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Economia Brasileira Bruna Mara da Silva Wargas © 2019 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. Presidência Rodrigo Galindo Vice-Presidência de Produto, Gestão e Expansão Julia Gonçalves Vice-Presidência Acadêmica Marcos Lemos Diretoria de Produção e Responsabilidade Social Camilla Veiga Gerência Editorial Fernanda Migliorança Editoração Gráfica e Eletrônica Renata Galdino Supervisão da Disciplina Vaine Fermoseli Vilga Revisão Técnica Vaine Fermoseli Vilga Thamiris Mantovani CRB-8/9491 2019 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Wargas, Bruna Mara da Silva W274e Economia brasileira / Bruna Mara da Silva Wargas. – Londrina : Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2019. 208 p. ISBN 978-85-522-1591-2 1. História. 2. Economia. 3. Brasil. I. Wargas, Bruna Mara da Silva. II. Título. CDD 330 Sumário Unidade 1 Formação da economia brasileira ............................................................... 7 Seção 1 Formação da economia no período colonial ......................... 9 Seção 2 Da economia cafeeira à industrialização .......................................26 Seção 3 Da crise dos anos 1930 à conquista dos direitos trabalhistas .....40 Unidade 2 Do nacional desenvolvimentismo à crise dos anos 1980 .......................59 Seção 1 Fase nacionalista de Getúlio e o desenvolvimentismo ................61 Seção 2 Reformas estruturais e o milagre econômico ...............................75 Seção 3 A crise da dívida externa .................................................................90 Unidade 3 Os planos de estabilização dos anos 1980 e os anos 1990 ...................107 Seção 1 Planos de estabilização econômica dos anos 1980 ....................109 Seção 2 Abertura comercial e financeira e o início dos anos 1990 ........123 Seção 3 Do Plano Real à manutenção das políticas neoliberais ............137 Unidade 4 Reflexões sobre questões estruturais da economia brasileira nos anos 2000 ............................................................................................157 Seção 1 Governo Lula..................................................................................159 Seção 2 Governo Dilma ..............................................................................174 Seção 3 Governo Temer ..............................................................................188 Palavras do autor Nesta disciplina vamos explorar a história econômica do Brasil do período colonial até os dias de hoje. Apesar de muitos estudantes não gostarem de história e nem mesmo de economia, conhecer o processo de formação da economia brasileira nos proporciona um maior entendimento em relação ao presente de nosso país. Vamos estudar as experiências brasileiras referentes ao processo de colonização portuguesa e à ocupação territorial; os ciclos econômicos; o modelo de exploração da colônia; o surgimento da indústria e o papel do estado brasileiro nesses processos. A nossa reflexão pretende retratar não apenas a formação de uma economia mas também de uma sociedade com grande miscigenação de povos indígenas, portugueses, africanos entre outros que chegaram ao Brasil para construir sua própria história. Como em todo processo de formação, veremos que algumas iniciativas foram bem-sucedidas, enquanto outras foram um completo fracasso, sendo que tudo isso refletiu na configuração atual de nossa economia. Podemos pensar em vários exemplos dessa influência histórica na economia brasi- leira atual, como a pauta de exportações bastante atrelada às commodities, a concentração fundiária, as desigualdades regionais e as problemáticas sociais. O objetivo deste material é proporcionar a você um amplo conhecimento sobre a trajetória da economia brasileira e sobre as questões atuais, além de abordar os impactos da economia do país sobre sua vida, suas decisões e sua carreira. Para atingir esse propósito, o livro está estruturado em 4 unidades: na Unidade 1, falaremos sobre a formação da economia brasileira (veremos os ciclos do açúcar, do ouro e do café, além das bases para o processo de industrialização nacional); na Unidade 2, a nossa abordagem compreenderá o período do nacional desenvolvimentismo à crise dos anos 1980 (momento em que estudaremos a política desenvolvimentista do governo JK e o Plano de Metas, as reformas dos anos 1960, o milagre econômico nos anos 1970 e a crise dos anos 1980); na Unidade 3, os planos de estabilização dos anos 1980 e os anos 1990 (em que percorreremos os planos Cruzado, Bresser e Verão, os processos de abertura comercial e financeira da economia, além do Plano Real e o Governo FHC). Para finalizar, na Unidade 4 faremos reflexões sobre questões estruturais da economia brasileira nos anos 2000, abordando o governo Lula e as políticas econômicas e sociais do período, o governo Dilma e o choque recessivo, o processo de impeachment e as reformas no governo Temer. Bons estudos! Unidade 1 Bruna Mara da Silva Wargas Formação da economia brasileira Convite ao estudo Você já parou para pensar como a economia brasileira foi formada desde o período colonial? Será que essa história iniciada há mais de 500 anos ainda impacta a estrutura da economia brasileira nos dias de hoje? As respostas para algumas perguntas similares a essas poderão ser encontradas na Unidade 1. Na primeira seção, temos em destaque a economia colonial, com duas principais fases: a primeira, com a formação da empresa colonial agrícola açucareira na região Nordeste, baseada em grandes propriedades produtoras, mão de obra escrava e voltada para a exportação; e a segunda, o ciclo do ouro, mostrará uma nova nuance da colonização com um processo de interiorização, estimulado pela coroa portuguesa com o intuito de encon- trar metais preciosos. Esse ciclo aurífero proporcionará maior movimen- tação de renda na economia interna, a aceleração da urbanização e o surgi- mento de um mercado consumidor, fazendo com que a sociedade brasileira ganhe alguns contornos de sua diversidade, devido à convivência de portu- gueses, escravos africanos e os nativos indígenas, sendo que, no período da mineração, ocorrerá um elevado crescimento populacional. Na segunda seção, após o declínio da mineração, veremos como emergirá a economia cafeeira que irá delinear uma nova dinâmica para a economia brasileira (do ponto de vista de estrutura, mão de obra e capitais), o que culminará no estímulo à formação de uma incipiente indústria nacional. Na última seção desta unidade, serão abordadas as políticas dos governos Vargas e Dutra, de incentivo à industrialização do país, além das reestruturações normativas com o estabelecimento da legislação trabalhista. Para nos auxiliar na missão de compreender este processo de formação da economia brasileira, vamos contar com o Sr. Afonso, um funcionário de uma renomada universidade brasileira, que está catalogando as obras doadas de um acervo que pertencia ao Sr. Francisco Gonçalves Santiago, um escritor brasileiro descendente de portugueses, que guardava um tesouro familiar: cartas e documentos de seus antepassados que contam passagens de suas vidas em vários momentos da história do país. Com esses relatos, você será levado a conhecer o processo de formação da economianacional passando pelos seus ciclos na era colonial, compreen- dendo os impactos para a atual configuração da economia brasileira e suas problemáticas, como uma indústria altamente dependente do ponto de vista tecnológico, a pauta de exportações concentrada em commodities (café, soja, minério de ferro entre outros), as desigualdade de desenvolvimento entre as regiões, além da elevada carga tributária. 9 Seção 1 Formação da economia no período colonial Diálogo aberto Você já parou para pensar que nos dias de hoje realizamos transações de compra e venda de bens e serviços com apenas um toque no celular ou com um cartão bancário? Essa operacionalização digital também pode ser feita para o pagamento de tributos ao governo, no entanto, no período colonial, as coisas funcionavam de maneira um pouco diferente, já que o fluxo de moedas ainda era bastante escasso, as trocas entre mercadorias (escambo) eram comuns, e a cobrança de impostos ainda estava sendo organizada, com a marcação do ouro e o recolhimento dos impostos nesse processo. Para entendermos esse e outros assuntos econômicos que estavam presentes no Brasil colonial, vamos conhecer o processo de colonização do país e os ciclos econômicos do açúcar e do ouro. A fim de assimilarmos o conteúdo desta seção, o Sr. Afonso, personagem do nosso contexto de apren- dizagem, irá nos auxiliar com uma descoberta importante sobre o material que está catalogando. Na primeira carta que Afonso estuda para a catalogação do acervo doado por Francisco, ele encontra os relatos de José de Oliveira Santiago, um funcio- nário da coroa portuguesa enviado ao Brasil para auxiliar no processo de estabelecimento da cobrança de impostos sobre a produção de ouro. Dom João V, rei de Portugal, observava muitas falhas no processo e almejava aumentar a arrecadação da coroa. Diante disso, ele estabeleceu uma legislação mais dura para conter os desvios. José relata que chegou ao Brasil acompanhado de sua esposa Ana e seus três filhos: Manoel, Pedro e Joaquim. Ao se estabelecer em Vila Rica, encontrou uma cidade sem infraestrutura e com um grande fluxo populacional de escravos, migrantes de outras regiões do país e imigrantes portugueses. Nesse ambiente, José tem como objetivo auxiliar a organização das Casas de Fundição que eram responsáveis pela pesagem, marcação do ouro e a cobrança do Quinto (o imposto arrecadado para a coroa portuguesa, corres- pondente a 20% de todo o ouro extraído). As dificuldades encontradas por José para a cobrança do Quinto eram provenientes da sonegação de impostos, que ocorria por