianização geralmente é evidenciado por: • Baixa taxa de estacionamento; • Ruas relativamente estreitas; • Alta densidade populacional; • Uso do solo misto; e • Deslocamentos curtos. 2.3 Vias e faixas exclusivas para transporte cicloviário Para que uma cidade se torne mais ciclo inclusiva, além de uma infraes- trutura dedicada à bicicleta, que combine diferentes tipologias e formatos, é necessária a adoção de um conjunto de estratégias: medidas de deses- tímulo ao uso do automóvel, redistribuição do espaço viário, moderação de tráfego, criação de sistemas de bicicletas compartilhadas e integração da bicicleta com outros modos (ITDP, 2017B). Por infraestrutura cicloviária entende-se um conjunto de elementos, incluindo vias, sinalização e locais para estacionamento. As estrutu- ras de circulação de bicicleta podem ser categorizadas como ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas, sendo diferenciadas pelo seu grau de segrega- ção em relação à via para carros, velocidades recomendadas e sinaliza- ção (Figura 11). Figura 11 Diferença entre ciclovia, ciclofaixa e ciclorrota. Fonte ITD,2017A As vias são espaços públicos e devem ser amplamente utilizadas por todos de forma democrática. Entretanto, de acordo com dados do ITDP (2017), o cenário atual em muitas cidades brasileirasainda é de prio- rização dos veículos motorizados, em especial os automóveis particulares, que representam 30% dos deslocamentos e ocupam de 70% à 90% do espaço viário. 196 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 197CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO Diante disso, a saturação das vias deve ser vista como oportunidade para a redistribuição dos espaços de forma mais equitativa e os custos dessa medida, em geral, são baixos. Assim, como já mencionado, o conceito de ruas completas inclui, justamente, o acesso seguro à via a todos os usuários, independentemente do modo de deslocamento utilizado. Medidas para atrair o transporte coletivo e ativo devem ser aplicadas de forma conjunta a estratégias que desestimulem o uso do automóvel, incluindo um controle maior da disponibilidade de vagas de estacionamen- to gratuito, do limite de circulação com a cobrança por congestionamento (pedágio urbano) e de zonas com controle de velocidade máxima dos auto- móveis particulares (zonas 30). A fi gura 12 ilustra o Largo do São Francisco, em São Paulo, após intervenção realizada em 2017, onde vagas de estacio- namento deram espaço a ciclovias e faixas para pedestres. A intermodalidade cumpre um papel fundamental para a ampliação da capilaridade dos sistemas de transporte de média e alta capacidade, uma vez que a bicicleta é mais efi ciente que a caminhada, sendo utiliza- da como complementar à viagem. É necessário, portanto, a existência de infraestrutura de estacionamento cicloviário nas imediações das estações de transporte coletivo ou que estes veículos comportem o deslocamento das bicicletas. Ao combinar os pontos fortes de ambos os modos, cria-se um arranjo efi ciente para viagens mais longas, superiores a 10 km. Para uma circulação viária segura aos usuários mais vulneráveis, pedestres e ciclistas, é necessária uma atenção maior ao desenho viário das interseções, uma vez que é nos cruzamentos onde há o maior número de acidentes de trânsito. Dito isso, diminuir a distância a ser percorrida por tais pessoas, via geometria e sinalização adequadas, diminui também a exposi- ção delas a possíveis acidentes. Além disso, é importante também nesses pontos uma boa iluminação e elementos redutores de velocidade para os veículos motorizados. As cai- xas de acumulação dos ciclistas (fi gura 13), “bike box”, são espaços pintados na frente dos cruzamentos que permitem aos usuários de bicicletas esperar o tráfego com maior segurança e que, graças à uma semaforização priori- tária, oferecem a partida inicial para as bicicletas em relação aos demais veículos, aumentando sua visibilidade. Figura 12 Rua de São Bento, São Paulo. Fonte Prefeitura de São Paulo, 2017. Figura 13 Caixa de acu- mulação do ciclista (“bike box”) Fonte Prefeitura de Maceió - Supe- rintendência Municipal de Transporte e Trânsito, 2015.2 2. Disponível em: <https://www.jornal dealagoas.com.br/ geral/1216/2015/05/02/ smtt-explica-como- funcionara-ciclofaixa-na- -rua-deputado-jose-lages>. Acesso em: 19/12/2020. 198 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 199CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO 2.4 Vias e faixas compartilhadas As vias compartilhadas têm a característica de unir todos os modos de transporte a fi m de desconstruir a hierarquia entre eles e reforçar o perfi l da rua como sendo um espaço público de interação entre modos, convívio de pessoas e permanência. Essa estratégia deve ser empregada em zonas com alta demanda de pedestres e baixo ou desestimulado volume de veículos motorizados. Neste contexto, os pedestres possuem direito de passagem e os veículos devem se mover a uma velocidade máxima de 10 km/h. Frequentemente o diálogo entre modos é incentivado através da implantação de um só nível de fachada a fachada, criando uma superfície contínua. Além disso, também é muito comum a presença de elementos que fomentem a apropriação dos cidadãos desse novo espaço público, como iluminação à escala humana, brinquedos para crianças, arte pública, jardins, bancos, entre outros móveis urbanos. Do ponto de vista da segurança dos cidadãos, medidas de moderação de tráfego são cruciais, pois induzem uma postura mais defensiva por parte dos condutores e, por consequência, transmitem conforto aos pedestres e ciclistas. Entre elas temos: identifi cação de portões ou marcos de acesso e saída de uma zona de tráfego moderado; alterações na geometria da via e no pavimento, por meio de faixas mais estreitas, curvas mais acentuadas, e pisos intertravados; além da gestão de velocidade através de sinalizações de segurança e advertências. O Guia de Desenho de Vias, elaborado pela NACTO (2018), categoriza as ruas compartilhadas em: • Comerciais: Contribuem signifi cativamente para a rede de espaços públicos, adicionando vitalidade e gerando atividades por meio de áreas de alimentação ao ar livre, assentos públicos, obras de arte e paisagismo. Há um maior incentivo ao comércio, aumento de pedestres em circulação, e, consequentemente, de consumo e segurança. • Residenciais: Extensões dos quintais, são locais para encontros com vizinhos e o fortalecimento de comunidades. O tratamento compartilhado torna as ruas mais seguras e o desenho conta com sinalização de crianças nas ruas, por exemplo. A fi gura 14 traz uma área residencial e comercial no centro de Amsterdam, onde se pode observar a presença simultânea de 4 modos de transporte (VLT, moto, bicicleta e à pé), todos no mesmo nível, além da pre- sença de vegetação e bancos. Figura 14. Rua comparti- lhada no centro de Amsterdam. FONTE Autores 200 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 201CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO 2.5 Difi culdades de implantação de ruas completas Ilustrando os comentários acima, temos o exemplo de Belo Horizonte (MG), onde feirantes – que alegaram não terem sido consultados sobre a obra – utilizaram o espaço da ciclovia na avenida Carandaí para estocagem de produtos e movimentação nos dias de feira (Carvalho, 2013). Em Porto Alegre (RS), ocorreu um confl ito similar, em que comerciantes se opuseram à implantação da ciclovia na Rua José do Patrocínio (Galeazzi, 2019). Soni et al (2016) diz que essa oposição se dá por uma percepção equivocada dos comerciantes de que a acessibilidade para veículos motorizados aumentam as vendas e que os usuários deste tipo de transporte terão mais dinheiro e poder de compra. Na verdade, o autor conclui que é a acessibilidade de diferentes meios de transporte que atrai mais consumidores. Soni et al (2016) também traz a situação em que vias para pedestres se tornam atrativas para ciclistas por serem uma opção mais segura quando não há uma infraestrutura adequada para bicicletas. Já Fabian (2013) traz o exemplo oposto, no qual ciclovias em regiões com calçadas irregulares e estreitas atraem pedestres. Ambos os casos apresentam riscos e confl itos que devem ser considerados antes e depois da implantação de qualquer tipo de via. Um dos maiores obstáculos na implantação de medidas para a criação de ruas completas é a mudança da cultura do automóvel. Ao priorizar o transporte público e ativo, usuários de veículos privados podem se mostrar contrários por conta da perda da prioridade na via pública. De igual forma, devem ser observadas as demandas referentes ao uso do solo. Questões relacionadas à redução de vagas de estacionamento, restrições ou regula- mentações de conversões, carga e descarga e acesso aos lotes costumam ser recorrentes durante o processo de implantação. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após essa série de recomendações, é muito importante ressaltar diretrizes gerais para o sucessode toda intervenção urbana e para a implementação de ruas completas, consolidando, assim, sugestões transversais para a ges- tão pública. Para que seja bem-sucedido, sugere-se que todo o processo de elabo- ração e implantação de um projeto de ruas completas conte com o traba- lho de uma equipe técnica plural e representativa, e consulte uma parcela igualmente diversifi cada da população, permitindo, dessa forma, diferentes interpretações do objeto de estudo e a defesa dos interesses dos mais diver- sos grupos. Em casos de cidades de pequeno porte e grandes municípios conur- bados, sugere-se a implantação de um projeto intermunicipal. Dessa forma, será possível aumentar a produtividade da equipe, reduzir os custos dos municípios, estreitar laços entre regiões, e sanar eventuais faltas de quadros técnicos. Vale ressaltar também que as cidades são fruto de relações orgânicas entre seus cidadãos e arredores, por isso, cada município tem suas próprias e específi cas forças e fraquezas. Essas particularidades não podem ser igno- radas e muito menos combatidas por conta de modelos pré concebidos de “boas práticas” ou “certo e errado”. Cabe à gestão pública, identifi car as potencialidades de cada município e traduzi-las em intervenções e soluções urbanas específi cas, que melhor respondam às necessidades de determi- nada localidade, respeitando sua individualidade. Outra maneira de tornar a decisão mais assertiva é adotar práticas de urbanismo tático: intervenções temporárias, rápidas e de baixo custo, que visam antecipar mudanças estruturais de longo prazo. Essa técnica consiste em propor ações em menor escala, através de soluções simples, geralmente mobiliário removível ou sinalizações temporárias, com o objetivo de obser- var possíveis impactos de futuras intervenções. 202 | CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO | 203CAPÍTULO 6 - RUAS COMPLETAS E MOBILIDADE URBANA PARA TRANSPORTE PÚBLICO E ATIVO Para assegurar a continuidade das ações voltadas à implantação e ao monitoramento do projeto, assim como gerar um sentimento de perten- cimento, recomenda-se a criação de um grupo independente, composto pelos vários agentes envolvidos, para acompanhar e monitorar as ações dos gestores. Esta supervisão deve ser contínua e ir além da fase de implantação. Considerando que as cidades são dinâmicas e mutáveis, suas necessidades também podem se alterar e devem ser readequadas ao longo do tempo. Por fi m, é indispensável ter em mente que o objetivo das intervenções é promover a inclusão de toda a população, evitando possíveis efeitos cola- terais de elitização dos espaços públicos e gentrifi cação. Dessa forma, é pre- ciso se atentar à proteção dos residentes e usos originais de toda a região antes da mesma ser transformada, a fi m de garantir a perpetuidade dessas pessoas e dos usos no local após qualquer intervenção. Um ambiente urba- no plural, democrático e com participação de todas as classes sociais só é possível através de um olhar mais humano para esses projetos, combaten- do a gentrifi cação das cidades. 4. REFERÊNCIAS AMERICAN SOCIETY OF CIVIL ENGINEERS - ASCE, The Road to the Future of Transportation. Youtube. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ptq7qNLdGk0>, acesso em: dezembro de 2020. Boni, D. e Salcedo, R. (2017). Ruas para Pedestres em Centros Urbanos Consolidados: Análise dialógica. Nacional de Gerenciamento de Cidades. 05. 119-134. Brown, B. 