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I JUCA-PIRAMA, GONÇALVES DIAS

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#66
I Juca-Pirama, Golçalves Dias
Oi! Sejam bem-vindos! Este é o Literatura Oral, podcast de leitura comentada e de sugestões literárias. Eu sou Sabrina Siqueira.
Na última postagem, que foi a faixa bônus 6, li a minha crônica “Centenário de Paulo Freire ou A lição do átomo”, publicada em Paralelo 29. E no último episódio eu li o conto “A casa de boneca”, de Katherine Mansfield. Te inscreve no canal e deixa teu like, que hoje vou ler a poesia I Juca-Pirama, de Gonçalves Dias.
Há poucos dias morreu o ator Luis Gustavo, e um dos personagens dele que eu lembro de ver quando era criança, era um radialista que tinha o bordão “meninos, eu vi”! Era na novela Salvador da pátria, e o nome do radialista era Juca Pirama, numa alusão ao poema de Gonçalves Dias. Essa novela é de 1989, escrita por Lauro Cezar Muniz e colaboradores, e conta a história de um homem simples levado a concorrer a um cargo público, se não me engano. Mas ele é influenciado por gente mal intencionada. O protagonista era interpretado pelo ator Lima Duarte. No mesmo ano, na vida real, no primeiro ano de eleições democráticas no Brasil, depois de mais de duas décadas de ditadura militar, um outro homem do povo concorria à presidência da república, mas perdeu, em parte porque a elite tem medo da implantação do comunismo, que ela nem sabe direito o que é e nem se esse tal homem tem alguma relação com o comunismo, e em parte pela falta de educação de classe e de política do brasileiro, que preferiu eleger um rico alavancado pela mídia, com o discurso de salvar o país dos marajás. Esse rico super mal intencionado confiscou a poupança dos brasileiros pobres que conseguiram juntar algum dinheirinho e sofreu impeachment por ser ele próprio o maior marajá que o Brasil já tinha visto. A palavra marajá saiu de circulação, mas quem não desapareceu foi o tal político representante da elite sem noção brasileira. Ele é mui amigo e acho que até está na equipe de governo do atual presidente, que repete exatamente a mesma trajetória dele. Eu espero que o naro siga os passos do Fernando Collor até o final e perca o cargo com impeachment o quanto antes. A memória curta do brasileiro pra política é lamentável! Eu sei de gente que viu os pais perderem o dinheiro da poupança e em 2018 usaram avatar do naro nas redes sociais, e continuam apoiando de camiseta amarela o desgoverno. Sobre o homem do povo que tinham medo que fosse implantar o comunismo, mais tarde ele foi presidente por 8 anos e o Brasil não soube nem pra que lado ficava o comunismo. O que aconteceu foi que muita gente conseguiu acessar universidades, com bolsas de pós-graduação, muita gente foi estudar e trabalhar em institutos federais, com alto nível educacional, muita gente fez curso profissionalizante e conseguiu se colocar no mercado de trabalho e, claro, isso incomodou aquela pequena parcela de gente que se autoproclama elite, mas são apenas privilegiados, mesmo. Eu lembro vagamente dessa novela, mas parece que o protagonista, o Sassá Mutema, ganha uma eleição e não corresponde ao que o povo esperava. Quer dizer, não existe um salvador da pátria. Não existe mito em política. Mito deixa pra literatura. Na política existem pessoas cheias de defeitos que decidem trabalhar pelo povo por um tempo. E é bom que lembrem que estão trabalhando a serviço do povo. E a nossa função é cobrar e fiscalizar e cobrar de novo. Político não é celebridade, nem faz favor pra ninguém. Ninguém vai pra política obrigado. 
Tá, e sobre o autor do poema? Golçalves Dias nasceu em 1823, no Maranhão, e morreu em 1864, num naufrágio, próximo ao seu Estado Natal. Além de poeta, trabalhou como jornalista, advogado e professor. Sua produção literária está inserida na primeira geração do Romantismo, ou geração indianista ou nacionalista. Um de seus poemas mais famosos é Canção do exílio, que foi muito parodiado. Ele também escreveu peças de teatro. 
