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Sobre a sociedade contemporânea

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Sociedade e Contemporaneidade
A guerra televisiva 
diz presente no 
contexto de nossa 
realidade 
cotidiana.
UM OLHAR INTEGRADO 
SOBRE A SOCIEDADE 
CONTEMPORÂNEA
Por Prof.(a) Maria Clara Ramos Nery
O atentado de 11 de setembro traduz-se 
como um marco histórico no contexto do sé-
culo XXI. É importante que compreendamos 
seus aspectos. É importante que compreenda-
mos seus múltiplos aspectos. 
Compreender a sociedade contemporânea 
envolve trabalharmos com 
conceitos sociológicos es-
pecíficos que nos permitam 
traduzir adequadamente a 
complexidade da socieda-
de atual. A realidade social 
não fala de si mesma. Os 
são os cientistas sociais que 
a desvelam e a traduzem, 
através de sistemas concei-
tuais científicos. 
Neste capítulo vamos partir das teorias 
clássicas para tentarmos dar um passo além 
das delas, na busca de uma visão sistêmica 
mais complexa e adequada à compreensão de 
uma sociedade que não apresentava as atuais 
características que no tempo em que viveram 
Durkheim, Marx e Weber. Para tanto, propo-
mos abordar os seguintes conceitos: sistema 
social e subsistema social 
e realizarmos uma abor-
dagem sobre a questão 
simbólica e a constituição 
da sociedade, e, ao estabe-
lecermos essa relação, de-
monstrarmos alguns traços 
típicos da sociedade pós-
moderna em que vivemos; 
do mundo em que vivemos, 
que é complexo e plural, e 
no qual o universo dos sím-
bolos parece ocupar uma dimensão e impor-
tância antes inexistentes.
UM OLHAR INTEGRADO UM OLHAR INTEGRADO 
Antes Depois
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justificativas para conferir-se centralidade e di-
mensão histórica a esse fato, provem do da cons-
tatação de que, a partir dele, manifestaram-se 
tendências ante então latentes de mudanças antes 
não percebidas. Esse atentado, portanto, repre-
sentou um momento num processo de crise em 
desenvolvimento. 
Afirma Vizentini:
em primeiro lugar, até agora não se fez as 
perguntas adequadas sobre a questão, e 
centrou-se a reflexão em aparências dema-
siado óbvias. Em segundo lugar, o propó-
sito da resposta americana já é bem claro 
um ano depois: o início de uma longa inter-
venção na Ásia, que pouco tem a ver com 
o atentado em si mesmo, ou com a “guerra 
ao terrorismo”. Por fim, o nó da questão 
encontra-se no próprio Ocidente e em seus 
problemas internos, sendo o Oriente Médio 
apenas uma extensão do problema.3
O autor ainda chama a atenção para a ne-
cessidade de uma análise mais aprofundada da 
questão, especialmente em se considerando que 
se revelou um problema presente no mundo Oci-
dental decorrente dos desafios que se impuseram 
às potências capitalistas desenvolvidas, e as di-
ficuldades que se apresentaram como conseqü-
ência do impacto das políticas neoliberais apli-
cadas pelos governos desses países nas décadas 
de 1980 e 1990. Chomsky4 salienta que estamos 
a viver um novo tipo de guerra, no qual as armas 
encontram-se, agora, apontadas em direções di-
ferentes. 
Vizentini clarifica este aspecto quando afir-
ma que:
é cada vez mais difícil crer que os primi-
tivos “homens das cavernas” afegãs ti-
vessem condições de, sozinhos, idealizar 
e executar um atentado tão complexo e 
eficaz. Além do mais, em termos simbóli-
cos, os sinais enviados através desse ato 
A queda do Muro de Berlim foi um marco 
histórico, político e geopolítico que marcou o fim 
precoce do século XX. Já o atentado terrorista de 
11 de setembro parece anunciar-se como primei-
ro ato político do século XXI. Tratava-se agora 
de uma potência mundial, a maior de todos os 
tempos, ser atingida, pela primeira vez desde o 
ataque a Pearl Harbour, na Segunda Guerra Mun-
dial, por um inimigo externo. 
Até aquele momento, portanto, os EUA não 
haviam enfrentado uma agressão externa, embo-
ra fosse um potencial agressor menosprezado. 
