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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC BACHARELADO EM CIÊNCIAS E HUMANIDADES WILLIAM ESTRELA DANTAS DOS SANTOS IMPACTOS DO SISTEMA BRASILEIRO DE TRIBUTAÇÃO DE RENDA DE PESSOAS FÍSICAS NA DESIGUALDADE SOCIAL São Bernardo do Campo – SP 2021 WILLIAM ESTRELA DANTAS DOS SANTOS IMPACTOS DO SISTEMA BRASILEIRO DE TRIBUTAÇÃO DE RENDA DE PESSOAS FÍSICAS NA DESIGUALDADE SOCIAL Monografia apresentada à disciplina de Monografia III, como requisito parcial para obtenção do grau do Bacharelado de Ciências Econômicas. Orientador: Ricardo Batista Politi São Bernardo do Campo - SP 2021 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Universidade Federal do ABC e a todos os professores que me proporcionaram uma educação plural e interdisciplinar, sem ela esse momento jamais seria possível. Aos meus pais, Edvalda e Adilson, que sempre me apoiaram nas principais decisões da minha vida e sempre me guiaram para o caminho correto, através de ensinamentos que guardo comigo para a vida toda. Ao meu orientador, Ricardo Politi, por ter tido paciência durante todo o desenvolvimento do projeto e por ter me dado sugestões e materiais que foram de suma importância para o desenvolvimento desta monografia. Por fim, agradeço aos amigos que fiz durante toda a minha graduação, que sempre me acompanharam nos momentos bons e ruins que a vida universitária de uma faculdade pública nos proporciona. Um agradecimento especial à André de Almeida, Flávia Luz, Heitor Baldin, Geovana Rodrigues, Felipe Martins, Leonardo Petroni e outros que não serão citados por uma infeliz falta de espaço. RESUMO Esta monografia busca analisar o efeito causado pela atual estrutura tributária de renda para pessoas físicas na desigualdade de renda do Brasil, utilizando dados tributários disponibilizados pelo IRPF da Receita Federal nos últimos anos, de dados do Banco Mundial e da OCDE a respeito de desigualdade e concentração de renda. A desigualdade é posta como pilar central na discussão sobre a regressividade do imposto e a forma com a qual ele é aplicado em outros países semelhantes, assim como seus efeitos em diversas economias. A política tributária nacional tem o dever de assegurar uma redistribuição de renda justa de forma a evitar desigualdades na distribuição de riquezas causadas pela pratica incorreta de tributos. É necessário analisar a correlação entre o sistema tributário de renda brasileiro e a desigualdade social no país à fim de realizar mudanças para mudar esse paradigma. Palavras-chave: Tributação de Renda e Desigualdade; Concentração de Renda; Tributos no Brasil, Desigualdade e Impostos. ABSTRACT This monograph seeks to analyze the effect caused by the current income tax structure for individuals on income inequality in Brazil, using tax data made available by the IRPF of the Brazilian Federal Revenue in the last 10 years, data from the World Bank and OECD regarding inequality and income concentration. Inequality is seen as a central pillar in the discussion about the regressiveness of the tax and the way in which it is applied in other similar countries, as well as its effects in several economies. National tax policy has a duty to ensure a fair redistribution of income in order to avoid inequalities in the distribution of wealth caused by the incorrect practice of taxes. It is necessary to analyze the correlation between the Brazilian income tax system and social inequality in the country in order to make changes to change this paradigm. Keywords: Income Taxation and Inequality; Income concentration; Taxes in Brazil, Inequality and Taxes. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 7 1.1 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA ........................................................ 7 1.2 OBJETIVOS ................................................................................................ 8 1.2.1 Objetivo Geral ...................................................................................... 8 1.2.2 Objetivos Específicos ......................................................................... 8 1.3 JUSTIFICATIVA .......................................................................................... 9 1.4 METODOLOGIA .......................................................................................... 9 2. REVISÃO DE LITERATURA ..................................................................... 11 2.1 CARACTERISTICAS DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO ........... 11 2.2 PROGRESSIVIDADE DE UM TRIBUTO ................................................... 13 2.3 PERFIL TRIBUTÁRIO BRASILEIRO ........................................................ 14 2.3.1 Histórico Tributário Brasileiro ......................................................... 14 2.3.2 Cenário Atual Da Tributação Brasileira ........................................... 15 2.4 DESIGUALDADE DE RENDA NO BRASIL .............................................. 19 3. ANÁLISE DO SISTEMA TRIBUTÁRIO DE RENDA NO BRASIL ............ 23 3.1 HISTÓRICO DO IMPOSTO DE RENDA PARA PESSOAS FÍSICAS ....... 23 3.1.1 Origens e Aplicações Internacionais ............................................... 23 3.1.2 Histórico no Brasil ............................................................................ 24 3.2 ANÁLISE DE DADOS DO IRPF ................................................................ 26 3.2.1 Evolução no Número de Declarantes .............................................. 26 3.2.2 Composição Dos Declarantes .......................................................... 28 3.2.3 Evolução e Composição da Renda e de Bens dos Declarantes ... 32 4. SISTEMAS TRIBUTÁRIOS E DESIGUALDADE À NÍVEL GLOBAL ....... 36 4.1 COMPARATIVO ENTRE MEMBROS DA OCDE ...................................... 36 4.2 COMPARATIVO ENTRE PAÍSES DA AMÉRICA LATINA ....................... 40 5. CONCLUSÕES ......................................................................................... 46 6. REFERÊNCIAS ......................................................................................... 48 7 1. INTRODUÇÃO 1.1 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA O debate acerca da distribuição de renda no mundo, como discussão econômica traz à tona a importância deste tema não apenas para a comunidade acadêmica mas para toda a população, diversos estudos recentes como os de Fernandes (2018) e Gobetti (2016) além de autores internacionais como Piketty e Morgan tratam acerca dessa discussão. O retrato que se tem ao estudar essas obras é de que o Brasil, assim como a média dos países latino-americanos e em desenvolvimento, apesar de gozar de determinados períodos de crescimento econômico, não conseguiram transportar essa riqueza gerada para todas as camadas da sociedade, sendo conhecidos notoriamente pela desigualdade. Os fatores para essa má distribuição são diversos, partindo desde a concentração de renda anterior ao período desenvolvimento, poucos programas governamentais de distribuição de renda, baixo investimento em educação e tecnologia e etc. Assim como as demais razões, a estrutura tributária de países em desenvolvimentos costuma ser fundamental para a manutenção dessa concentração de renda e separação entre os estratos sociais. De forma não surpreendente, os sistemas tributários de países emergentes costumam se assemelhar, com uma amplitude de impostos indiretos onde o consumo é amplamente tributado em detrimento de impostos diretos e mais progressivos como o Imposto de Renda. A relação entre o sistema tributário e distribuição de renda pode ser sintetizada conforme Fernandes no trecho abaixo: O sistema tributário influi na distribuição derenda a partir do momento em que se utiliza de diversos instrumentos de arrecadação que vão impactar de modo diferenciado sobre cada contribuinte. Ao dispor de tributos que incidem sobre diferentes fatos econômicos – como, por exemplo, a posse ou transferência de bens, a aferição de renda, o consumo ou a poupança –, o modo como o Estado organiza o seu sistema tributário irá impactar cada agente de modo particular, a depender de seu perfil econômico em cada tipo de tributação pertinente. (FERNANDES, 2016, p.11) 8 A desigualdade social no país se mantém elevada, segundo dados recentes da OCDE, o Brasil está ranqueado como segundo colocado entre os países em desenvolvimento com maior desigualdade na distribuição de renda, perdendo apenas para a África do Sul. Em 2017, segundo o IBGE (2018) a metade mais pobre da população teve uma retração de 3,5% de seus rendimentos do trabalho e 1,6% de queda se consideradas todas as rendas, enquanto isso os 10% de brasileiros mais ricos com alguma renda observaram um crescimento de quase 6% em seus rendimentos do trabalho, e de 2% se considerados todas as rendas no mesmo período. O IBGE estima que os rendimentos mensais médios do 1% mais rico representam 36,3 vezes mais que aqueles dos 50% mais pobres. 1.2 OBJETIVOS 1.2.1 Objetivo Geral O objetivo geral desta monografia consiste em analisar a relação entre a concentração de renda do Brasil e a tributação de renda, analisando os dados tributários divulgados pela Receita Federal do Brasil. Desta forma podendo analisar a composição da estrutura tributária brasileira, verificando o seu grau de regressividade e comparando-a com outros sistemas tributários da América Latina e de países da OCDE. 1.2.2 Objetivos Específicos Apresentar o histórico do sistema tributário brasileiro e analisar sua evolução até o sistema atual. Analisar a composição do sistema tributário e os dados reportados pela Receita Federal do Brasil a fim de diagnosticar a concentração de renda entre as classes mais ricas do país. Avaliar comparativamente a estrutura tributária brasileira com outros países latino-americanos e da OCDE, utilizando dados da própria OCDE e do Banco Mundial. 