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LIVRO MARY RICHIMOND DIAGNÓSTICO SOCIAL

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DIAGNOSTICO 
SOCIAL
POR
MARY E. RICHMOND
D IR E C TO R A DA SECÇÃO D E O R G A NIZAÇÃO DA CA RID A D E 
DA F U N D A Ç Ã O R U SSEL L SAGE 
A U T O R A DO «BO M V IZ IN H O » , E T C .
TR A D U Ç Ã O
DO
DR. JOSÉ ALBERTO DE FARIA 
Antigo Director Geral de Saúde
LISBOA
INSTITUTO SUPERIOR DE HIGIENE DR. RICARDO JORGE
1 9 5 0
DIAGNOSTICO 
SOCIAL
POR
MARY E. RICHMOND
DIRECTORA DA SECÇÃO DE ORGANIZAÇÃO DA CARIDADE 
DA FUNDAÇÃO RUSSELL SAGE 
AUTORA DO «BOM V IZIN H O », ETC.
TRADUÇÃO
DO
DR. JOSÉ ALBERTO DE FARIA 
Antigo Director Geral de Saúde
LISBOA
IN STITUTO SUPERIOR DE HIGIENE DR. RICARDO JORGE
1 9 5 0
EDITADO EM 1917 PELA FUNDAÇÃO 
RUSSELL SAGE
Impresso em Maio de 1917 
Reimpresso em Junho de 1917 
Reimpresso em Outubro de 1917 
Reimpresso em Abril de 1918 
Reimpresso em Outubro de 1918 
Reimpresso em Outubro de 1919 
Reimpresso em Julho de 1921 
Reimpresso em Junho de 1923 
Reimpresso em Dezembro de 1925 
Reimpresso em Julho de 1928 
Reimpresso em Agosto de 1930 
Reimpresso em Junho de 1932 
Reimpresso em Junho de 1934 
Reimpresso em Fevereiro de 1935 
Reimpresso em Abril de 1936 
Reimpresso em Novembro de 1940 
Total de exemplares vendidos 
até 1946 — 29.911 
Na tradução Portuguesa foi 
seguida a edição de 1940
A
ZILPHA DREW SMITH
CUJA FÉ ARDENTE NAS POSSIBILIDADES DO SERVIÇO 
SOCIAL DOS CASOS INDIVIDUAIS INSPIROU ESTE 
LIVRO E A SUA AUTORA
Um dos factos mais admiráveis referentes à vida consciente de qualquer ser 
humano, ê a sua ligação com as vidas dos outros. E em cada uma das relações 
sociais do homem que a sua história mental está principalmente escrita, e é nas 
suas relações sociais igualmente que as causas dos infortúnios que ameaçam a sua 
felicidade, a realização desta e os meios para assegurar o seu restabelecimento 
devem ser principalmente procuradas.
— DR. JAMES JACKSON PUTNAM
Por mais horrível e miserável que seja a vida de um homem, a primeira coisa a 
fazer é compreendê-lo; explicar precisamente como é que a nossa comum natureza 
humana pôde chegar àquela situação. Este método requer paciência, conhecimentos, 
firmeza e confiança nos homens, deixando pouco lugar para o egotismo caracterís­
tico de certas espécies de reformadores. Ê cada vez mais vulgar lidar-se com a 
intemperança, o crime, a ambição e, em resumo, com todos os problemas com cuja 
resolução tentamos tornar-nos melhores, a nós e aos nossos vizinhos.
— CHARLES H ORXON COOLEY
Só o insensato sabe tudo; o homem experimentado compreende quão pouco pode 
alcançar o espirito do indivíduo e quantas colaborações são precisas para se poder 
explicar a coisa mais simples.
— H A N S GROSS
P R E F Á C I O
Q S l A 15 anos, comecei a tomar notas, a juntar elementos 
informativos e a esboçar mesmo certos capítulos de um 
livro sobre 0 trabalho social nas famílias.
Nele esperava transmitir aos novos que viessem a trabalhar 
em instituições de caridade a explicação dos métodos que nós 
os velhos, julgávamos mais úteis.
Pareceu-me logo, contudo, que não haveria objectivo ou 
método que pudesse ser característico e exclusivo desse campo 
de trabalho, pois que, em última análise, os objectivos e métodos 
para se solucionarem os casos sociais eram ou deveriam ser os 
mesmos, qualquer que fosse 0 tipo de necessidade que havia a 
atender, quer se tratasse dum paralítico sem casa onde viver, 
duma criança abandonada por pais alcoólicos ou de uma viúva 
com filhos pequenos e sem recursos.
Alguns dos procedimentos a adoptar teriam certamente 
aplicação apenas num ou noutro grupo de casos, conforme a 
especial incapacidade social que neles houvesse a remediar, mas o 
que mais haveria a referir a respeito do serviço social dos casos 
individuais seria tudo o que pudesse ser aplicável ao maior 
número de casos.
Se contudo era necessário e conveniente dividir 0 trabalho 
social em secções e especialidades, havia entretanto 0 dever de 
manter os pontos comuns e fundamentais desse trabalho.
Para outros profissionais, como os médicos e os advogados, 
por exemplo, existe sempre uma base de conhecimentos gerais 
comuns. Se um neurologista e um cirurgião têm de decidir jun­
tos seja 0 que for sobre determinado caso, um e outro servem-se, 
além da experiência adquirida no seu ramo, de certos elementos 
basilares de ordem técnica que ambos conhecem.
Em circunstâncias semelhantes, que noções básicas e comuns 
haverá que possam orientar as trabalhadoras sociais•
V II
PREFÁCIO
Eis a pergunta que durante 15 anos fiz a mim própria: 
Pareceu-me então, e ainda hoje assim penso, que os elementos 
para o diagnóstico social deveriam ser aqueles que todas as tra­
balhadoras sociais deviam conhecer bem e que conviria susten­
tar-se a ideia de que cada uma delas não só viesse a dominar 
bem esses conhecimentos corno a aceitar as modificações que a 
experiência e 0 tempo determinassem nos mesmos.
A isto se limitavam os meus propósitos iniciais que depois 
se estenderam ao aproveitamento da experiência das formas de 
correcção dos vários tipos de casos a encarar. Nesse tempo era 
chefe duma secção muito activa de trabalho numa agência fami­
liar e quase não tinha vagar para fazer quaisquer estudos pro­
fundos; pus 0 meu plano por isso de lado durante cerca de 
9 anos!
Mas há uns 6 anos quando entrei para 0 serviço da Funda­
ção Russel Sage, voltei de novo a ocupar-me dele.
Entretanto havia já que pensar na circunstância de se ter 
alargado 0 campo da averiguação das realidades sociais, do 
diagnóstico social e do respectivo tratamento, tanto no domínio 
do verdadeiro trabalho social como para conseguir outros desígnios 
que já não eram os da correcção de necessitados ou delinquentes, 
pois seria necessário que 0 serviço social dos casos individuais 
viesse também a servir de complemento á acção médica, educa­
tiva e judicial. Além disso nalgumas cidades americanas havia 
já grupos de trabalhadoras sociais a desenvolver uma notável 
acção nas várias instituições que serviam, estando serenamente 
empenhadas em desenvolver os seus conhecimentos para vencer 
as dificuldades que se lhes deparavam e, desembaraçando-se ao 
mesmo tempo de preconceitos já velhos, especialmente durante 
0 período da sua formação, estavam por assim dizer, construindo 
o corpo duma verdadeira técnica social, quer nos tribunais, quer 
nos hospitais e escolas
Voltei então pela segunda vez a ocupar-me desse meu pro­
jecto no inverno de 19 10 -11, já um objectivo um tanto diferente 
do que inicialmente concebera e com a pretensão de lhe levar, 
tanto quanto possível, além da minha própria experiência, a 
averiguações dos elementos a utilizar na sua elaboração.
O Sr. Francis Mc. Lean, que era então meu colega na 
Fundação Russell, onde demonstrara qualidades valiosas de ini­
ciativa, tinha já convidado um grupo de trabalhadoras sociais
v i »
PREFÁCIO
dos casos individuais (a maior parte delas ligadas a institui­
ções de caridade) a enviar-lhe breves relatos em que descre­
vessem sucintamente os seus métodos e observações ao darem 
os passos que no seu trabalho' precediam a execução dum plano 
de acção.
A este grupo juntou-se posteriormente outro e alguns dos 
seus relatos sobre tal assunto, (como por exemplo as informações 
gerais dadas por vizinhos actuais ou por patrões sobre o rendi­
mento profissional, sobre a maneira como decorrera a primeira 
conversa, etc.), foram discretamente impressos e distribuídos a 
umas tantas colegas trabalhando em instituições de caridade para 
estas lhes fazerem a critica que entendessem. Serviam também 
esses artigos para um ensaio de publicação sobre a matéria e de 
certas noções que eles continham se fez logo uso com todo o 
proveito, como se pode ver na Parte II deste livro.
A seguir foram encarregadas duas trabalhadoras sociais de 
estudar durante i ano os registos originais dos casos, tanto em 
trabalho junto das famílias como num serviço mêdico-social e 
esse estudo foi apresentado em 5 diferentes cidades sem preo­
cupação alguma de se conhecer qualquer média ou aferir 0tra­
balho social nessas cidader, antes apenas com a ideia de pôr em 
destaque a melhor prática de trabalho social desde que estivesse 
então a ser usado e que não representasse casos excepcionais. 
Além destes casos analisados foram coligidas muitas entrevistas 
com trabalhadoras sociais, sendo todas cuidadosamente registadas. 
Dada a minha experiência no campo da caridade organizada foi 
a atenção principalmente concentrada no estudo da protecção à 
infância e nos centros de serviço mêdico-social.
Uma grande parte do material de demonstração tão larga­
mente utilizado na 11 Parte deste livro foi colhido no abundan­
tíssimo arquivo de notas e relatórios de entrevistas obtidas por 
estas duas ordens de relatórios (case readers), embora tenham 
sido aproveitadas notas, da prática (field memorandaj das minhas 
colegas da Repartição da Caridade Organizada da Fundação.
Como esta secção desde aue se fundou se tem sempre inte­
ressado pelo ensino do serviço social nas várias escolas de serviço 
social em que ele ê professado, começaram também a publicar-se 
fichas originais de casos que pudessem ser utilizadas nas aulas. 
Essas fichas eram impressas na íntegra, sem exclusão dos seus 
próprios erros, pois 0 trabalho malfeito é quase tão instrutivo
IX
PREFÁCIO
como q p o m, sendo entregues a um pequeno grupo de professores 
categorizados, que os empregavam nas suas lições.
As críticas e comentários, baseados nalguns destes relatórios 
e feitos por especialistas, foram-lhes depois acrescentados.