Por isso, este acontecimento é um fato histori-
camente marcante. Pensadores sociais críticos 
da sociedade atual caracterizaram-no como uma 
reação na “oprimido” assume o papel de agres-
sor direto de seu opressor. Segundo Chomsky, 
“Aqueles que vêm sendo mencionados como os 
prováveis autores dos atentados são uma espé-
cie de categoria à parte, mas indubitavelmente, 
obtêm apoio de uma reserva de ressentimen-
to e raiva contra as políticas americanas postas 
em prática na região, que por sua vez são uma 
continuidade da ação política dos antigos domi-
nadores europeus”1. Nesse sentido, enfatiza-se 
uma razão histórica para tal fato, sem que, ne-
cessariamente os defensores desse enfoque me-
nosprezem o caráter de atrocidade do atentado. 
O mundo efetivamente alterou-se 
com tal fato? 
Numa tentativa de resposta, à primeira vista 
seria adequado responder que não. Mas, pare-
ce evidente que é demasiado relevante e carre-
gado de significados simbólicos, o fato de uma 
potência hegemônica como os EUA sofrer uma 
agressão externa, partido de um inimigo poten-
cialmente muito mais fraco, e demonstrando com 
isso, uma vulnerabilidade e uma fragilidade até 
então impensadas. Segundo Vizentini2, uma das 
A marca violenta da instabilidade: 
o 11 de setembro e a guerra 
dele resultante
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do Conselho de Segurança da ONU. O atentado 
às torres gêmeas, nesse sentido, ofereceu aos 
EUA um pretexto para “legitimar” a guerra con-
tra Saddan Hussein, como prioridade das rela-
ções internacionais.
No entanto, esse fato se anuncia como que 
contraditório, pois a luta contra o terrorismo não 
parece envolver especificamente os ditames das 
políticas internacionais, mas a “combinação de 
ação policial, serviços de inteligência e políticas 
socioeconômicas destinadas a eliminar as causas 
do fenômeno e não através de operações milita-
res convencionais”8. 
Outro aspecto relevante quanto ao atentado 
diz respeito ao fato de que também ficou de-
monstrado que os EUA reservam para si mesmos 
o exclusivo direito de agir à revelia das leis inter-
nacionais, inaugurando uma tentativa de imposi-
ção do “unilateralismo” como visão estratégica 
do governo Bush para o papel dos Estados Uni-
dos na arena mundial. 
Afirma Vizentini:
[...] a economia estadunidense desacelera-
va seu crescimento, e os mercados inter-
nacionais e bolsas de valores ingressavam 
numa era de instabilidade, agravada pelo 
colapso econômico-financeiro de vários 
países. Então o século XXI inicia com um 
governo fraco e deslegitimado, o que é 
agravado por atitudes unilaterais. Em se-
guida, ocorre o 11 de setembro, chocando 
e traumatizando a população americana e 
do Primeiro Mundo, mas dando aos EUA 
uma nova iniciativa. Seguem-se medidas de 
segurança com custos insuportáveis, cer-
ceamento das liberdades civis e um reforço 
violento parecem ser demasiado sutis para 
ter sido pensados por cérebros dotados de 
uma lógica tão rasteira; até porque a res-
posta seria a possível eliminação do Gru-
po Al Qaeda e do regime talibã. Sem ade-
rir a teorias conspirativas, é importante 
lembrar que, dois dias antes do atentado, 
o Comandante Massud foi assassinado. 
Este líder da Aliança do Norte seria, num 
governo pós talibã, um homem indepen-
dente. Portanto, isto sugere que a guerra 
já estava planejada antes dos atentados e 
que o futuro governo deveria ser dócil ao 
Ocidente, como de fato o foi.5
Precisamos ter presente a lógica aplicada 
por este autor quanto a esta questão, e neste sen-
tido, entendermos o atentado de 11 de setembro 
como uma “resposta” a uma guerra não anuncia-
da e que o atentado simplesmente a precipitou. 
Essa guerra foi a Guerra do Golfo, que uniu as 
potências mundiais, com o aval da ONU, na rea-
ção à invasão do Kwait pelo o Iraquegovernado 
pelo ditador Saddam Hussein. 