meio da ocultação de parte da produção. Isso o deixava bastante nervoso, o que era perceptível nos relatos que fazia sobre as revoltas sociais decorrentes da cobrança do tributo. Nesse ponto, Afonso se questiona: se o Brasil gerava tanto ouro dentro de sua economia durante o final do século XVI e meados do século XVIII, por quais motivos não conseguiu desenvolver a 10 manufatura na sua economia? Naquela época, será que os problemas finan- ceiros da metrópole (Portugal) afetaram essa situação? Para que você entenda como essas coisas aconteceram, estudaremos conceitos importantes sobre o fluxo de recursos internos no ciclo do ouro, o tratado de Methuen e seus desdobramentos para Portugal e para o Brasil, compreendendo, assim, o processo de formação da economia colonial. Prepare-se para a aula lendo o material de forma reflexiva e crítica, questionando os desdobramentos dos ciclos do açúcar e do ouro para a formação de nossa economia. Boa leitura! Não pode faltar Neste momento, compreender o processo de formação da nossa economia, proporcionará a você um maior domínio sobre as questões que afligem a economia brasileira nos dias de hoje. Para tanto, iniciaremos a discussão relembrando conceitos sobre o processo de colonização que, em diferentes momentos de sua trajetória estudantil, foram abordados no contexto histó- rico brasileiro. Inicialmente vamos analisar as transformações econômicas e sociais que ocorreram no continente europeu para compreendermos, na sequência, como o processo de colonização do Brasil foi delineado a partir desses movimentos. No final da Idade Média, os alguns acontecimentos alteraram modo de produção na Europa, que deixou de ser um modelo fechado, baseado na produção de subsistência e norteado por dogmas da ética pater- nalista cristã, passando a ser um sistema arraigado nos movimentos comer- ciais, com uma nova configuração econômica pautada nas relações de trocas econômicas e na acumulação primitiva de capitais. Isso foi um marco de transição para uma nova e revolucionária forma de organização econômica, política e social: o sistema capitalista. A transição do sistema feudal para o mercantilismo retrata uma mudança de paradigma. No sistema feudal, a forma como a sociedade se organizava estava pautada em um sistema estático, dividido em três grandes grupos, sendo o primeiro o topo da estrutura social e o último, a base: clero, nobreza e os servos. Nessa época, a ética paternalista cristã determinava como era a relação entre as camadas da sociedade, defendendo a obediência servil como uma retribuição ao senhor pela proteção e subsistência que proporcionava a todos. Dentro desse sistema, os dogmas prevalecentes eram contrários às trocas comerciais, à cobrança de juros e à busca por lucratividade, exaltando a 11 produção da terra. No entanto, com o esgotamento do modelo, devido à estag- nação de técnicas agrícolas e ao aumento populacional, ocorreram crises de abastecimento, colaborando para a ascensão da burguesia, o que impulsionou as relações comerciais nos centros urbanos (HUNT; SHERMAN, 1996). Diante disso, emergiu um sistema de transição até o sistema capitalista (que nos interessa nessa seção): o mercantilismo, que objetivava as trocas comerciais e a incessante busca por metais preciosos que auxiliaria as nações europeias a manterem suas relações comerciais e suas formas de defesa e expansão territorial. Nesse ínterim, grandes nações iniciaram uma jornada por novos territó- rios, por novas rotas comerciais e por metais preciosos. Portugal e Espanha despontaram para as grandes navegações, sendo que os portugueses reuniam condições favoráveis para o empreendimento devido à centralização da monar- quia, ao fortalecimento da burguesia e a uma posição geográfica privilegiada. Assimile Em 1492, a Espanha chegou à América. Na sequência, em 1494, Portugal e Espanha estabeleceram o Tratado de Tordesilhas, dividindo, por meio de uma linha imaginária, que passaria a 370 léguas a oeste do arqui‐ pélago de Cabo Verde, as terras a serem descobertas por essas duas nações. Assim, as terras a oeste dessa linha imaginária pertenceriam à Espanha e aquelas situados à leste seriam de Portugal. Na Figura 1.1, é possível visualizar essa divisão dos territórios pelo tratado. Figura 1.1 | Tratado de Tordesilhas e a distribuição das terras entre Portugal e Es- panha Fonte: https://santarosadeviterbo.files.wordpress.com/2013/03/tratado-de-tordesilhas-mapa. jpg. Acesso em: 10 jun. 2019. https://santarosadeviterbo.files.wordpress.com/2013/03/tratado-de-tordesilhas-mapa.jpg https://santarosadeviterbo.files.wordpress.com/2013/03/tratado-de-tordesilhas-mapa.jpg 12 Vale lembrar que Portugal chegou ao Brasil em 1500 e, como inicialmente não foram encontrados metais preciosos ou produtos coloniais para explo- ração, foi iniciada a exploração de recursos naturais nas terras tupiniquins que pudessem ser comercializados na Europa. O pau-brasil, uma madeira nobre com relevante valor comercial no continente europeu, foi um dos produtos expoentes no período inicial da colonização. Assimile No processo de colonização dos territórios da América portuguesa e da América espanhola existia a questão do Pacto Colonial, que consistia no exclusivo metropolitano sobre as relações comerciais das colônias. Segundo esse acordo, a colônia tinha por objetivo exclusivo fornecermatérias-primas para a metrópole e adquirir produtos manufaturados apenas da metrópole. O objetivo era manter a relação de dependência da colônia com a metrópole. A ocupação do território brasileiro era uma das prioridades do governo português para evitar possíveis invasões de outras nações, por isso, como forma de ocupação, de organização administrativa e de controle das terras, foram estabelecidas as capitanias hereditárias. O sistema não foi tão bem-su- cedido, sendo que as capitanias de São Vicente e de Pernambuco foram as que obtiveram o maior êxito do ponto de vista econômico e territorial, devido aos modelos econômicos estabelecidos nas regiões, dos quais trataremos a seguir. Os fatores que dificultaram o êxito das outras regiões foram: a grande extensão territorial para administrar, a baixa disponibilidade de recursos econômicos, a dificuldade de comunicação com as demais regiões e com a metrópole, além dos ataques indígenas. Saiba Mais O objetivo de Portugal com o estabelecimento das capitanias hereditá‐ rias era a ocupação do território. As terras da colônia foram divididas em 15 capitanias e destinadas a 12 donatários, em geral nobres da corte portuguesa. Esse modo de organização administrativa da colônia foi implementado por Portugal em 1534. Os donatários deveriam colonizar, proteger e administrar os territórios, vitaliciamente, e seus descentes (por isso, o termo “hereditária”) poderiam continuar com a propriedade e explorar os recursos naturais. Os retornos financeiros aguardados pela coroa portuguesa não corres- ponderam às expectativas iniciais, pois os metais preciosos encontrados nas 13 colônias espanholas não foram, inicialmente, achados no território brasileiro. Dessa forma, passou-se a buscar um modelo de exploração para o território que pudesse sustentar os gastos com a colonização e levantar recursos para a coroa. A partir desses pressupostos e da experiência prévia portuguesa com o cultivo da cana de açúcar nas Ilhas do Atlântico, iniciou-se a montagem do complexo açucareiro no Nordeste, pois o produto ainda era bastante escasso no mundo e tinha um valor econômico elevado na Europa, o que permitiria o alcance de lucros vultuosos. Assim, o complexo açucareiro se pautou em um modelo com baixos custos e alta rentabilidade, tendo sido construído sobre o sistema agrícola do plantation, que é um estilo de produção de uma única cultura intensa, culti- vada em grandes propriedades e com mão de obra predominantemente escrava. Reflita Desde o início de nossa história, o plantation delineou a formação do setor agrícola no país a partir de grandes latifúndios, que eram culti‐ vados por um enorme contingente de trabalhadores rurais que não tinham acesso à terra. Segundo um estudo recente da Oxfam, uma confederação global que tem como objetivo combater a pobreza, as desigualdades e as injustiças em todo o mundo; no Brasil menos de 1% dos proprietários agrícolas possui 45% da área rural do país (OXFAM, [s.d.]). Será que essa concentração de terra atual é parte de uma herança histórica do plantation? Reflita sobre o assunto. É importante dizer que, inicialmente, a mão de obra indígena foi empre- gada nesse modelo produtivo, mas esse tipo de produção fracassou, pois os indígenas eram muito suscetíveis a doenças trazidas pelos europeus, como a gripe, o sarampo e a varíola. Além disso, não se acostumavam com o trabalho intensivo, já que, culturalmente, faziam apenas o necessário (caça, pesca e coleta) para sobreviverem; estavam nos planos de catequese dos jesuítas, o que gerava uma contradição de interesses entre os colonizadores e os missio- nários cristãos; eram resistentes e guerreavam, fugindo para locais de difícil acesso. Por conta disso, a mão de obra escrava negra passou a ganhar espaço, sendo adotada em massa na produção açucareira do Brasil. Assimile Em decorrência das guerras e do episódio da peste bubônica (que dizimou um grande contingente populacional), Portugal não tinha uma população muito numerosa, o que dificultou a imigração de trabalhadores livres para o complexo açucareiro. Assim, esse fato, em conjunto com outros fatores, fortaleceu o uso da mão de obra escrava no ciclo do açúcar. 