9 1.3 JUSTIFICATIVA A desigualdade de renda pode trazer diversos problemas no desenvolvimento de um país, desde o aumento de problemas sociais até afetar o crescimento do PIB no longo prazo. Esta monografia busca contribuir analisando dados do Banco Mundial e da Receita Federal do Brasil, verificando o nível de desigualdade do Brasil e a sua relação com a tributação de renda de renda atual. O cenário atual é palco de diversas pautas e propostas a cerca de uma provável reforma tributária, que dependendo da forma que for realizada pode alterar essa relação entre tributação de renda e desigualdade, portanto diante desse cenário considero discussão ainda mais necessária. A justificativa para escolha do tema e a realização do projeto se pauta na necessidade da análise do regime tributário brasileiro diante da centenária concentração de renda que eleva a separação entre os brasileiros de maior e menor renda. Estudos de instituições voltadas à analises de desigualdades (Banco Mundial, World Inequality Lab e OCDE) indicaram o método brasileiro de tributação como um dos fatores que podem influenciar na dificuldade de combate à desigualdade. 1.4 METODOLOGIA Utilizando como base a classificação realizada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), esta pesquisa está classificada dentro de duas áreas: Ciências Sociais Aplicadas (6.00.00.00-7 Ciências Sociais Aplicadas) e Ciências Humanas (7.00.00.00-0 Ciências Humanas). Esta monografia é composta por cinco capítulos, sendo quatro capítulos dedicados ao desenvolvimento do tema e o último sendo uma conclusão do que foi abordado. O primeiro capítulo apresenta uma introdução do tema, determinando os objetivos, as motivações e a metodologia que levaram o autor a escolher este tema e desenvolver esta monografia. O capitulo segundo se trata de um aprofundamento sobre o conceito de tributo e as características do sistema tributário no Brasil, uma revisão teórica sobre a progressividade de um tributo e de estudos sobre a desigualdade e concentração de renda no Brasil, utilizando principalmente referências de obras de Ferreira (2000) e 10 Fernandes, Campolina e Silveira (2019), autores com influência relevante e que prestaram grande contribuição para o estudo do tema. O terceiro capítulo traz um histórico sucinto do desenvolvimento do Imposto sobre a Renda no Brasil. Após contextualizar o assunto é apresentado uma análise de dados oriundos do IRPF, disponibilizados pela Receita Federal do Brasil, à fim de observar a situação atual e a evolução da desigualdade de renda, regressividade e carga de impostos no país. O capítulo quatro utiliza de parte dos argumentos realizados no terceiro capítulo e busca trazer uma reflexão acerca do sistema tributário brasileiro, comparando as estruturas tributárias nacionais com de outros países latino-americanos e membros da OCDE. Na comparação entre os latino-americanos podemos comparar nosso sistema com países de economia, culturas e colonizações semelhantes à nossa, enquanto na comparação com países da OCDE podemos olhar de forma global como o Brasil se posiciona, analisando países distintos que se desenvolveram de forma variada. O quinto capítulo compreende as principais conclusões desta monografia, com as conclusões das análises de capítulos anteriores e recomendações para a saída do problema discutido. No desenvolvimento da monografia houve algumas limitações em relação à disponibilidade de dados, em relação ao Banco Mundial, apesar de ser um dos maiores fornecedores e consolidadores de dados macroeconômicos entre países, ainda carece de informações especificas acerca de sistemas tributários, sendo necessário recorrer à dados e materiais da OCDE. Em relação aos dados da Receita Federal do Brasil, temos uma abrangência populacional grande, porém ainda restrita, já que apenas uma parte da população possui renda superior à faixa mínima e necessitam declarar a sua renda. Desta forma optei por utilizar estes dados pois apesar de possuírem as limitações supramencionadas, possuem credibilidade, são atualizados periodicamente e possuem um intervalo de dados disponível amplo (1960 a 2018 para o Banco Mundial e 2008 a 2018 para a Receita Federal do Brasil) e são suficientes para realizar este recorte da análise da concentração de renda no Brasil. 11 2. REVISÃO DE LITERATURA Este capítulo trata os aspectos fundamentais para o desenvolvimento dos capítulos a seguir, sendo como base para a análise da relação entre o a tributação de renda e desigualdade. A primeira seção deste capítulo apresenta o conceito de tributo, suas variantes e as características de suas aplicações no Brasil, segundo artigos da CTN (2001), Lima e Rezende (2019), Oliveira (2003), Fabretti (1997). Na segunda seção é abordado o conceito de progressividade de um tributo, sendo essencial para a contextualização do problema e do sistema tributário atual, utilizando principalmente artigos de Stiglitz (2000) e Avila e Bugarin (2017) Na terceira seção, é discutido brevemente o histórico tributário brasileiro assim como o seu o perfil tributário, com base em artigos de Varsano (1996), Dornelles(2008) e Nóbrega (2014). Na quarta seção deste capitulo, há uma breve análise sobre a questão da desigualdade de renda no Brasil, utilizando como base analises do indicador Gini realizadas por Ferreira (2000), Morgan (2017) e Fernandes, Campolina e Silveira (2019). 2.1 CARACTERISTICAS DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO Conforme analisado por Lima e Rezende (2019), o sistema tributário brasileiro está fundamentado nosartigos 145 a 156 da Constituição de 1988, se baseando em quatro princípios que definem as espécies tributárias, determinando a unicidade do sistema e delimitando a capacidade contributiva. O primeiro é o princípio da reserva legal (art. 150, I, CF e art. 9º, I, do CTN), onde estabelece que União, Estados, Distrito Federal e os Municípios só poderão aumentar a carga tributária ou ampliar o leque de impostos se uma lei assim o estabelecer. O segundo princípio é o da anterioridade (CF, art. 150, III) determinando que os tributos só serão cobrados após a vigência da lei, bem como no mesmo exercício financeiro da publicação da lei que os instituiu. O terceiro princípio é o da isonomia (CF, art. 150, II), em que todos devem ter tratamento igual perante a lei. O quarto princípio, da capacidade contributiva, (CF, art. 145), em que quando possível, 12 os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte. (LIMA; REZENDE, 2019) A obrigação tributária é configurada em um conjunto de obrigações, direitos e deveres, determinado pelo sujeito ativo (Estado), através de uma lei, ao sujeito passivo (contribuinte), previsto no Código Tributário Nacional. Ela pode ser dividida em obrigação principal, surgida da ocorrência do fato gerador, consistindo no pagamento de determinado tributo ou penalidade pecuniária decorrente da legislação tributária, tendo por objetivo as prestações de informações de interesse do ente arrecadador. (LIMA; REZENDE, 2019) O tributo é caracterizado pelos seguintes elementos fundamentais: fato gerador, lei, objeto, contribuinte, base de cálculo, alíquota e adicional. O Código Tributário Nacional (CTN) define tributo através de seu terceiro artigo, conforme trecho abaixo: Art. 3º (CTN) Tributo é toda prestação pecuniária, compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. O Código Tributário Nacional, descreve a definição de fato gerador nos artigos 114 e 115. Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal. O contribuinte e o responsável são definidas no artigo 121 do CTN (2001): Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz – se: I – Contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II – Responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa em lei. A base de cálculo é estabelecida pelo artigo 44 do CTN (2001). Art. 44. A base de cálculo do imposto é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis. 13 O conceito de alíquota é definido por Oliveira (2003, p.28) como o percentual definido em lei que, aplicado sobre a base de cálculo, determina o montante do tributo a ser recolhido. Da mesma forma que a base de cálculo, a alteração da alíquota também está sujeita aos princípios constitucionais da legalidade, da anterioridade e da irretroatividade. Segundo Fabretti (1997, p.128), as vezes a lei determina o pagamento de um mais um imposto, denominado de adicional, que incide sobre determinado valor a fixar. Esse imposto não está incluído no pagamento inicial da alíquota sobre a base de cálculo. 