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Além disso, aborda cri- térios para a avaliação da qualidade das calçadas e introduz o conceito da caminhabilidade como fator de promoção da vivacidade urbana. Exemplifi ca, através de experiências em cidades na América do Sul, como a caminhabilidade demanda um pacto social para a sua adequação à realidade local e apresenta os resultados e benefícios da pedestrianização de espaços urbanos. Apresenta, também, o índice de caminhabilidade ICam 2.0 do ITDP com exemplos de aplicação em cidades brasileiras com diferentes portes e características. Assim como ilustra, através do Plano de Caminhabilidade de Fortaleza, como se pode confi gu- rar um processo de implantação e gestão da caminhabilidade no município, defi nindo o papel dos gestores públicos, técnicos e sociedade civil, bem como os balizadores técnicos para avaliação da qualidade das calçadas. E, por fi m, conclui-se com um Guia de Calçadas Acessíveis, cujo objetivo é auxiliar gestores municipais e técnicos na construção de calçadas que garantam o deslocamento de qualquer pessoa com autonomia e segurança. AMANDA FERNANDES FERREIRA National Taiwan University amandafernandes17@yahoo.com.br CAMILA PADOVAN DA SILVA Universidade Federal do Rio de Janeiro camila.padovan@pet.coppe.ufrj.br KERICLES SILVA Universidade Federal do Rio Grande do Norte kriclespinheiro@gmail.com RODRIGO DE CARVALHO Prefeitura Municipal de Vitória – ES arquitetorodrigodecarvalho@gmail.com BRUNA MARTINS DE OLIVEIRA Universidade Federal do Rio de Janeiro brunacap_martins@hotmail.com CAMILA SILVA COELHO Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais coelho.camilas@gmail.com RICARDO MACHADO BECKER Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS ricardobecker.arquiteto@gmail.com | 211CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 1. INTRODUÇÃO Após a Revolução Industrial e o processo de urbanização, as cidades passa- ram a produzir espaços de circulação voltados exclusivamente para o uso do automóvel, o que, aliado à dispersão da ocupação, acabou criando cida- des segregadas e fragmentadas. Emergiram problemas como a crescente curva de engarrafamentos, estresse de condutores e impactos ambientais e sociais, causados, dentre outros motivos, pelo aumento do número de veí- culos nos centros urbanos. Como tentativa de amenizar o problema relacionado ao crescimento do número de viagens realizadas pelo transporte individual motorizado, cidades do mundo inteiro estão mudando a sua forma de ver o espaço urbano e muitas delas estão começando a incentivar uma mobilidade mais sustentável e igualitária. Nesse contexto de produção de cidades mais sustentáveis, foram criadas por vários líderes globais agendas urbanas com intuito de repensar a forma como as cidades são planejadas. Uma delas é a Agenda 2030, que constitui um arranjo de 17 Objetivos globais de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem alcançados até 20301 e que intensifi cam a urgência em encontrar caminhos para a sustentabilidade urbana ambiental. Outra medida foi a Nova Agenda Urbana2, desenvolvida, em 2016, na Conferência das Nações Unidas sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentável (Habitat III) e cujo objetivo é repensar a maneira como as cidades são planejadas, fi nan- ciadas e governadas. Em comum, esses dois instrumentos reforçam a importância da produ- ção de cidades mais compactas, policêntricas e com um uso mais racional do solo. Estas características podem reduzir os problemas ligados à mobi- lidade urbana, uma vez que localidades com alta densidade habitacional, oferta de emprego e lazer, atrelados a um ambiente urbano de qualidade para pedestres e ciclistas, podem reduzir o número de viagens de automó- veis, induzindo a população a se locomover por meios ativos de transporte. Segundo Vargas (2017), as cidades europeias possuem densidade de habitação e empregos, em média, três vezes maior do que as cidades ame- ricanas, logo, o nível de “transporte ativo” diário é maior do que nos Estados Unidos, por exemplo, onde enquanto apenas 9,4% dos americanos fazem suas viagens a pé ou de bicicleta, na Europa este número é de 33%. No Brasil, torna-se cada vez mais evidente a tendência de crescimento do transporte motorizado individual, devido ao alto investimento do setor público em infraestrutura viária para o automóvel e à ausência de investi- mentos em transporte público coletivo e em infraestruturas que condicio- nem qualidade às viagens a pé ou de bicicletas. É importante afi rmar que os veículos motorizados individuais não transportam a maioria das pessoas do território nacional, embora ocupem a maior parte do espaço da cidade. Segundo dados da Associação Nacional de Transporte Público (ANPT), a maioria das viagens de origem/destino rea- lizadas no Brasil são feitas a pé, seguidas do transporte coletivo, e, posterior- mente, do carro (Figura 1). Figura 1. Viagens de origem/destino por modo de transporte. Fonte: Associação Na- cional de Trans- porte Público, 2016. Adaptado pelos autores. 1. Disponível em: http:// www.agenda2030.org.br/ ods/11/. Acesso em 13 de janeiro de 2021. 2. Disponível em: http:// uploads.habitat3.org/hb3/ NUA-Portuguese-Angola. pdf. Acesso em 13 de janei- ro de 2021. 212 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 213CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Para orientar os gestores públicos brasileiros a desenvolverem soluções de mobilidade urbana mais igualitárias e que representem todos os modos de se locomover nas cidades, foi decretada a Lei 12.587/2012, denominada de Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), que tem entre seus obje- tivos promover a acessibilidade universal, segurança, equidade e efi ciência no deslocamento das pessoas nas cidades. Essa Lei estabelece a prioridade dos modos de transportes não motori- zados e dos serviços de transporte públicocoletivo sobre o transporte indi- vidual, determinando, também, a obrigatoriedade de que municípios com mais de 20.000 habitantes elaborem seus planos de mobilidade urbana. Sendo assim, é importante que estes planos priorizem a mobilidade ativa sobre o transporte motorizado individual e é de responsabilidade dos ges- tores públicos a proposição de soluções de mobilidade que se adequem às necessidades locais, de forma ampla e inclusiva. 2. INDICADORES QUE FAVORECEM A CAMINHABILIDADE Esta seção apresenta um conjunto de fatores que infl uenciam a caminha- bilidade e norteiam a atenção dos gestores municipais para a construção de cidades mais caminháveis, proporcionando a todos os usuários do espa- ço urbano um deslocamento não motorizado de forma acessível, segura e atrativa. 2.1 A Calçada como espaço público de qualidade Evidencia-se, neste tópico, a calçada como lugar de circulação do pedes- tre e de uso público e democrático. De acordo com o Código Brasileiro de Trânsito (CBT), a calçada é “parte da via, normalmente segregada e em nível diferente, não destinada à circulação de veículos, reservada ao trânsito de pedestres e, quando possível, à implantação de mobiliário urbano, sinaliza- ção, vegetação e outros fi ns” (BRASIL, 1997, p. 94). Sendo assim, a calçada compõe o sistema viário das cidades e ainda desenvolve propósitos mais complexos. Elas são elementos intrínsecos à rotina de seus usuários, com espaços de “encontros, desencontros, contatos entre pessoas de mundos que se tocam, se veem, se percebem, mas não necessariamente se pertencem” (SUSSAY, J. C. R., 2019). Para tratar do movimento do ‘pedestre-cidadão’ é importante que seja avaliada a qualidade das calçadas nos bairros. É necessária a elaboração de políticas públicas que visem à criação, manutenção e padronização desses espaços e, para isso, há fatores relevantes para torná-las mais adequadas à caminhabilidade, como atratividade, conforto, segurança viária e segurança pública (BARRETTO e GISLON, 2013). Nas calçadas ocorrem os principais movimentos de pedestres nas cida- des. As travessias completam seu espaço de circulação e devem apresentar segurança e opções de ocorrência, em esquinas e em meio de quadras3. Boas calçadas e travessias favorecem a mobilidade ativa. 3. Este capítulo conta com um Guia de Calçadas Acessíveis em anexo, com normas, regulamentações e boas práticas de execução. 214 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 215CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Mas afi nal, o que é Mobilidade Ativa? Mobilidade Ativa é o termo que caracteriza os deslocamentos não moto- rizados, ou seja, que ocorrem com uso da força física do usuário, e que se dividem popularmente entre o uso de bicicletas e o caminhar (Figura 2). Dentro deste conceito surge o termo caminhabilidade, que se popularizou no mundo e se refere às condições do espaço urbano vistas sob a ótica do pedestre, que, de acordo com Park (2008), pode ser defi nido como a qua- lidade de um ambiente de caminhada e se esse caminho é seguro, con- fortável e agradável. Segundo Vargas (2015), a caminhabilidade propõe um modelo de cidade focado nas pessoas e na facilidade para se deslocar no ambiente urbano. Figura 2. Representação de modos ativos de transporte. Fonte: Fórum de Mobilidade Ativa, 2018.4 Ainda dentro desse contexto da mobilidade ativa, a cidade precisa pos- suir infraestrutura cicloviária, composta por ciclovias, ciclofaixas e ciclorro- tas, as quais têm papel fundamental na promoção do uso da bicicleta como alternativa para os deslocamentos curtos na cidade. Destaca-se, também, que em alguns trechos as calçadas podem ter uso compartilhado com as bicicletas e até outros modos de transporte, o que reforça a necessidade de atenção à segurança do pedestre, elemento este de maior vulnerabilidade no contexto do trânsito. 4. Disponível em: https:// mobilidadeativa.org/home/. Acesso em 13 de janeiro de 2021. O desenho urbano voltado para a mobilidade ativa deve considerar, ain- da, fatores como a diversidade de usos, como a presença de atividades no térreo das edifi cações, por exemplo, as chamadas fachadas ativas. Aliás, as fachadas podem contribuir para a sensação de segurança no espaço públi- co se apresentarem permeabilidade – ou transparência – em relação ao que ocorre em seu interior, bem como quando tais usos se integram ao espaço da calçada, utilizando, desde que de maneira adequada, parte da mesma como forma de extensão de sua área privativa, como a disposição de mesas e espaços de espera no exterior dos estabelecimentos, por exemplo. 2.2 Segurança Pública A segurança pública é um atributo importante quando um espaço é avalia- do quanto à sua caminhabilidade. Para este indicador devem ser considera- dos a iluminação e o fl uxo de pedestres, pois com a apropriação do espaço urbano, ocorre, consequentemente, o aumento da segurança por meio da vigilância natural, benefi ciando tanto os moradores quanto os pedestres do lugar. Segundo a Teoria das Janelas Quebradas, de Wilson e Kelling, o crime é maior em áreas onde há negligência, sujeira, desordem e abuso. Ou seja, para que os lugares sejam mais seguros é preciso fomentar políticas que os tornem mais atrativos para que as pessoas se sintam confortáveis em ocupar tais espaços. 216 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 217CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 2.3 Segurança Viária A ONU (Organização das Nações Unidas) propôs aos países membros a Década de Ação para Segurança Viária 2011-2020 que visava reduzir em 50% o número de mortos e feridos graves no trânsito. Em 2013, a Organização Mundial da Saúde (OMS), produziu um manual denominado Segurança de pedestres: manual de segurança viária para gestores e profi ssionais da área5 , endere- çado aos gestores e profi ssionais e com objetivo de contribuir na implantação de medidas para a segurança de pedestres. Países do mundo todo passaram a desenvolver medidas e intervenções para melhorar a segurança do pedestre: alargamento de calçadas, implanta- ção de faixas de pedestres, passarelas, passagens subterrâneas, e redução da velocidade dos veículos são algumas formas de reduzir a exposição do pedes- tre ao tráfego. Em seguida, são mencionados exemplos de medidas moderadoras de tráfego que propiciam mais segurança ao pedestre nas cidades. 2.3.1 Zona 30 A proposta dessa política é de viabilizar a cidade para todos através da regu- lamentação de vias locais com velocidade máxima de 30km/h para veículos, priorizando quem anda a pé, de bicicleta ou àqueles com mobilidade reduzi- da. Recomendável para núcleos de bairros. Em 2014 foi ofi cializada a primeira Via Calma de Curitiba, promovendo um convívio harmônico entre motoristas, ciclistas e pedestres (Figura 3). Em Vitória, a implantação de zonas 30 favorece a criação de ciclorrotas nos bairros. Interligadas às ciclovias existentes, elas contribuem para comple- tar a rede cicloviária urbana. 5. Disponível em: https://apps.who.int/iris/ bitstream/handle/10665/ 79753/9789275718117_ por.pdf;jsessionid= B670D7C204BF83123AD 832EBC607CB2A? sequence=7. Acesso em 13 de janeiro de 2021. 6. Disponível em: https:// www.curitiba.pr.gov.br/ noticias/implantacao-da- -via-calma-e-ofi cializada- -com-portaria-que-estabe- lece-normas/33592. Acesso em 13 de janeiro de 2021. 7. Disponível em: https:// www.agazeta.com.br/es/ cotidiano/ciclorrotas-ruas- -de-bento-ferreira-em-vito- ria-ganham-nova-sinaliza- cao-0820. Acesso em 13 de janeiro de 2021. Figura 3. Via Calma na Avenida Sete de Setembro, Curitiba. Fonte Luiz Costa/SMCS.6 Figura 4. Ciclorrota no bairro Bento Ferreira, em Vitória: a via como espaço preferencial para a mobilidade ativa. Fonte Fernando Madeira/A Gazeta, 2020.7218 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 219CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 2.3.3 Urbanismo Tático O urbanismo tático propõe intervenções temporárias que visam espaços públicos mais humanos e estimulam a realização de projetos de longo pra- zo (WRI, 2018). Tais propostas buscam readequar o espaço viário e valorizar o espaço urbano de forma a benefi ciar as pessoas com medidas rápidas, reversíveis e com baixo custo (ITDP, 2020). Esse modelo de criação é impor- tante para testar elementos que atendam às necessidades locais mediante a vivência de seus usuários, antes de serem feitos investimentos e modi- fi cações defi nitivas. A intervenção apresentada no subtópico anterior, no bairro Cachoeirinha em Belo Horizonte (Figura 5), é um exemplo de urba- nismo tático, onde foram utilizados, inicialmente, recursos temporários para demonstrar e testar como fi caria a confi guração viária com o aumento das calçadas em ambos os lados e a retirada de uma faixa extensa de estaciona- mento de automóveis. 