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TCC Andressa Sorensen (1)

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Prévia do material em texto

ANDRESSA SÖRENSEN 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O LUGAR DOS PAIS NO ABANDONO 
DO TRATAMENTO PSICOLÓGICO DE CRIANÇAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
IJUÍ, DEZEMBRO, 2014 
 
 
 
1 
UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO 
GRANDE DO SUL 
DHE – DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO 
CURSO DE PSICOLOGIA 
 
 
 
 
 
O LUGAR DOS PAIS NO ABANDONO 
DO TRATAMENTO PSICOLÓGICO DE CRIANÇAS 
 
 
 
ANDRESSA SÖRENSEN 
 
 
 
ORIENTADORA: PROFESSORA ANGELA MARIA SCHNEIDER DRÜGG 
 
 
 
 
Trabalho de conclusão de curso apresentado 
como requisito parcial para conclusão do curso 
de formação de Psicólogo 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
IJUÍ, DEZEMBRO, 2014 
 
 
 
 
2 
 
 
ANDRESSA SÖRENSEN 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O LUGAR DOS PAIS NO ABANDONO 
DO TRATAMENTO PSICOLÓGICO DE CRIANÇAS 
 
 
 
 BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
PROFª MSc. ANGELA MARIA DRUGG ____________________________ 
 Orientadora 
 
PROFª MSc. KENIA FREIRE ___________________________ 
 Examinadora 
 
 
 
 
 
 
IJUÍ, DEZEMBRO, 2014 
 
 
 
3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esta conquista aos meus 
familiares e ao meu noivo que, sem 
dúvida, foram essenciais para que eu 
pudesse chegar até aqui para a 
realização deste sonho, e aos demais 
amigos e colegas que, de alguma forma, 
me apoiaram durante meu percurso 
acadêmico. 
O meu muito obrigada de todo o coração! 
AGRADECIMENTOS 
 
Este momento significa a realização de um sonho. Não foi fácil, mas hoje me 
sinto orgulhosa de ter conseguido ser psicóloga, profissão que escolhi seguir, honrar 
e, sem dúvida, servir. 
Agradeço ao meu companheiro de vida, Vagner, por ter sonhado junto comigo 
e não ter medido esforços para que esse sonho hoje se tornasse realidade; por ter 
respeitado os meus momentos de ausência e por ter me encorajado em momentos 
de dificuldades. 
Aos meus pais e meus irmãos, que acreditaram comigo que esse sonho seria 
possível; que confiaram e me deram todo o apoio necessário para que eu pudesse 
chegar até aqui. Hoje esta conquista é nossa. 
Aos meus sobrinhos que são a luz da minha vida. 
À minha avó Áurea que, em todo este percurso, sempre me apoiou, torceu e 
orou muito para que eu realizasse este sonho. 
A vocês o meu profundo agradecimento – minha família, minha base. 
À minha orientadora, Angela Drügg, pelo caminho percorrido em conjunto, 
pelo conhecimento compartilhado, pela paciência e por me ajudar a evoluir tanto 
profissional quanto pessoalmente. 
Às colegas e amigas Aline A. Lindner, Marisa Scherer, Dalva A. Victor e 
Karine T. Schneider, pelo tempo que passamos juntas, dividindo nossas 
experiências. 
Aos amigos, familiares e colegas, por se permitirem ouvir e compreender 
minhas angústias durante as experiências dos estágios de ênfase e também no 
decurso da elaboração deste trabalho, além de entenderem a minha ausência em 
alguns momentos. 
Agradeço a Deus por ter me permitido chegar até aqui e por ter me protegido 
durante esta caminhada. 
 
 
 
5 
TÍTULO: O LUGAR DOS PAIS NO ABANDONO DO TRATAMENTO PSICOLÓGICO 
DE CRIANÇAS 
ACADÊMICA: ANDRESSA SÖRENSEN 
ORIENTADORA: PROFESSORA ANGELA MARIA SCHNEIDER DRÜGG 
 
RESUMO 
 
Este estudo traz considerações acerca do abandono do tratamento psicológico de crianças 
bem como a presença dos pais no trabalho clínico com elas. Aborda a presença dos pais 
desde os primórdios da psicanálise com crianças, e também a especificidade da clínica com 
crianças e suas características particulares, desdobrando, assim, conceitos fundamentais 
desta prática. A pesquisa analisa uma possível causa de abandono de tratamento infantil à 
medida que leva conta a constante presença dos pais neste momento. A interrogação que 
se produz é: Qual a relação entre o abandono do tratamento e o lugar dos pais? 
 
Palavras-chave: Abandono do Tratamento. Resistência dos Pais. Transferência Múltipla. 
 
 
 
 
6 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ............................................................................................................7 
 
1 O LUGAR DOS PAIS NA ORIGEM DA PSICANÁLISE COM CRIANÇAS...............8 
 
2 O ABANDONO DO TRATAMENTO NA CLÍNICA INFANTIL: COMO PODEMOS 
PENSÁ-LO? ..............................................................................................................17 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................30 
 
REFERÊNCIAS.........................................................................................................32 
 
 
 
 
 
 
 
7 
INTRODUÇÃO 
 
O presente trabalho pretende trazer algumas questões acerca da clínica com 
crianças relativas à suas especificidades e à constante presença dos pais como algo 
muito importante para o “sucesso” do tratamento psicanalítico destas. O trabalho se 
constitui por meio da pesquisa teórica pelo viés da psicanálise, trazendo autores 
contemporâneos que contribuíram com o tema em questão. 
O interesse pelo assunto iniciou durante o percurso acadêmico e, 
especialmente, a partir da experiência de estágio na Clínica/Escola, que nos 
proporcionou a observação de que ocorriam interrupções/abandonos de tratamento 
por parte das crianças. Esta observação nos fez começar a pensar quais poderiam 
ser as possíveis causas destes “abandonos”. 
Historicamente, a psicanálise com crianças teve seu primeiro intento realizado 
por Freud na análise do pequeno Hans. Até então o que se sabia do mundo interno 
infantil era baseado nas observações e escuta clínica de adultos. O trabalho com 
Hans obteve êxito, mas nada técnico foi elaborado, visto que, tratava-se de uma 
urgência a ser trabalhada e não a busca por uma forma de atendimento de crianças. 
Assim teve início um protótipo de atendimento infantil, uma futura técnica que 
adviria com outros estudiosos interessados como Hermine Von Hug-Hellmuth, Anna 
Freud, Melanie Klein, Françoise Dolto, Maud Mannoni. Como podemos observar, no 
cenário da psicanálise infantil encontram-se grandes pesquisadores, e claro, cada 
um, busca sua fundamentação dentro de sua teoria formadora e/ou constitutiva. 
Uma das características que podemos perceber na prática clínica com 
crianças é a presença dos pais e como isto pode interferir no curso do tratamento. 
Às vezes essa interferência conspira para o bem do tratamento, e, em outras, ela 
pode prejudicar o mesmo se o terapeuta não souber como lidar com ela. Esta real 
presença exige do profissional muito mais do que se ele estivesse tratando adultos. 
Muitos fatores, como a demanda e a transferência, determinam o tratamento quando 
se trata de crianças, pois se modificam e exigem certo manejo do psicólogo. 
Muitas interrogações surgem a partir do trabalho na clínica infantil, como, por 
exemplo, trabalhar essa relação com os pais e verificar como estabelecer o laço 
transferencial com estes e com a criança que está em atendimento. Estas e outras 
levaram à escrita deste trabalho, o qual se estrutura em dois capítulos. 
 