2.2 PROGRESSIVIDADE DE UM TRIBUTO Segundo Avila (2017), uma das principais responsabilidades do Estado na visão das finanças públicas é a função redistributiva. Essa função está associada a ajustes no perfil da distribuição de renda, uma vez que as alocações normais de mercado podem levar a situações de desigualdade não apoiadas pela necessidade da população de um país. Desta forma, o equilíbrio de mercado pode passar a gerar conflitos e a interferir no funcionamento da própria sociedade. Um importante instrumento à disposição do Estado para poder realizar sua função distributiva de renda é o sistema tributário. Através dele o governo pode ajustar a renda líquida dos cidadãos, taxando mais algumas rendas e menos outras, de forma a atingir uma distribuição final mais equitativa (AVILA; BUGARIN, 2017). Um sistema tributário progressivo é aquele em que os impostos aumentam proporcionalmente mais de acordo com o aumento da renda dos contribuintes. O sistema é regressivo quando o pagamento dos impostos aumenta proporcionalmente menos com a renda dos contribuintes e proporcional (ou neutro) quando os impostos aumentam de forma exatamente proporcional à renda do contribuinte (STIGLITZ, 2000:159). Avila e Bugarin definem o sistema de imposto progressivo e relacionam com o IRPF como o imposto que melhor possibilita a aplicação do princípio da progressividade, conforme trecho abaixo: Um sistema de impostos progressivo tende, naturalmente, a reduzir a desigualdade de renda entre os cidadãos. No contexto do sistema tributário de qualquer país, o tributo que melhor possibilita a aplicação do princípio da progressividade é o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Para avaliar- se a progressividade de um tributo foram criados índices de medida da progressividade estrutural ou local, como a alíquota efetiva, por exemplo, os 14 quais utilizam a própria configuração do tributo e índices de medida da progressividade efetiva ou global, os quais utilizam medidas de desigualdade de renda antes e após a incidência do tributo. (AVILA; BUGARIN, 2017) Com este pressuposto a partir da seção 3 desta monografia trataremos a análise da incidência do IRPF e sua relação com a formação da má distribuição de renda e desigualdade no Brasil. 2.3 PERFIL TRIBUTÁRIO BRASILEIRO 2.3.1 Histórico Tributário Brasileiro A estrutura tributária da República brasileira se iniciou como uma herança do modelo tributário do período Imperial, com a economia predominantemente agrícola. A fonte de receita governamental era o imposto de importação, que correspondia à aproximadamente dois terços da arrecadação. Alterações realizada na constituição de 1934 promoveram alterações no sistema tributário, foi inserido o “imposto de vendas e consignações” e estados e municípios ganharam maior autonomia e passaram a decretar alguns impostos. Em 1946 o imposto de consumo representava 40% da receita da União, este cenário se manteve até a reforma tributária de 1964. (VARSANO, 1996) Sobre a reforma tributária de 1964 a 1967 Varsano (1996, p. 11) afirma: Um novo sistema tributário foi paulatinamente implantado entre 1964 e 1966, concedendo-se prioridade para as medidas que, de um lado, contribuíssem de imediato para a reabilitação das finanças federais e, de outro, atendessem de forma mais urgente os reclamos de alívio tributário dos setores empresariais, que constituíam a base política de sustentação do regime: a administração fazendária federal foi reorganizada; o IR sofreu revisões que resultaram em vigoroso crescimento de sua arrecadação; e o imposto de consumo foi reformulado dando origem ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), com resultado semelhante. Vinte e um anos após a conclusão dos trabalhos da reforma tributária de 1964, se iniciou o processo de elaboração de uma nova constituição e por conseguinte, uma reforma tributária. O sistema tributário foi avaliado por uma subcomissão dirigida pelos constituintes Benito Gama e Fernando Bezerra Coelho, cujo anteprojeto foi aprovado em maio de 1987. Houve poucas mudanças em suas estruturas, com o IPI e o IR sendo os principais meios de arrecadaçãopara a União, assim com o ICMS para a arrecadação os Estados. A principal mudança para a reforma de 1964 foi a promoção 15 de uma descentralização dos recursos oriundos dos tributos para os estados e municípios (DORNELLES, 2008). Sobre a constituição de 1988, Varsano (1996) comenta que a descentralização não foi corretamente implementada, o que gerou uma perda de recursos muito grande na União, o que gerou um desequilíbrio entre receitas e despesas no setor público, com autonomia excessiva de Estados e Municípios e por conta isso logo após ser promulgada, já se reclamava nova reforma do Estado brasileiro. Para corrigir este desequilíbrio fiscal gerado pela descentralização desorganizada, foi criado no período pós-Constituição uma série de medidas do governo federal para compensar as suas perdas, o que piorou a qualidade da tributação e dos serviços prestados, conforme mencionado por Varsano (1996, p. 17) no trecho seguinte: Na área tributária ocorreram a criação de novos tributos e elevação das alíquotas dos já existentes, em particular daqueles não sujeitos à partilha com estados e municípios. Alguns exemplos são a criação da contribuição, prevista na Constituição, incidente sobre o lucro líquido das empresas (1989), o aumento da alíquota da Cofins de 0,5% para 2% e também das do imposto sobre operações financeiras (1990), e a criação do Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF), mais um tributo cumulativo (1993). Em suma, o sistema tributário brasileiro acabou por não se modernizar suficientemente e gerar reflexos negativos. Este movimento se deu por grande parte das medidas de ajuste adotadas não serem visadas para a melhoria do sistema e sim visando apenas o controle momentâneo do déficit público. Para Varsano (1996), faltou um plano coeso de descentralização previamente negociado, que não comprometesse a capacidade de investimento e não afetasse tão severamente ás alíquotas de impostos que foram progressivamente elevadas pelos governos seguintes, 2.3.2 Cenário Atual Da Tributação Brasileira Para Lima e Rezende, o sistema tributário brasileiro é bastante complexo, gerando interpretações diferenciadas tanto por parte do governo quanto pela sociedade, o que tem provocado inúmeros questionamentos judiciais. 16 O sistema tributário brasileiro possui cerca de noventa cobranças distintas (podendo variar de acordo com estado e município)1. A maior fatia destes tributos se realiza sobre empresas, o que aumenta o custo de se produzir localmente e acaba sendo repassado ao consumidor. Outros tributos incidem ou sobre bens e o consumo como o ICMS (Imposto sobre a circulação de mercados e serviços), outros sobre patrimônio como IPTU (Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana) e IPVA (Imposto sobre a propriedade de veículos automotores) e outros sobre renda como IR (Imposto de Renda), sendo eles IRPF (para pessoas físicas) e IRPJ/CSLL (para pessoas jurídicas). Neste cenário a chamada tributação direta sobre a renda é mais rara e proporcionalmente menos relevante para a arrecadação governamental, segundo a OCDE, a tributação sobre a renda e lucro no Brasil (excluindo tributos sobre propriedade e seguridade social) representou 21,5% da arrecadação total, enquanto os impostos sobre o consumo de bens e serviços representou uma fatia de 44,1%. Os impostos indiretos geralmente incidem sobre a maioria dos bens e serviços consumidos, sejam eles necessários para a subsistência ou supérfluos, a quantidade de tributos embutida no preço de um dado bem ou serviço é igual independente de quem está comprando o bem, o que gera um desajuste devido aos compradores destes produtos apresentarem rendimentos diferentes, ou seja, o tributo que compõe o preço do produto termina por representar uma parcela da renda diferente para cada consumidor (STIGLITZ,1999). Ao analisar estrutura tributárias, as questões principais questões se baseiam no trade-off entre eficiência e equidade, a participação de tributos diretos e indiretos no conjunto das receitas arrecadadas pelo Estado, e a discussão sobre regressividade e progressividade de sistemas tributários (VIANNA, 2000). A estrutura tributária brasileira, ancorada fortemente na tributação indireta se coloca como um elemento altamente regressivo pois não respeita o nível de renda do contribuinte, pois mesmo que ela seja baixa para itens de primeira necessidade e elevada para bens de consumo de luxo, pois é impossível de personalizar o tributo para a condição socioeconômica de cada contribuinte (VIANNA, 2000). Se considerarmos a renda, um parâmetro muito mais progressivo para tributação, pois a incidência do tributo cresceria conforme a renda e capacidade de 1 Fonte: http://www.portaltributario.com.br/tributos.htm 17 pagamento do indivíduo. Em média a proporção de despesa financeira das famílias com o consumo é inversamente proporcional ao nível da renda, ou seja, quanto mais baixa for a faixa de rendimento da família, proporcionalmente mais ela irá comprometerá seu orçamento com bens de consumo não durável (STIGLITZ,1999). Para Zockun (2007) a regressividade da tributação indireta no Brasil supera a progressividade da tributação direta, prejudicando as camadas mais baixas da sociedade que são os maiores afetados. Segundo dados da OCDE (2018), os impostos diretos no Brasil, que incluem impostos sobre a renda acrescidos de tributação de propriedade e demais tributos em folha salarial, representam cerca 53,2% da arrecadação total o que denota uma dependência considerável de impostos indiretos (que incidem sobre o consumo). No gráfico abaixo está posta um acompanhamento da evolução do % de tributos diretos e indiretos no Brasil, na média da América Latina e na média dos países membros da OCDE. Gráfico 1. Evolução de Impostos Diretos em % da Arrecadação Total Fonte: OCDE (2018), elaborado pelo autor Nota-se que em países desenvolvidos a fatia dos tributos sobre renda, lucro e ganho de capital é consideravelmente superior, membros da OCDE como EUA, Canadá e Dinamarca possuem fatias consideravelmente superiores às do Brasil em proporção à tributação direta. Embora a média