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1 MBA EM GESTÃO EMPRESARIAL Para profissionais de todas as áreas LIDERANÇA PROPOSTIVA E A GESTÃO DE PESSOAS Inspirando e dando significado ao trabalho e à vida das pessoas Jorge Bertolino Filho 2 BERTOLINO FILHO, Jorge Liderança Propositiva e a Gestão de Pessoas: Inspirando e dando significado ao trabalho e a vida das pessoas. (livro-texto) / Jorge Bertolino Filho – São Paulo: Pós-Graduação Lato Sensu UNIP, 2020. 3 Liderança Propositiva e a Gestão de Pessoas APRESENTAÇÃO Caro aluno Hoje iniciamos uma nova jornada rumo ao conhecimento. Nesta disciplina vamos discorrer sobre um tema que, apesar de bastante debatido, continua sendo apaixonante, porque representa um dos propulsores da evolução humana. Estamos nos referindo à Liderança. Talvez possa parecer exagero atribuir à liderança um papel tão determinante na vida do homem, mas acredite, não é. Desde que o homem surgiu neste nosso pequeno planeta azul, a liderança vem balizando seu comportamento e, consequentemente, sua forma de viver. É claro que não estamos nos referindo apenas ao líder empresarial, mas à todas as pessoas que com visão inspiradora conseguem nos indicar um caminho que vale a pena ser trilhado. Estamos sim, nos referindo ao pai ou à mãe, que com sua liderança afetiva contribui para direcionar o destino dos filhos. Ao amigo, que sem nenhum interesse subjetivo, utiliza sua liderança ajudando-nos a reencontrar a dignidade e a força nos momentos mais difíceis. Ao líder filantropo, que com suas ações virtuosas consegue mobilizar grandes grupos em prol de objetivos humanitários. Estamos finalmente nos referindo ao líder latente que está dentro de cada um de nós, capaz de emergir nos momentos mais improváveis. Não é difícil, portanto, perceber, que a história do homem seria bem diferente se não houvesse a figura do líder. Sem os grandes líderes o desenvolvimento humano seria muito mais lento, o que em outros termos significa dizer que a humanidade não estaria no estágio evolutivo em que está. É por isso que não estamos cometendo nenhum disparate acadêmico considerando a liderança como um dos propulsores da nossa evolução. É bem verdade que nem todos os líderes são “do bem”, ou seja, nem todos são pautados por princípios de honestidade, ética e justiça. Há muitos exemplos ao longo da história, de líderes que se tornaram famosos pelo exercício excessivo do autoritarismo ou, ainda pior, por práticas de extrema crueldade. Mas, é também verdade que são os líderes virtuosos que no final das contas são os mais determinantes, mesmo quando suas ações ocorrem apenas para neutralizar as ações nocivas do mau líder. 4 Nesta disciplina vamos abordar os vários aspectos relacionados à liderança. O nosso maior interesse é falar sobre o líder do bem, por esse motivo, vamos discorrer sobre o Líder Propositivo. O termo propositivo significa algo ou alguém focado na construção de propostas de valor para a sociedade. De modo geral, um líder propositivo é aquele, cujos princípios e valores o levam a sempre apresentar caminhos que possam trazer ganhos não apenas para ele, mas, em especial, para as outras pessoas. Este é o motivo pelo qual nossa disciplina é denominada de Liderança Propositiva e a Gestão de Pessoas. No primeiro capítulo, iniciamos com os conceitos básicos de liderança. Vamos conhecer sobre o perfil do líder propositivo, sobre como ele lida com as questões da ética e da moral, sobre como a comunicação influencia o exercício de sua liderança, sobre as diferenças básicas entre líderes e chefes, sobre como o feedback pode se tornar uma poderosa ferramenta nas mãos do líder, sobre importância do líder no fomento dos conceitos de diversidade e inclusão e finalmente sobre o papel transformacional que eles exercem. No segundo capítulo vamos abordar o papel do líder propositivo na criação de significados. Vamos aprender como, com sua capacidade inspiradora e humanista, o líder propositivo consegue significar o trabalho de seus liderados e, a partir daí, criar momentos de felicidade para eles, assim como para todas as partes interessadas. No terceiro capítulo, vamos comentar sobre as diferenças individuais e estilos de comportamento motivacional. Vamos entender porque as pessoas são diferentes umas das outras e compreender que são essas diferenças que tornam uma organização mais criativa, inovadora e, consequentemente, mais competitiva. Vamos analisar a importância de o líder conhecer as diferentes necessidades de seus liderados e, ao mesmo tempo, de se autoconhecer. No quarto capítulo, vamos discorrer sobre os vários estilos de liderança, assim como sobre as características e as peculiaridades de cada um. Vamos aprender que cada estilo tem suas vantagens, mas que também apresenta pontos frágeis de acordo com a situação. Vamos entender, ainda, que o líder propositivo é aquele que, apesar de ter um estilo de liderança dominante, sabe utilizar outros estilos em função das necessidades do momento. No quinto e último capítulo, vamos analisar os líderes do mal. Vamos entender um pouco da personalidade de líderes, que apesar de carismáticos e realizadores, possuem desvios de comportamento que podem ser prejudiciais às organizações e destrutivos para as pessoas. Vamos entender sobre os líderes narcisistas e sobre os líderes narcisistas malignos. Finalmente, vamos entender como e porque esses líderes conseguem despontar e cooptar seguidores. 