Haveria, portanto, uma lógica “perversa” 
em todo o processo que levou ao atentado, pois, 
segundo Vizentini6, a guerra contra o Iraque era 
uma forma de isolar posteriormente o Irã, que, 
por sua vez, aliou-se à China e à Rússia, esta-
belecendo um contraponto geopolítico regional 
aos países que impulsionaram as políticas neo-
liberais de enfrentamento aos desafios da glo-
balização. Da mesma forma, o virtual controle 
Iraquiano sobre a região causaria danos à eco-
nomia européia, pois a Europa é dependente do 
petróleo do Golfo Pérsico, o que, como conseqü-
ência debilitaria o Euro, moeda continental nova 
e que concorre com o dólar no mercado cambial 
global. A guerra funcionou como um pretexto 
que, em dando “certo”, atenderia aos interesses 
americanos, mas não só, no mundo.
Segundo Vizentini7, a resposta norte-ame-
ricana ao atentado gerou conseqüências mais 
sérias, a partir do momento em que levou insta-
bilidade à região. A posterior invasão do Afega-
nistão e do Iraque, como atitudes unilaterais dos 
Estados Unidos, inclusive contra a vontade de 
seus aliados na guerra de libertação do Kuwait 
de anos antes, fez com que os EUA estejam en-
frentando um decréscimo do apoio vindo da Eu-
ropa, dos países Árabes e dos demais membros 
E a potência mundial adquire o direito de ma-
tar, sem considerar as diferenças culturais existentes 
entre os povos do mundo.
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das atitudes belicistas e unilateralistas, que 
não param de surpreender a comunidade 
internacional. No entanto, tudo isso deu à 
administração americana um eixo definido 
de política externa, embora com crescente 
resistência mundial, começando por seus 
próprios aliados. Assim, como tudo na his-
tória, o balanço posterior é ambíguo. Por 
um lado, a autoconfiança da população foi 
derrubada, e a crença internacional de que 
a segurança americana era inexpugnável 
já não existe, embora pouco se fale disso 
no momento. Num quadro de instabilidade 
econômica doméstica e global, se revelam 
igualmente fraturas internas nos EUA e no 
Ocidente.9
As incertezas provocadas pela presença de 
uma nação poderosa marcam o contexto presen-
te, e a ambigüidade se projeta sobre as tendências 
inauguradas pela entrada no século XXI. Assis-
timos a emergência de guerras mais dramáticas 
do que as anteriores; o crescimento do papel dos 
meios de comunicação como fator interveniente 
nas relações econômicas e políticas; a globaliza-
ção como fonte geradora de desemprego estrutu-
ral; a transição da produção industrial tradicional 
para a economia de serviços e o deslocamento 
das indústrias tradicionais para os países perifé-
ricos; a instabilidade financeira internacional e a 
adoção da democracia liberal na maioria dos pa-
íses, como conseqüência da falência do chamado 
socialismo real.
O que torna o 11 de setembro um 
fato não isolado no contexto da 
sociedade Ocidental? 
A noção de sistema social, também nos per-
mite a formulação adequada de uma resposta a 
esta questão. Devemos compreender o conceito 
de sistema social como um conjunto interdepen-
dente de elementos culturais e estruturais.10 Tra-
ta-se de uma totalidade constituída de partes con-
catenadas, no interior do qual cada parte, sendo 
semi-autônoma numa dimensão da sua função, é 
dependente das outras partes como componente 
de um sistema que é.
