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MACEDO_ Portugal e a Economia Pombalina

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Portugal e a Economia Pombalina
Jorge de Macedo
Em seu interessante texto sobre a administração de Pombal, Macedo inicia suas considerações comentando as diferentes visões correntes sobre a época dita “pombalina”: historiografia liberal visualizando, no período, um esforço no ensino e no estado, além de um apoio às classes burguesas; historiografia tradicionalista via a hipertrofia do Estado e a conseqüente corrupção do conceito de monarquia.
Mais peculiar do que as próprias questões levantadas sobre o período é a associação pessoal destas a Pombal (“ação pombalina ligada ao seu ódio anti-jesuítico”, “enfeitiçado pelo capitalismo”, “instrumento dos Iluministas” e um longo etc). Macedo se propõe, então, a estudar esta época a partir de uma óptica diferente, baseando-se em perspectivas objetivas, e não se apoiando na figura de Pombal.
Tendo em vista esta objetivo, Macedo utiliza dados numéricos que permitam a compreensão e interpretação da época, além da realização de uma integração da História econômica portuguesa com a européia e colonial. Coloca, então, em uma perspectiva evolutiva os 27 anos tipicamente unificados como período pombalino.
Macedo começa traçando um perfil de Portugal do período. No séc XVIII, a economia de Portugal constitui um todo econômico inseparável do Brasil, com movimentos de comercio também que convergiam da Índia e da África em direção a Lisboa (tabaco, açúcar, madeiras ouro e diamantes são os principais produtos). Havia também uma intensa atividade pirata e de contrabando (segundo o autor, por vezes mesmo estimulada por Portugal, uma vez que eram praticas mercantis freqüentes na época).
País de escassa exportação (sal e vinho, essencialmente) mas com ampla importação , possuía portos e comercio muito disputados - de onde era drenado o ouro brasileiro – principalmente por França e Inglaterra. Estes países, por sinal, possuíam também colônias e alianças político – econômicas com os grandes impérios coloniais de então (Espanha e Portugal, respectivamente).
O todo econômico Portugal-Brasil intervêm e sofre influencia dos acontecimentos em torno do Atlântico. Assim, Portugal, especificamente, está ligado as contingências econômicas do conjunto (criação de novas zonas produtivas em concorrência com as suas próprias afetavam diretamente o país). Embora até meados do séc XVIII a situação comercial de Portugal estivesse em relativa calma (abundancia do ouro brasileiro, exportações de vinho, tabaco e acucar em alta), começa a se desenrolar uma mudança de quadro (ao fim do reinado de D. João V), caracterizada por um enfraquecimento do Estado, aumento brutal do contrabando e queda sensível no movimento do porto de Lisboa (conforme observamos também em GODINHO, com queda da exportação de açúcar e grande concorrência enfrentada pelo vinho do Porto). O início da administração pombalina se dá, portanto, em um contexto de crise parcial da economia portuguesa.
Daí o reforço do papel do Estado (medidas protecionistas, monopólio etc) logo no início do reinado de D. José I. A preocupação, porém, é momentânea, e o conjunto de leis e decretos publicados neste período é logo esquecido. Este tipo de governo é típico do período pombalino, em que as circunstâncias do momento norteiam as políticas adotadas.
Macedo separa a época pombalina em 4 fases principais:
diz respeito a problemas comerciais e estaduais (protecionismo e reforço do Estado)
preocupações militares
reforço dos privilégios mercantis
predomínio da legislação industrial
Em todo o período, verifica-se uma ausência quase total da legislação agrária.
Na primeira fase, há um reforço do aparelho estatal (atacando pequenos privilégios) e a subseqüente criação das Companhias Privilegiadas de Comércio (companhias de capital acionário aberto e que deteriam o monopólio de certos mercados e produtos). Exemplos: Companhia do Grão-Pará e Maranhão, da Pesca da Baleia, da Agricultura dos Vinhos do Alto-Douro etc. Pequenos comerciantes são duramente atingidos (limitação do dinheiro disponível ao pequeno comércio por meio de regulamentação restrita dos empréstimos, direito do tabaco e açúcar reduzidos, preços de compra e frete fixados, alvarás tornam o pequeno comércio viageiro para o Brasil quase um contrabando etc). 
A instituição da Companhia da Agricultura dos Vinhos do Alto-Douro tem uma razão particular. Desde Methuen, os vinhos do Douro (região produtora do vinho do Porto) viam-se ameaçados por uma concorrência, na Inglaterra, de outros vinhos portugueses. Além deste fato, estava se desenvolvendo o comércio vinícola português com o Brasil. Por fim, nesta época se renova a produção francesa e espanhola, o que piora a situação do vinho do Porto.
