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A Grécia Antiga by José Ribeiro Ferreira

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Fabricador 
de instrumentos de trabalho, 
de habitações, 
de culturas e sociedades, 
o homem é também 
agente transformador 
da história. 
Mas qual será o lugar 
do homem na história 
e o da história na vida 
do homem ?
à
LUGARDAHISTÓRIA
1. A NOVA HISTÓRIA, Jacques Le Goff, Le Roy Ladurie, Georges Duby e outros
2. PARA UMA HISTÓRIA ANTROPOL0GICA,W. G I., Randles, Nathan Wachtel e outros
3. A CONCEPÇÃO MARXISTA DA HISTÓRIA, Helmut Fleischer
4. SENHORIO E FEUDALIDADE NA IDADE MÉDIA, Guy Fourquin
5. EXPLICAR O FASCISMO,Renzo de Felice
6. A SOCIEDADE FEUDAL, Marc Bloch
7. O FIM DO MUNDO ANTIGO E O PRINCÍPIO DA IDADE MÉDIA, Ferdinand Lot
8. O ANO MIL,Georges Duby
9. ZAPATA E A REVOLUÇÃO MEXICANA, John Womarck Jr.
10. HISTÓRIA DO CRISTIANISMO, Ambrogio Donini
11. A IGREJA EAEXPANSÃO IBÉRICA, C. R. Boxer
12. HISTÓRIA ECONÓMICA DO OCIDENTE MEDIEVAL, Guy Fouquin
13. GUIA DE HISTÓRIA UNIVERSAL, Jacques Herman
15. INTRODUÇÃO À ARQUEOLOGIA, Carl-Axel Moberg
16. A DECADÊNCIA DO IMPÉRIO DA PIMENTA, A. R. Disney
17. O FEUDALISMO, UM HORIZONTE TEÓRICO, Alain Guerreau
18. A ÍNDIA PORTUGUESA EM MEADOS DO SÉC. XVII, C. R. Boxer
19. REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA, Jacques Le Goff
20. COMO SE ESCREVE A HISTÓRIA, Paul Veyne
21. HISTÓRIA ECONÓMICA DA EUROPA PRÉ-INDUSTRIAL, Carlo Cipolla
22. MONTAILLOU, CÁTAROS E CATÓLICOS NUM A ALDEIA FRANCES A( 1294-1324), E. Le Roy Ladurie
23. OS GREGOS ANTIGOS, M. I. Finley
24. O MARAVILHOSO E O QUOTIDIANO NO OCIDENTE MEDIEVAL, Jacques Le Goff
25. INSTITUIÇÕES GREGAS, Claude Mossé
26. A REFORMA NA IDADE MÉDIA , Brenda Bolton
27. ECONOMIA E SOCIEDADE NA GRÉCIA ANTIGA, Michel Austin e Pierre Vidal Naquet
28. O TEATRO ANTIGO, Pierre Grimai
29. A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL NA EUROPA DO SÉCULO XIX, Tom Kemp
30. O MUNDO HELENÍSTICO, Pierre Lévêque
31. ACREDITARAM OS GREGOS NOS SEUS MITOS?, Paul Veyne
32. ECONOMIA RURAL E VIDA NO CAMPO NO OCIDENTE MEDIEVAL, (Vol. I), Geoges Duby
33. OUTONO DA IDADE MÉDIA, OU PRIMAVERA DOS NOVOS TEMPOS?, Phillippe Wolff
34. A CIVILIZAÇÃO ROMANA, Pierre Grimai
35. ECONOMIA RURAL E VIDA NO CAMPO NO OCIDENTE MEDIEVAL (Vol. II), Geoges Duby
36. PENSAR A REVOLUÇÃO FRANCESA, François Furet
37. A GRÉCIA ARCAICA DE HOMERO A ÉSQUILO (Séculos VIII-VI a. c.), Claude Mossé
38. ENSAIOS DE EGO-HISTÓRIA,Pierre Nora, Maurice Agulhon, Pierre Chaunu, Georges Duby, Raoul 
Girardet, Jacques Le Goff, Michelle Perrot, René Rémond
39. ASPECTOS DA ANTIGUIDADE, Moses I. Finley
40. A CRISTANDADE NO OCIDENTE 1400-1700, John Bossy
41. AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES - 1 OS IMPÉRIOS DO BRONZE, Pierre Lévêque
42. AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES - IIA MESOPOTÂNIA/ OS HITITAS, Pierre Lévêque
43. AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES - III OS INDO-EUROPEUS E OS SEMITAS, Pierre Lévêque
44. O FRUTO PROIBIDO, Marcel Bemos, Charles de la Roncière, Jean Guyon, Philipe Lécrivain
45. AS MÁQUINAS DO TEMPO, Carlo M. Cipolla
46. HISTÓRIA DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL 1914-1918, Marc Ferro
47. A GRÉCIA ANTIGA, José Ribeiro Ferreira
48. A SOCIEDADE ROMANA, Paul Veyne
49. O TEMPO DAS REFORMAS (1250-1550) - Vol. I, Pierre Chaunu
50. O TEMPO DAS REFORMAS (1250-1550) - Vol. II, Pierre Chaunu
51. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA HISTÓRIA ECONÓMICA, Cario M. Cipolla
52. POLÍTICA NO MUNDO ANTIGO, M. 1. Finley
53. O SÉCULO DE AUGUSTO, Pierre Grimai
54. O CIDADÃO NA GRÉCIA ANTIGA, Claude Mossé
55. O IMPÉRIO ROMANO, Pierre Grimai
56. A TRAGÉDIA GREGA, Jacqueline de Romilly
57. HISTÓRIA E MEMÓRIA-Vol. I, Jacques Le Goff
58. HISTÓRIAEMEMÓRIA-Vol.Il,JacquesLeGoff
59. HOMERO, Jacqueline de Romilly
60. A IGREJA NO OCIDENTE, Mireille Baumgartner
61. AS CIDADES ROMANAS, Pierre Grimai
62. A CIVILIZAÇÃO GREGA, François Chamoux
63. A CIVILIZAÇÃO DO RENASCIMENTO, Jean Delumeau
64. A GRÉCIA ANTIGA, José Ribeiro Ferreira
A GRÉCIA 
ANTIGA
r v ^
1 / V ^
José Ribeiro Ferreira e Edições 70, 2004
Capa de José Manuel Reis
Depósito Legal n.° 216465/04
ISBN; 972-44-1219-9 
ISBN da 1“ edição: 972-44-0869-8 
Era 0 número 47 da mesma colecção
Paginação, impressão e acabamento: CASAGRAF 
para
EDIÇÕES 70, LDA. 
em Setembro de 2004
EDIÇÕES 70, Lda.
Rua Luciano Cordeiro, 123 - 2.° Esq.° - 1069-157 LISBOA / Portugal 
Telef.: 213 190 240 
Fax: 213 190 249 
E-mail: edi.70@mail.telepac.pt
www.edicoes70.pt
Esta obra está protegida pela lei. Não pode ser reproduzida 
no todo ou em parte, qualquer que seja o modo utilizado, 
incluindo fotocópia e xerocópia, sem prévia autorização do Editor. 
Qualquer transgressão à Lei dos Direitos do Autor será passível de 
procedimento judicial.
mailto:edi.70@mail.telepac.pt
http://www.edicoes70.pt
José Ribeiro Ferreira
A GRECIA 
ANTIGA
SOCIEDADE E POLÍTICA 4 : :
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.edições 70
PREFACIO
Endereçou-me o Museu Calouste Gulbenkian o convite para participar 
num ciclo de lições sobre A Grécia Antiga. Em torno da pólis: socie­
dade e moeda. De colaboração com o Dr. Mário de Castro Hipólito, 
com uma periodicidade semanal, as lições prolongaram-se de Outubro 
de 1991 a Janeiro de 1992: «A pólis grega: sistema de vida e mestra do 
homem» (24. 10. 1991); «A época arcaica: crises de crescimento» (31. 
10. 1991); «A questão da origem da moeda: dados e problemas» (7. 11. 
1991); «Amoeda na época arcaica: características gerais» (14.11.1991); 
«A democracia grega: a procura da igualdade» (21.10.1991); «A Simaquia 
de Delos e a hegemonia ateniense» (28.11.1991); «As moedas do século 
V: 0 triunfo do classicismo» (5. 12.1992); «Atenas durante a Guerra do 
Peloponeso» (12. 12. 1991); «A guerra e a paz na pólis grega» (19. 12. 
1991); «As moedas dos finais da época clássica: tradição e inovação»
(9.1.1992) ; «O período helenístico: uma época de refinamento, fusão e 
difusão cultural» (16. 1. 1992); «As moedas da época helenística» (23.
1.1992); «A influência da Grécia na Revolução Francesa: alguns aspectos»
(30.1.1992) . Por amável anuência e colaboração da Fundação Calouste 
Gulbenkian, este ciclo foi depois repetido, em parte, no Instituto de Estudos 
Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, de 9 de 
Março a 18 de Maio.
Possui o Museu dessa instituição, como é sabido, uma numerosa e rica 
colecção de moedas gregas, de cujo catálogo saíra dois anos antes o II 
volume A Catalogue o f the Calouste Gulbenkian Collection o f Greek 
Coins (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1989), distinguido com 
um prémio anual da Associação Internacional dosNumismatas Profissionais 
para o ano de 1990 - prémio que foi entregue no decurso dos trabalhos 
do XI Congresso Internacional de Numismática, reunido em Bruxelas, 
em Setembro de 1991. Pretendeu por isso o Museu realçar o facto e 
chamar ao mesmo tempo a atenção para o seu rico espólio numismático. 
Felicito-o pela iniciativa e agradeço o honroso convite para nela participar.
A Grécia Antiga. Sociedade e Política tem por base as lições que 
então proferi, com excepção da última «A influência da Grécia na Revo-
A GRÉCIA ANTIGA
lução Francesa: alguns aspectos». Cada uma delas - com alterações 
ligeiras ou substanciais - passou a formar um capítulo do presente vo­
lume. Alguns deles já se encontram de momento publicados - caso de 
«A hegemonia de Atenas» {Conimbriga 28,1989, pp. 33-51), «O fascínio 
do poder: o paradigma de Atenas durante a guerra do Peloponeso» {Biblos 
65,1989, pp. 267-292) e «A guerra e a paz na pólis grega» {Máthesis 1, 
1992, pp. 69-87) - e outros aproveitam dados ou partes de trabalhos já 
editados. «A pólis grega: um sistema de vida e mestra do homem» retoma 
dados de Hélade e Helenos. 1 - Génese e evolução de um conceito 
(Coimbra, 1983); «A' época arcaica:crises de crescimento» aproveita 
parte de Da Atenas do século VII a. C. às reformas de Sólon (Coimbra,
1988), «A democracia ateniense: a busca da igualdade» baseia-se em 
«As reformas de Clístenes» {Biblos 63,1987, pp. \19-\99),Participação 
e poder na democracia grega (Coimbra, 1990), A Democracia na 
Grécia Antiga (Minerva, Coimbra, 1990).