da América Latina seja baixa, o que representa uma alta regressividade do sistema tributário, países latino-americanos em 51,7% 53,0% 51,7% 52,7% 52,7% 52,4% 53,1% 53,6% 55,0% 54,2% 53,2% 48,5% 49,0% 48,2% 49,3% 49,4% 49,7% 49,6% 49,1% 48,7% 48,8% 49,2% 67,3% 66,6% 66,0% 66,1% 66,4% 66,5% 66,3% 66,6% 66,9% 66,9% 66,9% 45,0% 50,0% 55,0% 60,0% 65,0% 70,0% 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 Brasil Média AL Média OCDE 18 desenvolvimento, como o Chile e o México, possuem por volta de 60% de impostos diretos sobre a arrecadação total. Segundo dados da OCDE, no período entre 2008 e 2018 a carga tributária brasileira se manteve estável ao redor dos 33% do PIB. É importante relembrar que este percentual é acima da média dos países em latino-americanos e em desenvolvimento, ficando próximos de países europeus com maior índice de desenvolvimento humano (que por sua vez tendem a oferecer serviços públicos de melhor qualidade). A tabela abaixo traz a evolução da carga tributária brasileira nos últimos 10 anos e sua respectiva comparação com as médias da América Latina e dos membros da OCDE, conforme será visto nas próximas seções. Gráfico 2. Evolução na Carga Tributária em % do PIB Fonte: OCDE 2018, elaborado pelo autor Neste recorte, é visível o percentual elevado da carga tributária brasileira em relação ao PIB. Porém faz-se necessário observar uma manutenção dos valores nos últimos anos, sem apresentar qualquer movimento intenso de crescimento. As médias da OCDE e da América Latina como um todo apesar de estar em patamares distintos, estão com movimentode ascensão, se elevando ao menos 1 p.p nos últimos dez anos. 33,3% 32,0% 32,3% 33,1% 32,3% 32,3% 31,6% 31,9% 32,0% 32,1% 33,1% 21,7% 20,9% 21,2% 21,6% 21,9% 22,0% 22,2% 22,6% 22,6% 22,7% 23,1% 32,9% 32,2% 32,3% 32,6% 33,1% 33,4% 33,6% 33,7% 34,4% 34,2% 34,3% 20,0% 22,0% 24,0% 26,0% 28,0% 30,0% 32,0% 34,0% 36,0% 38,0% 40,0% 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 Brasil Média AL Média OCDE 19 2.4 DESIGUALDADE DE RENDA NO BRASIL O debate a respeito da desigualdade de renda no Brasil vem ganhando relevância nos tempos recentes, embora a origem e o desenvolvimento deste problema não sejam obrigatoriamente recentes. A pobreza e a concentração de renda se apresentam como fatores inatos a forma na qual nossa economia se desenvolveu, através de decisões políticas, onde a concentração de renda era característica marcante e o descontrole inflacionário, que consumia proporcional mais o poder de compra das camadas mais pobres da sociedade. Sobre a evolução da desigualdade Ferreira (2000) afirma: Após crescer de forma pronunciada durante as décadas de 60 e 70, o índice de Gini permaneceu estável durante a maior parte dos anos 80 – com pequenas reduções em 1984 e 1986 – mas voltou a piorar com a hiperinflação que se seguiu ao fracasso do Plano Cruzado, atingindo o pico global (0,62) da série em 1989.3 A partir desse alto nível, a década de 1990 foi caracterizada por uma queda na desigualdade, com uma redução idiossincrática em 1992, e uma mais permanente após a estabilização da economia com o Plano Real de 1994. Não obstante, o coeficiente de Gini para 1996 foi de 0,58: um nível semelhante ao do começo da década anterior, e ainda muito elevado em termos internacionais. (FERREIRA, 2000, p.3) No decorrer do século XX, houve severas alterações estruturais e produtivas ocorridas no Brasil, o crescimento econômico e desenvolvimento urbano do país pouco contribuiu para modificar a dinâmica de desigualdade que perdura desde a sua colonização. Traçando brevemente uma linha do tempo podemos passar por períodos de forte crescimento econômico como a industrialização (mesmo que tardia) da Era Vargas, do Milagre Econômico que colocou o Brasil e novos patamares econômicos em relação aos seus pares globais, da década perdida e dos períodos de crescimentos instáveis até meados da década de 90, é possível notar que embora o PIB tenha crescido consideravelmente, esse desenvolvimento se deu de forma que o panorama de desigualdade se mantivesse intacto. (BARROS; HENRIQUES; MENDONÇA, 2000) Por mais que os índices de pobreza apresentem valores continuadamente menores, o modo com que as novas riquezas foram distribuídas manteve a separação total entre as camadas mais pobres e as mais nobres da sociedade, mantendo as oligarquias locais e perpetuando as riquezas familiares. Entretanto, desde meados da década de 1990, esta tendência começou a dar alguns sinais de reversão, embora moderada e longe de significar ruptura do modelo 20 atual. O índice de Gini do Brasil iniciou uma tendência negativa interrupta nunca antes vista e dados de pesquisas domiciliares reiteram o constante incremento da renda média do brasileiro mais pobre, o gerando uma diminuição gradual dos níveis de concentração de renda. (MORGAN, 2017) O gráfico abaixo ilustra a evolução do índice de Gini do Brasil no período entre 1981 (dado mais antigo disponibilizado pelo Banco Mundial) e 2017 (o mais recente até a data desta publicação). Gráfico 3. Evolução do Índice de Gini para o Brasil entre 1981 e 2019 Fonte: Banco Mundial (2019) É importante observar também, que embora seja perceptível à melhora no índice, o Brasil ainda figura entre os países mais desiguais do mundo, seja em comparação com países da América Latina (região com os maiores índices médios de desigualdade) ou com a média dos países da OCDE. Outros estudos, porém, mostram que o cenário embora positivo pode trazer outra perspectiva se analisado utilizando dados menos amplos. O economista irlandês Marc Morgan Milá analisou os dados fiscais do Brasil para medir a participação dos 10% mais ricos, 40% de renda intermediária e dos 50% mais pobres da sociedade através da metodologia DINA (Distributional National Accounts), que permite combinar 21 os dados de crescimento econômico e de renda mensurados por fontes oficiais. Abaixo está um gráfico demonstrando a proporção dessas classes no período entre 2001 e 2015. Gráfico 4. Evolução da participação das camadas sociais no Brasil Fonte: Morgan (2017, p. 64). Observando o gráfico acima é possível notar uma estabilidade da concentração de renda no Brasil, o percentual de renda detida pelos 10% mais ricos praticamente não oscilou e continuou mantendo níveis próximos dos 55% de toda a renda do país. Enquanto isso, os 40% intermediários detinham pouco menos de 35% e os 50% mais pobres, detinham uma participação inferior a 15% da renda, indicando que a renda apesar de parecer que foi melhor distribuída, foi só um reflexo do crescimento econômico, mantendo os mais ricos, exatamente com o mesmo percentual do início do período. Para Morgan, o governo do PT, que governou o país de 2002 até 2016, se concentrou em reduzir a desigualdade da distribuição apenas no grupo dos 50% mais pobres, assim como ele comenta no trecho abaixo: While the PT government focused much attention on the bottom of the distribution, without infringing on the privileges of high income groups, the evolution of the Middle 40% income share may seem of residual importance, particularly as the share of the Middle 40% in labour income remained stable during the same time. (MORGAN, 2017, p. 27) 22 Marc Morgan foi além e corrigiu o Índice de Gini do Brasil utilizando a metodologia DINA, o resultado está exposto no gráfico abaixo: Gráfico 5. Evolução do Gini do Brasil ajustado pela metodologia DINA Fonte: Morgan (2017, p. 64). O resultado mostra que a queda do Gini não se mantém se aplicada à metodologia DINA, embora haja uma queda pouco perceptível, ela está com inclinação bem inferior à do Gini padrão. Tal resultado traz à tona o questionamento se a desigualdade no Brasil realmente foi reduzida ou se foi apenas uma interpretação estatística devido ao crescimento econômico ter gerado ganho de renda da população no geral. O Brasil, apesar da grande evolução recente, não superou sua estrutura concentradora de renda, os programas de distribuição de renda postos em prática principalmente pelos últimos governos foram parcialmente efetivos em reduzir a desigualdade, porém ainda é necessário utilizarmos de outros meios à fim de complementar e expandir esse progresso recente. 23 3. ANÁLISE DO SISTEMA TRIBUTÁRIO DE RENDA NO BRASIL 3.1 HISTÓRICO DO IMPOSTO DE RENDA PARA PESSOAS FÍSICAS 3.1.1 Origens e Aplicações Internacionais Embora seja difícil assegurar com propriedade a origem do imposto de renda, o primeiro registro de imposto sobre a renda de pessoas físicas foi na Inglaterra em 1799 em um projeto liderado pelo Ministro William Pitt que necessitava de recursos para financiamento da guerra contra o exército napoleônico (NÓBREGA, 2014). Este novo tributo, que consistia em uma taxa era de 10% para rendas acima de 60 libras no ano, não foi bem aceito na Câmara dos Comuns e entre a população em geral, conforme apresenta Nóbrega (2014). Mesmo com a insatisfação, o tributo se manteve em vigor e perdurou até 1815, ano em que Napoleão foi derrotado e deu fim à guerra que motivava o imposto. Tabela 1. Evolução da Arrecadação do Imposto de Renda Britânico Fonte: Nóbrega, elaborado pelo autor (2014) Ano Arrecadação (em mil libras esterlinas) 1798 1.856 1799 6.046 1800 6.244 1801 5.628 1802 0 1803 5.341 1804 4.112 1805 6.430 1806 12.822 1807 11.906 1808 13.482 1809 13.6311810 14.453 1811 14.462 1812 15.488 1813 15.795 1814 14.188 1815 15.642 24 Cerca de 30 anos após a sua extinção, o governo britânico restabeleceu o imposto sobre a renda, conforme dito por Nóbrega no seguinte trecho: O Parlamento inglês concordou com o retorno do imposto, acreditando que seria suprimido, quando o caixa do tesouro permitisse. Há registro de discursos de políticos e ministros que se comprometiam a extinguir o imposto, quando fosse possível. Em 1852, o imposto foi suspenso. Retornou no ano seguinte. Mais uma vez um conflito internacional motivou a cobrança do imposto de renda e o aumento das alíquotas. Dessa vez, foi a Guerra da Crimeia. Instituído como um simples imposto de guerra e para cobrir dificuldades financeiras, o imposto de renda passou a ser permanente e se transformou na principal fonte de recursos em muitos países. (NÓBREGA, 2014, p.20-21) Nas décadas seguintes, apesar de situações diferentes, este mesmo modelo de imposto foi replicado em outros países como Itália, França, Alemanha e Estados Unidos, onde ganharam relevância e se tornaram grandes fontes de recursos. 