2.3.2 Traffi c calming Traffi c calming é uma técnica de acomodação do tráfego de forma a adequar o espaço de cada modo de circulação, com atenção à escala humana e ao meio ambiente. Zonas de traffi c calming possibilitam um trânsito mais seguro ao reduzir as velocidades de circulação em áreas comerciais e residenciais. Em Belo Horizonte, a prefeitura produziu o Manual de Medidas Moderadoras de Tráfego8 como referência para o desenvolvi- mento e a implantação de projetos de Traffi c Calming no município. É possível garantir os benefícios de uma via segura para a mobilidade ativa através da implementação de intervenções físicas, como a mudança da geometria viária e travessias elevadas para pedestres; ou de forma mais simples, como a ocupação do espaço com mobiliário urbano, plantas e locais de permanência delimitados somente com pintura. Na Figura 5, pode ser visto o antes e depois da intervenção no bairro Cachoeirinha, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Figura 5b. Rua Simão Tamm, Belo Horizonte (MG), durante a intervenção. Fonte Site ITDP Brasil.9 Figura 5a. Rua Simão Tamm, Belo Horizonte (MG), antes da intervenção. Fonte Site ITDP Brasil.9 8. Disponível em: https://prefeitura.pbh. gov.br/sites/default/fi les/ imagens/authenticated %2C%20editor_a_bhtrans/ manual_traffi c_calming. pdf. Acesso em 14 de janeiro de 2021. 9. Disponível em: https://itdpbrasil.org/itdp- e-bhtrans-promovem- intervencao-urbana- temporaria-no-bairro-do- -cachoeirinha-em-belo- horizonte/. Acesso em 14 de janeiro de 2021. 220 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 221CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 3. CASOS DE SUCESSO DA EXPERIÊNCIA DE CAMINHABILIDADE - EXEMPLOS DE APLICAÇÃO EM CIDADES DA AMÉRICA DO SUL 3.1 Quem já fez? Para ilustrar experiências bem sucedidas na América do Sul, serão utiliza- dos exemplos de três cidades brasileiras – Afuá (no Pará), São Paulo e Rio de Janeiro (ambas capitais de seus respectivos estados) – além de Bogotá, capital da Colômbia. Todos os exemplos fazem parte da dissertação do autor Lincoln Paiva, intitulada “Urbanismo Caminhável: a caminhabilidade como prática na construção de lugares” (PAIVA, 2017). No capítulo 01 de seu trabalho, Paiva (2017) refere-se à caminhada como processo experimental de reconhecimento do lugar, citando experiências, denominadas de caminhadas, que ajudam a compreender o estudo da caminhabilidade. Estes exemplos demonstram que pequenas intervenções urbanísticas são capazes de melhorar a experiência do caminhar das pesso- as, criando um senso de pertencimento à cidade, tornando-a mais humana, acessível, confi ável e pacífi ca. A primeira experiência de caminhada que Paiva (2017) descreve, em Afuá (PA), constituiu-se em uma oportunidade única, pois nessa peque- na cidade ribeirinha paraense, com suas palafi tas e passarelas em madei- ra, só é permitido o deslocamento de sua população a pé ou de bicicleta. Essa obrigatoriedade favorece a convivência entre vizinhos de bairro que frequentam juntos os espaços públicos, gerando sua apropriação, apesar de estarem geografi camente isolados. Essa conexão faz com que as pes- soas do lugar reconheçam que todos os equipamentos públicos culturais, de saúde, lazer e educação são parte de seu território, ao contrário do que ocorre nas cidades grandes, conferindo-lhes noções básicas de cidadania e de percepção sobre o direito à cidade. E, apesar do IDH de Afuá ser um dos piores do Brasil, a grande maioria de seus moradores declarou serem felizes vivendo nesta cidade (PAIVA, 2017). Por outro lado, o segundo exemplo de experiência de caminhada, em Bogotá (CO), foi realizado em duas épocas distintas (2012 e 2015), antes e depois de intervenção no espaço público feito pela municipalidade local. O trecho percorrido em 40 minutos nas duas ocasiões, situado na área cen- tral da capital colombiana, foi a Carrera 7ª, a qual neste intervalo de tempo passou por processo de pedestrianização (foi a primeira na América Latina a passar por essa transformação urbanística). As ruas estavam agora no mes- mo nível das calçadas, as fachadas das edifi cações foram renovadas, o ruído era bem menor (mesmo com mais pedestres por conta da diminuição do tráfego de carros), usos e funções diversifi cadas (misturando-se residências e comércios) e criaram-se áreas públicas de convivência, com áreas verdes e mobiliário urbano padronizado. A paisagem passou a ser mais harmoniosa e a experiência do caminhar mais agradável – parecia ter sido criada uma lógica de caminhada através da interconexão entre as zonas pedestrianiza- das e os espaços públicos de convivência. A terceira experiência de Paiva (2017), a da caminhada realizada no bair- ro do Botafogo no Rio de Janeiro versa sobre a importância da criação de novos mapas mentais, sem a preocupação de mapas puramente geográ- fi cos, possibilitando um exercício da busca dos vazios urbanos da cidade, com novos signifi cados subjetivos, mais afetivos e menos consumistas. Já na quarta experiência, no percurso que liga 18 edifícios do período Modernista de São Paulo (1930 a 1968), tombados pelo Departamento de Patrimônio Histórico da cidade, foi abordada a relevância da caminhada e a possibilidade do aprendizado sobre a cidade. Foram avaliados requisi- tos que a Caminhabilidade demanda: condições de fachadas e calçadas, mobiliário urbano, cruzamentos, entre outros. Ressaltou-se, também, neste experimento de campo que o estudo da Caminhabilidade pode ser adotado tanto para percursos específi cos, quanto para os temáticos. 222 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 223CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Através das quatro experiências mencionadas, fi ca claro que são mui- tas as maneiras de se incentivar o pedestrianismo através de vários instru- mentos urbanos, desde que se respeitem as especifi cidades locais. Foi a partir do 1º Fórum de Micro-intervenções Urbanas na cidade de Lima, capital do Peru, em agosto de 2016, apoiado pela ONU-Habitação (UN- Habitat) e organizado por entidades que atuam no desenvolvimento de cidades, que a noção de espaço do pedestre começou a ser amplamente discutida. Na época, a organização do encontro conduziu seus participantes a conhecerem alguns dos projetos locais de micro intervenções realizados em parceria com a gestão pública municipal, escolas e fi nanciados pela ini- ciativa privada, que tem potencial de serem replicados em outras cidades. 3.2 Como fez? 3.2.1 Método do Índice de Caminhabilidade (iCam) Diversos municípios brasileiros têm adotado metodologias para o diagnós- tico da caminhabilidade urbana. Uma forma de análise bastante difundida e aceita é o Índicede Caminhabilidade (iCam), instituído pelo Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento - ITDP. O iCam é uma ferramenta para a avaliação dos espaços públicos a partir de 15 indicadores de qualidade, notadamente focados nas calçadas e travessias de pedestres. Agrupados em 6 categorias, tais indicadores são aplicados a cada segmento de quadra de cada trajeto de circulação, com atribuição de nota, resultando no iCam 2.0 (ITDP, 2018). Conforme indica o Quadro 1, as categorias Calçadas, Mobilidade e Segurança Viária apresentam dois indicadores cada. Segurança Pública e Ambiente, contam com três indicadores cada. E a categoria Atração é com- posta por quatro indicadores. O conjunto envolve aspectos físicos e senso- riais do ambiente. CATEGORIAS INDICADORES CALÇADA • Largura • Pavimentação. MOBILIDADE • Dimensão das Quadras; • Distância a Pé ao Transporte. ATRAÇÃO • Fachadas Fisicamente Permeáveis; • Fachadas Visualmente Ativas; • Uso Público Diurno e Noturno; • Usos Mistos. SEGURANÇA VIÁRIA • Tipologia da Rua; • Travessias. SEGURANÇA PÚBLICA • Iluminação; • Fluxo de Pedestres Diurno e Noturno AMBIENTE • Sombra e Abrigo; • Poluição Sonora; • Coleta de Lixo e Limpeza. Quadro 1. Categorias e Indicadores da Calçada Fonte ITDP, 2016. Editada pelos autores. Já o Quadro 2 apresenta 19 estudos de diferentes autores brasileiros com a aplicação do método iCam do ITDP, visando a análise qualiquanti- tativa e o diagnóstico da caminhabilidade em diversas cidades nacionais e dos mais variados tamanhos. Em sua maioria, aplicam-se os requisitos das 6 categorias e 15 indicadores da versão atual 2.0 (2018), no entanto, alguns autores não abordam todas essas categorias e outros utilizaram a versão 1.0 de 2016, conforme indicado. Além dos autores e datas de publicação dos estudos, estão relacionados sua localização (cidade / estado), sua área urba- na de recorte, a quantidade de segmentos analisados (a unidade básica de estudo é a calçada) e o índice fi nal de caminhabilidade iCam. 224 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 225CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Autor / Ano Localização Área de estudo Número de segmentos iCam Becker et al. (2020) Ilhéus / BA (XVI Fórum) Praia 17 (5 quadras) 0,50 (1) Becker et al. (2020) Ilhéus / BA (IV SIBOGU) Praia 17 (5 quadras) 0,50 (2) Brandão et al. (2018) Ouro Preto / MG Centro Histórico 8 0,99 Carvalho (2019) Vitória / ES Portuária 5 (trechos) 1,69 (*) FEPESE (2018) Videira / SC Região central 22 1,02 ITDP (2017) Santo Cristo, Rio / RJ Portuária 64 (14 ruas) 0,9 ITDP (2016) Praça Tiraden- tes, Rio / RJ Central 153 (28 ruas) 1,4 Lazarin (2018) Cascavel / PR Central 16 1,7 Oliveira et al. (2019) Mossoró / RN Central 11 0,92 Pereira (2019) Goiânia / GO Setor central 19 1,67 (*) Pfützenreuter et al. (2018) Balneário Barra do Sul / SC Central + praia 8 (4 trechos) 1,13 (*) Ramos (2019) Vila Velha / ES Central + praia 23 1,47 (*) Roxo (2019) São Paulo / SP Vila Olímpia 4 1,67 Rufi no et al. (2019) Monte Carmelo / MG Central 4 (avenidas) 1,35 (*) Serpa et al. (2019) Petrópolis / RJ Central 19 (3 praças) 1,70 (**) Tonon et al. (2018) Marília / SP Central 54 (14 quadras) 1,50 (**) Wolkart (2019) Vitória e Vila Velha / ES Áreas verdes 13 praças 1,28 (*) Zorek e Pisani (2018) Av. Paulista, São Paulo / SP Não central 9 2,28 Praia Grande / SP X 6 2,27 (1) Segurança Viária / (2) Atração / (X) não especifi cada no estudo / (*) média aritmética / (**) iCam 1.0 (2016) Quadro 2. Estudos com o método de aplicação do iCam 2.0 (2018) do ITDP. Fonte: Autores Vale ressaltar, que ambos os estudos do autor Becker (2020) abordaram apenas uma categoria cada (respectivamente Segurança Viária e Atração) do iCam 2.0 (ITDP, 2018), porém a pesquisa total envolveu a metodologia completa, tendo o índice de caminhabilidade fi nal atingido a pontuação 1,10. A metodologia do ITDP é na atualidade a mais utilizada em estudos nacionais pela maioria dos pesquisadores brasileiros, portanto, foi com base na sua relevância que se selecionaram os 19 estudos apresentados no Quadro 2. Dentre eles, os valores do iCam variaram entre 0,90 e 2,28, sendo a média aritmética deles igual a 1,43. Como as notas na metodologia iCam variam de 0,00 a 3,00 e são qualifi cadas como insufi ciente (0,00 a 0,99), sufi - ciente (1,00 a 1,99), bom (2,00 a 2,99) e ótimo (3,00), o resultado fi nal geral de 1,43 é considerado como aceitável ou sufi ciente. Dos 19 locais, 3 são considerados insufi cientes, apenas 2 são bons, e os demais 14 são aceitáveis10. Há muito a melhorar na grande maioria das cida- des brasileiras, tanto de pequeno, quanto de médio e grande porte. A ferra- menta aponta os aspectos que podem trazer resultados mais impactantes. O ICam 2.0 tem correspondência com diversas outras metodologias de análise do espaço urbano e uniformiza o modo de diagnosticar o território. Sua divisão em eixos temáticos possibilita identifi car aspectos de qualida- de do espaço, permitindo ao gestor maior clareza quanto às intervenções necessárias em cada trecho investigado. Com isso, podem-se orientar recur- sos humanos, materiais e fi nanceiros de forma mais específi ca, ampliando o potencial de efetividade dos investimentos em acessibilidade. 10. Maiores detalhes sobre os estudos citados podem ser obtidos de acordo com as referências bibliográ- fi cas ao fi nal do Capítulo, acessando-se os links dire- tamente na internet. 226 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 227CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 3.2.2 Plano Municipal de Caminhabilidade de Fortaleza - PMCFor Com o objetivo de incentivar os deslocamentos de pedestres e pessoas com mobilidade reduzida, a cidade de Fortaleza (CE) investiu em seu Plano Municipal de Caminhabilidade. Para alcançar a qualifi cação de passeios com continuidade de trajetos, o Plano lança a missão de diagnosticar a situ- ação das calçadas na cidade, estabelecendo subsídios para que a gestão municipal possa adotar as melhores estratégias e diretrizes de ações para ampliar os níveis de mobilidade humana nos espaços da cidade. O sítio eletrônico do PMCFor apresenta o Plano com sua linha do tempo de implantação, conforme demonstra a Figura 6. Figura 6. Linha do Tempo: implantação do PMCFor. FONTE Prefeitura Municipal De Fortaleza, Plano Municipal de Caminhabilidade – PMCFor. Em aproximadamente 18 meses foram realizadas reuniões internas na prefeitura, ofi cinas para elaboração da base conceitual, consultas públicas, ofi cinas e reuniões que concluíram na elaboração do Manual Técnico para Calçadas, Cartilhas e Cadernos temáticos (Estratégias; Participação Social; Diagnóstico; etc.). Além disso, foi estabelecida uma Rede Interdisciplinar e Intersetorial para a elaboração e acompanhamento do Plano Municipal de Caminhabilidade (Figura 7). Figura 7. Composição da Rede Interdisciplinar e Intersetorial. FONTE Prefeitura Municipal De Fortaleza, Plano Municipal de Caminhabilida- de – PMCFor. Instituída a partir da Portaria SEUMA Nº 10/2020, a Rede Interdisciplinar e Intersetorial conta com a participação de 61 integrantes e 21 instituições, caracterizando uma sistemática de participação da sociedade civil através de seus representantes. A construção e o acompanhamento do Plano em cada eixo temático ocorre através da formação de Grupos de Trabalho (GT’s). As discussões temáticas, descritas na Figura 8, distribuem-se de acordo com o perfi l de cada grupo, sendo estimuladas as interações entre os grupos e destes com a sociedade. Figura 8. Grupos de trabalho. FONTE Prefeitura Municipal De Fortaleza, Plano Municipal de Caminhabilida- de – PMCFor. 