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psicanalise_com_bebes - apostila

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Prévia do material em texto

Brasília-DF. 
Psicanálise com BeBês
Elaboração
Mônica Gurjão Carvalho
Tatiana Ferreira Peres
Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
Sumário
APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 4
ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 5
INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7
UNIDADE I
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO ........................................................................ 13
CAPÍTULO 1
E TUDO COMEÇOU COM FREUD ........................................................................................... 13
CAPÍTULO 2
A ESCOLA INGLESA: MELANIE KLEIN E WINNICOTT ................................................................... 26
CAPÍTULO 3
A ESCOLA FRANCESA: FRANCOISE DOLTO ............................................................................. 41
UNIDADE II
A CLÍNICA PRECOCE .......................................................................................................................... 49
CAPÍTULO 1
POR QUE PENSAR NO ATENDIMENTO DE BEBÊS? ..................................................................... 49
CAPÍTULO 2
A IMPORTÂNCIA DA VOZ NA CONSTITUIÇÃO SUBJETIVA .......................................................... 54
CAPÍTULO 3
PSICOPATOLOGIA DO BEBÊ .................................................................................................... 61
CAPÍTULO 4
RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA ................................................................................................ 65
UNIDADE III
A TÉCNICA NA CLÍNICA PSICANALÍTICA ............................................................................................... 70
CAPÍTULO 1
A FAMÍLIA NO PROCESSO TERAPÊUTICO: ENTREVISTA INICIAL COM OS PAIS, 
ACOMPANHAMENTO E ENTREVISTAS POSTERIORES .................................................................. 70
CAPÍTULO 2
A TRANSDISCIPLINARIDADE NA CLÍNICA COM BEBÊS ............................................................... 78
CAPÍTULO 3
A MÚSICA COMO INSTRUMENTO DE AUXÍLIO NA CONSTRUÇÃO SUBJETIVA ............................. 81
CAPÍTULO 4
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................ 90
REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 96
4
Apresentação
Caro aluno
A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se 
entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. 
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como 
pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia 
da Educação a Distância – EaD.
Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da 
pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar 
conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, 
como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os 
desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.
Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de 
modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal 
quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.
Conselho Editorial
5
Organização do Caderno 
de Estudos e Pesquisa
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em 
capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos 
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar 
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para 
aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização 
dos Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes 
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor 
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e 
reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. 
É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus 
sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas 
conclusões.
Sugestão de estudo complementar
Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, 
discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.
Atenção
Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a 
síntese/conclusão do assunto abordado.
6
Saiba mais
Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões 
sobre o assunto abordado.
Sintetizando
Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o 
entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.
Para (não) finalizar
Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a 
aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo 
estudado.
7
Introdução
É mais fácil analisar crianças ou adultos? Existe atendimento psicanalítico para 
bebês? Como realizar esse tipo de atendimento? É preciso envolver os pais? Inúmeras 
são as dúvidas no que se refere ao trabalho psicanalítico com bebês entre as quais se 
destacam as especificidades do manejo psíquico de seres humanos incapazes de falar e 
a enorme carência de estudos sobre este campo da psicologia.
Apesar de ser comum a ideia de não ser possível atender aqueles que não falam, 
é importante pensar que há uma comunicação. A questão é se sabemos escutar. 
Geralmente, a expressão do bebê se dá através do corpo, campo no qual o simbólico 
será alocado, já que ainda não há maturidade para a linguagem falada.
A presença e o envolvimento dos pais desde o início do tratamento; a abertura para 
a escuta e o acolhimento quando necessário; a reavaliação da criança junto aos pais 
no decorrer do tratamento; todos esses itens provocam um considerável movimento 
transferencial que não tem como ser ignorado. Mais do que um traço particular do 
tratamento de bebês, a presença dos pais define uma especificidade dessa clínica, 
posto que o manejo e a intervenção se fazem necessários.
Dificilmente o bebê chega à clínica e ainda é difícil compreender o trabalho analítico 
em tão tenra idade. Entretanto, saber sobre os primeiros momentos de vida da criança 
facilita a leitura da história das crianças e até mesmo dos adultos. O que queremos 
dizer é que, apesar de os bebês não chegarem ao consultório e o seu atendimento 
geralmente ocorrer nas instituições de cuidados precoces, saber como eles funcionam 
e estabelecem suas relações iniciais é fundamental para o sucesso do atendimento, 
independentemente da idade.
A criança chega ao psicólogo levada por um adulto, que percebe nela sofrimento, 
tristeza ou porque o adulto sofre algum incômodo decorrente do comportamento da 
criança. Muitas vezes os pais chegam desnorteados, sem esperanças, preocupados 
com os sintomas que percebem na criança, transferem, portanto, para o psicólogo 
uma “suposição de saber”, demandam que o psicólogo os ajude e ajuste a criança, de 
tal forma que os problemas deixem de existir. Acreditam, muitas vezes, que a análise 
funcionará como uma cura mágica, restaurando a harmonia e tranquilidade familiar.
Contudo, se são os pais que trazem a criança, apresentando uma queixa a respeito 
desta, escutá-los não significa escutar “a verdade da criança”, sua “história real”,mas, 
8
sim, muitas vezes, escutar algo do desejo desse Outro parental diante do qual ocorre a 
constituição do sintoma infantil.
Assim, ao receber uma criança para tratamento, devemos assumir a interrogação: 
de quem se trata quando se trata de uma criança ou de um bebê? Afinal, a demanda, 
comumente, não se apresenta como demanda do bebê, mas de quem a traz para o 
atendimento (o casal parental, a mãe, algum membro da família, uma Instituição etc.), 
sendo necessário um desdobramento transferencial para possibilitar o surgimento da 
demanda da criança, se é que ela existe de fato.
Em outras palavras, se por um lado o psicólogo precisa acolher o discurso dos pais 
ofertando abertura para que um processo possa se constituir, por outro, deve ofertar, 
também, espaço para que o bebê e suas demandas possam advir, o que pode parecer 
estranho, já que bebês não falam. Aqui, trabalhamos o tempo todo com o suposto 
sujeito, aquele que ainda está por vir. Nossa escuta está intimamente relacionada 
à manifestação do corpo do bebê e à maneira como o casal parental reage a essa 
expressão. Para que fique claro, no atendimento do bebê, não tratamos nem um, 
nem o outro. Tratamos aquilo que surge na relação. Uma palavra dirigida à mãe pode 
funcionar como intepretação para o bebê ou para ambos e vice-versa. No atendimento 
com bebês é nossa função colocar a palavra.
Sinteticamente podemos afirmar que escutar e compreender a demanda dos pais 
é importante, desde que não se inviabilize a escuta da criança ou do bebê. Como 
Zimerman (2004) destaca, é difícil imaginar uma criança atendida em psicoterapia 
psicanalítica sem o acompanhamento concomitante sistemático dos pais, não sendo 
rara a possibilidade de realizar sessões familiares. Contudo, faz-se necessário atentar 
para singularidade da criança, preservando seu espaço de análise. Portanto, é comum 
que, ao tratar uma criança, tratam-se na realidade duas demandas: a dos pais1 e a dela.
Nesse contexto, faz-se relevante ainda destacar o conceito de infância. Apesar de, em 
um primeiro momento, a infância parecer um dado inquestionável, Philippe Ariès 
(1981) demonstrou, em a “História social da criança e da família”, que a definição de 
criança se modificou no decorrer do tempo de acordo com parâmetros ideológicos2.
Ariès (1981) aponta que na idade média a criança era vista como um pequeno adulto, 
não sendo considerada merecedora de cuidados especiais. Assim, as crianças eram 
vestidas como pequenos adultos, participavam de trabalhos, festas, jogos e outras 
situações, sendo, portanto, um período rapidamente superado. Os bebês, por sua vez, 
eram destinados às amas de leite. A expressão: “cuidado para não jogar o bebê com 
1 Aqui nos referimos a demanda parental em relação à criança.
2 Philippe Airès (1981) realizou um estudo na Europa, no período compreendido entre a Idade Média e o século XX, para 
demonstrar como definição de criança se modificou no decorrer do tempo de acordo com parâmetros ideológicos.
9
a água do banho” reflete o lugar do bebê nessa época: ele não era pensado e cuidado 
como sujeito, o que muitas vezes gerava mortes prematuras.
Na idade média as crianças se relacionavam mais com a comunidade do que com seus 
pais. Assim, a aprendizagem e a socialização não eram realizadas pela família ou pela 
escola, mas por toda a comunidade. É a partir da renascença que ocorre a privatização 
do espaço doméstico e a família passa a se estabelecer em um grupo fechado e coeso. 
Passa a predominar, então, a noção de uma inocência infantil, tornando-se a educação 
uma preocupação das famílias e dos educadores.
No século XVII, a Igreja já se preocupava em afastar a criança de assuntos ligados ao 
sexo, apontando que estas vivências deformavam a formação do caráter e a moral. 
Foram construídas escolas nas quais, além da preocupação básica com o ensino da 
religião e da moral, ensinavam-se habilidades como leitura, escrita e aritmética. 
À época, acreditava-se que na infância predominava a maldade, portanto, fazia-se 
necessário um adestramento moral. Cabia aos pais uma atitude rigorosa com seus 
filhos, uma certa frieza e distanciamento que oportunizassem uma educação rígida 
que livrasse os filhos das malignidades naturais.
O capitalismo, desde seu advento, transformou a criança num investimento lucrativo 
para o Estado. A ideia era que uma criança bem-educada poderia assegurar o futuro da 
civilização. Tratava-se, portanto, de preparar as crianças para que a sociedade tivesse 
homens bons e produtivos. Com o objetivo de educar a criança tornando-a um futuro 
adulto produtivo, a pedagogia, a pediatria e a psicologia desenvolveram-se.