Ê muito mais fácil do que se pensa fazer a identificação do 
indivíduo a quem se refere uma dada ficha e por isso, para 
guardar o devido segredo, tornou-se esta publicação apenas 
conhecida das poucas pessoas que colaboraram na experiência; 
mas, embora limitada, foi nela que se colheu a maior parte das 
valiosas sugestões incluídas nestas páginas.
Conquanto a maioria dos problemas de diagnóstico social 
desafie a análise estatística e embora como um meio de conse­
guir obter apenas uma medida quantitativa grosseira de prefe­
rência relativa com que eram aproveitadas as diversas fontes de 
informação e colaboração, foi feito um breve estudo estatístico.
Um dos métodos também adoptados foi o de estabelecer 
ligação, por correspondência ou pessoalmente, com agentes do 
serviço social que tivessem transitado dum serviço social para 
outro, como, por exmplo, do trabalho nas famílias para o de 
protecção à infância, do de readaptação ao de observação ou ao 
mêdico-social, de modo a aprender a r mudanças de método e as 
modificações a introduzir na maneira de se exprimir quando 
varia a natureza do trabalho. Os métodos precedentes comple­
taram os dados da II Parte deste livro; e a selecção destes dados 
e a interpretação do que neles havia de significativo constituiu 
o trabalho de muitos anos, permitindo poupar muito tempo. 
Neste livro expÕem-se francamente os erros que foram encon­
trados, alguns deles resultantes de métodos que já se não usam; 
mas nem por isso deixou de convir pôr tais erros em foco para 
evitar que venham a repetir-se.
A respeito das várias modalidades de actuação para con­
seguir obter um diagnóstico social e no sentido de as poder des­
crever duma maneira bastante compreensível para uso diário das 
trabalhadoras sociais, ensaiámos uma outra forma de obter noções 
seguras, solicitando a vários especialistas que nos esclarecessem 
sobre o valor de certas perguntas que segundo sua experiência 
se tivessem mostrado úteis e dignas de figurar nos questionários 
de inquérito. Para isso dirigimos-lhes, uns longos questionários 
que transcrevemos na III Parte que, certamente, algumas pessoas 
não compreenderão bem e que todos julgarão um processo gros-
x
PREFÁCIO
seiro; mas não nos acorreu, a mim e aos meus colegas, outro 
modo de fornecer às trabalhadoras sociais, num relance vasto e 
rápido, o que lhes permita prover as possíveis necessidades que 
pudessem surgir nos diferentes casos.
Os questionários, como se vê, não foram todos feitos pela 
mesma pessoa e nalguns colaboraram trabalhadoras sociais do 
nosso serviço e outros de diversas instituições. As últimas prin­
cipalmente, foram redigidas com um fim experimental e para 
que, de tempos a tempos, sofram a introdução de noções novas, 
adquiridas nas diferentes fases do trabalho.
A mais difícil tarefa que se nos deparou consistiu na apre­
sentação da matéria que trata da Situação real averiguada, na 
I Parte, da máxima importância para a trabalhadora social que 
dela e da sua correcção tem de, permanentemente, se ocupar.
Quando o professor Hans Gross estava preparando o grande 
manual destinado aos funcionários judiciais da Europa pensou, 
de início, em que cada uma das suas partes fosse escrita por um 
especialista, tal como o médico, o fotógrafo, o armeiro, etc. Mas 
verificou logo que esses especialistas não vinham ao encontro da 
habilitação mais útil dos oficiais de justiça porque se confinavam 
às suas especializações e se alargavam em considerações técnicas 
muito exclusivas. Por isso Gross, embora declarando que por 
aquela forma se podia dar ao seu manual uma maior base cien­
tífica, foi obrigado a reduzir as suas ambições.
Ora, com uma preparação muito inferior à de Gross, que 
era um enciclopédico, tive eu de seguir o mesmo caminho e não 
teria chegado à meta sem o generoso auxílio que me prestaram, 
na crítica e na revisão das ideias, os especializados em técnicas 
e artes diferentes das minhas, como os do direito, psicologia e 
história. Tanto o professor }. H. Wigmor, decano da Escola de 
Direito da Universidade de Northwestern como o professor 
Lucy Salmon director da secção de História de Vassar, tiveram 
a amabilidade de nos esclarecer sobre certos capítulos. Devo 
agradecimentos muito especiais pelo valioso auxílio que tive da 
Sr.a Ada Eliott Sheffield, de Cambridge, Massachusetts, que não 
só leu e fez a crítica do original da I Parte deste livro, como tam­
bém elaborou algumas das tabelas que este contém e fez a revi­
são completa do trabalho a que deu colaboração directa em dois 
capítulos, pelo menos. Os conhecimentos adquiridos pela 
Sr.a Sheffield, tanto em trabalho social oficial como no das insti­
XI
PREFÁCIO
tuições particulares, tornaram duplamente valiosa a ajuda que 
nos deu.
Não posso agradecer individualmente às várias centenas de 
trabalhadoras sociais que responderam a cartas minhas, estudaram 
questionários, me emprestaram fichas e me prestaram auxílio por 
vários outros modos. Elas estão acostumadas a satisfazer tudo o 
que se lhes pede e até recebem os pedidos com verdadeira 
satisfação.
Mas não posso deixar de citar as minhas colegas na Fun­
dação, que coligiram dados para este livro, cujo primeiro origi­
nal ajudaram também a corrigir. Ã cabeça de todas figuram o 
Sr. Francis H. Mc. Lean bem como as Sr.as Hilbert Day e
H. S. Amsden. Muito grata fico também a Miss Margarida F. 
Byngton, Miss Carolina Bedford e a minha actual companheira 
Miss Mary B. Sayles.
Foi valiosa a contribuição recebida, em certa altura da 
colheita de material, da Escola de Filantropia e Civismo de 
Chicago e da Escola de Trabalhadoras Sociais de Boston.
Em 1914, como leitora da Escola de Filantropia de Nova- 
-lorque, servi-me já de elementos que naquele tempo reunira nas 
seis lições do Curso que lá fiz. Tive então ocasião de negar as 
qualidades de técnicos eficientes àqueles que apenas se ocupam 
em discutir os processos que se usam. Para se ser técnico do 
serviço social é necessário ter aprendido com um bom mestre 
como também possuir uma personalidade atraente e enérgica. 
Oualquer método de trabalho que despreze a individualidade da 
trabalhadora social é condenável, não só em serviço social como 
também no sentido, na arte ou em qualquer outra aplicação de 
esforço criador. Em nenhuma dessas ocupações os técnicos têm 
deixado de aproveitar os estudos feitos por outros e nunca pen­
saram que uma boa ordenação dos conhecimentos tirasse a ins­
piração.
Philipps Brooks disse uma vez dum certo tipode ministros; 
«Uma cabeça vazia quanto mais arde e brilha mais seca, estreita 
e oca se torna». Qualquer trabalhadora social que tivesse de com­
pilar dados provindos dum génio julgado original, desperdiçado 
em apreciar exemplos e técnicas, hesitaria em dizer se apaga mais 
fogo a trabalhadora social puramente inspirada ou a que desen­
volve a sua acção sem inspiração, exageradamente recostada em 
regras e fórmulas.
XII
PREFÁCIO
Àqueles que achem escassas as referências bibliográficas 
insertas nas várias páginas devo dizer que estas foram reduzidas 
porque se acha no fim do livro a citação de extensa bibliografia 
relacionada com o meu trabalho e acrescentarei que não são reais 
os nomes referidos nos casos de que se trata no texto e nos 
exemplos referidos neste livro.
Finalmente julgo que ninguém me acusará de deslealdade 
para com a corporação em que trabalho por não ter hesitado em 
apontar as suas deficiências em matéria de diagnóstico. Se essas 
mesmas deficiências impulsionaram o meu trabalho não poderia 
este ser levado a cabo se muitas trabalhadoras sociais não se 
tivessem desempenhado de missões dificeis e originais, vencendo 
dificuldades enormes. Se houver alguém com prática deste espe­
cial trabalho que, cheio de encargos e preocupações, seja tentado, 
depois de conhecer estas páginas, a pensar que os conselhos aqui 
dados são impraticáveis nas condições em que se desenvolve o 
trabalho que diariamente lhe caiba, pedimos-lhe, desde já, que 
em vez de discutir verifique antes se tais condições não poderiam 
ou não podem ser modificadas. Se esse alguém está porém seguro 
de que há qualquer falta da minha parte, quer por erro, quer 
por omissão, então que faça o favor de me escrever contando-me 
tudo o que entender. Tenho fortes razões para convidar os crí­
ticos a pronunciarem-se. Ninguém, melhor do que eu, sabe como 
a discussão deste assunto é tentadora. Na hipótese pouco pro­
vável, de se fazer nova edição deste livro muito gostaria de o 
tornar mais útil do que consegui desta vez, apesar dos grandes 
esforços que para isso empreguei.
Nova-Iorque — Abril de 1917.
M a r y E. R i c h m o n d .
XIII
NOTA DO TRADUTOR
V -/ «.Diagnóstico Social» de Mary Richmond tem vindo em cada reedi­
ção, na América, a estimular fortemente a prática do Serviço Social 
e a aperfeiçoar os respectivos métodos, porque, com o andar dos tempos, 
mais se tem consolidado a verdade dos pensamentos e conclusões que 
neste livro são apregoados.
Depois de larga e minuciosa experiência, a autora assenta em que 
ê pela análise profunda das relações sociais de cada caso que se fixará 
o rumo para se descobrirem as causas da incapacidade que o atormenta e, 
por consequência, a plataforma para se reduzir o mais conveniente tra­
tamento, quer este dependa duma actividade médica quer doutra, igual­
mente específica.
Este princípio quando proclamado pela autora, em 19 2 J, parecia 
então decerto excessivamente exagerado. Hoje, porém, já por ninguém ê 
discutido.
Até mesmo as designações que Mary Richmond criou, tais como o 
«caso», o «cliente», etc., se afiguram actualmente as mais racionais e 
apropriadas.
O ensino, que ela dita, quanto às razões gerais e às particularidades, 
a atender nos inquéritos exigidos pelo trabalho social, desde as que roçam 
por uma ingenuidade aparente até às de mais engenhoso critério, eviden­
cia uma penetração tamanha como a da verdade humana e social que a 
essas razões anima!
Livro muitíssimo judicioso, não se podia esperar que ele entrasse, 
desembaraçada e pormenorizadamente, no campo do tratamento social, 
visto que este derivará, na prática, dos recursos que o ambiente venha a 
facultar, em suas condições de variadíssima ordem, sociais, administrati­
vas, económicas, políticas, religiosas, culturais e consuetudinárias.