I Juca-Pirama é um POEMA DE X CANTOS, publicado em 1851, na primeira fase do romantismo brasileiro, a fase indianista. É a história de um jovem Tupi que se perde e é pego pela tribo inimiga, os Timbiras, porque ele havia entrado no território deles. Eles iniciam o ritual de morte do guerreiro Tupi, pintando o corpo dele. Nisso ele chora e pede pela sua vida, porque era o único a cuidar do pai, cego. E aí o chefe Timbira o libera, considerando-o covarde. Porque pelo ritual Timbira de morte aos inimigos, eles praticavam canibalismo, mas não queriam se alimentar da morte de um covarde. O índio encontra o pai e os dois retornam à aldeia Timbira. Lá, o pai descobre que o filho chorou, pedindo pra não ser morto. Enfurecido, lança uma maldição sobre o filho. Então o índio Tupi luta para provar sua coragem. Com isso, a tribo Timbira concede a ele uma morte digna de guerreiro, porque perdoar por ele ter pisado no território deles não tava em questão, e eles passam a contar a história desse Tupi valente e do seu pai, orgulhoso. Ele tinha provado sua honra também ao retornar pra tribo inimiga, depois de explicar pro pai o que aconteceu. Sobre o título do poema, em língua Tupi, I Juca-Pirama significa “aquele que deve morrer”. Não tem referência a nomes próprios dentro do poema, somente aos nomes das tribos inimigas, Tupi e Timbira. 
Mas deixa eu explicar melhor, canto a canto, o que se passa nessa poesia. O canto I narra o quanto a tribo Timbira é brava e põe medo nas outras tribos. O índio Tupi se perde e é feito prisioneiro. Preparam o ritual, pintando o corpo dele, cortando o cabelo e colocando as penas e os enfeites do rito. O canto II mostra o prisioneiro resignado com a própria morte, até que lembra do pai e faz uma expressão facial que demonstra preocupação. Então o chefe Timbira pergunta o que aconteceu. Muito atencioso do chefe, perguntar o que incomoda o prisioneiro, afinal ele só vai morrer queimado e ser comido pelos inimigos, o que poderia estar incomodando essa pessoa? No canto III o chefe Timbira diz ao prisioneiro que conte seus feitos, que fale. O canto IV é o canto de morte, a parte mais conhecida desse poema. O guerreiro Tupi se apresenta, chora e implora pela vida, dizendo que o pai doente e cego só tem a ele e está esperando, com fome, pela volta dele da floresta. No canto V o chefe Timbira manda que o soltem, liberta o prisioneiro. Não por compaixão, pela história que ele contou, nada disso. É porque não quer comer carne de covarde mesmo. No canto VI o Guerreiro Tupi retorna pra junto do pai, que estranha o quanto ele demorou. Ele sente o cheiro das tintas ritualísticas no filho, sente a cabeça raspada pro ritual, sente as penas e entende que o filho fugiu de ser morto pelos inimigos. E não pensa duas vezes. Pede que o filho o leve à tribo dos Timbiras, que ele vai entregar o próprio filho pra morte e pedir que algum dos Timbiras assuma o papel do filho e cuide dele. Que paizão, hein! No canto VII, chega lá e pede que façam o fogo pra queimar o filho que cuidava dele. Mas aí escuta do chefe Timbira que o filho chorou, que é covarde, ninguém quer comer ele. E aí no canto VIII o velho fica puto e destrata o filho. Só porque o filho chorou em presença da morte e pediu pra ficar vivo e cuidar dele. E lança maldições terríveis contra o filho. Que código de honra esvaziado de compaixão e de criticidade esse! O velho faz um discurso amaldiçoando o filho, e é muito mais rígido que a tribo inimiga. Com um pai desses, ninguém nem precisa de outro inimigo. No canto IX o guerreiro luta pra demonstrar que não é covarde e o velho fica tão emocionado que chora! O choro dele tá liberado! É um velho ingrato e hipócrita. Mas claro, eu to analisando desse jeito pelos meus valores, é claro que Gonçalves Dias tinha outra perspectiva de interpretação pro poema. O canto X é afastado temporalmente desses acontecimentos, dá um salto no tempo, é um Timbira que presenciou tudo contando às gerações mais jovens sobre a coragem desse guerreiro Tupi. E quando alguém duvidava dele, ele dizia, “meninos, eu vi”! 