O conceito de sistema social envolve a com-
preensão de que estamos utilizando um funda-
mental princípio sociológico que propõe que o 
todo é maior do que a soma das partes. São im-
portantes as palavras de Johnson, quando afirma 
que:
[...] as partes que entram na composição 
de um sistema social são menos importan-
tes do que o próprio sistema e as relações 
que o constituem; a menos, é claro que 
aconteça que as partes sejam sistemas 
sociais. Assim, seres humanos individuais 
são analiticamente sem importância, ex-
ceto em relação à posição que ocupam em 
sistemas sociais. Este fato, porém, não os 
deixa fora do contexto sociológico, uma vez 
que virtualmente tudo que experimentamos 
e fazemos, relaciona-se de alguma maneira 
com as limitações impostas pelos sistemas 
sociais.11 
Nas palavras de Johnson, podemos verificar 
que sistema social é um conceito nos permite 
assumir uma noção estrutural e estruturante do 
nosso objeto, pois ele diz respeito a elementos 
materiais e imateriais interdependentes, isto é, 
à forma como diversas partes que compõem um 
todo se encontram ajustadas umas em relação às 
outras.12 
Outro aspecto importante a verificarmos 
no conceito de sistema social aplicado á análise 
da sociedade contemporânea, é que ele abrange 
dimensões totalizantes da realidade. Se tomar-
mos como referência Parsons13, verificamos que 
ele estabelece uma concepção do sistema social 
como um novo enfoque analítico sobre a relação 
indivíduo e sociedade, que envolve o real e o sim-
bólico simultaneamente, pois ambos afetam pro-
fundamente a vida e a ordem social, no sentido 
mesmo de dirigir o que as pessoas pensam, sen-
tem ou fazem sob influência do ambiente social, 
num contexto em que os meios de comunicação 
A instabilidade no 
mundo se instaura em fun-
ção de uma única mente que 
não consegue trabalhar com 
as diferenças e determina-
ções culturais no mundo em 
complexidades. 
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avançam sobre os espaços da mediação social. 
Neste sentido, encontramo-nos influenciados, 
também, por um sistema de valores, de fatos e de 
normas, que permite a integração social, na me-
dida em que nossas ações são constituídas pelas 
estruturas sociais e pelos processos que em maior 
ou menor grau incorporam nossas intenções e 
vão fazer parte integrante das situações concre-
tas que são traduzidas nas instituições sociais. 
 
Sob esse ponto de vista, o atentado 
terrorista de 11 de setembro pode 
ser visto por novos e diversos ângu-
los complementares e integrados? 
Como acontecimento, o atentado influiu 
drasticamente na estrutura das próprias relações 
internacionais e do poder político entre as nações 
e dentro das nações. Mas também, influiu nas 
representações que indivíduos e grupos criam 
ao interpretarem a realidade social que os cerca, 
com base nas condições presentes num ambiente 
que supera as intenções e forças motivacionais 
dos denominados atores sociais. 
Quais as conseqüências do 
atentado? 
A partir dele, instaura-se um processo de 
insegurança e de incertezas no psiquismo indi-
vidual, não apenas das pessoas mais diretamen-
te atingidas, no momento em que se percebe 
que quaisquer alvos ligados aos interesses das 
potências-alvo, em qualquer lugar do mundo. O 
sentimento de insegurança de quem se encontra 
à mercê dos fatos, a mercê das circunstâncias, 
introduz um traço estrutural e psicossocial mar-
cante de nossa contemporaneidade. O psiquismo 
individual e coletivo passa a ficar marcado por 
uma contingência inusitada determinada pela 
conexão das vidas humanas em sentido macro, 
como parte integrante do sistema social global 
novo, e em sentido micro, na medida em que essa 
dimensão da realidade passa a fazer parte da vida 
cotidiana de indivíduos e grupos.
Com base em Parsons14, os subsistemas 
constituem-se de quatro elementos: subsistema 
social, subsistema cultural, subsistema político e 
subsistema econômico. Segundo Nery15, o sub-
sistema social possui como componente de sua 
estruturação o conjunto de normas e de regras 
presentes no contexto das sociedades. O subsis-
tema cultural baseia-se nos valores pertinentes 
aos componentes da estrutura social, e a própria 
conservação dos modelos culturais. O subsis-
tema político, que Parsons16 classifica como de 
personalidade, tem seu componente estrutural a 
coletividade e envolve finscoletivos. No subsis-
tema econômico que o autor classifica como or-
ganismo de comportamento, encontra-se a fun-
ção primária de adaptação ao ambiente em sua 
totalidade.
Os indivíduos e grupos internalizam todo um 
sistema de normas com as quais se identificam e 
estabelecem o que podemos denominar de reper-
tórios de ações individuais e coletivas. Os sub-
sistemas culturais envolvem a organização dos 
valores, idéias, hábitos 
e crenças, bem como 
as normas e também 
A imagem ao 
lado nos fala con-
sequentemente 
do contexto da 
complex idade, 
c o m p l e x i d a d e 
nas ciências na-
turais e exatas 
e complexidade 
existente também 
no campo das re-
lações sociais. 
