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modelagem Já nascemos com alguma preparação biológica para interagir com o ambiente. Mas não nascemos, por exemplo, falando a nossa língua materna. Você sabe também que não aprendemos a falar de um dia para o outro, ou que não dormimos um dia sem saber engatinhar e acordamos no outro correndo pela casa. Novos comportamentos não surgem do nada. Gil Marcos - Psicologia Análise Experimental do Comportamento o que é a modelagem ? É um procedimento de reforçamento diferencial de aproximações sucessivas de um comportamento-alvo. O resultado final desse procedimento é um novo comportamento construído a partir de combinações de topografias de respostas já presentes no repertório comportamental do organismo. O modo como essas combinações se dão é determinado pelas contingências de reforçamento e pelas extinções que sucessivamente resultam no comportamento-alvo. Ou seja, a modelagem é um dos modos pelos quais novos comportamentos passam a fazer parte do repertório comportamental dos indivíduos. na prática A maioria dos bebês já nasce emitindo diversos sons diferentes (“gu”, “dá”, “bê”, “ê”, etc.). Um bebê, pouco tempo após nascer, pode emitir todos os fonemas encontrados em todas as línguas do mundo, passando considerável período de tempo emitindo-os aleatoriamente. Suponha que, em um desses momentos, a mãe do bebê esteja presente, ao lado do berço, repetindo para seu filho: “mamãe, mamãe...”, e a criança, olhando para ela, “diz”: “gu”, “dá”, “bê”, “ê”… Os minutos vão se passando, e, em um dado momento, o bebê emite um som parecido com “mã”. Quando isso ocorre, a mãe, felicíssima, acaricia seu filho na barriga e sorri para ele. Ou seja, a mãe disponibilizou uma consequência potencialmente reforçadora para a vocalização da criança. Se essas consequências apresentadas pela mãe resultarem no aumento da probabilidade de que o bebê volte a dizer “mã” quando ela estiver próxima, podemos afirmar que o carinho e a atenção dela são estímulos reforçadores para os comportamentos daquela criança. Depois de algum tempo, provavelmente a mãe deixará de dar tanta atenção e carinho quando seu filho disser apenas “mã”. O fato de a mãe fazer isso consiste no procedimento de extinção. Vimos que, quando um comportamento é colocado em extinção, ocorre um aumento na variabilidade de sua topografia. Esse aumento na variabilidade topográfica poderá acontecer com o comportamento do bebê, de modo que ele provavelmente emitirá variações de “mã”, como “mãb”, “mád” e “mãg”, por exemplo. É provável que a criança, em algum momento, repita o “mã” logo após emitir o primeiro “mã”, formando, “mãmã” O reforçamento diferencial consiste em reforçar algumas respostas que obedecem a algum critério e em não reforçar aquelas que não atendem a tal critério. Usamos, na modelagem, basicamente, o reforçamento diferencial (reforçar algumas respostas e extinguir outras similares) e as aproximações sucessivas (exigir gradualmente respostas mais próximas do comportamento-alvo) para ensinar um novo comportamento. Três aspectos principais devem ser levados em consideração quando se usa esse procedimento: Não se deve reforçar demasiadamente respostas em cada passo intermediário Imediaticidade do reforço em relação à resposta: quanto mais temporalmente próximo da resposta o estímulo reforçador for apresentado, maior será o seu efeito sobre o comportamento. Se deve ter passos intermediários graduais, reforçando pequenos avanços a cada passo. Modelagem versus Modelação Como os nomes são parecidos, é comum o estudante confundir os dois conceitos. Isso, no entanto, é um erro, já que ambos descrevem processos diferentes. Na modelagem, como vimos, os comportamentos são gradualmente selecionados por suas consequências. Já na modelação, ou aprendizagem por observação de modelos, o comportamento de um organismo tem a sua probabilidade alterada em decorrência da observação do comportamento de outro organismo e da consequência que este produz. na prática: Um exemplo de aprendizagem por modelação é o de uma criança que passa a fazer birra com mais frequência ao ver um colega conseguir mais sorvete de seus pais com esse comportamento. É importante ressaltar, entretanto, que a observação do reforçamento do comportamento de outro organismo somente aumenta a probabilidade de emissão de uma topografia de resposta similar pelo observador. A sua aprendizagem requer a apresentação de consequências reforçadoras contingentes à emissão da resposta. Reforçadores sociais e não sociais Estímulos reforçadores são aqueles cuja apresentação aumenta a probabilidade de ocorrência futura do comportamento que os produziu. Nos estímulos reforçadores sociais, a mudança produzida pelo comportamento no ambiente é justamente