3.1.2 Histórico no Brasil Segundo Nóbrega (2014), a primeira tentativa de implementação de um tributo sobre a renda no Brasil surgiu no início do reinado de D. Pedro II, com a edição da Lei nº 317, de 21 de outubro de 1843, que estabeleceu um imposto progressivo, variando de 2% a 10% sobre os vencimentos recebidos pelos cofres públicos, durou apenas dois anos por dificuldades práticas de controle e por ser incompatível com a sociedade escravista e elitista da época que acabava por produzir um limitado número de possível contribuintes. As discussões voltaram à tona no Brasil de forma similar com a qual surgiram na Inglaterra, em 1864 o Brasil necessitou de recursos para desenvolver a Guerra do Paraguai, diante desta situação o governo imperial promoveu uma modernização do sistema tributário. Foi criado o art. 10 da Lei nº 1.507, de 26 de setembro de 1867, que cobrava um percentual sobre os rendimentos provenientes dos cofres públicos e da receita gerada pelo aluguel de imóveis. Foi extinto e logo depois retornou em 1879, sempre alternando em um ciclo de extinção e retomada até ser definitivamente suprimido em 1910 (NÓBREGA, 2014). Após diversas tentativas de criação de um imposto de renda, em 31 de dezembro de 1922 foi instituído através do artigo 31 da Lei nº 4.625. As alíquotas variavam entre 1% e 8% conforme tabela abaixo: 25 Tabela 2. Alíquotas do Imposto de Renda Brasileiro de 1922 Fonte: Nóbrega, elaborado pelo autor (2014) Com o passar do tempo, este imposto ganhou representatividade nas pautas governamentais da época, recebendo uma série de reformas e aperfeiçoamentos para se tornar mais amplo e eficaz, se inicialmente o tributo correspondia a algo em torno de 3% da arrecadação total, em 1943 o imposto sobre a renda correspondeu à 8% da arrecadação total, marco inédito no Brasil. Houve outras reformas durante o governo militar, o PAEG colocava a reforma tributário, assim como a estabilização da moeda como condições fundamentais para o crescimento econômico do país. O imposto de renda teve a sua alíquota marginal máxima reduzida de 65% para 50%, em contrapartida houve na média um crescimento de impostos indiretos, gerando um aumento na carga tributária para a população com renda mais baixa e reduzindo proporcionalmente a arrecadação das classes mais altas. Em 1988, momento da criação da Constituição Social, o governo se viu novamente com a necessidade de atualizar o imposto sobre a renda das pessoas físicas, com a redemocratização e com a força do liberalismo a àquela altura grande parte das alterações vieram no sentido de facilitar a declaração, reduzindo a Faixa de renda (em contos de réis) Aliquota (em %) Entre 0 e 20.000 Isentos Entre 20.000 e 30.000 2% Entre 30.000 e 60.000 3% Entre 60.000 e 100.000 4% Entre 100.000 e 200.000 5% Entre 200.000 e 300.000 6% Entre 300.000 e 400.000 7% Entre 400.000 e 500.000 8% Acima de 500.000 9% 26 quantidade de faixas do imposto de onze para três e reduzir a alíquota máxima, se 50% para 25%. (GOBETTI; ORAIR, 2014) De lá para cá foram acrescentadas faixas e se manteve a tendência de modernizar a declaração. Atualmente, segundo a Subsecretaria de Tributação e Contencioso da Receita Federal, o imposto de renda sobre as pessoas físicas no Brasil: “[...] Incide sobre a renda e os proventos de contribuintes residentes no País ou residentes no exterior que recebam rendimentos de fontes no Brasil. Apresenta alíquotas variáveis conforme a renda dos contribuintes, de forma que os de menor renda não sejam alcançados pela tributação. ” (SUBSECRETARIA DE TRIBUTAÇÃO E CONTENCIOSO, 2018) São cinco alíquotas diferentes: 0%, 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%, em faixas de renda entre R$1.903 e R$4.664 mensais (a partir deste valor o rendimento é tributado em 27,5%). 3.2 ANÁLISE DE DADOS DO IRPF 3.2.1 Evolução no Número de Declarantes Antes de analisarmos de fato os dados do IRPF propriamente ditos, é necessário analisar o gradiente populacional para podermos dimensionar o a relevância e a composição da população declarante, de forma a avaliar a amplitude e a efetividade do IRPF. Será utilizado alguns dados do IBGE que definem a grupos populacionais disponíveis e com potencial para mão de obra, assim podemos observar além da população geral, uma segmentação de pessoas que em tese exerce ou está apta a exercer atividade remunerada e que não atingem a faixa mínima para se tornar contribuintes do IRPF. Entre os dados mencionados acima estão o PIA (População em Idade Ativa), que segundo o IBGE corresponde ao conjunto de pessoas com idade superior a 15 anos que estão aptas a exercer alguma atividade econômica remunerada. Dentro deste indicador podemos separar entre a PEA (População Economicamente Ativa) e a população não economicamente ativa. A PEA representa o potencial de mão de obra a disposição do setor produtivo, por sua vez este indicador pode ser dividido em outras duas subcategorias, a População Ocupada, que representa os indivíduos que estão atualmente empregados 27 ou exercendo atividade remunerada, sendo ela formal ou informal, e a População Desocupada, que se refere aos indivíduos que estão disponíveis para o mercado de trabalho porem sem ocupação formal ou informal. Devido à substituição da PNAD anual para a PNAD Contínua, que acarretou mudanças de cálculo em alguns indicadores, os dados se restringem até o ano de 2012. Na tabela abaixo apresenta uma relação entre os indicadores acima mencionados e a população total do Brasil no período entre 2012 e 2018. Tabela 3. Participação Percentual da População Brasileira entre PIA, PEA e contribuintes do IRPF 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 População Total 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% PIA 79,3% 79,8% 80,4% 80,7% 81,0% 81,4% 81,5% PEA 48,6% 48,7% 49,0% 49,6% 49,7% 50,3% 50,3% PEA Ocupada 45,3% 45,7% 45,8% 45,1% 43,7% 44,4% 44,5% PEA Ocupada Informal 22,3% 22,3% 22,2% 22,3% 21,8% 23,1% 23,5% PEA Ocupada Formal 23,0% 23,3% 23,5% 22,8% 21,9% 21,3% 21,1% Declarantes IRPF 13,1% 13,2% 13,7% 13,5% 13,6% 14,1% 14,5% Fonte: IBGE (PNAD Contínua), elaborado pelo autor Antes de analisarmos as variações do período é importante frisar a camada considerável da População Ocupada Informal, que cresceu a médias acima da População Ocupada Formal, mudando o mix de empregos atualmente, com um percentual maior da população brasileira com empregos informais em comparação aos formais. Essa população costumeiramente possui rendimentos inferiores aos demais, de qualquer forma devido à falta de controle do estado sobre o rendimento destas pessoas, acabam não sendo tributados com qualquer alíquota do IRPF, independente do rendimento.O cenário é demasiado ruim para a economia, pois trabalhadores informais além de não contribuírem da mesma forma que os formais, não estão inclusos em benefícios federais como o seguro desemprego contribuição do INSS através do empregador, além é claro de estarem muito mais suscetíveis à manterem um movimento pendular entre a formalidade e informalidade. Outro ponto que podemos analisar é da queda relativa da PEA Ocupada, que reduziu de 45,3% em 2012 para 44,5% em 2018, uma queda considerável que reflete o aumento contínuo nos índices de desemprego visto desde 2014, que impactou 28 negativamente a base de possíveis contribuintes do IRPF, apesar de não ser visto uma queda de contribuintes na mesma proporção. Nota-se que no ano de 2012 apenas 13,7% da população brasileira era declarante do IRPF, variando relativamente pouco dentro do período analisado, porém indicando um leve crescimento, atingindo 14,5% da população no ano de 2018. Este crescimento é contrastante com a redução da PEA e principalmente da PEA Ocupada Formal, que compõe a principal base de possíveis declarantes do IRPF. Utilizando o raciocínio de que houve uma queda na ocupação e não obrigatoriamente uma queda nas mesmas proporções no número de contribuintes, podemos creditar este aumento proporcional à não atualização das faixas de renda que determinam as alíquotas desde abril de 2015. Esta manutenção das faixas atuais por um período tão longo de tempo acabou por aumentar a abrangência da base de contribuintes, levando mais contribuintes para a faixa inicial de 7,5% e fazendo com que os indivíduos que já contribuíam, elevassem suas alíquotas de contribuição. 