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MANUAL TECNOVIGILANCIA 2021 v4

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MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA: 
Uma abordagem sob a ótica da 
Vigilância Sanitária
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Gerência-Geral de Monitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária
Gerência de Tecnovigilância
Brasília – DF
2021
Manual de Tecnovigilância: 
Uma abordagem sob a ótica 
da Vigilância Sanitária
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Brasília – DF
2021
Gerência-Geral de Monitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária
Gerência de Tecnovigilância
2021 Agência Nacional de Vigilância Sanitária. 
Tiragem: 1ª edição revisada e ampliada – 2021 – versão eletrônica
Elaboração, distribuição e informações:
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Gerência-Geral de Monitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária
Gerência de Tecnovigilância
SIA Trecho 5, Área Especial 57, Bloco D, 1º Andar
CEP: 71205-050 – Brasília/DF
Tel.: (61) 3462-5444
Site: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/
fiscalizacao-e-monitoramento/tecnovigilancia
E-mail: tecnovigilancia@anvisa.gov.br
Apoio:
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
Gerência Regional de Brasília - GEREB
Programa de Evidências para Políticas e Tecnologias em Saúde (PEPTS)
Fonte de financiamento: TED: 005/2016 Ações para apoio à Governança 
Regulatória de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária
Coordenação-geral e organização:
Maria Glória Vicente
Maria da Graça Sant Anna Hofmeister
Margarete Martins de Oliveira
Elaboração:
Ana Clara Ribeiro Bello dos Santos
Ana Paula Siqueira Silva de Almeida
Anderson Silva de Oliveira
André Anderson Carvalho
Antonio Alfredo Rodrigues e Silva
Carlos Henrique Pereira Mello
Carlos Rodrigo de Mello Roesler
Christiane do Prado Norcia
Christiane Trigueiros Macedo
Clarice Alegre Petramale
Cláudio Maierovitch Pessanha Henriques
Cleide Felicia de Mesquita Ribeiro
Eduardo Jorge Valadares Oliveira
Elaine Koda
Eliza Midori Yagyu
Emanoel Bonfim Santos Galvão
Emilia de Santana Sena
Enio Roberto Matui
Evelinda Marramon Trindade
Fernanda Louise Voos
Francisco de Assis Souza dos Santos
Francisco Faloci Neto
Geraldo Lucchese
Gonzalo Vecina Neto
Haylander Kruell Loregian
Heiko Thereza Santana
Hélio Bomfim de Macêdo Filho
Janaina Dallas C. B. K. Fonseca da Silva
Jerusa Seixas Guimarães Reis
Katia Regina da Silva
Katia Shimabukuro Donath
Keila Fernanda Guerra Silva
Leticia Seixas Prata da Fonseca
Leylane Porto Bittencourt
Luana Teixeira Morelo
Luis Antonio Glowacki
Luiz Carlos Fonseca e Silva
Magda Machado de Miranda Costa
Marcelo de Moraes Antunes
Márcia Cristina de Moraes Reis Ribeiro
Maria de Lourdes de Oliveira Moura
Maria Glória Vicente
Mariana Pastorello Verotti
Mary José Campos Romero
Michele Feitoza-Silva
Patrícia Fernandes da Silva Nobre
Rafael Gomes Fernandes
Raymund Hans Huttner
Rita de Cássia de Jesus Rocha
Roberto Costa
Rodrigo Fortes Lopes
Rodrigo Maximiano Antunes de Almeida
Rosana Carvalho Esteves
Rosângela de Souza N. Seixas
Stela Candioto Melchior
Thiago Rezende Pereira Cunha
Vilma Isoko Inamini
Vivian Cardoso de Morais Oliveira
Walfredo da Silva Calmon
Wanda Lycia Amaral Carvalho
Revisão técnica:
Maria da Graça Sant Anna Hofmeister
Maria Glória Vicente
Stela Candioto Melchior
Maíra Catharia Ramos
Margarete Martins de Oliveira
Colaboração:
Flávia Tavares Silva Elias
Sheila Martins Cordovil
Revisão ortográfica e de normalização:
Lucas Giron
Tikinet
Capa, projeto gráfico e diagramação:
Daniela Botelho
Saúde Conecta
Ficha Catalográfica
_________________________________________________________________________________________________________________
Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
 Manual de tecnovigilância : uma abordagem sob ótica da vigilância sanitária [recurso eletrônico] / Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 
Gerência-Geral de Monitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária, Gerência de Tecnovigilância. – Brasília : Agência Nacional de 
Vigilância Sanitária, 2021. 
 1046 p. : il.
 Modo de acesso: World Wide Web:
 ISBN 978-65-897012-02-6
 1. Vigilância Sanitária. 2. Vigilância pós-comercialização. 3. Tecnovigilância. I. Título.
CDU 616.7 
_________________________________________________________________________________________________________________
Catalogação na fonte – Coordenação-Geral de Documentação e Informação – Editora MS – OS 2021/0000
Título para indexação:
Medical Devices post-market surveillance guide. A health surveillance based approach
Esta obra é disponibilizada nos termos da Licença Creative Commons – Atribuição – Não Comercial – 
Compartilhamento pela mesma licença 4.0 Internacional. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, 
desde que citada a fonte.
4
PREFÁCIOSUMÁRIO GERAL
APRESENTAÇÃO 5
PREFÁCIO 7
UNIDADE 1: O SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA 13
 Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil 14
 Capítulo 2: A criação da Anvisa: Um importante marco para a vigilância 
sanitária no Brasil 62
 Capítulo 3: Bases legais e técnicas da vigilância sanitária de dispositivos médicos 73
 Capítulo 4: Segurança sanitária de produtos para saúde 166
UNIDADE 2: TECNOVIGILÂNCIA COMO PRÁTICA DE SAÚDE PÚBLICA 191
 Capítulo 1: Tecnovigilância no cenário internacional 192
 Capítulo 2: Histórico e organização da tecnovigilância no Brasil 226
 Capítulo 3: Tecnovigilância no contexto do Sistema Nacional de Vigilância 
Sanitária: A experiência do estado da Bahia 267
 Capítulo 4: Tecnovigilância no contexto do Sistema Nacional de Vigilância 
Sanitária: A experiência do estado do Rio de Janeiro 281
 Capítulo 5: Notivisa: Sistema de notificações para a vigilância sanitária 303
 Capítulo 6: Ação de campo de dispositivo médico 346
UNIDADE 3: PROCESSOS RELEVANTES PARA TECNOVIGILÂNCIA 408
 Capítulo 1: O processo de regularização de dispositivos médicos no Brasil 409
 Capítulo 2: Boas práticas de fabricação de dispositivos médicos e interfaces 
com a tecnovigilância 447
 Capítulo 3: Certificação de materiais de uso em saúde como estratégia de 
garantia de sua segurança e eficácia 460
 Capítulo 4: Certificação de equipamentos eletromédicos como estratégia de 
garantia de sua segurança e eficácia 487
 Capítulo 5: Processamento de dispositivos médicos 514
 Capítulo 6: O rito sanitário da coleta e análise fiscal: Dos aspectos legais à 
realidade brasileira 540
5
UNIDADE 4: TECNOVIGILÂNCIA COMO ESTRATÉGIA PARA SEGURANÇA DO PACIENTE 562
 Capítulo 1: Segurança do paciente e qualidade em serviços de saúde 563
 Capítulo 2: Hospitais Sentinela como observatório estratégico do 
comportamento de dispositivos médicos no Brasil 596
 Capítulo 3: Implementação da tecnovigilância em estabelecimentos de saúde 619
 Capítulo 4: Aquisição qualificada de materiais de uso em saúde 643
 Capítulo 5: Metodologia para subsídio à tomada de decisão baseada em 
evidências nos processos de incorporação e aquisição de equipamento 
médico assistencial sob regime de vigilância sanitária 676
 Capítulo 6: Gerenciamento de equipamentos para saúde: Da aquisição ao descarte 714
 Capítulo 7: Segurança no uso de conectores: Responsabilidade dos fabricantes, 
usuários e autoridades de saúde 763
 Capítulo 8: Usabilidade de dispositivos médicos e suas interfaces com a segurança 
do paciente 793
 Capítulo 9: Registro nacional de artroplastias: Um avanço necessário para a 
ortopedia no Brasil 815
UNIDADE 5: TECNOVIGILÂNCIA NAS EMPRESAS 834
 Capítulo 1: Implementação da tecnovigilância em empresas 835
 Capítulo 2: Gerenciamento de risco de dispositivos médicos e interfaces com a 
tecnovigilância 859
 Capítulo 3: Monitorização pós-comercialização como estratégia para aprimorar a 
segurança e eficácia de dispositivos médicos 882
UNIDADE 6: PRODUTOS IMPLANTÁVEIS 912
 Capítulo 1: Principais produtos implantáveis utilizados em ortopedia e traumatologia 913
 Capítulo 2: Dispositivos médicosimplantáveis utilizados em cardiologia: Destaque 
para marca-passos e cardioversores 950
UNIDADE 7: PRODUTOS INOVADORES 973
 Capítulo 1: Tendências no desenvolvimento e uso de dispositivos médicos 974
 Capítulo 2: Dispositivos médicos desenvolvidos de forma personalizada 1008
 Capítulo 3: Cibersegurança: Um desafio para regulação de dispositivos médicos 1023
SUMÁRIO GERAL
6
PREFÁCIOAPRESENTAÇÃO
A rapidez com que as tecnologias evoluem e são incorporadas pelos diversos segmentos 
produtivos e de prestação de serviços impacta sobremaneira o dia a dia e contribui, 
inclusive, para as constantes mudanças em nossos hábitos.
No campo da saúde, também experimentamos mudanças importantes que afetaram 
a atenção à saúde prestada à população, seja pela introdução de novos produtos para 
prevenção, diagnóstico e tratamento das mais diversas condições de saúde, seja pela forma 
como essas tecnologias são incorporadas pelos sistemas de saúde – público ou privado. 
Assim, ao mesmo tempo em que experimentamos os seus benefícios, nos deparamos com 
preocupações em relação à sua segurança, eficácia – pilares que se relacionam diretamente 
com o ordenamento regulatório vigente – e benefício custo. 