228 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE |229CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Além da qualifi cação das calçadas para a acessibilidade, o PMCFor tem por princípio garantir a acessibilidade a praças e parques, priorizando o pedestre e garantindo sua segurança. O documento estabelece metas ambiciosas com relação aos espaços públicos, claramente ao propor a pro- moção de locais atrativos e acessíveis para pessoas que transitam nestes ambientes, na expectativa de tornar Fortaleza uma referência no tema, que acolhe a acessibilidade universal, atratividade, humanização do espa- ço, segurança, sustentabilidade e a priorização do pedestre e pessoas com mobilidade reduzida. O Plano estabelece critérios para a caminhabilidade, servindo de parâme- tro para que quaisquer intervenções futuras no espaço público sejam aces- síveis a seus usuários. São diretrizes de aplicação dessa política: • Aumentar a atratividade pelo deslocamento a pé, através da qualifi cação das calçadas e incentivo ao caminhar; • Garantir a continuidade nos bairros, considerando moradia e trabalho; • Garantir acesso por deslocamento de pedestre aos parques e praças; • Priorizar os deslocamentos de pedestre nas centralidades; e • Elevar a segurança do pedestre. A partir dessas diretrizes foram propostas metodologias com os ele- mentos norteadores para os projetos da Prefeitura de Fortaleza, que podem ser empregadas de acordo com os objetivos do município: • Elementos de composição de calçadas; • Acessibilidade Universal; e • Espaços Atrativos: Arborização; Mobiliário Urbano; Resíduos Sólidos; Efl uentes e águas pluviais; e Fachada ativa. Todo este material está disponível de forma aberta no Canal Urbanismo e Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Fortaleza e compõe uma evi- dente referência para o estabelecimento de planos de caminhabilidade por outros municípios brasileiros, estando eles obrigados ou não ao esta- belecimento de rotas acessíveis nos moldes do Estatuto da Pessoa com Defi ciência. O PMCFor constitui um marco recente na implantação de polí- ticas municipais de caminhabilidade em cidades brasileiras. 3.3 O que aprendemos com essas experiências? Transformar as cidades e torná-las caminháveis é uma tarefa difícil para a gestão municipal, porém não impossível. Como descrito nessa seção, exis- tem diversas formas de intervir no espaço construído para melhorar a vida dos pedestres na cidade. Além disso, podemos contar com diversas técni- cas e estudos que contribuem para o entendimento de quais mudanças devem ser feitas com mais urgência no ambiente urbano dos pedestres. Figura 9. Arborização em calçadas. FONTE Prefeitura Municipal De Fortaleza, Plano Municipal de Caminhabilida- de – PMCFor. 230 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 231CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O desafi o para o desenho e planejamento urbano pode residir em propor- cionar espaços fl uidos e receptivos ao pedestre. A presença de pessoas cir- culando pelos locais públicos em diferentes horas do dia, em comparação a quando estes se encontram vazios, notadamente alteram a sensação de segurança, coletividade e acolhimento, quesitos indispensáveis a uma boa caminhabilidade. E experimentar a cidade pode conduzir a possibilidades diversas para o uso efetivo dos espaços públicos como promotores do desenvolvimento local, através dessa ferramenta rica que é a caminhabilidade. O índice de caminhabilidade é um exemplo de mecanismo de suporte ao diagnóstico da qualidade das calçadas em cidades brasileiras com diferentes portes e conformações, e com potenciais resultados. Por fi m, resta reafi rmar que o papel dos gestores públicos é de grande importância para que a cidade possa contar com uma infraestrutura urba- na adequada para a maior segurança e conforto dos pedestres. Reconhecer a importância da caminhabilidade constitui, assim, um passo fundamental para a promoção de cidades mais acessíveis, sustentáveis e agradáveis. REFERÊNCIAS Associação Nacional de Transportes Públicos- ANTP (2016). Sistema de Informação da Mobilidade Urbana. São Paulo. Relatório Geral da Mobilidade Urbana. BARRETTO, M.; GISLON, M. (2013). O fl âneur revisitado: processos de revitalização urbana e caminhabilidade. Revista Hospitalidade. São Paulo, v. X, n. 1, p. 54 - 77. BECKER, R. M.; STEIN, P. P. (2020). 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Índice de Caminhabilidade – Aplicação em Santo Cristo, Rio de Janeiro. Aplicação versão 2.0 dez. 2017. Disponível em: <http:// itdpbrasil.org.br/wp-content/uploads/2018/02/ITDP-Brasil-TA-iCam-Aplicacao2.02018-02-20. pdf>. Acesso em: 13/01/2021. ITDP – Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento. 2017. Índice de Caminhabilidade – Aplicação Piloto na área da Praça Tiradentes, Rio de Janeiro. Aplicação versão 2.0 set. 2016. Disponível em: <http://itdpbrasil.org.br/wp-content/uploads/2016/09/2016-09-ITDP- caminhabilidadeaplicacao.pdf>. Acesso em: 13/01/2021. ITDP – Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento. (2020). Como as experiências de urbanismo tático podem ajudar na retomada pós Covid-19. Disponivel em: <https://itdpbrasil. org/como-as-experiencias-de-urbanismo-tatico-podem-ajudar-na-retomada-pos-covid-19/>. Acesso em: 13/01/2021. LAZARIN, A. R. (2018). Qualidade do Espaço Público para Pedestres – Estudo de Caso: Trecho central da Av. Brasil em Cascavel / PR. 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Isso signifi ca que 6,7% da população brasileira apresenta incapacidade ou grande difi culdade para enxergar, ouvir, cami- nhar ou subir degraus (IBGE, 2010). Além disso, estudos mostram que o envelhecimento da população, que é uma tendência global, está diretamente relacionado ao aumento de pes- soas com defi ciência. A elevação da expectativa de vida traz diversas opor- tunidades para os indivíduos, suas famílias e para a sociedade. No entan- to, não há evidências sufi cientes de que este ganho em longevidade seja acompanhado por uma melhora da saúde deste grupo quando comparado com a geração anterior (OMS, 2020). No Brasil, 13% da população tem 60 anos ou mais, isso representa 28 milhões de brasileiros, número este que deve dobrar até 2031 (IBGE, 2018). Essa mudança na composição da popu- lação fará com que as cidades precisem se adaptar de forma a garantir que todas as pessoas tenham acesso a direitos e serviços básicos, tais como saú- de, educação, lazer e emprego. É neste contexto que a acessibilidade e padronização das calçadas se destacam, afetando diretamente as atividades diárias da população e, ainda, o lazer e turismo. A falta de acessibilidade nas calçadas inibe de forma considerável a iniciativa de pessoas com defi ciência ou mobilidade reduzida a saírem de casa para realizar suas atividades. Logo, uma cidade que se proponha acessível, deve assegurar o acesso irrestrito e universal aos espaços públicos, ao transporte e às edifi cações. Dessa forma, é fun- damental a implementação de uma calçada “adequada”, que garanta o caminhar livre, seguro e confortável para todos os indivíduos de maneira igualitária. Além disso, a provisão de calçadas adequadas faz com que os pedestres as utilizem de forma mais frequente. Por sua vez, o aumento dos desloca- mentos a pé poderia contribuir, também, para a redução do uso de veículos particulares. Uma cidade com menos automóveis e mais pedestres circu- lando possui menos poluição, um comércio local mais vivo, uma população menos sedentária e, logo, mais saudável e menores índices de acidentes viários. Em outras palavras, cidades que incentivam e possibilitam os deslo- camentos a pé se tornam mais atraentes para os moradores e visitantes e, por fi m, proporcionam uma qualidade de vida melhor para seus cidadãos. 2. A CALÇADA IDEAL A calçada é o elemento urbano que garante o deslocamento de qualquer pessoa com autonomia e segurança. Calçadas seguras e acessíveis, aliadas à boa conservação, são um investimento fundamental e necessário para as cidades,devendo sempre estar acima do nível da faixa de tráfego de veícu- los, criando uma separação clara entre os dois espaços e usos, e, em espe- cial, garantindo a livre circulação das pessoas com defi ciência ou mobilida- de reduzida, igualitariamente. Todos os procedimentos adotados na construção de calçadas devem obedecer às determinações da NBR 9050/2015, que trata da “Acessibilidade a edifi cações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos”. 238 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 239CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 3. COMPONENTES DA CALÇADA Para garantir que haja autonomia, conforto e segurança no caminhar, a ABNT NBR 9050/2015 divide a calçada em três faixas de utilização (Figura 1) A calçada deve ser composta por uma faixa livre de qualquer interferên- cia, que permita os pedestres transitarem. Uma faixa de serviço, que deve conter o mobiliário urbano, tal como canteiros, árvores e postes de ilumina- ção ou sinalização. E, por fi m, uma faixa de acesso/transição, que permita o acesso às edifi cações e que pode acomodar também o mobiliário dos esta- belecimentos comerciais. As defi nições e especifi cações de cada uma das faixas serão detalhadas a seguir. 3.1 Faixa livre Área do passeio destinada exclusivamente à circulação de pedestres, deso- bstruída de mobiliário urbano ou de outras interferências. Essa faixa deve ter superfície regular, fi rme, contínua e antiderrapante, ou seja, não deve ter qualquer emenda ou rachadura, deverá também se diferenciar visualmen- te em relação às outras faixas do passeio. A largura da faixa livre deve per- mitir que um cadeirante faça manobras para retornar ou ultrapassar outro cadeirante, com uma largura mínima recomendada de 1,20m. Vale ressaltar que para a implementação da sinalização tátil nessa faixa, ela deverá ter, no mínimo, 1,50m. Pontos de parada do transporte coletivo não devem ser alocados sobre a faixa livre da calçada. Em locais como centros históricos e áreas tombadas, ou onde o dimensionamento da calçada ideal não é possí- vel, podem ser analisadas a implantação de outros meios, como ruas com- partilhadas ou pedestrianizadas. 3.2 Faixa de serviço Faixa localizada entre o meio-fi o e a faixa livre, destinada à instalação de elementos urbanos úteis para a qualidade e o funcionamento do espaço público, tais como árvores, rebaixamento para acesso de veículos ou rampas de acesso para pessoas com defi ciências, entre outros. A largura dessa faixa deve ser de no mínimo 0,80m e pode ser pavimentada, mas recomenda-se ser coberta de vegetação para garantir maior permeabilidade. A arborização dessa faixa deve ser feita sempre que possível, pois traz benefícios ambien- tais, além de segurança e conforto para os pedestres e beleza para a cidade. Os rebaixamentos para acesso de veículos devem ser executados somen- te dentro da faixa de serviço, não interferindo na faixa livre, bem como as caixas de inspeção devem estar localizadas nesse trecho e sua tampa deve estar nivelada com o piso. Figura 1. Componentes da calçada FONTE Manual de Cal- çada Acessível de Cabo Frio (2020). 240 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 241CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 3.3 Faixa de transição ou acesso A faixa de transição, também chamada de acesso, é destinada à passagem da área pública para a área privada. Serve para acomodar a rampa de acesso aos lotes lindeiros, sob autorização do município, para edifi cações já cons- truídas. Esta faixa é aplicável apenas em calçadas com largura superior a 2,00m. Recomenda-se a limitação clara das faixas, diferenciando o piso das faixas livres e de acesso, a fi m de extinguir a interferência de mobiliários privados na faixa livre. Áreas de permeabilidade e vegetação podem ser ins- taladas nessa faixa, bem como mobiliários temporários do comércio local, como mesas e cadeiras, desde que não atrapalhem ou invadam a faixa livre, mediante enquadramento na legislação municipal. 4. ACESSIBILIDADE UNIVERSAL O conceito de “Acessibilidade Universal” ou “Desenho Universal” foi criado nos Estados Unidos em 1963 e inicialmente chamado de “Desenho Livre de Barreiras”, por ser voltado à eliminação de barreiras em projetos arquitetô- nicos. Posteriormente, este conceito evoluiu para a concepção de universal, pois passou a considerar não somente o projeto, mas a englobar a diversi- dade humana, de forma a garantir acessibilidade a todos os componentes do ambiente. Com o tempo, o conceito ganhou amplitude e hoje é adota- do em todo o mundo para garantir a acessibilidade plena. Um exemplo de ambiente urbano acessível pode ser visto na Figura 2. Figura 2. Exemplo de interseção e travessias acessíveis FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). 242 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 243CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Os elementos que garantem a acessibilidade universal das calçadas são apresentados a seguir: 4.1 Piso Tátil Piso caracterizado por textura e cores contrastantes em relação ao piso adjacente, com textura e cor diferentes das calçadas convencionais, des- tinado a constituir alerta ou linha-guia, servindo de orientação às pessoas com defi ciência visual ou baixa visão, de forma a ajudar na locomoção. Este piso permite a percepção de rotas e obstáculos com os pés ou bengalas e, além de orientar, tem como função dar autonomia e segurança no trajeto. São de dois tipos: piso tátil de alerta e piso tátil direcional (Figura 3). O piso tátil direcional (Figura 4): É o piso que direciona as pessoas com defi ciência visual. Ele é instalado formando uma faixa que acompanha o sentido do deslocamento. O piso direcional deve ser usado para indicar o caminho a ser percorrido, servindo também para informar as mudanças de direção e opções de percursos. Ele deve ser implantado no eixo da faixa livre da calçada e, no caso de calçadões, deve ser posicionado de acordo com o fl uxo dos pedestres. O acesso a áreas de travessia, como passarelas elevadas e passagens subterrâneas, deve ser sinalizado com a sua colocação trans- versal à calçada. Além disso, deve contornar o limite de lotes não edifi cados, como postos de gasolina e estacionamentos, ou quando a edifi cação estiver recuada. Figura 3. Posicionamento de pisos táteis FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). Figura 4. Piso tátil direcional FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). 