O discurso psicológico destaca-se como aquele capaz de produzir um discurso científico 
sobre a infância no qual a pedagogia, cada vez mais, vai se ancorar para produzir 
práticas educativas e saneadoras. Esse caráter normatizador torna-se imperativo, 
principalmente na infância, que é a etapa da vida em que o desenvolvimento do caráter 
se encontra em fase embrionária e, portanto, mais suscetível às influências externas. 
(NEVES; VORCARO, 2010)
Frente a esse cenário, os pais passaram, muitas vezes, a reproduzir e assumir o 
discurso científico e social, acreditando que uma criança bem-ajustada seria aquela 
capaz de adequar-se socialmente, ao passo que uma criança desajustada estaria fadada 
à exclusão social. A criança era, portanto, um ser a ser moldado, corrigido e educado 
pelo adulto. A criança não teria desejo próprio, sendo, ainda, assexuada. Essas ideias 
foram questionadas por Freud, que, apesar de não ter atendido crianças, formulou, a 
partir da escuta de suas pacientes histéricas, uma modificação no conceito de infância, 
que deixou de ser vista a partir de um registro genético e cronológico para ser abordada 
pela lógica do inconsciente.
10
Assim, apesar de as descobertas de Freud sobre a infância decorrerem da análise de 
adultos, a natureza delas conduziram o autor a investigar os anos de infância, pois lhe 
pareceu claro que as primeiras causas dos transtornos mentais tinham sua fonte em 
fatores provenientes das primeiras fases do desenvolvimento.
As descobertas de Freud acerca da dinâmica do inconsciente, a sexualidade infantil 
e a configuração e destino do complexo de Édipo provocaram rechaço, despertaram 
repúdio e resistências. Contudo, foram fundamentais para que se reconsiderasse o que, 
até então, se conhecia sobre crianças. Freud pôs em xeque as concepções moralizantes 
sobre a atividade sexual das crianças apresentando ao mundo uma nova concepção de 
criança, dotada de uma sexualidade perverso-polimorfa. Partindo do legado freudiano, 
Melanie Klein, Winnicott e Lacan buscaram novas formas de compreender e aplicar a 
psicanálise ao tratamento de crianças. 
A partir desse panorama podemos pensar na clínica psicanalítica com crianças e bebês 
destacando seus impasses, desafios e nuances. É preciso que se atente, desde já, que a 
história da psicanálise com crianças e bebês não é linear. Afinal, muitas formulações 
freudianas foram questionadas e até mesmo restruturadas pelos pós-freudianos, que 
reviram a teoria e a prática acerca da organização sexual infantil e das chamadas 
relações pré-genitais.
No que tange ao contexto brasileiro, Zimerman (2004) destaca a grande influência 
das ideias de autores como M. Klein e D. Winnicott, além de contribuições de A. 
Aberastury e R. Soifer (autoras argentinas). O autor destaca que a Psicanálise no 
campo da infância esteve frequentemente associada à área da Educação e, também, 
à Medicina. Assim, por muito tempo, as ideias psicanalíticas eram aplicadas no 
contexto educacional com o objetivo de solucionar problemas escolares ou de tratar 
“transtornos emocionais e mentais”.
Diante desse cenário, Zimerman (2004) destaca a importância da atenção integral à 
criança, que combina a psicoterapia e a assistência relativa às dificuldades externas, 
numa abordagem que reconhece que muitas crianças, além de sofrerem conflitos 
emocionais,possuem considerável carência de cuidados físicos e psicológicos.
Assim, é importante destacar que cabe à psicanálise, no contexto brasileiro, atentar 
ao fato de que as condições de pobreza atingem, no mínimo, 40% da nossa população. 
O psicólogo deve em sua prática, seja esta clinica ou não, realizar uma reflexão 
crítica sobre os fenômenos sociais, tais como o preconceito de gênero, classe e raça, 
interpretando seus pacientes não apenas a partir de um ponto de vista psicanalítico, 
mas, também, social, afinal, tal contexto atravessa, por vezes de maneira determinante, 
o ambiente analítico.
11
De forma geral, esta disciplina apresentará o percurso histórico da psicanálise com 
crianças e bebês, indicando os principais autores que contribuíram para a técnica 
da Psicanálise de Crianças. Nesse sentido, abordará a obra e as concepções de 
autores como Freud, Anna Freud, Melanie Klein, Donald Winnicott e Francoise 
Dolto. Discutirá, ainda, a teoria do brincar, seu valor na análise infantil e práticas 
empreendidas nesse campo. Contextualizará teorias e perspectivas apresentadas 
com a realidade brasileira, refletindo de forma crítica sobre toda a complexidade que 
envolve o atendimento de crianças e bebês.
Objetivos 
 » Apresentar a história da Psicoterapia Psicanalítica com bebês;
 » Apresentar os fundamentos e os conceitos da prática psicanalítica com 
bebês;
 » Oferecer subsídios teóricos e técnicos acerca da psicoterapia infantil;
 » Oferecer subsídios teóricos e técnicos para a prática do atendimento dos 
pais e/ou familiares;
 » Preparar o profissional para observar, compreender e interpretar as 
manifestações psíquicas do bebê sob a ótica psicanalítica;
 » Refletir sobre situações que favoreçam o desenvolvimento do 
pensamento clínico e sobre a atuação profissional perante o sujeito 
criança em diferentes etapas do seu desenvolvimento e em diferentes 
contextos clínicos. 
12
13
UNIDADE I
PSICANÁLISE 
DA CRIANÇA: 
UM PERCURSO 
HISTÓRICO
Objetivos
 » Conhecer a história do pensamento psicanalítico e suas transformações 
em relação às crianças e bebês.
 » Apresentar os principais autores e conceitos.
 » Refletir sobre a mudança da noção de constituição do sujeito.
CAPÍTULO 1
E tudo começou com Freud
Freud (1909/1996b)1 iniciou a teoria psicanalítica a partir de métodos focados no 
adulto e, posteriormente, continuou o desenvolvimento no campo de análise de 
crianças. As descobertas de Freud sobre as crianças se deram por meio do atendimento 
de adultos, visto que foi a partir destes que observou que as primeiras causas dos 
transtornos se localizavam em fatos da infância.
A partir da escuta de suas pacientes histéricas, Freud desenvolveu inicialmente a 
teoria da sedução, afirmando que a etiologia das neuroses nos adultos estava fundada 
em experiências sexuais traumáticas ocorridas durante a infância. Contudo, com o 
decorrer do tempo, reviu essa teoria, pois percebeu, a partir de seus atendimentos 
clínicos, que as neuroses não obrigatoriamente estavam fundadas em experiências 
reais e concretas, mas, muitas vezes, eram decorrentes de fantasias impregnadas de 
desejo. Portanto, a realidade psíquica era a determinante, e não a realidade factual.
Esse foi um momento muito importante para a teoria psicanalítica quando, finalmente, 
Freud (1909/1996b) percebeu que não seriam os fatos “concretos” da infância, a 
1 Veja mais em: Freud, S. (1996). Análise de uma fobia em um menino de cinco anos. In: FREUD, S. Edição Standard 
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (Vol. 10, p. 11-133). Rio de Janeiro: Imago. (Obra 
original publicada em 1909).
14
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
experiência “real” que a criança viveu, mas a realidade psíquica, constituída pelos 
desejos inconscientes e pelas fantasias a ela vinculadas, que atuaria como pano de 
fundo na constituição da sexualidade infantil. 
Em outras palavras, Freud constatou que: 
O efeito traumático estaria relacionado ao fato de a criança ser confrontada 
passivamente com a sexualidade do adulto. Através dos cuidados e dos desejos 
maternos, a criança será introduzida no campo da sexualidade, pois é pelo contato com 
a mãe, ou um substituto, que o corpo do bebê será erogenizado (NEVES; VORCARO, 
2010, p.14)
Figura 1. Sigmund Freud, por Max Halberstadt, em 1922.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sigmund_Freud. Acesso em 03 set. 2020.
A partir dessa constatação, Freud questionou a visão moralizante que até então se 
tinha da infância. Na obra “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, elaborou teses 
sobre a sexualidade infantil, apresentando o conceito de complexo de édipo – que a 
seguir apresentaremos. 
Pode-se dizer, portanto, que Freud apresenta ao mundo uma nova criança, repleta de 
pulsões e desejos. Chocou a sociedade vienense em sua época ao propor a ideia de uma 
infância que se afastava da tradicional noção de pureza, trazendo à tona uma criança 
dotada de afetos, desejos e conflitos.
Freud demonstrou como a criança utiliza o “próprio corpo como objeto de satisfação 
(por exemplo, sugar o polegar), derivado da impossibilidade de a criança dominar o 
mundo externo” (NEVES; VORCARO, 2010, p. 15). Assim, pode-se dizer que o pai da 
psicanálise pôs em xeque a concepção naturalista acerca da sexualidade predominante 
no final do século XIX ao afirmar que a sexualidade surgiria desde os primórdios da 
15
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
constituição do psiquismo e seria radicalmente diferente da então aceita noção de 
instinto sexual.
Até agora mencionamos os termos pulsão sexual e instinto sexual. Você sabe a 
diferença entre eles?
É importante notar que, para Freud, pulsão sexual é um fator que impulsiona 
uma série de manifestações psíquicas. Pulsão sexual designa em psicanálise 
um impulso energético que direciona o comportamento do indivíduo. O 
comportamento gerado pelas pulsões é impulsionado por forças internas, 
inconscientes. As pulsões são a origem da energia psíquica que se acumula no 
interior do ser humano, gerando uma tensão que exige ser descarregada.
Quanto ao conceito de instinto sexual, este se refere, para Freud, a um padrão 
de comportamento biológico hereditariamente fixado. Refere-se, assim, às 
atividades da sexualidade biológica.