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E a civilização é 
ferida de morte por ele-
mentos que ela mesma, 
em seu processo civi-
lizador, criou, ficando 
sem rumo certo para 
seguir adiante. 
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os símbolos, com os quais indivíduos e grupos 
orientam sua existência individual e coletiva, es-
tabelecendo os meios e os fins de suas ações. É 
importante ter claro que ao compartilharmos os 
elementos presentes no subsistema cultural é que 
temos a constituição da estrutura social.17 
Pode-se verificar, então, que há uma relação 
de interdependência entre os subsistemas, social, 
cultural, político e econômico, na medida em que 
toda e qualquer sociedade pode ser compreendi-
da como resultado da interação destes subsiste-
mas.18
Com base no conceito de subsistemas so-
ciais, verificar as funções de cada um no gran-
de sistema social globalizado contemporâneo. 
O subsistema político, no contexto da socie-
dade atual, envolve assegurar o sistema de re-
presentatividade democrática através do qual 
são deliberados os fins coletivos. O subsiste-
ma econômico envolve a garantia de eficiência 
econômica das nações, o que também envolve 
melhoramento adaptativo. O subsistema social 
tem por finalidade a garantia da integração e 
da coesão social; envolve a integração e social, 
especialmente na interface como o subsistema 
econômico. E, o subsistema cultural envolve o 
processo de socialização dos valores culturais 
e representações coletivas da realidade, função 
antes cumprida pelos rituais e pela tradição, e 
hoje fortemente influenciado pelos meios tecno-
lógicos de comunicação através de redes digitais. 
Como se poderia, então, estabe-
lecer uma relação entre os sub-
sistemas sociais e o fato histórico 
de 11 de setembro?
Com relação ao subsistema político, que 
envolve a questão da democracia tal como de-
fendida representada historicamente pelos EUA, 
assim como componente da retórica do enfren-
tamento ao terrorismo, convém observar-se que 
a própria postura norte-americana nas relações 
internacionais colocou em questão alguns valo-
res básicos da democracia, na medida em que os 
EUA desrespeitaram pressupostos da ordem jurí-
dica internacional e consubstanciados pela ONU. 
Os fins políticos determinados pelos interesses 
norte-americanos foram impostos aos interesses 
coletivas da maioria dos países Ocidentais, in-
clusive pondo em risco o equilíbrio das relações 
internacionais. Com relação ao subsistema eco-
nômico, a o desempenho norte-americano, pelo 
próprio custo da guerra com o Iraque, tem sido 
questionado, dada sua fragilidade, claramente 
comprovado pela queda do dólar gerada pelo dé-
ficit público. 
No que concerne ao subsistema cultural, 
no qual se expressa o imaginário coletivo da so-
ciedade global emergente, suas representações 
e valores, assiste-se a explosão da diversidade 
despertada pelo contato das diferentes culturas 
com as informações em profusão nas redes de 
comunicação, revelando uma evidente dificulda-
de dos EUA para lidar com essa pluralidade, que 
se apresenta com parte do novo subsistema social 
mundial em formação. O surgimento de novos 
tipos de conflitos violentos como o que emerge 
com o terrorismo e a reação que ele desperta, in-
troduz um componente desestabilizador das re-
lações interculturais que poderiam da origem a 
um novo sistema pacífico e estável de relações 
internacionais.
Pensarmos acerca do poder simbólico e da 
constituição da sociedade é pensarmos acerca 
dos elementos constituintes do que denominamos 
E o mundo está de luto, pelas guerras e 
instabilidades nele existentes.
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de subjetividades. A subjetividade individual é 
construída socialmente. A projeção de um siste-
ma social global novo remete-nos à necessidade 
sua sustentação pelo equilíbrio do todo, nas aspi-
rações individuais dos integrantes desse sistema 
em todas as suas esferas e dimensões.
Dubar19 trabalha a constituição da identida-
de como sendo fundamentalmente originária do 
processo de socialização, e, neste sentido, a so-
cialização constitui os indivíduos ao mesmo tem-
po em que define o perfil das instituições sociais. 