Se, de um lado, os novos recursos tecnológicos dão suporte a uma verdadeira reinvenção 
nos protocolos de prevenção, de intervenções terapêuticas e de reabilitação, de outro, 
exige a reorientação, por parte dos governos, das políticas públicas, dos mecanismos 
tradicionalmente adotados para o monitoramento pós-uso e das ciências regulatórias.
Em outras palavras, a transformação provocada pela inovação da tecnologia, combinada 
aos marcos regulatórios e às políticas públicas, exige uma reformulação no processo 
monitoramento pós-uso.
Antes do surgimento da pandemia de Covid-19, as mudanças provocadas por essas 
inovações em saúde já eram apontadas como um dos principais desafios, senão o principal, 
para a tomada de decisão regulatória. Durante a pandemia, houve um desenvolvimento 
de produtos essenciais para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento para atender às 
necessidades da população em uma velocidade jamais experimentada, como ocorreu com 
os produtos para diagnóstico in vitro e as vacinas. 
O monitoramento se depara, assim, com diferentes realidades que requerem o 
aperfeiçoamento da vigilância pós-comercialização dos produtos, cuja tecnologia já está 
consolidada e incorporada, bem como com a necessidade de avançar na perspectiva de 
que produtos com novas tecnologias são (ou serão) comercializados no Brasil. 
Nesse contexto, a tecnovigilância se reveste de indiscutível importância, visto que 
problemas poderão ocorrer quando o produto for utilizado em condições reais e em 
7
grande escala, ainda que submetido à aprovação da autoridade regulatória antes de sua 
colocação no mercado.
A presente edição do Manual de Tecnovigilância traz elementos para reflexão sobre esse 
cenário polarizado: ao mesmo tempo em que regulamos produtos cuja tecnologia está 
consolidada, nos deparamos com a necessidade de aprimorar a regulação sanitária 
para enfrentar os desafios que as novas tecnologias impõem e a rapidez com que a 
realidade se transforma. 
O Manual valoriza aspectos históricos da vigilância sanitária e da tecnovigilância no Brasil 
e no mundo e descreve práticas adotadas na atualidade. Também destaca algumas 
tecnologias que, apesar de consolidadas, se revestem de importância em função do perfil 
de morbi-mortalidade da população brasileira, além de fazer uma provocação em relação 
à regulação de produtos inovadores e dos produtos desenvolvidos sob medida, incluindo 
a relação entre cibersegurança e produtos para saúde.
Esta publicação é fruto do esforço dos profissionais que se dispuseram a colaborar na 
sua elaboração, atuando como autores dos diversos temas, bem como de servidores e 
colaboradores da Gerência de Tecnovigilância da Gerência-Geral de Monitoramento de 
Produtos sob Vigilância Sanitária (GETEC/GGMON) que conduziram esse processo de 
construção coletiva, em parceria com a Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz), por meio da 
Gerência Regional de Brasília.
Os temas que envolvem a Tecnovigilância não foram aqui esgotados, mas esta publicação 
é um importante referencial e reflete, em parte, o momento regulatório que vivemos hoje.
Alex Machado Campos 
Diretor – Quinta Diretoria – Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
APRESENTAÇÃO
8
PREFÁCIOPREFÁCIO
“A área de tecnovigilância é nova em nosso país e mesmo no mundo.”
Esta foi a frase de abertura da apresentação do primeiro Manual de tecnovigilância: abor-
dagens para a vigilância sanitária de produtos para a saúde comercializados no Brasil, 
publicado em 2010. Passados 10 anos, apesar da experiência acumulada, pode-se dizer 
que a tecnovigilância ainda é uma área em consolidação no mundo.
A elaboração da primeira edição do manual, iniciada em 2006, com sua primeira versão 
online disponibilizada em 2008, trouxe algo novo para o setor da saúde, reunindo em um 
único instrumento conceitos técnicos e as melhores práticas em tecnovigilância. Desde 
então, ocorreram muitas mudanças, permeadas pela acelerada evolução tecnológica, 
que impactaram na regulação de produtos e serviços e nas exigências do mercado, abrin-
do, assim, um leque de novas tecnologias para o diagnóstico, o tratamento e a própria 
organização dos serviços de saúde.
Passados 20 anos da criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – e da 
organização do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS) – e 30 anos da instituição 
do Sistema Único de Saúde (SUS), inúmeras interfaces foram estabelecidas no contexto 
desse tema, mas ainda há muito o que aprender. No tocante à vigilância sanitária, área 
responsável por atuar nos mais distintos processos relacionados ao cuidado à saúde (da 
produção ao consumo), inúmeras tensões fazem-se presentes na rotina do trabalho das 
diferentes áreas. Isso também reflete na tecnovigilância, sistema de vigilância que tem por 
objetivo acompanhar o comportamento dos produtos para saúde em sua “vida real”, o que 
faz uma ponte entre o processo de regularização do produto e sua utilização nos mais dis-
tintos espaços de cuidado e assistência à saúde. Os produtos para saúde compreendem os 
materiais de uso em saúde, equipamentos médico hospitalares e produtos para diagnósti-
co in vitro. Apesar desse conceito constar em diversos documentos regulatórios, existe uma 
tendência de alterar tal denominação para “dispositivos médicos”, de modo a convergir 
com o termo medical devices, utilizado por autoridades regulatórias de outros países.
O desafio imposto à tecnovigilância está na abrangência do tema. Fazer vigilância na área 
de dispositivos médicos implica atuar com múltiplas tecnologias, em múltiplos proces-
sos produtivos, com múltiplas aplicações, que a cada dia se configuram e reconfiguram 
em novas propostas. Diante disso, é inegável seu caráter transdisciplinar e multiprofissio-
9
nal. É imprescindível que múltiplos conhecimentos sejam somados para que a tecnovi-
gilância possa acontecer de fato.
Nesse contexto, chegamos à edição revisada e ampliada do Manual de tecnovigilância: 
abordagens para a vigilância sanitária de produtos para saúde comercializados no Brasil. 
O processo de elaboração dessa edição, iniciado em junho de 2018, traduziu-se em uma 
construção coletiva em que diversos profissionais com suas expertises dispuseram-se a 
abordar temas que se configuram no objeto de trabalho da tecnovigilância – o que não 
significa que esses temas esgotem a abrangência de atuação da área.
Assim, a proposta vai além de atualizar o manual elaborado entre 2006 e 2008, mas avan-
ça no sentido de tratar sobre temais atuais; apresentar o novo; contextualizar o percurso 
trilhado e as conquistas obtidas; trazer para esse espaço de debate os desafios que ainda 
se mostram latentes para a vigilância pós-mercadodos dispositivos médicos. Para tanto, 
o manual foi organizado em unidades com temas centrais e seus respectivos capítulos.
Nesse sentido, a primeira unidade contextualiza a história do desenvolvimento da vigilân-
cia sanitária no Brasil e da criação da Anvisa, apresentando e discutindo o arcabouço legal 
e técnico afeto à vigilância sanitária e aos dispositivos médicos, avançando no tema da 
segurança sanitária desses dispositivos, um dos principais propósitos da tecnovigilância.
Refletir sobre a história da vigilância sanitária no Brasil e pontuar os principais marcos 
regulatórios dão o mote para a segunda unidade, que apresenta a consolidação da tec-
novigilância como prática de saúde pública, que vem sendo aprimorada no âmbito na-
cional e internacional. Conta-se a história da organização da tecnovigilância no Brasil e 
a produção de informações que permitem retroalimentar os atuais sistemas de controle 
e elaborar orientações para a prevenção de riscos ao paciente. Além disso, no contexto 
do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), apresenta-se a organização no nível 
estadual a partir da experiência de dois estados.
A terceira unidade amplia o detalhamento de processos relevantes para a tecnovigilân-
cia, incluindo o ordenamento legal e regulatório de dispositivos médicos, bem como re-
comendações que foram incorporadas ao longo dessa última década. A unidade também 
trata do avanço na certificação de dispositivos médicos e termina com um capítulo sobre 
os cenários de ampliação da capacidade analítica desses produtos, com a incorporação 
de laboratórios privados por meio de autorização e credenciamento para a execução de 
análises – o que antes era atribuição exclusiva de laboratórios oficiais de saúde pública.
PREFÁCIO
10
PREFÁCIO
A tecnovigilância é mostrada como uma estratégia relevante nos processos dos serviços 
de saúde na quarta unidade, onde se destaca sua importância como estratégia para a 
segurança do paciente. Na primeira versão, o manual já abordava o papel da gerência de 
risco nos serviços de saúde dentro do contexto da Rede Sentinela; agora essa visão foi 
ampliada com o conceito de segurança do paciente como política pública nacional. Da 
mesma forma, foram abordadas e reestruturadas as orientações que a primeira edição 
trazia para as instituições de saúde com relação aos processos de aquisição, utilização 
e descarte de dispositivos médicos e engenharia clínica. Temas novos como os relacio-
nados aos conectores, o registro de artroplastias e usabilidade também compõem essa 
unidade, reforçando o papel dos serviços de saúde na segurança do uso dos produtos. 
Assim, a unidade como um todo destaca o papel dos serviços como observatório do 
comportamento dos produtos e da tecnovigilância como um meio para gerenciar riscos.
Entendendo que as empresas possuem responsabilidade sobre o gerenciamento de seus 
produtos, a quinta unidade foi dedicada a esse assunto – o que é um diferencial impor-
tante em relação ao primeiro manual. Nessa unidade é apresentada uma experiência de 
implementação da tecnovigilância em uma empresa e a importância do gerenciamento 
de riscos ao longo do ciclo de vida do produto; finalizando com um modelo de processo 
de monitorização de pós-comercialização com busca ativa de dados e informações.
Diante da especificidade e dos recorrentes desafios dos produtos implantáveis, a sexta 
unidade foi destinada ao tema. Foram agrupados esclarecimentos sobre os dispositivos 
implantáveis ortopédicos e cardiológicos, contendo informações sobre indicações, fa-
lhas, complicações, riscos e eventos adversos relacionados a esses implantes; além das 
regras e recomendações referentes à tecnovigilância desses dispositivos, que são inde-
pendentes de sua indicação clínica.