3.2.2 Composição Dos Declarantes A Receita Federal reúne e classifica os rendimentos declarados em três agrupamentos, abaixo foi realizado um consolidado dos valores declarados referentes ao ano de 2018, com base nos números da DIRPF. Cada grupo de rendimentos possui uma particularidade específica, embora todos incluam rendimentos do trabalho e do capital. Os rendimentos tributáveis são majoritariamente vinculados ao salário, em que o empregador retém o valor do imposto diretamente do salário do empregado, não sendo responsabilidade do mesmo o pagamento do imposto. Os rendimentos isentos costumam estar relacionados à lucros, rendimentos de aplicações financeiras e de outras isenções instituídas pelo governo federal à fim de incentivar ou não desestimular investimentos e transferências patrimoniais de determinadas áreas e pessoas. Os rendimentos sujeitos à tributação exclusiva/definitiva são variados assim como os isentos, costumam ser relacionados ao 13º salário, participações de colaboradores em lucros da empresa empregadora e rendimentos de aplicações financeiras. 29 Tabela 4. Composição dos Rendimentos Declarados do IRPF do ano de 2018 Tipo de Rendimento Valor total % do total Tributáveis 1837,9 59,3% Valor Recebido de PJ Titular 1683,4 54,3% Valor Recebido de PF Exterior 125,8 4,1% Outros 28,8 0,9% Isentos e não-tributáveis 957,3 30,9% Lucros e dividendos recebidos 327,9 10,6% Tranferências patrimoniais - doações e heranças 95,7 3,1% Rendimentos de Sócio de ME ou optante pelo Simples 104,1 3,4% Parcela isenta de aposentadoria 74,7 2,4% Pensão ou aposentadoria por doença grave ou por acidente 60,3 1,9% Rendimentos de poupanças, LCI, LCA, CRI e CRA 56,5 1,8% Outros 238,1 7,7% Sujeitos à tributação Exclusiva na Fonte 302,7 9,8% 13º Salário 100,1 3,2% Rendimento de Aplicações Financeiras 77,7 2,5% Ganho de Capital na alienação de bens 33,3 1,1% Participação nos lucros e resultados 31,2 1,0% Outros 60,5 2,0% Total 3097,9 100,0% Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor Na tabela acima podemos verificar a concentração dos rendimentos em salários, que tradicionalmente são os mais relevantes, respondendo por 59,3% do total de rendimentos enquanto isentos correspondeu à 30,9% e os de tributação exclusiva/definitiva 9,8%. Essa isenção de lucros e dividendos, assim como de heranças e investimentos incentivados acaba por representar uma “renúncia” de parte relevante dos rendimentos. Esse cenário se torna ainda mais regressivo se considerarmos que as classes em que estes rendimentos possuem mais relevância são majoritariamente as mais elevadas, assim como podemos ver na tabela 5. 30 Tabela 5. Composição dos Rendimentos Declarados por Faixa Salarial no IRPF do ano de 2018 Faixa de Salário Mín. Mensal Quantidade de Declarantes Rendimento Tributáveis Tributação Exclusiva na Fonte Rendimentos Isentos Até 1/2 4,5% 58,8% 14,3% 26,8% De 1/2 a 1 2,1% 88,9% 2,8% 8,3% De 1 a 2 5,5% 82,1% 3,7% 14,2% De 2 a 3 15,4% 87,8% 4,2% 8,1% De 3 a 5 27,4% 81,5% 6,5% 11,9% De 5 a 7 14,5% 78,0% 7,1% 14,8% De 7 a 10 10,9% 75,3% 7,5% 17,2% De 10 a 15 8,4% 71,3% 7,9% 20,9% De 15 a 20 3,9% 66,8% 8,5% 24,7% De 20 a 30 3,6% 61,9% 9,1% 28,9% De 30 a 40 1,6% 57,2% 9,6% 33,3% De 40 a 60 1,2% 47,5% 11,2% 41,3% De 60 a 80 0,4% 36,7% 12,6% 50,7% De 80 a 160 0,4% 26,4% 13,9% 59,7% De 160 a 240 0,10% 18,7% 14,8% 66,4% De 240 a 320 0,04% 16,3% 15,8% 67,9% Mais de 320 0,09% 9,4% 19,5% 71,0% Média - 59,3% 9,8% 30,9% Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor A tabela acima mostra a distribuição entre cada agrupamento de rendimentos por faixa de salário, sendo evidente a concentração de tributos isentos nas camadas mais altas da sociedade, se tornando superiores aos rendimentos tributáveis a partir da faixa de renda de 60 salários mínimos. Nos estratos ainda mais elevados a discrepância é ainda maior, enquanto na faixa de 2 a 3 salários mínimos apenas 8,1% dos rendimentos são isentos, na maior faixa disponível, dos declarantes com renda mensal superior à 320 salários mínimos a proporção é de 71,0%, uma diferença que acaba por jogar a alíquota média do IRPF das classes superiores muito abaixo da alíquota média das classes médias. 31 Gráfico 6. Composição dos Rendimentos Declarados por Faixa Salarial no IRPF do ano de 2018 Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor A regra ao analisar o gráfico acima é do aumento gradual de rendimentos isentos conforme o aumento da faixa salarial, o único erro da amostra é nos declarantes que afirmam possui rendimentos de até ½ salários mínimos, isso ocorre devido a uma quantidade significativa de declarantes não possuírem vínculo empregatício formal, tendo sua remuneração oriunda de rendimentos não tributáveis como dividendos. Gráfico 7. Composição dos Rendimentos Declarados por Faixa Salarial no IRPF de 2018 Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor 0,0% 0,4% 0,5% 0,6% 4,0% 4,6% 7,2% 9,7% 11,0% 11,3% 11,3% 9,6% 7,7% 5,7% 4,1% 3,5% 2,0% 6,9% 0,0% 2,0% 4,0% 6,0% 8,0% 10,0% 12,0% Até 1/2 De 1/2 a 1 De 1 a 2 De 2 a 3 De 3 a 5 De 5 a 7 De 7 a 10 De 10 a 15 De 15 a 20 De 20 a 30 De 30 a 40 De 40 a 60 De 60 a 80 De 80 a 160 De 160 a 240 De 240 a 320 Mais de 320 Média 0,0% 10,0% 20,0% 30,0% 40,0% 50,0% 60,0% 70,0% 80,0% 90,0% 100,0% Rendimento Tributáveis Rendimento sujeitos à Tributação Ex. na Fonte Rendimentos Isentos 32 O gráfico 7, derivado das informações obtidas na tabela 5, mostra a alíquota média efetiva de cada faixa salarial do IRPF. É possível observar um crescimento partindo dos estratos mais baixos até atingirmos um pico na alíquota média nos indivíduos com renda entre 15 e 40 salários mínimo, sendo proporcionalmente os maiores contribuintes do IRPF. Nesta outra visão também é possível observar o impacto dos rendimentos isentos das classes sociais mais elevadas, apesar de serem impactados pela alíquota máxima da mesma forma que os contribuintes com mais de 15 salários, a proporção de rendimentos isentos faz com que o a alíquota médiaseja inferior à dos contribuintes que recebem de 3 a 5 salários mínimos mensais. 3.2.3 Evolução e Composição da Renda e de Bens dos Declarantes Após analisarmos os dados mais amplos sobre os contribuintes e seus respectivos tipos de rendimentos, iremos agora analisar a relação entre eles. Esta seção se concentra na análise da composição dos declarantes do IRPF de acordo com a sua renda, como cada camada compõe o total de contribuintes através de seu tamanho e do valor de seus rendimentos. Na tabela abaixo é apresentado uma evolução dentro do período de 2010 a 2018, para facilitar a visualização foi efetuado um agrupado de faixas. Por mais heterogêneo que sejam as camadas de declarantes do IRPF, principalmente as inferiores, foi realizado um agrupamento onde todos os contribuintes que possuem renda de até 5 salários pertençam a mesma categoria. As demais categorias são, de 5 a 10 salários mínimos, de 10 a 20, de 20 a 40, de 40 a 80, de 80 a 160 e acima de 160. Tabela 6. Evolução do número de Declarantes por Faixa Salarial no IRPF Faixa Salarial (em salários minimos) 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 Até 5 49,9% 50,7% 49,6% 50,1% 53,0% 54,8% 54,9% De 5 a 10 27,9% 27,6% 28,3% 28,0% 26,5% 25,5% 25,4% De 10 a 20 13,4% 13,3% 13,6% 13,5% 12,7% 12,2% 12,3% De 20 a 40 5,9% 5,7% 5,8% 5,7% 5,3% 5,2% 5,2% De 40 a 80 2,1% 2,0% 2,0% 1,9% 1,7% 1,6% 1,6% De 80 a 160 0,6% 0,5% 0,5% 0,5% 0,5% 0,4% 0,5% Acima de 160 0,3% 0,3% 0,3% 0,3% 0,2% 0,2% 0,2% Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor 33 Na tabela acima podemos observar o crescimento da faixa inferior de até 5 salários mínimos que passou de um percentual inferior aos 50% para 54,8% em 2018, um ganho de 4,9 p.p. Esse crescimento se deu muito provavelmente pela não correção das faixas de inclusão no IR, portanto desde 2014 se iniciou um crescimento significativo que fez com que todas as demais faixas perdessem relevância, principalmente os estratos intermediários da análise O que pode se notar é que mesmo entre a camada mais rica da população, ainda existe uma certa desigualdade, com uma concentração considerável da camada de maior rendimento perante as outras, o que pode ser visto analisando no gráfico abaixo. Tabela 7. Evolução dos Rendimentos Declarados por Faixa Salarial no IRPF Faixa Salarial 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 Até 5 14,5% 15,3% 14,8% 14,7% 16,4% 17,3% 17,5% De 5 a 10 19,3% 19,6% 19,6% 19,6% 19,8% 19,7% 19,7% De 10 a 20 18,4% 18,7% 18,7% 18,7% 18,8% 18,7% 18,9% De 20 a 40 16,1% 16,0% 15,8% 15,8% 15,6% 15,7% 15,8% De 40 a 80 11,1% 10,7% 10,5% 10,5% 9,9% 9,8% 9,5% De 80 a 160 5,9% 5,7% 5,5% 5,6% 5,3% 5,2% 7,1% Mais de 160 14,8% 14,0% 15,0% 15,2% 14,0% 13,5% 13,6% Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor A tabela 7 mostra a evolução na participação dos rendimentos das faixas selecionadas, nessa comparação a desigualdade entre os estratos sociais já se torna mais expressivo. A primeira faixa, de até cinco salários mínimos, que compõe um percentual superior à 50% do número de declarantes, representa apenas 17,5% dos rendimentos, um valor muito baixo, inferior inclusive se comparado à outras faixas intermediárias como a de 5 a 10 SM e 10 a 20 SM, que possuem percentuais superiores de contribuição, mesmo com uma composição bem menor de declarantes. O estrato mais elevado da comparação, de rendimentos superiores a 160 salários mínimos mensais é o mais contrastante da comparação, com apenas 0,2% do total de contribuintes, possuem 13,5% de toda a renda entre os elegíveis para declarar o IRPF. A evolução destes estratos replica um movimento similar, porém em menor intensidade, ao visto na tabela 6, onde o agrupamento de até 5 salários mínimos ganha relevância perante aos demais, elevando sua participação em 2,8 p.p. 34 Outro ponto além dos rendimentos que necessitam de análise são os bens declarados como patrimônio dos declarantes. Para estes itens não é aplicado qualquer tipo de alíquota, sendo utilizado como uma “fotografia” da situação do contribuinte no momento da declaração, sendo comparada anualmente pela Receita Federal do Brasil, verificando assim qualquer incompatibilidade de renda e bens em determinado período de tempo. Na tabela abaixo está listado de forma agrupada os principais bens/direitos das contribuintes segundo dados de 2018. Tabela 8. Agrupamento de Bens ou Direitos Declarados no IRPF do ano de 2018 Bem ou Direito Valor (em R$ milhões) % do total Aplicações Financeiras 3.289 35,3% Imóvel Residencial 2.825 30,3% Ações ou Quotas de capital 1.580 17,0% Imóvel Comercial 924 9,9% Veículos 548 5,9% Outros 145 1,6% Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor Na tabela acima é possível ver a concentração do patrimônio nos declarantes do IRPF em aplicações financeiras, seguido de imóveis, sendo eles de uso majoritariamente residencial, indicando uma homogeneidade nos bens dos brasileiros. Por não haver abertura na declaração de bens por faixas de renda, não é possível realizar análises mais profundas entre cada item. Porém é disponibilizado o valor consolidado de Bens e Direitos e Doações e Heranças por faixa. Desta forma, a tabela abaixo correlaciona o valor médio de bens e direitos e de heranças em cada faixa salarial. 