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1 SOUZA, M.B. Tema 3 – Saúde Mental Introdução No terceiro capítulo abordaremos a temática sobre saúde mental e os transtornos mentais, muito importante para os operadores do Direito e da Psicologia, pois um indivíduo só poderá ser responsabilizado judicialmente, se for considerado normal. Definir o que é normal ou patológico é uma questão muito complexa e controversa, pois está carregada por uma carga valorativa. Esses conteúdos são importantes, pois descrevem comportamentos, que em situações conflituosas, recebem uma grande influência dos estados emocionais, que frequentemente escapa à normalidade. O transtorno mental gera um desvio no comportamento do indivíduo, tendo um impacto na capacidade de responder de maneira adequada e a assumir a responsabilidade de maneira consciente. Ao conhecer as informações sobre o diagnóstico de um transtorno mental de um indivíduo, relacionado ao seu funcionamento mental no passado ou nas possíveis ações futuras, os operadores do direito podem melhorar a tomada de decisão da questão legal. Diante desse aspecto, vamos estudar os transtornos mentais no mundo jurídico. 2 SOUZA, M.B. Na última parte deste capítulo serão apresentados, de maneira resumida, algumas patologias que foram selecionadas pela relevância para o Direito. Foi utilizado como referência o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) para a familiarização desse conhecimento, muito comum na prática forense. Serão abordados os Transtornos Relacionados a Trauma e a Estressores, os Transtornos Disruptivos, do Controle de Impulso e da Conduta, os Transtornos Dissociativos e, finalmente, os Transtornos de Personalidade. Saúde Mental Falar sobre normalidade em psicopatologia é muito complexo, pois envolve noções de valores, com enfoque político e filosófico (de maneira explícita ou camuflada). Esses valores não deveriam interferir quando um indivíduo é considerado psicologicamente “anormal”. A definição de normalidade e Saúde Mental é muito controversa, não havendo um conceito oficial, e está muito ligada aos valores de uma certa época histórica. O que é desejável ou indesejável em termos de comportamento humano numa dada sociedade e época, geralmente define o normal ou anormal psicologicamente. Assim, os comportamentos que são aceitos, adequados, valorizados e normais num dado momento e cultura, em outro momento podem ser considerados desviante, patológicos e 3 SOUZA, M.B. anormais. Por exemplo: muitas mulheres foram consideradas loucas por seus comportamentos sexuais no início deste século, bem como a homossexualidade era considerada uma patologia. O conceito de normalidade esteve associado com a ausência da doença mental, mas é muito mais complexa, pois causa sintomas que perturbam e alteram a personalidade, prejudicando a estrutura e causando um desvio progressivo no seu desenvolvimento. No quadro abaixo, é possível entender a evolução do conceito e do entendimento da loucura. 4 SOUZA, M.B. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a saúde mental está associada com a forma de reação diante dos DESAFIOS, EXIGÊNCIAS e MUDANÇAS da vida, e como o indivíduo consegue equilibrar as suas emoções e ideias. 5 SOUZA, M.B. A saúde mental está relacionada a capacidade de equilíbrio do bem- estar e a harmonização de capacidades, desejos, ambições emoções e ideias; se conseguimos enfrentar de maneira efetiva as adversidade e os conflitos diários ou buscar ajuda diante das dificuldades de resolver as perturbações e conflitos na evolução das diferentes etapas no ciclo de vida. Para ter Saúde Mental é importante: ● Viver e aceitar os eventos da vida; ● Ter uma boa relação consigo mesmo e com os outros; ● Lidar com as emoções (boas e desagradáveis); ● Saber dos seus limites e procurar ajuda. Nos dias atuais, não é simples manter a Saúde Mental, pois existem muitos fatores que podem interferir de maneira negativa sobre ela, sendo eles: 6 SOUZA, M.B. Ao diagnosticar a anormalidade psicológica de um sujeito, essa determinação terá implicações nas áreas criminal e ética, gerando consequências sociais, institucionais e legais. Para que um sujeito possa ser responsável por suas ações e responder legalmente por elas, é fundamental