Finalmente, a sétima unidade do manual – de extrema relevância no cenário atual – traz 
informações sobre a utilização de tecnologias inovadoras, atualizando o leitor sobre as 
tendências de mercado dos dispositivos médicos. A unidade também orienta as boas 
práticas em relação aos dispositivos desenvolvidos de forma personalizada, alertando 
sobre o grande desafio que é a regulação desses dispositivos em um momento em que 
a cibersegurança está listada como prioridade em todos os fóruns sobre inovação e uso 
de tecnologias disruptivas.
Espera-se, com a atualização do Manual, demonstrar que a vigilância pós-comercialização 
de dispositivos médicos será efetiva se envolver as autoridades regulatórias, os fabricantes, 
11
os serviços de saúde, os profissionais de saúde e os pacientes ou usuários; e que, apesar 
dos avanços, ainda existem muitos desafios nesse campo da saúde pública, entre eles a 
importância da notificação informativa e instrutiva de queixas técnicas e eventos adversos.
Cabe lembrar aqui as palavras do presidente da Anvisa na apresentação da primeira ver-
são do manual:
O ineditismo e a importância dos assuntos tratados revelam um tra-
balho cuidadoso e ousado de uma equipe da Anvisa associada a ou-
tros trabalhadores do sistema nacional de vigilância sanitária e técni-
cos de saúde que tiveram percepção para produzir o primeiro livro de 
referência brasileiro em tecnovigilância, material que deve se tornar 
indispensável na gestão de risco nos serviços de saúde.
Nesse sentido, agradecemos a iniciativa e o grande empenho da Gerência de Tecnovigi-
lância da Anvisa e da Fiocruz Brasília, bem como o apoio da Gerência Geral de Monito-
ramento de Produtos sujeitos à Vigilância Sanitária em providenciar a revisão e atualiza-
ção do Manual de Tecnovigilância. Também agradecemos a colaboração incansável dos 
diferentes autores dessa obra, profissionais com competência técnica e experiência nos 
temas, e a todos os demais envolvidos na revisão desse trabalho. Esta publicação man-
tém vivos os objetivos traçados na elaboração da primeira versão e fortalece o foco nas 
questões de prevenção e monitoramento de riscos inerentes à utilização de dispositivos 
médicos, para ampliar a segurança do paciente ou usuário desses produtos largamente 
utilizados no setor saúde em nosso país e no mundo.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, muitos países ainda carecem de recursos fi-
nanceiros e expertise técnica para avançar na regulação de dispositivos médicos, o que 
requer uma transição de um mercado não regulado até a instituição de leis compreen-
síveis inseridas em um programa único. O processo de transição exige uma abordagem 
progressiva, passo a passo, para alcançar um sistema regulatório que vise a qualidade, 
a segurança e o desempenho desses produtos. Dentre os requisitos mais básicos para 
atingir esse patamar, destacamos a publicação de leis e toda a base legal complementar 
para regular a atividade e a garantia de recursos às autoridades sanitárias para as ações 
de fiscalização e monitoramento, usando estratégias de diversas naturezas apresentadas 
nas unidades deste Manual. Isso estabelecido, recomenda-se progredir para controles 
de nível expandido, com inspeções dos estabelecimentos registrados e supervisão de 
PREFÁCIO
12
PREFÁCIO
investigações clínicas (WHO, 2017)1. Nesse contexto, o Brasil encontra-se nessa última 
fase, a mais avançada, de controle sanitário dos dispositivos médicos. Entretanto, ainda 
temos muito a evoluir.
São muitos os desafios para a área de pós-comercialização de dispositivos médicos e os 
últimos anos reforçaram a necessidade de fortalecer a construção conjunta de estratégias 
para gerenciar riscos com os diversos atores envolvidos nesse tema. O material aqui com-
pilado fornece subsídios para que a tecnovigilância seja percebida como uma vigilância 
estratégica, tanto no âmbito da gestão dos produtos como no cuidado ao paciente.
Não se buscou esgotar todo o universo de temas que envolvem a tecnovigilância, pois 
esse seria um trabalho hercúleo e ainda assim, não estaria completo. Sabe-se também 
que a dinamicidade desse tipo de tecnologia exigeconstante atualização normativa e 
regulatória. Esse tipo de publicação assume as regras do momento da escrita e, portanto, 
representa o arcabouço vigente do momento de sua elaboração.
O editorial do primeiro manual destacou que o trabalho “preenchia algumas das lacunas 
de informação existentes no nosso país e que a aplicação dos conteúdos, por si só, pode-
ria representar a redução de mortes, sofrimento e perda de preciosos recursos da área de 
saúde”. Pode-se dizer que a segunda edição também segue essa linha, pois não somen-
te reapresenta temas importantes apontados na primeira edição, mas também atualiza 
outros conteúdos de extrema relevância para a organização e para o fortalecimento da 
tecnovigilância nas diversas rotinas em que os dispositivos médicos se apresentam. A 
operacionalização efetiva da tecnovigilância é responsabilidade compartilhada e implica 
na redução de riscos e na proteção da saúde das pessoas.
Esta é uma leitura para ser feita aos poucos, de acordo com os desafios que a rotina apre-
senta. Deve ser retomada sempre que necessário, de forma a introjetar os conceitos aqui 
apresentados!
Uma excelente leitura!
Quinta Diretoria – Anvisa Gerência Regional Brasília - Fiocruz
1 WHO. WHO global model regulatory framework for medical devices including in vitro diagnostic medical 
devices. Geneva: WHO, 2017. 68 p. (Série técnica de dispositivos médicos da OMS). Disponível em: https://
www.who.int/medical_devices/publications/global_model_regulatory_framework_meddev/en/. Acesso 
em: 15 dez. 2020.
 O SISTEMA NACIONAL DE 
VIGILÂNCIA SANITÁRIA
UNIDADE 1
Unidade 1 // Capítulo 1
EVOLUÇÃO DA VIGILÂNCIA 
SANITÁRIA NO BRASIL
Geraldo Lucchese
Farmacêutico bioquímico pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul 
(UFRGS), doutor em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública 
da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz), consultor em política de saúde e 
vigilância sanitária, professor voluntário do Departamento de Saúde Coletiva 
da Universidade de Brasília (UnB).
15Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
RESUMO
A evolução da vigilância sanitária no Brasil tem seus determinantes relacionados aos diferentes con-
textos econômicos, políticos e sociais que conformaram nossa história. Esta unidade tem o objetivo 
de mostrar um panorama do processo que terminou por instituir um campo singular da saúde pública 
em nosso país, que chamamos de vigilância sanitária. É um estudo de natureza histórica, e para sua 
realização recorremos a fontes de informação, principalmente secundárias, que abordam a história da 
saúde pública, não apenas no espaço nacional, mas também internacional. O resultado de tantos anos 
de história, em seus diferentes contextos, é um arranjo específico, encarregado do controle sanitário de 
determinados produtos, serviços e ambientes, chamado de Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, 
que operacionaliza os princípios do Sistema Único de Saúde na busca da concretização do direito à 
saúde para todos brasileiros. Não obstante os avanços conquistados, esse sistema ainda carece de me-
lhor estrutura para identificar e controlar os riscos à saúde em um país do tamanho e da importância 
econômica do Brasil.
PALAVRAS-CHAVE: 
Saúde Pública. Vigilância Sanitária. Riscos. Polícia Médica.
KEYWORDS: 
Public Health. Health Surveillance. Risks. Medical Police.
16 MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária
1. INTRODUÇÃO 17
2. MODELO EXTRATIVISTA E EXPORTADOR DE PRODUTOS 
PRIMÁRIOS – 1500 A 1930 18
 2.1 O Brasil Colônia até a chegada da Família Real, em 1808 18
 2.2 De 108 até a Proclamação da República, em 1889 22
 2.3 Da República Velha até a Revolução de 1930 26
3. MODELO NACIONAL-DESENVOLVIMENTISTA DE SUBSTITUIÇÃO 
DE IMPORTAÇÕES – 1930 A 1990 30
4. MODELO DE ABERTURA AO MERCADO GLOBAL 41
5. TENDÊNCIAS E DESAFIOS 48
 LISTA DE SIGLAS 50
 REFERÊNCIAS 52
SUMÁRIO
17Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
 1. INTRODUÇÃO
 Cada sociedade, desde as mais remotas, desenvolve uma concepção sobre saúde e doença, 
conforme a sua realidade geográfica, social, econômica, política, cultural e religiosa. Essa concepção se 
fundamenta no conhecimento, acumulado pelas experiências concretas de vida e observações empíri-
cas que identificam ameaças e perigos que podem resultar em doenças e outros danos à saúde e, mes-
mo, em morte. Não obstante a diversidade de povos, suas culturas e estratégias de sobrevivência, há 
inúmeras evidências de que, desde as mais antigas civilizações, algumas preocupações eram comuns: 
a qualidade da comida, a qualidade da água, o destino de dejetos, a habitação, as substâncias que po-
diam ser usadas como remédios, as pessoas que podiam exercer a assistência aos doentes ou fazer os 
remédios necessários, a qualidade dessa assistência e dos remédios e a prevenção ou o tratamento das 
enfermidades, em especial as epidemias de doenças transmissíveis, que eram o flagelo mais frequente 
e mortífero que as acometia.
 George Rosen (1979, 1994) nos oferece um detalhado panorama da evolução da saúde pública 
nos tempos, apesar do seu ponto de vista essencialmente ocidental e eurocêntrico. Em seus relatos, 
podemos vislumbrar numerosas preocupações e práticas que hoje, no Brasil, pertencem à área da vi-
gilância sanitária. Desde perigos de origem predominantemente natural, até os perigos essencialmen-
te decorrentes de atividades humanas, essa área se estrutura, na maioria dos países, de forma quase 
cataclísmica, conforme a necessidade de intervenções em tragédias, maiores e menores. Essas inter-
venções, que requerem uma autoridade pública reconhecida, buscam proteger a saúde da população, 
acima dos interesses particulares.