35 Tabela 9. Agrupamento de Bens ou Direitos Declarados no IRPF do ano de 2018 Faixa de Salário Mín. Mensal Valor Médio de Bens e Direitos % do total Valor Médio de Doações e Heranças (R$ mil) % do total Até 1/2 142,8 0,15% 0,02 0,001% De 1/2 a 1 104,7 0,11% 0,02 0,001% De 1 a 2 107,2 0,11% 0,05 0,002% De 2 a 3 89,4 0,09% 0,04 0,002% De 3 a 5 87,9 0,09% 0,1 0,005% De 5 a 7 135,0 0,14% 0,4 0,02% De 7 a 10 199,1 0,2% 0,8 0,04% De 10 a 15 311,3 0,3% 1,5 0,07% De 15 a 20 493,7 0,5% 2,7 0,12% De 20 a 30 763,0 0,8% 5,2 0,23% De 30 a 40 1.180,8 1,2% 9,0 0,41% De 40 a 60 1.844,1 1,9% 18,8 0,86% De 60 a 80 2.940,8 3,0% 37,5 1,71% De 80 a 160 5.282,2 5,4% 84,6 3,86% De 160 a 240 10.426,1 10,7% 191,1 8,72% De 240 a 320 15.190,8 15,5% 281,0 12,82% Mais de 320 58.281,2 59,5% 1.558,9 71,13% Média 307,66 - 3,11 0,14% Fonte: RFB 2019/ano calendário 2018, elaborado pelo autor Antes de analisar os valores da tabela 8, é importante relembrar que esses valores correspondem à um percentual consideravelmente baixo da população brasileira e até mesmo da População Economicamente Ativa, sendo que a maior parte não possui riqueza ou renda suficiente para entrar na estatística da Receita Federal. Nesta tabela vemos a diferença mais contrastante entre declarações, com um percentual que corresponde à 0,013% da população total e 0,025% da população economicamente ativa deter cerca de 59,5% do total de bens declarados entre todos os contribuintes. Embora o índice de Gini indique uma queda na desigualdade no Brasil em períodos recentes, não é visto nenhuma mudança significativa nos dados e na estrutura do IRPF, não contribuindo significativamente para a redução da desigualdade e distribuição de renda. 36 4. SISTEMAS TRIBUTÁRIOS E DESIGUALDADE À NÍVEL GLOBAL Durante o processo de análise da estrutura tributária de um país é importante realizar comparações com as estruturas tributárias de outros países, desta forma é possível verificar em escala maior o real cenário do país. Analisar todas as variáveis que influenciam na concentração de renda dos países é uma tarefa árdua pois a variedade de sistemas tributários, moedas e diferenças regionais impossibilitam uma comparação perfeita. Considerando o imposto de renda a comparação é ainda mais difícil pois possuem estruturas de alíquotas e deduções variáveis, conforme características sociais e econômicas de cada país. Este capitulo se concentrará em realizar comparações sobre a estrutura tributária de paísesmembros da OCDE, cujas características são variadas, podendo trazer aspectos positivos e negativos do nosso modelo em comparação ao resto do mundo e da América Latina, cujos países compartilham semelhanças históricas, culturais, sociais e econômicas. Para esta comparação serão utilizados dados majoritariamente do Banco Mundial, através da plataforma World Bank Data, da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e quando necessário, do IBGE. 4.1 COMPARATIVO ENTRE MEMBROS DA OCDE Assim como visto nos itens anteriores, embora complicado realizar uma comparação de desigualdade entre países, o Índice de Gini é o melhor indicador de análise da distribuição de renda entre países, além de ser amplamente utilizado pela comunidade acadêmica, o Banco Mundial atualiza os dados para praticamente todos os países anualmente. Países com o indicador mais elevado apresentam maiores concentrações de renda entre a população, no gráfico 7 é apresentado a evolução do Índice de Gini, nos últimos 25 anos para alguns países da OCDE e dos BRICS, escolhidos como pares globais para auxiliar na comparação. 37 Gráfico 8. Evolução do Índice de Gini entre membros da OCDE e BRICS Fonte: Banco Mundial (2018) É visível no gráfico 8 a altíssima posição do Brasil, com índice de 53,9 muito acima da média dos países membros da OCDE. Sendo considerado um dos países de maior concentração de renda e riqueza no mundo, o Brasil possuí um dos índices mais elevados no mundo, atrás somente da África do Sul e a frente de outros pares latino americanos como Chile e México. Os três países da OCDE cujos índices apresentam maior desigualdade se localizam nas Américas, sendo os dois líderes na América Latina (Chile e México), seguido dos Estados Unidos que apesar de possuir uma renda per capita muito elevada, se mantem na primeira posição de desigualdade entre países desenvolvidos. Países escandinavos, como Suécia e Dinamarca, que possuem uma elevada renda per capita e um altíssimo índice de desenvolvimento humano, costumeiramente também são conhecidos por realizarem uma boa distribuição de renda. Para atingirem esse patamar de renda do país e distribuição entre a população estes países necessitam de um sistema tributário que favoreça essa distribuição. Na tabela abaixo iremos analisar a percentual incidência na carga tributária total por tipo de tributo 38 Tabela 10. Participação % de tributos por categoria entre os membros da OCDE País Renda Folha Salarial e Seguridade Social Consumo de Bens e Serviços Propriedade Outros Alemanha 32,8% 37,7% 26,8% 2,7% 0,0% Chile 35,8% 6,9% 53,3% 4,0% 0,0% Coreia do Sul 34,2% 25,7% 26,3% 11,6% 2,2% Dinamarca 62,2% 0,7% 32,9% 4,1% 0,1% Espanha 29,3% 33,9% 29,5% 7,3% 0,0% Estados Unidos 45,2% 24,9% 17,6% 12,3% 0,0% França 25,1% 38,2% 26,6% 9,0% 1,1% Itália 31,0% 31,1% 28,7% 6,1% 3,1% Japão 31,9% 40,2% 19,5% 8,1% 0,3% México 44,0% 15,9% 36,4% 2,0% 1,7% Reino Unido 35,3% 19,5% 32,6% 12,5% 0,1% Suécia 35,9% 33,5% 28,2% 2,2% 0,2% Brasil 21,5% 27,2% 44,1% 4,6% 2,6% Média OCDE 34,3% 26,9% 32,7% 5,6% 0,5% Fonte: OCDE 2018, elaborado pelo autor Com base nos dados acima disponibilizados pela OCDE, podemos comparar os sistemas tributários de diversos países e relaciona-los com seus coeficientes de Gini. O Brasil possui a segunda maior tributação de bens e serviços entre todos os países da lista, perdendo apenas para o Chile, segundo colocado entre os maiores indicadores da OCDE. Ambos os países tributam a renda, folha salarial e propriedade abaixo da média da OCDE, o caso do Chile é o mais severo de todos, mais de 50% de todos os tributos do país são indiretos, obtidos através do consumo de bens e serviços. O Brasil, logo abaixo no ranking, possui cerca de 44,1% de toda sua carga tributária oriunda de bens e serviços, para efeito de comparação, a média de tributação de bens e serviços entre os membros da OCDE é de 32,7%, abaixo da tributação de renda que contribui para, em média, 34,3% da arrecadação de seus países membros. O sistema tributário, brasileiro, chileno e mexicano, classificados como os mais indiretos e regressivos acabam por se assemelhar, incidindo majoritariamente sobre o consumo, se tornando uma característica marcando entre países em desenvolvimento com renda per capita mais baixa. Observando o outro extremo da tabela, encontramos países mais heterogêneos. A Dinamarca é o país que mais tributa a renda, com 62,2% da carga tributária do país oriunda através de impostos de renda, ao mesmo tempo ela possui, 39 conforme mencionado acima, um dos menores índices de Gini, reforçando o conceito de que uma estrutura tributária mais igualitária, com maior proporção de impostos progressivos, é fundamental para a distribuição de renda do país. Por outro lado, os Estados Unidos, embora possuía um índice de Gini acima da média da OCDE, é o país que menos tributa bens e serviços entre os selecionados, com uma estrutura tributária concentrada em tributos de renda, folha salarial e propriedade, os EUA conseguem ser o país com melhor alocação de tributos diretos em relação à arrecadação total, com 82,4% de arrecadação direta. Países como Dinamarca, EUA e Japão, de renda per capita elevada, no geral se assemelham em sua estrutura tributária, concentrando sua arrecadação via tributação indireta, conforme pode ser observado no gráfico abaixo. Gráfico 9. Proporção de Impostos Diretos e Indiretos entre membros da OCDE Fonte: OCDE 2018, elaborado pelo autor Embora alguns países não tenham esta correlação, como por exemplo a Noruega que se posiciona um dos países com maior renda per capita e menor Índice de Gini, é clara a relação entre renda per capita elevada x arrecadação majoritariamente direta. Além da divisão da tributação também é necessário analisar o tamanho da carga tributária de cada país, na tabela abaixo está relacionado o percentual da carga tributária em relação ao PIB, da mesma forma está o percentual da tributação de renda em relação ao PIB, considerando os percentuais da tabela 11. 