 
 
8 
O primeiro, “O lugar dos pais na origem da psicanálise com crianças”, aborda 
a presença dos pais desde os primórdios da psicanálise infantil e como os teóricos 
viam e trabalhavam com esta presença. Neste estudo podemos perceber as grandes 
diferenças teóricas que surgiram desde a prática clínica. Podemos, ainda, a partir de 
cada um deles, perceber como consideravam a presença dos pais no atendimento 
de crianças e o que achavam desta presença. 
O segundo capítulo, “O abandono do tratamento na clínica infantil: como 
podemos pensá-lo?”, destina-se a trabalhar as possíveis causas de abandono no 
tratamento psicanalíticode crianças, sem deixar de lado a questão do lugar que os 
pais ocupam neste trabalho clínico. Também apresenta as principais características 
desta clínica que tanto interroga os profissionais que nela atuam e como ela se 
configura diferentemente da clínica com adultos. Este capítulo aborda como os 
elementos principais no tratamento psicológico se configuram no trabalho com 
crianças, apresentando a origem da demanda, como ela vem expressa no 
tratamento e se torna mais complexa, trata da transferência e como se constitui um 
laço transferencial com os pais do mesmo modo que com a criança. Por fim, 
investiga como todos estes elementos particulares do trabalho clínico com crianças 
contribuem para que ocorra a interrupção do tratamento. 
Buscou-se, mediante a escrita, trazer considerações que sejam relevantes 
para entender este “abandono”, e poder, de alguma forma, trazer evidências que o 
ligam à presença real dos pais neste campo. 
Diante disto, cabe a reflexão acerca do trabalho clínico com crianças: Por que 
ocorrem essas interrupções? Quais seriam as possíveis causas? 
Partindo destas questões, na tentativa de uma explicação trazemos algumas 
considerações acerca do assunto. 
 
 
 
 
9 
1 O LUGAR DOS PAIS NA ORIGEM DA PSICANÁLISE COM CRIANÇAS 
 
É importante buscarmos na História quando a psicanálise de crianças teve 
seu efetivo início e quais foram os principais teóricos que contribuíram para isso. 
Dentre estes, também verificamos como cada um trabalhou a presença dos pais no 
tratamento de crianças e qual era a importância destes para o trabalho clínico com 
as mesmas. 
Segundo Costa (2010), o interesse pela psicanálise infantil surgiu a partir da 
escuta de Freud a suas pacientes histéricas. Para esta autora, Freud desenvolveu a 
teoria da sedução, encontrando a etiologia das neuroses dos adultos em 
experiências sexuais traumáticas ocorridas na infância. Mais tarde, no entanto, os 
fracassos clínicos o levaram a abandonar essa teoria, porque concluiu que os 
sintomas histéricos decorriam de fantasias impregnadas de desejo. A realidade 
psíquica, portanto, era a determinante, e não a realidade factual. 
Esse foi um momento teórico muito importante para a teoria psicanalítica, 
quando o que se tornou relevante não mais eram os fatos decorridos na infância, 
mas sim a realidade psíquica, constituída pelos desejos inconscientes e pelas 
fantasias a ela vinculadas, tendo como pano de fundo a sexualidade infantil. A 
infância também passa por mudanças no seu conceito; passa não mais a ser vista 
como um registro genético e cronológico para ser abordada pela lógica do 
inconsciente. 
Durante muito tempo estudou-se sobre a psicanálise de crianças e se ela era 
realmente possível de ser realizada. 
Para Freud (1905), a criança é introduzida no campo da sexualidade por meio 
da função materna realizada pela própria mãe ou por quem assuma este papel. É 
por intermédio dos cuidados e do desejo materno que o corpo do bebê é erotizado e, 
então, passa a ser introduzido no campo da sexualidade. 
Desse modo, Freud (1909) apresenta ao mundo uma nova criança, dotada de 
sexualidade. A partir do conceito de pulsão, Freud (1905) mostra que o corpo da 
criança é um corpo pulsional, corpo este de desejo. 
De acordo com Costa (2010, p. 15), é mediante este conceito que Freud 
demonstra que “a criança faz uso do seu próprio corpo como fonte de prazer”. Para 
exemplificar, Freud utiliza a amamentação do bebê para mostrar a separação entre 
instinto e pulsão. Sempre haverá uma distância marcada entre o que é desejado e o 
 
 
 
10 
desejo alcançado, e é essa abertura que marcará o sujeito em sua eterna busca 
pelo objeto que supostamente o fará alcançar a satisfação. 
Muitas questões surgem a partir do estudo de vários teóricos sobre a 
psicanálise com crianças: Quem é essa criança da psicanálise? Como se constitui? 
É possível uma psicanálise com crianças? 
Durante muitos anos estas perguntas foram alvo de teóricos que tentavam de 
toda maneira respondê-las, cada um com sua linha de pensamento. 
Pode-se considerar que a psicanálise com crianças teve seu marco inicial 
com o caso do pequeno Hans, publicado por Freud em 1909. Este caso teve uma 
peculiaridade: o tratamento foi realizado pelo pai do menino, Max Graf, sob 
supervisão de Freud, que se encontrou com o menino apenas uma vez. 
Segundo Marra (2005, p. 26), 
 
até então tudo que se sabia sobre o mundo interno infantil era baseado em 
observações e escuta de adultos através da análise de pacientes do próprio 
Freud. O trabalho obteve êxito com o desaparecimento dos sintomas 
fóbicos de Hans, entretanto, nenhuma sistematização técnica foi elaborada, 
visto que, tratou-se na época de uma urgência a ser trabalhada para alívio 
dos sintomas de Hans e não a busca por uma forma de atendimento de 
crianças, na realidade de uma improvisação que em certa medida deu certo. 
 
Conforme Marra (2005), Freud nos forneceu o primeiro modelo de análise 
infantil, na medida em que mostrou ser possível ter acesso à linguagem pré-verbal 
de uma criança (as associações livres) por meio de desenhos, dos sonhos e 
também pelas fantasias que lançariam as bases de uma técnica da psicanálise 
infantil. Observou que, à medida que os aspectos conflitantes e os temores de Hans 
foram surgindo e do mesmo modo se esclarecendo, chegou-se ao desaparecimento 
da fobia. 
Nessa primeira tentativa de tratar de uma criança por meios analíticos, Freud 
contou com a colaboração do pai do menino. No já citado artigo, Freud (1909, p. 15) 
afirma: 
 
[...] o próprio tratamento foi efetuado pelo pai da criança, sendo a ele que 
devo meus agradecimentos mais sinceros por permitir publicar suas 
observações acerca do caso [...]. Ninguém mais poderia, em minha opinião, 
ter persuadido a criança a fazer quaisquer declarações como as dela; o 
conhecimento especial pelo qual ele foi capaz de interpretar as observações 
feitas por seu filho de cinco anos era indispensável; sem ele as dificuldades 
técnicas no caminho da aplicação da Psicanálise numa criança tão jovem 
 
 
 
11 
como esta teriam sido incontornáveis. Só porque a autoridade de um pai e a 
de um médico se uniam numa só pessoa, e porque nela se combinava o 
carinho afetivo com o interesse científico, é que se pode neste único 
exemplo, aplicar o método em uma utilização para a qual ele próprio não se 
teria prestado, fossem as coisas diferentes. 
 
Foi a partir do caso Hans que Freud estabeleceu os pontos essenciais para 
que uma análise com crianças fosse possível, ou seja, a demanda, a transferência e 
a interpretação. 
A demanda normalmente vem expressa pelos pais ou pelos adultos 
responsáveis pela criança. A transferência, segundo Freud (1912), no caso da 
análise de crianças, precisa da junção da “autoridade paterna com a autoridade 
médica”. 
O terceiro ponto essencial para que uma análise seja possível é a 
interpretação. Freud demonstrou a importância da interpretação ao entender a fobia 
do pequeno Hans por cavalos como sendo um medo da retaliação paterna pelos 
desejos eróticos pela mãe. Essa interpretação, segundo ele possibilitou a cura da 
neurose. 
Freud (1909), com esses pontos e a partir do caso do pequeno Hans, lançou 
as bases teóricas para análise de crianças, mas ainda levaria muito tempo para que 
ela se desenvolvesse. Faltava um elemento fundamental para a clínica com 
crianças: a descoberta do brincar como um recurso que o terapeuta utiliza para ter 
acesso ao inconsciente infantil. 
A psicanálise tem como objeto o sujeito, seja ele uma criança ou um adulto, 
no entanto não podemos esquecer que a psicanálise com crianças tem uma 
especificidade em relação à clínica de adultos, uma vez que a criança, por 
características comportamentais que lhe são próprias, não pode cumprir com a regra 
fundamental da análise, ou seja, a associação livre. Por isso foi fundamental a 
descobertado brincar como um equivalente da associação livre, pois, por meio dele, 
a criança sente-se livre; ela brinca com o que encontrar em sua frente, sendo esse 
um modo natural de ela se expressar. 
Na História da psicanálise foi, inicialmente, às mulheres que coube o papel de 
analisar crianças. Isso foi decorrente de uma época em que não era bem-visto que 
as mulheres ingressassem nas universidades e com isso pudessem seguir uma 
carreira profissional. Era possível, no entanto, que ingressassem nas escolas, 
atuando como professoras. Algumas, a partir daí, passavam a praticar a psicanálise, 
 