Mas, com toda a austeridade, insinua, pelos vários capítulos, os 
mais importantes pontos de vista que servirão de guia na escolha dos 
procedimentos para dominar a instabilidade social, em causa.
A tradução porfiou no respeito pela expressão e, quanto possível, 
pelo exacto termo ou qualificativo que a autora empregou.
Não se quis usar de maior liberdade visto que da própria constru­
ção da frase e da formulação estilística, diferentes da nossa língua embora, 
transparece com maior realce o escrúpulo e proficuidade dos conceitos, 
sobre que Mary Richmond desenvolveu as suas originais considerações.
F.
X IV
PREFÁCIO DA EDIÇÃO PORTUGUESA
ORIGENS, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
^ ^ E há designação moderna que tenha conseguido pleno sufrágio uni;
_ versai indiscutível e sido adoptada unanimemente em toda a parte 
sem hesitações devidas a motivos políticos, religiosos ou sociais, essa 
designação é a de Serviço Social. Da Inglaterra aos Estados Unidos da 
América, à Alemanha, à França, à Bélgica, à Holanda, à Suécia, à Dina­
marca, à Itália, à Áustria, à Hungria, à Rússia, à Bulgária, à Roménia, 
à Espanha, a Portugal, à Suíça, aos quatro cantos do mundo, da América 
do Norte à do Sul, à Ásia, à África e à Oceânia, em todas as latitudes e 
raças, o Serviço Social se espalhou como um rastilho benéfico e inteli­
gente, pela eficácia dos seus métodos, pela unanimidade com que foi 
apreciado e adoptado, por vezes entusiàsticamente.
Mas se a palavra e o seu prestígio obtiveram unânime sufrágio, 
outro tanto não pode dizer-se do conceito e da técnica, por vezes imper­
feitos, incorrectos, acanhados ou deturpados.
Ora para se realizar e compreender bem o Serviço Social o melhor 
meio consiste em seguir a sua génese histórica e a sua evolução.
Vejamos, pois, as origens do Serviço Social e quais as transforma­
ções por que ele passou até se fixar definitivamente o seu conceito e 
aplicações.
A História do Serviço Social pode dividir-se em quatro períodos:
1 .° — Origens pré-cristãs da verificação das necessidades do que 
hoje se chama o Serviço Social e esboço da técnica aplicável aos conceitos 
de então.
2.° — Orientação que o Cristianismo imprimiu à prática do Ser­
viço Social.
3.° — A origem da reacção no começo do Séc. xix e das experiên­
cias feitas desde então até 1899, de onde resultou o Serviço Social.
4.° — A fixação definitiva do conceito e da técnica e a expansão 
do Serviço Social em todo o mundo.
Vista a história das tentativas feitas para se realizarem as finali­
dades do Serviço Social, tal como ele hoje é compreendido, facilmente 
verificamos que nenhuma das suas definições atinge a perfeição lapidar 
que o considera como o modo de «fazer bem o Bem».
Em face duma necessidade e dum necessitado verifica-se através 
da história uma evolução de atitudes que podem assemelhar-se às que se 
observam comparando a ontogenia e a filogenia.
X V
OR IG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
Com efeito, parte-se em geral do simples para o complexo, das 
resoluções cómodas, fundadas em lamentações ou aparências, para a 
averiguação das realidades com probabilidades de se acertar, não rios 
limitando aos que nos procuram, tanta vez simuladores, mas procurando 
solicitamente os verdadeiramente necessitados, tantos deles ignorados e 
ocultos, pela paralisia, pela caquexia, pela doença, pela cegueira, pela 
tenra idade, pela loucura, pelo pudor ou pelo orgulho.
Sem discutir se a miséria poderá ou não acabar algum dia, como 
fazem certos utopistas que em geral pouco se comovem ou raciocinam 
em face dos necessitados, o Serviço Social procura, tal como o médico, 
apurar os sintomas, averiguar a etiologia, as causas, a patogenia, a evo­
lução lógica, firmar um diagnóstico, com compreensão nítida da modali­
dade da miséria ou falta que se depara e instituir um tratamento.
Para a maior parte da gente, hoje como nas épocas mais longín­
quas da história, o factor essencial é o económico, donde resulta a ilusão 
de que tudo se resolve com dinheiro.
O Serviço Social demonstra que, sem se dispensar este, evidente­
mente, alguma coisa há de mais importante, qual é a atenção e o estudo 
pormenorizado de cada caso, tal como o quefaz o médico em face dum 
doente. E que tal como seria cómodo, mas absurdo, pensar que para se 
tratar um doente basta o dinheiro, porque com ele se paga ao médico e 
ao farmacêutico, sem cuidar de saber antes se, quer um quer outro, são 
bons técnicos e sérios, assim também, quem queira valer a uma necessidade, 
tem de apurar qual a técnica a seguir, a seriedade dos técnicos e a soli­
citude que eles sejam capazes de pôr ao serviço do necessitado, não esque­
cendo que por vezes para se acabar com uma necessidade a acção tem de 
se exercer menos sobre ele do que sobre o meio que o cerca. Ora se o 
raciocinar sobre o problema da miséria e das múltiplas necessidades, 
materiais, mentais, morais ou sociais, não é coisa que, mesmo hoje, ocupe 
muita gente, antes p>ouoo tempo rouba mesmo às raras pessoas a quem 
tal assunto interessa, nada admira que este facto se verificasse tamberr 
na antiguidade.
*
* *
i.° Período — Na época pré-cristã havia já a preocupação de fazer 
«bem o Bem».
Conhece-se a prática de na Grécia e em Roma serem feitas distri­
buições de géneros aos necessitados, principalmente de pão. Sabe-se que 
se cuidava de organizar distracções públicas, espectáculos que o povo 
apreciasse, tais como as Olimpíadas, por exemplo, os espectáculos do 
Circo, etc., nos quais se reservavam lugares aos pobres.
Mas, ao organizarem-se essas distribuições, de géneros ou fichas 
de entrada nos espectáculos, verificou-se a necessidade de distinguir os 
verdadeiros pobres dos parasitas, preguiçosos e simuladores, fazendo-se 
listas prévias de pobres, depois de inquéritos feitos sem precipitação.
Estes inquéritos são já uma das preocupações do Serviço Social
X V I
O RIG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
moderno, embora não se possa limitar a eles a sua acção, como é tenta­
ção de tanta gente sem experiência ou preguiçosa, incluindo no número 
até certas agentes do Serviço Social.
Entre os judeus havia já também o hábito das visitas domiciliárias, 
a velhos, a doentes, a entrevados, levando-lhes a esmola que bastasse ou 
pelo menos minorasse as suas necessidades.
Aristóteles já dizia que as distribuições do que sobejava da admi­
nistração pública não resolviam a situação dos necessitados, pois não é 
possível encher-se um tonel esburacado, porquanto o auxílio para ser efi­
caz tem de ser permanente e não de acaso. O mesmo e outros filósofos 
gregos e latinos, entre os quais se distinguiram Platão, Séneca e Cícero, 
se ocuparam da sorte dos necessitados, não cuidando apenas da esmola 
material, mas de todo o auxílio justo, oportuno e humano.
No velho Egipto, cerca de 3.000 anos antes de Cristo, existiam já 
instituições em que se praticavam algumas das atribuições do Serviço Social 
moderno. Referimo-nos às Confrarias do deserto, que tinham como missão 
facilitar a marcha das caravanas, cuidando das fontes existentes nos oásis, 
de abrigos e alimentação para os viandantes e de tudo o que as circuns­
tâncias exigiam.
Os collegia romanos, os eranistas gregos e os guildes escandinavos, 
germânicos, persas, etc., eram instituições no género das confrarias, para 
auxílio mútuo e defesa profissional, quer dos direitos, quer do aperfei­
çoamento técnico e prestígio dos confrades, procurando estudar os pro­
blemas è exercer, em relação às épocas em que funcionavam, acção no 
género da reálizada pelo Serviço Social moderno.
Nos velhos hospitais da índia pré-cristã, tal oomo depois fazia 
S. Basílio no seu hospital da Cesareia e os muçulmanos, mais tarde, 
seguindo esta tradição, os doentes recebiam à saída um viático para a 
viagem e socorro para a convalescença.
2 .° Período — O início do Cristianismo distinguiu-se logo pela 
maior humanização dos costumes e a preocupação de justiça, principal­
mente para com os mais humildes.
Nos Evangelhos ensinava-se a prática das 14 Obras de Misericórdia, 
síntese perfeita da luta contra todas as necessidades humanas, não só 
materiais, tais como as referentes à alimentação, à mitigação da sede, ao 
agasalho com roupas e ao abrigo nas casas, à remissão dos cativos e visita 
a presos, ao tratamento dos doentes e ao enterro dos mortos, mas às men­
tais, morais ou sociais, como a de ensinar os ignorantes, dar bons con­
selhos, castigar (mas com caridade) os que errassem, consolar as pessoas 
aflitas, perdoar as injúrias, os erros e as injustiças com paciência e rogar
a. Deus pela sorte dos vivos e a paz dos mortos.
Entre as tarefas dos Apóstolos contava-se a de distribuir esmolas 
aos pobres. Dado porém que isso era mais fácil e elementar do que fazer 
compreender a essência do Cristianismo, tão diferente das doutrinas então 
em voga, foi resolvido, para poupar tempo a estes, encarregar sete pessoas 
de se ocuparem dessas distribuições, pessoas a quem se deu o nome de 
diáconos. O que provocou essa resolução foi o murmúrio das reclamações
i i X V II
O R IG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
de certos judeus nascidos na Grécia e que se julgavam prejudicados, nas 
distribuições, pelos nascidos na Palestina. Não tardou, porém, muito 
tempo que novos murmúrios surgissem, acompanhados de tal exaltação 
que um dos diáconos — Estêvão — foi morto à pedrada, vindo a ser o 
primeiro dos canonizados — Santo Estêvão.
Por maior que fosse o escrúpulo e justiça dos diáconos o sistema 
ressentia-se dos mesmos defeitos já apontados por Aristóteles. O neces­
sitado não o é apenas por, ele próprio, se julgar como tal e o remédio 
não pode consistir somente em distribuir coisas materiais, nem em dar 
a todos o mesmo ou o que cada um pretenda.
Logo nos primeiros tempos do cristianismo, nos meados do Século n, 
Hermas, irmão do Papa Pio I, sustentou no seu livro O Pastor que a 
esmola devia ser dada, sem hesitação nem averiguações, a toda e qual­
quer pessoa que a pedisse, ficando à consciência de cada um a justiça 
do pedido.