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Diretos Indiretos 40 Tabela 11. Participação % de tributos e IRPF em relação ao PIB entre os membros da OCDE País Carga Tributária em % do PIB IRPF em % do PIB Renda per Capita (em USD) Alemanha 38,5% 10,5% 47.603,03 Chile 21,1% 1,4% 15.923,36 Coreia do Sul 26,8% 4,9% 31.362,75 Dinamarca 44,4% 24,1% 61.350,35 Espanha 34,6% 7,7% 30.370,89 Estados Unidos 24,4% 10,0% 62.794,59 França 45,9% 9,4% 41.463,64 Itália 41,9% 10,7% 34.483,20 Japão 32,0% 6,1% 39.289,96 México 16,2% 3,4% 9.673,44 Reino Unido 32,9% 9,0% 42.943,90 Suécia 43,9% 12,9% 54.608,36 Brasil 33,1% 2,8% 8.920,76 Média OCDE 33,9% 8,1% 33.604,00 Fonte: OCDE e Banco Mundial (2018), elaborado pelo autor Analisando apenas o tamanho da carga tributária, o Brasil embora não se localize em nenhum extremo da lista, se destaca por estrar com um % de tributação muito superior aos seus pares Chile e México, se assemelhando à países em que o retorno em benefícios público à população geral é muito superior. Novamente os países que mais se destacam bem baixa tributação renda são latino-americanos, Chile com 1,4%, Brasil com 2,8% e México com 3,4% do PIB são os países que além de possuírem a menor participação da tributação de renda no PIB são os países com menor renda per capita. Analisando os dados ponderados pelo tamanho da tributação podemos notar que a Dinamarca se destaca como o país que mais tributa em relação ao PIB, sendo seguido de outros países de elevada renda per capita como Suécia e Itália, todos com tributação de renda acima de 11% do PIB. 4.2 COMPARATIVO ENTRE PAÍSES DA AMÉRICA LATINA A comparação com os membros da OCDE é válida para situar o Brasile seu sistema tributário no mundo, podendo correlacionar indicadores que nos mostram o 41 quão longe estamos dos países desenvolvidos que dispões de uma renda per capita consideravelmente superior à nossa. Para realizarmos uma análise mais justa, considerando as nossas características estruturais, é necessário realizar uma comparação com países que compartilham de um histórico de desenvolvimento similar ao nosso, para tal, utilizando dados da OCDE e do Banco Mundial, será realizada uma análise entre países da América Latina, além do Chile e México que foram mencionados acima. Assim como no item anterior, é necessário considerarmos o Índice de Gini dos países analisados, conforme tabela abaixo. Tabela 12. Índice de Gini de Países da América Latina País Índice de Gini (2018) Brasil 53,9 Colômbia 50,4 Paraguai 46,2 Equador 45,4 México 45,4 Chile 44,4 Peru 42,8 Bolívia 42,2 Argentina 41,4 Uruguai 39,7 Média AL 45,2 Fonte: Banco Mundial (2018), elaborado pelo autor Entre os países analisados o Brasil ainda mantém sua posição de destaque, com 53,9 pontos é o maior Índice de Gini da América Latina, ou seja, o país mais desigual de uma das regiões mais desiguais do mundo. Apesar do destaque negativo, é válido ressaltar que toda a região possui níveis muito acima do usual para outros países, mesmo os em desenvolvimento, o Brasil é seguido de perto por Colômbia e Paraguai, dois países vizinhos que historicamente compartilharam da liderança do índice na região. Os melhores desempenhos são de Uruguai, Argentina e Bolívia, este último por sua vez é um grande exemplo de redução do índice de Gini, no ano 2000 chegou a liderar o continente em desigualdade e com medidas de distribuição de renda 42 conseguiu reduzir seu indicar até se aproximar dos líderes, embora com indicadores ainda muito altos, conforme gráfico abaixo. Gráfico 10. Evolução do Índice de Gini entre os países Latino-americanos Fonte: Banco Mundial (2018) A redução de nível na região é visível, no gráfico acima podemos ver como todo o continente reduz seu índice a partir de meados de 2000. O Brasil encabeça a lista em praticamente todos os momentos, sempre revezando com a Colômbia, no período após 2015, devido à crise econômica atravessa pelo país, passamos a subir no índice, na contramão do resto do continente que manteve o movimento de queda, isolando o Brasil com o país mais desigual da região. Assim como o realizado na comparação entre os países da OCDE, é necessário comparar a estrutura de arrecadação de cada país, utilizando os dados da da própria OCDE foi criada a tabela abaixo. 43 Tabela 13. Participação % de tributos por categoria entre os países latino-americanos País Renda Folha Salarial e Seguridade Social Consumo de Bens e Serviços Propriedade Outros Argentina 17,8% 21,7% 50,4% 9,3% 0,8% Brasil 21,5% 27,2% 44,1% 4,6% 2,6% Bolívia 15,0% 24,0% 49,9% 0,8% 10,3% Chile 35,8% 6,9% 53,3% 4,0% 0,0% Colômbia 33,7% 11,4% 42,8% 8,0% 4,1% Equador 23,5% 24,9% 49,9% 1,6% 0,1% Paraguai 16,3% 25,4% 55,9% 1,8% 0,6% Peru 36,1% 12,2% 48,1% 2,2% 1,4% México 44,0% 15,9% 36,4% 2,0% 1,7% Uruguai 26,3% 26,1% 39,4% 7,6% 0,6% Média AL 27,8% 17,8% 50,1% 3,6% 0,7% Fonte: OCDE 2018, elaborado pelo autor É possível observar como diferentemente dos países da OCDE, em que a principal fonte de arrecadação eram os impostos sobre a renda, os países latino- americanos tendem a possuir uma estrutura mais regressiva, com impostos sobre bens e serviços correspondendo à uma fatia maior de impostos indiretos. Neste cenário o Brasil se coloca uma posição mediana, não estando entre os melhores nem os piores países da relação, outros membros como Cuba, Paraguai e Argentina tributam mais o consumo de bens e serviços. O destaque positivo na região é o México, que possui uma tributação direta, se concentrando em tributos de renda e tributando relativamente pouco o consumo. Gráfico 11. Proporção de Impostos Diretos e Indiretos entre países latino-americanos Fonte: OCDE (2018), elaborado pelo autor 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Diretos Indiretos 44 Sendo basicamente outra forma de ilustrar o que foi discutido acima, México e Uruguai se destacam positivamente na comparação, possuindo uma tributação mais progressiva e igualitária na comparação regional, com participações de 62% e 60% de tributos diretos em suas arrecadações totais, respectivamente. Na tabela abaixo é analisado a participação do Imposto de Renda em relação ao PIB e à carga tributária total, assim como na seção anterior, é posto a renda per capita de cada país à fim de verificar uma possível relação entre os indicadores. Tabela 14. Participação % de tributos e IRPF em relação ao PIB entre países latino- americanos País Carga Tributária em % do PIB IRPF em % do PIB Renda per Capita (em USD) Argentina 28,8% 2,0% 11.683,95 Brasil 33,1% 2,8% 8.920,76 Bolívia 25,4% 0,2% 3.448,59 Chile 21,1% 1,4% 15.923,36 Colômbia 19,4% 1,2% 6.667,79 Equador 20,6% 0,8% 6.344,87 Paraguai 14,0% 0,3% 5.821,81 Peru 16,4% 1,8% 6.941,24 México 16,1% 3,4% 9.673,44 Uruguai 19,2% 4,3% 17.277,97 Média AL 23,1% 2,3% 9.270,38 Fonte: OCDE 2018, elaborado pelo autor Na América Latina, diferentemente da OCDE, os tributos correspondem à percentuais muito menores do PIB. O Brasil também se localiza mal nesse cenário, sendo um dos países da região com maior carga tributária e consequentemente um dos que mais tributam o consumo de bens e serviços. A Argentina também se destaca negativamente nessa comparação, junto com o Brasil são os países que, em termos percentuais do PIB, mais oneram o consumo, se opondo de forma contrastante a exemplos positivos da região como México e Colômbia. No gráfico abaixo está listada a participação de tributos diretos e indiretos em cada país da comparação. Em geral, os países latino-americanos possuem uma participação do imposto de renda em sua carga tributária demasiadamente baixa, principalmente se comparado à países ricos. Os maiores níveis de participação em relação ao PIB são 45 de Uruguai e México, porém o bom desempenho na comparação regional ainda não é suficiente para coloca-los em patamares similares à de membros da OCDE. Em geral, o Brasil detém a maior carga tributária em relação ao PIB dentre os países latino-americanos analisados, com 33,1%, possuindo uma participação de 2,8% de imposto de renda em função do PIB. Acima da média em carga tributária, mas dentro da média dos países analisados, possuindo um potencial para tornar seu sistema tributário mais progressivo. 46 5. CONCLUSÕES O sistema tributário brasileiro ainda é muito divergente dos sistemas utilizados nos países desenvolvidos, principalmente os membros da OCDE. A carga tributária nacional é elevada em termos percentuais do PIB para um país com renda per capita de país em desenvolvimento. Adicionalmente, possuímos uma das maiores taxas de desigualdade do mundo, com elevada concentração de renda, que decorre entre outros fatores, do sistema tributário de caráter regressivo, concentrando sua arrecadação em tributos indiretos, o que tende a onerar mais os cidadãos de menor renda. Assim como o Brasil, a América Latina como um todo também deve se atentar em relação à progressividade do seu sistema tributário, principalmente em relação à proporção de seus tributos indiretos sobre os diretos. A arrecadação fiscal não deve ter como meta superávits que por consequência onerem as populações mais carentes. A questão da má distribuição de renda não corresponde à fatos recentes na história do Brasil, mas a fatores relacionados ao nosso desenvolvimento como países e nossa formação econômica. Com grandes semelhanças com nossos vizinhos, decisões políticas guiaram o país
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