 No Brasil, tivemos uma trajetória específica, que não acompanhou diretamente o que acon-
tecia nas cidades europeias e, depois, nos países que primeiro se industrializaram. Autores brasileiros, 
como Costa (2004), Bueno (2005) e Figueiredo (2016) abordam diretamente a vigilância sanitária em 
seus estudos históricos. Outros, como Hochman (1998), Mehry (1987), Luz (1982) e Machado et al. (1978), 
entre tantos, abordaram indiretamente assuntos relacionados ao campo da vigilância sanitária.
 O objetivo deste texto é oferecer um panorama resumido dos processos da nossa saúde públi-
ca, que acabaram por instituir esse campo singular que chamamos de vigilância sanitária.
 Considerando as fontes acima referidas, optamos por adotar um olhar que busca cotejar, na 
medida do possível pelo escopo deste trabalho, leis e regulamentos da área da saúde pública com os 
respectivos contextos sociais, políticos e econômicos.
Nessa linha, para oferecer uma perspectiva de processo sobre a evolução dos fatos que se de-
senvolveram, na história brasileira, conformando o campo específico da saúde pública que hoje chama-
mos de vigilância sanitária, optamos por um recorte histórico que divide nossa história em três fases, de 
acordo com o modelo econômico e político principal de cada fase:
1) desde a chegada dos portugueses até as primeiras décadas do século XX, mais especifica-
damente 1930, período em que nossa principal atividade era originada no extrativismo e 
na exportação de produtos primários;
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária18
2) de 1930 até 1990, quando o modelo agroexportador foi sendo preterido pela estratégia de 
desenvolvimento nacional baseado na substituição de importações;
3) de 1990 até os dias atuais, quando o esgotamento do modelo nacional-desenvolvimentis-
ta leva a uma abertura geral da economia.
 Cada um desses macrocontextos e seus modelos econômicos incluem o devido componen-
te político, que, com os componentes social e sanitário, enseja o aparecimento de um determinado 
quadro epidemiológico e umadeterminada forma de enfrentamento dos problemas que ele contém, 
considerando os recursos disponíveis.
 Em síntese e em grandes linhas, os atos econômicos e políticos, conjugados com problemas 
sanitários e com a capacidade de organização e inovação do país, acabam por determinar modelos 
ou arranjos de políticas de saúde pública, explícitas ou não. Pretendemos, aqui, assinalar alguns 
acontecimentos, geralmente traduzidos em alguma legislação ou normatização, que tiveram influên-
cia, no caminho percorrido por nossa saúde pública, para a formação do campo que hoje conhece-
mos como vigilância sanitária.
2. MODELO EXTRATIVISTA E EXPORTADOR DE PRODUTOS PRIMÁRIOS – 
1500 A 1930
2.1 O Brasil Colônia até a chegada da Família Real, em 1808
 Este período caracterizou-se pelos esforços da Coroa Portuguesa em descobrir as riquezas da 
terra recém “descoberta” e explorá-las, além de tentar povoar o território para assegurar sua posse. 
Os portugueses não encontraram, no Brasil, grandes civilizações, como os espanhóis haviam encon-
trado os astecas no México e os incas no Peru, que já dominavam a extração de ouro e prata e os 
usavam em seu cotidiano.1 Na ausência do ouro, o primeiro produto a ser explorado foi o pau-brasil, 
árvore nativa da Mata Atlântica, que gerava uma tinta muito valorizada na Europa, usada no tingimen-
to de tecidos. Sua madeira também era usada na construção de caravelas. Os índios já conheciam e 
usavam o pau-brasil. Em troca de quinquilharias, os portugueses faziam os índios cortarem e trans-
portarem a madeira até suas naus. Depois de cerca de 40 anos de exploração intensa, a espécie foi 
quase extinta.2 O resultado foi uma grande devastação da mata costeira (BUENO, 2005).
 
 
 
1 Assinale-se que recentes estudos arqueológicos, botânicos e genômicos têm revelado que o Brasil anterior à chegada dos 
portugueses tinha populações densas, com culturas desenvolvidas, hierarquias complexas e multiétnicas, redes de comércio, 
aldeias vibrantes e capazes de construir monumentos. Cf: Reinaldo (2017).
2 O principal explorador desse comércio, amplamente predador, foi Fernando de Noronha, hoje nome do arquipélago (BUE-
NO, 2005).
19Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
A chegada dos portugueses foi uma catástrofe para os índios brasileiros: escravidão, 
doenças, massacres, genocídios, etnocídios e, sobretudo, a perda do seu território.3 
 Além de serem catequizados e obrigados a trabalhar para os portugueses, sua mortalidade 
era elevada devido a doenças virais e bacterianas trazidas pelos colonizadores, contra as quais os 
índios não tinham imunidade. Antes, os índios brasileiros, segundo relatos dos próprios portugue-
ses, eram fortes e saudáveis; tomavam banho todos os dias nos rios e alimentavam-se de produtos 
naturais. Havia entre eles doenças como bócio, disenterias, dermatoses, parasitoses e formas leves 
de malária, que eles enfrentavam com suas plantas medicinais e seus conhecimentos, centralizados 
nos pajés e xamãs. Mas os jesuítas, para melhor catequisar e controlar os índios, criaram aldeamen-
tos de tupiniquins no recôncavo – sítios perto de portos e vilas, onde os índios eram forçados a viver 
agrupados e a trabalhar. O meio hostil aos seus hábitos e a circulação de padres e outros portugue-
ses, que já vinham doentes para o Brasil, causaram a morte de milhares de indígenas nesses aldea-
mentos (BUENO, 2005).
 Para povoar e defender o território, o rei de Portugal D. João III, em 1532, enviou a primeira 
expedição ao Brasil, comandada por Martin Afonso de Sousa, que chegou em São Vicente, com cen-
tenas de pessoas e as primeiras mudas de cana-de-açúcar. Em 1549, chegava a segunda, com Tomé 
de Sousa e mais de mil homens, com a missão de construir uma grande fortaleza. Assim, ainda em 
1549, foi inaugurada a cidade de Salvador, a primeira capital do Brasil. Erguida em uma colina à beira 
do mar, mas também à margem de um riacho que servia de proteção contra invasores, Salvador logo 
reproduziria as mesmas condições insalubres de Lisboa e de outras cidades europeias: total sujeira 
nas ruas, cuidado nenhum com as questões sanitárias. Galinhas, patos, cabras, ovelhas, porcos, ca-
valos, vacas, entre outros animais, viviam confinados nos muros de defesa da cidade, junto com a po-
pulação. Dejetos de todos os tipos eram jogados nas nascentes do curso d’água, que se transformou 
em rio de esgotos, contendo tripas de animais e toda sorte de dejetos. Corrupção dos agentes públi-
cos e fraudes no comércio dos alimentos eram generalizadas.4 Apesar de existir multas para os que 
amontoassem lixo nas suas casas, ruas e lugares públicos, o máximo que era feito era jogar o lixo nas 
ribanceiras (BUENO, 2005), ou seja, persistia o modo medieval de lidar com os problemas sanitários 
nas cidades que cresciam constantemente. Embora já existisse a teoria “científica” dos miasmas5 para 
explicar a origem das doenças, ainda prevalecia a visão de natureza mágico-religiosa: o doente era 
3 A identidade dos povos indígenas está intimamente ligada ao território onde habitam e é um dos mais importantes fatores de 
sua saúde. A terra não é apenas suporte para a vida material, meio de subsistência ou fator de produção, mas é o referencial 
do seu mundo simbólico. Todas as dimensões da vida de um povo indígena têm por base seu território físico. Cf.: http://www.
ccms.saude.gov.br/saudeindigena/quemsaoeles/povosindigenasdobrasil.html. Acesso em 23 jul. 2019.
4 Embora proibida, sob o argumento de que arruinava a saúde da população, a cachaça era consumida às escondidas. Era to-
lerada inclusive porque alguns vereadores tornaram-se senhores de engenho e queriam vender seu produto (BUENO, 2005).
5 O esforço medieval para lidar com problemas sanitários da vida urbana, que crescia constantemente, originou explicações sobre 
a ocorrência das doenças: a existência de águas e ares corrompidos por putrefações, pântanos e matéria em geral em decompo-
sição e os odores fétidos geravam os miasmas, emanações que geravam as doenças. A teoria miasmática tinha duas correntes: 
os contagionistas, que acreditavam que alguma coisa específica causava as epidemias; e os anticontagionistas, que afirmavam 
que o aparecimento das doenças dependia de uma série de fatores climáticos e sociais (ROSEN, 1994, p. 90).
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária20
vítima de demônios, de espíritos malignos, da cólera divina diante dos pecados humanos. A doença 
era sinal de desobediência ao mandamento divino (SCLIAR, 2005).
 Como os índios não se revelaram bons escravos, a Coroa autorizou, em 1550, o início do tráfico 
de escravos negros trazidos da África. A mortalidade durante a travessia dos navios negreiros era muito 
alta (40%) devido às péssimas condições a que os negros eram submetidos.6 Os negros tinham mais 
imunidade a algumas doenças que grassavam pelas margens do Mediterrâneo, mas as consequências 
sanitárias do tráfico de escravos foram igualmente terríveis. Doenças como a febre amarela, malária, 
elefantíase, dracunculose (infecção parasitária causada por um verme da Guiné), tracoma e dengue 
formavam um novo quadro epidemiológico (BUENO, 2005).
 A mão de obra dos escravos foi o fator crucial para o sucesso do ciclo econômico do açúcar, que 
se estendeu por dois séculos (XVI e XVII), tendo seu auge entre 1646 e 1654. Os engenhos organizaram a 
vida colonial ao redor dos canaviais e das usinas, em especial nas capitanias da região Nordeste.7 Ne-
gros africanos, índios e mestiços detinham suas práticas mágicas e rituais de cura; conhecimentos da 
medicina natural da flora e da fauna, de acordo com sua cosmovisão. 
Dentre eles, surgiam os grandes curandeiros, benzedores e outros, que eram os 
verdadeiros “médicos” da maioria da população do Brasil Colonial (SCLIAR, 2005). 
Os jesuítas se apropriavam do saber médico nativo e passaram a misturar as plantas que traziam da 
Europapara fazer remédios comercializados por eles.