seu efeito sobre o comportamento de outra pessoa. Quando o bebê do exemplo anterior dizia “mã”, sua mãe sorria e lhe acariciava a barriga. O sorriso e a carícia da mãe, nesse caso, seriam exemplos de reforçadores sociais, uma vez que se constituíram no comportamento de outra pessoa (a mãe) e fortaleceram o comportamento do bebê de dizer “mã”. É importante lembrar que nem todas as reações de outras pessoas serão consideradas reforçadoras. Só podemos concluir que o são a partir do efeito que geram sobre o comportamento que as produziu. Já sabemos qual a definição de estímulo reforçador social. E qual seria a definição de estímulo reforçador não social? Podemos definir os não sociais como aqueles cuja função fortalecedora independe dos efeitos de um comportamento sobre o comportamento de outra pessoa. Reforçadores não sociais, dessa forma, podem ser definidos como alterações no ambiente não social, isto é, no ambiente que não se refere ao comportamento alheio. a luz acender após apertar o interruptor abrir uma torneira e a água sair empurrar um móvel e ele se mover Um fator complicador da distinção apresentada anteriormente é que certas alterações no ambiente não social são mediadas por outras pessoas, isto é, também envolvem alterações no comportamento alheio. Por exemplo, se uma criança pede para um adulto pegar a lata de biscoitos em uma prateleira fora de seu alcance e o adulto atende ao seu pedido, podemos dizer que o comportamento da criança alterou o ambiente não social, já que resultou no acesso aos biscoitos. Porém, esse acesso ocorreu pelo intermédio do comportamento de outra pessoa. Nesse exemplo, o comportamento de pedir teve efeito tanto sobre o comportamento de outra pessoa (reforçamento social) como sobre a lata de biscoitos (reforçamento não social). Não há consenso na área com relação a como classificar exemplos como esse. Reforçadores sociais e não sociais A distinção entre estímulos reforçadores naturais e arbitrários talvez seja ainda mais controvertida, na literatura da área, que aquela entre estímulos reforçadores sociais e não sociais. De maneira geral, essa distinção gira em torno de, entre outros fatores, a consequência reforçadora para um determinado comportamento ter sido, de alguma maneira, planejada ou não, ou de o estímulo reforçador ter sido ou não produzido diretamente pelo comportamento em questão. Alguns autores, por exemplo, diriam que, se o comportamento do músico de tocar violão é reforçado pelo som que sai do instrumento, o som produzido seria um estímulo reforçador natural. Esses mesmos autores diriam ainda que, se esse mesmo comportamento fosse reforçado pelo pagamento do cachê, talvez pudéssemos falar que o dinheiro seria um estímulo reforçador arbitrário. Nesse sentido, estímulos reforçadores naturais seriam aqueles produzidos diretamente pelo comportamento, ao passo que estímulos reforçadores arbitrários seriam aqueles mediados, de alguma forma, pelo comportamento de outra pessoa. Todos nós sabemos que há crianças que estudam sem que nenhum brinquedo ou presente seja apresentado contingentemente a esse comportamento. Mas o que, então, mantêm o comportamento de estudar dessas crianças? Bom, dizer que elas se conscientizaram da importância dosestudos não ajuda muito. Pontos, menções, medalhas, estrelinhas e elogios de professores, pais e colegas são alguns dos estímulos reforçadores mais comuns relacionados ao comportamento de estudar. São tão comuns que, às vezes, nem percebemos que esses estímulos funcionam como reforçadores para esse comportamento. Embora se possa argumentar que pontos, menções, medalhas, estrelinhas e elogios também sejam reforçadores arbitrários para o comportamento de estudar, as pessoas, em geral, os aceitam muito mais facilmente como modo de controle desse comportamento que brinquedos ou guloseimas, por exemplo. É preciso reconhecer que boa parte dos comportamentos das pessoas, principalmente em contextos sociais, só ocorre se for arbitrariamente reforçada. Se, por exemplo, o comportamento de estudar de uma criança, em um primeiro momento, só aumenta de frequência utilizando-se brinquedos, então que sejam utilizados brinquedos, mas que seja elaborada também uma intervenção que vise estabelecer outras contingências de reforçamento para esses comportamentos. Se brinquedos, elogios, dinheiro, presentes, sorrisos, pontos, menções, “ganhar presença por estar em sala de aula”, etc., são reforçadores apropriados para manter determinados comportamentos, isso dependerá de vários fatores, incluindo fatores culturais. Como regra, para o profissional que irá realizar intervenções manipulando contingências de reforçamento, talvez seja útil fazer sempre as seguintes perguntas: “Quando minha intervenção chegar ao fim, haverá reforçadores disponíveis para os comportamentos em questão sem a minha intervenção?” e “O comportamento em questão já tem frequência mínima para que esses novos reforçadores passem a controlá-lo?”