É no processo de interação que os indivíduos se 
constituem, pois nele encontramos a presença do 
compartilhar sentidos e significados, que uma 
vez internalizados possibilitam a construção de 
específicos repertórios de ações individuais e 
coletivas, que, por sua vez, acabam por constituir 
subjetividades e identidades. 
As formas de produção simbólica são im-
portantes e significativas para compreendermos 
a sociedade. Devemos compreender que todo 
símbolo representará algo para além de si mes-
mo. Pensarmos o poder simbólico e a constitui-
ção da sociedade é pensarmos na representação 
que fazemos da sociedade, nas formas como esta 
sociedade é representada em nós mesmos. A so-
ciedade não se constitui simplesmente em sua di-
mensão concreta que pode ser traduzida por suas 
instituições sociais, mas também, se constitui de 
sistemas culturais, tal como vimos anteriormen-
te, que sofrem modificações na dinâmica presen-
te no social. 
Estamos vivendo um período que se deno-
mina de pós-modernidade. Neste período da his-
tória humana as condutas individuais e coletivas, 
assim como a mediação das relações sociais, é 
fortemente influenciada pela presença abrangen-
te, ubíqua e permanente dos meios de comunica-
ção, que constituem parte inseparável do ambien-
te no qual se dá a construção das representações 
individuais e grupais. Assistimos a perda de for-
ça da fé na universalidade da razão humana, a 
dissociação entre saberes especializados e o sa-
ber do senso comum, que, por sua vez, refletem 
os deslocamentos de poder e a fragmentação que 
contagiam o saber científico, instaurando-se um 
contexto de descontinuidades e conflito20.
Segundo Martelli, “O pós-moderno, a nos-
so ver é exatamente isto: a re-interpretação de 
significados a símbolos presentes tanto na tra-
dição como na modernidade e até no arcaico, 
mas de maneira seletiva e mediata sem ilusões 
sobre a existência de atalhos míticos em dire-
ção ao“paraíso perdido” e guiada pela inten-
ção de formar a vida cotidiana mais dotada de 
sentido”21. 
A complexidade das relações sociais é po-
tencializada, pois os elementos da modernidade 
e da pós-modernidade coexistem na esfera cultu-
ral cultura e nos modelos referenciais de indiví-
duos e grupos e nas suas representações sociais, 
porque a força motriz desse processo reside nas 
descontinuidades entre as linhas referenciais 
fornecidas pela sucessão de gerações.22 Neste 
sentido, tudo tende a misturar-se o tempo todo, 
produzindo efeitos “micro” e “macro” sociais, 
tais como: des-historização de experiências; des-
localização das relações sociais; sentido de imo-
bilidade como resultado da experiência de acele-
ração contínua o tempo todo e da rotinização da 
novidade técnica; des-realização; fragmentação 
da identidade; deslocalização; desenraizamento; 
transitoriedade; sensação de não-pertencimento;deslocalização da experiência e incapacidade do 
fornecimento de representações sociais adequa-
das à hipercomplexidade.23 Podemos observar 
que encontramo-nos na sociedade dos símbolos, 
fazendo com que tenhamos a presença de novas 
representações sociais a todo instante. Aconteci-
mentos com o 11 de setembro, por exemplo, em 
alguns instantes provocam alterações profundas 
na representação socialmente construída em re-
lação à presença dessa potência, como realidade 
ou como imagem projetada em todo o mundo.
Para analisarmos alguns traços marcantes 
da pós-modernidade que levam à nova consti-
tuição da sociedade desse novo momento histó-
Nunca imagi-
namos que tal fato 
poderia acontecer 
em nossa sociedade 
civilizada. 
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rico, portanto, é interessante observarmos o que 
nos diz Gadea24, por exemplo, ao afirmar que 
no âmbito das formas como as pessoas pensam 
e definem suas respectivas situações vitais e as 
conseqüentes concepções da ordem social, des-
cobrimos que a forma de percepção do tempo 
é praticamente dirigida pela contingência; pela 
eventualidade como orientação temporal das 
condutas. A profusão de imagens, informações e 
demandas, leva à priorização do presente cons-
tante; do aqui e do agora, do imediatismo a reger 
as condutas de indivíduos e grupos. Já a relação 
com o transcendente; com o divino, nesse con-
texto faz emergir a crise da razão e um novo pro-
cesso de reencantamento do mundo. Como busca 
da felicidade traduz-se como concepção lúdica 
da vida; e, a organização social vê surgir uma 
“nova-comunidade”, na qual os vínculos sociais 
também são determinados pela contingência e 
pela eventualidade.