 Nesse mesmo tempo de grande otimismo e efervescência dos ideais iluministas nas cidades 
europeias,8 no Brasil, a Coroa Portuguesa, com a decadência do ciclo do açúcar,9 envia expedições, cha-
madas de entradas e bandeiras, ao interior do Brasil em busca de metais valiosos (ouro, prata e cobre) 
e de pedras preciosas (diamantes e esmeraldas). Acabaram por encontrar, entre 1690 e 1720, ouro nas 
regiões que hoje pertencem aos estados de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso; os primeiros diaman-
6 Deitados, acorrentados dois a dois, sem poderem se levantar pois não havia altura suficiente; dois de cada cinco escravos não 
chegavam vivos. E os que morriam permaneciam acorrentados aos vivos (BUENO, 2005).
7 Diversos autores brasileiros relatam a realidade da sociedade escravagista e patriarcal brasileira, entre eles Gilberto Freyre, 
com sua obra clássica Casa grande e senzala, de 1933.
8 A revolução científica do século XVII também influenciou o Iluminismo do século XVIII. O período que vai de 1680 a 1780 
ficou conhecido como Século das Luzes, em oposição ao período medieval, denominado Idade das Trevas. O Iluminismo 
foi um movimento principalmente intelectual e filosófico, mas também social, econômico e político, que defendia o uso da 
razão em contraposição aos dogmas rígidos da Igreja Católica; pregava maior liberdade política e econômica; questionava os 
privilégios da nobreza e do clero; criticava o absolutismo e o mercantilismo; propugnava escolas para o povo, igualdade de 
todos perante a lei; investigação e experiência como forma de conhecer a natureza, a sociedade, a economia e o ser humano. 
Também difundia a separação entre Igreja e Estado; e valores como liberdade, fraternidade, tolerância, progresso e governo 
constitucional. Sua principal força era uma burguesia (principalmente dos comerciantes) que existia na França, Inglaterra e 
Holanda e que, apesar de muito rica, não tinha poder algum (ROSEN, 1994).
9 O processo de comercialização do açúcar pelos portugueses tinha a Holanda como sócia. O açúcar era enviado a Portugal, que 
o mandava para a Holanda, onde era refinado. Os holandeses detinham a tecnologia da montagem dos engenhos e também 
ficavam com a parte da comercialização do produto na Europa. Como tinham recursos, passaram a investir em plantações de 
cana nos países centro-americanos. A concorrência foi diminuindo a importância dos engenhos brasileiros (ROMERO, 2019).
21Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
tes foram encontrados por volta de 1729 e seu principal centro produtor foi o Arraial do Tijuco, hoje 
Diamantina (MG). Cerca de 50 mil pessoas foram atraídas a essas regiões em busca de riqueza, o que 
originou violentas disputas, extermínio de indígenas e guerras pelo controle das jazidas, como a Guerra 
dos Emboabas, na região onde hoje se localizam os municípios de Cachoeira do Campo, Ouro Preto e 
Mariana, em Minas Gerais. O ciclo do ouro atingiu seu ápice entre 1741 e 1789. O grande deslocamento 
de pessoas causou uma grave crise de abastecimento; fome, violência e doenças mataram milhares de 
pessoas. Alimentos estragados, fraudados e caríssimos, remédios sem substância e também raros, gen-
te que se dizia curador, dentre muitos outros flagelos, originaram novas normas que, como de costume, 
não eram observadas (BUENO, 2005).
 Entre 1740 e 1744, quando a lepra chegou a contaminar pessoas das classes mais abastadas, o 
preço dos remédios vendidos nas boticas do Rio de Janeiro aumentou desavergonhadamente, o que 
fez o físico-mor do Reino baixar uma ordem para que se regulamentasse o seu preço. O regimento apro-
vado em 1744 continha outras regras relativas ao exercício da medicina e da farmácia no Brasil. As boti-
cas (cerca de 50 distribuídas entre Salvador, Rio de Janeiro, Recife e São Paulo) deveriam ser visitadas, 
sem aviso prévio, de três em três anos, para verificação da qualidade dos remédios e qualificação dos 
boticários e barbeiros-cirurgiões. Em 1798, ordena-se a repressão aos remédios secretos, cuja com-
posição ninguém conhecia, mas que eram amplamente consumidos ou distribuídos caritativamente. 
A norma estimulava os proprietários a publicarem as suas fórmulas, prometendo sua publicação na 
Farmacopeia Geral do Reino (BUENO, 2005).
 Um outro regulamento, o Regimento da Provedoria, que substituía o regulamento de 1744, foi 
editado em 1810 pelo recém instituído Provedor Mor de Saúde da Costa e Estados do Brasil. Estabe-
lecia novas regras para os mesmos principais problemas: controle sanitário dos portos; controle de 
alimentos; inspeção de matadouros e açougues, boticas e medicamentos; fiscalização e exames para 
o exercício da medicina e da farmácia. O novo regimento também não trouxe mudanças significativas 
da situação sanitária. Os regulamentos simplesmente não eram cumpridos e serviam mais para fins de 
arrecadação (COSTA, 2004).
 As ideias iluministas chegavam ao Brasil principalmente por meio de publicações contraban-
deadas da Europa e dos brasileiros que iam estudar em Coimbra. Elas fomentavam o questionamen-
to ao sistema colonial e o desejo de independência e de mudanças, que influenciaram movimentos 
como a Inconfidência Mineira (1789, mesmo ano do início da Revolução Francesa), a Conjuração Baiana 
(1789) e a Revolução Pernambucana (1817).
Em síntese, nesse período não havia produção nacional de bens, embora a 
Revolução Industrial já estivesse em curso na Europa. 
 Nas poucas cidades brasileiras (Salvador, Recife, Rio de Janeiro, São Vicente, São Paulo), os 
portugueses tentavam impor regulamentos sobre um conjunto de temas que se repetiam, como con-
trole dos portos; controle dos alimentos, inclusive matadouros e mercados em praças públicas; con-
trole das boticas, dos boticários e dos médicos; água; destino de dejetos etc. Mas os regulamentos 
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária22
aplicavam-se apenas às poucas cidades existentes e não havia estrutura nem recursos suficientes 
para fiscalizar o seu cumprimento; serviam mais para fins de arrecadação e de exercício de poder 
das autoridades. Predominava a visão de que a doença era fruto de possessão de espíritos malignos 
ou de castigos pelos pecados cometidos. Os pajés, curandeiros, caboclos, benzedores e outras pes-
soas reconhecidas pelos povoados eram os que praticavam a assistência da maioria das pessoas. 
Os “médicos”, físicos ou barbeiros, atendiam apenas os mais ricos. Na Europa, já existia a teoria dos 
miasmas, que os portugueses também consideravam aqui na sua colônia para o enfrentamento das 
doenças. Também estava em construção um formidável conjunto de ideias sobre a conservação da 
saúde nas cidades, que viria a se chamar “polícia médica”.10
2.2 De 1808 até a Proclamação da República, em 1889
 No final de 1807, D. João, príncipe regente de Portugal,11 fugiu de Lisboa rumo ao Brasil, com 
a proteção dos ingleses, acossado por uma iminente invasão dos franceses e espanhóis. Ao chegar a 
Salvador, em janeiro de 1808, D. João e sua imensa comitiva encontraram uma cidade mais imunda, 
insalubre e perigosa do que era Lisboa – animais pelas ruas, excrementos, lixo, charlatães, ambulan-
tes e ladrões.
 A vinda da família real traria muitas mudanças favoráveis ao desenvolvimento do país, que não 
era mais colônia, mas sim a sede da Coroa Portuguesa. A abertura dos portos às nações amigas propi-
ciou algum controle das condições sanitárias não apenas dos portos, mas dos navios e dos passageiros. 
Depois de apenas um mês em Salvador, a família real mudou-se para o Rio de Janeiro. Antes de mudar a 
capital para o Rio de Janeiro, D. João criou a Escola de Medicina e Cirurgia da Bahia, a primeira do Brasil. 
Também nomeou o dr. Manuel Vieira da Silva como o Físico-mor do Reino e das Províncias Além-Mar. 
10 Já no século XV, começou-se a valorizar a aritmética política, também chamada de demografiasanitária ou médica, em 
especial no interior do pensamento mercantilista, segundo o qual não poderia haver um Estado forte sem uma população 
grande e sadia. Cuidar da saúde da população, portanto, era uma obrigação estratégica para que o Estado pudesse dispor 
dela, fosse formando exércitos poderosos ou trabalhadores fortes e produtivos. Entretanto, esse cuidado requeria uma po-
lítica específica para administrar a saúde pública. E era necessário conhecer a população, daí a importância das estatísticas 
(demográficas sanitárias) – quantos morrem, de quais causas, quantos nascem, quais doenças fazem a população dimi-
nuir, e assim por diante. Nascia o conceito de “polícia médica” – o ramo da administração aplicada à saúde pública. Sim, 
a “polícia médica” significava uma política para administrar a saúde pública. Essa política objetivava promover a saúde, 
prevenir as terríveis epidemias, oferecer cuidados aos doentes, cuidar da maternidade, treinar e supervisionar as parteiras, 
assistir aos trabalhadores, cuidar dos órfãos, formar médicos, regulamentar a sua prática, organizar os serviços, conter o uso 
excessivo do tabaco e de bebidas alcoólicas, inspecionar alimentos e águas, fazer limpar as cidades, inspecionar boticas, 
criar e manter hospitais, intervir nos negócios do povo quando fosse de interesse geral, zelar pela pureza do ar, propagar a 
higiene, educar o povo sobre a saúde, incentivar a fertilidade, conter a violência e os acidentes, planejar recreação, estabe-
lecer responsabilidades e competências dos oficiais de saúde, entre outras medidas. Tudo deveria ser implementado por 
meio de leis e regulamentações administrativas (ROSEN, 1994). No plano teórico, a polícia médica se desenvolveu de forma 
ampla e detalhada para todos os aspectos da vida, mas nenhuma das cidades criou uma política nacional baseada em seus 
pressupostos, porque não havia autoridade que centralizasse a política. As autoridades existentes, principalmente clero e 
nobreza, eram resistentes a qualquer forma de intervenção na vida privada ou social; o poder era fragmentado nas cidades, 
que estabeleciam suas próprias medidas; guerras, desorganização dos poderes e outros grandes problemas atrapalhavam 
de forma crítica a implantação da polícia médica. Entretanto, muitas cidades seguiram essas ideias e implantaram medidas 
por ela preconizadas (ROSEN, 1994).