E claro que tal doutrina, aparentemente ortodoxa, dava lugar a 
tantos abusos e era incentivo a tanta ociosidade, preguiça e vícios con­
secutivos, que não prevaleceu.
Entretanto S. Paulo, Santo Agostinho, S. João Crisóstomo, S. Gre- 
gório Nisseno, S. Basílio, Santo Hilário, S. Gregório Nazianzeno, Santo 
Ambrósio, S. Jerónimo, entre outros, bem como os Concílios, fixaram e 
esdareteram a doutrina cristã no que diz respeito à prática da caridade, 
não a limitando à esmola material, mas a um conjunto de solicitude, aten­
ção, zelo, eficácia, oportunidade e carinho, que são aqueles que analisados 
modernamente nos seus mínimos pormenores de ordem material, psicoló­
gica, moral e social, constituem em última análise o Serviço Social.
E durante séculos foram essas normas seguidas rigorosamente. Sis- 
temàticamente? Sempre? Por toda a gente? Não, infelizmente, e as 
excepções tanto se verificaram entre gente culta como entre os ignorantes, 
entre poderosos ou ricos como entre pobres, entre leigos, como entre ecle­
siásticos, regulares ou seculares. Então surgiram sucessivamente reforma­
dores e doutrinadores, uns, como S. Francisco, com o seu exempld, 
abandonando todos os bens que possuía para viver como pobre, pregando 
o modo de vida que ele próprio seguia, dando-se inteiramente aos desafor­
tunados; S. Domingos, pregando o cristianismo por toda a parte, no qual 
ia a essência do melhor Serviço Social; S. Bento, mestre da caridade, e 
S. Bernardo, reformando a Ordem dos beneditinos, exigindo-lhes o 
regresso à austeridade e à prática da mais sã caridade.
O doutrinador máximo porém, o sistematizador de toda a doutrina 
e em particular jia caridade cristã foi S. Tomás de Aquino (1224-1274).
Desde o começo do cristianismo que se haviam organizado confra­
rias, cujo germe aliás, como vimos, já se encontrava entre os egípcios, 
os gregos, os romanos, os persas, os índios e os gauleses pré-cristãos.
Os membros das confrarias faziam visitas, inquéritos discretos, dis­
tribuições oportunas de esmolas, davam conselhos, reconciliavam desavin­
dos, realizavam, empiricamente embora, mas seguindo já determinações 
dos seus regimentos ou compromissos,muitas das atribuições do moderno 
Serviço Social. Mas, tal como sucedeu às ordens religiosas, tocadas pelos
XVIII
O R IG EN S, EVOLUÇXO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
abusos e pelas vicissitudes da sociedade em que viviam, as confrarias arre­
feceram, ou desinteressavam-se a cada passo da sua verdadeira missão.
Houve reformas, de tempos a tempos. Entre as mais notáveis, pois 
fez reviver em si o que de melhor e mais prático havia no cristianismo, 
podemos contar uma portuguesa, a que realizou no fim do Século xv, 
em 1498, a Rainha D. Leonor, mulher do Rei D. João II, o preparador 
das descobertas marítimas, ao reorganizar a confraria da Misericórdia de 
Lisboa. Além das confrarias brilharam igualmente, actuando de modo 
semelhante, as Ordens Terceiras de S. Francisco, de S. Domingos, da 
Santíssima Trindade, etc.
A par das instituições referidas houve sempre, evidentemente, 
quem, de modo individual, se ocupasse dos necessitados com inteligên­
cia e bom senso, oportunidade e carinho, características do Serviço Social 
moderno.
As lutas políticas e religiosas todavia prejudicaram através dos 
séculos a acção exercida.
Por vezes ao fazerem-se reformas ou atacarem-se erros, destruía-se, 
não só o que se pretendia, mas muita coisa boa que não havia motivos 
para se atacar.
Um dos exemplos mais frisantes da cegueira de certos ataques está 
na reforma de Lutero que, proclamando a supremacia da Fé e a pouca 
importância da Caridade para a salvação das almas, ao contrário das dou­
trinas de S. Paulo, Santo Agostinho e dos outros atrás referidos, desenca­
deou paixões e egoísmos de que resultou a desorganização da assistência, 
defeituosa embora, nos países onde mais influência directa ou indirecta 
exerceu, nomeadamente na Inglaterra e na Alemanha, imitados depois, a 
pouco e pouco, nos restantes países, incluindo os que não acompanha­
vam a Reforma e se diziam católicos.
Resultou daí a preocupação de reorganizar a assistência, em bases 
laicas, sob a égide dos Estados, preocupada, fundamental ou exclusiva­
mente, com as necessidades materiais. ________
Entretanto, em pleno período das lutas religiosas, desencadeadas 
pela Reforma luterana, um português, nascido em Montemor-o-Novo 
em 1495 e falecido em Granada em 1550, depois dum começo de vida 
de vagabundo idealista, sem rumo certo, desenvolveu, impressionado com 
o sofrimento alheio, uma acção individual calorosa, a princípio conside­
rada loucura, que o levou a ser vaiado, insultado e apedrejado pelo 
rapazio e por fim a ser internado num hospital como doido, mas a seguir 
a contagiar tanta gente, qual bola de neve, que criou legião imensa de 
prosélitos e imitadores. Esse homem, esse sublime louco, chamava-se João 
Cidade, figurando no agiológio com o nome de S. João de Deus. Não era 
culto, não era rico, não era padre e todavia arrastou atrás de si ricos, 
poderosos, cultos e membros da Igreja, com o exemplo da sua fé na cari­
dade, da sua acção a favor de toda a espécie de necessitados que dele se 
acercavam ou ele procurava, seguindo normas e princípios que fazem 
parte do Serviço Social moderno. Essa acção desenvolveu-se em Espanha 
e principalmente em Granada.
XIX
O R IG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
Ura século depois da Reforma, nos meados do Século xvii, surge 
em França uma reacção que provocou entusiasmo e admiração'"geral, 
inclusivamente em países protestantes.
Tal reacção foi a promovida por S. Vicente de Paulo, que fez renas­
cer o espírito das velhas confrarias cristãs tradicionais, pela acção directa 
dos leigos na prática da caridade organizada, com a visitação, para averi­
guar as realidades referentes a cada necessitado ou género de necessidade, 
e com estudo metódico de cada caso e acção inteligente para valer a cada 
forma de miséria.
No começo do mesmo século já um Bispo francês que havia de ser 
depois canonizado com o nome de S. Francisco de Sales, iniciara outra 
grande actividade inteligente, estimulando leigos a praticar a caridade, 
seguindo muitas práticas hoje adoptadas também pelo Serviço Social.
A repercussão da obra de S. João de Deus, de S. Vicente de Paulo
e de S. Francisco de Sales, foram imensas por toda a parte.
A par da acção dos religiosos regulares abria-se de novo caminho
à acção dos leigos, que continuavam entretanto a exercer as suas activi­
dades habituais na sociedade.
Muito da técnica por eles exemplificada, praticada e seguida pelos 
que os imitaram, representa do melhor que o Serviço Social moderno utiliza.
A Revolução Francesa entretanto fazia tábua rasa de tudo e procla­
mava princípios novos, entre os quais o do direito à assistência, a con­
trapor ao dever de todos a prestarem, individual ou colectivamente, 
isolada ou em instituições organizadas.
Foi no rescaldo das paixões desencadeadas pela Revolução Francesa, 
cujos princípios se estenderam a todos os países, que se gerou o Serviço 
Social moderno organizado.
3.0 Período — Desde que Lutero proclamou que a salvação das 
almas nada depende das Obras, mas apenas da Fé, chamando «epístola 
de palha» àquela em que S. Tiago afirma que é «morta a Fé sem as 
obras» pois é «um corpo sem alma», as populações dos países protes­
tantes, reflectindo o pensar dos homens que as governavam, foram dei­
xando a pouco e pouco, por vezes bruscamente mesmo, desorganizar as 
instituições de beneficência, tomando comodamente à letra as palavras 
do antigo monge Wittemberg. Por toda a parte, sem exceptuar muitos 
países católicos, se foi espalhando o conceito de que era possível fundar 
a sorte dos deserdados da fortuna no direito à assistência, ao mesmo tempo 
que arrefecia cada vez mais a inquietação geral dos espíritos pela sorte 
dos pobres, fruto de muitos séculos de cristianismo, que fundava a bene­
ficência no dever de toda a gente ter caridade para com os desgraçados. 
Por outro lado, a miséria material era a que mais preocupava, esque­
cendo-se cada vez mais os múltiplos aspectos das causas que a geravam, 
de ordem psicológica, individuais ou colectivas, de carácter transitório ou 
permanente, sintetizadas nos sete pecados mortais e exigindo para as 
combater, tanto quanto possível, antes de darem lugar a situações irre­
mediáveis, a prática das 14 Obras de Misericórdia.
XX
O RIG EN S, EVOLUÇXO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
As perturbações sociais, resultantes da transformação dos métodos de 
trabalho, devidas à organização industrial e verificadas de 1750 a 1850, 
deram lugar ao capitalismo moderno, com a preocupação crescente pelos 
aspectos materiais da existência humana, sem se atender, concomitante- 
mente, tal a ânsia de lucro, aos aspectos psicológicos e morais, tornando 
as classes menos favorecidas simples peças minúsculas da maquinaria, que 
bastava serem lubrificadas, como se não tivessem sensibilidade e digni­
dade dignas de respeito._____________________________________ _____
Õs operários, por seu turno educados no culto pelo lucro material, 
ou se tornavam por sua vez em patrões, com os vícios tradicionais dos 
que só olhavam aos proventos e aos prazeres dos sentidos que estes pro­
porcionam, ou se revoltavam, instigados por doutrinas mais ou menos 
utópicas.
Entretanto a maioria deles, e, principalmente, das pessoas das suas 
famílias, eram lamentavelmente esquecidos por uns e outros, pois o inte­
resse e a solicitude que exige o estudo do problema da miséria e da luta 
contra ela eram incompatíveis com o ideal de prazer, de bem-estar, de 
avareza ou inveja, desses patrões, de velha ou recente origem, e dos ope­
rários revoltados que lhes contestavam o direito a tais prazeres, muitos dos 
quais só os combatiam por deles não poderem beneficiar também, sem 
verem que, mesmo nos prósperos e poderosos, são igualmente reprováveis.
A questão social começou a preocupar muitos espíritos filantrópicos, 
cada qual preparando a sua solução, esquecendo-se todavia a maior parte 
deles de que «nem só de pão vive o homem» e que todas as revoluções 
sociais que apenas cuidam do bem-estar material, esquecendo oespiritual 
(qualquer que ele seja) e não sejam humanas, abrangendo a personalidade 
total, só dão lugar a degraus sucessivos de ambições crescentes, sempre 
insatisfeitas, porque quem obfcm uma regalia material, pretende quase 
sempre mais e, por ser insociável, é egoísta, só vendo os que já alcança­
ram maiores benesses, mas esquecendo a maioria, que nem sequer aloan- 
.çou, nem nunca alcançará, o que a cada um desses já parece pouco.