 
 
12 
pois encontravam no ambiente da sala de aula um lugar propício para aplicarem a 
teoria psicanalítica. 
Segundo Marra (2005), foi entre os anos 20 e 40 do século 20 que ocorreram 
os primeiros movimentos psicanalíticos em prol da clínica com crianças. A partir das 
pesquisas das primeiras analistas – Hermine Von- Hug-Hellmuth, Anna Freud e 
Melanie Klein – é que a clínica com crianças começa a se desenvolver. 
Depois de Freud, a tentativa de analisar crianças foi levada adiante por 
Hermine Von Hug-Hellmuth (1910), que, até o ano de sua morte, em 1924, dirigiu 
um serviço psicanalítico de ajuda à educação em Viena, que a consagrou, 
juntamente com suas publicações e o grande respeito que Freud tinha pelo seu 
trabalho, como a pioneira da psicanálise com crianças (COSTA, 2010). 
Conforme Costa (2010), Hermine Von Hug-Hellmuth visitava as crianças em 
seus lares a fim de observá-las enquanto participavam de atividades lúdicas. Na 
análise com crianças utilizava jogos e desenhos, afirmando que com esse material 
as crianças elaboravam as situações difíceis e traumáticas. Em seu método, a 
interpretação do material inconsciente combinava-se com a influência pedagógica 
direta. 
Hermine Von Hug-Hellmuth desaprovava o atendimento de crianças muito 
pequenas, as quais ainda não haviam passado pelo complexo de Édipo, pois 
acreditava que nesses casos a análise poderia prejudicá-las em razão do poder do 
recalque de mobilizar e fortalecer as tendências impulsivas da criança. 
A pioneira Hermine buscava conciliar o objetivo psicanalítico com os da 
família, escola e sociedade, tentando desvendar os segredos que a criança ocultava 
intencionalmente dos educadores. Propunha que o analista de criança não precisava 
explicitar os impulsos inconscientes, bastando que esses se expressassem em atos 
simbólicos, sem a necessidade de passar pela linguagem falada. O analista deveria 
ser, ao mesmo tempo, terapeuta e educador que cura. 
Assassinada pelo sobrinho, o qual havia atendido quando criança, Hermine 
Von Hug-Hellmuth faleceu em 1924. Embora seu nome esteja citado como uma das 
pioneiras da psicanálise com crianças, sua obra pode ser considerada quase 
desconhecida, pois a maioria dos seus artigos não foram traduzidos do alemão. 
Consoante Costa (2010), a partir de então se tomaram pela psicanálise de 
crianças Anna Freud e Melanie Klein, cujas obras diferem acentuadamente. 
 
 
 
13 
Foi no campo da psicanálise com crianças que Anna Freud foi reconhecida 
por seus trabalhos. Anna recebeu influências de Hermine Von Hug-Hellmuth e, tal 
como ela, recomendava ao analista de criança desempenhar um papel ativamente 
pedagógico. 
A discussão entre Melanie Klein e Anna Freud girava em torno da 
analisabilidade da criança. Estudavam se seria possível organizar uma análise com 
ela tal qual o adulto estabelece, e, ainda, se haveria capacidade de associar 
livremente, internalizar conflitos psíquicos, haver estabelecimento de uma neurose 
infantil e possibilidade de instituir uma neurose transferencial. 
Durante suas pesquisas, Anna Freud estudou o comportamento das crianças 
em seu ambiente escolar e observou que tipos de brinquedos eram mais utilizados 
em cada etapa do desenvolvimento infantil e, aplicando conceitos psicanalíticos a 
essas observações, forneceu uma orientação prática para as professoras. 
Anna Freud valorizava o aspecto pedagógico na atuação psicanalítica. 
Também valorizava em sua atuação a utilização dos sonhos, das fantasias diurnas e 
dos desenhos, e limitava o uso do jogo, não permitindo que aspectos agressivos 
pudessem emergir, considerando que tais impulsos agressivos deveriam ser 
corrigidos para melhor desenvolvimento da criança. Seria necessária uma ação 
pedagógica constante do analista, por ter a criança um superego imaturo. 
Segundo Costa (2010), Anna Freud levantou algumas questões, fazendo 
então uma diferenciação entre a análise de crianças e a análise de adultos. Para ela, 
é praticamente impossível estabelecer uma relação analítica com uma criança em 
virtude da sua imaturidade e dependência do meio ambiente. Conforme Anna Freud, 
a criança não possui consciência da sua “doença”; não acredita estar doente. Isto 
aparece por intermédio dos pais, que estão angustiados e preocupados diante de 
suas dificuldades. Nesse sentido, para ela, falta algo essencial para a entrada em 
análise, que seria o mal-estar em relação a seu sintoma e a necessidade de 
tratamento. 
Pensando nisso, nessa falta de demanda Anna Freud propõe um período 
de preparação, ou seja, entrevistas preliminares que servirão para produzir na 
criança uma demanda artificial, conscientizá-la de que necessita de tratamento e 
que isso a ajudará a se livrar do sintoma. 
Para realizar seu trabalho analítico com crianças, Anna Freud associava 
medidas pedagógicas aos meios analíticos numa tentativa de conquistar sua 
 
 
 
14 
confiança, facilitando, assim, seu engajamento no processo analítico, ou seja, 
trabalhar sempre pelo viés da transferência positiva. 
Outro ponto abordado na teoria de Anna Freud sobre o tratamento 
psicanalítico com crianças diz respeito à associação livre, que, segundo ela, era 
impossível de ser realizada pela criança por esta estar ainda muito ligada aos pais 
da realidade. 
Em relação à transferência com crianças, Anna Freud acreditava que estas 
não teriam capacidade de estabelecer uma transferência positiva com seu analista. 
No seu entendimento, seria impossível haver uma reedição das relações com os 
pais dentro da análise, uma vez que a primeira edição ainda não estaria esgotada, 
sendo, então, impossível de a criança transferir fantasmaticamente a relação de 
amor que mantém com os pais da realidade para o analista. 
Segundo Zorning (2000, p. 87), para Anna Freud “a fraqueza superegóica da 
criança, que ainda não internalizou os valores parentais, faz com que o analista 
tenha de exercer uma dupla função: a de analisar e a de direcionar as pulsões, 
exercendo uma tarefa educativa”. 
Em 1927, Anna Freud (apud FERRO, 1995) faz a seguinte orientação: 
 
Nas crianças, as tendências negativas dirigidas contra o analista, apesar de 
freqüentemente reveladoras em muitos aspectos, são essencialmente 
inconscientes e deve-se reduzi-las a debilitá-las o mais rápido possível. É 
em sua relação positiva com o analista que se realizará sempre um trabalho 
realmente valioso. 
 