definir e diagnosticar seu estado psíquico, se ele é “normal” ou “anormal” em relação a saúde mental. Se a anormalidade não permite que a pessoa possa agir com racionalidade e respeitar as leis impostas na sociedade em que convive, passa a não ser responsável por seu comportamento, perdendo a autonomia e não sendo passível de ser acusada e punida judicialmente. TRANSTORNOS MENTAIS Como o conceito de Saúde Mental acompanhou a evolução da história, o conceito de Transtornos Mentais tendeu o mesmo caminho, mas 7 SOUZA, M.B. seguindo a evolução das ciências da Psicologia e Medicina. Segundo Dalgalarrondo (2019), oriundo do direito o termo “alienação” foi utilizado durante o século XIX; já no século XX, o termo utilizado foi substituído por “doença mental”. Nas últimas décadas o termo “transtorno mental” passou a ser utilizado, sendo válido para os dias atuais. Muitos são os transtornos mentais, por isso há uma necessidade de que eles possam ser descritos de uma maneira clara, organizados e classificados por critérios de diagnóstico. 8 SOUZA, M.B. Havia certa dificuldade de consenso para a classificação e organização dos transtornos mentais, mas na últimas décadas houve várias tentativas de sistemas diagnósticos, um desses é o de Classificação Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde (CID), outro é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), publicado pela primeira vez em 1884. De lá para cá já sofreu inúmeras revisões, sendo a última delas em 2013, com a aprovação do DSM-5, que tem por objetivo guiar de maneira prática, funcional e flexível as informações para diagnosticar e auxiliar no tratamento dos transtornos mentais. A ciência dos transtornos mentais evolui muito rapidamente, principalmente com os avanços nas áreas da neurociência, cognitiva, neuroimagem, epidemiologia e genética (DSM-5, 2014). 9 SOUZA, M.B. TRANSTORNOS MENTAIS E O MUNDO JURÍDICO No mundo jurídico os Transtornos Mentais geram consequências no comportamento humano e nas suas manifestações, o que impossibilita as pessoas a agirem dentro do esperado e aceito nas normas sociais. Diante disso, é importante que os operadores do Direito tenham o mínimo de conhecimento dos Transtornos, que estão relacionados diretamente com a atuação profissional. No fluxograma abaixo, é possível visualizar algumas áreas do Direito e alguns fenômenos que interessam à Psicologia Jurídica. 10 SOUZA, M.B. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5, 2014), é muito usado por advogados e nos tribunais como referência para estimar as consequências no mundo jurídico dos transtornos mentais. As informações sobre um diagnóstico e as noções diagnósticas de um indivíduo, poderão ajudar os detentores do poder jurídico na tomada de decisão no âmbito legal e a deliberar sobre os fatos. Portanto, o entendimento das características e classificação dos transtornos mentais, é relevante para as autoridades judiciais, já que o conhecimento pode sugerir uma linha de tomada de ação. 11 SOUZA, M.B. É importante deixar claro que, o fato de um indivíduo ter um diagnóstico, não significa, necessariamente, que ele está incapacitado de fazer o controle de seu comportamento num dado momento. Não cabe aos operadores do Direito fazer o diagnóstico, essa funçãoé exclusiva dos profissionais especialistas em Saúde. Esse profissional será qualificado para avaliar as condições fisiológicas, físicas e psíquicas do indivíduo. O Conselho Federal de Psicologia (CFP), na Resolução 08/2010, “Dispõe sobre a atuação do psicólogo como perito e assistente técnico no Poder Judiciário”. Em linhas gerais, tem o objetivo de normatizar o exercício profissional do psicólogo no mundo jurídico como perito ou assistente técnico. No quadro abaixo, será exposto as atribuições dessas atuações. 12 SOUZA, M.B. TRANSTORNOS RELACIONADOS A TRAUMA E A ESTRESSORES Os Transtornos Relacionados a Trauma e a Estressores, de acordo com o DSM-5 (2014), estão ligados a uma resposta a exposição de um evento traumático ou estressante. Geralmente causando um intenso sofrimento psíquico como: fadiga, depressão, sentimento de culpa, crise de pânico, entre outros. As consequências do indivíduo passar por um evento traumático está ligado a muitas variáveis, tais como: idade, cultura, tempo de exposição ao trauma, sexo, entre outros. Abaixo será descrito os tipos de Transtornos Relacionados a Trauma e a Estressores. 