Foi a meditação, por muitos espíritos bem formados, generosos e 
inquietos, sobre os múltiplos aspectos da miséria e das suas causas que 
deu origem ao Serviço Social moderno.
Pretendeu-se com ele adaptar a beneficência eficaz à vida moderna 
resultante da industrialização e do aumento da população, não sendo uma 
organização religiosa, mas não sendo também anti-religiosa, aproveitando 
todas as boas vontades, onde quer que estivessem.
Tal como o médico que, ao pretender tratar racionalmente um 
doente, procura averiguar, antes de prescrever a terapêutica, as influên­
cias hereditárias, as causas directas e indirectas do mal-estar individual, 
ligando-as umas às outras até compreender as suas interdependências, 
assim também fizeram os que racionalmente meditaram, sem interesses 
pessoais ocultos nem espírito deformado por utopias, nem seduzido por 
panaceias cómodas de arquitectar, sobre os aspectos complexos e variá­
veis das causas da miséria, não só material, mas psíquica, e sua associação 
em mil hipóteses, que se combinavam entre si, tudo em busca duma 
actuação que fosse tão eficaz e oportuna quanto possível.
XXI
O R IG EN S, EVOLUÇXO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
É curioso que o movimento racionaiista que deu lugar ao Serviço 
Social moderno partiu paradoxalmente de países onde o conceito de 
Lutero originara as mais graves consequências, como se uma reacção con­
tra as suas palavras imprudentes pretendesse trazer uma reparação histó­
rica à luta contra a caridade tradicional.
Com efeito, esse movimento iniciou-se na Inglaterra, na Alemanha 
e nos Estados Unidos, partido de protestantes.
Não menos curioso é verificar que o autor que parece ter influído 
mais nessa racionalização foi o católico espanhol João Luís Vives, que 
em 1525, em Anvers, depois de escapar à ira de Henrique VIII, lançou 
as bases fundamentais do que podemos chamar a Renascença em matéria 
de Assistência, no seu livro De subvencione pauperum. Verifica-se mesmo 
o paradoxo de ter sido grande a influência de Vives nos países protes­
tantes ou de algum modo atingidos por ideais dos seus vizinhos, como 
a Alemanha, a Holanda, a Bélgica, a Inglaterra, a Suíça e a França, não 
se tendo feito sentir na sua pátria, a Espanha, nem em Portugal, onde a 
rèforma da assistência aliás se iniciara já nos fins do Século xv, antes do 
ilustre humanista de Valência ter nascido.
Seja como for, os primeiros elos da cadeia das ideias que levaram 
ao conceito e à organização do Serviço Social moderno têm de ser oonhe- 
cidos de quantos se interessam pelo problema.
Não cabendo nos limites marcados a estas palavras a discrimina­
ção dos seus trabalhos, nem sequer a síntese das suas ideias, não deixa­
remos, contudo, de apontar os nomes dos que os realizaram.
Já Montesquieu (1689-1755) mostrou no seu Espírito das Leis 
(Livro XXIII, cap. XV) os perigos que poderiam resultar para os trabalha­
dores e suas famílias, do desenvolvimento das indústrias. O Rev. Tomás 
Malthus, em 1798, proclamou, como se 'febe, no seu estudo famoso, o 
princípio de que as subsistências aumentavam em progressão aritmética e 
a população em progressão geométrica.
Todos os economistas que se lhe seguiram, glosando, deturpando e 
aproveitando essas conclusões, cada um conforme as suas ideias precon­
cebidas, puseram em foco o perigo que ameaçava a sociedade e princi­
palmente as classes pobres. Não faltaram os «planos salvadores» por toda 
a parte, bem ou mal-intencionados, nem os «defensores dos direitos dos 
necessitados».
A maior parte deles, todavia, não passarvam de retóricos-teóricos, 
embora alguns muito bem-intencionados.
Quase todos, porém, precisamente porque eram economistas e por 
então não se ter ainda analisado o valor material dos factores psíquicos 
e particularmente dos morais, limitavam a sua análise e as suas propostas 
de beneficiamento social apenas aos elementos materiais.
Entretanto, vão a pouco e pouco surgindo em vários países, obser­
vações, experiências, conceitos e propostas, seguindo um outro rumo. 
Muitos dos que os expunham ignoravam a existência dos outros. Só o 
tempo permitiu reunir esses dados dispersos.
Em 1816 John Brunnel Davis organizou um grupo de visitadoras 
no dispensário de protecção à infância que fundou em Londres. O Pas­
XXII
O RIG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
tor inglês Tomás Chalmers fez ver em Glasgow, em 1819, o valor dos 
«fundos invisíveis da caridade», revelado no auxílio mútuo prestado 
pelos pobres uns aos outros e na necessidade de a «caridade se tornar 
uma ciência, baseada na observação, tendo em vista fins sociais».
Foi enorme a influência de Chalmers, principalmente em Ingla­
terra, Alemanha e Estados Unidos.
Antes dele, já no séc. x v i i o francês Teofrasto Renaudot publicara 
em 1623 um Tratado sobre o direito dos pobres e já Benjamim Thompson, 
Conde de Rumford, inglês nascido na América, realizara, como ministro, 
em Munique, no último decénio do Séc. xvm, experiências inteligentes e 
práticas a bem dos necessitados.
A Higiene e a Educação eram postas ao serviço da Assistência, não 
limitando esta à distribuição de esmolas cegas. Foi este um dos princípios 
orientadores da plêiade de filantropos que desde o Séc. xvm pregaram 
esses princípios novos, que durante a Revolução Francesa levaram a 
experiências precipitadas ou utópicas, tendo como principal doutrinador 
La Rochefoucauld-Liancourt, e que o grande higienista francês F. E. Fodéré 
defendia também já no seu Ensaio histórico e moral sobre a defesa das 
Nações, publicado em 1825.
Em 1828 Edwin Chadwick, discípulo de Jeremias Bentham, que 
já no fim do Séc. xvm preconizara a criação dum Ministério da Saúde
Pública, iniciava a campanha que havia de notabilizar para sempre a
Inglaterra em tal matéria.
Em Paris o estudante Frederico Ozanam cria as Conferências de 
S. Vicente de Paulo, em 1833, cuja repercussão é bem conhecida de todos.
Na Alemanha, Amélia Sieveking organizou em 1832 associações 
de senhoras visitadoras de doentes e dos pobres, o Pastor Teodoro Fliedner, 
em 1836 , restaurou a instituição das diaconisas e em 1844 João Henrique 
Wichern e dos diáconos, tomando em 1848 a iniciativa de federar todas 
as obras protestantes alemãs.
Em 1845 Disraêli, depois Lord Beaconsfield, publicava o livro 
«Sibila, ou as duas Nações» em que descrevia o contraste entre a Ingla­
terra dos ricos e a dos pobres, pondo em destaque os seus conhecimentos 
sobre o problema e o seu talento, que mais tarde o haviam de tornar
notável, como Ministro da Rainha Vitória.
Daniel von der Heydt, na Alemanha, inicia em 1852 o sistema de 
Elberfeld, imitado por toda a parte, em vários países, com entusiasmo.
Em 1851 Florence Nightingale ( 1820-19 10 ) senhora da melhor 
sociedade inglesa, tendo conhecimento da instituição alemã de diaconisas de 
Kaiserwerth, foi ali passar três meses, indo a seguir estagiar em Paris com 
as irmãs de S. Vicente de Paulo, na Casa da Providência da Rua Oudinot.
Em 1854 partiu para a Crimeia onde iniciou a sua acção como 
reformadora da enfermagem e da administração hospitalar, o que a havia 
de imortalizar. Um dos segredos porém do êxito está em que a sua pre­
paração e as suas qualidades pessoais e até a sua categoria social anterior 
eram as que caracterizam as verdadeiras profissionais do Serviço Social 
moderno mais exigente, de que é considerada pioneira modelar por Mary 
Richmond.
X XIII
O R IG E N S, EVOLUÇXO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
Entretanto outras experiências permitiram pôr em destaque novas 
personagens e firmar conceitos.
Em 1859 WilliamRathbone, filantropo pertencente à seita dos 
Quakers, fundada no Séc. xvii nos Estados Unidos pelo sapateiro Jorge 
Fox e organizada pelo legislador William Penn e pelo teólogo Roberto 
Barclay, instituiu na Inglaterra, em Liverpul, o primeiro serviço de enfer­
meiras domiciliárias, tendo o apoio de Florence Nightingale.
Octávia Hill, orientada pelo famoso escritor John Ruskin, inicia 
em 1865, em Londres, uma acção social junto de inquilinos de três casas, 
propositadamente adquiridas por Ruskin para esse ensaio de educação 
familiar e social, ensaio que causou sensação pelos presidiados colhidos.
Eduardo Denison (1840-1870) — faz uma experiêritia no mesmo 
género, inspirada pelo mesmo Ruskin, noutro bairro de Londres, fazendo 
um verdadeiro apostolado social, ao mesmo tempo no campo da assis­
tência, da higiene e da educação.
O Pastor Samuel Barnett e sua mulher, cujo nome de solteira era 
Henriqueta Octávia Rouland, colaboradora de Octávia Hill, criam em 
Londres o Toynbee Hall, em 1884, verdadeiro centro de acção social, em 
memória do professor de Oxford Arnold Toynbee (1852-1883), grande 
educador dos meios operários.
Em 1875 começou a sua acção o grande orientador da assistência 
moderna e do Serviço Social inglês, Carlos Loch (1849-1923).
Na Bélgica o grande apóstolo e pioneiro do Serviço Social foi 
Eduardo Ducpétiaux (1804-1868).
Em 1890 o notável médico americano William Osler mandava 
os estudantes em Baltimore a casa dos tuberculosos para averiguarem 
as suas condições de vida e lhe permitirem um tratamento mais eficaz. 
O mesmo fizeram em Génova Eduardo Maragliano e o seu discípulo 
Luís Devoto.
O estímulo destes foi a pouco e pouco dando forma ao que se havia 
de chamar o Serviço Social.
A organização dos settlements e o ensino da técnica, metodicamente, 
firmaram de modo definitivo o conceito, dando origem a uma nova pro­
fissão em todos os países. Aos settlements ingleses dos meados do 
Séc. xix, correspondem os modernos centros sociais.