Para Marra (2005), Anna Freud, em sua teoria sobre a psicanálise de 
crianças, acreditava na importância dos pais no tratamento. Ela presumia que os 
sintomas apresentados pelas crianças estariam sendo determinados pelos conflitos 
inconscientes dos pais. Logo, segundo Anna Freud, na análise de crianças o que é 
levado em conta é o material recolhido no âmbito da família e não no da sessão. 
Daí, em sua teoria, a importância do trabalho constante com os pais e dessa troca 
contínua de informações. 
Por mais que a teoria psicanalítica tenha iniciado por Freud e, mais tarde, 
seguida por outros teóricos, sempre houveram dúvidas de que fosse possível uma 
análise de crianças. Cada psicanalista buscava em sua teoria dar conta desta 
 
 
 
15 
questão, trazendo elementos que confirmassem esta possibilidade tal como um 
adulto. 
Foi Melanie Klein quem formulou que com um estudoinfantil era possível uma 
criança ser analisada. Melanie Klein utilizou como fundamento principal de sua obra 
a técnica lúdica, tal como Freud ensinou sobre os sonhos, concebendo o brincar 
como forma simbólica de expressão de desejos e fantasias. Assim como nos 
sonhos, os símbolos deveriam ser analisados na relação com o todo. 
Conforme Marra (2005, p. 29), 
 
Melanie Klein desenvolve a técnica da psicanálise infantil através do jogo, 
do brinquedo, do recorte, procurando preservar todos os princípios da 
Psicanálise de adultos, com a diferença que os meios técnicos empregados 
se adaptam às mentes das crianças. Critica qualquer intervenção educativa 
do analista e afirma que ‘uma verdadeira situação analítica só pode ser 
produzida por meios analíticos’. 
 
Muito diferente de Anna Freud, Klein (1970, p. 107) considerava factual a 
possibilidade de transferência da criança, definindo-a da seguinte maneira: 
 
Transferências são novas edições ou fac-símiles das tendências e fantasias 
despertadas e tornadas conscientes durante o processo de análise. 
Possuem, no entanto, uma peculiaridade característica de sua espécie: 
substituem uma pessoa anterior na pessoa do médico. Em outro termos, 
conjuntos completos de experiências psicológicas são revividos, não como 
algo que pertence ao passado, mas que se aplica ao médico no presente 
momento. 
 
Segundo Zorning (2000, p. 91), Melanie Klein trabalhava com a criança 
enfatizando o conceito de “infantil” como referido às fantasias inconscientes e às 
angústias arcaicas do bebê, descartando quase totalmente a interferência dos “pais 
reais” no percurso analítico da criança. 
Melanie Klein, muito diferente de Anna Freud, acreditava que a criança 
poderia ser analisada sem a presença dos pais. Estes não deveriam ser levados em 
conta durante o tratamento, pois a criança teria subsídios suficientes para sustentar 
uma análise. 
Mais tarde, no auge dos anos 70, Françoise Dolto surge trazendo articulações 
da teoria de Lacan na psicanálise de crianças. Contemporânea de Lacan, é 
considerada a iniciadora do movimento que consiste em articular na psicanálise de 
 
 
 
16 
crianças as colocações que Lacan fazia em seu retorno a Freud, e que, mais tarde, 
foi continuado por Maud Mannoni. 
Segundo Volnovich (1947, p. 24), Françoise Dolto propõe, em seu trabalho, 
inserir a criança na estrutura desejante da família como efeito dessa estrutura. Ou 
seja, a criança não seria como a criança apresentada anteriormente pela teoria de 
Anna Freud, aquela que escolhe ou não se tratar, produto das vicissitudes de seu 
Ego1 e de seu desenvolvimento libidinal. 
Também não seria a criança apresentada por Melanie Klein, determinada pela 
quantidade de instinto de morte que se faz presente nos ciúmes e na inveja. A 
criança da teoria lacaniana, que Françoise Dolto apresentava, estava 
essencialmente inserida na estrutura da família, efeito desta do “desejo do Outro”.2 
Quando Lacan propõe na releitura de Freud sua fórmula “o desejo inconsciente é o 
desejo do Outro”, estabelece que não existe nenhuma possibilidade de que alguém 
possa ser gerado a partir de si mesmo, mas, pelo contrário, na medida em que o 
sujeito é efeito do desejo do Outro e retoma a determinação histórica e social do 
sujeito, reconhece que o inconsciente é uma experiência transindividual, social. 
É a partir desta posição teórica que Françoise Dolto redefine o sintoma da 
criança como sendo também sintoma da estrutura familiar na qual ela está inserida. 
Esta teoria gerou certa reviravolta entre os analistas de crianças da época, pois, de 
um momento para o outro, parecia ter terminado as análises de crianças, ficando 
unicamente a análise da estrutura desejante na família. 
Françoise Dolto tinha uma técnica de trabalho muito particular: fazia a 
primeira entrevista, tentando detectar na estrutura da família qual era a situação 
problemática, ou, no dizer dela, aquela que seria pervertedora ou denegatória da 
humanização da criança, fazendo sua intervenção em razão desta situação. Ela não 
tratava a criança senão por uma estratégia. Se a criança não podia falar de alguma 
coisa, incluída no sintoma, era porque não havia sido suficientemente “falada” pelo 
Outro, ou seja, pelos representantes familiares da cultura. 
Assim, a escuta e a palavra do analista podiam ser introduzidas na criança ou 
nos pais desta. Ela deixava entrar na sessão qualquer um que tivesse alguma coisa 
a dizer sobre a questão sintomática e sobre a criança, assim como não poupava 
 
1 Ego – em psicanálise o termo utilizado significa EU. 
2 Em Psicanálise, emprega-se o termo Outro (com letra inicial maiúscula) para referir-se ao grande 
Outro materno – função materna. 
 
 
 
17 
intervenções, quando necessário, para o pai, a mãe ou a criança. Esta forma de 
análise de crianças se diferenciava muito do modo como Melanie Klein a conduzia, 
posto que, na teoria kleiniana, os pais, enquanto a criança fazia tratamento com o 
psicanalista, deveriam fazer um acompanhamento, digamos, penoso, com outro 
analista. 
Para Françoise Dolto é o contrário. Ela estava para escutar. Para ela, nada 
melhor que um analista de crianças para escutar o pai e a mãe de uma criança 
sobre o que eles têm a dizer sobre seu filho. Esta linha de trabalho é continuada por 
Maud Mannoni, e o importante não era quem tratar, mas ver como estava 
estruturada a questão, momento em que se podia estar falando a palavra 
mediadora, que, neste campo, é representada pela palavra do analista. 
Todos estes estudos sobre a psicanálise com crianças foram muito 
importantes para o avanço da análise infantil e para que, hoje, se possa desenvolver 
um trabalho eficaz em relação ao tratamento analítico de crianças. 
Adiante verificaremos como a clínica com crianças se apresenta e quais são 
as suas principais especificidades, sempre levando em conta a real presença dos 
pais neste trabalho clínico. 
 
 
 
 
18 
2 O ABANDONO DO TRATAMENTO NA CLÍNICA INFANTIL: COMO PODEMOS 
PENSÁ-LO? 
 
Desde o princípio da análise de crianças o lugar dos pais no tratamento 
psicanalítico de crianças é algo que sempre foi ponto de interrogação. Muitos foram 
os teóricos que estudaram o tema, mas, como já mencionado, os que se destacam 
são Anna Freud, Melanie Klein, Françoise Dolto e Maud Mannoni, com teorias 
diferentes. 
Para Klein (1970), como vimos, os pais deveriam manter-se fora da sala de 
análise, ficando, assim, uma relação exclusiva entre criança e analista. Qualquer 
encontro com eles poderia ser percebido como uma invasão do espaço de escuta da 
criança ou até contaminar a escuta do analista, vindo, deste modo, a atrapalhar o 
curso do tratamento. 
Segundo Marra (2005), Klein compreendia que as dificuldades ou sintomas 
das crianças eram fruto de seu mundo fantasmático, movimento intrínseco à criança. 
O que dizia respeito aos pais era somente o contrato a ser feito, tal como os 
honorários e o dia das sessões, ficando, assim, os encontros com eles ou reduzidos 
ou dispensáveis. Não trabalhava as transferências que eram estabelecidas entre 
analista e pais por ser objeto de investigação a mente da criança em sua dimensão 
intrapsíquica. 
Conforme já mencionamos, mais tarde, com Françoise Dolto, o papel dos pais 
vai tomando importância e se tornando essencial. Passa a ser visto como um fator 
importante a ser considerado no tratamento analítico de crianças. Os pais passam, 
então, a ser “incluídos” na análise de crianças. 
Segundo Barbosa (2014), o ser humano, enquanto um ser de linguagem, 
inscreve-se como sujeito desejante a partir do Outro que dará sentido ao seu apelo, 
identificando-o como demanda. É desde o seu nascimento que a criança é marcada 
pela constante presença do Outro, pois ela nasce sem condições de se 
autossustentar biologicamente e, por isso, a estrutura familiar, ou seja, as funções 
maternae paterna são imprescindíveis. Durante todo o seu desenvolvimento a 
criança conta com recursos psíquicos advindos do Outro, na maioria das vezes da 
mãe. Entre o bebê e a mãe circula um saber inconsciente, e, se este saber vacila, 
obstáculos se interpõem na constituição do sujeito. Esses obstáculos podem ser 
oriundos da história de vida da mãe ou também de uma dificuldade do bebê, cujo 
 