Freud acreditava que a pulsão não está dentro do aparelho psíquico, e, sim, 
entre este e o somático, num limite entre os dois. É importante, ainda, notar 
que Freud distinguiu duas pulsões: Eros, ou pulsão sexual / pulsão de vida, e 
Tânatos, ou pulsão de morte. Nas palavras do pai da psicanálise:
Fomos levados a distinguir duas espécies de instintos: aqueles 
que procuram conduzir o que é vivo à morte, e os outros, 
os instintos sexuais, que estão perpetuamente tentando e 
conseguindo uma renovação da vida. (FREUD, 1920/2010)
Assim, para Freud (1920/2010), a pulsão de vida é aquela que nos leva à busca 
constante de satisfação que nunca é completa e que faz com que o sujeito 
continue desejando. Já a pulsão de morte é a sua contrapartida, a diminuição 
da excitação, o trabalho dessa pulsão teria como objetivo a descarga, a falta de 
vida.
Podemos considerar que a psicanálise de crianças foi inaugurada pelo famoso 
caso do pequeno Hans2 (FREUD, 1909/1996b). Freud viu a criança uma única vez 
e o tratamento estava a cargo do pai, Max Graf, paciente de Freud à época. A partir 
das interpretações feitas pelo pai do menino, Freud observou as possibilidades e 
potencialidades do tratamento psicanalítico infantil, considerando que eventos 
traumáticos infantis gerariam possíveis problemas emocionais na fase adulta.
2 O pequeno Hans é o garotinho cujo caso clínico é descrito por Freud (1909/1996d) em “Análise de uma fobia em um menino 
de cinco anos”. Freud, S(1996). Duas Histórias Clínicas (o “Pequeno Hans” e o “Homem dos Ratos”, v. X. In Edição standard 
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalhooriginal publicado em 1909).
16
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
A partir dessa compreensão – e da consequente ampliação – explicitada em “Três 
ensaios sobre a teoria da sexualidade” (1905/1996a), Freud questionou as concepções 
moralizantes sobre a atividade sexual das crianças, elaborando, o que à luz da 
psicanálise atual, se denomina “uma tese inicial sobre a sexualidade infantil”. Freud 
apresentou, portanto, um novo conceito de criança, dotada de uma sexualidade 
perverso-polimorfa. O autor nos apresenta a criança dotada de um “corpo de 
desejo”, repleto de pulsões que emanam de zonas erógenas que estão em processo de 
constituição, apoiando-se em funções vitais.
Para Freud (1905/1996a), a criança usa o próprio corpo como objeto de satisfação 
(sugar o polegar, defecar etc.). Para o infante, todo o corpo se comportaria como uma 
zona erógena. Afinal, para o autor, as crianças obtêm prazer com atividades cotidianas 
ligadas ao corpo.
Assim, para Freud (1905/1996a), as manifestações sexuais da criança são perversas 
pois não têm relação com a reprodução; são também polimorfas porque não estão 
voltadas a um objeto sexual, assumindo formas variadas de satisfação através das 
zonas erógenas mas, também, através de partes da pele e/ou da mucosa. Portanto, 
o corpo da criança é tomado por pulsões parciais, que seriam pulsões sexuais 
fragmentadas e independentes entre si, que encontram prazer no próprio corpo e não 
em um objeto externo.
A criança viveria, portanto, um estágio de autoerotismo. Ao falar de autoerotismo, 
Freud salienta a ausência de investimento em objetos externos. A criança vivenciaria o 
prazer direcionado ao seu próprio corpo, durante a satisfação de suas necessidades (de 
sono, de alimentação etc.). Nas palavras de Freud (1905/1996a, p.171):
Diríamos que os lábios da criança se comportaram como uma zona 
erógena, e a estimulação pelo fluxo cálido de leite foi sem dúvida 
a origem da sensação prazerosa. A princípio, a satisfação da zona 
erógena deve ter-se associado com a necessidade de alimento. [...] 
A necessidade de repetir a satisfação sexual dissocia-se então da 
necessidade de absorção de alimento [...]. A criança não se serve de 
um objeto externo para sugar, mas prefere uma parte de sua própria 
pele, porque isso lhe é mais cômodo, porque a torna independente do 
mundo externo, que ela ainda não consegue dominar, e porquê desse 
modo ela se proporciona como que uma segunda zona erógena, se bem 
que de nível inferior.
Assim, à medida que as pulsões autoeróticas que a criança destina ao próprio corpo 
começam a se dirigir a um objeto externo, o narcisismo se instalaria e, com isso, o 
17
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
ego. Contudo, antes que se apresente a formação do ego a partir de uma perspectiva 
Freudiana, é importante salientar que o autor estruturou a organização sexual infantil 
por meio de quatro fases de desenvolvimento: oral, anal, fálica e genital. Cada uma 
dessas fases diz respeito a uma etapa do desenvolvimento, preponderando em cada 
etapa uma zona erógena e uma modalidade específica de relação com o objeto.
Fase oral
Aproximadamente entre 0 e 1 ano
Freud (1905/1996a) destacou como etapa inicial a fase oral, uma vez que a boca é o 
destino de tudo que está próximo ao bebê. É pela boca que o bebê conhece o seio da 
mãe e o mundo à sua volta. É por essa razão que a criança pequena tende a levar tudo 
o que pega à boca. 
Inicialmente o seio da mãe é o primeiro objeto da pulsão sexual do bebê, contudo, à 
medida que a mãe não está mais inteiramente à disposição, o bebê substitui a atividade 
de sucção do seio materno pela sucção de uma parte do seu próprio corpo.
O principal objeto de desejo nesta fase é o seio da mãe, que, além de alimentar, 
proporciona satisfação ao bebê. Nesta fase, o bebê experimenta uma relação de 
dependência com os sujeitos que lhe proporcionam nutrição e sustento. O objetivo 
desta fase é que o bebê obtenha gratificação de suas necessidades libidinais orais sem 
conflitos excessivos.
Fase anal
Aproximadamente entre 2 e 4 anos
Neste período a criança passa a adquirir o controle dos esfíncteres, a zona de 
maior satisfação é a região do ânus. A criança passa a, gradativamente, dominar a 
musculatura do corpo, prendendo ou soltando as fezes. É assim que descobre que a 
mucosa do intestino é fonte de excitações intensas.
O objeto que caracteriza a fase anal são as fezes, utilizadas pela criança como moeda 
de troca na relação com o seu cuidador, à medida que a criança descobre que pode 
controlar as fezes que sai de seu interior, oferecendo-as à mãe em alguns momentos 
como um presente e, e outros, como algo agressivo. 
18
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Quando nos referimos às fezes como instrumento que potencialmente pode ser 
utilizado pela criança como expressão da agressividade, referimo-nos à concepção 
freudiana da fase anal como a etapa em que se configura a dualidade: Atividade x 
Passividade. Freud afirma que, muitas vezes, o bebê se recusa obstinadamente “[...] 
a esvaziar o intestino ao ser posto no troninho, ou seja, quando isso é desejado pela 
pessoa que dele cuida, ficando essa função reservada para quando aprouver a ele 
próprio.” (FREUD, 1905/1996a, p. 175). 
Nesse momento, o bebê, mesmo que de maneira rudimentar, percebe uma divisão de 
opostos, o par ativo/passivo. Assim, nessa relação de troca com o outro, o bebê começa 
a perceber as possibilidades de perdas e ganhos: ao renunciar ao prazer proporcionado 
pela retenção das fezes, a criança ganha respeito social.
Fase fálica
Aproximadamente entre 4 e 6 anos
Nesta etapa, as crianças voltam sua atenção para a região genital. Inicialmente 
imaginam que tanto os meninos quanto as meninas possuem um pênis. Contudo, 
quando são defrontadas com as diferenças anatômicas entre os sexos, criam as 
chamadas “teorias sexuais infantis”, imaginando que a menina não tem pênis porque 
este órgão lhe foi arrancado. 
No decorrer de suas observações, o menino percebe que nem todos possuem pênis. 
Descobre tal fato, conforme afirma Freud (1905/1996a), por meio da visão fortuita 
dos genitais de uma irmãzinha ou amiguinha. Quando isso acontece, o menino rejeita 
a ausência do pênis, criando argumentos plausíveis para isso, como fez o pequeno 
Hans quando, ao observar a irmã no banho, afirmou: “‘Mas o pipi dela ainda é bem 
pequenininho’, observou; e acrescentou, à guisa de consolo: ‘Quando ela crescer, ele 
vai ficar bem maior.’” (FREUD, 1905/1996a, p. 20).
Já a menina, segundo Freud, ao se deparar com pênis de um irmãozinho ou de um 
amiguinho, nota que o tamanho é maior do que o de seu órgão. Instala-se, neste 
momento, a inveja do pênis. A menina admite que não tem pênis, mas quer tê-
lo também, ou melhor explicitando a questão, não é que a menina deseje o genital 
masculino, mas a sensação de potência que tal órgão promove.
Assim, na fase fálica, o menino vivencia a angústia da possibilidade de perder o falo e a 
menina sofre por já o ter perdido. Neste período surge também o complexo de Édipo, 
no qual o menino passa a ter a mãe como objeto de desejo e a rivalizar com o pai. A 
19
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
menina também tem, na mãe, o seu primeiro objeto de amor e precisa trocá-lo pelo 
pai e voltar seu investimento libidinal para ele. Enquanto o menino tem como objeto 
narcísico uma parte de seu corpo, na menina, o objeto narcísico é a imagem de si. 
Assim, a dor de ter perdido o pênis faz com que a menina abandone a sexualização da 
mãe e se volte para o pai, para que este possa cuidar de sua ferida narcísica.
Fase de latência
Aproximadamente entre 6 e 11 anos
Este período caracteriza-se, principalmente, pelo deslocamento da libido da 
sexualidade para atividades socialmente aceitas, ou seja, a criança passa a gastar 
sua energia em atividades sociais, escolares etc. Assim, não se trata de uma nova 
organização emtorno de uma zona erógena, nem de uma nova modalidade de relação 
objetal. 