Desde que o francês Gerando, em 1839, classificou as causas da 
miséria e propôs o estudo da patologia e terapêutica da mesma fundadas 
na sua etiologia; que em 1889 C. F. Mallet, membro da direcção da 
Sociedade de Organização da Caridade, de Londres, defendeu a ideia da 
organização científica da beneficência; que em 1893 a mesma sociedade 
criou o seu primeiro curso com essa orientação; que em 1894 Richard 
Ely e P. W . Ayres criaram na América os primeiros cursos no mesmo 
género, respectivamente em Visconsin e Cincinnati, o interesse pela pre­
paração das agentes do Serviço Social manifestou-se por toda a parte.
4 ° Período — Eduardo Devine, secretário da Sociedade de Orga­
nização da Caridade de Nova-Iorque, fundada em 1882 por Josefina 
Shaw Lowell, organizou em 1898 um Curso de Verão, acudindo ao apelo
X X IV
O RIG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
feito na Conferência Nacional de Caridade e Correcção, realizada em 
Toronto, em que uma das mais notáveis trabalhadoras sociais de todos 
os tempos, Maria Helena Richmond, apresentou uma proposta para a cria­
ção duma Escola para o ensino da Filantropia Aplicada (Training School 
in Applied Philantropy). Esse curso deu origem em 1899 à Escola de 
Filantropia que mais tarde havia de passar a pertencer à Universidade de 
Colômbia, tomando em 1919 o nome de Escola de Serviço Social.
Ali ensinou Mary Richmond, com o Dr. Leonardo P. Ayres.
A primeira escola de serviço social organizada na Europa foi a de 
Amesterdão, também fundada em 1899.
No mesmo ano, em Berlim, foram iniciados cursos, por Alice Salo­
mon, que todavia só em 1908 conseguiu transformá-los também numa 
verdadeira escola.
A primeira escola de Serviço Social inglesa data de 1908, funcio­
nando na Universidade de Birmingham.
Em França foi fundada em 1911, por M.Iles Novo e Butillard a 
Escola Normal Social, católica, e em 1913, pelo Pastor Doumergue, a 
Escola Prática do Serviço Social, protestante, ambas elas em Paris.
Na América Latina a primeira escola foi fundada em 1925 em 
S. Tiago do Chile.
A seguir espalharam-se as escolas do Serviço Social por todo o 
mundo, em quase todos os países civilizados, contando-se já 200.
Mas a par das escolas foram fixados, precisamente em 1899, tendo 
como ponto de partida essas escolas, os tipos de instituições e principal­
mente os pormenores da técnica do Serviço Social.
Desde os primitivos settlements, em que, a par da inteligência e da 
caridade, se exigia cultura, tacto, boa educação e civilização, superioridade 
■moral e mental, enfim, ligados à modéstia, à simplicidade e à persistên­
cia, até à imensa variedade de instituições onde se encontram trabalhado­
ras sociais, é enorme a lista de obras em que estas podem exercer funções 
preciosas, da qual fazem parte os centros sociais, os centros de acção social, 
os centros de assistência social, os dispensários, os centros de saúde, os 
centros de serviço social, as casas do povo, logo que se organizem nesse 
sentido, etc.
A tendência para se procurar sempre uma sede para a acção, leva, 
todavia, a cada passo, a induzir em erro.
Ora o Serviço Social é, na verdade, menos uma instituição do que 
uma técnica, dispensando mesmo toda e qualquer instituição, pois actua 
onde quer que exista uma necessidade, física, moral ou social, na casa do 
necessitado, num hospital, ou até na rua, se for nela que este precisa de 
ser socorrido.
O Serviço Social não pode confundir-se com Assistência, embora 
os seus métodos tenham dado a esta, cada vez mais, uma orientação racio­
nal e progressivamente eficaz e humana.
A sua técnica aprende-se em escolas, sim, mas a orientação seguida 
nalgumas dessas escolas e a formação de certos dos seus professores, em 
todo o mundo, está longe de ser uniforme.
X X V
O R IG E N S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
Essa acção benemérita e inteligente partiu principalmente duma 
instituição devida à iniciativa particular, de Nova-Iorque, da Fundação 
Bussell Sage, e a sua impulsionadora e orientadora foi Mary Richmond.
Da obra enorme de Mary Richmond e dos seus colaboradores des­
taca-se o livro Diagnóstico Social (Social Diagnosis), agora publicado 
pelo Instituto Superior de Higiene Dr. Ricardo Jorge.
Por isso reconheceu-se a necessidade de fazer irradiar a acção peda­
gógica da melhor escola e da melhor técnica, de modo a conseguir-se dar 
cada vez mais unidade ao conceito e à prática do Serviço Social, utili­
zando-se para isso a imprensa, em livros, em revistas, em folhetos, em 
jornais noticiosos, etc.
Poucas vezes a imprensa terá tido um papel pedagógico-social 
mais útil.
MARY RICHMOND E A SUA OBRA E INFLUÊNCIA
Mas quem era Mary Richmond para que um livro seu possa mere­
cer tais louvores e tal confiança?
Qual a sua mentalidade e como foi educada? Quais foram os seus 
mestres e guias? Qual a sua obra escrita e qual a sua acção?
Seria longo dizê-lo em todos os pormenores, porquanto é vasta a 
documentação que lhe diz respeito.
Quanto à sua autoridade em matéria de Serviço Social bastará refe­
rir que todos os autores de categoria que se ocupam do assunto a citam 
como mestra, na América como na Europa. Na França e na Bélgica tive­
ram-na como guia dois dos que mais se distinguiram como pioneiros do 
Serviço Social e da Medicina Social, Armand Delille e René Sand, este 
último escolhido para presidir à reunião de médicos representantes de 
75 países que criou a Organização Mundial da Saúde.
Vejamos alguns dos traços essenciais da sua biografia.
Maria Helena Richmond nasceu nos Estados Unidos, em Belleville 
(Illinois), em 5 de Agosto de 18 6 1 . Pouco depois do nascimento foi com 
os ipais para Baltimore, donde estes eram naturais. Ali passou os anos 
da Guerra Civil, perdendo os dois ainda em pequena, um após outro, 
vitimados ambos pela tuberculose.
Tomou conta dela uma das avós e uma tia, uma e outra entusiastas 
das ideias liberais avançadas, ouvindo desde criança em casa discussões 
sobre o voto das mulheres, os problemas raciais, espiritualismo, luta con­tra a vivissecção e outros que então ocupavam os «radicais».
O entusiasmo da tia por essas ideias era tal que daí a anos se ocupou 
na revisão de provas numa casa editora de livros avançados.
Aprendeu a ler muito cedo, embora só fosse para a escola aos 
onze anos. Leu com entusiasmo Dickens, impressionando-se de tal modo 
com a sua morte, tinha ela nove anos, que o chorou horas inteiras, sem 
que ninguém a conseguisse consolar.
Caracterizava o seu espírito a agudeza e o sentido do humor.
Criada, embora, num meio avançado, não se deixou arrastar pelas 
paixões dos que a cercavam, para os quais era uma conservadora, embora
X X V I
ORIG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
os conservadores a considerassem, por sua vez, como radical. Era, eviden­
temente, o seu espírito ávido de justiça que a levava a não se satisfazer 
nem com o que bastava a uns nem a outros. Aos 10 anos, porém, já se 
sabia subtrair à influência dos que faziam mudar de opinião a cada passo 
lá em casa, à sua vista, pessoas bem mais velhas do que ela, pasmando 
com a facilidade com que se deixavam arrastar.
As ideias revolucionárias da família, que levavam esta a não acatar 
a pedagogia oficial, impediram-na de sofrer a influência do que de 
nefasto havia nela; mas o seu espírito precocemente crítico, mas senti­
mental, vibrando e impressionando-se com o que se passava à sua volta, 
fazia-a comparar o que lia com o que via na casa dos seus e o que ouvia 
discutir apaixonadamente, permitindo-lhe desenvolver esse espírito crítico 
e de observação, auto-instruindo-se e auto-educando-9e ao mesmo tempo, 
lendo tudo o que apanhava, influindo muito para o seu espírito uma 
amiga da tia que lhe emprestava livros, mas que não lhe entregava 
nenhum volume sem que ela lhe tivesse mostrado o resumo do anterior, 
O que certamente muito contribuiu para a treinar na redacção clara e 
lúcida das sínteses que mais tarde havia de fazer.
Num trecho de Sainte-Beuve, que um dia copiou, impressionou-a 
particularmente o método pedagógico, por ele citado, de se ler muito, 
discutir o que se lê, apreciar os companheiros e discutir a sua opinião, 
sendo corrigido por uma pessoa mais experiente tudo o que se pensava.
Foi criada no meio de pessoas já feitas e com personalidade, o que 
não a impedia, quando brincava com outras crianças, de tomar uma ati­
tude de-chefe.
Apesar da orientação que a família deu à sua instrução, ao termi­
nar aos 16 anos 0 seu curso numa escola de Baltimore era uma das alunas 
mais novas da sua classe. A professora de inglês que teve nesta escola 
incutiu-lhe hábitos de estudo e método que muito influíram no seu labor 
intelectual durante toda a vida.
Pouco depois de terminar o seu curso, em 1878, foi para Nova- 
-Iorque, onde sua tia se tinha empregado numa casa editora de obras 
revolucionárias, como já vimos.
Embora se empregasse em ocupações muito diversas, começou a 
fazer um pouco de tudo, revendo também provas, distribuindo tipo, e 
aprendendo estenografia, à nOite, depois de ter trabalhado 12 horas 
durante o dia. Vivia com a tia, modestamente, num quarto mobilado. 
A tia, porém, inutilizou-se fisicamente, passados alguns meses, regres­
sando a Baltimore onde viveu longos anos sustentada sempre por ela.
Ficando sozinha em Nova-Iorque, sem família nem pessoas amigas 
e com encargo de tanta responsabilidade, passou então os dias mais 
duros e difíceis da sua vida, mal alimentada e pobremente vestida, sem 
dinheiro para se poder distrair, lendo constantemente, no entanto, sendo 
a leitura a sua ún ca distracção. Teve sempre receio de vir a morrer com 
a mesma doença que lhe vitimou os pais. Eram justificados os seus 
receios, pois mais tarde, sendo-lhe feita uma radiografia, verificou-se que 
tinha sinais de ter tido tuberculose pulmonar, certamente adquirida 
durante os anos difíceis de Nova-Iorque.
X X V II
O R IG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
Começou, com efeito, a sentir-se muito doente, resolvendo pro­
curar o médico mais notável da especialidade, pedindo-lhe para lhe obser­
var os pulmões, dizendo-lhe logo lealmente que não tinha com que lhe 
pagar a consulta. Este observou-a atentamente, dizendo-lhe depois que 
tinha que deixar de trabalhar imediatamente e de ir para o campo. 