244 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 245CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE O piso tátil de alerta (Figura 5): É usado para sinalizar locais que envol- vem risco à segurança. Esse tipo de piso é usado para alertaras pessoas com defi ciência visual sobre a existência de faixas de pedestres, desníveis ou locais com risco permanente, como, por exemplo, a presença de objetos suspensos não detectáveis pela bengala longa. Ele deve ser implantado em locais onde o piso tátil direcional muda de direção, indicando a existência de outros trajetos, e no início e fi m de rampas e escadarias. No caso de rebai- xamentos de calçadas e travessias elevadas, deve ser posicionado paralela- mente à faixa de travessia ou perpendicularmente à linha de caminhada. Em quaisquer obstáculos fi xos alocados na calçada, como telefones públi- cos, placas, árvores, etc., a sinalização tátil deve vir ao seu redor conforme defi nido por norma. Figura 5. Piso tátil de alerta FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). 4.2 Rebaixamento de Calçadas É compreendido como rebaixamento de calçada toda rampa construída ou instalada no passeio, destinada a promover a concordância de nível entre o passeioe o leito carroçável, garantindo a melhoria das condições de mobi- lidade e acessibilidade a todos. Os rebaixamentos de calçada devem ser construídos na direção do fl uxo da travessia de pedestres. Calçadas altas e desniveladas tornam a travessia um desafi o diário. Dessa forma, o rebaixamento das calçadas tem o intuito de nivelá-las com o leito carroçável, possibilitando uma travessia sem obstáculos e de maneira contínua. As rampas podem ser executadas com diferentes comprimentos, dependendo da altura da calçada existente, como ilustra a Figura 6: O comprimento variável das rampas, apresentado na Figura 2, é calcu- lado através da seguinte equação: C= h x 100 / i Onde, i é a inclinação da rampa, em porcentagem (i ≤ 8,33%); h é a altu- ra do desnível e C é o comprimento da projeção horizontal. Além disso, a inclinação dos rebaixamentos na rampa central e nas rampas das abas laterais não deve ser superior à 8,33% (1:12) e a largura míni- ma do rebaixamento deve ser de 1,50m. O rebaixamento não pode diminuir a faixa livre de circulação de, no mínimo, 1,20m da calçada e, para implanta- ção do piso tátil direcional na faixa livre, ela deverá ter, no mínimo, 1,50m de largura. Figura 6. Dimensionamento de rampas FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). 246 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 247CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 4.3 Rebaixamento em esquinas As esquinas são locais de interseção das vias, onde, geralmente, ocorrem aci- dentes de trânsito envolvendo pedestres. As normas existentes no Código de Trânsito Brasileiro e na NBR 9050/2015 da ABNT defi nem como devem ser executados os rebaixamentos das calçadas nestes casos. Adicionalmente, a área das esquinas deve ser livre de obstáculos, como árvores, postes de ilu- minação, hidrantes, entre outros elementos, e deve comportar os pedestres antes da travessia. É importante, também, que o raio de curvatura da esquina seja mini- mizado, não excedendo 4,50m, a fi m de incentivar a redução da velocida- de dos veículos no momento da conversão. Vale ressaltar que em esquinas onde há pouca visibilidade entre pedestres e motoristas é recomendada a extensão do meio-fi o. Por fi m, um projeto de esquina deve assegurar cone- xões adequadas, acessíveis e seguras entre calçadas adjacentes, conforme ilustrado na Figura 7. Quando o melhor posicionamento para a faixa de pedestres for no ali- nhamento com a calçada da via transversal, admite-se o rebaixamento total da calçada na esquina, que deve ser projetado considerando a segurança do pedestre através da instalação de balizadores, distantes de 1,20m a 1,50m um do outro. 5. OUTROS ELEMENTOS Outros componentes indispensáveis nas calçadas e também relacionados à acessibilidade, como semáforos para pedestres, sistemas de informação, pavimentação e arborização, são abordados a seguir. 5.1 Mobiliários urbanos Os Equipamentos Urbanos são todos os bens públicos e privados, de utilida- de coletiva, destinados à prestação de serviços necessários ao funcionamen- to da cidade, implantados mediante autorização do poder governamental, em espaços públicos e privados, para o uso da população ou suporte aos serviços da cidade (NBR 9050/2020), conforme ilustrado na Figura 8. Figura 7. Exemplos de esquinas com rebaixamento FONTE Manual de Cal- çada Acessível de Cabo Frio (2020). Figura 8. Mobiliários urbanos. FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). 248 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 249CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Os elementos publicitários, como totens e outdoors, podem revitalizar o espaço onde são implantados, propiciando informações muitas vezes rele- vantes para a comunidade e o consumidor de um modo geral. Além disso, são fontes de recursos para a administração pública para a manutenção da própria área onde foram instalados. No entanto, sem o devido planejamen- to, também pode prejudicar a paisagem e a mobilidade plena com suas dimensões e quantidade exageradas, tornando-se uma fonte de poluição visual e obstrução da passagem. 5.2 Semáforos para pedestres O semáforo de pedestres consiste na sinalização por dispositivos semafóri- cos que permitem ou impedem a travessia dos pedestres, através de sinais sonoros, vibratórios ou mostradores com contagem regressiva. O tempo semafórico deve ser projetado para a velocidade com base na caminhada de um idoso, cerca de 1,20 m/s. Estes semáforos podem ter dois tipos de funcionamento: aquele atuado, que funciona através do acionamento de uma botoeira, que deve estar localizada entre 0,80m e 1,20m do piso; ou o semáforo com tempo de ciclo fi xo, quando há presença contínua de pedes- tres. Para a melhor acessibilidade de todos, os semáforos também devem emitir sinais sonoros ou vibratórios de forma síncrona ao sinal visual. Por sua vez, o mostrador com contagem regressiva auxilia os pedestres na decisão de seguir em frente ou esperar. A localização dos semáforos deve ser estratégica e permitir a visibilidade com- pleta da sinalização. Sua instalação é recomendada especialmente em locais com demanda específi ca, onde há a travessia de crianças, idosos e pessoas com mobilidade reduzida em geral. Um semáforo instalado de forma corre- ta prioriza o pedestre, evitando confl itos com veículos e, consequentemente, aumentando a segurança. A colocação de mesas e cadeiras, ou qualquer outro tipo de mobiliário móvel, em passeio público fronteiriço aos estabelecimentos comerciais, como bares, confeitarias, restaurantes e lanchonetes, deverá ser autorizada pelo Município, com base nas legislações vigentes de cada cidade. A loca- lização do mobiliário não deverá ocasionar bloqueio, obstrução ou difi cul- dade de passagem para veículos quando houver acesso de garagens, por exemplo, bem como não prejudicar a visibilidade dos condutores de auto- móveis nas interseções entre vias. Além disso, não poderá obstruir a livre circulação de pedestres na faixa livre. Quanto aos mobiliários estruturantes de um espaço público urbano, os serviços de distribuição de energia elétrica e rede telefônica, iluminação pública e sinalização vertical de trânsito deverão, preferencialmente, estar associados em um único poste, de modo a reduzir o número de postes implantados e retirar os ociosos. A iluminação pública, por exemplo, deve- rá considerar a arborização existente para que não ocorra podas indevidas posteriormente. 250 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 251CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE 5.3 Sistema de informação O que é visto regularmente são amplos sistemas informativos para os con- dutores de veículos e pouca informação para pedestres. Um sistema de sinalização informativa deve ser projetado para que seja facilmente utilizado por todas as pessoas, contendo orientações, instruções, direcionamentos e características da região. Essa sinalização deve encorajar a mobilidade a pé e auxiliar os pedestres a planejarem suas rotas com autonomia e facilidade. Este sistema informativo deve apresentar algumas características: • Fornecer somente as informações necessárias, sem excesso; • A informação deve ser acessível, ou seja, posicionada de forma visível mesmo para pessoas em cadeiras de rodas, com versão em braile e em áudio, quando possível; • A estrutura de um sistema de sinalização deve ser projetada em escala humana, ou seja, com letras e textos que possam ser facilmente lidos por qualquer pessoa; • Apresentar mapas em duas escalas: uma escala menor, com um raio mostrando a distância que pode ser percorrida em 5 minutos de deslocamento a pé/de cadeira de rodas e; uma escala maior, com um raio que ilustre a distância que podeser alcançada em 15 minutos de percurso a pé/cadeira de rodas; • Instruções sobre como ler os mapas também são necessárias; • Pode mostrar pontos de interesse da região, com distâncias, direções para chegar nesses locais e os tempos que deslocamento; • Pode mostrar rotas acessíveis ou preferíveis para pessoas com mobilidade reduzida, informando, por exemplo, sobre a existência de trechos com topografi a acidentada ou com algum tipo de barreira; • Deve estar localizada em pontos estratégicos, como em paradas de ônibus e paradas de interesse, onde a circulação de pessoas é geralmente alta; • Pode ser utilizado para contar histórias e curiosidades da região, bem como para indicar atrações acessíveis; e • Pode conter tradução em outras línguas, como inglês e espanhol, de acordo com o local em que está inserida e o público que o frequenta. 5.4 Pavimento As calçadas, obrigatoriamente, precisam apresentar superfície regular, fi r- me, contínua, antiderrapante, independente das condições; sem degraus e obstáculos que sejam um empecilho para a circulação segura dos pedes- tres. O piso das calçadas deve seguir as seguintes características: segurança, durabilidade e resistência para suportar a passagem de pedestres e veículos nos acessos de garagem. Além de não apresentar qualquer tipo de emenda, reparo ou fi ssuras. Para a escolha dos pisos, é preciso observar a tipologia adotada no segmento urbano em que se insere a calçada, de modo a pro- porcionar unidade visual ao ambiente, além de atender aos padrões norma- tivos, bem como aos padrões apresentados por este guia. 5.5 Arborização O principal critério para a correta implantação de uma arborização urbana diz respeito às faixas livres do passeio público, as quais devem ser comple- tamente desobstruídas e isentas de interferências, inclusive no que tange a vegetação e equipamentos de infraestrutura urbana afl orados, como golas de árvores e jardineiras. Da mesma forma, as muretas, grades ou desníveis no entorno da vegetação não devem interferir na faixa livre de circulação, conforme ilustrado na Figura 9. Figura 9. Arborização urbana FONTE Manual de Calçada Acessível de Cabo Frio (2020). 252 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 253CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Orienta-se, ainda, que nas áreas adjacentes à rota acessível não sejam adotadas plantas que possuam espinhos ou qualquer tipo de vegetação produtora de substâncias tóxicas, bem como não se recomenda o plantio de espécies que demandam manutenção constante, que desprendam muitas folhas, fl ores ou frutos que tornem o piso escorregadio ou que possam difi - cultar o deslocamento. Recomenda-se, ainda, que ao longo das calçadas os canteiros possuam a mesma cota de nível, contribuindo para o armazena- mento das águas pluviais. Caso necessário, gradis, cercas e afi ns podem ser empregados, contanto que mantenham vãos sem obstáculos para o escoa- mento da água da calçada para o canteiro. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS As calçadas exercem papel fundamental para que as cidades se tornem locais de interação para todas as pessoas. Para que uma cidade seja mais atrativa, com maior qualidade de vida e vitalidade urbana, são necessários espaços públicos e calçadas adequadas para que qualquer cidadão possa se movimentar de forma bem-sucedida. São muitos os problemas causados pelo confl ito de árvores inadequadas com diversos equipamentos urbanos. Portanto, é fundamental que, além do planejamento prévio à implantação, ocorra a manutenção constante e adequada de forma a impedir que a arborização interfi ra negativamente na acessibilidade das calçadas. Esta manutenção envolve etapas de plantio, condução das mudas, podas e tratamento de possíveis patologias. A mobilidade a pé é fundamental e deve ser contemplada em todas as etapas do planejamento urbano. Caminhar de forma segura e confortá- vel deve ser uma pauta fundamental nos planos diretores e de mobilidade urbana. O incentivo ao uso misto do solo é um exemplo de ação de plane- jamento urbano que pode, em conjunto com calçadas bem executadas, produzir um aumento signifi cativo no número de pessoas caminhando nas cidades. A ausência de calçadas acessíveis ou a má qualidade das mesmas é uma questão crítica que pode difi cultar, ou mesmo inibir, a participação das pessoas com mobilidade reduzida na sociedade. Além disso, a população brasileira, atualmente, passa por um processo rápido de envelhecimento e que irá contribuir para aumentar, signifi cativamente, o número de pessoas com mobilidade reduzida nos próximos anos. Neste contexto, é imprescin- dível que gestores públicos entendam o acesso universal ao espaço público não apenas como um benefício para os moradores, usuários e visitantes, mas como um pré-requisito básico para possibilitar o acesso de uma parce- la crescente da população a serviços essenciais, tais como saúde, emprego, educação e lazer. 