. Usar brinquedos ou prendas, em contextos como esses, pode ser interessante para que a criança comece a estudar ou estude mais. A partir do momento que ela começa a se dedicar, o comportamento pode passar a ser reforçado também por esses estímulos mais comumente utilizados em sala de aula. Se isso não acontece, o profissional que realiza a intervenção com o objetivo de fazer a criança estudar mais precisa, de alguma maneira, programar as contingências para que essa transição ocorra. No caso da pesquisa de Walker e Buckley, uma continuação interessante seria fazer a transição entre utilizar brinquedos como reforçadores para manutenção do comportamento e utilizar estímulos como pontos, menções, estrelinhas e elogios. Comportamento, respostas e classes de respostas O termo comportamento refere-se, na verdade, a uma classe de respostas, e o termo resposta pode ser definido como uma instância do comportamento. Uma instância do comportamento, por sua vez, pode ser definida como uma ocorrência isolada desse comportamento. Quando, por exemplo, o rato pressiona a barra, dizemos que ocorreu uma resposta de pressão à barra. O conjunto de todas as respostas de pressão à barra, nesse caso, é chamado de comportamento de pressão à barra e também designado de classe de respostas de pressão à barra. É por isso que dizemos, por exemplo, que o rato emitiu 10 respostas de pressão à barra, e não 10 comportamentos de pressão à barra. Quando falamos de conjuntos, ou classes, estamos nos referindo a agrupamentos de itens ou eventos segundo algum critério para realizar esse agrupamento. Um conjunto de números ímpares, por exemplo, reunirá apenas aqueles cuja divisão por dois não resulte em números inteiros. O mesmo raciocínio se aplica a classes de respostas: temos que utilizar algum critério para poder dizer que determinadas respostas constituem uma classe de respostas. Veja a seguir alguns desses critérios. Agrupamento pela relação funcional. Vimos em estudos anteriores que as respostas de um organismo podem produzir certo tipo de consequência no ambiente que aumenta a probabilidade de ocorrerem respostas semelhantes. Chamamos esse tipo de consequência de consequência reforçadora. Quando determinadas respostas produzem sistematicamente determinada consequência reforçadora, dizemos que há uma relação funcional entre elas e a consequência. Nesse caso, quando determinadas respostas possuem a mesma função, podemos agrupá-las em uma classe de respostas funcional, ou seja, o critério utilizado para agrupá-las é a sua função. Mesmo respostas topograficamente diferentes podem fazer parte da mesma classe de respostas funcional. na prática: uma criança pode gritar e obter atenção dos pais se jogar no chão e obter atenção dos pais pedir educadamente e obter atenção dos pais Agrupamento pela topografia da resposta. Podemos definir uma classe de respostas simplesmente por sua forma, isto é, por sua topografia. Por exemplo, dar tchau acenando com o braço para alguém. Dizemos que alguém está dando tchau acenando com base nos movimentos realizados pela pessoa (seu braço e sua mão). Nesse caso, cada aceno é uma resposta. O conjunto das respostas de dar tchau é uma classe de respostas que também pode ser denominada de comportamento de dar tchau. Ainda sobre o conceito de comportamento, é importante ressaltar que há uma definição, bastante comum na literatura, que pode ser problemática e, até mesmo, considerada incorreta por alguns autores, como, por exemplo, Todorov e Henriques (2013). Essa definição diz que comportamento é interação entre organismo e ambiente. O uso dessa definição é problemático porque o comportamento é parte da interação na qual estamos interessados, e não a própria interação. Uma implicação desse uso incorreto é a identificação do comportamento operante com a própria contingência da qual ele é apenas um dos termos. Por exemplo, o rato pressiona a barra da caixa de condicionamento operante e essa resposta de pressão à barra é sistematicamente seguida pela apresentação de água para o animal. Essa relação pode ser descrita pela contingência “ se pressionar a barra, então apresentação de água”. Note que a interação é descrita pela contingência (R → C) e que o comportamento é apenas uma parte dela: a resposta de pressão à barra é uma instância de uma classe de respostas, isto é, de um comportamento. Essa classe de respostas, por sua vez, pode ser denominada de comportamento de pressão à barra, ou seja, um comportamento operante definido por sua função.
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