14 Um detalhe importante da produção açucareira ter sido realizada na região Nordeste é que este é o ponto mais próximo entre a colônia e os continentes africano e europeu (o que facilitava e barateava a importação de escravos, bem como a própria exportação do açúcar), além de possuir clima tropical e terras férteis (que são ideais para esse tipo de cultivo). Vale destacar também que a Holanda foi o principal financiador da produção açucareira, com grandes investimentos na atividade, que envolviam o aparelhamento dos engenhos, a questão do refino do açúcar e da comer- cialização na Europa. Note que este será um ponto chave para o declínio da produção, em decorrência das questões políticas que envolveram Portugal, Espanha e Holanda. Saiba Mais O complexo açucareiro foi bastante rentável, gerando um fluxo elevado de recursos para Portugal. Isso pode ser confirmado pela rapidez da expansão do número de engenhos e escravos na região. Para se ter uma ideia, o primeiro engenho foi estabelecido em Pernambuco, em 1539. Ao final do século já haviam sido construídos 120 engenhos e 20 mil escravos estavam trabalhando nas lavouras (FURTADO, 1989). O fluxo de recursos financeiros na economia açucareira estava forte- mente concentrado nas mãos dos proprietários dos engenhos e a maior parte destes recursos não circulou na economia interna, sendo a maior parte deles utilizados para importações de produtos da própria metrópole, o que nos remete ao Pacto Colonial. Como não havia movimentação de recursos para o pagamento dos trabalhadores, pois, em sua maioria, eram escravos, estima-se que apenas 10% da riqueza gerada pela exportação do açúcar circulou pela economia da colônia. Esse quadro não permitiu que um mercado interno se desenvolvesse a partir desta atividade econômica (FURTADO, 1989). Atenção É importante que façamos uma análise sobre a sociedade brasileira que estava se formando. Darcy Ribeiro, em seu livro O Povo Brasileiro retrata o cenário social da época, dizendo que Ao lado da casa‐grande, contrastando com seu conforto ostentatório, estava a senzala, constituída de choças onde os escravos viviam uma existência subumana, que só se tornava visível porque eles eram 15 os escravos. Da casa-grande, com a figura do senhor, da sinhá, das sinhazinhas e suas mucamas, temos descrições as mais expressivas e nostálgicas de uma antropologia que sempre focalizou o engenho através dos olhos do dono. Dos brancos pobres e dos mestiços livres, engajados como empregados, mascates e técnicos, assim como do submundo dos escravos do eito não contamos, ainda, com reconstituições fidedignas e, menos ainda, com uma perspectiva adequada de interpretação. (RIBEIRO, 1995, p. 283) A partir dessa descrição, percebe-se que, desde o início da colonização brasileira, temos traços de uma sociedade baseada na desigualdade, na concentração de renda e na exclusão de parte da população. Antes de tratarmos do declínio do modelo açucareiro, vamos falar sobre o papel da pecuária no Nordeste. A pecuária se destacou no complexo nordestino, sendo acessória à produção açucareira. Os trabalhadores envol- vidos nessa atividade eram homens brancos livres e com baixos recursos. Eles proviam os animais necessários para os engenhos, que eram usados na produção, na alimentação da população e na extração de couro. A pecuária não necessitava de grandes investimentos de capital, pois a própria reprodução do rebanho subsidiava a produção. Além disso, por ser extensiva e itinerante, com a expansão da atividade açucareira, houve o aumento das áreas produ- toras, o que, consequentemente, gerou um conflito entre a área de plantio da cana-de-açúcar e a área criatória; levando o governo português a proibir, em determinado momento, a pecuáriana região litorânea. Note que tanto essa proibição como a própria característica da pecuária na região impulsionaram a interiorização do território, expandindo a ocupação para os sertões. Atenção No século XVII, além dessa ocupação de terras no interior do Nordeste, houve o início da conquista da região amazônica, devido à exploração das drogas do sertão (ervas medicinais, cravo, pimenta, castanhas e guaraná). A questão da pecuária foi importante como atividade auxiliar do complexo açucareiro, no entanto, cabe salientar que a economia açucareira dependia de dois grandes fatores externos: a mão de obra escrava e a importação dos equipamentos necessários para a produção. Dessa maneira, o ponto chave para a ascensão e posterior queda da lucratividade do complexo foi o papel dos holandeses. Assim, 16 (...) no terceiro quartel do século XVII, essa prosperidade e bons lucros da economia açucareira sofreriam com a redução pela metade dos preços do açúcar no mercado externo. Mas, por qual motivo isso aconteceu? A colônia brasileira perdeu o monopólio de produção com a entrada das Antilhas nesse mercado, que contaram com a ajuda técnica e financeira dos holandeses que, de parceiros, se tornariam concorrentes. Vamos entender como essa relação se inverteu? Entre 1580 e 1640 Portugal e Espanha estiveram reunidos e os holandeses estavam em luta constante com a Espanha. Por isso, eles passaram a ocupar muitos trechos da colônia, usufruindo de uma parcela dos lucros do comércio do açúcar. Em 1630, eles instalaram-se em Pernambuco, de onde se estendiam ao sul, até Alagoas, e para o Norte, até o Maranhão. Portugal depois de restaurar sua independência política em relação à Espanha, com quem esteve reunida entre 1580 a 1640, conseguiu expulsar os holandeses do Nordeste, em 1654. Com a expulsão, eles começaram a se empenhar para criar outro núcleo de produção do açúcar, pois já detinham conheci‐ mentos sobre os aspectos técnicos e organizacionais dessa produção. Depois de menos de um decênio da expulsão, já operava nas Antilhas, uma produção açucareira com equipamentos novos, financiados por poderosos grupos financeiros holandeses (FONSECA; BENELI, 2017, p. 19-20). O resultado da concorrência da produção holandesa nas Antilhas e a redução dos preços, foi o atrofiamento do complexo econômico da região Nordeste, levando a produção açucareira a ser mantida em escala reduzida graças aos baixos custos de manutenção do sistema (FURTADO, 1989). Como desdobramento dessa modificação na atratividade da região Nordeste, podemos perceber que esse processo explicou tanto a grande migração populacional para as regiões Sudeste e Sul do país, em vários momentos históricos, como os problemas econômicos e sociais que marcam a região Nordeste até dias de hoje. Atenção As transições entre os ciclos econômicos não foram movimentos rápidos, foram processos de formação complexos, pautados no atrofiamento dos 17 rendimentos do modelo anterior e acompanhados de fluxos migratórios tanto da mão da obra escrava como a chegada de imigrantes europeus. Para compreender a contração econômica do complexo açucareiro e o desenvolvimento das condições para a mudança no eixo dinâmico da economia colonial, é primordial conhecer um pouco da situação de Portugal no período. A redução da rentabilidade da colônia, o aumento nos custos de manutenção e a perda de colônias no Oriente e na África levaram Portugal a uma crise econômica. No esforço de encontrar uma alternativa para esse problema, iniciou-se um processo de incentivo à interiorização e à ocupação do território brasileiro, com o intuito de se buscar metais preciosos e, conse- quentemente, um novo motor econômico para a colônia. Nesse sentido, alguns atores serão preponderantes para o processo de expansão territorial e a consequente descoberta de ouro em Minas (FURTADO, 1989). Saiba mais Você sabia que os bandeirantes percorriam o sertão aprisionando indígenas e escravos em fuga, além de buscar os metais preciosos? Existiam três movimentos dentro das bandeiras: de apresamento, serta‐ nismo de contrato e prospecção. Além disso, havia o movimento oficial liderado pela coroa portuguesa, as entradas, que eram expedições armadas de caráter oficial realizadas para mapear o interior da colônia e expulsar estrangeiros que invadiram o território. As expedições eram compostas por soldados portugueses e brasileiros e tiveram um papel importante na expansão territorial no período colonial, sendo que o Tratado de Madri (1750), acordado entre Portugal e Espanha, deter‐ minou que a posse do território ocorreria a partir da ocupação “uti possidetis” (ou seja, o território é de quem nele habita). Assim, note que o tratado será um ponto chave para delinear os novos limites territoriais. No Brasil, a descoberta da primeira jazida de ouro foi creditada (por alguns pesquisadores) ao bandeirante Antônio Rodrigo Arzão, por volta de 1693 em Minas Gerais. O modo de extração desse minério se pautou em dois formatos: a faiscação (ouro obtido pela peneiração do fundo dos rios, sendo realizada individualmente pelo trabalho do próprio garimpeiro) e as lavras (ouro obtido em minas fixas, maiores, que demandavam investimentos em equipamentos e grande quantidade de mão de obra escrava). Com o crescimento da exploração do ouro, a coroa portuguesa iniciou um processo de organização administrativa da região das Minas Gerais, 18 com a implantação da Intendência de Minas em 1702, um órgão criado pela metrópole que fiscalizava, controlava e facilitava a arrecadação de impostos sobre o ouro. Na sequência, foram implantadas as casas de fundição, para onde os mineradores deveriam levar todo o ouro encontrado, para que ele fosse transformado em barras, facilitando a cobrança do imposto. Nesse quesito, a organização tributária da época estava pautada, princi- palmente, na cobrança do Quinto, um imposto que consistia na arrecadação de 20% da produção aurífera. No entanto, havia outros impostos acessórios, entre eles, a cobrança da capitação, que era a taxação fixa paga por cada escravo, maior que 12 anos, que trabalhasse na lavra. Fazendo uma relação com o nosso contexto de aprendizagem, é exatamente neste momento histó- rico que o nosso personagem José chega ao Brasil para promover a organi- zação do sistema para a cobrança dos impostos. Reflita Os ciclos do açúcar e do ouro foram importantes para delinear a economia brasileira, tendo sido construídos com semelhanças e diferenças. Com relação ao modo de produção, à geração do fluxo de riquezas interna e externa e à mão de obra utilizada, quais foram as semelhanças e diferenças vistas nesses dois ciclos? Diferentemente do ciclo do açúcar, o ciclo do ouro desenvolveu um mercado consumidor interno no Brasil. Como a mineração de aluvião era de fácil extração e demandava poucos recursos e ferramentas, os próprios escravos trabalhavam, em parte do tempo, por conta própria e poderiam comprar sua liberdade. Além disso, muitos portugueses menos abastados foram atraídos a migrar para o Brasil em busca de ouro. Assim, temos um quadro de maior mobilidade social. Exemplificando A migração populacional interna no Brasil (causada pela busca de um minério) não ficou restrita ao período colonial, já que várias regiões se tornaram locais de atração ou repulsão populacional, devido à busca de oportunidades de enriquecimento e de melhoria nas condições de vida. O caso da cidade de Curionópolis no Estado do Pará é um exemplo disso, pois a famosa Serra Pelada é um distrito desse município, que presenciou nos anos de 1980 uma corrida pelo ouro. Por conta disso, até o ano de 1983, cerca de 80 mil garimpeiros já haviam chegado ao povoado, em sua maioria provenientes da Região Nordeste (SOUZA, 2017). A região produziu dezenas de toneladas de ouro entre 1980 e 1990 (MATHIS, 1995). 