5 Para que você possa aproveitar ao máximo os conceitos apresentados nesta disciplina, precisamos do seu empenho e da sua dedicação. Não há como lhe dar o conhecimento pronto e acabado, pois o verdadeiro conhecimento é aquele que construímos a partir de tudo o que apreendemos em nossa vida. Ele decorre da nossa interação com o ambiente físico e social. Portanto, lembre-se que você é o construtor do seu conhecimento, os professores apenas fornecem os materiais de que você necessita para edifica-lo. Se você realmente quer aprender, comprometa-se com três elementos fundamentais: suas mãos, sua mente e seu coração. Estamos obviamente utilizando uma metáfora para expressar o que esperamos de você. As mãos são, na verdade, uma alusão ao empenho que você deve realizar para obter os conhecimentos de que necessita, pois não há conquistas sem esforços. Para construir seu conhecimento, leia todos os textos com a máxima atenção, não desconsidere nenhum detalhe. Faça leituras regulares e pausadas. Não deixe para traz informações que você não tenha compreendido claramente. Acesse os textos complementares, pois eles trazem informações relevantes para a consolidação dos seus conhecimentos. Vale aqui destacar a frase do nosso grande herói das pistas, Ayrton Senna: “No que diz respeito ao empenho, ao compromisso, ao esforço, à dedicação, não existe meio termo. Ou você faz uma coisa bem-feita ou não faz”. Suas mãos são, portanto, muito importantes, mas não suficientes. Precisamos também da sua mente. Aqui nos referimos à mente como a capacidade de pensar e refletir sobre todos os conceitos explorados. É por meio do estímulo da mente que nosso potencial criativo vem à tona. Assim, antes de achar que você entendeu um conceito, reflita profundamente sobre ele. Pense em situações nas quais você pode utilizá-lo. Procure exemplos que possam validar o seu entendimento a respeito do que foi assimilado em seus estudos. Lembre-se que sem esforço mental, não há também como produzir conhecimento. Por fim, além das mãos e da mente, precisamos do seu coração. Estamos, é claro, diante de mais uma representação metafórica. Em sentido amplo, o coração expressaa paixão que você deve ter pela busca do saber. A paixão é a base do crescimento cognitivo, pois sem ela não há como completar seu arcabouço de conhecimentos. Neste caso, a mensagem é simples: “apaixone-se pelo que você faz e os resultados serão surpreendentes”. Para encerrar esta pequena apresentação, registramos uma última nota: a essência da conquista não está no verbo “poder”, mas sim no “querer”. Antes de dizer “não posso”, diga “eu quero”. Por mais improvável que pareça, quando você quer realmente alcançar um destino e, para isso luta com todas as suas forças, você certamente chegará lá. Portanto, lembre-se: você pode, quando você realmente quer. Então vamos lá. Mãos à obra! 6 1. O LÍDER PROPOSITIVO Organizações de todos os tipos precisam de líderes com um conjunto mais amplo de habilidades e competências para levá-las ao futuro. OBJETIVO 1.1. INTRODUÇÃO Liderança é algo que acompanha o homem desde o início de sua existência. Para sobreviver em condições adversas, o homem sempre se guiou pelos ditames de algum líder. Basta um rápido sobrevoo sobre a história para perceber como os líderes foram fundamentais nos momentos mais decisivos. Embora nem todos possam ser realçados por uma conduta virtuosa, não há como negar a importância que esse personagem tem nas organizações sociais e, principalmente, nas empresariais. Seja tomando decisões nas horas mais improváveis, seja aglutinando forças divergentes ou apenas servindo de inspiração para seus seguidores, os líderes foram, e continuam sendo, fundamentais para a evolução da espécie humana. As habilidades e proezas desses homens já foram cantadas em verso e prosa ao longo dos tempos. No entanto, foi com o florescimento da moderna organização empresarial, ocorrido a partir da Revolução Industrial, que a liderança passou a ser tema de estudos mais profundos. Especialistas das mais diversas áreas do conhecimento, como administração, psicologia, economia, teologia, filosofia – apenas para citar algumas – têm se aventurado a estudar esse personagem, procurando encontrar os elementos que o diferenciam das demais pessoas. E nesse universo, é possível encontrar um pouco de tudo, desde os trabalhos que apregoam a liderança como um “dom” inato e, portanto, privilégio de poucos, passando por aqueles que defendem a ideia de que todas as pessoas, de certa forma e em certo nível, são líderes, até os estudos que OBJETIVO É objetivo deste módulo é fazer com que você conheça os principais requisito e atributos da liderança propositiva. Visa, também, desenvolver competências e habilidades, no sentido de que você seja capaz de estruturar, organizar, dirigir e inspirar equipes de alto desempenho. 