É uma obra que sugere selvageria entre os índios, que mostra os índios como negativos. Sópor alguém ter entrado no território da outra tribo, teria que morrer. Vamos lembrar que o europeu invadiu o território não de uma, mas de muitas tribos indígenas, e não foi morto, foi até bem acolhido em alguns casos. Mostra os índios com atitudes reprováveis. Que pai é esse, que reprova a atitude do filho de querer cuidar dele, e duvida da coragem do filho na frente de estranhos e inimigos? 
Esse tipo de texto reforça a ideia de que os índios são belicosos, violentos, inflexíveis, quer dizer, reforça somente aspectos negativos dos indígenas. Mesmo o guerreiro Tupi, que se mostra corajoso e bom filho, porque volta pra cuidar do pai, é bobo ao voltar e se entregar pra morte, acatando uma regra questionável, de ter que morrer porque pisou sem querer na área Timbira. 
Eu não duvido que houvesse violência entre as tribos, mas a escolha por parte do autor em destacar esse aspecto da cultura indígena corresponde a uma necessidade de reafirmação de que a colonização europeia era necessária e de que teria sido justa, como forma de conter a selvageria. Parece que valida a invasão do europeu, a destituição do espaço do indígena, toda truculência do homem branco, toda falta de respeito. 
Como é uma obra do século XIX e que emprega alguns vocábulos da cultura indígena, têm algumas palavras diferentes pro leitor de hoje. Separei aqui algumas que soam estranhas pra mim, vê se tu conhece: mendaces é mentirosas, traiçoeiras; acervar é amontoar, acumular; canitar é um adorno de penas usado na cabeça, em cerimônias; enduape é um fraldão de penas; piaga é a mesma coisa que pajé; e nado o sol é nascer do sol. Iverapeme é o nome de uma arma cerimonial com que alguns povos indígenas matavam os prisioneiros de guerra. Ignavo é sem coragem. Aparecem também algumas formas reduzidas, como as palavras imigo, pra inimigo, e mi, pra mim. 
Vamos à leitura!
VINHETA
O narrador do poema é um velho Timbira, que esteve presente na morte do guerreiro e viu como aconteceu, agora conta aos jovens aquele ato de coragem. Além da voz narrativa aparecem a voz do guerreiro, do chefe Timbira e do pai Tupi. O poema de Golçalves Dias tem ritmo, e é um ritmo que remete ao tambor indígena. Esse autor dá mais ênfase à poeticidade do que à rigidez formal dos versos. Que bom! Ele valoriza mais o que está dizendo, que soe de forma bonita e agradável pro leitor, do que a metrificação rígida. 
O poema I Juca-Pirama mostra o conceito de coragem do indígena ligado ao fato de não chorar. Esse conceito de bravura, principalmente masculina, preponderou por muito tempo. O guerreiro Tupi é um homem à frente do seu tempo. Pra mim o maior ato de coragem dessa personagem foi ter chorado em frente ao inimigo, quando era tido por certo e esperado que guerreiros não choram. É preciso muita coragem pra admitir medo, e assumir seus sentimentos, e chorar em público. 
Essa máxima de que homem não chora já deve ter provocado muito problema. Tá na hora de exaltar o guerreiro Tupi pela que foi a sua real manifestação de coragem: chorar. 
Hoje li o poema I Juca-Pirama, de Golçalves Dias. Fiquem bem, fora bolsonaro e até o próximo episódio do Literatura Oral.

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