Nos tennos técnicos gregos optei pelo seguinte critério: os que se 
encontram já registados nos dicionários - como demo (de dêmos), no 
sentido de “circunscrição autárquica” de Atenas, heteria (de hetairia), 
“espécie de sociedade política secreta”,/»r/towe - usei-os em caracteres 
normais, sem qualquer distinção. Os restantes, transcrevi-os em itálico: 
caso de dêmos, no sentido de “povo”, Ecclesia (Assembleia), phyle 
(tribo), genos (estirpe), nomos (lei), entre outros. Daí o diferente trata­
mento que foi dado ao tenuo grego Sqpos,
Para designar a magistratura mais importante da Atenas do século V 
a. C., usei a fonna estratégia, com a acentuação grega, por o tenuo 
estratégia designar hoje uma realidade bem distinta.
A génese do livro - fruto da reunião de um conjunto de palestras - 
explica algumas das suas características, em especial a retoma em cada 
capítulo de assuntos e elementos já focados nos anteriores.
Além do agradecimento à Fundação Calouste Gulbenkian que teve 
papel de relevo na gênese deste trabalho e às Edições 70 que o acolheram 
na sua colecção “Lugar da História”, desejo expressar a minha gratidão 
aos amigos que, por diversas vias, me ajudaram na construção do livro. 
De modo especial, à Professora Doutora M. H. Rocha Pereira agradeço 
as sugestões e observações que me ajudaram a aclarar questões e factos; 
ao Dr. Mário de Castro Hipólito, a colaboração prestada, as sugestões e 
sobretudo a nota sobre a origem da moeda, que vai em apêndice ao 
capítulo II.
Coimbra, 14 de Setembro de 1992
10
PREFACIO à 2." Edição
Esta segunda edição de A Grécia Antiga. Sociedade e Política 
mantém o fundamental da primeira. Apenas houve actualização relativa­
mente aos dados de novas descobertas arqueológicas ou às doutrinas 
entretanto surgidas, em relação à pólis e à democracia ateniense. O texto 
foi aclarado em um ou outro passo e teve-se em conta vária da abundante 
bibliografia que saiu desde 1992 até 2004. Procedeu-se também à 
correcção das gralhas e lapsos detectados na edição anterior.
Coimbra, Julho de 2004
11
A POLIS GREGA
Sistema de Vida e Mestra do Homem
A Grécia antiga estava dividida num número considerável de pequenos 
Estados independentes, alguns de reduzido espaço territorial e de escasso 
volume populacional. Se Esparta e Atenas constituíam excepções - a 
primeira, caso único e especial, com cerca de 8400 km^ depois da 
conquista da Messénia, e a segunda a rondar os 2650 km^ - , todos os 
outros Estados não atingiam o milhar de quilômetros quadrados e alguns 
nem sequer a centena. Destaco Delos - constituído pelas ilhas de Delos 
e de Reneia - que rondava os vinte e dois quilômetros quadrados (‘). 
Quanto à população, apesar de serem falíveis e oscilantes as cifras e 
estatísticas para essa época, o seu número era sempre relativamente 
reduzido.
A esse Estado autônomo e autárcico davam os Helenos o nome de 
pôlis, que de modo geral aparece traduzido nas várias línguas ora por 
“cidade-estado”, ora por “cidade” apenas 0 . Nenhuma destas desig­
nações corresponde, no entanto, exactamente ao sentido do tenno grego 
e, tanto uma como outra, pode gerar, além disso, confusão. A pôlis não se 
refere apenas ao Estado e, quase sempre uma povoação de reduzidas 
dimensões, de modo algum entra no nosso conceito moderno de cidade 
como grande aglomerado urbano. Como veremos, a pôlis não se reduz à 
urbe apenas, mas implica algo mais amplo que, num todo homogêneo.
(') Alguns exemplos elucidativos quanto à reduzida extensão da maioria dos Estados 
gregos (os números dados indicam quilômetros quadrados); a Beócia, com 2 580, comportava 
dez pólels e mais tarde vinte; a Fócida, com uma superfície de 1 575, tinha 22 cidades, 
cada uma a rondar os cerca de 70; Corinto, uma grande pôlis, com cerca de 880; Sícion com 
360; Fliunte com cerca de 175; Egina com 85; Meios com 152; a Eubeia possuía oito 
cidades, o que dava uma média de 460 para cada uma; em Lesbos, uma ilha com 1750, 
havia 6 pôleis; Ceos, com 24 km de comprimento e 13 de largura, esteve dividida em três 
pôleis independentes, durante grande parte da sua história. Vide V. Ehrenberg, L ’état 
grec, Paris, Maspero, 1976), pp. 59-66.
(̂ ) City-state, em inglês; Stadt-staat, em alemão; cité, em francês; città, em italiano. O 
português oscila entre cidade-estado e cidade apenas.
13
A GRÉCIA ANTIGA
além da parte urbana, abrange também terras de cultivo e bosques ou 
zonas de pastoreio: a chamada terra cívica. Segundo Snodgrass, a pólis 
constituía uma unidade política autônoma que incorporava um aglomerado 
urbano e seu território como partes inseparáveis dessa unidade (̂ ). Em 
face do que acabo de expor, vou servir-me por sistema do termo grego. 
Os exemplos que vou dar são, intencionalmente, de épocas diferentes, já 
que as póleis (plural de pólis), apesar de uma transformação considerável 
sobretudo ao longo da época arcaica, apresentam traços comuns até que 
desaparecem nos fins do século IV a. C. com a formação dos reinos 
helenísticos.
1
A pólis era o concreto dos cidadãos, todos, e não o Estado como 
entidade jurídica abstracta - noção que, como se sabe, não estava ainda 
formada. Os Gregos não a designavam, como actualmente, pelo nome 
do país - por exemplo Esparta, Atenas, Corinto - , mas pelo concreto dos 
que nele viviam e o formavam: os Espartanos ou Lacedemónios, os 
Atenienses, os Coríntios. É o etnónimo que aparece consignado nos textos 
e nos tratados e não o topónimo. Para o Grego, os cidadãos é que 
interessavam; eram eles que constituíam o cerne da pólis e não o 
aglomerado urbano. Alceu, um poeta da segunda metade do século VII 
e primeira do VI a. C., afmna claramente que não são as muralhas e as 
casas que constituem a pólis, mas os homens (Fr. 426 Lobel-Page). Não 
menos significativo é um passo de Tucídides (7.77.7). Atenas decretara 
a conhecida expedição à Sicília (415-413 a. C.), de trágicas consequências. 
Passados cerca de dois anos de confrontos, as operações não corriam 
de feição para a cidade e seus aliados. As forças encontravam-se 
desmoralizadas e a expedição caminhava para o fracasso. É nessa 
circunstância que Nícias, chefe das forças atenienses, se dirige aos 
soldados antes da batalha decisiva, lembrando-lhes a necessidade de 
serem valentes, porque não encontram na vizinhança lugar onde possam 
escapar, se fraquejarem, e porque se lhes oferece a possibilidade, se 
vencerem, de restaurar o poderio da pólis, por enfraquecida que esteja. 
E conclui o discurso nestes termos elucidativos:
E que a pólis são os cidadãos e não as muralhas nem os barcos viúvos de
homens.
(b Archaeology and the rise o f the Greek State (Cambridge University Press, 
1977), p. 7.
14
A POLIS GREGA
O aglomerado urbano e o território apareciam apenas como o local 
em que os homens construíam uma comunidade de hábitos, normas e 
crenças. Daí admitir-se que a pólis seja transferível para outro sítio. 
Heródoto conta um episódio esclarecedor a tal respeito. Decorria a 
segunda invasão persa, comandada por Xerxes, - que, como é sabido, se 
verificou de 480 a 479 a. C. Os Estados gregos, não na sua totalidade, 
mas na maioria, perante tal ameaça haviam constituído uma aliança, 
para enfrentarem em conjunto o invasor. Discutia-se, no momento, qual 
a melhor táctica a seguir. Pretendiam os Espartanos que as forças aliadas 
se retirassem para o Peloponeso, construíssem uma muralha no Istmo 
de Corinto e, desse modo, tentassem impedir a progressão do poderoso 
exército persa. Alegavam que só assim conseguiriam evitar a derrota e a 
consequente perda da liberdade. Mas uma decisão dessas equivaleria a 
entregar a maior parte da Hélade aos Persas,incluindo a Ática. Temís- 
tocles, dirigente de Atenas na altura e comandante das suas forças, 
discordava dessa estratégia e queria que se enfrentasse Xerxes na parte 
continental e no mar, por entender que os Gregos tinham mais possibilidades 
num confronto naval ('*). Para fazer valer a sua táctica, ameaça abandonar 
a causa grega e transferir a pólis ateniense para outro lugar. Nestes ter­
mos se dirige ao rei espartano que comandava as forças gregas (6. 82):
Se tu permaneces aqui, serás um homem de bem, mas se não o fizeres 
arruinarás a Hélade, já que todas as nossas possibilidades nesta guerra 
se encontram nos navios. Vá, segue o meu conselho. Se não atendes ao 
que te digo, nós recolheremos as nossas famílias e nos transferiremos 
para Siris, na Itália.
Daqui se deduz que a pólis tinha também o sentido de povo, com ou 
sem associação política. Dos numerosos exemplos {e. g. Tucídides 2. 
39. 1 e 4), vejamos dois tirados á-àAntígona e do Rei Èdipo de Sófocles. 
Na primeira das referidas tragédias, Creonte vem expor o seu programa 
de governo e anuncia o édito que proibia as honras fúnebres a Polinices 
e condenava à morte quem, contra tal determinação, lhas prestasse. O 
rei expressa-se deste modo (vv. 203-205):
Foi proclamado à pólis que ele as honras fúnebres 
não recebería nem pessoa alguma o lamentaria, 
mas seria deixado insepulto...
f ) Sobre Temístocles vide os capítulos “A democracia ateniense: a busca da igualdade” 
e “A Simaquia de Delos e a hegemonia ateniense”.
15
A GRÉCIA ANTIGA
Ou seja “foi feita uma proclamação pública, a todo o povo”, a toda a 
população.
No Rei Éáipo, o protagonista, ao tentar descobrir o assassino de 
Laio, sabe por Jocasta que este foi morto por ladrões num cruzamento 
de três caminhos, segundo contara um escravo que acompanhava na 
altura o rei (vv. 715-716). Edipo então, como também matara mas 
sozinho — um homem na mesma encruzilhada, enche-se de receio e 
pede que lhe tragam o escravo, para que este confirme se Laio fora 
morto por uma ou mais pessoas. Ao que Jocasta responde (w . 848-850):
Fica sabendo que desse m odo foi feito o relato
e não lhe é possível agora desdizê-lo:
toda a pólis o ouviu, não apenas eu.
Ou seja: Jocasta pretende dizer que não foi ela sozinha a escutá-lo, 
mas “toda a população”.
Se nestes dois exemplos o termo designa povo, como entidade que 
se distingue do Estado, em outros passos surge com o sentido de entidade 
política. Dou um exemplo de Tucídides e outro de Demóstenes. Na 
“Oração fúnebre” em honra dos Atenienses mortos nos primeiros anos 
da Guerra do Peloponeso que o historiador coloca na boca de Péricles, 
este estadista faz o elogio da constituição ateniense e refere que o poder 
da pólis, em virtude das suas qualidades, corresponde à verdade dos 
factos: é a única que, posta à prova, se mostra superior à fama que 
possui e não provoca irritação ao inimigo, quando invadida, nem censura 
aos que submete. (2. 41. 2-3).