19 A extração do ouro de superfície (aluvião) foi ficando escassa ao longo dos anos, e medidas como a utilizaçãodo mercúrio para conseguir extrair o minério foram utilizadas e geraram impactos para o meio ambiente (MATHIS, 1995). Nos últimos anos, retomou-se o debate sobre a volta da exploração do ouro em Serra Pelada, que, se realmente acontecer, pode gerar muitos recursos financeiros para a população e governo locais, além de uma nova avalanche de pessoas para lá (SOUZA, 2017). Qual seria, então, a consequência dessa elevada migração para a região? Houve um grande crescimento populacional no período e, no início, ocorreram algumas crises de escassez de gêneros de subsistência e, consequentemente, a fome. Com o passar do tempo, alguns produtores iniciaram o cultivo de roças de subsistência, além da diversificação de produtos provenientes de outras regiões da colônia. Assim como na economia açucareira, a atividade pecuária foi impulsionada, estando voltada para a questão da alimentação e do trans- porte (com o uso de mulas) para o escoamento da produção. Nessa produção, além dos animais que já eram criados no sertão nordestino, a região Sul da colônia passou a ganhar destaque com esse mesmo mercado. Dessa forma, pouco a pouco, foi ocorrendo uma maior interdependência entre as regiões com a criação do gado, o processo de engorda e a distribuição de produtos no mercado no mercado mineiro, trazendo, como resultado, o desenvolvimento de um mercado interno mais robusto, que fazia o dinheiro circular dentro do próprio território brasileiro (isso também acontecia por conta de uma dificul- dade maior em importar mercadorias, já que as pessoas estavam deixando as regiões litorâneas em busca de ouro no interior do Brasil). Vale destacar também que, apesar de ter havido um crescimento do mercado interno, a economia mineira não difundiu efeitos econômicos importantes que conse- guissem alavancar atividades manufatureiras (sem contar que isso também foi resultado de uma incapacidade técnica dos imigrantes para iniciar essas ativi- dades manufatureiras, já que, em Portugal, o desenvolvimento manufatureiro foi destruído pelo Tratado de Methuen). Assim, antes de seguir com os desdobramentos do ciclo do ouro para a economia brasileira, é importante falarmos um pouco sobre o Tratado Methuen. Esse acordo entre Portugal e Inglaterra foi firmado em 1703 e esteve em vigor até 1842 e consistia em uma aliança comercial entre Portugal e Inglaterra, em que Portugal importaria produtos têxteis apenas da Inglaterra e, em contrapartida, a Inglaterra importaria vinhos de Portugal. Apesar de parecer que o Tratado traria benefícios para os dois países envol- vidos, as trocas se mostraram muito desvantajosas para Portugal, pois impor- tava muito mais tecidos do que exportava vinhos, o que forçou a transfe- rência (para cobrir esse saldo negativo) de boa parte do ouro proveniente do 20 Brasil para a Inglaterra (que o utilizou, inclusive, para o impulsionamento da Revolução Industrial). Isso inibiu o desenvolvimento manufatureiro em Portugal e, consequentemente, em sua colônia americana. Mais adiante, a questão da industrialização brasileira será abordada detalhadamente, mas não deixe de notar que esse acordo também refletirá no desenvolvimento tardio da indústria no país. Depois de quase meio século de exploração das minas de ouro, o auge da produção foi alcançado em 1754 (FURTADO, 1989), mas, a partir de então, a produção caiu e dava sinais de esgotamento. A queda da produtividade gerou uma serie de pressões da coroa portuguesa com relação à cobrança de impostos. A revolta dos colonos com a cobrança excessiva de impostos e o confisco de bens pela coroa trouxe conflitos que culminaram no movimento da Inconfidência Mineira. Reflita A cobrança do Quinto, imposto que retinha 20% de todo o ouro extraído no Brasil, era tão detestada pelos brasileiros que gerou a expressão “O Quinto dos Infernos” (LUNELI, [s.d.]). Para fugir dessa alta tributação, muitas pessoas tentavam sonegar impostos escondendo o ouro, sendo que uma dessas técnicas gerou outra expressão popular muito usada ainda nos dias de hoje: “santo do pau oco”, pois as pessoas escondiam ouro no interior de imagens sacras ocas (LUNELI, [s.d.]). Esse nível de tributação indignava tanto os brasileiros, que culminou no processo da Inconfidência Mineira. Recentemente, o Ministro da Fazenda, Paulo Guedes, declarou que uma tributação como a que o Brasil tem hoje (os brasileiros pagam mais de 30% de tributo sobre tudo o que é produzido no país), deixa o país numa posição mais complicada do que a do “Quinto dos Infernos” (EUSÉBIO, 2019). A alta tributação faz com que muitas pessoas tentem sonegar impostos, em um conceito econômico conhecido como Curva de Laffer, que relaciona a porcentagem de impostos cobrados com a arrecadação tributária do governo, mostrando que, a partir de um certo ponto, se as alíquotas dos tributos aumentarem, a arrecadação tributária não vai aumentar na mesma proporção, já que as pessoas tentariam sonegar mais imposto porque não conseguiriam pagar aquele volume de tributos. Por qual motivo, a tributação atual no Brasil é tão alta? Esse peso tributário que cada contribuinte precisa arcar no país poderia gerar movimentos de revolta parecidos com a Inconfidência Mineira? Reflita sobre o assunto. 21 Com o motor dinâmico da economia colonial em baixa, houve uma crise na economia mineira e um respectivo atrofiamento econômico devido aos movimentos de migração para outras regiões da colônia. Nesse ponto, você pode estar se perguntando: mas, quais foram os legados deixados pelo ciclo do ouro no Brasil? Primeiramente, houve o desloca- mento do centro dinâmico da economia brasileira do Nordeste para a região Sudeste, saindo do litoral para o interior. Além disso, a capital brasileira sai de Salvador e é fixada no Rio de Janeiro, havendo também o surgimento de um mercado consumidor interno e a criação de um sistema de transportes entre o interior e o litoral, que promoveu uma maior integração entre algumas regiões. Percebe-se, de forma adicional, um elevado aumento populacional, uma maior fiscalização por parte da coroa portuguesa e o início do processo de urbanização. No quesito renda, nota-se que esteve menos concentrada. Assim, diferentemente do complexo açucareiro, que mesmo em um processo de atrofiamento continuou com uma produção reduzida (devido aos baixos custos), o ciclo da mineração trouxe uma desconstrução da estrutura da economia brasileira que vigorava até aquele momento. A crise do sistema colonial estava estabelecida, intensificando o conflito entre as elites locais (que se formaram no período) e a metrópole, sendo que os principais focos do embate eram o pacto colonial, as restrições que se colocavam para as relações com outros países e a alta tributação. Para fechar a seção, podemos concluir que a principal característica da economia colonial estava no seu caráter dependente, em especial, dos movimentos da metrópole e do mercado externo. A colônia tinha um desen- volvimento centrado na produção primária e na extração de recursos naturais, o que a deixava em uma situação de grande vulnerabilidade em relação aos movimentos externos. Além disso, o período foi marcado pela ausência do desenvolvimento industrial, que poderia se tornar uma alternativa econô- mica que proporcionasse uma maior independência. Do ponto de vista social, tem-se uma grande diversidade e miscigenação se formando, com a interação entre indígenas, portugueses e escravos africanos, em uma sociedade que distribuía os recursos gerados de maneira desigual. Pesquise mais No livro Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda (1936), o autor retrata as características da sociedade brasileira trazendo algumas carac‐ terísticas da própria sociedade portuguesa que delineiam o que ele chamou de “Homem Cordial”. Trata‐se de uma importante leitura para compreender as raízes de nossa sociedade, especialmente, o capítulo 5. 