254 | CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE | 255CAPÍTULO 7 - A CALÇADA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DA CAMINHABILIDADE Dessa forma, a acessibilidade deve ser entendida tanto pelo poder público quanto pela sociedade civil como um direito e uma responsabilida- de de todos. É um dever coletivo zelar por este bem comum e do Estado de garantir o cumprimento da lei, que assegura a todos este direito, principal- mente para àqueles que têm na acessibilidade uma condição imprescindí- vel para que possam se locomover nas cidades. Afi nal, a acessibilidade é um elemento primordial para os municípios que visam assegurar equidade de acesso e garantir o direito humano fundamental e universal à mobilidade. O presente guia pode orientar em como executar as calçadas de forma a garantir os elementos necessários para fomentar uma melhor cami- nhabilidade. Contudo, ressalva-se, novamente, que todos os procedimen- tos adotados na construção de calçadas devem obedecer às determina- ções da NBR 9050/2015: Acessibilidade a edifi cações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. 7. REFERÊNCIAS ABNT -Associação Brasileira de Normas Técnicas. (2015) NBR 9050: Acessibilidade a edifi cações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro, RJ. ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas (2016). NBR 16537: Acessibilidade – Sinalização tátil no piso – Diretrizes para elaboração de projetos e instalação. Rio de Janeiro. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística). (2020). Conheça o Brasil - População – Pessoas com defi ciência. Brasil. Disponível em: < https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o- brasil/populacao/20551-pessoas-com-defi ciencia.html > Acesso em: 11/12/2020. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística). Idosos indicam caminhos para uma melhor idade (2018). <https://censo2021.ibge.gov.br/2012-agencia-de-noticias/noticias/24036- idosos-indicam-caminhos-para-uma-melhor-idade.html> Acesso em: 11/12/2020. OMS (Organização Mundial da Saúde). (2020). Ageing and Health. World Health Organization: Geneva, Switzerland. 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ANA MARIA SANTOS TORQUATO Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) anatorquato10@yahoo.com.br MARIA LAURA LOPES LUCIANO Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) malaura232373@gmail.com EVELYN CORTEZ ALVES PET/COPPE/UFRJ evelyn_cortez_alves@hotmail.com MARIANA MARÇAL THEBIT STT/EESC/USP marianathebit@gmail.com GUILHERME EXPEDITO DE ANDRADE Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) guilherme6572@hotmail.com MATHEUS RONDON NAVAS Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) matheusrn0305@gmail.com THIAGO ASSIS DUTRA LUCENA Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) thiago-dutra2000@hotmail.com GABRIELA SOUZA CONRADO Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) gabrielasconrado@gmail.com MATEUS BERNARDO DE OLIVEIRA Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mateusbzs13@gmail.com RAPHAEL GERALDO ESTANISLAU VAZ RIBEIRO Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) raphaelgeraldovaz@gmail.com | 261CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO 1 INTRODUÇÃO Você se preocupa com os congestionamentos diários de sua cidade, com as oscilações do preço da passagem e a qualidade do transporte público? Já se perguntou se as pessoas da sua cidade têm acesso aos ônibus e metrôs? E se eles são sufi cientes para sua livre locomoção na cidade? Ainda já consi- derou os diversos impactos ao meio ambiente (poluição ambiental, sonora e visual, por exemplo) acarretados pelo setor de transportes, principalmente pelo transporte rodoviário urbano? Durante muito tempo, valorizou-se a utilização do transporte privado motorizado por meio de incentivos fi scais e investimentos em infraestrutu- ra viária (construção de novas vias ou expansão das já existentes, por exem- plo) para acomodar o número crescente de automóveis, mas será que de fato esta é mesmo a melhor opção? Neste capítulo, discutimos sobre uma opção de mobilidade urbana sus- tentável, que apesar de parecer óbvia, encontra sérios desafi os, principal- mente em países em desenvolvimento como o Brasil, em especial quando analisamos o nível de serviço oferecido aos seus usuários. Trata-se do transporte público coletivo que tem sido amplamente reconhe- cido como uma alternativa viável e sustentável ao uso excessivo de automó- veis particulares, garantindo redução do congestionamento, dos aciden- tes, das altas emissões de carbono, dos problemas de estacionamento etc. (Redman et al., 2013; Islam et al., 2020; Santos et al., 2021). Dessa forma, é de fundamental importância que todo gestor público, seja ele responsável de pequeno, médio ou grande município, incentive a promoção do transporte público coletivo por meio de políticas públicas que promovam uma melhor qualidade do serviço, considerando aspectos como acessibilidade, integração, os processos de concessão e a tarifação. Queremos apresentar a você um novo olhar sobre esse modo de transporte e possibilidades para adequá-lo às demandas sociais e ambientais. Nesse sentido, buscamos dividir este capítulo em três tópicos impor- tantes para promoção do transporte público coletivo, que são: (1) as polí- ticas tarifárias, abordando a importância da modicidade do serviço para a efetivação do direito à mobilidade; (2) as questões de acessibilidade e de integração, que são essenciais na democratização do acesso ao transporte; e (3) a concessão, enquanto um modelo de prestação do serviço. 262 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 263CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO É nessa perspectiva que a tarifa do transporte público deve ter uma rela- ção positiva com a renda mensal da população em geral. Um interessante estudo realizado pelo Mobilize Brasil em 2019 revela as proporções entre as tarifas e a renda média das cidades por todo o mundo, conforme apresen- tado na Figura 1. Destaque para as cidades de Belo Horizonte (MG), Recife (PE), Florianópolis (SC) e Curitiba (RS), nas quais o preço da passagem incide em mais de 15% da renda mensal. Portanto, cabe ao gestor público pensar políticas tarifárias que garantam a livre locomoção, acessibilidade e a mobi- lidade, de modo que isso não tenha um grande peso sobre a renda de sua população. Figura 1. Gráfi co gerado pelo Mobilize Brasil compara tarifas de trans- porte público no Brasil e em várias cidades do mundo. Fonte: Mobilize Brasil, 2019. 2 POLÍTICAS TARIFÁRIAS Qual o valor da passagem na sua cidade? Qual a relação do número de passageiros com a qualidade do transporte público? O valor da tarifa refl ete na qualidade do serviço oferecido? O que a tarifa dos transportes públicos tem a ver com uma gestão efi ciente? Existe passagem gratuita? Nesse tópi- co, convidamos você, gestor público, a tentar responder essas perguntas conosco. Vamos lá! Muito se discute em torno das políticas tarifárias, pois é a partir delas que a administração pública cria diretrizes específi cas voltadas para a forma de cobrança pela utilização dos serviços de transporte público. Em outras palavras, os prefeitos e seus assessores determinam qual será o cálculo e valor das tarifas. De forma simplifi cada, é possível dizer que o cálculo do valor da tarifa é realizado dividindo os custos totais de operação pelo número de passageiros pagantes. Isso signifi ca dizer que as políticas tarifárias estão diretamente ligadas com os contratos de concessão. São as empresas que apresentarão seus planos de custos de operação para os órgãos públicos. Por isso, é impor- tante que os contratos de concessão sejam pensados a partir de uma boa política tarifária para não deixar que somente os passageiros arquem com o ônus do serviço. Logo, a atuação do gestor deve ser efetiva no papel de regulador e fi scalizador das concessões fi rmadas. Garantir a qualidade do transporte público deve ser uma meta compar- tilhada em qualquer gestão pública porque a locomoção faz parte da rotina comum dos cidadãos. Muitas pessoas enfrentam longas jornadas dentro de ônibus ou metrôs que são agravadas pelo engarrafamento, chuvas e aciden- tes no trânsito. Nesse sentido, deve haver uma relação proporcional entre o serviço ofertado e as tarifas cobradas, de modo que o preço para transitar pelos espaços da cidade não impliquem em restrição da livre locomoção. 264 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 265CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO 2.1 Como é fi nanciado o transporte coletivo? Em muitas cidades brasileiras, o sistema de transporte público é custeado exclusivamente pela tarifa, o que faz com que o ônus seja aplicado majorita- riamente às parcelas mais pobres da população. Do mesmo modo, os benefí- cios de gratuidades também são pagos por esses usuários, embora devessem ser custeados por toda a sociedade. Em contrapartida, as parcelas mais ricas apesar de se benefi ciarem da redução dos congestionamentos, das emissões de poluentes, e dos acidentes, dentre outros aspectos positivos, ocasionadas pela oferta dos modos coletivos, não participam do custeio do sistema, uma vez que não o utilizam (INESC, 2019). O fi nanciamento do sistema exclusivamente pela tarifa também se mos- tra inadequado ao considerarmos a necessidade de expansão e melhoria dos serviços de transporte coletivo ao longo do tempo. Neste contexto, é de suma importância a gestão pública prever fontes de renda extratarifárias para os modos coletivos. Essas, além de buscar a inversão da iniquidade existente, delegando maior pagamento do ônus do sistema aos ricos do que aos pobres, também podem funcionar como um mecanismo de compensação das externalidades negativas ocasionadas pelos modos indivi- duais. O Capítulo 4 apresenta alguns exemplos de taxação dos veículos privados pelo uso do solo, por meio de medidas como estacionamento rotativo e pedá- gio urbano, as quais, além de seremimportantes mecanismos de desestímulo ao uso dos modos individuais, também podem desempenhar o papel de fonte extratarifária no fi nanciamento do transporte público, caso parte dos recursos arrecadados sejam destinados a esse fi m. No município de Porto Alegre, por exemplo, está em debate um projeto que prevê fontes extratarifárias para o fi nanciamento do transporte coleti- vo, mais especifi camente a Taxa de Mobilidade Urbana - TMU e a tarifa de congestionamento. A TMU consiste na cobrança ao empregador por fun- cionários com carteira assinada ao mesmo tempo que garante a estes tra- balhadores o passe livre. Já a tarifa de congestionamento propõe taxar os veículos emplacados fora de Porto Alegre que adentrarem no centro histó- rico do Município. Outro exemplo de fonte extratarifária apresentado foi a criação da tarifa de uso do sistema viário, a qual consistiria na cobrança de R$ 0,28 por km rodado para as empresas de transporte por aplicativos. O debate incluiu a apresentação de um simulador de tarifa no site ofi cial da prefeitura, que permitiu avaliar o quanto cada medida poderia impactar na redução dos valores da passagem de ônibus e da TMU propos- ta (Prefeitura de Porto Alegre, 2020). 266 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 267CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO A Tabela 1 apresenta um conjunto de possíveis fontes extratarifárias para os sistemas de transporte coletivo. Origem Fonte Justifi cativa Vantagens Desvanta- gens Exemplos Sociedade Orçamento geral, Fundos Setoriais (gra- tuidades) Toda socieda- de se benefi cia do transporte público Facilidade legal - Uso do poder discricionário do agente público Compromete investimen- tos sociais e fundo com característi- cas regressi- vas. São Paulo e cidades europeias que já subsi- diam. Usuário do automóvel - Taxação do uso Taxa sobre os combustí- veis; taxação do uso do espaço urba- no (estacio- namento e pedágio) Congestiona- mentos de trânsi- to aumentam os custos de opera- ção do transporte público para a sociedade. Tributo pro- porcional ao uso das vias públicas e de fácil cobrança Resistên- cia política e algumas iniquidades em termos de uso do transporte individual A cidade de Bogotá (taxa sobre a gasolina destinada a fundo espe- cífi co para o transporte público.) Usuário do automóvel - Taxação da aquisição e propriedade Tributos inci- dentes sobre a produção, comercia- lização e propriedade dos veículos individuais Externalidades negativas do transporte priva- dos são propor- cionais à frota Tributos já existentes e de fácil operacionali- zação Resistên- cia política e algumas iniquidades em termos de aquisição do transporte individual Cingapura cobra uma taxa anual muito cara para licen- ciar os veícu- los privados Setor produ- tivo Taxa de transporte proporcional ao fatura- mento ou folha de pagamento Os empregado- res são benefi ci- ários indiretos do TPU Aumento da base de arre- cadação para benefi ciários indiretos Aumento da carga tributá- ria e resistên- cias políticas Versement transport da França e VT do Brasil Proprietários de imóveis IPTU, op. urbanas, con- tribuições de melhorias ou taxas sobre vagas priva- das de gran- des empre- endimentos imobiliários Valorização dos imóveis em função da rede de transporte de qualidade pró- xima ou investi- mentos públicos realizados. Aumento da base de arre- cadação para benefi ciários indiretos Aumento da carga tributá- ria e resistên- cias políticas. Contribui- ções de melhoria no exterior e operações consor- ciadas no Brasil. Receitas de comércio, serviços, publicidade, PPP, etc. Comissões de atividades geradoras de renda associadas ao transporte Transporte público viabi- liza demanda de espaço para exploração comercial Receitas extra tarifárias e sem aumen- to de carga tributária. Modelos de negócios complexos (PPP´s ou outras for- mas) Shoppings em aeropor- tos no Brasil, propaganda em ônibus e shoppings anexos ao metrô em Tóquio. Fonte: INESC (2019). Embora algumas das fontes apresentadas na Tabela 1 sejam de com- petência da União e dos Estados, é possível identifi car aquelas cuja imple- mentação compete aos Municípios, como é o caso das taxas relacionadas ao IPTU e a cobrança pelo uso do espaço público. É importante que, você, gestor, conheça as possíveis fontes alternativas de fi nanciamento do transporte coletivo para que possa desenvolver proje- tos que permitam que os custos não sejam pagos apenas pela tarifa, com- pondo assim um sistema mais sustentável e de menor impacto na renda das famílias mais pobres. Tabela 1. Exemplos de fontes extra- tarifárias para fi nanciamento do Transporte público coletivo. Fonte: INESC (2019). 