Freud (1905/1996a) afirmava que o período de latência não se configura como uma 
fase psicossexual, visto que não ocorre a organização de uma zona erógena, nem uma 
nova modalidade de relação objetal.
Portanto, o período de latência é um ponto intermediário entre a sexualidade infantil 
e a adulta. O investimento libidinal desloca-se de objetivos sexuais e é canalizado para 
outras finalidades. 
Fase genital 
Aproximadamente a partir de 11 anos
Finalizando a organização libidinal, tem-se a fase genital e a consolidação da vida 
sexual adulta. Neste período, que se inicia com a adolescência, há uma retomada 
dos impulsos sexuais. Se antes a pulsão sexual partia de diversas zonas erógenas, 
independentes entre si, ou seja, eram pulsões parciais, agora elas se reúnem sob o 
domínio da zona genital. 
A adolescência é um período de mudanças no qual o jovem tem que elaborar a perda 
da identidade infantil para que, pouco a pouco, possa assumir uma identidade adulta. 
É o momento em que, gradativamente, ocorre a desvinculação dos pais, permitindo, 
assim, a inserção na comunidade social. Para se desvincular dos pais, é preciso 
dessexualizá-lo, ou seja, dirigir os desejos libidinais para um objeto de amor real, no 
mundo externo.
20
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Para além das observações que Freud fez do pequeno Hans – que o levaram a repensar 
a teoria do trauma, constatando que a realidade psíquica era constituída pelos desejos 
inconscientes e pelas fantasias a ela vinculadas –, outra importante observação feita 
pelo pai da psicanálise foi sobre o papel do brincar3. 
Observando seu neto Ernst, então com um ano e meio de idade, brincando com um 
carretel – empurrava este para longe enquanto pronunciava “Fo-o-o-órt”, uma 
interjeição referente a “ir embora”, em seguida, puxava o carretel de volta, emitindo 
alegremente um “daaaaaa” -, Freud observou que a criança estava encenando a partida 
da mãe, vivenciada de forma desagradável e, consequentemente, o seu retorno, 
saudado com prazer. O garotinho repetia, por meio da brincadeira, uma experiência 
que era desagradável, mas que o permitia passar de um papel passivo para um ativo. 
Nas palavras de Freud, o jogo do Fort-da se relaciona: 
À grande realização cultural da criança, à renúncia instintual (isto 
é, a renúncia à satisfação instintual) que efetuara ao deixar a mãe ir 
embora sem protestar. Compensava-se por isso, por assim dizer, 
encenando ele próprio o desaparecimento e a volta dos objetos que se 
encontravam a seu alcance (FREUD, 1920/2010, p. 172).
É a partir da observação sobre o jogo do Fort-da que Freud (1920/2010) compreende 
que a criança, brincando, cria um mundo próprio ou rearranja as coisas de seu mundo 
numa forma que lhe agrada. Apesar de o pai da psicanálise não ter atendido crianças 
ou trabalhado diretamente com elas, Freud destacou as relações entre o brincar e a 
construção da realidade psíquica.
Que tal pensar sobre psicanálise de uma forma leve?
Por meio de exemplos criativos e baseando-se em contextos recorrentemente 
presentes no nosso dia a dia, Christian Dunker e Cláudio Thebas publicaram 
o livro “O Palhaço e o Psicanalista - Como escutar os outros pode transformar 
vidas” (2019).
Cláudio Thebas, um dos escritores do livro, é palhaço e, por longos anos, 
trabalhou com crianças. No texto “Depois que a gente brinca, a gente fica 
amigo” reflete sobre o brincar a partir de uma perspectiva freudiana, diz o autor:
Se perguntássemos a Freud como aprender a escutar o outro, 
ele provavelmente diria que escutar é brincar. Brincar é realizar 
um percurso junto, ao modo de uma pequena viagem. Brincar 
envolve, portanto, fazer malas criar planos, imagina companhias, 
3 Verificar em: FREUD, S. Além do princípio de prazer. São Paulo: L&PM, 2016. (Obra original publicada em 1920).
21
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
usar mapas, mas também: ficar esperando na estação, ficar 
perdido sem saber para onde ir, tropeçar e perder as malas, 
encontrar hotéis lotados e até mesmo decepcionar-se com o 
encontro real com lugares tão vivamente imaginados. Só o adulto 
que esqueceu demasiadamente de sua infância esqueceu-se do 
quão sério é brincar (THEBAS, 2019, p. 50)
Por meio desta leitura você refletirá sobre a escuta psicanalítica dos pacientes, 
mas, também, sobre a escuta que o analista deve fazer de si mesmo.
Esperamos que você tenha compreendido as fases do desenvolvimento libidinal e a 
importância do brincar na construção da realidade psíquica; que tenha compreendido 
como Freud concebe a constituição do sujeito marcada pela pulsão sexual. Afinal, a 
mãe, ao dispensar cuidados ao corpo biológico do filho, desperta também “um corpo 
psíquico”. Nesse sentido, é o contato entre mãe4 e filho que oferece os contornos de 
uma estrutura psíquica. Nos cuidados, a figura materna libidiniza o corpo, de forma 
sexual, mas não erótica, o que faz com que a criança tome o lugar de ser desejado, que 
se oferece ao gozo do outro, para um outro momento, o de tornar-se um ser desejante.
Anna Freud e os primeiros passos de uma 
psicanálise infantil
Quando se fala de Ana Freud, “a ascendência familiar e a transmissão psicanalítica 
confundem-se e mesclam-se.” (NEVES; VORCARO, 2010, p.19). Muito além de filha, 
Anna foi companheira enfermeira, parceira de viagens e interlocutora de Freud. 
Cuidou de Freud principalmente em seus últimos anos de vida, em especial quando 
este enfrentou um câncer de mandíbula. Após a morte do pai da psicanálise, coube à 
filha o papel de guardiã e censora da obra freudiana. 
Anna nasceu em uma família na qual a tradição era a de que os homens fossem 
intelectuais reconhecidos, mas, mesmo frente às dificuldades, lutou para se tornar 
uma psicanalista, sendo analisada pelo próprio pai durante um longo período. Como 
em sua época era vedado que mulheres cursassem a faculdade de medicina, tornou-se 
professora primária.
Com o tempo, Anna percebeu que ser professora não era sua vocação, passou a 
dedicar-se à psicanálise infantil. Nessa época, a psicanálise com crianças era, ainda, 
uma prática controvertida, portanto, pode-se dizer que Anna, com Hermine von Hug-
Hellmuth, deu os primeiros passos para o tratamento psicanalítico de crianças.
4 Aqui nos referimos à realização da função materna, que é independente de quem a realiza.
22
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Figura 2. Anna Freud, em 1957.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Anna_Freud. Acesso em 03 set. 2020.
Em 1927, Anna Freud publicou sua primeira obra oficial: “O tratamento psicanalítico 
das crianças”, por meio da qual expôs técnicas e princípios da análise infantil. Para 
a autora, o papel do analista com a criança era pedagógico. Vale ressaltar que a 
publicação dessa obra revelou a oposição entre Anna e Melanie Klein5. 
Neves e Vorcaro (2010, p.24) destacam que, quanto ao tratamento psicanalítico de 
crianças, Anna Freud afirmava que era impossível:
Estabelecer uma relação puramente analítica com uma criança em 
função de sua imaturidade e dependência do meio ambiente. A criança 
não tem consciência de sua doença, nem acha que tem um “problema” 
para resolver. Normalmente são seus pais que estão preocupados ou 
angustiados diante de suas dificuldades. Neste sentido, falta à criança o 
elemento fundamental para a entrada de um paciente em análise, que 
é o mal-estar em relação a seu sintoma e a necessidade de tratamento.
Outro aspecto que Anna Freud apontava como diferente entre a análise de crianças e 
adultos era “o destino dos produtos de uma análise” (NEVES; VORCARO, 2010, p. 25). 
A autora apontava que o tratamento psicanalítico com adultos objetiva a suspensão 
do recalque enquanto o tratamento infantil não se dá da mesma maneira, pois, se as 
tendências pulsionais fossem liberadas do recalque, a criança buscaria sua satisfação 
imediata.Dessa forma, na análise de crianças, o psicanalista deve demonstrar certa 
autoridade, ajudando a criança a “domar” seus impulsos, exercendo, também, o papel 
de educador. 
Anna Freud foi amplamente reconhecida por “O Ego e os Mecanismos de Defesa”, 
publicado em 1936. Nessa obra, apresentou sua visão da psicanálise infantil fazendo 
5 Líder, até então, da escola psicanalítica inglesa. No próximo capítulo conheceremos um pouco mais sobre sua obra.
23
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
um percurso até a adolescência. Além disso, essa obra obteve especial reconhecimento 
na época por discutir três relevantes aspectos da psicanálise:
 » Analisar e rever as descobertas técnicas e teóricas que ensinavam os 
psicanalistas a dar igual consideração clínica ao id, ao ego e ao superego.
 » Rever os mecanismos de defesa que seu pai isolara e descrevera, 
elaborando-os e resumindo-os.
 » Incorporar os mecanismos de defesa à experiência que acumulara, até 
então. 
Essa obra é até hoje reconhecida por auxiliar a compreensão mais profunda do 
adolescente e, também, da psicologia do ego, parte do aparelho psíquico que a autora 
destaca como fundamental na mediação entre os impulsos instintivos e a realidade.
Você quer conhecer mais sobre a obra de Anna Freud? 
Que tal assistir a um vídeo que fala de sua vida e obra? 
The School of Life – Escola da vida – produziu o vídeo: “Psicoterapia - Anna 
Freud”, com comentários sobre a teoria de Anna e com exemplos. Assistindo ao 
vídeo, você compreenderá os mecanismos de defesa estudados por Anna em 
“O Ego e os Mecanismos de Defesa”, com uma ampla riqueza de exemplos e 
situações. 