22 Sem medo de errar A situação-problema retratou o ciclo do ouro e a estruturade arreca- dação de impostos e tributos organizada pela coroa portuguesa. Ao ler a carta escrita por José de Oliveira Santiago, Afonso se questionou: se o Brasil gerava tanto ouro dentro de sua economia durante o final do século XVI e meados do século XVIII, por quais motivos não conseguiu desenvolver a manufa- tura na sua economia? Naquela época, será que os problemas financeiros da metrópole (Portugal) afetaram essa situação? Para encontrar soluções para essas questões, Afonso deve se lembrar que o ciclo da mineração traz importantes modificações para o sistema colonial, dentre elas: as relações de trabalho entre proprietários, homens livres e escravos, e o estimulo a atividades de apoio à mineração (como a pecuária), que proporcionam um fluxo interno de recursos maior que no período do açúcar, fortalecendo um incipiente mercado interno. Nesse contexto, para a arrecadação de impostos, foram criados os órgãos de controle da produção, a cobrança de tributos e a marcação do ouro, sendo que a Intendência de Minas (administração) era responsável pelo controle e determinação das cotas e pelos tipos de impostos (como o Quinto, que tributava em 20% todo o ouro extraído), enquanto as Casas de Fundição realizavam a marcação do ouro produzido para circulação. Essa cobrança de impostos gerou muitos recursos financeiros para a coroa portuguesa e iniciou um fluxo comercial interno na colônia. No entanto, o período não foi acompanhado do desenvolvimento industrial do Brasil como uma nova alternativa para a economia, que se deve a alguns fatores, dentre eles: a incapacidade técnica (dos imigrantes portugueses) para desenvolvi- mento da manufatura no país; e a crise financeira portuguesa (mesmo antes do esgotamento das reservas auríferas do Brasil) causada pelo Tratado de Methuen, que enfraqueceu as finanças de Portugal (e enriqueceu os cofres ingleses), deixando a metrópole fora do processo da Revolução Industrial iniciada na Inglaterra. Assim, apesar de a colônia estar gerando muito ouro para Portugal, boa parte dele era utilizada para pagar as importações de tecido inglês, fazendo com que a manufatura na Inglaterra se fortalecesse, o que culminou no processo da Revolução Industrial e estagnou o desenvolvimento no território português (prejudicando também essa progressão em terras brasileiras). 23 Avançando na prática Para além do Tratado de Tordesilhas O assessor-mor do Rei de Portugal, o Sr. Pedro Vaz, apreciando os mapas do mundo e a divisão das terras entre Portugal e Espanha (Tratado de Tordesilhas), compara-os com mapas que recebeu, recentemente, das terras ocupadas no Brasil até final do século XVIII. Nessa comparação, Pedro nota grandes diferenças e um grande avanço para dentro do território espanhol na América, refletindo sobre como puderam avançar tanto. Pedro verifica a mensagem que recebeu junto aos mapas, na qual o guarda-mor informa sobre várias revoltas que estão ocorrendo em regiões distintas da colônia brasileira, no Nordeste e nas Minas Gerais, sendo infor- mado sobre a dificuldade de ação da Guarda Real nas diferentes regiões, por conta das distâncias. Nesse ponto, ele se questiona: de que forma se deu essa rápida ocupação territorial de algumas regiões do interior do Brasil? Resolução da situação-problema O Sr. Pero Vaz, conversando com o Rei de Portugal, apresenta as situa- ções que estão ocorrendo na colônia e indaga o monarca sobre as questões que o afligem. Assim, o Rei explica a Pedro que vários movimentos impul- sionaram a expansão do território do brasileiro, além dos limites do Tratado de Tordesilhas, com destaque para a pecuária, a atuação dos bandeirantes e a extração do ouro. Na região Nordeste, a atuação da pecuária para o interior levou à ocupação dos sertões. No Centro-Oeste e no Sudeste, a expansão para as regiões interioranas em busca de metais preciosos e a própria reprodução da economia mineira levaram à expansão da pecuária que servia de apoio para alimentação e transporte. Na região Norte expandiu-se a atividade extrativa com as drogas do sertão (plantas medicinais, sementes, temperos) e a atuação dos jesuítas. Já no Sul do Brasil, a pecuária encontrou um local favorável e foi a atividade predominante. Com relação à integração regional, o monarca explica que, na verdade, não houve uma efetiva integração entre as regiões. Assim, podemos verificar que, na visão de alguns autores, durante o período colonial, existiam ilhas de desenvolvimento no território brasileiro (sem que houvesse uma efetiva integração entre regiões). Mesmo os movimentos de caráter separatista do período foram iniciativas isoladas, como a Inconfidência Mineira (uma revolta contra a cobrança de impostos, em Minas, e que incitava 24 a independência da metrópole) e a Conjuração Baiana (movimento baiano que objetivava o estabelecimento de uma República independente de Portugal). Essa dificuldade de integração decorre da própria questão da escala territo- rial e a distância entre as localidades, fazendo com que os fracos elos de ligações entre as regiões acabassem ficando concentrados na atividade pecuária. Com relação ao delineamento das fronteiras do país, essas movimentações territo- riais foram determinantes para uma configuração muito próxima à atual, sendo que o Tratado de Madri (1750), acordado entre Portugal e Espanha, determi- nava que a posse do território ocorreria a partir da ocupação “Uti Possidetis”. Faça valer a pena 1. A empresa colonial agrícola introduzida no Brasil não se reduzia a extrair riquezas naturais para revenda nos mercados europeus. Era um empreendimento muito mais complexo, que envolvia o desenvolvimento de uma atividade agrícola que seria explorada segundo critérios que proporcionassem o máximo de lucrativi- dade possível aos portugueses. O modelo de empresa agrícola baseado no plantation e iniciado no período colonial, aconteceu durante o: a. Ciclo do Ouro. b. Ciclo do Açúcar. c. Ciclo do Pau-Brasil. d. Ciclo do Algodão. e. e. Ciclo da Soja. 2. A Colonização Portuguesa na América não respeitou o Tratado de Tordesilhas, estabelecido com a Espanha em 1494, já que as fronteiras da colônia foram se expan- dindo para além dos limites estabelecidos pela linha de Tordesilhas. Os espanhóis, por sua vez, também descumpriram esse Tratado e ocuparam as colônias portuguesas situadas no oriente, como as Ilhas Filipinas. Como ocorreu o processo de ocupação e povoamento do interior do território brasileiro? a. As expedições oficiais financiadas pelo governo português (exploradores que buscavam aprisionar indígenas e escravos fugidos) e os Jesuítas (padres que realizavam a catequização dos indígenas e a disseminação dos ideais católicos no território brasileiro) foram os únicos responsáveis pelo processo de interiorização do território brasileiro. 25 b. O processo de expansão territorial e a consequente interiorização delineou-se pelo Tratado de Methuen de 1745, que definiu a configuração atual das fronteiras do Brasil. c. A configuração atual do território brasileiro foi determinada pelo Tratado de Utrech de 1715, firmado entre a coroa portuguesa e espanhola, no qual a posse das terras ocorreria por meio de uma negociação. d. A definição do processo de interiorização do território brasileiro foi construída por meio do Tratado de Tordesilhas, após a expulsão dos holandeses de Pernambuco. e. O processo de interiorização foi impulsionado por movimentos como o dos Bandeirantes, além da descoberta de jazidas de minérios em regiões interioranas do Brasil, que fomentaram o desenvolvimento de outras atividades econômicas de apoio (como a pecuária), em outras áreas do interior do país (como na região Sul). 3. Nossa história, diz Sérgio Buarque de Holanda (1936), girou em torno do “complexo ibérico”. Mas o êxito da colonização portuguesa não decorreu de um empreendimento metódico e racional, não emanou de uma vontade construtora e enérgica. É uma herança atrasada, em via de superação,mas foi a base da nacio- nalidade, constituiu as “raízes do Brasil”. Não se pode nem se deve, simplesmente, recusá-la e negá-la, mas sim transformá-la. Sobre o processo de colonização do Brasil, analise as afirmativas a seguir: I. O modelo estabelecido foi uma colônia de exploração baseada no plantation, que tem como características, a produção de um único produto em pequenas propriedades, pautada na mão de obra escrava e voltada para a exportação. II. O fluxo de recursos financeiros gerado na economia açucareira estava desti- nado para o mercado externo, seja em forma de comissionamento dos holan- deses, comerciantes, impostos para a coroa portuguesa e os próprios senhores de engenho, que importavam grande parte dos produtos para sua manutenção. III. A sociedade brasileira foi se delineando com uma grande diversidade e misci- genação entre povos indígenas, portugueses e africanos. Considerando o contexto apresentado, é correto o que se afirma em: a. I e II, apenas. b. I e III, apenas. c. II e III, apenas. d. I, II e III. e. II, apenas. 