13 SOUZA, M.B. No mundo jurídico, um ato ilícito praticado por outro geralmente cria a necessidade de reparação jurídica pelos danos causados. Isso quer dizer indenizações, que podem ser de ordem material ou moral (psicológica). O Direito é uma ciência que tem entre os seus objetivos, a proteção das garantias: ● dos direitos do indivíduo; ● dos direitos humanos; ● dos Direitos de Personalidade. Na atualidade, vivemos um momento em que a liberdade de expressão e manifestação desses direitos vêm sendo ameaçadas. Segundo Trindade (2017), o Direito deve estar envolvido e atento com todos acontecimentos da vida dos sujeitos, bem como suas expressões emocionais e psicológicas, para poder realizar a justiça de forma individualizada. TRANSTORNOS DISRUPTIVOS, DO CONTROLE DE IMPULSOS E DA CONDUTA Os Transtornos Disruptivos, do Controle de Impulsos e da Conduta, segundo o DSM-5 (2014), são caracterizados por problemas relacionados ao autocontrole de emoções e comportamento, essas manifestações ocorrem em situações que violam os direitos dos outros e/ou acabam gerando conflitos com as normas sociais e/ou figuras de autoridade. 14 SOUZA, M.B. Com as características desse Transtorno, geralmente as pessoas estão em conflito na área do Direito, comportam-se de maneira criminosa e agressiva. Essas pessoas acabam gerando um risco para si e para a sociedade, não se arrependendo ou sentido culpa por suas ações. No desenho abaixo, está descrito os tipos desse transtorno: Na tabela abaixo, está explanado os tipos dos Transtornos Disruptivos, do Controle de Impulsos e da Conduta, com os principais sintomas. 15 SOUZA, M.B. TRANSTORNOS DISSOCIATIVOS Os Transtornos Dissociativos “são caracterizados por perturbação e/ou descontinuidade da integração normal da consciência, memória, identidade, emoção, percepção, representação corporal, controle motor e comportamento” (DSM-5, 2014, p. 291). Os sintomas desse transtorno podem perturbar todas as áreas do funcionamento psicológico; um indivíduo que comete um crime no estado dissociativo, pode não lembrar do que fez e nem do momento em que fez quando retoma à normalidade. 16 SOUZA, M.B. TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE De acordo com o DSM-5, Transtorno de Personalidade é definido como: “um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas de cultura do indivíduo, é difuso e inflexível, começa na adolescência ou no início da fase adulta, é estável ao longo do tempo e leva a prejuízo” (DSM-5, 2014, 646). O padrão se manifesta em duas (ou mais) das seguintes áreas: ★ Cognição ★ Afetividade ★ Funcionamento interpessoal ★ Controle dos impulsos 17 SOUZA, M.B. O Manual DSM-5 (2014), classifica em dez os Transtornos de Personalidade específicos, descrito na tabela abaixo com os sintomas mais significativos. Além desses, acrescenta outros, que são: ● Mudança de Personalidade Devido a Outra Condição Médica ● Outro Transtorno de Personalidade Especificado ● Transtorno de Personalidade Não Especificado. 18 SOUZA, M.B. REFERÊNCIAS AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. DSM-5 – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2014. BOCK, Ana Mercês Bahia. Psicologias.15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP nº 08, de 30 de junho de 2010. Dispõe sobre a atuação do psicólogo como perito e assistente técnico no Poder Judiciário. Brasília, DF: Conselho Federal de Psicologia, 2010. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp- content/uploads/2010/07/resolucao2010_008.pdf.Acesso em: 30 ago. 2020. DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2019. FIORELLI, José Osmir. MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia Jurídica. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2020. PINHEIRO, Carla. Psicologia Jurídica (col. Direito Vivo). São Paulo: Saraiva, 2019. TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do direito. 8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2010/07/resolucao2010_008.pdf https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2010/07/resolucao2010_008.pdf
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