 
 
19 
aparato orgânico não esteja em condições de interagir e se deixar marcar pelo 
desejo do Outro, ou, ainda, pela sensibilidade do bebê, que não se deixa enganar 
pelo que o carinho materno visa a ocultar. 
Diante dessas circunstâncias, podemos nos defrontar com uma mãe 
impotente, destituída e desautorizada e um bebê em sofrimento psíquico, que apela, 
mais tarde, durante sua infância, para um sintoma no corpo, do qual ele não poderá 
fazer cargo. A partir daí, os pais podem procurar tratamento psicológico para seu 
filho, supondo um saber que não estaria do lado deles. É a partir deste pressuposto 
que surge o pedido de análise de crianças. 
O tratamento psicanalítico com crianças, como já mencionado, se diferencia 
do tratamento com adultos. A prática clínica com crianças tem especificidades e 
começa com a presença dos pais ou responsáveis pelo tratamento. A criança chega 
à clínica por intermédio de um Outro, apresentada, na maioria das vezes, pela 
queixa daquele que a traz. 
Assim, uma das características do trabalho clínico com crianças refere-se à 
presença dos pais no tratamento, o modo de interpretação pela via do brincar, a 
demanda e também a transferência. Inicialmente podemos destacar que na clínica 
com crianças a demanda3 de atendimento se mostra diferente e complexa, uma vez 
que dificilmente a criança chega ao tratamento clínico por vontade própria. Ela é 
trazida porque se interpreta que algo não está bem, geralmente em razão de algum 
tipo de comportamento que apresentou ou apresenta. Isto é interpretado por aquele 
que a traz como algo que em seu desenvolvimento não vai bem. 
Somente é possível dar continuidade a um tratamento psicológico se a 
demanda vinda do paciente estiver bem-colocada. Se não houver demanda o 
tratamento não pode ter continuidade. Por isso, quando se trata de atendimento 
clínico de crianças, a demanda torna-se tão complexa, pois ela vem expressa por 
um Outro. Quem demanda atendimento aos filhos muitas vezes são os pais; então, 
é preciso reconhecer que neste trabalho seja feita uma escuta tanto dos pais quanto 
da criança que está em atendimento, de modo a conseguir visualizar o que eles 
esperam do seu filho, o que eles desejam ou gostariam de reconhecer nele e 
também se a criança se reconhece naquilo que a traz para o tratamento. 
 
3 Em psicanálise o termo demanda expressa: “Forma comum de expressão de um desejo, quando se 
quer obter alguma coisa de alguém, a partir da qual o desejo se distingue da necessidade”. 
 
 
 
20 
O atendimento psicológico tem início por meio do pedido. Este, no caso do 
atendimento de crianças, normalmente vem expresso pela família. Neste pedido 
está inclusa a queixa; aquilo que diz respeito aos conteúdos manifestos e 
conscientes que estão relacionados ao sintoma apresentado. É por intermédio desta 
queixa que o paciente chega até a clínica para atendimento e, com isso, formula seu 
pedido de ajuda endereçado ao psicólogo. Já a demanda de atendimento nem 
sempre é o motivo pelo qual se busca um psicólogo. A demanda deve ficar bem-
clara já nos primeiros atendimentos. Ela é construída nas entrevistas preliminares e 
a análise somente começa quando a demanda do paciente estiver constituída. O 
terapeuta deve visar para além da demanda para saber precisar, mais tarde, o que 
se tornará o desejo. Ela geralmente é expressa nas entrevistas preliminares, as 
quais têm o objetivo de colher informações sobre a criança e também sobre sua 
família, de modo a identificar de que lado a demanda está. É também neste 
momento que o psicólogo percebe o lugar que a criança ocupa para os pais. 
A psicanálise com crianças tem como característica a não demanda de 
tratamento pela própria criança e sim por aqueles que a trazem para tratamento. 
Segundo Hamad (apud FERRARI, 2001), 
 
[...] a demanda está relacionada ao Sujeito Suposto Saber, mas, no caso da 
criança, esta relação está estabelecida ainda com seus pais, a criança 
supõe que são seus pais que sabem sobre ela. Nesse sentido, a criança se 
deixa levar para tratamento porque os pais não conseguem dar conta 
daquilo que ela apresenta, coloca-os como testemunha do seu mal-estar e 
os reenvia àquilo que da sua história permanece vivo no seu infantil. 
 
A transferência também é um fator que muda quando se trata do tratamento 
de uma criança. Na clínica com adultos a transferência é estabelecida entre analista 
e analisando; já no caso do atendimento clínico de crianças a transferência é 
múltipla e acontece entre o terapeuta e a criança e também entre este e os pais, 
pois a disponibilidade para o tratamento é facilitada graças ao motor da 
transferência: a suposição do saber. 
A posição do analista que trabalha com crianças não é a mesma quando o 
paciente é adulto. A prática clínica com crianças oferece uma particularidade que 
não pode ser desconsiderada, uma questão que já foi referida; trata-se de como a 
criança chega para o tratamento. Ela não busca sozinha. Geralmente quem a traz 
são os pais, que trazem também uma queixa, um quadro sintomático, algo que os 
 
 
 
21 
angustia e os faz sofrer. Sabemos, porém, que o que se configura no tratamento 
como uma questão para a criança pode não coincidir com a queixa dos pais. 
Como o analista procede em seu trabalho analítico diante de tal 
particularidade que é a presença dos pais? Na psicanálise com crianças, segundo 
Mannoni (1980, p. 97), “o analista trabalha com várias transferências”, de vários 
sujeitos, pois os pais, de certa maneira, estão sempre implicados no sintoma da 
criança. 
Assim, no trabalho clínico com crianças o analista escuta a criança, pois ela é o 
sujeito em análise, mas continua atento à fala dos pais, que sempre apresentam 
elementos importantes. Escutá-los faz parte do manejo da transferência na sustentação 
da análise da criança. 
Escutar a história que os pais contam é muito importante, pois a pré-história 
da criança está inserida no discurso dos pais e em como eles simbolizaram e 
significaram a vinda do sujeito em questão. Por isso, a importância de escutá-los. 
Em “Observação sobre o relatório de Daniel Lagache”, Lacan (2009) aborda 
esta questão afirmando que a história de um indivíduo já começa na sua pré-história, 
a partir de um desejo não anônimo que irá sustentá-lo no decorrer da vida. Lacan 
(2009, p. 86-102) assevera que: 
 
Antes de existir em si, por si e para si, a criança existe para e por outrem: já 
é um polo de expectativas, projetos e atributos [...] Um polo de atributos, eis 
o que é o sujeito antes de seu nascimento [...] de atributos, isto é, de 
significantes mais ou menos ligados num discurso. 
 