7 denotam a liderança como competência profissional e que, portanto, pode ser perfeitamente desenvolvida. Em linhas gerais, a essência da liderança pouco mudou nos últimos anos. Ela continua tendo a função de cooptar as pessoas em torno de objetivos comuns. Mas o mundo mudou e mudou muito, principalmente no universo empresarial. O processo de transformação dos últimos trinta anos foi mais expressivo do que o dos cem anteriores e será ainda mais intenso nos próximos cinco. No contexto organizacional, as mudanças estão ocorrendo de forma avassaladora. Fatores como a tecnologia e a globalização mudaram a forma como as pessoas vêm e, principalmente como interagem com a realidade à sua volta. Vivemos hoje no mundo VUCA1, que de forma resumida significa um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo. Como consequência, temos enormes dificuldades para prever os acontecimentos futuros, ainda que estejamos falando do dia de amanhã. Diante desse mundo em permanente transformação, surge uma questão crucial: será que as pessoas à frente das organizações estão mudando sua forma de pensar e agir na mesma velocidade e com a mesma intensidade? Infelizmente, as pesquisas nessa direção mostram que poucos líderes estão, de fato, preparados para enfrentar os novos desafios. Não há, no entanto, como desconsiderar o fato de que nesse novo cenário, organizações de todos os tipos precisam de líderes com um conjunto mais amplo de habilidades e competências para levá-las ao futuro. Esses são os homens que denominamos “líderes propositivos”. Como já mencionado, os líderes estão presente e são determinantes em todos as esferas da sociedade, a exemplo das famílias, das empresas, das comunidades religiosas e dos grupos de relacionamentos. Por isso, ao explorarmos os atributos desses vultosos personagens, é provável que cada leitor adote um tipo diferente de líder como referência. Ao comentarmos sobre o líder afetivo, por exemplo, alguns pensarão no chefe de família, que com ações fraternais estão sempre direcionando o caminho dos filhos. Outros, por sua vez, lembrarão das pregações orientativas do clérigo da sua paróquia. Não há nenhum problema nisso, embora seja bom lembrar que o foco desta disciplina é no contexto empresarial, ou seja, tenha sempre em mente que todos os conceitos abordados daqui por diante, estarão especialmente relacionados com os líderes que atuam nas empresas. DESTAQUE O processo de transformação dos últimos trinta anos foi mais expressivo do que o dos cem anteriores e será ainda mais intenso nos próximos cinco. 8 1.2. QUEM SÃO OS LÍDERES PROPOSITIVOS? Na apresentação desta disciplina, já explicamos o significado da palavra “propositivo”, mas vale a pena repetir. Propositivo significa algo ou alguém que se preocupa em criar propostas que possam promover o bem-estar de todos. Uma pessoa propositiva é alguém preocupada em apresentar ideias criativas que contribuam com a melhoria de vida das pessoas. Pessoas propositivas são analíticas, avaliam os acontecimentos de forma crítica, gerando soluções centradas no bem comum. Elas possuem um propósito de vida e realmente lutam para realiza-lo. Elas não se intimidam com as dificuldades, pelo contrário, vêm as barreiras como desafios, capazes de agregar novos conhecimentos e habilidades. E quem é o líder propositivo? É aquele que sempre enxerga à frente porque sabe que o futuro não é a mera repetição do passado. Reconhece que o futuro não é um lugar a ser conquistado, mas um lugar que precisa ser criado. Utiliza o conhecimento como o combustível para atingir o sucesso. É tão consciente de suas fragilidades quanto o é de suas potencialidades. Por isso, é humilde do ponto de vista pedagógico, ou seja, está sempre aprendendo. Nunca desperdiça aquilo que pode obter a partir de uma boa conversa porque, mais do que falar, está sempre pronto a ouvir e escutar. Um ponto fundamental: o líder propositivo não tem a liderança como o seu principal objetivo, mas sim o que pode obter a partir dela, tanto para ele, quando para aqueles a quem lidera. Um líder propositivo em geral é também transcendental. Eles vão muito além da lógica simples e das emoções efêmeras. Sua capacidade de transcendência cria a condição ideal para ativar toda a competência que as pessoas possuem e que muitas vezes não conseguem utilizar. Ele é equilibrado e por isso sua mente é calma, o que lhe permite refletir sobre os problemas com mais clareza e precisão. O líder propositivo sabe que a liderança não é um lugar a ser alcançado, porque em essência ela representa uma jornada pelas estrelas – não tem fim. Ele sabe que todos os dias é possível ir mais longe, que todos os dias há novas fronteiras para serem desbravadas. E por isso, tem plena consciência de nunca será o melhor líder que pode ser, porque liderança é aprender continuamente. Mas isso não lhe causa desalento, pelo contrário. Ele levanta cedo todos os dias com a certeza de que são as novas conquistas que trazem ganhos substanciais a ele e seus liderados. Os líderes propositivos têm um pontoem comum: gostam de gente. Sabem que uma de suas principais funções é conhecer as necessidades das pessoas e procurar atendê-las. Normalmente, conseguem o que querem porque trabalham para que seus liderados também possam conseguir o que desejam. Eles sabem que as necessidades dos outros não são idênticas às suas e que não irão compreendê-las sem interagir e principalmente, escutar muito. Assim, o líder propositivo é aquele 9 preocupado em dar a máxima atenção ao que as outras pessoas pensam, sentem e expressam. Você já deve ter ouvido alguém dizer: “eu não misturo problemas de casa com problemas do trabalho”. Pois acredite, essa é uma grande falácia ou, utilizando uma expressão do momento, uma grande fake. Não há como dividir a vida em vida no trabalho e vida fora dele. Independentemente do contexto, todos temos uma única vida. Se você tem problemas com sua família, naturalmente eles irão refletir no seu desempenho profissional, assim como se você não está plenamente satisfeito com seu trabalho, não vai conseguir confinar sua angustia às quatro paredes do escritório. Tudo está interligado, por que tudo faz parte de uma única