Demóstenes, no discurso Contra Mídias 45, elucida que todo o acto 
de violência ou insolência é passível de uma acusação pública apresentada 
por alguém que o queira, visto a lei considerar que quem recorre à violência 
comete uma injustiça contra a pólis e não apenas contra a vítima.
E assim temos que a pólis aparece primordialmente como os cidadãos 
concretos e pode apresentar o sentido de povo, entendido simplesmente 
como o conjunto das pessoas que a habitam ou como entidade política. 
Mas a pólis englobava ainda a vida econômica e não se concebia desligada 
da religião. Segundo Péricles, no discurso acima referido, que lhe atribui 
Tucídides, devido à grandeza da pólis - ou seja à sua riqueza e prospe­
ridade - , afluern a Atenas produtos da terra inteira, o que permite que os 
habitantes desfrutem tanto dos bens locais como dos de outros países.
Hoje tende-se a aceitar o princípio de que o Estado deve estar separado 
da religião, matéria que pertencería ao foro íntimo e à consciência de 
cada um. Tal ideia era impensável para os Gregos, que consideravam a
16
A POLIS GREGA
religião - embora não em todas as suas formas (̂ ) - parte integrante e 
nuclear na pólis e as cerimónias e actos do culto funções da alçada dos 
governantes. Se os deuses olímpicos eram adorados por todos os Gregos 
e tinham carácter pan-helénico, cada pólis prestava com frequência cultos 
privados a esses deuses, distintos dos das restantes; tinha os seus heróis 
que eram objecto de culto e possuía uma divindade políade ou protectora: 
caso da deusa Atena para Atenas e de Hera para Argos. Como não havia 
sacerdotes, no sentido que hoje damos ao termo, os rituais do culto e os 
sacrifícios eram executados pelos governantes. A ligação da religião à 
pólis era tão íntima que os Gregos pensavam que as divindades protectoras 
a abandonavam no momento em que ela era conquistada. A partir de 
então deixava de ser um Estado autónomo e ficaria subjugado a uma 
pólis com outra divindade protectora.
Se os aspectos até agora enumerados constituíam traços importantes 
da pólis, esta dava primazia à lei e era o meio pelo qual esta se realizava 
e satisfazia, quer se tratasse do thesmos, quer do nomos - dois tenuos 
que significavam lei, mas que, embora com sentidos idênticos, designavam 
realidades diferentes, pelo menos quanto à origem e autoridade (®).
A pólis estava baseada na aceitação absoluta das leis no sentido lato 
- incluindo nelas o que nós chamamos a constituição, o conjunto de 
regulamentações e normas que enformam a vida da cidade - e de uma 
administração despersonalizada.
Para o Grego, o agir de forma emocional, violenta, excessiva e pela 
força é próprio de um Bárbaro e está em desacordo com o modo de 
actuar de um Heleno que sabe dominar-se e molda o seu comportamento
P) Além da religião oficial da pólis, havia uma religião pessoal e os Mistérios em que 
a intervenção do Estado não existia ou era menor. Sobre o assunto vide A. J. Festugière, 
Personal religion among the Greeks (Sather Classical Lectures, University o f California 
Press, 1954); M. H. Rocha Pereira, Estudos de História da Cultura Clássica. I - Cultura 
Grega (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2003), pp. 306-320.
(®) Vide J. Ribeiro Ferreira, Hélade e Helenos. I - Gênese e Evolução de um Conceito 
(Coimbra, 1992), pp. 155 sqq. Segundo M. Ostwald, Nomos and the beginnings o f the 
Athenian democracy (Oxford, 1969), p. 19 (citado a partir de agora: M. Ostwald, 
Nomos ), thesmos era “a thing imposed by a higher power upon those for whom the 
authority o f the imposing agency makes the deagcx; an obligation”. Nomos, por sua vez, 
significava “decreto”, “lei escrita” da pólis, produto da votação da vontade da maioria 
dos cidadãos, ou seja, não é uma doação de uma entidade superior, mas uma criação da 
própria pólis.
17
A GRÉCIA ANTIGA
pela medida e moderação, quer no domínio político quer na actividade 
privada C). No primeiro caso, essa razão ou medida, pela qual os Helenos 
pautavam o seu procedimento, estava simbolizada na lei que sentiam 
como um privilégio que os opunha aos Bárbaros. Para o Grego, deve 
apenas obedecer-se à lei e por ela deve a pólis reger-se e cada um mo­
delar 0 seu comportamento, quer seja governante ou simples cidadão. É 
o que nos mostra um diálogo de Tíndaro com Menelau no Orestes de 
Eurípides. Quando o segundo procura ajudar o protagonista mesmo contra 
a lei e a vontade do povo reunido em assembleia, sob a alegação de que 
é filho do seu próprio irmão, o primeiro manifesta a sua estranheza (vv. 
485-489):
Tíndaro:
Barbarizou-te o tempo passado entre os Bárbaros.
Menelau:
É de um Grego honrar sempre os do seu sangue.
Tíndaro:
Também o é não querer nunca estar acima das leis.
Menelau:
Tudo 0 que vem da obrigação é uma servidão para os sábios.
Tíndaro:
Age tu então desse modo; eu não o farei.
Para Tíndaro, ajudar alguém que se serve da violência e, sem recorrer 
às leis, se vinga e faz justiça por suas próprias mãos não é próprio de um 
Grego. Por isso, considera que o tempo passadopor Menelau entre os 
não Gregos - os Bárbaros que não têm por soberano a lei, mas obedecem 
a um homem e são por isso seres inferiores - o transformou num deles, 
visto que pretende ajudar um criminoso contra a justiça e a vontade da 
pólis. À justificação deste de que é um traço do Grego honrar sempre os 
do seu sangue, mesmo contra as decisões da justiça e da pólis, replica 
que também o é não querer estar acima das leis. A resposta de Menelau 
de que a obrigatoriedade {ananké) imposta pelas leis é uma escravidão, 
considera-a Tíndaro um juízo que não merece a sua aprovação f ). Está
(9 Sobre a noção de Bárbaro entre os Gregos vide J. Ribeiro Ferreira, Hélade e 
Helenos I, pp. 191 sqq.
Q) Este passo tem recebido várias interpretações. Vide Grube, The drama o f Euripides 
(London, 1941), pp. 382-383; M. ?oh\enz, Die griechische Tragoi/Ze I (Göttingen, ̂1954), 
p.415;F. Chapoutier e L. Mérlákr, Euripides VI. I-Oreste, (Paris, 1959), p. 52, nota 1; 
D. Lanza, “Unità e significato delF OrestQ euripideo”, Dionisio 35 (1961) 60-62; V. di 
Benedetto, Euripidis Orestes (Firenze, 1965), ad 485-488 e 489; W. Biehl. Euripides:
18
A POLIS GREGA
aqui subjacente o conhecido tópico da oposição entrephysis “natureza” 
e nomos “lei”, muito do agrado dos sofistas (̂ ).
O Grego era cioso de ter por único soberano a lei e isso o distingue 
proflindamente dos Bárbaros. Daí a estranheza do rei persa, ao saber 
que os Lacedemónios não tinham senão a lei por senhor (Heródoto 7. 
107) e a de Atossa, nos Persas de Ésquilo, por os Atenienses não obedece­
rem a um chefe. A rainha pretende saber quem mandava nos Atenienses, 
contra os quais o filho se propõe combater, e quem era seu chefe; quando 
o Coro lhe responde que
De nenhum homem são escravos nem súbditos
a soberana então estranha e duvida que sejam capazes de enfrentar os 
Persas (w. 241-243). Por outro lado, não obedecer à lei e derrogá-la era 
um acto bárbaro e condenado pelos Gregos. Por isso, responde Demarato 
a Xerxes que os Lacedemónios estão sujeitos à lei que temem mais do 
que os Persas ao seu soberano (Heródoto 7. 104).
Péricles, na “Oração fúnebre” que lhe atribui Tucídides, põe em realce 
a obediência dos Atenienses em relação às leis, especialmente as que 
protegiam o oprimido (2.37.3). Uma actividade criadora inspirada pela 
liberdade e assegurada pela lei constituía precisamente, como mostra 
Bowra, o ideal que esse dirigente pretendia para Atenas ('“). Boa parte 
da força da cidade radicava no facto de os seus cidadãos, apesar de 
gozarem de grande liberdade, permanecerem observantes da lei, por terem 
a consciência de que a desordem ou anarquia favorecia os que odiavam 
0 regime ateniense e o queriam destruir. Daí a afirmação de Atena nas 
Eiunénides de Ésquilo (w. 696-699):
Uma forma de governo intermédia entre a anarquia e o despotismo, eis o 
que eu recomendo aos cidadãos que pratiquem e venerem, e ainda que 
não expulsem completamente o temor da sua cidade. Quem observará a 
justiça, se nada tiver a recear? (")
Orestes (Berlin, 1965), ad 485,486,487 e 488; Augusta F. de Oliveira e Silva, Euripides: 
Orestes (Coimbra, Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Univ. de Coimbra, 
1982), pp. 20-23.
(®) Sobre a oposição nomos/physis vide F. Heinimann, Nomos und Physis (Basel, 
1945); W. K. C. Guthrie, History o f Greek philosophy. Ill - The fifth-century enlighten­
ment (Cambridge University Press, 1969), pp. 55-134; J. de Romilly, La loi dans la 
pensée grecque (Paris, Les Belles Lettres, 1971), pp. 73-114.
('“) Vide C. M. Periclean Athens (London, 1970; trad. esp. 1974), pp. 121-128.
(") Ésquilo, Oresteia, tradução de Manuel O. Pulquério, (Lisboa, Edições 70,1990),
p. 220.
19
A GRÉCIA ANTIGA
e a sua longa e persistente tentativa de persuadir as Erínias - divindades 
que castigam os crimes de sangue e haviam ficado derrotadas no julga­
mento de Orestes - a não castigarem a cidade e a ficarem em Atenas, 
transformadas em Euménides, como protectoras da justiça e guardiãs 
das leis e do seu cumprimento (w. 778 sqq.). Sem nada recear, qual 
dos mortais seria justo? - proclama Atena.
Mesmo os governantes tinham de obedecer à lei e por ela conformar 
a sua actuação - sobretudo eles, porque, como observa e bem Creonte 
na Antígona de Sófocles, não se conhece o temperamento e carácter de 
um homem antes de se exercitar no poder e na legislação (vv. 175-177). 
Esse poder e lei vêm da participação dos cidadãos, sendo nestes que 
reside a pólis. Expressamente o declara Nícias no discurso, já referido, 
que dirige aos soldados durante a campanha na Sicília: a pólis são os 
cidadãos e não as muralhas e os barcos viúvos de homens (Tucídides 7. 
77.7). Afirma-o também não menos poderosamente o jovem Hémon na 
mQsm .̂ Antígona, num diálogo significativo com o pai, em que lhe anuncia 
que Tebas o não aprova na decisão de condenar Antígona (vv. 733-739):
Hémon:
Não o afirma o povo todo de Tebas.
Creonte:
E é a pólis que me vai dizer o que devo ordenar?
Hémon:
Vês que respondes como se foras uma criança?