268 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 269CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO 2.2 Quais são as alternativas? É possível o fi m das tarifas? Diante do apresentado, você, gestor, pode se perguntar, mas é possível o passe livre? Ou seja, é possível que os cidadãos não paguem pontualmente pelo serviço de transporte público? Essa é uma pergunta que deve sempre guiar as políticas tarifárias, porque quando falamos da mobilidade urbana, estamos tratando de um serviço público como qualquer outro. Nos serviços de coleta de lixo, iluminação, limpeza urbana não há o pagamento de taxas no momento da prestação do serviço, em outras palavras, ninguém espera o caminhão de lixo passar para pagar um valor e ter seu lixo recolhido. Por mais que pareça uma proposta distante de sua realidade, destaca- mos que essa medida é possível e já foi implementada em vários lugares. Para ilustrar melhor essa situação, a Tabela 2 contém alguns exemplos de cidades que tiveram vivência com o passe livre. Além das cidades brasileiras já citadas na Tabela 2, existem pelo menos mais 14 pequenos municípios, com população inferior a 60 mil habitan- tes, que adotam a prática da tarifa zero. Em outros países, podemos citar mais exemplos como cidades na França, Alemanha, Estônia, Luxemburgo, Romênia, Canadá, entre outros, que possuem políticas públicas voltadas para a isenção de tarifa no transporte público (Santini, 2019). A experiência desses locais serve apenas como referência, essa situação pode ser muito diferente da realidade do lugar em que você vive, por isso, o mais impor- tante é que você, gestor, conjuntamente com a equipe da administração pública, busque soluções que sejam adequadas para sua cidade. A maioria dos municípios atualmente pode não possuir meios de implementar a isenção de tarifa de forma imediata, porém, medidas podem ser tomadas para proporcionar uma redução gradual do valor da passagem. Uma dica importante é seguir o exemplo de diversas pequenas cidades bra- sileiras que estão investindo em ônibus com tecnologias sustentáveis, como forma de reduzir os custos e baratear a passagem. Cidade O que ocorreu? Como ocorreu? Resultados Talim (capital da Estônia) O passe livre foi apli- cado para todas as pessoas que possuem cadastro de morado- res da cidade. Utilizaram a recei- ta da captação de impostos para custear o transporte. Muitos moradores regularizaram seus cadastros junto ao município, para poderem desfrutar do passe livre, o que gerou um aumento expressivo na arreca- dação. Maricá - RJ Criação de uma empresa estatal de transportes municipal seguida da abertura de linhas operando com tarifa zero. Utilizaram royalties de exploração do petró- leo, na costa do muni- cípio, para custear o passe livre. Ampliação da oferta de rotas disponíveis, bem como um con- siderável aumento no fi nanciamento de pesquisas de novas tecnologiasde trans- portes. São Paulo - SP Tentativa de imple- mentação da política de tarifa zero na cidade. A ideia era subsidiar os custos do passe livre por meio de um Fundo de Transportes custeado por contri- buições da prefeitura e de empresas priva- das, benefi ciadas por não terem que pagar vale-transporte. A proposta não foi aprovada devido a grande pressão con- trária, por parte de políticos e de empre- sas de transporte. Paris (capital da França) Atualmente, estuda a viabilidade de adotar o passe livre em toda a cidade. Políticas de passe livre restrito apenas para alguns grupos já estão sendo adotadas gradual- mente. O intuito é custear o passe livre por meio de fi nanciamento indireto. A cidade tem pers- pectivas de conseguir reduzir a poluição, reduzir a quantidade de carros em circula- ção, ampliar a inclu- são social e reduzir o custo operacional com transportes. Tabela 2. Exemplos de algumas cidades que tiveram experiência com o passe livre. Fonte: Adaptado de Santini (2019). 270 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 271CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO 2.3 Como planejar as políticas tarifárias? Para concluir essa seção, indicamos que é importante que você, gestor público, no planejamento das suas políticas tarifárias leve em consideração: • A proporcionalidade entre o valor da passagem e a qualidade ofertada pelo serviço; • A proporcionalidade entre o valor da passagem e a renda mensal da população; • Os contratos de concessão, de modo que não signifi quem redução da qualidade e do acesso dos transportes públicos mediante altas tarifas; • Fontes extratarifárias de custeio do sistema; • A possibilidade da gratuidade universal; e • O não sobrecarregamento dos usuários com os custos da operação. 3 ACESSIBILIDADE E INTEGRAÇÃO No dia a dia é possível perceber que o transporte público faz muito além que levar as pessoas de um ponto ao outro na cidade, ele também é promo- tor de acesso às diversas “oportunidades” que ela tem a oferecer. Essas oportunidades são direitos sociais também garantidos pela Constituição, como: saúde, emprego, estudo e lazer. Todo cidadão, independentemente de classe social, raça, gênero, credo, idade, orientação sexual, condição físi- ca etc., deve ter um acesso efetivo à cidade, tanto em seus próprios limites quanto em regiões metropolitanas. Assim, como você já deve ter percebido, o transporte público é impres- cindível na promoção da cidade para as pessoas. Apesar da maior parte desses serviços serem públicos e gratuitos, muitas pessoas não conseguem frequentá-los por conta de tarifas caras, veículos automotores que não suprem as necessidades de todos, falta de capacitação dos trabalhadores no manejo de peças adaptadas para as pessoas com defi ciência, falta de investimento público nos sistemas de transporte, falta de conexão entre os modos de transporte e vias que não favorecem a comunicação entre os bairros e centros. Com municípios cada vez mais desiguais e com diversos centros de atividade espalhados em seus territórios, o que se observa na realidade são metrópoles em que a maioria da população reside em áreas distan- tes dos seus locais de trabalho ou estudo e regiões comerciais, além de sofrer com a carência de acesso a serviços básicos, essenciais à dignida- de da pessoa humana. Você verifi ca isso na sua cidade também? 272 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 273CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO Melhorar o transporte público em favor de uma acessibilidade univer- sal é efetivar a cidadania, uma vez que signifi ca avanços na qualidade de vida de todos os usuários do espaço urbano (Ministério das Cidades, 2004). Para pessoas com algum tipo de defi ciência, estar provido de meios de sociabilidade é também uma condição para deixar de estar invisível aos olhos da sociedade e poder ser enxergado como prioridade no planeja- mento de políticas públicas (BARONI e RESENDE, 2006). 3.1 Tornando nossas cidades realmente acessíveis As legislações que temos hoje são fruto de décadas de trabalho em prol da inclusão de defi ciente físicos e pessoas com incapacidades em diver- sos espaços da vida pública. Na Política Nacional de Mobilidade Urbana, os Artigos 5º e 7º trazem como princípios a acessibilidade universal, a equi- dade no acesso dos cidadãos ao transporte público coletivo e a equidade no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros. Além de estabe- lecer entre seus objetivos: reduzir as desigualdades e promover a inclusão social; e proporcionar melhoria nas condições urbanas da população no que se refere à acessibilidade e à mobilidade (BRASIL, 2012). No entanto, ao ler isso você deve estar pensando: “A realidade é bem diferente da lei!”. Verdade! Ao andar pela cidade é fácil perceber obstácu- los que difi cultam ou impossibilitam a mobilidade de pessoas com algum tipo de defi ciência, cerceando, assim, seu direito de ir e vir e restringindo o desenvolvimento de uma vida plena e produtiva (BARBOSA, 2016). Ainda existem diversas barreiras arquitetônicas no meio urbano difi cultando todas as etapas da locomoção. Governantes, empresários e a sociedade em geral precisam ter em mente que as pessoas com defi ciência são cidadãos, contribuintes, con- sumidores e clientes como qualquer outro. Viajam, apreciam a gastrono- mia, o teatro, o cinema, a música e a dança como qualquer pessoa. Contudo, no Brasil, ainda é raro encontrar um museu onde exista a possibilidade de um defi ciente visual tocar as peças para conhecê-las ou esteja disponível algum recurso de audiodescrição das obras expostas. Ademais, em diversos espaços, tudo isso ainda se soma à falta de acessibilidade física já conhecida em locais culturais, como a falta de piso tátil e de banheiros adaptados para cadeirantes (AFFONSO, 2014). Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde - realizada pelo IBGE (2016) - em 2013, 7,2% da população maior de 14 anos tinha algum tipo de defi ciên- cia, seja intelectual, física, auditiva ou visual. Uma proporção aproximada de 1 pessoa com defi ciência para cada 14 pessoas da população em geral. Nesse sentido, te convidamos a perceber que esse grande número de indi- víduos têm impedimentos que, em um ambiente inadequado, limitam ou impedem que estes desempenhem as habilidades que seriam esperadas neste contexto. Assim, esperamos que você, gestor público, enxergue como na realidade se fazem necessários esforços em prol do atendimento pelos serviços públicos da melhor maneira possível a todos da cidade. 274 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 275CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO Os impedimentos não estão nas pessoas, esses desafi os surgem na relação da pessoa com os ambientes (Prado e Moraes, 2006) e por isso é indispensável um processo de equiparação de oportunidades em que a cidade permita que todos se desenvolvam em suas potencialidades. A luta em favor de uma cidade acessível a todos deve ser pautada no res- peito à diversidade física e sensorial entre todos os indivíduos (ALMEIDA E BORTOLUZZI, 2013). A construção de cada um desses ambientes deve ser feita em um diálogo aberto com organizações e comunidade civil. Grupos de pesquisa sobre o tema, associações de defi cientes, organizações de moradores, movimentos sociais e outros, não apenas conhecem o pro- blema, como podem contribuir com soluções em um trabalho conjunto com os gestores, arquitetos e urbanistas. Ainda, partindo da perspectiva da luta por um acesso efetivo à mobi- lidade pública, percebe-se que esse sistema precisa ser repensado, para que seja, de fato, universal a todas as parcelas da população, como por exemplo, os gordos. Para muitos, a falta de inclusão começa logo ao aden- trar no ônibus, nas catracas, que, na maioria dos casos, não são adaptadas para a largura de corpos que divergem daqueleimposto como “padrão”. Gerando, assim, desconforto e até mesmo constrangimento para aqueles que não consigam passar pelos limites impostos pelas catracas usuais. Além disso, dentro dos ônibus, o número reduzido de assentos destinados a pessoas obesas, além é claro, da qualidade destes, são outras questões a serem pensadas para a garantia de um transporte público digno para esse público. Como exemplo de medidas tomadas no contexto brasileiro, você, gestor, pode começar pensando na cidade de Palmas, no Tocantins, em que os passageiros obesos que comprovem sua necessidade de atendimento dife- renciado, por meio da apresentação de uma carteirinha especial forneci- da pela empresa de transporte, têm acesso pela porta do meio do veículo como forma de evitar o uso da catraca. Ademais, a empresa responsável pelo transporte coletivo na capital também orientou seus motoristas para a garantia de um melhor atendimento a esses cidadãos (MARQUES, 2019). Ainda no Brasil, na capital do Mato Grosso do Sul, Campo Grande, por força da Lei 6.217/2019, as pessoas obesas foram desobrigadas de acessa- rem o embarque ou desembarque do ônibus pelas catracas. Nesse sen- tido, a lei prevê que após realizado cadastro na Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito) e no Consórcio Guaicurus, empresa concessio- nária do transporte urbano da capital, o passageiro receberá um cartão eletrônico e, por meio deste, terá acesso diferenciado. Esse cartão, por sua vez, deverá ser apresentado ao motorista, que girará a catraca e permitirá o acesso do passageiro pela porta traseira do ônibus. Apesar de avanços na área já serem evidentes, como comprovado a partir de ações como o Projeto de Lei (PL) 4.804/2019, que destina obriga- toriamente 3% dos dos assentos de transportes coletivos para pessoas com defi ciência ou obesidade mórbida, ainda há muito a ser pensado e trabalha- do quando se objetiva o acesso universal ao transporte público. 