No que tange à psicanálise com crianças, Anna questionava velhas teorias que se 
baseavam na noção de que o desenvolvimento saudável de uma criança dependia de 
uma rígida disciplina. Por meio de sua longa experiência na clínica Hampshead, na 
Grã-Gretanha – fundada por Anna em 1947 –, estudou o desenvolvimento da criança, 
atuou junto a pais e professores. Destacava, constantemente, que a terapia devia ter 
uma influência educacional positiva na criança.
Neves e Vorcaro (2010, p.24) destacam que, no que se refere ao tratamento 
psicanalítico com crianças, Anna Freud levantou algumas questões, diferenciando a 
análise de crianças e adultos.
Segundo ela, há uma impossibilidade de estabelecer uma relação puramente analítica 
com uma criança em função de sua imaturidade e dependência do meio ambiente. A 
criança não tem consciência de sua doença, nem acha que tem um “problema” para 
resolver. Normalmente são seus pais que estão preocupados ou angustiados diante 
de suas dificuldades. Nesse sentido, falta à criança o elemento fundamental para a 
24
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
entrada de um paciente em análise, que é o mal-estar em relação a seu sintoma e à 
necessidade de tratamento.
Conclusivamente, podemos sintetizar o excerto acima afirmando que, para Anna 
Freud, a criança está em processo de construção, portanto, torna-se impossível 
compreender sua personalidade, já que está sendo formada. Assim, o trabalho com a 
criança deve ser educacional e, nesse processo, é fundamental a participação de pais e 
professores, que devem contribuir para que a criança se torne autônoma e criativa. 
Anna Freud (1951/1971) destacava, ainda, que as crianças não têm capacidade de 
transferência espontânea ou de realizar associação livre. Nas palavras da autora: “os 
sonhos e os sonhos diurnos das crianças, juntamente com a fantasia manifestada no 
jogo, desenhos, etc., revelam os impulsos do id sem disfarces e de uma maneira mais 
acessível que nos adultos” (FREUD, 1951/1971, p. 83) 
Diante desses aspectos, afirmava que seria necessário um trabalho prévio não analítico, 
com a finalidade de preparar a criança para o tratamento. Seria um momento de trazer 
à consciência da criança a enfermidade, dando-lhe confiança no analista. 
Diante do fato de que a criança está, ainda, em processo de construção e é incapaz 
de constituir uma transferência com o analista, como Anna Freud propunha que 
o psicanalista realizasse o tratamento da criança? Além do período preparatório 
acima destacado, a autora sugeria entrevistas preliminares realizadas com os 
pais e professores para produzir artificialmente uma demanda de análise, ou seja, 
conscientizar a criança de seu sofrimento e da necessidade de ser ajudada a se livrar de 
seu sintoma.
Dando seguimento a essa etapa, tendo, portanto, a demanda parental em mente, é 
papel do psicólogo tentar mostrar, por exemplo, que uma conduta rebelde por parte da 
criança é um problema, e que traz desvantagens. Assim, para Anna Freud: 
É tarefa do analista mostrar à criança que, a desobediência, por 
exemplo, é sinal de que a criança e infeliz, na realidade, ela é muito 
infeliz, que sofre e há um desgaste excessivo em sua luta interna contra 
‘seus demônios’ (NEVES; VORCARO, 2010, p. 25). 
Para demonstrar tais aspectos à criança, o analista deve se apresentar de maneira 
acessível, usando uma linguagem apropriada que aproxime a criança dele. Anna 
Freud (1951/1971) dizia que o analista de crianças, além do treinamento analítico 
propriamente dito, também deveria possuir um grande conhecimento pedagógico.
25
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
Assim, para Anna Freud, o analista de crianças deve constantemente associar medidas 
pedagógicas aos meios analíticos, numa tentativa de conquistar a confiança da criança, 
facilitando seu engajamento no processo psicanalítico. Para além disso, ela adverte 
que o analista deve se colocar no lugar do Ego-Ideal da criança por toda a duração da 
análise.
Outro aspecto defendido por Anna Freud é o de que “a criança não consegue associar 
livremente como o adulto; não estabelece uma neurose de transferência em função 
de sua ligação com os pais da realidade” (NEVES; VORCARO, 2010, p.25). Assim, 
embora a criança estabeleça entre ela e o analista uma relação na qual expressa muitas 
das situações vividas com os pais,
Não está disposta, como o adulto, a reeditar seus vínculos amorosos, 
porque, por assim dizer, ainda não esgotou a velha edição. Seus 
primeiros objetos amorosos, os pais, ainda existem na realidade e não 
só nas fantasias, como no neurótico adulto; a criança mantém com eles 
todas as relações da vida cotidiana e experimenta todas as vivências 
(ABERASTURY, 1982, p. 61)
Ante esses limitadores, Anna Freud (1951/1971) sugere que deve haver uma 
colaboração dos pais com o analista. Contudo, em situações, por exemplo, em que os 
pais se apresentavam como um empecilho para o desenvolvimento da criança, Anna 
sugeria o afastamento da criança, colocando-a, por exemplo, numa instituição onde 
pudesse ser analisada. 
Anna Freud (1951/1971) apresentou ainda o conceito de linhas de desenvolvimento, 
destacando que o desenvolvimento da criança se dá em um processo contínuo e 
cumulativo, sendo, ainda, possível que a criança avance ou regrida no decorrer desse 
processo. No caso de uma regressão, Anna destaca que, às vezes, a criança precisa 
regredir por um breve período a fim de lidar com estágios mal resolvidos, uma vez 
regredindo e superando o desafio, a criança pode voltar a avançar. 
Como exemplo, podemos pensar em uma criança que já aprendeu a ir ao banheiro 
sozinha, mas que, confrontada com a pressão de um novo “irmãozinho”, esqueça 
“como fazer essa atividade”. Uma vez que tenha se ajustado ao novo membro da 
família, com o apoio dos pais, o problema será resolvido e novamente a criança estará 
pronta para avançar.
26
CAPÍTULO 2
A escola inglesa: Melanie Klein e 
Winnicott
Melanie Klein e a técnica do brincar
A teoria de Freud sobre o desenvolvimento da criança influenciou muitos discípulos 
que, a partir de suas ideias, pensaram o desenvolvimento infantil à luz da teoria 
psicanalítica. Entre esses discípulos, Melanie Klein se destacou ao averiguar, em sua 
experiência clínica com crianças, a teoria do desenvolvimentolibidinal proposta por 
Freud. Contudo, se Klein confirmou alguns elementos da teoria freudiana, por outro, 
fez suas próprias descobertas a respeito dos estágios iniciais do desenvolvimento da 
criança.
Klein (1952/1991) teve uma vasta experiência com a clínica de crianças. Para a autora, 
o mundo interno do bebê é povoado por fantasias, figuras boas e más. Assim, desde o 
nascimento, o bebê está exposto aos impulsos libidinais. Em outras palavras, pode-
se dizer que: “O elemento organizador essencial do pensamento de Melanie Klein é a 
prevalência da fantasia e dos ‘objetos internos’ sobre as experiências desenvolvidas no 
contato com a realidade externa” (NEVES; VORCARO, 2010, p.30).
Segundo a teoria kleiniana, cada criança nasce com um “dote pulsional”, que 
compreenderia as forças que se articulam entre a pulsão de vida e de morte, que se 
equilibram quando o bebê está tranquilo, livre de fome, medo, sono etc. Na prática, 
quando o bebê recebe o carinho e a atenção da mãe, sente-se gratificado, o que reforça 
sua pulsão de vida; e o contrário, a ausência da mãe, intensifica as frustrações do bebê 
e, consequentemente, a sua pulsão de morte.
Assim, para Klein (1952/1991), quando o bebê nasce, experimenta ansiedades que têm 
origem em fontes internas e externas. Vivencia dor e desconforto como se estivesse 
sendo atacado por objetos persecutórios, num processo que inaugura um ciclo 
contínuo de projeção e medo de aniquilamento. No entanto, os sentimentos de perda 
suscitados pelo nascimento podem ser compensados pelas experiências gratificantes 
que o bebê experiencia com a mãe através da amamentação e do aconchego.
27
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
Figura 3. Melanie Klein, em 1952.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Melanie_Klein. Acesso em 03 set. 2020.
Você sabia que Melaine Klein, conhecida como a responsável por lançar as 
bases e desenvolver a técnica da análise de crianças, não brincava com seu pai? 
Nas palavras de Klein: “Não me lembro de alguma vez ele ter brincado comigo. 
Doía-me pensar que meu pai era capaz de afirmar com toda franqueza e sem 
consideração por meus sentimentos que preferia minha irmã mais velha, sua 
primogênita.” (SOCHA, 2019)
Você quer conhecer mais sobre a vida e a obra de Melaine Klein? Em 2008, a 
Folha de S. Paulo publicou, na coleção “Folha explica”, o livro Melanie Klein, 
de autoria de Luis Claudio Figueiredo e Elisa Maria Cintra. No livro, além da 
teoria kleiniana, você encontrará curiosidades como o fato de Melanie Klein ter 
buscado a psicanálise, inicialmente, para curar sua própria depressão.
Para Melaine Klein (1952/1991), como se daria a pulsão de morte e de vida para 
o bebê? Logo no primeiro dia de vida, o bebê experimenta ansiedades que têm 
origem em fontes internas e externas, uma intensa sensação de perda suscitada pelo 
nascimento. Contudo, essas sensações são aliviadas pela experiência gratificante que 
os bebês têm com a mãe através da amamentação, do aconchego e do afeto.
A partir da experiência do bebê em seus primeiros meses de vida, Klein (1935/1996) 
descreve duas posições: a posição esquizo-paranoide e a posição depressiva. Vejamos 
abaixo um pouco mais sobre cada uma.