Creonte:
É pois outro, e não eu, que deve governar este país?
Hémon:
Nenhuma pólis é pertença de um só homem.
Creonte:
Não se considera que a pólis é de quem manda?
Hémon:
Sozinho, numa terra deserta, é que governarias bem.
De estruturas mentais diferentes, pai e filho têm concepções antagó­
nicas de governação e autoridade, pelo que reagem, em conformidade, 
de modo distinto. Naturalmente despótico, Creonte não aceita que algo 
ou alguém se lhe oponha ou se sobreponha à sua vontade nem que a 
pólis lhe vá ditar o que deve fazer: para ele, esta é de quem manda. No 
pensar de Hémon, pelo contrário, nenhuma pólis é pertença de um só 
homem: por isso, se o pai não quer ter em conta a opinião dos cidadãos e 
deseja proceder de modo ditatorial, devia governar numa terra deserta. 
Para Hémon, o poder autocrático é o destruir da pólis. Constitui, de facto.
20
A POLIS GREGA
a negação de tal estrutura aquele que actua como tyrannos, de forma 
irresponsável, e baseia o seu agir na própria vontade, sem ter em conta 
os costumes tradicionais ou a opinião dos outros, quer de um conselho, 
quer de todos os cidadãos ( ’̂ ).
Ora a tirania era o regime em que os Bárbaros viviam. Por isso se 
forma a já referida oposição entre o sistema de pólis dos Helenos, que 
tinha por único soberano a lei, e o dos não Gregos. Povos subjugados a 
um soberano que tinha sobre eles poder absoluto, constituíam grandes 
dynasteiai (Heródoto 7. 135), um regime que, segundo Platão, procura 
evitar nos súbditos pensamentos de ousadia ou amizade e uniões dura­
doiras (Symp. 182b) (‘̂ ). Como, por outro lado, os Persas nas suas cam­
panhas contra a Grécia pretenderam restaurar as tiranias (Heródoto 6. 
102; 7. 6), não admira que os Helenos associem sistematicamente esse 
regime aos Bárbaros e que os Atenienses, à proposta do rei macedónico 
Alexandre, aliado dos Persas, de pactuar com Xerxes, respondam que 
anseiam pela liberdade e se defenderão até que possam Ĉ )̂. Os Gregos, 
nota-o Aristóteles, eram feitos para viverem em póleis, enquanto os 
Bárbaros viviam em ethne {Política 5, 1303a 20-25; 7, 1324a 23-25 e 
1326a 2-5 e 22-24).
É natural, por isso, que na literatura grega apareça amiúde a oposição 
entre o regime político grego e o dos Bárbaros, mesmo à custa de anacro­
nismos vários. Nas Suplicantes de Ésquilo, em passo citado no capítulo 
“A democracia ateniense: a busca da igualdade” (p. 91), Pelasgo refere 
não poder socorrer as Danaides sem consultar o povo, já que as conse­
quências recairão sobre toda a cidade. Considera ele que se a pólis inteira 
se contamina, deve ser o povo em comum a procurar a solução, pelo que 
tem de ser consultado (’̂ ).
Cf. H. D. F. Kitto, The Greeks (London, 1951, repr. 1957), pp. 71-72.
(' )̂ Demócrito, fr. 251 Diels, à apregoada felicidade nas dynasteiai considera preferível 
a pobreza na democracia, como a liberdade à escravidão. C f ainda fr. 30 Diels.
Oh C f Heródoto 8. 143.
Aliás a obra de Heródoto narra oconfronto entre Gregos e Bárbaros a que se associa 
a antítese liberdade/tirania — tirania que incorre em hybris e é castigada pelos deuses.
Ch Vv. 366-369.
Sobre aposição constitucional do rei e possíveis implicações políticas do passo, vide 
P. Podlecki, The political background o f Aeschylean tragedy (Michigan, 1966), p. 46; 
P. Burian, “Pelasgus and Politics in Aeschylus’ Danaid Trilogy”, Wiener Studien, N. F. 8 
(1974) 7; A. S. Garvie, Aeschylus’ Supplices: play and trilogy (Cambridge, 1969), 
pp. 150-154; H. F. Johansen and E. W. Aeschylus: The Suppliants II (Copenhagen,
1980), ad 365-369.
21
A GRÉCIA ANTIGA
Pelo contrário, as filhas de Dânao, que não são gregas, supõem que o 
rei tem poderes de senhor absoluto:
Tu és a pólis, tu és o povo.
Prítane que ninguém controla, 
és senhor do altar, lar comum do país.
O aceno da tua fronte por único sufrágio, 
ceptro único em teu trono, 
tudo decides. (‘̂ )
Nestes dois passos, procura-se um contraste entre o sistema de pólis e 
0 governo de um senhor despótico, de um soberano absoluto. Essa dico­
tomia é poderosamente acentuada pela linguagem: Pelasgo, que se revela 
um rei “democrático”, a “meu lar” (v. 366) e a “eu” (v. 368) contrapõe 
“pólis inteira” (v. 366), “povo em comum” (v. 367) e “todos os cidadãos” 
(v. 369). Em contraste, as Danaides, com palavras semanticamente ade­
quadas, insistem no poder soberano de Pelasgo, procurando identificá-lo 
com o próprio corpo político e repetindo os compostos em que entra o 
elemento mono (*’).
No mesmo sentido vai a afirmação de Demofonte, nos Heraclidas 
de Eurípides, que, por mais explícita, se toma mais significativa. O rei de 
Atenas quer ajudar os filhos de Héracles, mas diz-lhes não o poder fazer 
contra a vontade da pólis e de modo a expor-se às suas censuras e 
acusações (vv. 423-424):
Não governo em tirania como fazem os Bárbaros.
Por isso, se agir com justiça, com justiça serei tratado.
E, pois, comum a constatação de que se não deve governar de modo 
tirânico, mas de acordo com a vontade dos cidadãos, ou seja, com justiça. 
Ciosos da sua liberdade e de não obedecerem senão à lei da pólis, os 
Gregos viam nesta a garantia e o símbolo daquela. Participar na vida e 
no governo da pólis constituía para eles o penhor máximo de liberdade e 
nisso residia o viver de acordo com a razão. Em contraste com isso, os 
Bárbaros estavam sujeitos à vontade de um homem e eram súbditos de 
um soberano (cf Heródoto 7. 103). Viver desse modo era para o Grego 
uma vida de escravo. O poder absoluto dos soberanos dos Bárbaros 
consideravam-no eles tirania, escravidão a sujeição dos súbditos.
(' )̂ Vv. 370-375.
Para a insistência, visível no passo, na ideia de monocracia a nível linguístico, prosódico 
e semântico, vide Johansen-Whittle, Aeschylus: The Suppliants II, pp. 295-297.
CO Vide Johansen-Whittle, The Suppliants II, ad 368-369 e 370-375.
22
A POLIS GREGA
Num passo da Helena de Euripides, encontramos explicitamente 
expressa a noção de que a tirania é um regime que transforma em escravos 
quantos nele vivem. Aí, a dada altura, a esposa de Menelau, exilada entre 
os Egípcios, ela que era livre, lamenta a sua vida actual de escrava longe da 
Hélade, já que os Bárbaros são todos escravos com excepção de um ("®).
Em oposição aos Bárbaros o Grego vivia, pois, no sistema de pólis 
que tinha por único soberano a lei. A liberdade significava o reinado da 
lei e a participação no processo de tomada de decisões; não residia na 
posse de direitos inalienáveis. Como observa Finley, não havia o reconhe­
cimento da existência de direitos e de um domínio privado intangíveis 
para o Estado (‘®).
A esse propósito são significativas as afinuações de Sócrates no Críton 
de Platão, no episódio da “Prosopopeia das Leis” (50a sqq): quando Críton, 
na noite anterior à execução do mestre, lhe propõe fugir, Sócrates recusa 
como argumento de que as Leis o acusariam de, com tal acção, as deitar 
a perder, a elas e a toda a pólis, porque nenhum Estado pode subsistir 
quando as sentenças proferidas não têm poder. Não se pode alegar que 
a pólis foi injusta, porque ela não é outra coisa senão o conjunto dos cida­
dãos e, por isso, é senhora plena de cada um: graças às suas leis, normas 
e costumes ele nasce, é educado e cresce. Por isso as Leis insistem:
E depois de teres nascido e teres sido criado e instruído, poderás afirmar 
que não és nosso, nosso filho e nosso escravo, tu e os teus antepassados?
E, se isto é assim, pensas acaso que são iguais os nossos direitos e que 
te é lícito fazer-nos, a nós, aquilo que tivermos empreendido contra ti?
Ninguém deve recuar, fiigir ou abandonar o seu posto (51b-c):
mas, no combate, no tribunal, em toda a parte, tem obrigação de executar 
o que ordena a pólis e a pátria ou então convencê-la por processos que 
sejam justos.
Do que aqui fica exposto, conclui-se que a pólis é uma entidade 
multiforme que não se reduz ao Estado, nação ou povo, mas é mais
('*) V. 276. Vide R. Kannicht, Euripides: Helena (Heidelberg, 1969), II, ad 275-276. 
C’) Democracy, ancient and modern (London, ^1973), p. 78.
Q̂ ) 50e. Tradução de Manuel O. Pulquério, Platão: Apologia de Sócrates - Críton 
(Lisboa, Edições 70, 1997) p. 77. Sobre o passo vide J. Burnet, Plato’s Euthyphro, 
Apology o f Socrates and Crito (Oxford, 1924, repr. 1967), pp. 199 sqq.
23
A GRÉCIA ANTIGA
ampla. Péricles, na “Oração fúnebre” que lhe atribui Tucídides e a que já 
aludi por mais de uma vez, ao louvar a pólis, como nota Kitto, mais do 
que exaltar um povo ou um Estado, faz o elogio de um sistema de vida 
que considera a “escola da Hélade” (Tucídides 2. 41. 1) ( '̂). Atenas, 
uma pólis democrática, evoluíra consideravelmente no domínio cultural, 
económico e político: criara uma constituição avançada que privilegiava 
a igualdade entre os cidadãos, tinha uma vida cultural pujante e intensa, 
gozava de grande prosperidade. As suas realizações culturais, as suas 
festas religiosas, a sua prosperidade e poder atraíam cidadãos de outras 
póleis. Daí que Péricles considere que Atenas possa servir de paradigma 
aos outros Helenos.
Desde que nasce, o habitante habitua-se ao modo de vida da pólis, às 
suas leis e costumes, às normas que regulam os actos mais comezinhos, 
às cerimónias religiosas e crenças. Comunidade viva, nela o convívio 
com os outros, a actividade nas diversas instituições, a participação nos 
actos públicos e cerimónias religiosas aos poucos conformavam o jovem 
a uma maneira de ser e de viver. Desse modo, a pólis educa o cidadão e 
modela-o, a ponto de ser um produto e escravo seu, como demonstra 
Sócrates no passo do Críton acima referido. Daí compreender-se a 
afirmação de Simónides (fr. 15 West) de que
A pólis é mestra do homem.