vida. Pessoas não são máquinas, o que significa dizer que não são dotadas de comandos que a um simples toque separam os problemas em categorias distintas ou, melhor ainda, simplesmente desligam os problemas. Por esse motivo, quando uma pessoa não vê sentido no trabalho que realiza, em grande parte ela perde o sentido da própria vida, já que o trabalho é uma de suas partes mais importante. O líder propositivo sabe disso porque é, antes de tudo, humano. Por isso ele empenha-se para dar sentido ao trabalho das pessoas, porque ao fazê-lo está, em verdade, dando sentido às suas vidas. Compreende as fragilidades e as limitações humanas, mas sabe que dando significado ao trabalho das pessoas, ele pode obter resultados excepcionais. Ao criar significados, os líderes propositivos sabem que simultaneamente estão inspirando e incentivando as pessoas a fazerem o que efetivamente precisa ser feito. Eles não modelam os comportamentos, ao invés disso, abrem espaços para que seus funcionários sejam criativos e possam tomar decisões individuais em relação aos trabalhos para os quais foram designados. O líder proposito sabe que seus liderados estão preparados para olhar para o futuro e buscar soluções criativas sem microgereciamentos2. Por fim, há um ponto importante a ser esclarecido: o líder propositivo não nasce pronto. Embora algumas características inatas possam favorecer sua formação, o líder propositivo precisa ser construído. E não há formula ou receita mágica para isso. Assim como, para aqueles que desejam se tornar um profissional destacado faz-se necessário muito estudo e experimentação prática, para aqueles que querem se tornar DESTAQUE Se uma pessoa não vê sentido no trabalho que realiza, em grande parte ela perde o sentido da sua própria vida, uma vez que não há como separar vida no trabalho do resto da vida. Por esse motivo, o líder propositivo trabalha prioritariamente para significar a vida das pessoas. 10 um líder proposito verdadeiro, é preciso muito conhecimento, empenho, paciência e dedicação. 1.3. LIDERANÇA E ÉTICA O brilhante filósofo, professor e escritor “Mario Sergio Cortela”, nos brinda com uma frase insigne ao falar sobre ética: É necessário cuidar da ética para não anestesiarmos a nossa consciência e começarmos a achar que tudo é normal”. De fato, a ética pode – em certos aspectos – ser comparada com o nosso Pet (se você tem um, vai compreender o que estou dizendo). Ele nos direciona, nos sensibiliza e nos torna mais humanos. Mas é preciso cuidar dele todos os dias, porque sem ele corremos o risco de nos tornar mais insensíveis, impiedosos e insociáveis. Mas, afinal, o que é ética? A palavra ética tem origem grega e está relacionada com o termo “ethos”, que significa caráter ou modo de ser de uma pessoa. Para a maior parte dos estudiosos, ética representa o conjunto de princípios e valores que norteiam e motivam o comportamento de uma pessoa ou de uma organização. Os conceitos relacionados à ética surgem pela convivência e pelas interações das pessoas em sociedade, como forma de delimitar seus comportamentos, de modo a preservar o bem-estar e a segurança do grupo. Apesar de ética e moral serem expressões muitas vezes utilizadas sinonimamente, os filósofos geralmente as distinguem, exprimindo a moral como coletiva e a ética como individual. Não há unanimidade em relação ao tema, mas em geral a moral é compreendida como um conjunto de regras sociais, ou seja, o conjunto de todos os princípios, valores e normas que são adotados e respeitados por uma sociedade. Por isso, a moral varia de acordo com o local e, principalmente de acordo com as características das pessoas que compõem a sociedade. A moral está sempre em mutação, adquirindo contornos diferenciados em função da realidade de cada momento. A ética, como dito, está relacionada com as ações que são tomadas por uma pessoa e que correspondem aos seus próprios princípios e valores. Diferentemente da moral, ela não muda. O que é ético hoje, deve ser ético amanhã. Naturalmente, a postura ética adotada por uma pessoa, será julgada de acordo com a moral da sociedade onde essa pessoa vive. A postura ética é vista como o saber discernir entre conceitos opostos – como o bem e o mal, o bom e o ruim, o certo e o errado – e a partir daí, saber escolher comportamentos que favoreçam as pessoas. A ética, portanto, relaciona-se com despertar do altruísmo do ser humano. Já a moral é balizada pelo cumprimento de 11 normas e regras que são definidas pela sociedade para regular comportamentos gerais. Sem nenhum rigor filosófico, podemos dizer que a moral é sedimentada pela razão coletiva, enquanto a ética é alicerçada pelos ditames que vêm do coração de cada pessoa. Agora que compreendemos os conceitos de ética e moral, podemos falar sobre a liderança ética. Simplificadamente definimos a liderança ética como aquela praticada por um líder que direciona suas ações para o bem comum, adotando condutas que são aceitáveis em todas as esferas da vida. Portanto, o líder ético é aquele cujos princípios o levam a trabalhar em prol, não apenas de seus próprios interesses, mas, principalmente do interesse de seus liderados e da organização para a qual trabalha. A ética é julgada pela moral, mas como muitos dos princípios morais não são universais, o tema torna-se complexo e ambíguo. É possível que todos concordem que matar uma pessoa é imoral, mas nem todos concordam que sacrificar animais para testes farmacológicos é errado. Além disso, às vezes um