Trata-se de escutar em que lugar a criança está situada na fantasia do Outro; 
em que lugar se situa no desejo dos pais, no seu discurso sobre ela. 
É a partir do manejo da transferência com os pais e com a criança e do 
desejo do analista, que o enigma que se apresenta no pedido de tratamento para 
uma criança poderá se transformar em questão de um ou mais sujeitos. 
Acolher uma criança na clínica psicanalítica quando ela não tem qualquer 
implicação com as questões que sobre ela são apresentadas pelo Outro, é mantê-la 
no lugar de objeto e não de sujeito. Por isso a escuta, na psicanálise, é um fator de 
grande relevância, pois está atenta para o tipo de demanda e se a criança em 
questão se reconhece na queixa apresentada. 
 
 
 
22 
Na análise de uma criança muitas vezes as intervenções analíticasvisam o 
laço pais-criança e, para que esta traga resultados e se possam extrair as 
consequências, é preciso que a criança seja vista como um sujeito suposto saber do 
que lhe causa. Será por meio desta maneira, ora estabelecendo laços com a criança 
e antecipando um sujeito ora na transferência com os pais, que o analista obterá 
movimentos em relação à posição destes, o que se refletirá na interação com seu 
filho. 
A transferência estabelecida com os pais versa sobre o estágio em que a 
criança se encontra, na medida em que se trata de um sujeito em constituição. 
Observa-se, então, que os pais são figuras presentes no cotidiano da criança e que 
esta ainda não dissolveu o complexo de Édipo, e ainda que a transferência na 
clínica com criança se apresenta de maneira diferente e cumpre outra função. 
Freud (1933, p. 146) aborda a transferência no tratamento clínico com 
crianças da seguinte maneira: 
 
As resistências internas contra as quais lutamos, no caso dos adultos, são 
na sua maior parte substituídas, nas crianças, pelas dificuldades externas. 
Se os pais são aqueles que propriamente se constituem em veículos da 
resistência, o objetivo da análise – e a análise como tal – muitas vezes corre 
perigo. Daí se deduz que muitas vezes é necessária determinada dose de 
influência analítica junto aos pais . 
 
O que vem a ser essa influência analítica? Freud (1933) não deixa claro o que 
seria para ele o influxo analítico, mas esclarece que há um nexo estrutural entre as 
resistências da criança em análise e as resistências dos pais. A experiência de 
Freud, já em 1909 com o caso Hans, nos fornece o exemplo da influência que os 
pais têm sobre o funcionamento da análise de um filho. 
Na concepção de Marra (2005, p. 48), 
 
[...] podemos entender esta ‘dose de influência analítica sobre os pais’ como a 
possibilidade que tem o analista de incluir dentro de sua leitura do campo 
analítico (de acordo com o conceito de Baranguer) os nexos existentes e em 
dupla direção, entre a conflitiva intrasubjetiva do paciente e a relação 
intersubjetiva parental. 
 
Com isso, objetiva-se desfazer a trama identificatória que existe entre os 
desejos da criança e o mundo desejante dos pais. 
 
 
 
23 
É importante para o trabalho do analista de crianças que se tenha em mente 
que a relação estabelecida entre pais-criança é uma relação dialética sempre atuante 
e que não somente os pais, com sua fantasmática inconsciente, entrarão na 
determinação da formação de sintomas, mas há uma parte, não menos importante, de 
responsabilidade que é da criança e que se deve trabalhar, senão corre-se o risco de 
tratá-la como vítima dos pais, não considerando sua individualidade e co-participação 
na determinação de seu sofrimento psíquico. 
No entendimento de Marra (2005), para Anna Freud a criança não pode ser 
isolada das relações com as pessoas que a circundam. O psicoterapeuta concebe a 
subjetividade como resultante da relação do indivíduo com o mundo externo, não se 
limitando ao mundo intrapsíquico, olhando o ambiente no qual o paciente encontra-
se inserido. 
Para Marra (2005, p. 49), “não é no ego do paciente, mas na razão e 
compreensão dos pais que o tratamento terá seu início, sua continuidade e sua 
conclusão”. 
Assim, a partir destes teóricos que se dedicaram ao estudo da análise de 
crianças, podemos perceber o quão ela é interrogativa, e como cada um trabalhou a 
presença dos pais junto a psicanálise de crianças transformando esta presença em 
um elemento essencial para o sucesso da análise infantil. 
Seguindo com a questão da presença dos pais a partir de Marra (2005), é 
possível recortar na teoria freudiana o momento em que Freud parece antever 
dificuldades que adviriam para aqueles que fossem trabalhar com crianças. Em 
1920, no texto “Sobre a psicogênese de um caso de homossexualidade feminina”, 
um dos poucos em que faz referência direta ao trabalho com crianças, expõe o 
seguinte: 
 
às vezes são os pais que demandam a cura de um filho que se mostra 
nervoso e rebelde. Para eles uma criança sadia é uma criança que não cria 
dificuldades e só provê satisfações. Quando o médico consegue o 
restabelecimento da criança, depois da cura esta segue seus próprios 
caminhos, mais decididamente que antes, e os pais ficam mais 
descontentes (FREUD, 1920, p. 144). 
 
Com isso podemos perceber que se os pais não se modificam dificilmente 
teremos a cura e haverá o fracasso do trabalho. Muitas vezes o abandono do 
tratamento de crianças se dá quando os pais não acompanham a modificação que o 
 
 
 
24 
tratamento causa nos filhos e com isso não “suportam” o reestabelecimento da 
criança, vindo, assim, a interromper o tratamento. 
Sobre o fracasso do tratamento infantil, Sigal (2001, p. 158) afirma: 
 
Se os pais não se modificam, verão a cura como fracasso. Portanto, nesse 
caso, sua inclusão é imprescindível, visando que acompanhem e 
compartilhem mudanças na criança e que, por sua vez, se modifiquem. 
Incluídos no contexto da análise, os pais se oferecem na transferência e 
recriam-se no encontro – fantasias primitivas sobre estes pais atuais que 
são, e não os originários. 
 
Depois de traçarmos as principais especificidades da clínica infantil e 
caracterizá-las, passamos para o ponto central do presente trabalho: O que 
acontece na clínica com crianças para que haja tantos abandonos de tratamento? 
Onde poderiam estar as causas? 
Como já vimos anteriormente, trabalhar com crianças nos coloca ante a 
diversas demandas que se sobrepõem, mas, muitas vezes, não partem da própria 
criança. É muito mais frequente sermos procurados pelos pais, pela escola, pelos 
pediatras, que trazem a queixa referente à criança, do que por ela própria. 
Por seu estado “infantil” a criança necessita de adultos, muitas vezes na 
posição de pais, que se responsabilizem por seu tratamento, pelo pagamento das 
suas sessões, por sua locomoção até o consultório, etc. Por isso, cada vez mais os 
pais estão incluídos no tratamento dos seus filhos e cada vez mais precisamos nos 
haver com essa presença. 
A criança se constitui na estrutura familiar e parte da sua questão em análise 
se relaciona com o lugar que ocupa no desejo e no discurso dos pais. Se, portanto, 
não escutarmos a demanda que é trazida pelos pais e não acolhermos a sua 
transferência, a análise da criança não se torna possível. Então, a questão que 
surge para quem se propõe a trabalhar com crianças é: Como conciliar essa 
dependência estrutural aos pais, que veiculam uma demanda fundamentalmente 
narcísica em relação à criança e o processo psicanalítico, que teria por objetivo fazer 
cair a criança como significante de uma ideologia social, para aparecer um sujeito na 
acepção de poder construir suas próprias normas? Essas e outras interrogações 
fazem parte do trabalho que os analistas têm ao observar crianças. Ao receber uma 
criança para tratamento, analisar o sintoma é o primeiro passo para identificar a sua 
causa. 
 