E como Mary lhe respondesse que isso lhe era impossível, deu-lhe então 
os mais minuciosos conselhos sobre alimentação, repouso, sono e exercí­
cios respiratórios, que ela seguiu com a sua habitual fidelidade. Deixou 
c quarto mobilado onde vivia em Bleecker Street, indo instalar-se em 
Brooklyn, de onde vinha todos os dias para o seu trabalho, de barco, 
fazendo no caminho exercícios respiratórios de manhã e à tarde.
Sobrevieram-lhe entretanto sezões apanhadas em Brooklyn e teve 
de desistir de ali continuar, indo para Baltimore.
Isto nos conta a sua biógrafa Joana Colcord, que lhe sucedeu 
como directora do Departamento de Organização da Caridade da Fun­
dação Russell Sage, a quem devemos os dados que aqui registamos.
Afirmando esta, porém, que se não conhecem dados biográficos 
sobre o período da doença de Mary Richmond; apenas os conseguindo 
obter depois de 1881, tudo leva a crer que o diagnóstico de sezões tenha 
sido errado ou, pelo menos, que, se as teve, elas tenham agravado o seu 
estado pulmonar, de resto prejudicado por certo com as viagens diárias 
de barco de Brooklyn para Nova-Iorque e os «exercícios respiratórios» 
feitos sabe Deus como, juntos a alimentação por certo deficiente.
O que é positivo é que de 1881 a 1888 trabalhou como guarda­
-livros em Baltimore num armazém de papel e a seguir num hotel, onde 
desempenhou já funções mais elevadas.
Educada, como vimos, um tanto ao acaso, num meio avançado, não 
tivera formação religiosa, não aceitando dogmas que a sua inteligência 
não podia compreender nem nada em que a sua sensibilidade não visse 
um fundo de beleza ou utilidade.
Durante este período, porém, da sua vida, sentiu necessidade de 
alguma coisa que o seu simples raciocínio e sensibilidade lhe não dava 
e aproximou-se espontaneamente da Igreja Unitária, entre cujos membros 
criou amizades e de quem recebeu estímulos vários, sendo-lhe reconhecido 
merecimento, pelo que lhe confiaram a regência dum curso na Escola
Dominical, em que revelou logo as suas qualidades pedagógicas.
Entretanto aprendeu música e aperfeiçoou a sua cultura.
A primeira iniciativa que levou a cabo foi a de organizar um clube 
literário. Tinha 21 anos, verificando-se nas palavras que então escreveu 
como já possuía uma curiosidade e espírito de análise dos factos fora do 
vulgar, a par da gratidão, pois deu ao clube o nome da sua professora 
de inglês, Miss Laura De Valin. O retrato que se conhece dela em rapa­
riga foi tirado em 1887, quando tinha 26 anos, a seguir à doença, quando 
o seu espírito começou a interessar-se pelo problema religioso. O cargo 
que desempenhava no Hotel Altamont, embora demonstrando a con­
fiança que merecia, era monótono para o seu «espírito impaciente». Não
tinha, contudo, por onde escolher. Naquela época a única profissão que 
se oferecia a uma rapariga nas suas condições era a de professora. Já vimos
X X V III
O RIG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
a sua especial vocação para o ensino e a atracção que sobre ela exerciam 
os problemas pedagógicos.
Foi nesta ocasião hesitante que viu um anúncio publicado pela 
Sociedade de Organização da Caridade de Baltimore, em que se pedia uma 
assistente que desempenhasse o lugar de tesoureira. Mary Richmond não 
conhecia então absolutamente nada sobre a finalidade e funcionamento 
de tal Sociedade. O interesse, porém, que logo lhe mereceu foi tal que 
não hesitou em ir, numa noite chuvosa, falar com o Presidente da Direcção 
da mesma, Carlos J. Bonaparte.
Anos depois dizia este que, ao vê-la, a achara ao mesmo tempo 
impressionantemente jovem pelo seu aspecto, mas tão ajuizada, no que 
dizia como se fosse já uma pessoa com larga experiência.
Assim era, na verdade. E dessa impressão, correspondente às suas 
reaiscaracterísticas, resultou o futuro rumo dado à sua vida. A tia deu­
-lhe o conselho, sem dúvida sensato, de não deixar o certo pelo duvidoso, 
o lugar que desempenhava no hotel por uma «coisa tão vaga».
Com efeito, quem é que em 1889 podia prever que o Serviço Social 
viria a ser uma coisa que não fosse vaga e indefinida?
A sua intuição, porém, levou-a a aceitar. Precisava, todavia, de se 
iniciar num trabalho para ela até então desconhecido.
Para esse fim resolveu ir passar uma semana a Boston, onde a nova 
técnica já era seguida nas «Caridades Associadas».
Assim fez, efectivamente, o que lhe permitiu pôr-se em contacto 
com um grupo de pioneiros, entre os quais sobressaía a secretária geral 
da instituição, Miss Zilpha Smith, que havia de vir a ser a sua melhor 
amiga desde a mocidade e a mais avisada conselheira pela vida fora.
A Sociedade de Baltimore tinha sido fundada em 1881 devido 
principalmente aos esforços de Daniel Gilman, primeiro reitor da Uni­
versidade de John Hopkins, cuja acção, como a do secretário geral Amos 
Warner, foi digna de elogios e modelar.
Não nos é possível neste lugar dar conta pormenorizadamente do 
entusiasmo e dedicação com que Mary Richmond desempenhou o seu 
cargo e das iniciativas que tomou, não só na Sociedade, como noutras 
instituições. A sua actividade dentro da Sociedade impô-la de tal modo 
à consideração de todos, que em 1891 foi eleita secretária geral da mesma. 
O seu prestígio ia crescendo de ano para ano. Em reuniões públicas, em 
relatórios, em artigos de revistas e jornais, por toda a parte as suas 
excepcionais qualidades de organizadora eram reconhecidas cada vez mais.
Mary Ridhmond, como diz a sua biógrafa, estava «a criar uma 
reputação nacional».
Nas diversas reuniões das Sociedades de Organização da Caridade, 
de que se fundaram na América 180 desde 1877 a 1907, rekcionou-se 
com as figuras mais categorizadas do movimento, entre as quais sobres­
saíam Josefina Shaw Lowell, fundadora da Sociedade de Organização da 
Caridade de Nova-Iorque, e Carlos Loch, o grande chefe do moderno 
movimento da caridade em Inglaterra.
Os artigos e os discursos que fez prepararam a opinião pública 
para os passos fundamentais do Serviço Social, um dos mais importantes
XXIX
OR IG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
dos quais foi a criação da primeira Escola de Serviço Social em Nova- 
-Iorque. Merecem leitura atenta esses trabalhos, reunidos no volume 
The Long View, publicado pela Fundação Russell Sage em 1930.
De tal modo se impôs como secretária geral da Sociedade de Bal­
timore que, em 1895, foi convidada para secretária auxiliar da sua con­
génere de Nova-Iorque, cargo que não aceitou, apesar de bem remune­
rado. Criara já, então, uma reputação nacional, duma verdadeira «chefe 
do Serviço Social».
Em 1897 proclamou em Toronto, como vimos, a necessidade de se 
criar uma escola profissional de Serviço Social, tendo a satisfação de ver 
realizada a sua ideia no ano seguinte em Nova-Iorque.
Entretanto, era tal a admiração que as Sociedades de Organização 
da Caridade tinham pela «brilhante jovem secretária geral» da de Balti­
more, que a Sociedade de Filadélfia convidou-a a ir ali ocupar o mesmo 
cargo, para remodelar os seus serviços.
Aceitou Mary Richmond o honroso convite, tanto mais que deixava 
a de Baltimore próspera e bem orientada e em Filadélfia havia muita 
coisa a fazer a bem da causa da caridade, cujo movimento se iniciara ali 
em 1878, ao ser criada a Sociedade a que ela ia dar vida nova como 
Secretária Geral.
£ impossível reunir em poucas páginas tudo o que ela realizou em 
Filadélfia, de 1900 a 1909.
Desde a remodelação dos escritórios, modemizando-os e tornando 
mais rendoso o seu trabalho, à reorganização das actividades caritativas; 
da organização de reuniões e congressos ao estudo dos problemas mais 
difíceis e transcendentes; desde os artigos e discursos até aos cursos sobre 
a prática do Serviço Social, realizados em Filadélfia e em Nova-Iorque, 
em cursos de férias ou em cursos regulares, entre os quais um na Uni­
versidade de Pensilvânia; da colaboração em campanhas contra as casas 
insalubres, a favor da infância, sob vários aspectos, da higiene mental, 
da expansão das instituições sociais, entre as quais as creches, etc., a sua 
actividade durante os dez anos passados em Filadélfia foi prodigiosa, 
tendo de vencer a resistência da rotina, do cepticismo, da vaidade, da 
preguiça, da falta de cultura e de inteligência ou da maldade dos que não 
compreendiam o que era o Serviço Social.
Não deixou, entretanto, de aumentar a sua cultura literária com lei­
turas, nem a musical, ouvindo concertos, nem a social, convivendo com 
pessoas amigas, artistas, literatos, etc.
Em 1902 foi a Cuba a um congresso e no verão de 1903 a Ingla­
terra, onde visitou Carlos Loch, Bosanquet e as respectivas esposas, e 
uma irmã de Octávia Hill, lamentando não ter podido visitar a «decana 
das trabalhadoras sociais inglesas», indo observar atentamente o funciona­
mento dos «settlements», bem como de casas de trabalho e outras insti­
tuições, assistindo a sessões várias, sem deixar de admirar em Londres e 
na Escócia, a par das paisagens dos percursos, os museus e monumentos, 
assistindo a concertos, juntando o útil ao agradável.
A sua actividade durante esses dez anos não lhe permitiu escrever 
tanto como desejava e conseguiu fazer noutras épocas da sua vida. Come­
XXX
O RIG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
çou, todavia, um livro dedicado ao Serviço Social nas famílias, que não 
chegou a terminar, mas cujos capítulos incluiu em parte no «Diagnós­
tico Social».
Em 1907, porém, publicou um livro que causou sensação e foi 
«àvidamente adquirido pelas trabalhadoras sociais», O bom vizinho na 
cidade moderna, em que mostrava ao público, em termos simples, 0 que 
era o Serviço Social e qual a sua utilidade, ao mesmo tempo que expli­
cava o modo como qualquer pessoa pode colaborar no Serviço Social ou 
utilizá-lo, bem como aos recursos da sua comunidade.
Em Filadélfia foi feita uma edição especial de 10 mil exemplares 
do Bom vizinho que foram distribuídos por padres, médicos, professores, 
juizes, advogados, oficiais da polícia, magistrados e outras entidades ofi­
ciais da cidade.