princípio moral entra em conflito com outro. Você pode achar ótimo trabalhar em uma empresa que estimula a liberdade de expressão, por exemplo, mas não vai gostar nem um pouco se um colega de trabalho utilizar essa liberdade para propagandear suas fragilidades. Diante desse contexto, o líder ético deve manter-se fiel aos seus princípios, independentemente de como a moral irá julgá-lo. É claro que essa premissa é válida, desde que o líder realmente tenha o perfeito discernimento sobre aquilo que é correto e melhor para todos. Um líder pode ser julgado como aético ou imoral caso decida demitir um elevado número de funcionários. Mas se o líder tiver a plena convicção de que esse é o único caminho possível para salvar a empresa e, consequentemente o emprego da maioria, ele estará de fato agindo de forma ética. Portanto, o líder ético deve ser sensível às diferentes visões de seus liderados e deve saber gerenciar os conflitos que possam surgir em decorrência de opiniões divergentes. A ética é, pois, um atributo especial do líder propositivo. Líderes propositivos são guiadospela ética porque, antes de tudo, são honestos com si mesmo e com os outros. Eles se engajam em ações que refletem intensamente seus valores e crenças virtuosas. A função da liderança propositiva – e, portanto, ética – é, entre outras, construir paradigmas de valor que influenciam positivamente seus seguidores. Isso DESTAQUE A ética relaciona-se com despertar do altruísmo do ser humano. Já a moral é balizada pelo cumprimento de normas e regras que são definidas pela sociedade para regular comportamentos gerais. A moral é sedimentada pela razão coletiva, enquanto a ética é alicerçada pelos ditames que vêm do coração de cada pessoa. 12 porque, é a conduta ética do líder propositivo que gera as bases para a formação da conduta ética da própria organização. Se houver uma pequena lacuna entre o que o líder diz e como ele efetivamente age, isso vai criar um dilema na cabeça das pessoas, e a dúvida de qual é o comportamento correto a ser seguido, será generalizada. Ao exibir comportamentos éticos, os líderes inspiram seus seguidores a somente fazer o que é certo e justo. Essa abordagem eleva a consciência moral dos seguidores, gerando alto índice de satisfação no trabalho, elevação da autoestima e, consequentemente, melhora a eficácia dos produtos e serviços que são destinados aos clientes. Portanto, falar sobre ética é falar sobre ensinamento, porque é por meio da postura ética que o líder efetivamente ensina o caminho que seus seguidores devem percorrer. Em um dos meus trabalhos de consultoria, uma experiência, em especial, foi marcante para entender a postura de um líder ético. Descrevo, a seguir, como os fatos aconteceram. Eram sete e meia da manhã de um dia frio de julho em São Paulo. Lá fora uma garoa fina caia intermitentemente em meio a uma forte neblina. A sala de reunião estava gelada e os participantes, com caras de poucos amigos, se encolhiam nas poltronas. Fazia apenas uma semana que eu tinha iniciado meu trabalho naquela empresa de software. Participar de uma reunião era uma boa maneira de conhecer um pouco de sua cultura organizacional. O objetivo da reunião era discutir o elevado índice de retrabalhos do setor responsável pela elaboração de propostas de vendas. Os números eram realmente alarmantes – cerca de 70% das propostas retornavam com algum problema, o que tornava o processo moroso, além de gerar descrédito juntos aos clientes. Por vezes, a empresa perdera a oportunidade de realizar uma venda porque não houve tempo hábil para refazer a proposta. A área comercial da empresa era composta por um gerente e dez vendedores, sendo cinco funcionários regulares e cinco representantes comerciais. Na reunião estavam presentes o Presidente, a Diretora de Marketing, o Diretor Técnico, o Gerente Comercial, três funcionários do setor de propostas e todos os dez vendedores, além de mim, é claro. O clima parecia tenso e as pessoas estavam caladas. Assim que a reunião começou, um dos representantes comerciais, como que tentando “quebrar o gelo”, pediu a palavra e disse: — Já que estamos todos reunidos, quero aproveitar a oportunidade para dar uma informação importante. A empresa Alpha, um de nossos clientes preferenciais, abriu licitação para adquirir um software de gerenciamento da produção. Eles aguardam nossa proposta de venda até o início da semana que vem. 13 Visivelmente entusiasmado, por cerca de 5 minutos o representante falou sobre a Alpha e de sua importância como cliente. O Diretor Técnico, presente à reunião, depois de ouvir pacientemente as explanações do representante, fez a seguinte colocação: — Senhores, infelizmente essa transação não é do nosso interesse, por isso não vale a pena trabalharmos nessa proposta. Eu conheço muito bem as necessidades da Alpha e posso afirmar categoricamente que o nosso sistema não é adequado. Vamos dispender um esforço enorme para elaborar a proposta, sem nenhuma chance real de ganharmos essa licitação. Será pura perda de tempo. Todos voltaram sua atenção para o representante comercial, como se dissessem: você deveria saber disso. E foi, então, que com um sorriso maroto, ele respondeu: — O senhor tem razão, não vamos realmente vencer essa licitação. Por isso não precisamos caprichar na elaboração da proposta. Na verdade, o responsável pelo setor de compras da Alpha já decidiu de quem eles irão adquirir o sistema. O problema é que pelas regras da matriz eles precisam de pelo menos