Posição esquizo-paranoide
Entre o nascimento e o terceiro ou quarto mês de vida do 
bebê
Durante esse período o bebê compreende o seio materno de dois modos: o seio bom, 
que alimenta e supre suas necessidades, e o seio mau, que o deixa com fome, sozinho, 
28
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
esperando a saciedade. Assim, enquanto o seio bom seria gratificador, o seio mau seria 
frustrador. O bebê, nesse momento, não é capaz de compreender que existe um único 
seio, imagina que existem dois, separados, um amado e outro odiado. 
O seio bom aglutina as boas experiências, proporcionando a formação de uma 
unidade egoica (as bases para autoestima). Nas palavras de Klein (1952/1991, p. 
92), “fortalece a capacidade do bebê para amar e confiar em seus objetos, aumenta 
o estímulo para a introjeção de objetos bons e situações boas, sendo, portanto, uma 
fonte essencial de reasseguramento contra a ansiedade. Torna-se o representante 
interno da pulsão de vida”.
Assim, a posição esquizo-paranoide caracteriza-se pela ansiedade constante que o 
bebê sente de ser destruído. Um medo constante de que o seio mau prevaleça sobre o 
seio bom. Contudo, entre o quarto e o quinto mês de vida do bebê, a posição esquizo-
paranoide dá lugar à posição depressiva.
Posição depressiva
Entre o quarto ou quinto mês de vida do bebê
É o momento que o bebê introjeta o “objeto como um todo”, em outras palavras, ele 
passa a perceber o seio como único. Assim, o seio amado, também seria o seio odiado. 
Ambos se integrariam formando, gradativamente, um objeto total. Klein (1935/1996) 
acredita que o bebê consegue estabelecer uma relação de objeto total quando a mãe é 
percebida como um objeto completo, real e amado. A partir desse momento, o bebê 
também passa a perceber o pai, os irmãos e as outras pessoas do seu convívio como 
pessoas inteiras. 
O bebê é agora capaz de integrar amor e ódio, sintetizando as emoções relacionadas 
a ele. Passa a sentir, assim, culpa pelos ataques agressivos que dirigiu aos objetos 
amados. Percebe que quando estava atacando o seio mau, apertando, mordendo, 
estava, na realidade, também, atacando o seio bom. Tal constatação leva ao bebê o 
desejo de reparar os danos cometidos. Assim, se instalada a posição depressiva, nas 
palavras de Klein, (1952/1991, p. 55), o sentimento do bebê seria como o seguinte : “O 
objeto bom está ferido, está sofrendo, está num estado de deterioração; transformou-
se num objeto mau; está aniquilado, está perdido e nunca mais estará presente”.
Note que Klein (1932/1997) utiliza o termo “posição” em detrimento do 
termo “fase” (utilizado por Freud). A autora escolheu esse termo, pois, apesar 
desses fenômenos ocorrerem durante os estágios iniciais da vida do bebê, 
29
PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
eles não estão confinados a esses estágios, aparecendo e reaparecendo 
durante toda a vida.
Agora que você conhece um pouco mais da teoria kleiniana e as duas posições que a 
autora apresenta, deve estar se perguntando: E o complexo de Édipo? Onde Melaine 
Klein situaria este evento? Klein, assim como Freud, deu grande atenção ao conflito 
gerado pelo complexo de Édipo. Contudo, reformulou a forma de pensar o Édipo.
Klein (1935/1996) acreditava que a frustração advinda do desmame liberaria as 
tendências edipianas, assim, o complexo de Édipo surgiria no primeiro ano de vida, 
com o início da posição depressiva. Klein (1935/1996) refere-se, assim, a um édipo 
precoce que é despertado a partir dos sentimentos depressivos expressos pelo medo 
da criança de perder os objetos amados, por causa de seu ódio e da agressividade 
dirigidos a eles. 
Mas como isso aconteceria? Para Klein (1935/1996), a culpa e os sentimentos 
depressivos impulsionariam a libido a buscar outras formas de satisfação além da 
proporcionada pelo seio. O ímpeto de procurar novos objetos se deve à tentativa de 
alcançar uma satisfação sem limites, tal ímpeto afasta o bebê do seio da mãe e volta 
seus desejos para o pênis do pai. Dessa forma, o seio e o pênis se configuram como os 
primeiros objetos que o bebê toma para satisfazer seus desejos orais.
Contudo, assim como o bebê descobriu, por meio da frustração, a existência de um 
seio mau, também descobrirá um pênis mau, tendo, dessa forma, suas esperanças de 
encontrar gratificação com o novo objeto, o pênis do pai, frustradas. Neste momento, 
o bebê se volta novamente para o seio. Assim, para Klein (1935/1996), os impulsos de 
ódio e a ansiedade gerada por eles inauguram o conflito edipiano e a formação de um 
superego “primitivo”. 
A teoria e a técnica do brincar na teoria 
kleiniana
Para além da discussão sobre as experiências advindas dos primeiros meses de vida do 
bebê, no que serefere à prática clínica com crianças, Melanie Klein fundou a técnica 
da análise pela atividade lúdica com crianças, afirmando que, pelas brincadeiras, 
a criança traduz de modo simbólico suas fantasias, seus desejos e suas experiências 
vividas.
30
UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Para Klein, quando a criança brinca, expressa o conteúdo de seus desejos, fantasias e 
experiências de modo simbólico, afinal, 
Brincar é o meio de expressão mais importante da criança. Ao 
utilizarmos essa técnica lúdica, logo descobrimos que a criança faz 
tantas associações aos elementos isolados de seu brinquedo quanto 
o adulto aos elementos isolados de seus sonhos. Cada um desses 
elementos lúdicos é uma indicação para o observador experimentado, 
já que, enquanto brinca, a criança também fala e diz toda a sorte de 
coisas que tem o valor de associações genuínas. (KLEIN, 1969, p. 31)
Assim, para Melaine Klein, brincar é, para a criança, um meio de expressão, de libertar-
se de sentimentos e problemas. Enquanto na terapia com o adulto, o analista acessa 
dificuldades e traumas por meio da fala, com a criança, encontra esses elementos por 
meio da brincadeira, afinal, a criança, em geral, não possui um domínio da linguagem 
capaz de transmitir as infinitas sutilezas que podem ser encontradas na brincadeira. 
Assim, no que se refere ao atendimento clínico, M. Klein (1952/1991) notou que as 
brincadeiras das crianças, os seus jogos, as suas histórias e os desenhos que inventam, 
tudo poderia ser visto e escutado como se fosse o falar do adulto. É com base nessa 
ideia que Klein afirma:
Ao interpretar não apenas as palavras das crianças, mas também suas 
atividades com seus brinquedos, apliquei este princípio básico à mente 
da criança, cujo brincar e atividades variadas – na verdade, todo o 
seu comportamento – soa meios de expressar o que o adulto expressa 
predominantemente através de palavras (KLEIN, 1991).
Melaine Klein foi, assim, a primeira psicanalista a utilizar as brincadeiras infantis como 
equivalentes à associação livre6 da análise dos adultos. Considerava que, assim como 
as associações aos elementos do sonho do adulto levavam à descoberta do conteúdo 
inconsciente, o mesmo ocorria em relação às brincadeiras infantis. Analisando o 
brincar com o modelo do sonho, chegou ao cerne da fantasia inconsciente de muitas 
crianças que atendeu, fornecendo a estas crianças a possibilidade de elaborar tais 
situações. 
O primeiro paciente de Melaine Klein foi Fritz, de 5 anos e meio de idade. 
Klein realizava o atendimento na casa dele, utilizando os brinquedos que ele 
tinha. Por meio desta experiência, Klein percebeu que poderia interpretar as 
ansiedades e fantasias de Fritz a partir do uso que ele fazia dos brinquedos. 
Tempos depois, em 1925, Klein tratou Rita, de dois anos e nove meses. Nesse 
6 A associação livre foi um método desenvolvido por Freud em substituição à hipnose, que consistia em encorajar o paciente a 
dizer o que viesse à sua mente, sendo também este convidado a relatar seus sonhos.
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PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
momento, concluiu que a análise da criança melhor transcorreria se utilizasse 
uma sala de brinquedos adequada. 
Klein passou, então, a acentuar a importância da caixa de brinquedos, que 
incluía pequenas figuras animais e humanas, pequenos veículos, recipientes, 
lápis, cola, massa de modelar, fita adesiva, cordão, tesoura etc. 
Tempos depois, a psicanalista argentina Arminda Aberastury (1982 introduziu e 
sistematizou o uso da caixa de brinquedos no setting analítico. Para Aberastury 
(1982), a caixa representa o mundo interno da criança, o mundo não verbal, 
contendo as representações inconscientes e as relações com seus objetos. 
Você quer conhecer mais a respeito da caixa lúdica? No livro “A Psicanálise 
da Criança: teoria e técnica”, Aberastury (1992) discute, no capítulo dois, a 
utilização da caixa lúdica, explicitando os brinquedos, o manejo necessário e 
os eventuais problema técnicos. No mesmo livro, no último capítulo, a autora 
apresenta casos clínicos em que essa técnica é utilizada. Uma excelente leitura 
para quem deseja conhecer essa ferramenta. 
Klein (1952/1991) trabalhou com brinquedos, pinturas, desenhos e modelagem 
para ajudar a recuperação de crianças. Sua meta era de que a criança pudesse 
alcançar, por meio do brincar, o domínio da angústia que lhe afligia e causava 
sofrimento. Klein (1952/1991) acreditava que, ao brincar, qualquer criança buscava 
superar as experiências desagradáveis. Brincar ajudaria a criança a dominar os 
medos instintivos e perigos internos, pela projeção destes no mundo exterior. Em 
outras palavras, por meio do brincar, a criança conseguiria deslocar os processos 
intrapsíquicos para o exterior.