11 Depois da morte de sua mãe, a rainha D. Maria I (A Louca), o príncipe regente D. João é nomeado rei D. João VI, do Reino 
Unido a Portugal e Algarves.
23Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
O cargo era cheio de poderes e abrangia: intervir nos serviços médicos de mar e terra; o ensino e os 
exames para os candidatos a médicos e farmacêuticos; análise e aprovação dos medicamentos, mes-
mo os importados, e dos gêneros alimentícios; inspeção das boticas; julgamento do exercício ilegal da 
medicina e farmácia; higiene dos lazaretos; quarentenas; inspeção dos portos; exame do gado de corte; 
polícia das casas de comestíveis e restaurantes, matadouros e açougues. Uma agenda bem próxima do 
que viria a ser a vigilância sanitária no século seguinte. No Rio de Janeiro, o panorama não era diferente 
daquele encontrado em Salvador; a cidade era imunda e malcheirosa. Todos os tipos de estrumes e de-
jetos eram jogados nas ruas e quintais e no cais em frente ao paço central por escravos que carregavam 
pesados barris (BUENO, 2005; COSTA, 2004).
 Depois da diminuição de importância do cultivo de cana-de-açúcar, o algodão e o tabaco fo-
ram também importantes culturas de exportação no período de 1700 a 1800, estimuladas pela gran-
de demanda criada pela Revolução Industrial12 na Inglaterra. Igualmente, chegamos a ser o maior 
produtor de cacau do mundo. Entre 1879 e 1912, tivemos o ciclo da borracha, que trouxe fausto e 
riqueza às cidades de Manaus e Belém, principalmente; em 1880, o Brasil exportou cerca de 73.500 
toneladas de látex (SALVATI, 2010).13
O início da industrialização do Brasil enfrentava sérios problemas com as determinações 
da Coroa Portuguesa, que proibia a instalação de qualquer indústria no Brasil e o 
comércio com qualquer outro país que não Portugal. 
 Em 1715, Portugal havia proibido a instalação de mais engenhos no Brasil; em 1766, foram proi-
bidas as atividades de ourives e tecelagem de algodão; e em 1767, até mesmo a fabricação de sabão. Em 
seguida, D. Maria I expediu o Alvará 1.785, que determinava a extinção, em qualquer parte da colônia, de 
12 O que se chamou de Revolução Industrial foi um processo de mudança tecnológica na produção de bens, que começou 
na Inglaterra no século XVIII e se estendeu até meados do século XIX (1760-1840). A grande acumulação de riqueza decor-
rente da expansão do comércio marítimo na Inglaterra; os novos conhecimentos científicos e sua aplicação na produção; 
o uso cada vez mais intenso de máquinas na produção; a substituição do trabalho artesanal e manual pelo trabalho 
assalariado (criação do proletariado); e o aumento vertiginoso da população em grandes cidades, vinda das zonas rurais, 
são algumas de suas características. A população aglomerava-se em cortiços insalubres, em condições degradantes; as 
condições de trabalho também eram péssimas. A imundície acumulada nas ruas e nas casas por falta de esgoto sanitário, 
a falta de abastecimento de água limpa, os alimentos estragados, o estresse e a degradação moral pela superexploração 
de homens, mulheres e crianças, em condições desumanas, desaguavam em condições deploráveis de saúde. A partir 
de 1830, o mesmo quadro se repetia na França, na Bélgica, na Prússia e nos Estados Unidos da América. A situação nas 
cidades mais industrializadas era propícia para a ocorrência de epidemias e outros agravos: superpopulação, aglomera-
ção, pobreza, falta de água de qualidade, saneamento, crime, insalubridade eram traços comuns. As taxas de mortalidade 
aumentavam rapidamente. Uma publicação de 1842 sobre o tema se tornou clássica: Investigação sobre as condições 
sanitárias da população trabalhadora da Grã-Bretanha, de Edwin Chadwick (ROSEN, 1994).
13 A exportação tinha alta demanda mundial, depois que franceses descobriram solventes que dissolviam o látex e faziam 
borracha, ingleses criaram o elástico e o americano Charles Goodyear desenvolveu a vulcanização, tornando possível a 
fabricação de pneus e múltiplos outros produtos industriais. Em 1877, cerca de 70 mil sementes da Hevea brasiliensis, 
nome científico da seringueira, foram contrabandeadas para a Inglaterra, que fomentou seu cultivo na Malásia. Dez anos 
depois, a produção da Malásia iria gradativamente substituir o látex produzido na Amazônia. Depois, durante a Segunda 
Guerra Mundial, os japoneses invadiram a Malásia, o que fez que os EUA recorressem ao Brasil para alimentar sua indústria 
no período da guerra.
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária24
todas as fábricas, manufaturas e teares, abrindo exceção para a tecelagem de panos grossos para vestir 
os escravos. As proibições se estendiam ao cultivo de amoreiras e oliveiras, cujas folhas serviam para 
a criação do bicho-da-seda. O Brasil importava todos os produtos manufaturados que usava, desde 
roupas até o sabão para lavá-las. Em abril de 1808, o príncipe regente D. João anulou o Alvará 1.785, que 
proibia a criação de indústrias no Brasil. Entretanto, o ato não surtiu muito efeito uma vez que tratados 
assinados entre Portugal e Inglaterra permitiam que os (bons) produtos ingleses chegassem ao Brasil 
com preços mais baixos, já que Portugal concedia aos produtos ingleses uma tarifa de impostos muito 
mais baixa e isso bloqueava a produção de similares em território brasileiro. Os outros atos também fo-
ram revogados, paralelamente à abertura dos portos às nações amigas. Já podíamos exportar algodão, 
tabaco, charque, couros, peles, chifres, cacau, madeira, café, arroz, cachaça, entre outros produtos, para 
outros países que não Portugal(SALVATI, 2010).
 Em 1811, o príncipe regente D. João criou a Junta Vacínica da Corte, que é vista por historiado-
res da saúde como o início da prática médica no Brasil como ação estatal. Inspirada nos fundamentos 
da polícia médica, a junta significava a visão da saúde como uma questão social, que exigia a interven-
ção das autoridades para que o Reino prosperasse por meio da prosperidade dos seus súditos (MACHA-
DO et al., 1978 apud ROMERO, 2019; COSTA, 2004).
 O próximo carro-chefe da economia agroexportadora seria o café, que ficaria responsável pela 
maior atividade econômica durante mais de um século, de 1800 até 1920. O Vale do Paraíba concentra-
va a produção que dava ao Brasil o título de maior produtor mundial e a possibilidade de determinar 
o preço no mercado mundial. Diversos fatores fizeram que a produção brasileira se tornasse maior que 
a demanda mundial, o que fez despencar seu preço. A crise de 1929 iria dar um golpe ainda maior na 
exportação do café brasileiro.
 Com a Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, pouca coisa mudaria na saúde. 
Uma dessas mudanças foi a nova Constituição, de 1824, que concedeu poder às câmaras municipais 
para estabelecer seus regimentos, inclusive os da saúde, e foram extintos os cargos de físico-mor e 
cirurgião-mor, símbolos do velho poder médico português. Em 1829, foi criada a Sociedade de Medi-
cina e Cirurgia do Rio de Janeiro, que atuou sempre questionando esse poder das câmaras munici-
pais, acusando-as de não possuírem o saber e serem fracas e incapazes de fazer cumprir a legislação. 
Assim, um novo Código de Posturas é editado em 1828, que praticamente não mudou a situação 
(COSTA, 2004).
 Epidemias de varíola, gripe, febre tifoide castigavam a população. Uma grande epidemia de 
febre amarela, em 1849, não poupou nem a família real, que, em 1850, perdeu seu filho Pedro Afonso, 
de um ano e meio de idade. Poucos dias depois, a princesa Isabel também foi acometida. Logo depois, 
o Imperador, castigado por febres intermitentes, foi convalescer no palácio real, em Petrópolis. Os mé-
dicos não afirmavam que se tratava da febre amarela. A epidemia matou milhares de pessoas, principal-
mente estrangeiros, por sua vulnerabilidade maior ao vírus (ROMERO, 2019).
 Em 1850, sepultando definitivamente o poder das câmaras municipais, o poder imperial centra-
lizou a política sanitária criando a Comissão Central de Saúde Pública. A centralização, tão reivindicada 
pelos sanitaristas europeus na época da polícia sanitária, estava instalada. A Comissão Central de Saú-
25Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
de Pública era constituída por membros da Academia Imperial de Medicina,14 um professor da Faculda-
de de Medicina e o presidente da Câmara Municipal. Publicou uma norma que continha “Providências 
para prevenir e atalhar o progresso da febre amarela” e um regulamento sanitário, que concedia, pela 
primeira vez, poder às autoridades para o controle de pessoas e do espaço urbano (BENCHIMOL, 2001 
apud ROMERO, 2019, p. 126).
No ano seguinte, 1851, a comissão se transformou na Junta Central de Higiene Pública. 
Com poder, mas sem recursos de toda ordem, a junta foi absolutamente incapaz de 
enfrentar as epidemias da época – febre amarela, cólera, peste bubônica e tuberculose. 
 Em 1886, a junta foi transformada e dividida na Inspetoria Geral de Higiene e na Inspetoria 
Geral de Saúde dos Portos. A criação da Inspetoria de Saúde dos Portos respondia às necessidades 
de dinamização da economia exportadora e passou a ser de competência do governo central, ao 
passo que as outras ações de higiene continuariam a ser de responsabilidade das autoridades locais 
(COSTA, 2004).