A pólis era, portanto, uma entidade activa, formativa, que exercitava 
o espírito e formava o carácter dos cidadãos. Constituía uma preparação 
para a aretê— excelência ou virtude —, Einção de que o Estado moderno 
se desliga quase por completo. Daí que se compreenda a afimiação de 
W. Jaeger de que descrever a pólis é descrever a vida total dos Gregos.
Como diz Aristóteles, a pólis é a comunidade perfeita, nascida de 
várias aldeias, que atinge então o nível de autarcia completa: a pólis 
forma-se por necessidades da vida e existe para se ter uma vida digna 
(Política 1. 2. 8, 1252b 27-33).
A sanção divina dava autoridade às leis da pólis que desse modo 
representavam como que a vontade dos deuses. No entanto, as leis da 
cidade-estado não podiam contrariar os ditames dos deuses, sob pena de 
graves consequências. Segundo Heraclito, os cidadãos devem combater 
pela lei (o nomos) da pólis tanto quanto pelas muralhas (fr. 44 Diels- 
-Kranz) e a pólis deve apoiar-se no nomos, já que as leis dos homens 
tiram a sua força da divina (fr. 114 Diels-Kranz). É uma insistência no
(-') H. D. F. Kitto, The Greeks, p. 75 (trad. port. Coimbra, 1960, p. 120).
24
A POLIS GREGA
respeito do nomos, e fundamenta-se no facto de as leis humanas serem 
sustentadas pela lei divina universal,fonte e origem de todas as nornias, 
a ordem do universo e lei fundamental da hamonia invisível de que fala o 
fr. 54 Diels-Kranz; a lei está em consonância com o Logos, constituinte 
e regulador do cosmos (̂ )̂. Por seu lado, a Antígona de Sófocles, onde 
se verifica uma oposição entre leis humanas e leis divinas, proclama que 
as leis positivas, decretadas pelos homens, devem hannonizar-se com as 
leis dos deuses. Creonte, rei de Tebas, por não o fazer é duramente casti­
gado. Publicara um édito que, sem ter em conta as normas divinas que 
determinavam a obrigatoriedade de serem prestadas honras fúnebres 
aos mortos (̂ )̂, estipulara que Polinices fosse deixado insepulto e estabe­
lecia a pena de morte para quem não cumprisse tal detemiinação. Antígona, 
surpreendida a lançar uma fina camada de pó sobre o corpo do irmão e 
interrogada por Creonte por que, conhecedora das suas leis, as ousou 
transgredir, responde com estas palavras célebres (w. 450-455):
E que essas não foi Zeus que as promulgou, 
nem a Justiça, que coabita com os deuses infernais, 
estabeleceu tais leis para os homens.
E eu entendi que os teus éditos não tinham
tal poder, que um mortal pudesse sobrelevar
os preceitos, não escritos, mas imutáveis dos deuses.
No estásimo primeiro o Coro, depois de cantar o progresso da humani­
dade, conclui que o engenho do homem tanto o pode levar ao bem como 
ao mal e que uma pólis só subsiste e prospera, se as suas leis estiverem 
de haraionia com os ditames dos deuses (vv. 367-371):
Se da terra preza as leis e dos deuses 
na justiça faz fé, grande é a cidade; 
mas logo a perde
quem por audácia incorre no erro. C'*)
6^) Cf. G. S. Kirk, J. E. Raven e M. Schofield, The presocratic philosophers. A 
criticai history with a selection of texts (Cambridge University Press, ^1983), pp. 211- 
-212; T. A. Sinclair, A history o f Greek political thought (London, ^1967), pp. 29-31. 
K. Reinhardt, Parmenides (Frankfurt am Main, 31977), pp. 215-216 integra o fr. 114 na 
oposição nomos/physis. M. Ostwald, Nomos, pp. 26-28 e 30 considera que, no fr. 44, 
nomos tern mais o sentido de eunomia “boa ordem” e “defines the value to this condi­
tion”, e que, no fr. 114, os anthropoi nomoi “as leis humanas” se referem a um “way o f 
life or mores o f city as whole” (citações das pp. 30 e 27, respectivamente).
(^h Os cadáveres insepultos podem originar pestes. Como os Gregos não as sabiam 
explicar, atribuíam-nas a um castigo dos deuses.
(^h A tradução dos dois passos áa Antígona é de M. H. Rocha Pereira, in Sófocles, 
Tragédias (Coimbra, 2003), p. 324.
25
A GRÉCIA ANTIGA
À mesma conclusão de origem divina do nomos nos conduz um passo 
do Contra Aristogíton I. 15-16 de Demóstenes. Considera o orador que 
a vida dos homens, quer habitem numa pólis grande, quer pequena, é 
regulada pela natureza e pelas leis - aphysis e os nomoi. Em sua opinião 
a natureza, irregular e particular a cada pessoa, se é vil, deseja com 
frequência o que é inferior e pode conduzir as pessoas a cometer erros; 
as leis, pelo contrário, são algo de comum, fixo e o mesmo para todos, 
uma dádiva dos deuses e uma descoberta dos homens sábios. Passo a 
ler a tradução do passo:
As leis desejam o que é justo, belo e útil, e procuram-no; logo que o 
encontram, proclamam-no ordem comum, igual e a mesma para todos. Eis 
o que é o nomos. A ele devem todos obedecer, por numerosos motivos e 
sobretudo porque toda a lei é uma criação e um dom dos deuses, uma 
decisão dos homens sábios, um correctivo para os erros, voluntários ou 
involuntários, um contrato comum da pólis, segundo o qual todos devem 
viver nessa sociedade.
Embora a pólis apresente um tipo estrutural genérico, no seu interior 
há variações mais ou menos substanciais, em extensão territorial, em 
número de habitantes, em instituições constitucionais e governamentais, 
em grau de duração e estabilidade, em costumes e modos de vida. Nela 
encontramos um grupo de cidadãos, ora restrito, ora mais alargado, que, 
como veremos, se bate com as realidades materiais e sociais da época e 
as transforma. Essa luta com os condicionalismos de cada pólis origina 
sociedades diferentes, com constituições e modos de vida diferentes, 
criando instituições novas e alterando mais ou menos substancialmente 
as existentes. O caso de Atenas, como veremos nos próximos capítulos, 
é um exemplo típico de tais alterações. No entanto, apesar dessas trans­
formações, todas as póleis surgem com um núcleo comum de instituições, 
com funções idênticas de início em todas elas, que se manterão ao longo 
dos tempos mais ou menos modificadas até ao declínio do sistema na 
segunda metade do século IV a. C. Estou a referir-me à Assembleia do 
povo, ao Conselho e aos Magistrados. Estes vários órgãos institucionais 
podem tomar nomes diferentes conforme a pólis. Assim, para dar o exem­
plo das duas mais poderosas cidades gregas do século V a. C., Atenas e 
Esparta, temos respectivamente Ecclesia (Assembleia) e Apela, para a 
Assembleia; Areópago e Gerúsia, para o Conselho; e Arcontes e Éforos, 
para os Magistrados.
26
A POLIS GREGA
Aos órgãos institucionais tinham acesso e neles participavam activa- 
mente apenas os cidadãos, sempre uma parcela reduzida da totalidade 
dos seus habitantes que, não obstante, incluía indistintamente pobres e 
ricos, num leque que se estendia dos abastados aos que nada tinham e 
viviam do salário do seu trabalho do dia-a-dia, como veremos em próximo 
capítulo. A população de uma pólis era constituída por pessoas livres e 
não livres. Eram livres os cidadãos e os estrangeiros com autorização de 
residência, cujo nome mais usual é o de metecos. Entre as não livres 
incluem-se os habitantes que estão submetidos a qualquer grau de depen­
dência e não podem dispor da sua pessoa: desde os considerados animais 
ou coisas - os escravos-mercadoria, algo que se compra e se vende - 
até aos que, obrigados a trabalhar a terra de outrem, os servos, tinham 
de entregar uma parte do produto e, de acordo com o estatuto, estavam 
numa situação melhor do que a dos anteriores (̂ )̂.
Numericamente, a soberania dos cidadãos era a de uma minoria, tanto 
nas oligarquias como nas democracias. Apesar da falibilidade e insegu­
rança das cifras e estatísticas para essa época, tudo indica que o seu 
número não teria ultrapassado os quinze por cento da totalidade da popu­
lação, mesmo nas democracias mais evoluídas e abertas, como é o caso 
de Atenas (̂ )̂.
Portanto, a obtenção da cidadania (politeia) é essencial. É ela que 
concede ao seu possuidor a qualidade depolites que lhe permite intervir 
activamente na pólis, ou seja na sua constituição {politeia) que, para um 
grego, abrangia as leis, as instituições e seu funcionamento, os costumes, 
crenças e hábitos, enfim toda a vida económica, política, social e religiosa.
Como teria surgido esse sistema social e político entre os Gregos? 
Nos textos literários mais antigos que possuímos, os Poemas Homéricos 
- a Ilíada e a Odisséia, que geralmente se julga assentarem em poesia 
de improvisação oral e terem atingido, no essencial, a forma em que
f Note-se que uma coisa é o estatuto e outra a situação real. Pode acontecer que 
numa pólis os não livres possuam um estatuto mais benéfico do que os de outra, mas se 
encontrem numa situação real inversa. É o que se passa com Atenas e Esparta: na primeira, 
os escravos, embora estatutariamente considerados uma mercadoria, têm uma situação 
real incomparavelmente melhor do que os hilotas de Esparta que, pelo estatuto, são 
servos.
(“ ) Em Atenas, de autor para autor, a variabilidade no número de habitantes ultrapassa 
com frequência os cinquenta por cento, como se verá no capítulo “A democracia ateniense: 
a busca da igualdade” (p. 104).
27
A GRÉCIA ANTIGA
chegaram até nós no decurso do século VIII a. C. e que devem transmitir 
elementos e instituições de tempos anteriores nos textos mais antigos, 
dizia, a referência à pólis ainda não existe ou não aparece com clareza. 
Já neles encontramos a presença deum conselho de anciãos - um 
conselho regular, formado pelos reis ou por nobres, que havia a obrigação 
de consultar, por direito ou por tradição, nos assuntos de interesse comum 
(cf Ilíada 19. 303; Odisséia 6. 53-55 e 8. 387-395) e que, ao tomarem 
a palavra nos debates, detinham o ceptro, símbolo da autoridade (cf Ilíada 
18. 505-506); encontramos indícios da Assembléia do povo, convocada 
por qualquer dos reis e consultada - sempre na companhia do Conselho 
- em alturas importantes (cf Ilíada 1. 54 sqq.; 18. 497-503). Mas o que 
predomina nos Poemas Homéricos é o palácio - o oikos - que é gover­
nado por um rei, apesar de apresentar características que o aproximam 
da pólis: ser uma célula social organizada, uma unidade humana e econô­
mica que tem por ideal a independência e a autarcia.
Não há unanimidade quanto ao facto de os Poemas Homéricos reflec- 
tirem ou não já o aparecimento da pólis. Nesta matéria são diversas as 
posições dos estudiosos (̂ ’).
Recorde-se, no entanto, o passo das duas cidades - uma em paz e 
outra em guerra (vv. 490 sqq.) - do célebre episódio da descrição do 
escudo de Aquiles {Ilíada 18. 478-608). Aí, na cidade em paz, faz-se 
alusão a um julgamento - ou melhor, um esboço de julgamento - , onde, 
além da Assembléia do povo e do Conselho dos anciãos, aparece também 
um ‘magistrado’. Portanto - sem nunca esquecer que se trata apenas de 
um esboço de julgamento - já estão presentes os três órgãos caracterís­
ticos da pólis. Teríamos, pois, um indício dos começos do sistema. Estes 
e outros aspectos levam os comentadores a considerar a descrição do 
escudo de Aquiles como um episódio de composição mais recente da 
Ilíada (̂ )̂.