O problema é que, pelo Tratado de Methuen, a produção de vinhos em outras regiões de Portugal se desenvolveu fortemente, e, por serem vinhos do mesmo país, um tratado de comércio não seria capaz de proteger determinada região de outra (como seria possível a proteção do vinho português perante o francês, por exemplo). Havia também a questão de falsificação devido ao menor preço das novas regiões produtoras. A companhia dos Vinhos do Alto-Douro, portanto, foi instituída em 1756 para proteger o vinho do Porto, especificamente, concedendo-lhe o privilégio de exportação (tem um efeito interno semelhante ao que Methuen teve no cenário externo). Macedo comenta, baseado nos argumentos acima, que, ao contrário do que muitos historiadores proclamam, a região do Douro sofreu uma diminuição do seu desenvolvimento com Methuen (devido à concorrência interna). Esta medida não é, pois, revolucionária, mas sim a expressão de um velho processo na luta comercial.
A criação das companhias de comércio com o Brasil, procurava-se manter com os acionistas os lucros do comércio que se encontravam ameaçados por uma numerosa pequena burguesia ( o objetivo das companhias é, portanto, interno). Diferentemente do alardeado, a política não visa o comércio estrangeiro (comparar com GODINHO) nem era adversária da Inglaterra (país politicamente necessário a Portugal). Apesar das críticas de Pombal a Londres, afirmações posteriores (“Portugal não tem outros inimigos que não sejam inimigos da Inglaterra”) compensam as opiniões negativas.
Macedo adverte, porém, que é errado pensar que a orientação pombalina é exclusivamente protecionista. Há uma libertação do comércio secundário (Goa com Moçambique, por exemplo), abastecedor do central, enquanto as vias principais são defendidas com privilégios. O Estado absoluto, portanto, intervêm interessadamente.
Assim, Macedo conclui que na primeira fase da administração pombalina:
a região vinícola do Douro foi protegida
bem como o grande comércio colonial
A partir da década de 1760, cria-se uma situação geral de crise decorrente da diminuição do influxo de ouro do Brasil e de demais produtos (açúcar, diamantes, mercado escravo etc, o que também se reflete nos lucros das Companhias de Comércio) compensadores do déficit português. A crise no ouro, entretanto, é a que tem reflexos mais expressivos, causando inclusive a diminuição acentuada de navios portugueses no movimento de Lisboa ( o porto perdia seu interesse como centro de contrabando, e, por conseqüência, de outras matérias exportáveis). 
A crise manifesta seus efeitos na diminuição da receita do Estado e na quebra generalizada em muitos ramos de comércio (aspecto social da crise) e, juntamente com a dificuldade de pagamentos internacionais e dificuldade de produção para exportação, caracteriza a segunda fase do governo pombalino.
Nesta época se coloca que o Marquês de Pombal teria sido o antecessor da “indústria” portuguesa (entre aspas, pois ele é anterior mesmo da Revolução Industrial Inglesa). A referência deve ser feita às técnicas então existentes, ou seja, manufatureiras e oficinais (principalmente).
A base do fomento industrial pombalino assenta-se numa realidade baseada na técnica tradicional (ou seja, já existente), oficinas dispersas pelas zonas rurais e centros urbanos e acumulados nas melhores regiões de matéria-primaou combustível. Assim era antes e com Pombal. Macedo atenta para o absurdo da afirmação de que, antes de Pombal, em Portugal existia um “deserto industrial”. Semelhante ignomínia provinha da aplicação NO SÉC XVIII da noção de indústria DO SÉC XIX. Entretanto, Macedo deixa claro que, dado que o fomento não partir de um deserto industrial nem constituiu uma revolução técnica de qualquer natureza, ele só pode ter surgido da evidência de que a crise do ouro e da produção colonial obrigava a produção industrial a tentar diminuir a importação estrangeira. Assim se caracteriza (pelo fomento industrial) a terceira fase da administração pombalina.
Conclusões: 80% das oficinas pombalinas foram criadas após 1770, protegidas com isenção de impostos, monopólio, saída livre de produtos, entrada livre de matérias-primas etc. 
Dado que a maioria das oficinas montadas nas cidades era para supri-las de produtos nacionais, estas desapareceram com o fim da crise.
Constata-se uma real falta de sistematização, o que caracteriza um fomento assente na realidade concreta e corrente da época, feito para as suas necessidades, num país em crise econômica. 
Macedo conclui criticando a visão de que “Pombal teve uma época sua”. Na realidade, Pombal foi um estadista que pertenceu à sua época, ao Estado a que serviu, aos grupos de que dependeu, ao ambiente histórico que o criou e orientou...compreendeu e tentou fazer face a alguns problemas que sua pátria enfrentou.

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