 
 
25 
Segundo Volnovich (1947), foi a partir do sintoma que Freud descobriu o 
inconsciente e, por meio deste, pôde situar o sintoma como lugar da verdade do 
sujeito. Os sintomas são definidos por ele como manifestações do recalcado,4 
formações pelas quais o reprimido inconsciente consegue obter o acesso que lhe é 
recusado. Freud define então o sintoma como o retorno do recalcado, como um sinal 
e substituto de uma satisfação pulsional que não se realiza: seria o resultado do 
processo de recalque. 
O tratamento psicanalítico não pretende o controle nem a supressão do 
sintoma, e isso não ocorre de maneira diferente quando se trata de crianças. A cura 
psicanalítica consiste em articular o sintoma com o desejo reprimido, o que é 
denominado “desvendar seu sentido”, articulação pela qual é possível assumir a 
própria história. 
O psicanalista de crianças pode, no curso do tratamento, observar o momento 
no quala criança começa a desenvolver toda sua potencialidade transformadora, 
achando o sentido de um passado que a amarra pelo simples fato de ser reprimido, 
assumindo sua própria história e, por conseguinte, sua própria palavra. 
Consoante Zorning (2000), a neurose dos pais tem um papel fundamental na 
eclosão dos sintomas na criança, pois esta fixa sua existência num lugar 
determinado pelos pais em seu sistema de fantasias e desejos. A criança procura 
responder ao enigma dos significantes obscuros propostos pelos adultos, 
identificando-se ao que julga ser objeto do desejo materno, tentando preencher a 
falta estrutural do Outro e evitar a angústia de castração (assunção da própria falta). 
A relação da criança com a sua estrutura familiar também aparece quando 
falamos em sintoma, pois existe a possibilidade de uma apropriação sintomática da 
criança mediante suas produções fantasmáticas, quando a criança responde ao que 
existe de sintomático na estrutura familiar ou de um assujeitamento mortífero ao 
desejo do Outro quando o sintoma corresponde à subjetividade da mãe. 
A intervenção clínica pode privilegiar uma destas vertentes: se interessar pela 
questão familiar, interpretando a criança apenas como sintoma dos pais, o que 
justificaria uma intervenção em âmbito familiar, ou se interessar pela verdade do 
desejo do sujeito e se constituir numa prática de subjetivação. 
 
4 Recalque – termo empregado em psicanálise para designar o conjunto das reações de um 
analisando cujas manifestações, no contexto do tratamento, criam obstáculos ao desenrolar da 
análise. 
 
 
 
26 
Para Mannoni (1982 apud ZORNING, 2000, p. 129), 
 
 
o que faz mal a uma criança não é a situação real que ela vivencia, mas o 
que nesta situação não foi verbalizado. É o não dito que introduz o ‘trauma’ 
na criança, que procura responder ao enigma proposto por meio de suas 
produções fantasmáticas. 
 
 
 
Para Balbo (1992), as demandas destinadas às crianças não partem somente 
dos pais, mas também da sociedade com um todo, que exige que a criança 
corresponda a uma imagem-modelo proposta pelas ideologias, sejam elas políticas, 
sociais, pedagógicas ou psicológicas. Se a criança não se integra ao gozo social, 
identificando-se a um sistema de valores, ela é trazida ao analista pelos pais que, 
por seu lado, esperam o restabelecimento de um gozo narcísico. Desta forma, a 
criança responde a duas demandas: à parental, de restabelecimento de um gozo 
narcísico e à social, de se identificar a um modelo estabelecido por um sistema de 
valores, como familiares, escolares, morais, etc., que reforça o comportamento 
desejado. 
Com isso, podemos observar que a singularidade do processo analítico de 
uma criança se dá em razão da amarração entre ela e as demandas exteriores a ela, 
fazendo com que o analista, ainda que privilegiando trabalhar com o fator infantil, 
não possa desconsiderar os fatores da transferência. 
Agora que já percorremos pela clínica infantil e constatamos como o trabalho 
analítico se estrutura neste campo, podemos trazer considerações acerca do que 
seriam os fatores causadores de tanta desistência/abandono na clínica infantil. 
Reconhecemos, ao longo do trabalho, que um dos fatores que caracterizam e 
questionam o trabalho clínico com crianças é a presença real dos pais ao longo do 
tratamento, e, como estes possuem influência sobre ela, é preciso, para que o 
tratamento avance, que os pais não se coloquem como fonte de resistências e, para 
que isso não ocorra, é necessário que o analista trabalhe em conjunto com pais-
criança. 
Uma das possíveis causas de tantas interrupções observadas no tratamento 
psicológico infantil estaria ligada aos pais. De que maneira, porém, os pais seriam os 
“causadores” desta interrupção? 
A clínica com crianças nos aponta continuamente esta relação entre a criança 
e os seus pais, a qual, ao ser ignorada, resulta frequentemente na interrupção do 
 
 
 
27 
tratamento psicológico da criança. A direção do tratamento bem como o final dele, 
dependem do destino que o psicólogo dá à demanda que lhe foi apresentada. No 
caso do trabalho clínico com crianças deve-se levar em conta, além da criança, os 
pais, pois os mesmos podem se colocar como fonte de resistência e, então, o 
trabalho pode ser interrompido. 
A resistência é um termo empregado em psicanálise para designar o conjunto 
das reações de um analisando cujas manifestações, no contexto do tratamento, 
criam obstáculos no desenrolar da análise. Essa resistência durante o tratamento 
psicológico de uma criança muitas vezes vem apresentada pelos pais, o que, em 
muitos casos, causa a interrupção do trabalho sem que ele realmente tenha 
chegado ao fim. A resistência é um fator que está presente no laço transferencial 
que se estabelece entre analista e analisando. (ROUDINESCO, 1998). 
Segundo Cunha e Martins (2012), a transferência é chamada por muitos 
profissionais de motor da análise, pois, sem que ela seja estabelecida entre paciente 
e psicólogo uma análise tornar-se-ia impossível. A transferência é uma suposição de 
saber endereçada ao analista. O analisando, sob transferência, deposita um saber 
sobre si no analista, um ideal – do eu – e o que sabe sobre o sujeito está no próprio 
discurso do inconsciente, porém apresentado como falta, como não sabido. Essa é a 
lógica de uma análise. O analisando aponta esse lugar de saber para o analista com 
uma demanda de amor, mas o analista, embora acolha, não ocupa esse lugar 
apontado pelo analisando. O analista, em sua ausência como sujeito – ausência 
essa que sinaliza a disponibilidade do analista para escutar o outro – presencia isso 
o tempo todo, justamente porque, sem isso, não haveria análise. 
Uma análise se autoriza desde o momento posterior de entrada em análise, 
ou seja, quando o sujeito é encaminhado por alguém ou identificado por algo pelo 
analista, como seu nome, sua fisionomia, sua voz, seu jeito de falar. A transferência 
já se estabelece até mesmo antes do primeiro contato. É a transferência que 
autoriza a função do analista. O analista, antes mesmo desse lugar de semblante da 
falta, de semblante do objeto, fica numa posição de depositário do saber, saber este 
que se presentifica como discurso do inconsciente como não sabido, como não 
saber, mas endereçado ao analista como o “representante” desse saber 
inconsciente. 
 
 
 
 
28 
Na Clínica Psicanalítica entendemos por resistência tudo o que é usado pelo 
analisando na tentativa de fugir do sofrimento e das lembranças que contêm o foco 
de seus traumas. Freud, em seus trabalhos, usou os termos “defesa” e “resistência” 
como sinônimos. A defesa age por meio do eu, ou seja, o eu do analisando na 
tentativa de fugir de uma lembrança dolorosa chama uma força repulsora que afaste 
essa ideia/lembrança patogênica. Daí o conceito de que toda defesa é uma tentativa 
do sujeito de fugir do que lhe traz dor, de esconder as ideias e pensamentos 
causadores ou relacionados aos seus traumas. As defesas podem acontecer tanto 
de forma inconsciente quanto conscientemente, e é papel do analista derrubar essas 
resistências e chegar ao foco do problema: a lembrança dolorosa causadora do 
trauma. 
Existem vários exemplos de resistências na clínica psicanalítica. Entre eles 
temos a resistência que vem dos pais quando o tratamento é com crianças. A 
resistência está presente em maior ou menor grau em todo o processo analítico, 
desde o início até a sua conclusão. A resistência se opõe ao processo analítico, ao 
analista e ao eu racional do paciente. 
A clínica psicanalítica, em verdade, serve de campo em que as resistências 
atuam. Cabe afirmar, então, que a clínica psicanalítica se caracteriza pela análise 
completa das resistências, por descobrir como o paciente resiste, a que ele resiste e 
porque age assim. 
Na transferência,entendemos uma situação em que um sujeito transfere para 
o outro sentimentos que, em verdade, não estão dirigidos a esta pessoa e sim a 
outra do passado. No caso da clínica psicanalítica, o analisando transfere para o 
analista sentimentos e emoções que, na verdade, são de uma relação vivida (ou 
deixada de viver) com um ente ou pessoa próxima que fez parte de sua infância 
primitiva, segundo Freud. São, em geral, sentimentos de relações que não foram 
bem-resolvidas. O analisando, em vez de recordar uma experiência passada, a 
revive e recria, envolvendo outra pessoa que não a originária e isso pode ser 
caracterizado como um tipo de defesa. 
A reação transferencial é sempre uma relação objetal, ou seja, relação que 
pode conter emoção, impulso, desejo, atitude, fantasia e defesas contra isso tudo. 
Ela se dá sempre de forma inconsciente e cabe ao analista reconhecê-la. Embora 
em alguns casos o analisando até possa perceber que está exagerando em algum 
 