(-9 Para uns encontramos já póleis do tipo clássico na Ilíada e na Odisséia e os 
Poemas implicam uma nova concepção da vida cívica em que cada cidadão tem a sua 
missão: por exemplo, J. M. Cook, The Greeks in Ionia and the East (London, 1962), 
pp. 37-38. Para outros, a Ilíada não mostra traços da existência da pólis, mas esta já 
aparecería na Odisséia: e. g. V. Ehrenberg, “When did the polis úsq7”, Journal o f Hellenic 
Studies 57 (1937) 155 e The Greek state (Oxford, 1960), p. 242. Para outros ainda, 
nenhum dos Poemas apresenta traços da pólis no sentido político clássico; Finley, The 
world o f Odysseus (London, Chatto & Windus, 1956), p. 35 (trad, port., Lisboa, Presença, 
pp. 43-44).
(̂ *) É certo que ístor do v. 501, como pretendem alguns comentadores, pode ser 
apenas um árbitro; outros dizem que se trata de um dos gérontes do v. 508. De qualquer 
modo exerce aqui as funções que mais tarde estarão a cargo dos magistrados. Sobre o
28
A POLIS GREGA
Em Hesíodo - um poeta cuja datação oferece dificuldades, mas se 
tende a colocar nos finais do século VIII, embora continue a haver quem 
a situe na primeira metade do VII a. C. - o sistema ainda não está total­
mente definido. A leitura dos Trabalhos e Dias deixa perceber que, na 
Beócia, por volta de 700 a. C., a união do campo e da cidade, característica 
essencial da pólis arcaica e clássica, não se havia ainda processado ple­
namente. Para Hesíodo, que vive em Ascra, uma aldeia do território de 
Téspies, na Beócia, aquele aglomerado urbano é um mundo distante onde 
vivem os nobres - ou os reis, como diz o poeta - “devoradores de presen­
tes” (w. 38-39). Parece dar-nos então um indício de que a pólis começava 
a ganhar forma.
Aos dados literários juntam-se os testemunhos arqueológicos. A. 
Snodgrass, num curto mas sugestivo estudo, analisou as descobertas das 
eseavações de algumas das cidades gregas e chama a atenção para o 
aparecimento - primeiro nas cidades da Ásia Menor e ilhas adjacentes - 
de fortificações a defenderem as povoações e de um templo: as muralhas 
construídas na segunda metade do século IX e ao longo do VIII a. C., e 
o templo de data ligeiramente mais tardia. Conclui que, se o aparecimento 
de muralhas não é a garantia de se ter atingido uma pólis independente, 
a existência de templo, ao reconhecer e eleger uma divindade protectora, 
será uma prova físiea de que a emergência da pólis se verificou ou está 
em curso (̂ ®).
O processo de cristalização da cidade-estado escapa-nos, mas a colo­
nização grega - um fenómeno que, como veremos no próximo capítulo, 
se inicia ainda na primeira metade do século VIII a. C. e espalha os 
Helenos pelas margens do Mediterrâneo - funda cidades que são todas 
(com excepção dos emporia) póleis independentes que imitam as institui­
ções da metrópole. O aparecimento do sistema era, portanto, anterior ao 
iníeio da colonização.
Hoje a tendência é para aceitar que a pólis teria surgido no século 
VIII a. C. - primeiro na Ásia Menor, mas em breve espalhada por toda
assunto vide H. Hommel, “Die Gerichtsszene auf dem Schilde des Achilleus”, in Politeia 
und Respublica (Wiesbaden, 1969) pp. 11-38. Outras obras mais recentes encaram o 
escudo de Aquiles sobre o ponto de vista literário ou arqueológico: W. Marg, Homer über 
die Dichtung. Der Schild des Achileus (Münster, ̂1971); K. Fittschen, “Der Schild des 
Achlleus” in Archaeologia homerica II (Göttingen, 1973); R. S. Shannon, The arms of 
Achilles and Homeric compositional technique (Suppl. 36 Mnemosyne, Leyden, Brill, 
1975).
Archaeology and the rise ofthe Greek state (Cambridge University Press, 1977),
p. 24.
29
A GRÉCIA ANTIGA
a Hélade - , se bem que H. Berve apenas considere a sua existência no 
século V a. C.
Ultrapassado o período conhecido como Época Obscura grega (do 
século XI à primeira metade do VIII a. C.), já não encontramos os reinos 
relativamente extensos dos tempos micénicos e dos Poemas Homéricos; 
os reis tinham desaparecido e, no seu lugar, deparamos com oligarquias 
aristocráticas.
Explica-se, por vezes, a origem da pólis pelas características físicas 
do solo grego, muito compartimentado por montanhas e vales e penetrado 
pelo mar em enseadas e golfos. A pólis apareceria assim, a bem dizer, 
como uma consequência dos traços geográficos. A teoria, embora pareça 
atraente, motiva objecções várias: o sistema de pólis não se desenvolveu 
em outras regiões tão ou mais acidentadas; mesmo na Grécia, apareceu 
tardiamente, se tivermos em conta que os Micénios já eram gregos, e é 
lícito perguntar por que não actuou mais cedo a causa geográfica; a pólis 
desenvolveu-se primeiro na Ásia Menor e floresceu em zonas onde as 
comunicações eram relativamente fáceis - Ásia Menor, Peloponeso, 
costa oriental da Grécia continental: havia cidades vizinhas, sem barreiras 
entre elas, que permaneciam independentes, enquanto outras regiões 
montanhosas e muito fraccionadas geograficamente - Arcádia, Etólia, 
zona ocidental da Grécia central e a do noroeste - nunca ou só em época 
tardia atingiram ou adoptaram o sistema ( '̂). Estes dados parecem 
permitir deduzir que a teoria, embora atraente, não deve ser verdadeira e 
que as razões geográficas não foram as determinantes.
É evidente que o surgir de tal sistema se pode perfeitamente explicar 
por razões históricas, com a ajuda das condições geográficas do solo e 
de factores económicos. Com o declínio micénico no século XII a. C., 
verifica-se uma acentuada e longa movimentação populacional que pro­
voca um grande fraccionamento e uma busca afanosa dos locais mais
(30) “Fürstliche Herren zur Zeit der Perserkriege”, in Gestaltende Kräfte der Antike 
(München, 1966), pp. 232-267, limita a pólis ao século V a. C.: embora aceite a sua 
existência desde Sólon, reconhece que, até às Guerras Pérsicas, luta desesperadamente 
por se afirmar.
( '̂) A Ática, muito dividida geograficamente, só formava uma pólis - Atenas - , em 
consequência de um sinecismo que se deve ter verificado nos fins do século IX ou inícios 
do VIII a. C. Vide A. Snodgrass, Archaeology and the rise o f the Greek state {CsmhvxàgQ 
University Press, 1977), pp. 16-21; J. Ribeiro Ferreira, X democracia na Grécia antiga 
(Coimbra, Minerva Coimbra, 1990), pp. 20-21. A Beócia, mais unificada geograficamente, 
tinha várias, de que sedestacam Tebas e Platéias. Pequenas ilhas, como Céos e Amorgos, 
dividiam-se em várias póleis, enquanto outras substancialmente maiores - caso de Quios 
e Samos - constituíam apenas uma pólis.
30
A POLIS GREGA
propícios e férteis. As lutas são intensas e os habitantes, dadas as con­
dições pouco favoráveis e a ameaça constante a que estavam sujeitos e 
visto não terem um poder centralizado forte que os protegesse, tentam 
defender-se em pequenas comunidades, acolhendo-se à protecção de 
antigas cidadelas micénicas ou refugiando-se nas regiões menos aces­
síveis, de modo geral no alto de colinas que rodeavam de muralhas, locais 
a que davam o nome de acrópole. A partir de deteraiinada altura, para 
melhor resistirem aos ataques constantes, essas pequenas comunidades 
agrupam-se em unidades mais amplas, através de sinecismo. Contribuem, 
desse modo, para a formação das póleis que se fecharam sempre num 
individualismo orgulhoso, sem nunca atingirem uma unidade política; 
apesar de várias tentativas e passos nesse sentido, o particularismo foi 
sempre mais forte. Ora isso é que já se toma mais difícil de perceber - 
a manutenção de tal sistema por vários séculos até que, anêmico, se vai 
diluir aos poucos ao longo do século IV a. C. p ) .
A pólis era a unidade natural e justa da sociedade humana, que 
constituía o desenvolvimento normal da família e da aldeia; e de uma e 
de outra possuía as vantagens, sem as limitações. Era um sistema de 
vida e existia para que se vivesse melhor. Ainda no século IV a. C., 
procurando talvez argamassar uma realidade que ele sentia já a derruir, 
Aristóteles {Política 1,1252 b 27-32) assim a considera. Justifíca-a por 
ser a comunidade perfeita que existe por natureza.
É uma célula política que concede direitos a todos os cidadãos e deles 
exige deveres. O Grego queria exercitar pessoalmente esses seus direitos: 
como observa Finley, na pólis os cidadãos, através dos votos - como um 
todo ou, nas oligarquias, como um sector do todo - , participavam direc- 
tamente e não por representação como num parlamento moderno Q̂ ). A 
participação directa de todos no governo condiciona a extensão do 
território e, em especial, o número de cidadãos Esta foi sempre uma 
preocupação dos políticos, quer governantes, quer teorizadores. Segundo 
a maioria deles, dez mil seria o número ideal - a polis myriandros de 
Hipodamo (Aristóteles, Po//fíca 2 ,1269b 30-31; 3 ,1280b 21-22). Para
(^9 Sobre a pólis e significado de tal sistema, vide Ehrenberg, The Greek state, 
pp. 88-192.
6 )̂ Authority and legitimacy in the classical city-state (A. J. C. Jacobson Memorial 
Lecture, Kobenhavn, 1982), p. 7. Sobre o assunto vide também J. Ribeiro Ferreira, 
Participação e poder na democracia grega (Coimbra, Faculdade de Letras, 1990), 
pp. 69-76.
(^h Sobre o território e sua extensão, vide Ehrenberg, The Greek state, pp. 28-32.
31
A GRÉCIA ANTIGA
Platão a cidade ideal deve possuir cerca de 5 000 cidadãos {Leis 5, 
737e-738ae6,771a-772d). Segundo Aristóteles, não deve ter um número 
demasiadamente diminuto, porque não lhe permitiría ser auto-suficiente, 
nem elevado em excesso, porque se tornaria ingovernável {Ética a 
Nicómaco 9 ,1170b 31-32):
Nem dez homens constituem uma pólis, nem com cem mil existe já pólis.
e num outro passo, este agora da Política {Política 7, 1326a 34-35, 
1326b 2-5 e 22-24):
A pólis que combina com uma adequada extensão o justo limite de 
que falámos é necessariamente a mais perfeita... A pólis que se compõe 
de demasiadamente poucos habitantes não é autárcica, e uma cidade tem 
de ser autárcica: por sua vez, a que se compõe de uma quantidade 
excessiva, se bem que capaz de se bastar nas suas necessidades, será 
como que um ethnos e não uma pólis, já que dificilmente tem uma 
constituição... É manifesto, por conseguinte, que o limite ideal da 
população para uma pólis é o número mais elevado compatível com a 
autarcia da vida e susceptível de ser abarcado na totalidade.