Winnicott: A função do ambiente
Donald Winnicott, médico e psicanalista, realizou um extenso trabalho clínico com 
bebês e crianças. Em decorrência de seu trabalho como pediatra, buscou compreender 
a importância do meio emocional da criança no desenvolvimento das doenças físicas.
Winnicot, durante muito tempo, foi supervisionado e orientado por Melaine Klein, 
contudo, por sua independência diante das teorias e das práticas clínicas defendidas 
à época juntou-se ao middle group7. Ao contrário dos estudos realizados na época – 
que enfatizavam os fenômenos de estruturação interna da subjetividade – Winnicott 
destacou a dependência da estruturação da subjetividade em relação ao ambiente.
7 Diante das controvérsias existentes à época entre Anna Freud e Melanie Klein, o middle group ou grupo dos independentes, 
caracterizou-se por sua independência diante das teorias e da prática clínica defendidas por essas duas teóricas.
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UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Ao longo de sua obra, Winnicott estudou a influência do meio ambiente no 
desenvolvimento psíquico infantil. Ao referir-se ao ambiente, Winnicott destaca 
a importância dos cuidados maternos para o bebê, ressaltando que estes podem 
favorecer ou dificultar o desenrolar do processo de desenvolvimento. 
Figura 4. Donald Winnicott.
Fonte: https://amenteemaravilhosa.com.br/biografia-de-donald-woods-winnicott/. Acesso em: 22 set. 2020.
Para Winnicott, é por intermédio dos cuidados maternos e da capacidade que a mãe 
tem de se adaptar às necessidades do bebê que este passa a conhecer o mundo. Em 
decorrência dessa ideia, criou a expressão “mãe suficientemente boa” para designar 
essa função. Winnicott destacou, ainda, que, se a mãe estiver impossibilitada de 
cuidar do bebê, estiver ausente ou for demasiadamente intrusiva, a criança pode ter 
tendências à depressão, ou a condutas antissociais.
Winnicott não negligenciava os cuidados paternos para o desenvolvimento do 
bebê. No decorrer de sua obra destacou a importância dos cuidados paternos, 
afirmando que é fundamental que o pai apoie moralmente a mãe, sustentando 
sua autoridade. Assim, para o autor, deveria ocorrer um equilíbrio entre a 
função materna e a paterna.
Para descrever o desenvolvimento psíquico do bebê, Winnicott partiu de sua total 
dependência em relação ao meio ambiente até o estágio edípico. O autor acredita que 
o amadurecimento é cheio de idas e vindas, de modo que a criança constantemente 
oscila entre uma maturidade relativa e uma imaturidade típica dos primeiros estágios 
de dependência. Para descrever esse caminho, estabeleceu os seguintes estágios:
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PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
Dependência absoluta
Aproximadamente até os quatro meses de vida do bebê
Esse estágio é chamado assim pois não haveria chances de o bebê sobreviver sem os 
cuidados do ambiente (mãe). Há, portanto, uma total dependência. A amamentação é 
central na vida do bebê. Aqui, Winnicott não se refere somente ao aspecto alimentar, 
mas ao sentido da relação estabelecida entre a mãe e o bebê. Ao amamentar, a mãe 
dá início à relação do bebê com a realidade externa, ainda quede forma bastante 
rudimentar.
Inicialmente o bebê não compreende a mãe como sendo um objeto externo. Também o 
ambiente não é entendido como um ambiente externo para o bebê; a mãe – ou pessoa 
que ocupe a função materna – e o ambiente não são distinguidos pelo bebê como 
externos ou separados.
Nesse momento, o bebê vive o que Winnicott denomina “Ilusão de onipotência”, que 
seria a característica do bebê de não conceber as como coisas separadas do seu mundo 
subjetivo. Assim, o bebê manifesta uma “criatividade primária”, ou seja, o bebê cria 
aquilo que vem de fora, como se ele o tivesse inventado. 
Para que esse estágio decorra com sucesso, é necessário que o ambiente seja confiável. 
Para tal, é preciso que a mãe seja “suficientemente boa”: capaz de se adaptar 
suficientemente às necessidades do bebê, de maneira que esse sinta confiança no 
ambiente e que este se apresente de maneira previsível, permitindo, assim, um 
ambiente facilitador que oportunize uma continuidade do ser por parte do bebê.
Assim, gradativamente, por meio deste ambiente previsível e confiável, o bebê é capaz, 
segundo Winnicott, de realizar algumas tarefas essenciais para o seu desenvolvimento:
 » Integração no tempo e no espaço;
 » Personalização (o alojamento da psique no corpo);
 » Início das relações objetais (início do contato com a realidade).
Essas três tarefas são interdependentes, ou seja, uma não se realiza sem as outras. 
Assim, à medida que o bebê é introduzido no tempo e no espaço, começa gradualmente 
a perceber os períodos de mamada, de sono, a rotina do ambiente ao seu redor etc., 
começa a habitar no mundo real, o que resulta no gradual alojamento da psique no 
corpo. 
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UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
À medida que o bebê “habita seu corpo” pode, também, explorar o espaço, perceber 
distâncias e proximidades, o caráter fixo ou transitório das coisas. Assim, caso o 
ambiente seja propício, o bebê amadurece especialmente em função do que Winnicott 
chamou de “tendência natural ao amadurecimento”, que seria esse percurso que o 
bebê passo a passo faz para a integração de um si-mesmo unitário.
Para que o bebê realize as três tarefas destacadas, a mãe/ambiente é essencial. 
Assim, existem três funções maternas que devem ser exercidas simultaneamente, 
proporcionando que o bebê cumpra essas tarefas:
 » Apresentação do Objeto
É a apresentação do seio ou da mamadeira. O bebê tem fome e “espera” 
algo. Esse algo surge, naturalmente, de modo que o bebê aceita o objeto 
oferecido. Nesse momento, o bebê tem a ilusão de ter “criado” esse 
objeto para a sua satisfação. Essa “ilusão” provê ao bebê uma experiência 
de onipotência; é como se o objeto adquirisse existência real quando 
desejado e esperado. À medida que a mãe está sempre à disposição, esta 
ilusão vai sendo reforçada e, ao mesmo tempo, protegendo o bebê de 
angústia que seriam insuportáveis. 
 » O Holding (segurar)
A integração no tempo e no espaço é uma das tarefas mais básicas que o 
bebê faz. Para isso, Winnicott destaca um cuidado específico: o Holding. 
Esse segurar refere-se a manusear o corpo do bebê, os cuidados em 
realizar essa atividade, sempre mantendo a preocupação com o bem-
estar do bebê. É preciso que a mãe/ambiente provenha um ambiente 
tranquilo e regular, uma atmosfera repleta de calma que espera pelo 
bebê e seus movimentos. Note, não se trata de estimular o corpo do 
bebê para que este se movimente de algum modo específico, mas de 
“sustentar a situação no tempo”, não exigindo que o bebê faça nada, 
apenas deixando que ele exista, aguardando respeitosamente para que 
os movimentos do bebê venham.
 » O Handling (manuseio)
O alojamento da psique no corpo também requer um cuidado 
específico. Winnicott destaca esse cuidado como Handling, trata-se 
de um manusear físico que provê ao bebê suas primeiras experiências 
sensoriais: de temperatura, de textura, de ritmo etc. Nesse manusear, 
gradualmente, o bebê sente seu corpo, sente que “não está solto no 
espaço”.
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PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
A experiência do Handling permite que o bebê gradativamente vá “habitando seu 
próprio corpo”, que, passo a passo, sinta-se real, vivo, existindo. Assim vai se criando 
uma conexão entre psique e soma, entre mente e corpo, que gradativamente dá ao 
bebê o sentimento de integração. 
Dentro da etapa de dependência absoluta é importante destacar, ainda, um possível 
efeito das falhas de maternagem sobre o bebê. Winnicott (1994) destaca que as falhas 
de maternagem neste primitivo momento do amadurecimento prejudicam o indivíduo 
na constituição de um si mesmo. 
Assim, ante as falhas da mãe/ambiente, surge um falso self, que se constitui como 
uma tentativa de substituir a falha da função materna. Em outras palavras, diante de 
uma mãe incapaz de reconhecer, acolher e respeitar a singularidade de seu bebê, este, 
tentando suprir as insuficiências maternas, cria um “falso self” que busca proteger o 
verdadeiro self.
Você já assistiu ao filme: Precisamos falar sobre Kevin? 
O filme, de 2011, dirigido pela cineasta Lynne Ramsay, mostra a relação de Eva 
e seu primeiro filho Kevin. Ao engravidar, Eva teme que sua vida social, sexual, 
profissional sejam afetadas. Não se sente confortável com seu corpo e com a 
gravidez. 
Após Kevin nascer, o filme mostra como não é criado um vínculo entre a mãe e 
filho, ou seja, Eva não participa ativamente do desenvolvimento de Kevin, não 
lhe provê o amor e os cuidados iniciais necessários ao desenvolvimento. Sendo 
assim, Kevin se sente sozinho no mundo e só acha conforto nos braços do pai. 
Eva se sente frustrada como mãe, por não conseguir acalmar seu filho durante 
suas incessáveis crises de choro. 
À medida que Kevin vai crescendo, Eva tenta melhorar sua função de 
mãe, contudo, observa-se, no decorrer do filme, que a relação dos dois é 
constantemente permeada por sentimentos de ódio e vingança um pelo outro. 
O resultado disso? O filme é surpreendente, vale a pena assistir e refletir 
a importância do papel facilitador do ambiente, ou, ainda, da “mãe 
suficientemente boa” na constituição da criança.
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UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Dependência e Independência relativas - rumo à 
independência 
Aproximadamente dos 4 meses aos 2 anos de vida do 
bebê
Gradativamente, à medida que o bebê se desenvolve a mãe vai se “desligando” um 
pouco do estado intenso de identificação, vai retomando sua vida, fazendo surgir, 
dando origem ao que Winnicott chamou de “falhas de adaptação moderadas”. Em 
outras palavras, o que caracteriza esse estágio é o início de uma desadaptação gradual 
da mãe em relação às necessidades do bebê.