26 Seção 2 Da economia cafeeira à industrialização Diálogo aberto Vários questionamentos podem ser levantados sobre o que estudamos na seção anterior, dentre eles: quais foram as implicações do ciclo do açúcar e do ouro em termos econômicos para a superação dos limites do modelo baseado na exportação de um único produto primário e na importação de produtos industrializados, com o mercado de trabalho sendo maciçamente formado por mão de obra escrava? Como reerguer os ganhos de Portugal e retomar o fluxo de recursos financeiros? Nesta seção, vamos estudar a crise do sistema colonial e o processo de gestação da economia cafeeira, que envolve a questão da mão de obra, com a abolição da escravidão e o incentivo à imigração europeia. Além disso, também vamos entender a discussão dos limites do modelo econômico brasi- leiro, a partir dos choques externos (Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e a Crise de 1929), e o início do processo de industrialização por substituição de importações. Para nos ajudar a assimilar esses conteúdos, voltaremos à história do Sr. Afonso, que analisa o material doado pelo Sr. Francisco Gonçalves Santiago à universidade para a qual trabalha. Nessa exploração, o Sr. Afonso se surpre- ende ao abrir a segunda e a terceira carta: na segunda, ele encontra o relato, décadas mais tarde, do filho mais novo do Sr. José (lembra dele, que organi- zava a cobrança de impostos em Minas Gerais?), o Pedro Santiago, único que decidiu permanecer no Brasil, após a morte do pai, tendo escolhido se mudar para a cidade do Rio de Janeiro junto com sua família. No Rio de Janeiro, Pedro, um comerciante visionário, decidiu investir parte de sua herança na compra de terras e escravos para iniciar a produção de um produto que estava em alta na Europa e havia acabado de chegar ao Brasil: o café. Pedro iniciou uma grande plantação em suas terras e dividia seu tempo na atuação como comissário na praça do Rio de Janeiro, auxiliando no financiamento e comercialização de café de vários produtores. Ele alcançou uma grande prosperidade e seus filhos deram continuidade aos negócios. Na terceira carta, Afonso encontra a história do bisneto do Sr. José, o João Santiago, que expandiu os negócios da família para a região oeste paulista, onde prome- tiam terras mais férteis e um novo modelo de relações de trabalho se formava após a abolição da escravatura, já que os imigrantes europeus chegavam no Brasil para trabalhar nas lavouras de café. 27 Ao ler as cartas, o Sr. Afonso se lembrou de uma notícia que havia assis- tido no jornal do dia anterior, que mostrava que o preço internacional do café havia diminuído, devido a uma safra recorde ocorrida nos países produtores (inclusive o Brasil). Nesse momento, ele se questiona: será que durante o ciclo do café, essa diminuição do preço internacional do café também aconteceu? Caso tenha acontecido, de que forma os produtores conseguiam superar esse obstáculo da queda do preço do produto? Será que esses problemas nos preços internacionais do café contribuíram para o início da industrialização brasileira (ocorrida no período seguinte)? Para chegar a uma solução sobre esses questionamentos, utilize os conceitos que envolvem a questão da mão de obra na cafeicultura, as carac- terísticas da classe cafeicultora e o desenvolvimento do mercado interno. Por isso, faça uma leitura de maneira reflexiva e crítica, com indagações sobre os desdobramentos de cada fase da formação de nossa economia. Bons estudos! Não pode faltar Na seção anterior, verificamos como ocorreu o auge e o declínio dos ciclos do açúcar e do ouro e as modificações que esses ciclos deixaram como legado para a economia colonial. Agora, vamos ver como a crise que se instalou no sistema colonial no final do século XVIII levou a uma série de conflitos entre as elites locais e o poder metropolitano, entendendo o ponto central da insatisfação que girava em torno do Pacto Colonial. Inicialmente, para compreendermos o contexto, vamos ver o que estava ocorrendo em Portugal e na Europa naquela época. Em 1750, assumia, como Primeiro Ministro do governo português, o Marquês de Pombal, que ficou no cargo até 1777. Tendo como objetivo modernizar as estruturas de Portugal (por meio da racionalização do processo de produção e do envio de riquezas da colônia para a metrópole), ele implementou uma série de medidas que atingiam a colônia brasileira, dentre elas: o fim das capitanias hereditá- rias, a proibição da escravidão indígena, a expulsão dos jesuítas, a criação de companhias de comércio (para aumentar a exploração de riquezas) e o estabelecimento da derrama em Minas Gerais (um imposto que servia para complementar as dívidas que os mineradores contraíam com a Coroa portu- guesa, principalmente, em momentos de diminuição da extração do ouro). É possível notar que a política pombalina piorou o quadro de crise do Pacto Colonial, impulsionando as revoltas dos colonos. 28 Na Europa, o final do século XVIII e início do século XIX foi um momento bastante conturbado. A Revolução Francesa (1789-1799) impul- sionava os ideais iluministas e a ruptura com o sistema absolutista, que culminou com a fundação da Primeira República na França. No início do século XIX, Napoleão Bonaparte tomou o poder (tornando-se imperador), iniciando várias batalhas no continente europeu contra as alianças das nações europeias. Em 1806, ele estabeleceu o Bloqueio Continental, que barrava o comércio dos outros países com a Inglaterra. Portugal se recusou a aceitar o bloqueio, pois tinha várias relações comerciais com a Inglaterra, inclusive dívidas e, como resultado dessa negativa, Napoleão Bonaparte invadiu o território português, no final de 1807, e Dom João VI, auxiliado pelos ingleses, decidiu levar toda a corte portuguesa para o Brasil. Com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, Dom João VI firmou alguns acordos comerciais com a Inglaterra, tais como a abertura dos portos (1808) e a redução de tarifas aduaneiras (1810), tendo findado, assim, o Pacto Colonial. Os tratados não foram vantajosos para Portugal, pois retiraram a exclusividade sobre a comercialização da colônia, reduzindo a lucratividade dos lusitanos. Para o Brasil, em um primeiro momento, ocorreram reflexos positivos para uma maior dinamização comercial, surgindo maiores oportunidades para a importação de produtos ingleses e a redução no custo de vida. Entretanto, de acordo com Furtado (1989), esse “favorecimento” aos ingleses foi um instrumento criador de privilégios, pois a Inglaterra preocupava-se em alocar seus produtos nas terras tupini- quins, em detrimento dos produtos brasileiros. Assim, os preços dos tecidos importados da Inglaterra eram muito baixos, fazendo com que o tecido feito no Brasil não conseguisse concorrer com aqueles, deixando os artesãos da colônia sem espaço para trabalhar. Reflita Diante dos tratados que influenciaramo processo de industriali‐ zação brasileiro, é importante refletir um pouco sobre as diferenças e semelhanças em relação ao processo de industrialização do Brasil e dos EUA. Os EUA iniciaram seu processo industrial no século XIX e o Brasil iniciará seu processo industrial, apenas no século XX. Por que o Brasil não se industrializou no mesmo período? Será que o tipo de colônia de explo‐ ração que aconteceu no Brasil (em vez de uma colônia de povoamento como no caso norte-americano) influenciou nesse processo? Será que a experiência técnica industrial dos colonos ingleses favoreceu a indus‐ trialização mais precoce dos EUA? Reflita sobre o assunto. 29 Na economia brasileira, na primeira metade do século XIX, houve uma abrupta redução da renda gerada, pois além das atividades econômicas permanecerem em um nível praticamente de subsistência, havia uma grande dificuldade em conseguir recursos externos para as atividades internas da colônia. Além disso, uma grave crise fiscal (déficit nas contas do governo) assolou o Brasil, pois a família real gastava muito dinheiro para financiar regalias e alguns serviços básicos, como higiene e urbanismo, sem contar a guerra na Guiana Francesa, em 1809. Diante desse quadro, qual seria a alternativa para a situação? A industria- lização? Outro produto primário para exportação? Bem, como pontos favorá- veis para uma retomada produtiva tinha-se uma grande disponibilidade de terras férteis e um grande contingente de escravos. Nesse momento, a única alternativa viável parecia ser o investimento (novamente) em um modelo de único produto para exportação, que utilizasse as terras abundantes e a mão de obra escrava disponível. (...) O problema brasileiro consistia em encontrar produtos de exportação em cuja produção entrasse como fator básico a terra. Com efeito, a terra era o único fator de produção abundante no país. Capitais praticamente não existiam e a mão-de-obra era basicamente constituída por um estoque de pouco mais de dois milhões de escravos, parte substancial dos quais permaneciam imobilizados na indústria açucareira ou prestando serviços domésticos (FURTADO, 1989, p.115). O café, uma bebida bastante apreciada na Europa e nos Estados Unidos, já era cultivado no Brasil, desde meados do século XVIII, para o consumo local. Naquela época, o grande produtor mundial de café era o Haiti (colônia francesa na América), que passava por disputas com relação a sua independência que comprometiam a produção. Isso fez com que o preço do café subisse no mercado internacional, estimulando o Brasil a cultivá-lo, aproveitando as terras e o clima propensos. Dessa forma, o Brasil iniciou o cultivo do café, em maior escala, em meados do século XIX, na região do Vale do Rio Paraíba (leste do estado de São Paulo e sul do estado do Rio de Janeiro), uma região montanhosa que reunia condi- ções favoráveis para a cultura cafeeira (terra, clima e mão de obra ociosa proveniente do fim da mineração) e que estava próxima do porto para o escoamento da produção, além da existência da pecuária, com mulas para o transporte (FURTADO, 1989). 