 No verão de 1889, a febre amarela atacou novamente e causou a morte da filha de Francisco de 
Paula Rodrigues Alves, ex-senador e governador da Província e depois do estado de São Paulo e ex-con-
selheiro do Império. Rodrigues Alves, em 1902, assumiria a Presidência do Brasil (o quinto presidente) 
e daria as condições para Oswaldo Cruz realizar o saneamento do Rio de Janeiro. Ainda em 1889, por 
meio do Decreto 10.319, de 22 de agosto, o Governo Imperial promulga a Convenção Sanitária entre o 
Império do Brasil, a República Argentina e a República Oriental do Uruguai, para facilitar trocas comer-
ciais e prevenção de doenças transmissíveis. O Brasil era visto como um paraíso das principais doenças 
epidêmicas. Rui Barbosa e a Academia de Medicina, que reclamava por não ter participado das nego-
ciações, viriam a denunciar o acordo como humilhante para o Brasil, por submeter nossa população a 
fortes controles sanitários (COSTA, 2004). Em 15 de novembro de 1889, sem que a população percebes-
se, generais e oligarcas do café proclamaram a República (BUENO, 2005).15
 Em síntese, com a transferência da Corte Imperial para o Brasil, são anuladas as proibições ao 
ensino de medicina na colônia, às indústrias e à venda a outros países que não Portugal. A produção 
(ainda agrícola) e o comércio intensificam-se. As epidemias de febre amarela, varíola, cólera, peste bu-
bônica, tifo, gripe e doenças como lepra, tuberculose continuam a castigar cruelmente não somente a 
população, mas o próprio modelo de exportação. A Revolução Industrial demandava matérias-primas, 
como algodão, látex, cacau, café, tabaco, madeira etc., e o Brasil, apesar de imperial, cumpria sua sina 
14 Tanto a Sociedade de Medicina e Cirurgia quanto a Academia Imperial de Medicina constituem a face do novo poder da 
medicina em articulação com o Estado, em nome do combate ao charlatanismo, mesmo cientes de que as formas oficiais 
de curar não alcançam a imensa maioria da população. A homeopatia, exercida por práticos, por exemplo, era ferozmente 
combatida (COSTA, 2004).
15 A época vivia, também, um movimento para a abolição da escravatura, que acabou acontecendo, no plano formal, em 1888, 
sem nenhuma política para amparar ou regulamentar a situação dos ex-escravos. Também importante era a Guerra do Para-
guai, na qual o Brasil promoveu um autêntico genocídio de crianças, mulheres e idosos paraguaios, que encheu de orgulho e 
poder os militares brasileiros. Estes, junto com os poderosos da “República dos Fazendeiros”, proclamaram a República em 1889 
(BUENO, 2005).
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária26
colonial de supridor delas, muitas das quais voltavam sob a forma de produtos industrializados. O mo-
vimento nos portos intensifica-se, o que os torna ainda mais importantes para a economia do Império. 
As condições sanitárias das cidades e da população são as piores; o saneamento é ainda muito invo-
cado e nada efetivado. O saber e a prática sanitária são reivindicados pelo crescente poder médico. As 
primeiras formas de organização sanitária mais consistentes são instituídas, reproduzindo o modelo 
normativo (e ineficaz) de Portugal; médicos e boticas são mais visados. O cultivo e a exportação de café 
criam riqueza e, consequentemente, poder, concentrados em São Paulo. A escravidão é abolida e o 
Império dá lugar à República.
2.3 Da República Velha até a Revolução de 1930
 Em 1891, foi promulgada a nova Constituição Federal, para organizar os poderes e as institui-
ções da República. Inspirada nos princípios liberais (da Constituição dos Estados Unidos), a Constitui-
ção de 1891 delega à União a responsabilidade pelos estudos das doenças e das medidas profiláticas; 
pela estatística demográfica e sanitária; pela fiscalização do exercício profissional da medicina e da 
farmácia; pela análise das substâncias importadas; e pelo controle das doenças na capital federal e 
nos portos e fronteiras. Aos municípios, delega a responsabilidade pela administração dos cemitérios, 
afirmando que são instituições seculares (COSTA, 2004).
 O café é o grande provedor da riqueza nacional (63% do total das nossas exportações) e tam-
bém o fundamento da oligarquia agrária, que permaneceno poder mesmo com a Proclamação da Re-
pública. Com ideais autonomistas, a riqueza proporcionada pelo café e o apoio da oligarquia cafeeira, 
São Paulo toma a frente na área da saúde. Em 1892, em São Paulo, foi criado o Laboratório de Bacterio-
logia, com o apoio de Louis Pasteur. Outros órgãos paulistas criados nessa época foram o Serviço Sani-
tário do Estado de São Paulo (a partir da Inspetoria de Higiene da Província de São Paulo), o Laboratório 
Farmacêutico e o Hospital de Isolamento.
O aumento da imigração, a expansão da produção cafeeira e o aumento do comércio 
internacional exigem melhoramentos nas cidades portuárias para assegurar condições 
sanitárias favoráveis aos negócios. 
 Os portos passam a ser o alvo privilegiado das intervenções do poder central, por exigências da 
economia exportadora. Em 1893, por meio do Decreto 1.558, de 7 de outubro, foram criadas as inspeto-
rias de saúde nos estados, com a finalidade de realizar o controle sanitário dos portos e o cumprimento 
dos tratados celebrados pelo Brasil.
 Em 1895, o destróier italiano Lombardia fez uma visita de cortesia ao Brasil, com trágico desen-
lace: 333 dos seus 340 tripulantes foram contaminados pela febre amarela no porto do Rio de Janeiro; 
234 morreram. Os sobreviventes voltaram à Itália em outro navio, deixando o destróier abandonado 
na baía da Guanabara (BUENO, 2005; COSTA, 2004). Em 1897, em nova reorganização dos serviços sa-
nitários federais, por meio do Decreto 2.458, de 10 de fevereiro, os serviços marítimos e terrestres são 
27Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
unificados em um único órgão denominado Diretoria Geral de Saúde Pública. Os serviços sanitários dos 
portos, sempre a preocupação principal, foram divididos em três distritos, com sedes no Rio de Janeiro, 
Recife e Belém (COSTA, 2004).
 Em 1889, em São Paulo e Santos; e em 1890, no Rio de Janeiro, ocorrem epidemias de peste, 
que evidenciam as primeiras indefinições de competências e superposições de atuação entre órgãos 
federais e estaduais. Em 1899, Emílio Ribas, à frente do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo, pre-
cisou enfrentar uma epidemia de febre amarela em Campinas e, logo após, outra epidemia da temida 
peste bubônica, iniciada com a chegada de um navio em Santos. Neste caso, Emílio Ribas, Vital Brazil, 
Adolfo Lutz e Oswaldo Cruz trabalharam juntos. Somente a França produzia o soro contra a peste, 
mas não em quantidade suficiente para atender os casos. Em 1900, no Rio de Janeiro, o governo 
federal cria o Instituto Soroterápico Federal, para produzir o soro. Em 1901, em São Paulo, é criado o 
Instituto Butantan, pelo governo estadual de Rodrigues Alves (que no ano seguinte seria presidente 
do país), para a fabricação do soro antiofídico (BUENO, 2005).
Em 1902, com Oswaldo Cruz como diretor da Diretoria Geral de Saúde Pública, são 
conferidos à União os mais amplos poderes para interferir na vida da capital e de seus 
cidadãos, dentro do figurino da polícia sanitária. 
 As epidemias no Rio de Janeiro e outras cidades, em especial de peste, varíola, cólera e febre 
amarela, e a alta mortalidade por tuberculose, estavam causando muitos prejuízos à economia do país. 
Muitos navios se recusavam a atracar em portos brasileiros e desviavam sua rota para outros países 
(COSTA, 2004).
 Rodrigues Alves, ele mesmo um grande produtor de café, banca liberdade total para Oswaldo 
Cruz, Pereira Passos e Lauro Miller e, em 1903, o Rio de Janeiro é palco da reforma sanitária combinada 
com a reforma urbana. Oswaldo Cruz lança mão de medidas polêmicas como compra de ratos, um exér-
cito de mata-mosquitos e vacinação antivariólica obrigatória, que causam muitas reações. Em 1904, 
eclode a Revolta da Vacina, que gera um intenso movimento de desobediência civil e deixa 23 mortos, 
67 feridos e 945 presos, dos quais 495 foram deportados para o Acre. Ignorância e muitos boatos sobre 
efeitos adversos da vacina; desempregados, desalojados dos cortiços pela reforma urbana; e vários mé-
dicos contrários à vacinação alimentaram um quebra-quebra. Militares, tendo à frente o general Silva 
Travassos, tentam tomar o Palácio do Catete e depor o presidente Rodrigues Alves, mas não têm suces-
so devido à oposição da Marinha (BUENO, 2005). Ainda em 1904, entra em vigor um novo Regulamento 
dos Serviços Sanitários da União, que estabelece novas normas para o controle da situação sanitária, 
determina que a União elabore seu Código Sanitário e institui, no Distrito Federal, o Juízo dos Feitos 
da Saúde Pública, para o julgamento de causas de interesse à saúde, como crimes e contravenções de 
higiene pública e cobrança de multas e taxas sanitárias (COSTA, 2004).
 Novamente os portos são objeto de medidas governamentais. Em 29 de novembro de 1911, com o 
Decreto 9.157, e em 18 de março de 1914, com o Decreto 10.821, ocorrem novas reorganizações do controle 
sanitário dos portos: estes são divididos em quatro categorias. Criam-se 19 inspetorias de saúde ao longo 
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária28
do litoral brasileiro, que ficam sob a responsabilidade dos Serviços de Polícia Sanitária e Profilaxia nos Por-
tos da República. Em 1913, é formada a primeira turma de farmacêuticos pela Universidade de São Paulo; 
e, em 1917, é aprovada a Pharmacopeia Paulista, antes mesmo que o país tivesse a sua (COSTA, 2004).
 Entre 1914 e 1919, ocorre a Primeira Guerra, que impulsiona a indústria brasileira e diminui a 
importação, haja vista que os principais países fornecedores do Brasil estão envolvidos com a guerra. 
Em especial, a indústria de alimentos dá um grande salto e passa a ser responsável por 40,2% da pro-
dução nacional. O congelamento permite a exportação de carne aos países em guerra; a indústria de 
embutidos e conservas também se desenvolve e exporta. O Brasil recebe os grandes frigoríficos interna-
cionais (Wilson, Armour, Swift, Continental e Anglo), assim como produtos químico-farmacêuticos, nos 
primeiros anos da década de 1920 (PRADO JR. apud COSTA, 2004).