Essa desadaptação gradativa da mãe é essencial para que o bebê dê seguimento ao 
seu processo de amadurecimento, diferenciando-se da mãe, rompendo com a unidade 
indiferenciada “mãe-bebê”. Esse processo levará o bebê a integrar-se como um eu 
unitário separado, capaz de estabelecer relações com o mundo externo.
O bebê sente esse momento como se “existissem duas mães”: Uma é a mãe dos 
momentos calmos, a outra, a dos momentos de excitação em que a agressividade está 
presente (em especial nas refeições). Diante dessas situações, o bebê se preocupa, pois 
já é capaz de identificar a existência de uma mãe e reconhecer-se dependente dela.
Contudo, com o tempo, o bebê passa a integrar as duas figuras maternas, perceber que 
se trata da mesma pessoa. Para isso, é fundamental a presença da mãe suficientemente 
boa. Nessa fase, depois de ter passado por uma fase de ilusão de onipotência, em que 
cria os objetos de suas necessidades, a criança vai descobrindo que ela e sua mãe são 
separadas e que ela depende da mãe para suas necessidades. Tem início o que Winicott 
denominou de “desilusão”.
Na fase de desilusão a criança desenvolve atividades como levar os dedos ou algum 
objeto à boca, como a ponta de um lençol, chupeta, um ursinho etc. Essas atividades 
aparecem em momentos emque surge a angústia de separação da mãe. Winnicott 
chama essas atividades de fenômenos transicionais, e quando elas envolvem objetos 
estes são chamados de objetos transicionais; lençol, chupeta etc. Trata-se aqui do 
objeto encontrado pela criança para compensar a angústia da ausência da mãe.
Ao utilizar objetos transicionais, a criança começa a perceber, mesmo que de forma 
rudimentar, a existência de uma realidade externa. Constitui-se, nesse momento, o 
espaço transicional, o espaço de jogo entre a criança e o mundo. Nas palavras de Dias 
(2017, p. 207): “Os fenômenos transicionais estão exatamente no meio do caminho – 
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PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
como uma passagem intermediária e facilitadora – dessa ‘longa jornada’ que vai da 
realidade subjetivamente concebida a realidade objetivamente percebida”.
Winnicott destaca que o que deve ser levado em conta não é o objeto transicional em 
si (a chupeta, o ursinho, o lençol etc.), mas a função que esses objetos ocupam na 
vida psíquica do bebê. Para o autor, o objeto transicional permite à criança suportar 
a separação, restabelecendo a continuidade ameaçada de ruptura, assim, ele é de 
grande valia na constituição da subjetividade, pois é a partir daí que o bebê adquire 
um sentimento de self. É a partir dos objetos e fenômenos transicionais que se dá o 
reconhecimento objetivo da realidade.
A teoria winnicottiana sobre a constituição subjetiva terá efeitos na prática clínica, 
pois, tomando como base sua teoria, Winnicott propôs uma nova abordagem, uma 
nova forma de lidar com pacientes.
Isso ocorre, por exemplo, no caso em que indivíduos que se depararam com um 
ambiente em que fracassara na adaptação às suas necessidades. Nesses= caso, o 
analista deveria, tal qual a mãe, exercer a função de holding, ou seja, ser continente 
com as necessidades do paciente, permitindo o estabelecimento de uma relação íntima 
entre dois psiquismos.
Na prática, isso significa que o analista deve prover cuidados ao paciente, permitindo 
que um ego muito infantil, que ficou regredido, encontre pontos de referência estáveis 
para que o paciente possa se integrar no tempo e no espaço.
Mas, na prática, como esse fundamento poderia ser aplicado à clínica com crianças?
Ao atender crianças, Winnicott buscava estabelecer uma comunicação com a criança, 
um encontro “espontâneo”. O autor destaca, ainda, que o analista deve ser cuidadoso 
com crianças, afinal, em determinadas situações, o sintoma representa a melhor forma 
que a criança encontra para lidar com as dificuldades que a vida lhe apresenta. Assim, 
de maneira cuidadosa, o analista pode ajudar a criança a se conectar com suas próprias 
experiências de vida, desvencilhando-se de alguns sentimentos e dificuldades.
Assim como Melaine Klein, Winnicott adotou a prática do brincar com crianças, 
contudo, para o autor, o brincar tinha uma função um pouco diferente. Klein permitiu 
que a função simbólica do brincar fosse explicitada. Para a autora, o brincar seria 
um meio de a criança expressar seus sentimentos e problemas, ou seja, um meio de 
comunicação da criança. Já para Winnicott, o brincar é a base para a construção do 
processo psíquico que estrutura o self. O autor trabalhou de modo minucioso a relação 
existente entre o brincar, a capacidade criativa do sujeito e a cultura.
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UNIDADE I │ PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO
Winnicott (1975) relata que é por meio do brincar que a criança pode ser criativa 
e, sendo criativa, pode descobrir o seu eu (self). Assim, o brincar é para o autor um 
espaço potencial, por meio do qual a criança experimenta liberdade suficiente para 
“criar-se”, ou seja, um espaço em que a potência do indivíduo se mobiliza em busca de 
uma concretização. 
Para Winnicott (1975), a criança que brinca é aquela que aprendeu a estar sozinha, que 
elaborou sua capacidade de criatividade, ou seja, é uma criança saudável. 
Vale destacar que, para melhor compreensão do brincar, em Winnicott (1975), 
você precisa, antes, compreender os estágios de desenvolvimento do bebê 
que detalhamos, em especial, as noções de fenômeno transicional e objeto 
transicional. Afinal, conforme o autor destaca, o brincar só pode ser plenamente 
entendido quando se compreende a noção de transicionalidade. 
Dito de outro modo, enquanto Freud afirmava que a experiência dos indivíduos 
passa por dois campos: um da realidade psíquica, pessoal e interna e outro 
da realidade externa compartilhada socialmente, Winnicott (1975) propôs um 
campo intermediário, o da transicionalidade. Trata-se de uma área intermediária 
da experiência humana na qual ocorre o encontro entre o mundo psíquico e o 
mundo socialmente construído. 
Assim, para Winnicott (1975), o brincar ocorre nesse espaço de fronteira, ele não 
fica dentro ou fora da subjetividade; é um espaço potencial, de descoberta do 
mundo. 
O brincar na sessão analítica winnicottiana
Winnicott afirma que o brincar é um aspecto universal da natureza. Assim, para ele, o 
brincar é, em si mesmo, psicoterápico: “É no brincar, e talvez apenas no brincar, que a 
criança ou o adulto fruem da sua liberdade de criação” (WINNICOTT, 1971, p. 79).
Brincar, na perspectiva winnicottiana, é “uma experiência, sempre uma experiência 
criativa, uma experiência na continuidade espaço-tempo, uma forma básica de viver” 
(Winnicott, 1968, p. 75). Assim, é por meio do brincar no processo terapêutico que a 
comunicação se estabelece, é por meio do “brincar juntos” que a criança estabelece 
confiabilidade com o analista e compartilha suas referências.
Assim, em uma perspectiva winnicottiana, inicialmente, o analista não deve se 
preocupar com a demanda de análise ou com o estabelecimento de um diagnóstico, 
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PSICANÁLISE DA CRIANÇA: UM PERCURSO HISTÓRICO │ UNIDADE I
nem mesmo com a interpretação. Deve buscar, primeiro, estabelecer uma comunicação 
com a criança, um encontro “espontâneo”.
Não se trata, portanto, de um encontro mecânico composto por “brincadeiras 
mecânicas” com objetivos específicos e orientados, mas de um encontro com o si-
mesmo, da comunicação entre a realidade subjetiva e a objetivamente percebida, 
encontro que, segundo Winnicott (1968), contribui para o amadurecimento. 
É por meio do brincar junto ao analista que a criança, gradualmente, toma a vida como 
algo que lhe diz respeito, já que o brincar que Winnicott (1968) propõe se dá na área 
em que a criança cria o mundo em que vive, ao mesmo tempo em que se adapta ao 
mundo objetivamente dado, sem perda significativa da sua espontaneidade. Em outras 
palavras, Winnicott (1968) reconhecia que, por meio do brincar, a criança poderia 
explorar e desenvolver sua liberdade criativa, o que significa, na prática, experimentar 
o mundo, as frustrações, as ilusões, os devaneios etc. e, assim, aos poucos, reelaborar 
questões e conflitos constituindo novos significados a estes.
Um método instituído por Winnicott (1994) foi o “Jogo do Rabisco”. O autor descreve 
a brincadeira mediante estas instruções:
Vamos jogar alguma coisa. Sei o que gostaria de jogar e vou lhe 
mostrar. Há uma mesa entre a criança e eu, com papel e dois 
lápis. Primeiro apanho um pouco de papel e rasgo as folhas ao 
meio, dando a impressão de que o que estamos fazendo não é 
freneticamente importante, e então começo a explicar. Digo: “Este 
jogo que gosto de jogar não tem regras. Pego apenas o meu lápis 
e faço assim...” e provavelmente aperto os olhos e faço um rabisco 
às cegas. Prossigo com a explicação e digo: Mostre-me se se parece 
com alguma coisa a você ou se pode transformá-lo em algo; depois 
faça o mesmo comigo e verei se posso fazer algo com o seu rabisco 
(WINNICOTT, 1994, p. 232).
Ao propor o jogo do rabisco, Winnicott acreditava que o problema que está causando 
tensões na criança se revelaria na situação terapêutica. Essa técnica se diferencia pela 
ausência de normas fixas, contrastando com os jogos estruturados por sistemas de 
regras. 
Para Winnicott

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