30 Exemplificando O cultivo do café no Brasil foi tão bem-sucedido que, atualmente, o país é o maior produtor mundial de café. Em 2018, a produção anual foi de mais 60 milhões de sacas, sendo que dessas, mais de 30 milhões foram exportadas (SAFRA..., 2018). A cultura cafeeira tinha uma estrutura com um menor custo de produção em comparação à produção açucareira, por ser uma cultura permanente e não necessitar de reposição a cada ciclo produtivo, apesar do pé de café levar em torno de 5 anos até que esteja formado e atinja seu ápice produtivo. A produção no Vale do Paraíba se pautou nas condições pré-existentes da localidade, sem grandes investimentos em equipamentos ou técnicas produ- tivas, ou seja, uma produção rudimentar nas encostas. Nesse ponto, você pode estar se fazendo a seguinte pergunta: quem eram os homens que inves- tiram na cultura cafeeira? A classe comercial que se formou no Rio de Janeiro com a chegada da corte portuguesa consistia em homens da própria região, que foram os grandes responsáveis por abastecer a cidade e por impulsionar a produção cafeeira. Essa nova classe tinha uma grande relação com o comércio, diferen- temente da classe açucareira, que não participava da comercialização do açúcar. De acordo com Furtado (1989, p. 117), “muitos desses homens, que haviam acumulado alguns capitais no comércio e transporte de gêneros e de café, passaram a interessar-se pela produção deste, vindo a constituir a vanguarda da expansão cafeeira”. Assimile Nesse período, não existiam órgãos oficiais de financiamento, assim os comerciantes de café (comissários) eram os grandes provedores de recursos para a formação e cultivo das lavouras cafeeiras. Em contra‐ partida, havia uma fidelidade do produtor, que lhe garantia a entrega da produção para comercialização, e o comissário recebia uma comissão que girava em torno de 3% (REGO et al., 2010). Note que, entre os anos de 1820 e 1840, o café já despontava como o principal produto das exportações brasileiras. Dessa forma, o crescimento da economia cafeeira, regado pelo aumento dos preços internacionais do café, aumentou a demanda pela mão de obra. No entanto, as péssimas condi- ções de vida limitavam o crescimento vegetativo da população de escravos (FURTADO, 1989). Diante disso, iniciou-se uma disputa por mão de obra entre as regiões (no caso entre Sudeste e Nordeste), que foi intensificada 31 com a assinatura da Lei Eusébio de Queiróz (1850), que proibiu o tráfico de escravos para o Brasil. Assimile A questão da escravidão no Brasil sempre foi um ponto de discussão entre Portugal e Inglaterra, pois, como sabemos, a Inglaterra passava pelo processo de Revolução Industrial (1750) e buscava novos mercados consumidores. Com a Independência do Brasil em 1822, a Inglaterra, cada vez mais, pressionava a abolição da escravidão brasileira. Assim, foram firmados alguns tratados de proibição sobre o comércio negreiro e, em 1850, criou-se lei que proibia o tráfico negreiro para o Brasil. Posteriormente, vieram a Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei do Sexage‐ nário (1885), por meio das pressões dos movimentos abolicionistas, mas, somente em 1888, com a Lei Áurea, é que definitivamente a escra‐ vidão foi abolida. A forma como foi conduzida a abolição dos escravos trouxe muitas dificuldades econômicas e sociais aos recém libertos, que deixaram os negros à margem da sociedade, desde àquela época A desagregação do regime escravocrata e senhorial se operou, no Brasil, sem que se cercasse a destituição dos antigos agentes de trabalho escravo de assistência e garantias que os protegessem na transição para o sistema de trabalho livre. Os senhores foram eximidos da responsabilidade pela manutenção e segurança dos libertos, sem que o Estado, a Igreja ou qualquer outra instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objeto prepará-los para o novo regime de organização da vida e do trabalho. (...) Essas facetas da situação (...) imprimiram à Abolição o caráter de uma espoliação extrema e cruel (FERNANDES, 2008, p.28). Retomando a questão da mão de obra na produção cafeeira, a região do Vale do Paraíba iria se deparar com o dilema da mão de obra e do esgota- mento do solo na região, devido às práticas rudimentares de produção nas encostas, o que levou à diminuição da produtividade no local no final do século XIX. Assim, outra frente de produção se iniciava na região oeste paulista, incentivando o processo de imigração dos europeus para o Brasil, que substituiriam a mão de obra escrava no campo. Naquele momento, países como a Itália passavam por grandes atribula- ções sociais, o que foi um incentivo para que as pessoas de lá viessem tentar 32 uma melhoria de vida no Brasil. Os imigrantes europeus chegaram ao país e foram submetidos a dois regimes de trabalho: o sistema de parceria, em que metade do valorda colheita seria dos imigrantes, após a dedução dos custos de transporte, impostos e comissões; e o regime de colonato, no qual ocorria o pagamento direto ao colono, que ainda recebia um pedaço de terra para o plantio de alimentos para subsistência. Este último se aproximava de uma relação de trabalho assalariado. Nesse sistema dinâmico que se instalava no oeste paulista, ocorreu o incentivo de alguns produtores, inicialmente, e, depois, do próprio governo imperial, para a vinda de um grande contingente de imigrantes para o país. A grande imigração europeia se concretizou no final do século XIX, sendo que cerca de 800 mil imigrantes chegaram ao estado de São Paulo, no último quartel do século XIX; só de italianos tínhamos algo em torno de 570 mil pessoas (FURTADO, 1989). Assim, a produção cafeeira no oeste paulista atingiu uma grande prospe- ridade, pautada em um modelo produtivo empres , com técnicas produtivas mais modernas, trabalho assalariado e a implantação das ferrovias para o escoamento da produção. Note que, o ponto de inflexão do ciclo do café no oeste paulista será o desenvolvimento de uma extensa malha ferroviária ligando o interior ao litoral de Santos. Com o estabelecimento do trabalho assalariado ocorreu uma profunda mudança no fluxo de recursos financeiros dentro da economia brasileira. Com o pagamento de salários, houve um impulsionamento no consumo e, consequentemente, no crescimento do mercado interno, sendo que esse movimento retroalimentava a economia e intensificava o processo de urbanização. No entanto, a questão da má distribuição da renda também foi observada no período, já que havia um grande abismo entre os rendimentos dos cafeicultores e os níveis salariais dos trabalhadores. Isso ocorreu, pois o aumento de produtividade das lavouras (e, consequentemente, da lucrativi- dade) não foi repassado aos salários. A economia cafeeira, apesar de continuar estruturada em um modelo vulnerável tanto às oscilações externas (variações dos preços internacionais) como à concentração produtiva em único produto primário (semelhante aos ciclos do açúcar e do ouro), conseguiu se diversificar um pouco, já que os cafeicultores, por estarem mais ligados com os setores empresarial e comer- cial, buscaram algumas alternativas ao café; no caso, a industrialização. Dessa forma, no início do século XX, algumas iniciativas com recursos deslocados da cafeicultura foram destinadas à produção industrial de bens de consumo (têxtil e alimentícia), em um processo de substituição de impor- tações, que consistia em produzir bens de consumo internamente, em vez 33 de importá-los. Esse movimento surgiu, principalmente, nos momentos de estrangulamento externo, que dificultavam tanto a exportação do café como a importação de mercadorias, como aconteceu durante a Primeira Guerra Mundial. As constantes crises que o café enfrentou nos primeiros anos do século XX também contribuíram para esse cenário. Antes de prosseguirmos, é preciso compreender como se delineava a questão política no Brasil no final do século XIX. Esse foi um período bastante intenso no campo político: em 1888, foi promulgada a Lei Áurea, que aboliu a escravidão, e, em 1889, foi proclamada a República. Na sequência, em 1891, foi promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil, que estabe- leceu o regime federativo, eleições gerais para presidente (com voto popular) e a separação entre o Estado e a Igreja (Estado laico). A República sofria grande influência dos produtores cafeeiros, sendo que alguns historiadores denominaram o período de 1889 a 1930 como Política do Café com Leite, uma alusão ao poder dos produtores de café de São Paulo e de leite de Minas Gerais, que se revezavam ocupando a presidência do país naquela época. Da mesma forma como havia ocorrido nos dois modelos anteriores, a economia cafeeira sofreu no final do século XIX com a queda na demanda mundial, em especial dos EUA, que era um dos grandes compradores do café brasileiro e enfrentou efeitos mais prolongados da crise (FURTADO, 1989). Tudo isso levou a uma grande redução nos preços internacionais do café, já que a oferta era maior do que a demanda, justamente no momento em que que a produção brasileira continuava crescendo (por ser uma cultura perma- nente não é tão simples reduzir a produção rapidamente). Você se lembra das influências dos produtores cafeeiros na política? Pois bem, várias medidas para diminuir essas oscilações de preços e que podem ser divididas em dois tipos: desvalorização cambial e política de valorização do café. O objetivo era proteger os produtores e garantir a sobrevivência da economia brasileira que dependia do café. Veja que são estabelecidas políticas de “socialização das perdas”, sendo que, em um primeiro momento, são realizadas medidas de desvalorização do câmbio (a moeda nacional é desvalorizada para manter o poder de compra dos cafeicultores, assim, mesmo que o preço internacional do café caia, internamente, reduz-se o impacto negativo na lucratividade do cafei- cultor em moeda nacional). Exemplificando O processo de desvalorização da moeda nacional proporcionou a manutenção da renda dos cafeicultores. Para exemplificar como isso funcionava, acompanhe no Quadro 1.1, que ilustra uma situação em 34 que, inicialmente, o preço internacional do café era de 15 libras por saca, o que proporcionava uma renda de 210 mil réis (em moeda nacional) para o produtor, ou seja, a taxa de câmbio era de 14 mil réis por cada libra. Agora, pense que, devido ao excesso de oferta (ou escassez de demanda) no mercado mundial do café, o preço internacional da saca caísse para 10 libras por saca, o que traria uma queda de renda ao cafei‐ cultor, caso a taxa de câmbio continuasse a mesma, já que vendendo uma saca ele passaria a receber 140 mil réis (redução de recebimentos em moeda brasileira de 33%). No entanto, se nesse momento de queda do preço internacional do café o governo promovesse uma desvalori‐ zação da moeda nacional, e a taxa de câmbio passasse a ser de 21 mil réis por cada libra. Nesse caso, o cafeicultor