três propostas para escolherem o ganhador. Portanto, a nossa participação será meramente figurativa, vamos apenas ajuda-los a conseguir as três propostas. Com um olhar de indignação, o Presidente retrucou: — Que absurdo, você está propondo que nossa empresa participe de uma falcatrua? Isso não é moralmente correto. — Senhor – disse o representante – isso é uma estratégia muito utilizada no mercado. Se eles forem seguir as regras à risca, vão perder muito tempo, por isso estão pedindo nossa ajuda. Em geral, as empresas agem assim. Sabe como é: uma mão lava a outra. Hoje nós os ajudamos, amanhã eles nos ajudam. É assim que o mercado opera. Visivelmente irritado o presidente completou: — Que mensagem estarei passando aos nossos colaboradores se eu concordar com isso? Essa ação vai de encontro aos valores centrais da nossa empresa. Esqueça, não vamos fazer isso. Entre em contato com a Alpha e diga que não participaremos desse conluio. O representante comercial ainda tentou argumentar. 14 — Senhor, eu não sei qual será a reação do pessoal da Alpha. Talvez eles não fiquem satisfeitos com a nossa decisão. — Se Alpha não consegue entender que somos uma empresa ética e que sempre agimos com responsabilidade, então ela não serve para ser nossa parceira – emendou o presidente. Depois disso, a sala ficou em silêncio por alguns segundos. A reunião só teve sequência quando a Diretora de Marketing retomou os itens da pauta. A maior lição que podemos tirar dessa história real é a de que o verdadeiro líder pode até comprometer seus resultados de curto prazo, mas jamais irá comprometer sua credibilidade, assim como a de sua organização. Conforme constatei depois de algum tempo, o presidente daquela empresa era de fato um líder propositivo e como tal, tinha a ética como um de seus pilares morais. Não foi surpresa, portanto, descobrir quanto ele era respeitado pela grande maioria dos colaboradores da empresa e até mesmo pelos seus concorrentes. Como vimos anteriormente, a ética do líder propositivo em geral se traduz por sua honestidade e por sua capacidade de tomar decisões justas e equilibradas, porque é dessa forma que ele garante a longevidade de sua organização. O líder propositivo é justo e humano. Respeita não apenas os membros de sua equipe, mas as pessoas de modo geral. Sob a batuta de um líder propositivo, nenhum liderado tem motivo para temer a tendenciosidade, porque a equidade é um dos princípios de sua ética. Ele ouve as pessoas e valoriza suas contribuições. Mais do que isso, é compassivo em relação a pontos de vista diferentes dos seus liderados. Desnecessário dizer que quem é ético é também honesto. A honestidade é particularmente importante para o líder, pois é uma das virtudes fundamentais para quem precisa inspirar confiança. Líderes propositivos nunca escondem a verdade. Transmitem os fatos com clareza e transparência, por mais inconvenientes que sejam. Antes de tomar uma decisão eles asseguram-se de que as ações a serem implementadas estejam de acordo com os valores organizacionais gerais. Sob a direção de um líder propositivo, os funcionaram prosperam. São recompensados por terem ideias inovadoras e são incentivados a fazerem o que for necessário – de forma ética – para melhorar a maneira como as coisas são feitas. Ainda mais, os funcionários proativossão sempre elogiados e, por isso, ninguém fica esperando que o outro dê o primeiro passo. DESTAQUE o verdadeiro líder pode até comprometer seus resultados de curto prazo, mas jamais irá comprometer sua credibilidade, assim como a de sua organização. 15 Liderança propositiva não se resume apenas a um belo discurso. Os líderes propositivos saem na frente, porque sabem que a melhor maneira de conquistar a adesão é por meio dos exemplos. Eles discutem os princípios e os valores éticos regularmente, porque dessa maneira garantem que haja entendimento consistente em toda a organização. Mas, infelizmente nem todo os líderes são éticos. Diariamente nossa privacidade é invadida por notícias a respeito de decisões tomadas por líderes que nos fazem questionar sua integridade e ética. Tenho amigos que decidiram não mais acompanhar os noticiários para evitar a inquietação que essas notícias trazem, não apenas para eles, mas principalmente para suas famílias. Escolheram renunciar à informação, para em contrapartida ter uma noite de sono reconfortável. O comportamento antiético decore de diversos fatores. Um dos mais observáveis é a ganância, que pode ser expressa por um sentimento que faz com que uma pessoa queira ter sempre mais, sem se importar com os caminhos que ela terá que trilhar para isso. Na verdade, o ganancioso nunca chega a um destino, porque para ele o céu é o limite. Pessoas gananciosas não se contentam em ter uma boa vida, elas estão sempre em busca de novas conquistas, novos bens e, em especial, de mais dinheiro. A ganância é um comportamento que não condiz com a ética. Outro problema da liderança antiética decorre do egocentrismo. Os líderes egocêntricos não conseguem descentrarem-se, ou seja, agem como se fossem o centro do universo. Em tese, são arrogantes, sentem-se perfeitos e acham que a sua verdade é única. Se você já trabalhou com um líder egocêntrico, sabe que eles são habilidosos em fazer tudo para si mesmo, mas quase nada para os outros. Geralmente se apoiam em objetivos nobres para anuviar a visão de seus liderados sobre suas verdadeiras razões que, em geral são torpes e mesquinhas. O líder egocêntrico não sabe nivelar