 Mas as condições de vida da maioria da população eram bastante precárias. 
Em 1918 acontece a grande pandemia de gripe espanhola, agravada pela fome. 
 Também foi criada, em 1918, a Liga Pró-Saneamento, que advoga uma nova organização sani-
tária e a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública, em meio a um movimento nacionalista 
(COSTA, 2004).
 Em 2 de janeiro de 1920 é publicado o Decreto-Lei 3.987, que define a Reforma Carlos Chagas 
e cria o Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), a Diretoria de Serviços de Saúde (DSP) do 
Distrito Federal (DF); a Diretoria de Defesa Sanitária Marítima e Fluvial (DDSMF) e a Diretoria de Sanea-
mento Rural (DSR). O contexto é de crise econômica e a saúde pública cresce como questão social.
 Em 31 de dezembro de 1923, o Decreto 16.300 institui o Regulamento Sanitário Federal. Com 
1.679 artigos, definia extensas competências ao DNSP, entre elas a polícia sanitária dos domicílios, lu-
gares e logradouros públicos, fábricas, oficinas, colégios, estabelecimentos comerciais e industriais, 
hospitais, casas de saúde, maternidades, mercados, hotéis e restaurantes do Distrito Federal; fiscali-
zação de gêneros alimentícios, de vacinas, soros e outros produtos biológicos; inspeção de imigrantes 
e outros passageiros dos portos; isolamento de leprosos e outros doentes de doenças transmissíveis; 
estatísticas demográficas e sanitárias; higiene industrial e profissional; exercício profissional no campo 
da saúde; normas de controle sanitário em diversos campos; um serviço de propaganda e educação 
sanitária, e pesquisas de interesse da saúde; multas e penas para falsificadores; todas as atividades de 
vigilância de doenças, de produtos e serviços; licença prévia para a venda de medicamentos pelas in-
dústrias e farmácias; responsável técnico para fabricantes e farmácias; água para abastecimento; soros 
e vacinas;passaporte sanitário; requerimentos para indústrias e portos, entre muitas outras. Como se 
vê, um código inspirado na polícia médica, que somente poderia ser cumprido se houvesse um forte 
aparato estatal, com pessoal qualificado e uma estrutura de poder inclusive policial. Os milhares de 
artigos continham disposições minuciosas que o aparato estatal não conseguiria fazer cumprir, como 
era de praxe na história da saúde pública. No texto do decreto, as ações de saúde têm natureza extre-
mamente autoritária e, apesar de emergir como questão social, a saúde ainda é vista como questão de 
polícia sanitária. O regulamento emprega o termo “vigilância” para se referir ao acompanhamento de 
29Capítulo 1: Evolução da vigilância sanitária no Brasil
comunicantes, pessoas chegadas de áreas epidêmicas no exterior ou no país; e também o termo “vigi-
lância sanitária” para se referir indistintamente ao controle sanitário de pessoas doentes ou suspeitas 
de moléstias transmissíveis, estabelecimentos e locais. O regimento tinha normas detalhadíssimas para 
todas as áreas envolvidas. Exigia, por exemplo, que as vacas leiteiras fossem lavadas diariamente e que 
os açucareiros pudessem ser usados sem a necessidade de se retirar a tampa ou usar colheres, e que 
fosse evitada a entrada de moscas (COSTA, 2004). Como era previsível, mantendo a tradição normativis-
ta, a imensa maioria dos seus dispositivos não era cumprida.
 Em 4 de novembro de 1926, o Decreto 17.509 aprova a primeira Farmacopeia Brasileira, que 
substitui a Farmacopeia Francesa até então usada como referência oficial. Em 1928, um novo surto 
de febre amarela aconteceu no Rio de Janeiro e depois em São Paulo. Uruguai e Argentina chegam 
a proibir que navios que houvessem passado pelos portos de Salvador ou do Rio de Janeiro atra-
cassem em seus territórios; e a Fundação Rockefeller já está no Brasil para “ajudar” no combate à 
febre amarela. Emerge um forte movimento para a criação de um ministério para a saúde. Em 1929, 
o governo de Washington Luís adere à Convenção da União de Paris, reconhecendo patentes para 
técnicas de produção e fabricação de medicamentos (COSTA, 2004), um exemplo claro da nossa men-
talidade colonial, pois o país não possuía condições técnicas e científicas para produzir inovações e 
se beneficiar com o acordo.
 Em 1930, é criado o Ministério da Educação e da Saúde Pública, com dois departamentos: o 
Departamento Nacional de Saúde Pública e o Departamento Nacional de Educação (DNE). Mas o novo 
governo, instaurado na Revolução de 1930, confere maior prioridade à área da educação. Um dos obje-
tivos da Revolução é um Estado forte face aos interesses de diversas classes, com um projeto nacional-
-desenvolvimentista, que se voltasse mais à industrialização e desestruturasse o poder oligárquico da 
Velha República. A grande crise internacional de 1930 mostrou a fragilidade do modelo agroexportador 
e a necessidade de se cuidar dos graves problemas sociais da população.
 Assim, desde a época colonial, apesar das diferentes formas de governo – colônia, império in-
dependente, república até 1930 –, a economia brasileira seguiu um modelo primário-exportador, ba-
seado na produção e exportação de comodities agrícolas e minerais, na dependência da demanda do 
mercado internacional, embalado pela Revolução Industrial (REGO; MARQUES, 2003). Os esforços de 
industrialização não foram bem-sucedidos, e o país era totalmente dependente de manufaturas impor-
tadas; a alfândega era relativamente livre à entrada desses produtos. 
O que hoje seria a área de portos, aeroportos e fronteiras era o principal foco de 
atuação da fiscalização sanitária, não exatamente porque era o ponto de entrada e 
saída de doenças que acometiam a população, mas principalmente pela sua função 
primordial para a economia primário-exportadora. 
 As epidemias absorviam a maior parte dos recursos e das energias da saúde pública; eram 
recorrentes, embora muitas delas já tivessem suas causas descobertas. Por sua precariedade e insufi-
ciência, o saneamento, visto como área crítica pelos sanitaristas, tornou-se problema central durantes 
MANUAL DE TECNOVIGILÂNCIA - Unidade 1: O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária30
as três primeiras décadas do século XX, sem que, no entanto, houvesse um investimento de vulto para 
sua solução. A produção industrial era incipiente e o controle sanitário dos produtos não era prioridade. 
Outros temas de preocupação, que também viriam a compor a área da vigilância sanitária, eram a fisca-
lização do exercício dos médicos e dos boticários; a qualidade dos alimentos e dos remédios utilizados; 
assim como a higiene em geral. Instaura-se a era bacteriológica nos campos da pesquisa e da produção 
de soros, vacinas e outros produtos, mas dentro de instituições públicas. Seguindo o ideário da polícia 
médica, o governo federal consegue o saneamento do Rio de Janeiro. A política era dominada por uma 
oligarquia agrária conservadora cognominada de “República dos Fazendeiros”. Os diversos regulamen-
tos, em todos os períodos, apesar de abordarem problemas concretos, não eram inteiramente cumpri-
dos; alguns porque impraticáveis pelo seu detalhamento, mas a maioria por falta absoluta de estrutura 
e recursos de fiscalização e de interesse em seu cumprimento, o que mostra uma organização das ações 
de controle sanitário mais baseada em papéis do que em fatos. Não se encontra menções a laboratórios 
que pudessem trabalhar para atestar qualidade ou segurança de produtos, como já vinha acontecendo 
em países europeus e nos Estados Unidos da América (EUA). O país ia avançando na organização de 
instâncias de governo que tivessem capacidade para enfrentar os problemas de saúde pública.
3. MODELO NACIONAL-DESENVOLVIMENTISTA DE SUBSTITUIÇÃO 
DE IMPORTAÇÕES – 1930 A 1990
 Em 1930, o Brasil estava literalmente quebrado. A crise internacional fez baixar o preço da saca 
do café, o carro-chefe da economia nacional, de 4 para 1 libra. Toda a economia nacional dependia das 
exportações do café: fazendeiros, cafeicultores, banqueiros, operários e camponeses, todos entram em 
bancarrota. Uma nova fraude nas eleições para presidente, comum na época e que mantinha o poder 
em mãos da velha oligarquia agrária, juntamente com o assassinato de João Pessoa desencadeiam 
uma revolução. Getúlio Vargas assume o poder16 com um projeto de desenvolvimento nacional, preo-
cupação com problemas sociais e interesse na defesa das riquezas nacionais. O momento é de reorien-
tação do modelo de desenvolvimento, de agroexportador para o de substituição das importações, por 
meio do incentivo à industrialização (RIBEIRO, 1985).
 Já em 19 de janeiro e 8 de setembro 1931, por meio dos Decretos 19.606 e 20.377, respectiva-
mente – que substituem parte do Regulamento de 1923 –, o governo prepara a base legal para o ramo 
farmacêutico. Mantem-se o licenciamento de produtos, de competência exclusiva da União, e o licen-
ciamento prévio para a produção e comercialização de especialidades farmacêuticas e outros produ-
tos, dentro de um amplo processo de reorganização do Estado. Numerosos outros tipos de produtos, 
como antissépticos, desinfetantes, inseticidas etc., também têm sua regulamentação renovada, visando 
a industrialização. O Brasil assina, em Genebra, a Convenção para Limitar a Fabricação e Regulamentar 
16 O Presidente Washington Luís, conservador paulista, queria fazer seu sucessor, como de praxe na “República dos Fazendeiros”. 
Seu escolhido era Júlio Prestes (outro paulista, grileiro de terras em Itapetininga), com Vital Soares (baiano) de vice (RIBEIRO, 
1985). Essa escolha contrariou Antônio Carlos, o governador de Minas Gerais, que havia lançado sua candidatura à presidência. 
Então, Antônio Carlos (MG), João Pessoa (PB) e Getúlio Vargas (RS) lançam a Aliança Liberal, como oposição à chapa oficial, com 
a candidatura de Getúlio para presidente e João Pessoa de vice. O assassinato (passional)

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