276 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 277CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO Um exemplo simples da aplicação de vários princípios do Desenho Universal nos ambientes públicos é a escolha das maçanetas e torneiras, os objetos do tipo alavanca, monocomando ou com sensor benefi ciam pesso- as com força limitada nas mãos ou que estejam carregando objetos, confor- me identifi cado na Figura 2. Ao ter difi culdades para andar em uma calçada, você já deve ter perce- bido que um transporte coletivo acessível vai além da facilitação da entrada nos veículos. O acesso ao sistema de transporte em cada cidade depende de suas características específi cas como a existência de estacionamentos próximos, localização das estações, dos pontos de ônibus e característi- cas relativas ao uso do espaço em torno destes. Esquematizando, ele é um sistema que depende, dentre outras coisas, de: • adequação dos veículos, terminais e/ou pontos de ônibus; • uma cidade caminhável, na qual haja calçadas, travessias e passarelas necessárias para chegar ao transporte público e aos destinos; • qualidade da via a ser percorrida, que infl uencia também na segurança da viagem; e • integração com o sistema de transporte de cidades vizinhas. Nem todas as possíveis difi culdades de um ambiente podem ser facil- mente reconhecidas por alguém que não vive com alguma limitação e, por isso, existem critérios gerais que podem auxiliar no desenvolvimento de um ambiente mais acessível. Na elaboração dos ambientes do transporte coletivo é indispensável seguir as diretrizes arquitetônicas do Desenho Universal (ou Design Universal), a elaboração de um ambiente que, na medida do possível, pode ser utilizado por todas as pessoas sem a neces- sidade de adaptações. Segundo Wright (2001), os princípios do Desenho Universal são: • Uso equitativo: O desenho é útil e pode ser vendido a pessoas com habilidades diversas; • Flexibilidade no uso: O desenho acomoda uma gama ampla de preferências individuais e habilidades; • Uso simples e intuitivo: O uso do desenho é fácil de entender, independentemente da experiência do usuário ou de seu conhecimento, profi ciência linguística ou nível atual de concentração; • Informação Perceptível: O desenho comunica a informação necessária efi cazmente ao usuário, independentemente das condições do ambiente ou das habilidades sensoriais do usuário; • Tolerância de erros: O desenho minimiza o perigo e as consequências adversas de ações acidentais ou não intencionais; • Pouco esforço físico: O desenho pode ser usado efi ciente e confortavelmente, com fadiga mínima; • Tamanho e espaço para aproximação e uso: Provêm-se tamanho e espaço apropriados para aproximação, alcance, manipulação e uso, independentemente do tamanho do usuário, sua postura ou mobilidade. Figura 2. Maçanetas e torneiras tipo monocoman- do, alavanca e sensor devem ter preferência sobre as do tipo bola. Fonte: Guia de Rodas (2018). 278 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 279CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO Embora seja ideal que toda cidade tenha um transporte público aces- sível, algumas difi culdades que podem ser enfrentadas em sua imple- mentação, como a necessidade de muitas obras de adequação do espaço urbano às diferentes necessidades de portadores de necessidades espe- ciais, além da adaptação da frota de ônibus para instalação de elevadores para cadeirantes. Também é importante salientar a importância de treina- mento adequado para os motoristas que passarão a operar o elevador do ônibus. Além disso, também há a necessidade de promover campanhas de conscientização da população em geral para que passe a ter um olhar mais cuidadoso e empático pelas pessoas que possuem necessidades especiais. Por fi m, a adequação da rede de transporte público por ônibus de forma que atenda áreas carentes de acesso ao transporte público. 3.2 As novas formas de organização das cidades O crescimento das cidades impõe uma nova forma de organização, cidades e regiões metropolitanas com milhões de habitantes já não conseguem mais atender às necessidades de seus cidadãos com apenas um centro comercial. As cidades atuais são redes cada vez mais complexas, com diver- sas centralidades e diferentes interesses, gerando um número maior de via- gens e confl itos. Mas, como garantir que o sistema de transporte atenda a necessidade dos cidadãos? O antigo padrão de redes de transportes, no qual as periferias eram ligadas ao centro por rotas fi xas e diretas (Figura 3), demonstrava-se ultrapassado e contraproducente em termos fi nanceiros, ambientais e de maximização de tempo. Figura 3. Cidade mono- cêntrica x Cida- de policêntrica e suas dinâmicas de deslocamen- tos internos. Fonte: Gomes (2009). 280 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 281CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO 3.3 Por que a integração é tão importante para uma grande cidade? Sistemas integrados de transporte são capazes de diminuir os conges- tionamentos nas cidades, aumentar a velocidade operacional do trans- porte público (no caso, de ônibus), e diminuir os custos operacionais do sistema, possibilitando uma tarifa mais justa para o passageiro pagante. Além disso, Tabassum et al. (2017) acreditam que um serviço alimentador regular melhora a acessibilidade do sistema principal, o que acaba por ele- var o número de passageiros, substituindo seus automóveis particulares por transporte público. Essa migração para o transporte público ajuda o meio ambiente, com menor emissão de gases de efeito estufa, além de diminuir o tempo gasto em engarrafamentos. Para que o sistema de transporte atenda às necessidades do usuário que precisar utilizar mais de um serviço de transporte para completar o seu deslocamento, é importante que o sistema contemple, segundo BNDES e SEMOB (2018), três aspectos: i. A integração física: a proximidade das estações e pontosde parada dos diferentes sistemas; ii. A integração tarifária: a possibilidade de pagar uma única tarifa para mais de um deslocamento na mesma viagem; e iii. A integração operacional: a coordenação dos horários e dimensionamento da oferta de viagens dos diferentes serviços. 3.4 O que é preciso ter em mente na implementação de um sistema integrado para uma grande cidade? É importante destacar que a integração tarifária também possibilita o acesso de pessoas de baixa renda a todas as regiões da cidade pagando apenas uma passagem. Este benefício, além de promover os serviços da cidade como um todo, aumenta as chances de pessoas residentes em regi- ões periféricas conseguirem emprego formal no centro comercial da cidade. Dessa forma, é importante ter em mente que se a implantação do siste- ma não prevê essa integração, o projeto acarretará maior gasto fi nanceiro por parte do passageiro pagante que talvez não seja suportado pelo orçamento familiar de classes sociais mais baixas, diminuindo o acesso dessas pessoas aos serviços essenciais. Sem esse cuidado, o objetivo de maior acessibilidade da cidade por todos os indivíduos irá fracassar, apesar das mudanças e adap- tações do sistema. Essa integração, de acordo com Alexandre (2014), pode ser intramo- dal e multimodal: intramodal quando envolver a utilização do mesmo modo de transporte em 2 trechos para se chegar ao destino; e multimodal quando envolver a articulação de diferentes meios de transporte, como um sistema em que serviços de menor capacidade (ônibus regulares) funcionam como alimentadores de serviços de alta capacidade como o metrô, BRT e trens urbanos. 282 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 283CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO O Guia TPC, elaborado pelo BNDES e pela SEMOB (2018), mostra que a área de infl uência do projeto de uma estação pode ser subdividida em áreas de infl uência direta e indireta. E a qualidade do acesso nessas duas áreas será determinante para a escolha entre o transporte público e o transporte privado. A área de infl uência direta é a parcela do território da cidade mais próxima da estação, que pode ser acessada a pé e por bicicleta, cujos deslo- camentos são da ordem de 500 a 1000 metros de cada lado da estação. Para os pedestres, deve-se considerar também a topografi a e diversos fatores intrínsecos ao desenho urbano que afetam a decisão de caminharem ou não até seu destino. Como a percepção de criminalidade e segurança pública, que somadas a características individuais como idade e gênero, também afetam a decisão daqueles que se locomovem pela cidade. A área de infl uência indireta de uma estação abrange uma parcela mais ampla do território, cobrindo áreas de atendimento das linhas alimentado- ras do sistema de transporte público. Assim, tendo como exemplo um BRT, o tempo de acesso aos terminais é tão importante quanto o tempo da via- gem em si. Em um estudo realizado por Marquez, Pico e Cantillo (2018) em Bucaramanga, na Colômbia, foi observado que o tempo de acesso median- te as linhas alimentadoras foi mais signifi cativo para os usuários do BRT, sendo 30% maior que o tempo de viagem em si. As linhas de alimentação são um ponto crítico do sistema, conforme estudos apresentados pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, elas são a principal fonte de reclamações dos usuários que utilizam o transporte com transbordo (baldeação - com uma ou mais trocas de veículos para che- gada a seu destino), por apresentarem defi ciências em atributos como con- forto, nível de serviço e também sincronia da integração (JUNIOR et. al., 2018). Muitas cidades de grande porte apostaram na implantação de cor- redores de transporte, utilizando o conceito da integração como solução de mobilidade para seus congestionamentos. Esse tipo de sistema é uma ótima solução para redes de transportes mais complexas, que atendam a diferentes centralidades, mas não deve ser replicado em qualquer situação. Em condi- ções inadequadas, esse tipo de rede pode ser inconveniente para os usuários, já que embora reduza a quantidade de veículos na área central, em contra- partida ela pode ampliar a quantidade de transbordos (ROSA, 2016). Para que a penalidade do transbordo ao passageiro seja minimizada, é importante que ele seja feito de forma satisfatória, segura e rápida. Dentre os desafi os que podem ser encontrados na implementação de sistemas integrados de transporte público, estão: i. a necessidade de realização de obras de infraestrutura nos terminais e pontos de integração; ii. a necessidade de ampla divulgação do novo sistema com a fi nalidade de informar a população com antecedência à implantação do sistema; iii. a necessidade de estudo tarifário e fi nanceiro para defi nir a tarifa modal de integração; e iv. a possibilidade de intervenção fi nanceira do Estado para fi nanciar parte da tarifa modal de integração. 284 | CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO | 285CAPÍTULO 8 - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO 3.5 A implementação de um sistema integrado e acessível Por se tratar de um tema tão importante, é essencial observarmos e apren- dermos com exemplos de cidades que aceitaram a tarefa de implementar um sistema de transportes integrado e acessível a suas populações. Para fi ns didáticos, vamos trazer um exemplo brasileiro, com a cidade de Curitiba, e, posteriormente, dois exemplos estrangeiros, com as cidades de Dublin, capital irlandesa, e Chester, no Reino Unido. Ao ler os exemplos trazidos, tente pensar em uma mudança que seria pertinente para sua cidade. O exemplo de Curitiba é emblemático exatamente por ser uma realida- de muito distinta da encontrada na maioria das cidades do Brasil. Pensado na década de 1970, o projeto de acessibilidade do transporte público da capi- tal paranaense mescla-se com o desenho urbano da cidade, trazendo um conceito de mobilidade urbana que preza pelo transporte coletivo e modos alternativos de locomoção. É importante citar que Curitiba possui diversos sistemas e tecnologias de monitoramento de tráfego, de bilhetagem ele- trônica, com câmeras, GPS e plataformas de dados que, juntos, compõem um grande sistema de estudo para o Poder Público avaliar o hoje e planejar o futuro, prezando pela qualidade de vida urbana. A URBS (Urbanização de Curitiba S/A), empresa de economia mista, passou a controlar o sistema de tráfego da capital do Paraná a partir de 1986, com diversas atribuições, tanto de pesquisa e aprimoramento, quanto de gerenciamento do sistema. Até hoje, Curitiba recebe prêmios de inovação e sustentabilidade pela ação da URBS (SANTANA, 2017). No caso de Dublin, a prefeitura da cidade assinou, em 2005, o Disability Act, comprometendo-se com a implantação de um plano de mobilidade que contemple e garanta o atendimento das necessidades de pessoas com defi ciência. Desde a implementação de rampas para cadeirantes, até a adaptação de espaços comuns na cidade, tudo precisou ser repensado para atender às necessidades dos defi cientes. O serviço de ônibus, por exemplo, apesar de apresentar veículos com até mesmo dois andares, foi pensado de maneira acessível. Devido à presença de piso rebaixado e espaço exclu- sivo para cadeiras de rodas, a frota de ônibus mostra-se extremamente inclusiva para diversos grupos com limitações de mobilidade. Ademais, o sistema de trens nacional, em sua maioria, também passou a seguir à risca diversas normas de acessibilidade, garantindo espaço para cadeiras de rodas em todas as unidades (GONÇALVES, 2019). Pensando na cidade de Chester, percebemos que apesar de legados históricos, cidades que sobreviveram até os tempos modernos precisam e conseguem se tornar referência em acessibilidade. Embora o centro his- tórico da cidade tenha sido reconstruído durante o século XVI, ele ganhou novos ares na contemporaneidade. Nesse sentido, em 2017, a cidade foi reconhecida pelo Access