conseguiria manter a sua receita em moeda nacional com a exportação de uma saca de café com preço de venda de 10 libras multiplicado por 21 mil réis (taxa de câmbio), totalizando, assim, 210 mil réis (valor da venda, em moeda nacional). Quadro 1.1 | Desvalorização da moeda nacional e impacto na receita do cafeicultor Preço internacional da Saca de Café (em libras) Taxa de Câmbio (mil réis por cada libra) Arrecadação pela venda de cada saca de café (em mil réis) Variação da renda de acordo com a da taxa de câmbio 15 14 210 Situação inicial 10 14 140 Redução da renda em 33% 10 21 210 Manutenção da renda Fonte: Elaborado pela autora. Essa foi uma medida socialmente justa? Provavelmente não, pois, com a desvalorização da moeda nacional, os brasileiros passaram a pagar mais pelos produtos que precisavam comprar de fora. Assim, houve uma transfe- rência de renda para os cafeicultores, e quem acabava pagando a conta era a sociedade, já que teria que arcar com preços mais elevados pelos produtos importados; sem contar que esse processo contribuía ainda mais para a concentração de renda. Como a desvalorização cambial camuflava a situação real do mercado, a produção cafeeira continuou crescendo e os preços no mercado internacional caindo. Em 1905, houve uma safra recorde e uma crise de superprodução (a produção ofertada era bem maior do que a demanda internacional pelo café) e, novamente, o governo criou uma medida para solucionar a crise por meio da política de valorização do café com o Convênio de Taubaté. Essa medida 35 consistia na compra pelo governo (e, muitas vezes, na queima do café) dos excedentes produzidos. A retenção de parte dos estoques diminuía a oferta de café no mercado, contribuindo para que não houvesse excesso de merca- doria, o que forçava os preços para baixo. Além disso, houve outras medidascomo uma maior tarifação sobre a saca de café e uma política de incentivo à redução da produção (FURTADO, 1989). Vale destacar que a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) também impactou na demanda mundial por café, fazendo com que essas medidas de proteção ao setor cafeeiro continuassem sendo realizadas pelo governo. O limite da intervenção do Estado, entretanto, ocorreu com a Crise de 1929 (que devastou a economia mundial, inclusive com a quebra da bolsa de valores de Nova York), pois ela reduziu drasticamente a demanda interna- cional por café e colocou em xeque as finanças do governo brasileiro que dependiam dos fluxos de recursos internacionais para financiar sua política de manutenção dos preços (FURTADO, 1989). Para concluir esta seção, é importante salientar que o ciclo do café foi um marco para a economia brasileira, com importante desenvolvimento da infra- estrutura de transportes na região Sudeste, geração de renda e fluxo finan- ceiro no mercado interno (a partir do trabalho assalariado), apesar da histó- rica vulnerabilidade externa do modelo primário-exportador permanecer. Os dois grandes choques que ocorreram no período, a Primeira Guerra e a Crise de 1929, mostraram os limites do modelo. No entanto, diferente- mente dos ciclos do ouro e do açúcar, nesse período houve uma nova forma de diversificação do modelo produtivo, que se deu de maneira espontânea. Isso se deve às condições apresentadas pelos ambientes interno e externo nas primeiras décadas do século XX, com várias iniciativas de deslocamento dos recursos financeiros da cafeicultura para um incipiente processo de indus- trialização por substituição de importações. As ferrovias foram um marco desse período, e o processo de produção interna de bens de consumo, como a indústria têxtil, alimentícia e algumas outras manufaturas, começou a despontar na economia brasileira em resposta aos choques externos e à redução da capacidade de importação. No entanto, esse é um assunto para ser tratado na próxima seção, em que veremos as políticas do governo Vargas para o incentivo da produção industrial no país. Pesquise mais Para aprofundar os estudos sobre a influência da economia cafeeira para a industrialização brasileira, pesquise mais em: 36 ALMEIDA, G. F. A.; ENGEL, V. A Influência da Economia Cafeeira no processo de Industrialização do Brasil na República Velha. Revista de Desenvolvimento Econômico – RDE – Ano XVIII, V. 2, n. 34, ago. 2016, Salvador, p. 581‐592. Sem medo de errar Nesta seção, vimos as indagações que o Sr. Afonso realiza ao ler as cartas da família do Sr. José, relacionando-as com uma reportagem que viu sobre a queda no preço internacional do café, devido a uma safra recorde: será que durante o ciclo do café, essa diminuição do preço internacional do produto também aconteceu? Caso tenha acontecido, de que forma os produtores conseguiam superar esse obstáculo da queda do preço do produto? Será que esses problemas nos preços internacionais do café contribuíram para o início da industrialização brasileira (ocorrida no período seguinte)? A situação-problema retrata os caminhos percorridos pelos descendentes do Sr. José Santiago que saem da região mineira, após o declínio da produção, e buscam nas terras do Vale do Paraíba e, depois, do Oeste Paulista uma nova forma de enriquecimento, a partir da cultura cafeeira. O ciclo cafeeiro era bastante semelhante aos anteriores, pautado na monocultura em grandes propriedades agrícolas, mão de obra escrava e voltado para exportação, ou seja, o modelo primário-exportador. No entanto, algumas características o diferem dos modelos anteriores, em especial, a classe empresarial cafeeira que estava ligada, não só à produção mas também à comercialização do produto. Os choques externos (crise mundial no final do século XIX, Primeira Guerra Mundial e a Crise de 1929) levaram a diminuições na demanda internacional por café e, consequentemente, queda nos preços desse produto (assim como o Sr. Afonso assistiu em uma reportagem). Como a economia brasileira dependia muito do mercado cafeeiro, o governo, para proteger os cafeicul- tores, realizou várias políticas de desvalorização da moeda nacional e valori- zação do café (compra e, muitas vezes, queima, de estoques excedentes), o que manteve, de maneira artificial, os ganhos do sistema cafeeiro. No entanto, o ciclo do café foi um pouco diferente dos ciclos do açúcar e do ouro. Na segunda fase da produção cafeeira, no Oeste Paulista, houve um ponto de inflexão do modelo, com o uso da mão de obra assalariada e o incentivo à imigração europeia. Essa modificação para a mão de obra assalariada gerou um fluxo de recursos financeiros na economia (com o aumento da demanda por bens de consumo) e intensificou o desenvolvi- mento do mercado interno. Aliado a isso, o desenvolvimento do sistema de transportes ferroviário trouxe uma nova atmosfera na dinâmica econômica. 37 Tais condições apresentadas na economia interna, aliadas às dificuldades do governo em manter os ganhos artificiais dos cafeicultores, impulsionaram o deslocamento dos recursos financeiros para o início do processo de indus- trialização de bens de consumo não duráveis no país. O objetivo era produzir internamente alguns produtos (tecidos e alimentos) que, até então, eram importados das nações industrializadas. Avançando na prática A política de socialização das perdas O presidente da República Afonso Pena recebeu de seu antecessor, Rodrigues Alves, um grande dilema ou “abacaxi”: assinar ou não o Convênio de Taubaté, que havia sido acordado entre os governadores dos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. O presidente questiona seu ministro da economia sobre a viabilidade de se assinar um convênio que irá aumentar os gastos do governo em um momento de dificuldades financeiras. Qual a viabilidade desse acordo? Quais são os prós e contras para o país? Resolução da situação-problema Para responder aos questionamentos do presidente, o ministro da economia deve deixar claro o que foi proposto no Convênio de Taubaté, mostrando as principais solicitações dos produtores cafeeiros, que pleiteavam uma política de valorização do produto, tendo em vista a queda dos preços internacionais e a grande produção do período. Como ponto positivo desse Convênio, o ministro pode dizer ao presidente que o acordo conseguiria manter a renda dos cafei- cultores e, consequentemente, o produto mais importante da economia brasi- leira continuaria sendo produzido, garantindo o emprego e a renda de muitos trabalhadores assalariados. No entanto, o Convênio de Taubaté iria trazer um alto custo para o governo e para a sociedade, pois o governo ampliaria muito os gastos públicos para adquirir a produção excedente de café, enquanto a sociedade teria que pagar um preço cada vez mais caro pelas mercadorias que importava (em razão da desvalorização da moeda nacional). Faça valer a pena 1. A produção do café no oeste paulista apresentou duas formas bem marcadas de utilização da mão de obra imigrante: o sistema de parceria (momento inicial de 38 inserção dos imigrantes) e o sistema de colonato (que inaugurou as bases de relações capitalistas de produção no país). Assinale a alternativa que apresenta as características corretas de um dos tipos de utilização de mão de obra imigrante, visto ao longo do ciclo do café: a. O sistema de colonato consistia em um regime de recebimento direto do pagamento pela produção, em que o colono recebia um pedaço de terra para cultivar produtos para sua subsistência. b. O sistema de parceria consistia em um modelo em que ocorria o pagamento direto ao colono, que ainda recebia um pedaço de terra para o plantio de alimentos para subsistência. c. O sistema de colonato era aquele em que metade do valor da colheita seria dos imigrantes, após a dedução dos custos de transporte, impostos e comissões d. No sistema de parceria, o colono recebia um salário pago diretamente, independentemente
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