Vivemos, então, num contexto de instabili-
dades na sociedade dos simulacros, dos símbolos. 
Nesse contexto, talvez numa dimensão sequer es-
perada por seus protagonistas, o 11 de setembro 
se constituiu num símbolo de questionamento de 
uma estrutura de poder até então inquestionável, 
mas também numa reflexão mais abrangente so-
bre a própria condição humana numa sociedade 
que é capaz de produzir um acontecimento como 
esse, ao mesmo tempo “medieval”, na figura dos 
guerreiros suicidas de Bin Laden, e pós-moderno 
nos contornos, formas e dimensões que assumiu.
Já no âmbito da ordem social emergem as 
diferenças, a heterogeneidade, o reconhecimen-
to social, o respeito; reivindicados como princí-
pios galvanizadores de uma nova afetividade, no 
sentido de que nos juntamos por proximidades, 
por sociabilidades; por identidades. No que diz 
respeito aos princípios de legitimação da reali-
dade, emergem diversas “realidades” construídas 
pela multiplicidade de sujeitos e suas múltiplas 
representações do mundo tal como percebidas 
nos vários ambientes em cada um constrói suas 
identidades mutantes e multifacetadas. A múlti-
pla combinação de relações possíveis entre esses 
“personagens” dá origem a um mundo de relações 
reais e virtuais hipercomplexas e multidimensio-
nais, revelando uma faceta da pós-modernidade 
que envolve a ausência da função integradora de 
agregação social.
Num contexto com essas características, o 
11 de setembro é mais do que um marco histórico 
apenas. Se, por um lado, ele expressa dimensões 
do passado incrustado no presente; como os ve-
lhos conflitos entre o Oriente e o Ocidente, entre 
dominadores e dominados, entre imperialistas e 
colônias, ainda que sob outras formas, não seria 
possível compreendê-lo em todas as suas facetas 
e implicações se reduzíssemos um acontecimento 
dessa magnitude e significado, à simplicidade di-
cotômica do bem contra o mal, que cada uma vê 
como quer na dinâmica de conflitos como esse. 
Há mais, muito mais do que as vãs filosofias do 
passado são capazes de perceber, por trás de um 
acontecimento como o 11 de setembro. Se qui-
sermos e soubermos construir os instrumentos 
de análise adequados à sua compreensão, talvez 
possamos, fechando o foco no atentado mesmo, 
identificar todos, ou quase todos, os ingredientes 
que caracterizam o sistema social do mundo em 
transformação. 
De onde viemos? Talvez saiba-
mos. 
Mas, diante de um mundo assim, so-
mente novas interrogações encon-
tramos quando nos perguntarmos: 
Quem somos? 
Onde estamos? 
Para onde vamos?
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Sociedade e Contemporaneidade
E, talvez estejamos diante do espelho a dizer o seguinte:
Espelho, 
espelho 
meu, existe 
alguém mais 
civilizado do 
que eu?
1 CHOMSKY, 2003, p. 13.
2 VIZENTINI, 2002.
3 Ibid., p.173.
4 CHOMSKY, 2003.
5 VIZENTINI, 2002, p.175.
6 Ibid.
7 Id.
8 Ibid., p. 174.
9 Ibid., p. 175.
10 JOHNSON, 1997.
11 Ibid., p. 209.
12 BIROU, 1982.
13 PARSONS, 1968.
14 Ibid.
15 NERY, 2007.
16 PARSONS, op. cit.
17 QUINTANEIRO, 2002.
18 PARSONS, op. cit. 
19 DUBAR, 2005.
20 MARTELLI, 1995.
21 Ibid., p. 419-420.
22 Ibid.
23 Id.
24 GADEA, 2007.
 Talvez um dia, tentando re-
solver as graves questões que es-
tão a nos inquietar, consigamos 
a paz necessária para darmos 
respostas as nossas mais signi-
ficativas questões humanas.
 Talvez um dia as novas 
gerações desenvolvam suas me-
lhores dimensões e consigam 
cuidar de nosso mundo huma-
no desta forma que nos retrata 
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