 
 
29 
sentimento, ele não entende o porquê disso. Conquanto a transferência esteja sendo 
abordada dentro da clínica psicanalítica, ela pode acontecer também fora dela. 
A transferência é sempre uma repetição e continuamente será inadequada. 
Podemos citar, então, algumas características da reação transferencial que são: a 
intensidade de sentimentos ou ausência total do mesmo, a inconstância e a 
tenacidade. 
Conforme Cunha e Martins (2012), para que um fenômeno psíquico seja 
enquadrado como transferência é necessário que apresente quatro características 
básicas: que seja uma variação de relacionamento objetal, que seja sempre uma 
repetição de um relacionamento passado com o objeto, que apresente um 
deslocamento, posto que esse é o processo fundamental nas relações 
transferenciais, e que seja sempre um fenômeno regressivo. 
A transferência é um fenômeno imprescindível no processo analítico. Sem a 
transferência não há análise. É ela quem indica a direção a ser tomada pelo analista, 
uma vez que é por meio dela que os processos inconscientes se atualizam e abrem 
as portas para o surgimento do conflito psíquico e sua resolução. A transferência 
segue mais ou menos o ritual “recordar, repetir, elaborar”. 
A transferência revela a constituição do sujeito, de sua demanda e de seu 
desejo. Somente a partir dela é possível que o sujeito descubra a estrutura de seu 
desejo. A resistência, tal qual a transferência, são mecanismos de defesa 
imprescindíveis para a realização do tratamento psicanalítico. Sem elas não há 
psicanálise. Uma aparece na tentativa de encobrir e se defender de lembranças 
dolorosas, a outra como a repetição de uma relação objetal passada, e as duas são 
fundamentais para a clínica analítica. 
Como já mencionado anteriormente, a transferência no trabalho psicológico 
com crianças se estabelece de forma múltipla, ou seja, entre o psicólogo e a criança 
e também entre o psicólogo e os pais. É apenas desta forma que é possível dar 
continuidade no tratamento psicológico e obter resultados. 
Quando o laço transferencial entre o psicólogo e os pais não se estabelece 
pode ocorrer o abandono do tratamento. Os pais se mostram como portadores de 
resistência e, por fim, acabam por interromper o trabalho psicológico sem que ele 
tenha realmente chegado ao final. 
Como vimos anteriormente, o analisando deposita sobre o analista uma 
suposição de saber. No caso do atendimento psicológico de crianças, os pais 
 
 
 
30 
esperam do profissional da psicologia que ele detenha o saber sobre a criança, que 
ele saiba como agir para que a criança obtenha o comportamento que os pais 
esperam dela. 
Outra possível causa de abandono/interrupção no tratamento psicológico de 
crianças estaria do lado do psicólogo; o profissional se colocando como fonte de 
resistência. Isso não é difícil de acontecer, pois trabalhar com crianças não é fácil e 
nem todos estão preparados para esta prática. 
O fato de atender crianças, para muitos profissionais da psicologia, já causa 
uma certa resistência, pois não são todos que estão preparados para lidar com as 
demandas que este trabalho impõe. Para muitos, trabalhar com crianças implica 
reviver fatos da sua própria infância. 
Enfim, pode-se afirmar que a presença dos pais durante o tratamento 
psicológico de crianças é, sem dúvida, muito importante e, em muitos casos, torna-
se até mesmo essencial. No desdobramento desta escrita também podemos 
perceber o quão importante é saber lidar com esta presença, pois, sendo ignorada, 
ela pode resultar em uma interrupção ou abandono do tratamento sem que ele 
realmente tenha chegado ao seu término. Essa brusca interrupção muitas vezes 
pode prejudicar a criança que vinha sendo acompanhada pelo profissional da 
psicologia, pois o tratamento, quando interrompido em momento importuno, não traz 
melhoras ao paciente. Por isso, a importância de refletirmos sobre a real presença 
dos pais durante o acompanhamento psicológico das crianças, percebendo a 
posição que eles ocupam para o avanço do tratamento, mas também atentando para 
o fato de que estes podem se colocar como portadores de resistência e, com isso, 
gerar a interrupção do tratamento. 
 
 
 
 
 
31 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Este trabalho trouxe considerações importantes acerca da clínica psicanalítica 
infantil; como ela vem se estruturando desde sua origem, quais as suas 
características principais, e também, como o terapeuta lida com a real presença dos 
pais no seu trabalho. Abordou-se, por intermédio de diferentes teóricos, como a 
relação com os pais é pensada durante a análise infantil. 
Constatou-se que o assunto em questão já vem sendo estudado há muito 
tempo. Iniciou com Freud na análise do pequeno Hans e depois foi ganhando 
importância na obra de outros teóricos, como Anna Freud, Melanie Klein, Françoise 
Dolto e Maud Mannoni. Todos trouxeram suas considerações em relação à análise 
de crianças – se era realmente possível e qual era o lugar dos pais neste trabalho 
clínico que, com o tempo, ganhou relevância. 
O trabalho também visou a trazer considerações acerca do constante 
abandono do tratamento clínico infantil, algo que ocorre muito no ambiente clínico 
infantil, e também o lugar dos pais no tratamento, que foi observado durante uma 
prática clínica de estágio. 
Durante a escrita deste trabalho percebeu-se que a presença dos pais é 
fundamental para o avanço do tratamento psicológico infantil, que é essencial que 
eles sejam incluídos no processo. Os pais podem proporcionar o suporte necessário 
à manutenção do tratamento, bem como contribuir para o entendimento do circulo 
familiar que cerca a criança. 
Assim como percebemos a importância dos pais para o tratamento infantil, 
também ao longo da escrita pode-se perceber que eles também podem ser os 
responsáveis para que o tratamento seja interrompido antes que ele tenha chagado 
ao seu efetivo final. Os pais podem se colocar como portadores de resistência e com 
isso dificultar o processo terapêutico. 
Pelo desdobramento da escrita desta pesquisa verificou-se o quanto a clínica 
infantil interroga os profissionais que nela se propõem a atuar, pois existem vários 
fatores particulares deste trabalho que o analista precisa levar em conta. O mais 
importante, diríamos, é a presença dos pais e como lidar com esta presença, já que 
o terapeuta deve ter muito cuidado, pois com o tratamento a família pode ficar 
vulnerável e perceber os conflitos e, em função disso, aumentam as resistências o 
 
 
 
32 
que pode vir a ocasionar o abandono/interrupção do tratamento como viemos 
abordando. 
Na atualidade, o trabalho clínico com crianças vem crescendo muito, e cada vez 
mais profissionais são procurados para atender esta demanda. A clínica psicanalítica 
com crianças é uma área que interroga muito o profissional que nela atua, pois exige 
dele certo manejo com as demandas que lhe chegam e, com certeza, lidar com apresença dos pais é a mais interrogativa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
33 
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