o interesse da coletividade com seus próprios interesses pessoais e por isso jamais consegue a confiança e a lealdade de seus liderados. Ser incapaz de pensar além dos seus próprios interesses e de seus próprios ganhos é uma das características do líder antiético. Infelizmente não é irrelevante o número de líderes que reúnem essas duas características indesejáveis da personalidade: egocentrismo e ganância. Costumo dizer que esses líderes sofrem de uma doença chamada “Síndrome da Egonância”, muito difícil de ser tratada e, principalmente, curada. A liderança antiética também pode aflorar quando o líder deixa de considerar o impacto de suas escolhas na vida da organização e, principalmente, na vida das outras pessoas, mesmo quando suas ações não visam ganhos próprios. A título de exemplo, imagine o líder que resolve demitir um grupo de pessoas apenas para obter ganhos imediatos, mesmo diante da possibilidade de que essas demissões gerem impactos negativos para a empresa em futuro próximo. Embora essa decisão possa 16 ser vantajosa em curto prazo, será que neste caso o comportamento do líder pautou- se pela ética? É certo que não. Muitos líderes exigem que seus liderados sejam absolutamente corretos e justos ou, de outro modo, que seus comportamentos sejam pautados pelos mais elevados padrões éticos. Mas, será que esses mesmos líderes têm consciência de que, por vezes, suas ações estão contribuindo para gerar efeito contrário. Mesmo com a melhor das intenções ou ainda sem ter a exata noção dos desvios de conduta que estão praticando, não é incomum que as ações do líder contribuam para subverter a conduta de seus liderados. Muitas vezes o líder acha que está agindo de maneira ética, mas não é assim que seus liderados o vêm. E isso é um problema. De que adianta o líder se autoproclamar o homem mais honesto do mundo, se não é dessa forma que as pessoas o vêm? Ao líder não basta ser ético é preciso também parecer ético. Se as pessoas não o vêm como ético ou se não compreendem as razões que o levam a tomar determinadas decisões, elas certamente não irão apostar suas fichas no jogo que ele está propondo. Para evitar esse tipo de situação indesejada é que o líder propositivo transmite com clareza e transparência tudo o que faz e o porquê. Os líderes verdadeiramente propositivos preocupam-se genuinamente com as outras pessoas. Fazem isso por altruísmo e não porque isso lhes traga algum ganho imediato ou direto. Agem de forma coerente e harmônica com seus valores éticos e sempre consideram o impacto que suas decisões podem gerar na vida das outras pessoas. Mas há casos em que o líder acaba – ironicamente – obscurecido pelo seu próprio brilho. O caso da empresa Enron, que exploramos a seguir, é um bom exemplo de situações que levam o líder a perder seu senso ético. A Enron Corporation3, empresa de energia, foi fundada em 1985 nos Estados Unidos por Kenneth Lay a partir da fusão das empresas Houston Natural Gas Corporation e da InterNorth Incorporated. O comando da empresa foi entregue a Kenneth Lay, originalmente CEO da Houston. Em 1990, Lay recrutou Jeffrey Skilling para comandar a Enron Finance Corporation, uma subsidiária recém-criada. Skilling era funcionário da Arthur Andersen, uma das empresas de consultoria e auditoria mais famosas do mundo, que na época respondia legalmente pela supervisão das contas da Enron. Maravilhado com as competências de Skilling, o presidente da Enron resolveu convidá-lo para fazer parte do quadro de profissionais da empresa. Skilling não apenas aceitou o convite, mas a partir daquele momento tornou-se o braço direito de Lay no comando da Enron. Posteriormente, em 2001, ele viria a ocupar a cadeira de Lay na presidência da empresa. 17 A Enron foi rápida em explorar as oportunidades que surgiram quando a desregulamentação, ocorrida no mercado americano no final dos anos 80, permitiu que os usuários comprassem gás ou eletricidade de diferentes produtores. Ela conseguiu firmar uma série de contratos para fornecer gás natural, energia elétrica e outros produtos energéticos às indústrias e empresas de serviços públicos. Com isso, os lucros da empresa aumentaram substancialmente e seu crescimento foi estratosférico. Em pouco tempo tornou-se a queridinha de Waal Street. As ações da empresa chegaram a ser comercializadas a US$ 90,75, um valor muito elevado, mesmo para os padrões americanos. Os analistas de mercado elogiavam a empresa por ela estar inovando e incorporando novas tecnologias em um negócio até então considerado tradicionalista, como o era o caso do fornecimento de energia. Vale lembrar que nessa época a Enron também lucrou muito com a febre das “ponto com”, por meio da Enronline, uma empresa do grupo que prestava serviços através da web. Por seis anos consecutivos, entre 1996 e 2001, a Enron foi escolhida pela revista Fortune como a empresa mais inovadora da América. Tornou-se a sétima maior empresa dos Estados Unidos e uma das maiores do mundo. No início de 2001, quando houve o estouro da bolha das empresas “ponto com”4, a Enron começou a enfrentar uma concorrência crescente no comércio de energia elétrica e os lucros da empresa diminuíram rapidamente. Sob pressão dos acionistas, os executivos começaram a utilizar práticas contábeis duvidosas para ocultar os problemas. Ao invés de adotar postura ética e transparente, anunciando ao mercado que a empresa estava com problemas, que certamente naquele momento ainda podiam ser corrigidos, os principais executivos