O Estagirita, portanto, considera a pólis como uma exigência natural 
e rema em sentido contrário ao que se designa por nacionalidade grega, 
para ele inexistente.
O govemo.directo exige o limite de cidadãos e leva, por consequência, 
ao particularismo. Só o sistema representativo o perfnitiria abandonar e 
ultrapassar, mas os Gregos não concebiam tal tipo de governo que se lhes 
afigurava coarctador da liberdade e da autonomia. A pólis era por natureza 
particularista e cada uma velava zelosamente pela sua liberdade e autono­
mia. A participação directa dos cidadãos no governo da pólis só é possível 
em Estados de reduzida dimensão, quer quanto ao número de cidadãos, 
quer quanto ao território - alguns eram mesmo estranhamente minúsculos, 
como acontecia com Delos, Egina, Meios, com os da Beócia (à excepção 
de Tebas), os da Fócida, os de Creta, de Ceos, de Amorgos (̂ )̂. No seu 
âmbito de contacto, por outro lado, os Estados extensos eram monarquias.
Cf. Ehrenberg, The Greek state, pp. 28-30.
Segundo Finley, in The Legacy of Greece (Oxford, 1981), p. 12, o número da população 
total (incluindo livres e escravos, homens, mulheres e crianças) no começo da guerra do 
Peloponeso, se paraAtenas rondava os 250-275 mil, para Corinto os 90 mil e para Tebas, 
Argos, Corcira e Agrigento os 40-60 mil, já na maioria das outras cidades-estado não devia 
ir muito além dos 5 mil e em algumas até nem chegaria a esse número.
Vide também Kitto, The Greeks, pp., 65-67; R. J. Littman, The Greek Experiment. 
Imperialism and Social Conflict 800-400 BC (London, 1974). pp. 31-33.
32
A POLIS GREGA
como acontecia no caso da Macedónia e da Pérsia, que, para os Gregos, 
como já dissemos, constituía uma tirania, em que os súbditos viviam em 
servidão. Na sua perspectiva, o sistema de pólis era o único que pemiitia 
a liberdade e a autonomia. Assim se compreende que a lónia nunca 
tenha feito uma tentativa para se constituir em Estado. A dificuldade não 
teria sido grande, já que os alicerces os tinha no Paniónion, em que as 
doze cidades celebravam anualmente as festas comuns em honra de 
Posídon Em vez disso, vemos que, segundo tudo indica, nem quando 
a sua salvação esteve em perigo - ao serem atacados e conquistados 
pelos Persas - actuaram em conjunto. Pelo contrário, rejeitaram mesmo 
uma proposta de Tales de Mileto para que as cidades se unissem e 
constituíssem um Buleutérion único, com sede em Teos (cf Heródoto 1. 
148 e 170). Do mesmo modo se compreende que também a Beócia 
nunca tivesse chegado a constituir uma verdadeira unidade política, apesar 
de ela possuir igualmente o suporte dos laços de uma anfictionia (̂ ’). 
Todos os débeis ensaios nesse entido esbarraram contra tal sentimento e 
esboroaram-se. Quando começaram a ganhar uma certa consistência, 
já a Grécia caminha para o ocaso político, em adiantado século IV a.C., 
ao longo do qual se verifica, como acentua Kitto, uma mudança no tem­
peramento do povo e a emergência de uma atitude diferente para com a 
vida (̂ )̂. O fulgor de que ainda vai gozar ficará a devê-lo íundamentalmente 
à acção dos Macedónios de Filipe e Alexandre, que nunca foram aceites 
como Gregos, pelo menos por uma boa parte. A unidade política nunca 
foi uma coisa desejada e construída por eles e adveio-lhes sempre como 
algo imposto do exterior: pelos Macedónios primeiro e depois pelos 
Romanos.
Em vez de passos no sentido da união, as cidades-estado gregas agiam 
de modo inverso: passaram o tempo da sua história, quase na totalidade, 
desavindas; combatiam-se amiúde com empenho feroz. Pretendiam dessa 
forma afinuar a sua independência, uma caraterística dos Gregos bem 
vincada. Como observa Pohlenz, a sensibilidade política dos Helenos 
constituía o mais grave obstáculo à concreta unificação, já que exigia o 
exercício imediato dos direitos políticos e a existência do sistema de pólis. 
Cada uma destas velava zelosamente pela sua autonomia - era por natu­
reza particularista (̂ )̂. Constituía um traço muito forte, a ponto de, como 
acabámos de ver, nema ameaça persa ter levado a que os lónios aceitas-
Vide J. Ribeiro Ferreira, Hélade e Helenos, pp. 140-141. 
(” ) Vide J. Ribeiro Ferreira, Hélade e Helenos, p. 142.
The Greeks, pp. 158-169. 
f L ’ iiomo greco, pp. 196 e 248-249.
33
A GRÉCIA A N TIG A
sem a proposta de Tales para se unirem e formarem um Estado único. 
A independência é quase objecto de culto por parte dos Gregos; foi esse sen­
timento que sempre se opôs a qualquer tentativa de ultrapassar o sistema 
de pólis em que gostavam de viver e que amavam profundamente 
Consideravam a pólis a única base possível de uma existência civilizada, 
como foi acentuado com vigor por Platão e Aristóteles: o primeiro toma 
a pólis como modelo do seu Estado ideal, o segundo ocupa-se em especial 
do assunto no livro I da Política. No Críton 50a sqq. e Leis 625e de 
Platão vemos quanto a pólis era apaixonadamente sentida. No primeiro 
passo, já atrás citado, ocorre a célebre prosopopeia das Leis: segundo 
estas, 0 cidadão recebe tudo da pólis, pelo que esta, que é ainda mais 
santa do que a família, tem também o direito de lhe exigir tudo, e ele não 
deve esquivar-se, mas tem a obrigação de fazer o que ela lhe ordenar C“).
Nas Leis (1 ,625e), a propósito das instituições de Creta e da Lacede- 
mónia, Clínias justifica a imposição das refeições em comunidade, susten­
tando que, desse modo, o legislador condena a insensatez da maioria que 
ignora
que a todos, enquanto durar a existência, toca uma guerra contínua contra 
todas as outras cidades.
Para o Grego, ser livre era exercer ele próprio, pessoalmente, os seus 
direitos civis, sem os delegar em outros. Foi esse desejo o maior óbice a 
uma unidade política. Seria impossível reunir toda a Hélade numa única 
pólis.
Ser agente activo na governação era realmente fundamental para os 
Helenos. Não concebiam um cidadão que, alheado, não vivesse e partici­
passe interessadamente no governo e na condução dos destinos da sua 
pólis. Nessa atitude encontraram mesmo um dos fundamentos que os 
fazia sentirem-se diferentes dos Bárbaros e em que cimentavam a sua 
superioridade em relação a eles
Era do temperamento do Grego viver em pequenos Estados indepen­
dentes, em cuja vida e organização fazia questão de participar. Só assim 
se considerava em plena liberdade. O estudo da pólis grega põe-nos pe­
rante uma tendência para a regionalização e o gosto de viver em pequenos 
espaços, em oposição às actuais centralização e formação de Estados
P“) Mesmo a formação de simaquias, que parece contradizê-lo, é, no fundo, motivada 
por esse apego à independência. Cf. V. Martin, La vie internationale dans la Grèce des 
cités (VI-IVs. av. J. Ch.) (Paris, 1940), pp. 98-101.
(‘") Vide supra p. 23-24.
Vide J. Ribeiro Ferreira, Hélade e Helenos, pp. 232 sqq.
34
A POLIS GREGA
cada vez mais vastos. A pólis constitui desse modo uma experiência his­
tórica cuja meditação tem importância e interesse para o mundo de hoje 
a balancear entre tendências contraditórias: por um lado, paradoxalmente, 
apontam-se as vantagens da regionalização e debate-se a necessidade 
de uma maior centralização; por outro, buscam-se uniões políticas mais 
amplas, mas assiste-se a um surto de fraccionamentos nacionalistas.
35
EPOCA ARCAICA
Crises de Crescimento
Aparecida a pólis por meados do século VIII a. C., nela um grupo de 
cidadãos, ora restrito, ora mais alargado, bate-se com as realidades mate­
riais e sociais que vai encontrando e transfonna-as. As diversas cidades- 
-estado evolucionam mais ou menos significativamente, cada uma com 
as dificuldades, os condicionalismos e as oposições que encontra, até 
nos oferecerem o quadro característico da época clássica. E à evolução 
da época arcaica que vou dedicar a minha análise, que se vai basear 
com mais insistência em Atenas, por ser dela que possuímos mais dados 
e infomiações. Terei de ser sucinto e deixar na sombra alguns factos, 
dada a extensão temporal que me proponho tratar e a quantidade de 
fenómenos e acontecimentos significativos que marcaram o período.
A época arcaica - cujas datas de início e final é costume situar entre 
776 e em 480 a. C., respectivamente a data tradicional dos primeiros 
Jogos Olímpicos e o ano da batalha de Salamina - é um período de 
grande vitalidade, de inovações, crises e transfonnações. A pólis modi- 
fica-se sensivelmente, a ponto de, nos começos do século V a. C., se 
apresentar em muitos aspectos diferente da que encontramos nos seus 
inícios.
Vamos tentar surpreender algumas dessas transformações através 
das obras de três poetas, distanciados entre si um século: Hesíodo, dos 
fins do século VIII e inícios do VII; Sólon que viveu no trânsito do VII 
para o VI; e Teógnis na segunda metade do VI e primeira do V a. C. 
Embora pertençam a regiões diferentes - Hesíodo à Beócia, Sólon à 
Ática e Teógnis a Mégara - os dados que nos fornecem podem ser apli­
cados a outros locais, sem grande receio de erro, já que todas as póleis, 
com pequena variabilidade temporal de umas para outras, passaram por 
fenómenos semelhantes.
Hesíodo, nos Trabalhos e Dias, fala da labuta dura e difícil do lavrador 
numa terra pouco fértil e muito dividida que quase não dá para alimentar 
uma família. Aconselha, por isso, o camponês a não ter mais do que um 
filho para, de acordo com as normas de então relativas à herança, se não
37
A GRÉCIA ANTIGA
verificar um fraccionamento maior da terra. É que, para agravar a situação, 
esse camponês estava na dependência total da vontade dos nobres. O 
poeta fala dos nobres que se deixam peitar e praticam a justiça que lhes 
convém (vv. 30-41):
Nós dividimos o nosso património, e tu de muitos dos bens, 
por roubo, te apoderaste, peitando bem os reis, 
devoradores de presentes, que praticam uma tal justiça.
Dirige-se ao innão Perses que, na divisão da herança, já lhe tirara a 
melhor parte, por corrupção dos juízes, os nobres, e agora ainda se quer 
apoderar da parte que lhe coube.