O prestígio alcançado pela sua acção em Filadélfia tornou-a, como 
vimos, em breve, «uma figura nacional no campo da organização da cari­
dade». Foi esse prestígio que fez com que fosse escolhida pela Fundação 
Russell Sage para directora do Departamento de Organização da Caridade 
da mesma Fundação.
A FUNDAÇÃO RUSSELL SAGE
Mas o que é a Fundação Russell Sage? Quem a criou? Quais as 
suas funções? Que papel desempenhou nela Mary Richmond?
É o que agora vamos resumir em breves palavras, em que vai 0 
nosso reconhecimento à sua actual direcção por nos ter tão generosamente 
autorizado a edição portuguesa do Social Diagnosis, e oferecido os dois 
volumes em que se relata a sua história, e, ao mesmo tempo, o volume 
Vistas largas (The Long View) em que, inteligente e piedosamente, se 
reuniram 69 artigos e relatórios de Mary Richmond, escritos desde 1882 
até 1927, ao canto do cisne da prestigiosa pioneira do Serviço Social que, 
no ano seguinte, em 12 de Setembro de 1928 havia de deixar de perten­
cer ao número dos vivos, depois de dar à Fundação Russell Sage 19 anos 
de esforços dedicados e inteligentes e ao Serviço Social o brilho do seu 
talento, do seu entusiasmo, do seu exemplo e do seu saber, assente na 
experiência e no estudo constante e escrupuloso.
A Fundação Russell Sage é uma das muitas instituições particulares 
que na América têm sido criadas por milionários, individualmente ou 
agrupados, destinadas a investigação científica no campo das Ciências 
puras ou aplicadas, do ensino, da educação, da defesa da saúde, da 
Higiene, da Sociologia, etc., entre as quais citaremos a Fundação Rocke­
feller, criada em 1913, a Universidade de ]ohn Hopkins, de Baltimore, 
instituída em 1876, o Milbank Memorial Fund, em 1905, o Common­
wealthFund, em 19 18 , a Cruz Vermelha Americana e a Liga das Socie­
dades da Cruz Vermelha, que receberam grande impulso em 1919, depois 
de postas à prova durante a Grande Guerra de 1914-18, entre mui­
tas outras.
XXXI
O R IG EN S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
O ensino da Medicina e em particular da Medicina Social, da 
Higtene, da Enfermagem e do Serviço Social preocupou em graus dife­
rentes todas elas, algumas notavelmente.
*
* *
A Fundação Russell Sage foi instituída em 1907 em Nova-Iorque. 
No ano anterior tinha ali falecido, depois de uma longa vida de trabalho, 
aquele cujo nome foi dado à instituição.
A sua viúva, Margarida Oiívia Sage, ao tomar conta da grande 
fortuna, de 65 milhões de dólares, que ele lhe deixara, resolveu fechar os 
ouvidos às inúmeras sugestões que lhe fizeram e aos pedidos que lhe 
dirigiram em vinte mil cartas e num sem-número de apelos verbais, pre­
ferindo criar uma instituição à memória do seu marido e que tivesse uti­
lidade maior e mais persistente. Tinha 78 anos, fora pobre em solteira e 
vivera sempre, já depois de rica, com a maior simplicidade. Sempre pru­
dente e poupada, quis ouvir pessoas entendidas que a pudessem orientar. 
Foram elas: Roberto Forest, que desde 1888 presidira à Sociedade de 
Organização da Caridade de Nova-Iorque, Daniel Gilman, um dos orga­
nizadores e primeiros impulsionadores da Universidade de John Hopkins, 
de Baltimore, e da Sociedade de Organização da Caridade da mesma 
cidade, John Glenn, autoridade em assuntos de assistência e de Serviço 
Social, ligado a várias instituições de caridade, oficiais e particulares, e 
Jeffrey Brackett, fundador e director da Escola de Trabalhadoras Sociais 
de Boston.
Concordaram em que conviria criar uma instituição para «estudo 
das causas da ignorância, da pobreza, do vício e do crime e modo de os 
combater», trabalhando tanto «no campo da filantropia curativa como 
preventiva, tendo em vista aumentar os conhecimentos que permitam 
ajudar a diminuir as necessidades e as doenças», sendo o principal objec­
tivo a investigação e, a seguir, a educação, conseguida principalmente por 
meio de publicações.
Margarida Sage concordou com o plano, pois preferia uma funda­
ção destinada a «melhorar as condições sociais e a beneficiar o modo de 
vida das classes operárias, proporcionando-lhes casas e ambiente mais 
saudável e confortável e uma vida mais feliz, dando-lhes mais garantias 
e em particular às crianças».
Além das finalidades projectadas, a Carta da Russell Sage Founda­
tion incluía o «estabelecimento e manutenção de actividades de caridade 
ou beneficência, agências e instituições, bem como o auxílio a quaisquer 
outras actividades, agências ou instituições já existentes».
A administração da Fundação ficou a cargo de nove membros, 
entre os quais a instituidora e os que lhe haviam dado os seus conselhos.
A verba destinada pela Senhora Sage à Fundação foi de dez milhões 
de dólares.
Sai dos limites marcados a estas palavras a descrição dos passos
XXXII
O R IG EN S, EVOLUÇÃO É CONCEITO DO SER V IÇ O . SOCIAL
da Fundação Russell Sage até hoje. A sua história merece ser lida por 
quantos se interessam pelos problemas sociais e em particular pela sorte 
dos pobres e pelo Serviço Social.
São inúmeros os ensinamentos que se colhem nessa história, fácil 
de ler nos dois volumes que, com o título de Russell Sage Foundation — 
1907-2946 foi publicado, da autoria de John Glenn, Lilian Brandt e 
Emerson Andrews.
Durante o período que foi de 1907 a 1946, gastaram-se na Fun­
dação vinte e um milhões de dólares.
A instituidora faleceu com 90 anos, em 4 de Novembro de 19 18 , 
deixando a instituição em pleno funcionamento.
Quando assistira à primeira sessão do Conselho de Administração 
da obra, doze anos antes, dissera e la :— «Estou com perto de 80 anos 
e sinto, apesar disso, que é agora que começo verdadeiramente a viver».
Foi para dirigir uma das secções desta Fundação que Mary Richmond 
foi convidada em 1909 — o Departamento de Organização da Caridade.
Além desta havia outras secções, tais como as de Protecção à Infân­
cia, Higiene Infantil, Legislação a favor da Infância, Estudos sobre Cré­
dito aos Consumidores, Delinquência e Penologia, Editorial, Educação, 
Estudos Industriais, Biblioteca, Expansão dos Campos de Jogos, Publica­
ções, Recreios, Caixas de Empréstimos a juros módicos, Legislação Social, 
Administração do Serviço Social, Interpretação do Serviço Social, Anuá­
rios do Serviço Social, Estatística, Estudos Profissionais, Inspecção, Pro­
paganda, Trabalho das mulheres, etc.
*
* *
Ê impossível resumir em breves palavras a prodigiosa actividade de 
Mary Richmond em Nova-Iorque, ao serviço da Fundação Russell Sage.
Quando para ali foi tinha 48 anos. A sua cultura, a sua experiên­
cia e as suas qualidades de inteligência, trabalho, dedicação, método, ener­
gia e fé nos resultados do seu esforço generoso e digno tornaram-na uma 
estimuladora excepcional, uma profissional inigualável.
Entretanto tinha uma saúde precária, sofrendo duma bronquite 
crónica que a obrigava a escolher um clima suave para passar as suas 
férias, fugindo ao clima, para ela péssimo, de Nova-Iorque, e tendo 
mesmo de deixar uma casa de campo que tinha em Catskills, onde 
sossegadamente escreveu, enquanto lá ia repousar, grande parte do seu 
livro de mais responsabilidade, o Diagnóstico Social.
A elaboração deste livro, que começou a planear em Baltimore e de 
que escreveu já alguns capítulos em 1902, obedecera à ideia em matéria 
nele às jovens colegas o modo de darem os primeiros passos em matéria 
de Serviço Social.
O seu plano foi depois modificado. Era tal a soma de elementos 
que reunira para a primeira parte — a semeiologia e o diagnóstico — que 
o tratamento teria de ocupar outro livro.
t u XXXI11
O R IG E N S, EVOLUÇÃO E CONCEITO DO SERVIÇO SOCIAL
Isto não quer dizer que o Diagnóstico Social não venha cheio de 
ensinamentos sobre terapêutica social. O livro destinado particularmente 
a esta terapêutica social não chegou a terminá-lo a sua autora.
No What is Social Case Work encontram-se, todavia, os princípios 
e exemplos práticos fundamentais da terapêutica seguida por Mary 
Richmond, como se encontram preciosas sugestões nos seus outros livros 
e nos artigos reunidos no volume The long View, publicado pela Fun­
dação Russell Sage em 1930.
Desde 1909 até 1917 a publicação do Diagnóstico Social foi para
Mary Richmond uma ideia fixa, dedicando-lhe cerca de 23 % do seu
tempo de trabalho durante largo período.
A sua actividade era enorme. Só um método seguro e uma vontade 
de ferro poderiam permitir-lhe uma vida assim intensa.
Dava aulas em Chicago, em Boston e Nova-Iorque, dedicando duas 
semanas por ano às da primeira, uma às da segunda cidade e dando lições 
duas vezes por semana, durante três meses, em Nova-Iorque.
No Instituto de Organização da Caridade desta última, fazia con­
ferências, orientava alunas para as realizarem por sua vez também, assis­
tia a muitas feitas por outras pessoas, dirigindo estágios, etc.
Publicava e dirigia a publicação de livros, revistas, artigos e folhetos 
de propaganda do Serviço Social e dos seus métodos. Fazia a sua corres­
pondência diária, metodicamente, tornando-a num foco de propaganda 
dos mesmos métodos e estimulando, não só na América como em diversos 
países, a sua expansão, atendendo por igual motivo visitas de inúmeras 
pessoas, a quem esclarecia e orientava.
Além disso, ocupava-se de toda a espécie de actividades subsidiá­
rias inesperadas, que a obrigavam a deslocar-se, para assistir a conferên­
cias, congressos, reuniões, etc.
A sua precária saúde pouco a deixava sair à noite. Para se distrair 
e aliviar o espírito das ocupações exaustivas diárias teve a coragem, aos 
50 anos, de receber lições de piano, que aprendera em rapariga, mas a 
sua vida intensa não lhe permtira cultivar. E aos serões o piano, entre­
meado com a leitura e a conversa de amigas, entretinha-lhe o espírito, 
que cultivou até morrer.
O trabalho

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