Mais elucidativo é o apólogo do gavião e do rouxinol (vv. 202-218), 
em que Hesíodo põe na boca do primeiro, que representa os poderosos, 
este modo de discorrer insolente (vv. 207-211):
Insensato, por que gritas? Nas garras de quem é muito mais forte,
irás para onde eu te levar, por bom cantor que sejas;
se me apetecer, refeição farei de ti ou te deixarei ir em liberdade.
Louco 0 que pretende medir-se com os mais poderosos: 
vê-se privado da vitória e à vergonha associa sofrimentos (').
Enfim, 0 pequeno está completamente à mercê do poderoso e de 
nada lhe vale protestar e falar de justiça. O nobre talha por onde quer e 
decide como entende.
Sólon, um século mais tarde, acusa os que enriquecem por processos 
injustos - o roubo e o saque. Na Eimomia (fr. 4 West), Sólon mostra 
uma profunda relação com a sua cidade. Manifesta preocupação pelo 
destino de Atenas, faz um diagnóstico da sua situação nos fins do século 
VII e inícios do VI a. C. e aponta as respectivas causas: eram os próprios 
cidadãos que punham em perigo a pólis, em especial os excessos e acções 
injustas dos dirigentes e dos ricos que nem os bens dos templos e dos 
santuários poupavam (vv. 5-12). Sem respeitar os veneráveis alicerces 
da Justiça, tudo roubam a saque e a sua rapina desperta a revolta, as 
lutas civis e a guerra. Sólon fala da servidão, que se pode abater sobre a 
cidade, e dos pobres lançados na escravatura. Pressagia que a ambição 
dos homens, a guerra civil e as conspirações em breve provocarão a 
ruína da pólis que ninguém conseguirá evitar (w. 13-25). Quer mostrar
(') Sobre o sentido de basileiis no primeiro passo vide West, Hesiod: Works and 
Days (Oxford University Press, 1978, repr. 1982) ad 38; J. Ribeiro Ferreira, Hélade e 
Helenos I, p. 56. Para uma análise do apólogo vide A. Bonnafé, “Le rossignol et la justice 
en pleurs (Hésiode, Traveaux 203-212)”, Bulletin de V Association Guillaume Biidé, 
1983, pp. 260-264.
38
EPOCA ARCAICA
(vv. 30-39) como a “Desordem” {dysnomia) causa a desgraça à pólis e 
como a “Boa-ordem” {eimomid) a salvada ruína e torna tudo bem orde­
nado e disposto; “endireita a justiça tortuosa”, “abaixa a insolência” e 
“tenuina com a discórdia” e com os ódios; como, sob o seu influxo, todas 
as acções são justas e os actos humanos são sensatos e prudentes (̂ ).
No fr. 34 West Sólon recusa a partilha das terras que então os campo­
neses reclamavam, pois considera que não lhe agrada usar da violência 
nem que da terra fértil da pátria possuam igual porção os bons e os maus 
(vv. 13-21) (3).
No fr. 36 West, ao fazer uma resenha da sua obra de legislador e 
governante, fala da libertação da “terra escrava”, pela surpressão dos 
horoi (Q, e dos que no país estavam reduzidos a uma humilhante escrava­
tura; da repatriação, trazendo-os do exílio, de três categorias de Atenienses 
- os que tinham sido vendidos legalmente, os que tinham sido vendidos 
ilegalmente e os que tinham fugido por medo (vv. 5-15).
Portanto, Sólon fala de nobres que se apoderaram de muitas terras, 
roubando a saque, fala de pequenas propriedades hipotecadas e de cam­
poneses que, além de perderem as terras, se tornaram escravos e foram 
vendidos. Veriflcara-se uma transferência das terras para a posse dos
(-) A bibliografia respeitante à “Eunomia” é vasta. Cito, entre outros, W. Jaeger, 
Paideia (trad, port., Lisboa, Aster, s. d.), pp. 165-169; V. Ehrenberg, Aspects o f the 
ancient world (Oxford, 1946, repr. New York, 1973), pp. 81 -86; H. Frankel, Early Greek 
poetiy and philosophy (trad, ingl., Oxford, Blackwell, 1975), pp. 220-222; A. W. H. 
Adkins, Moral values and political behaviour in ancient Greece (London, Chatto and 
Windus, 1972 (de futuro: Adkins, Moral values), pp. 47-51.
(b Era um preconceito aristocrata que já se encontra nos Poemas Homéricos e informa 
toda a época arcaica, deixando marcas na linguagem e na literatura, a ideia de que os nobres 
eram os agathoi “os nobres”, os aristoi “os melhores”, enquanto os das classes baixas 
eram os kakoi, “os maus” ou “vilãos”. Vide Adkins, Moral values, pp. 10-57.
(b Os horoi que Sólon diz ter removido são comummente interpretados como “marcos 
de hipoteca”. Como, no entanto, não foi encontrado na Ática nenhum destes marcos que 
fosse anterior ao século IV a.C., têm-se levantado dúvidas quanto ao verdadeiro significado 
da palavra no fr. citado. Para certos autores, os marcos a que se refere Sólon certificariam 
os direitos de um senhor sobre os trabalhadores da terra e sobre as colheitas dessa terra. 
Vide L. Beauchet, Histoire du droit privé de la république athénienne III (Paris, 1897, 
repr. New York, 1976), pp. 193-194; L. Gernet, Anthropologie de la Grèce antique (Paris, 
Maspero, 1976), pp. 363-364; J.V.A. Fine, Horoi. Studies in Mortgage, Real Security, 
and Land Tenure in Ancient Athens {Hesperia, Suppl. 9, Athens, 1951 (citado a partir de 
agora: Fine, Horoi)-, F. Cassola, “Solone, la terra, e gli ectemori”, Parola del Passato 19 
( 1964) 30-32 e 42-46; M. Manfredini e L. Piccirilli, Plutarco: La vita di Solone (Fondazione 
L. Valla, 1977), pp. 194-197 (de futuro: Manfredini-Piccirilli, Solone).
Tenha-se, contudo, em atenção a falibilidade do argumento exsilentio, que depende 
afinal das contingências das recuperações arqueológicas.
39
A GRÉCIA ANTIGA
nobres e ricos e a pequena propriedade quase tinha desaparecido. Aris­
tóteles {Constituição de Atenas 2.1-2) corrobora esta situação: para a 
época em questão, menciona o longo conflito que opunha os nobres à 
maioria (plêthos) e alude à “terra nas mãos de poucos”; refere que os 
pobres, com seus filhos e mulheres, “eram escravos” dos ricos e traba­
lhavam nos campos destes, mediante o pagamento de uma determinada 
renda (misthosis). O Estagirita especifica que, devido a essa misthosis, 
recebiam o nome de pelatas e hectêmoros e que, se a renda não fosse 
paga, os insolventes poderíam ser vendidos como escravos (̂ ).
Mas Sólon também nos infonna de nobres que tinham empobrecido e 
de elementos das classes inferiores enriquecidos: no fr. 15 West, w . 9-16 
refere que os vilões {kakoi) estão ricos e os nobres {agathoí) indigentes. 
Portanto temos já nesta altura um divórcio entre as noções de riqueza e 
nobreza (̂ ).
Esta alteração social acentuara-se consideravelmente, cerca de um 
século depois, no tempo de Teógnis, e muitos nobres casavam-se com 
quem não era da sua raça. Daí estas palavras, um tanto amargas, em que 
0 poeta acusa os nobres de prestarem culto ao dinheiro (vv. 189-192):
Prestam culto ao dinheiro: o nobre desposa a filha do vilão, 
e 0 vilão a do nobre; a riqueza mistura a raça.
Não te admires, Polipaides, de que feneça a linhagem
dos nossos concidadãos: o bom está a unir-se ao mau Ç ) .
Verificara-se afinal o que é frequente em épocas de crise: empobreci­
mento de umas famílias - por acomodação, negligência, falta de dinamismo 
ou dissipação - e enriquecimento de outras.
(b Embora o texto de Aristóteles fale em pobres que eram escravos {douleuo) dos 
ricos, não devemos tomar esse verbo à letra, já que os escritores dos fms do séc V e do 
século IV empregavam doidos e douleuo não apenas com o significado estrito de “escravos”, 
mas com sentido mais lato - para indicar qualquer forma de sujeição. Vide Beauchet, 
Histoire du droit II, p. 540; M.I. Finley, “The servile statuses o f ancient Greece”, RIDA, 
3 ser. 7 (1960) 165-189 = Economy and society in ancient Greece (London, 1984), pp. 
133.149.
Podem levantar-se dúvidas quanto à verdadeira forma do termo que aportuguesei 
como hectêmoros, já que as fontes antigas nos oferecem duas: Aristóteles, Constituição 
de Atenas 2 .2 , dá-nos hektêmoroi e Plutarco, Sol. 13.4 hektemorioi. Embora seja difícil 
dizer qual a melhor, parece preferível a forma aristotélica, aliás, analógica do termo 
geomoroi.
(®) Ora Aristóteles, Constituição de Atenas 3. 1 e 6, elucida que, antes de Drácon, os 
arcontes - de que depois saíam os membros do Areópago - e outros magistrados eram 
recrutados nas famílias nobres e ricas.
Ç) Tradução de M. H. Rocha Pereira, Hélade (Porto, ^2003), p. 171.
40
EPOCA ARCAICA
Mas a alteração, nessa época, era mais profunda. Teógnis refere que 
a cidade vive na insolência, que os chefes corrompem o povo e absolvem 
os injustos, na busca de proveito próprio e de poderio (w. 45-46). Consi­
dera que os nobres - “os bons” agathoi - nunca arruinam uma pólis, mas 
agora governam elementos das classes inferiores - “os maus” kakoi - , 
a quem agrada serem insolentes e procurarem o proveito próprio e o 
poder com público prejuízo (vv. 43-44 e 49-50). É esse tipo de actuação 
e de ambições que acabará por causar a destmição da pólis: embora pa­
reça repousar numa calma profunda, não pennanecerá tranquila por muito 
tempo. Em breve nascem a guerra civil, os massacres dos cidadãos; não 
tardará muito que não surja a tirania (vv. 51-52). E a concluir, Teógnis - 
dirigindo-se ao seu amigo Cimo, a que em outros passos chama Polipaides 
- lamenta as alterações sociais verificadas e que já não seja a nobreza a 
governar a cidade, mas os que outrora não conheciam as leis e andavam 
vestidos como escravos (vv. 53-57):
Cimo, esta pólis é ainda uma pólis, mas os habitantes são outros: 
outrora não conheciam nem regras nem leis,
mas em tomo dos flancos cingiam peles de cabra 
e, como veados, andavam fora da cidade;
agora são eles as pessoas de bem, Polipaides, e os bons de outrora 
são agora os vilões.
Os versos de Teógnis deixam bem claro que, nos fms do século VI a. C., 
a situação social e política da pólis se havia alterado substancialmente. 
Os que antes não tinham acesso às leis e viviam nos campos vestidos de 
peles de animais - portanto a eles equiparados - são agora os governantes 
da pólis (®). É esta a situação que Teógnis considera intolerável.
Quais os vectores das profundas transformações desses cerca de 
dois séculos e meio - segunda metade do VIII, VII e VI a. C.?
Desaparecida a monarquia, os inícios da pólis apresentam-nos o domí­
nio da aristocracia que detém todos os poderes: político, judicial, militar, 
religioso

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