preferiram jogar a sujeira para baixo do tapete. As falcatruas contábeis permitiram que a empresa contabilizasseganhos futuros ainda não realizados de alguns contratos, nas demonstrações financeiras, criando a sensação de que não haviam problemas graves e que seus lucros eram consistentes. Por sua vez, as operações não lucrativas da empresa foram transferidas para empresas parceiras, criando a ilusão de que tudo estava bem. A situação começou a ficar grave em agosto de 2001, quando o mercado foi tomado de surpresa pela renúncia de Skilling. Na época ele alegou problemas pessoais para deixar a empresa, mas a desconfiança foi geral. Lay, o antigo CEO que ainda estava ligado à empresa, negou que houvesse qualquer tipo de problema, mas a renúncia abrupta de Skilling acendeu a luz vermelha e as ações da empresa começaram a despencar. Pressionada por todos os lados, em outubro de 2001 a empresa teve que jogar a toalha e abrir os números reais. Descortinou-se um cenário terrível. Somente em 2000 a empresa havia perdido US$ 591 milhões. As dívidas, até 2000 somavam mais de US$ 600 milhões e as perspectivas de recuperação eram ínfimas. Em dezembro 18 de 2001 a Enron declarou sua falência. A empresa que tinha alcançado as nuvens estava agora no fundo do poço. Mas não foi somente a Enron que pagou a conta. Empresas diretamente ligadas a ela também foram severamente punidas. O caso mais emblemático ocorreu com a Arthur Andersen, a empresa de auditoria responsável por fiscalizar as operações financeiras da Enron. Com a falência da Enron, o mercado quiz saber porque uma empresa tão conceituada como a Arthur Andersen, tinha avalizado todas as operações financeiras fraudulentas da Enron. A empresa não conseguiu explicar adequadamente seus erros e também foi punida. Desapareceu do mercado. O fundador da Enron, Kenneth Lay foi condenado por várias acusações de fraude e conspiração. Antes de receber a sentença judicial ele morreu de ataque cardíaco em sua residência no Colorado. Outros executivos da Enron também foram condenados, mas a maior punição coube a Jeffrey Skilling, que foi sentenciado a 24 anos de detenção. Ele permanece na prisão e deve ser solto em 2028. A grande pergunta aqui é: porque um líder arriscaria uma carreira construída ao longo de anos de dedicação e esforço, assim como o emprego de milhares de pessoas, apenas para ocultar uma situação que poderia ser contornada com honestidade e transparência. Há várias razões que podem levar um líder a comprometer a sua ética, mas sem dúvida alguma a maior delas está associada com o medo de perder o reconhecimento. No caso da Enron o problema não foi corrupção e nem ganância por dinheiro. Os líderes da Enron foram tão dignificados ao longo do tempo, que se tornaram verdadeiros ícones da gestão empresarial. Durante o período áureo da empresa eles foram alçados ao patamar de referência mundial em liderança. A simples possibilidade de perder essa aura magnífica construída no imaginário coletivo, levou-os a apostar todas as fichas em uma única carta, mesmo sabendo da remota possibilidade que tinham de ganhar o jogo. O caso Enron nos dá a exata dimensão do estrago que um líder aético pode causar a uma empresa. Por isso, o líder propositivo não descuida um só minuto da questão ética. Ele sabe que mesmo em pequenas ações, os desvios de conduta podem ocorrer e que esses pequenos desvios podem, com o tempo, gerar o efeito “Bola de Neve”5. DESTAQUE Os líderes verdadeiramente propositivos preocupam-se genuinamente com as outras pessoas. Fazem isso por altruísmo e não porque isso lhes traga algum ganho imediato ou direto. Agem de forma coerente e harmônica com seus valores éticos e sempre consideram o impacto que suas decisões podem gerar na vida das outras pessoas. 19 Você já ouviu um colega de trabalho dizer: “não se preocupe com isso, estamos apenas fazendo o nosso trabalho”. Por vezes o “isso” a que ele se refere é uma ação duvidosa, que tem cheiro de “coisa errada”. Mas a justificativa é simples: se for para o “bem” da empresa, tudo é permitido. O líder propositivo não pensa e muito menos age assim, porque muito além do desejo de se obter resultados de curso prazo, ele se preocupa com a reputação de longo prazo que está construindo, não somente para ele, mas principalmente para sua equipe e para sua empresa. 1.4. LÍDERES E CHEFES Algumas pessoas utilizam os termos “chefe” e “líder” de forma intercambiável, porque acreditam que eles representassem a mesma coisa. Mas essa suposição está equivocada. Alguns chefes são simplesmente isso: “chefes”. São indivíduos que alcançaram uma posição de destaque na cadeia hierárquica da empresa e que, portanto, possuem um poder emanado pela posição. Ocupam belos escritórios, são auxiliados por assistentes e/ou secretárias, comandam grandes equipes, controlam orçamentos generosos e até tomam decisões importantes que podem afetar o rumo da organização. Mas, nada disso os tornam líderes de fato. As diferenças entre chefes e líderes são significativas. O chefe se apoia integralmente na posição hierárquica que ocupa ou, em outros termos, sua autoridade deriva diretamente da função exercida. Ironicamente falando, é a cadeira que ele ocupa que lhe confere o poder de mando. O líder, ao contrário, não depende de uma posição formal. Seu poder é natural e provem de sua capacidade de inspirar as pessoas, de sua transcendência. O verdadeiro líder é tão estimulante que ele consegue criar seguidores porque é capaz de apontar um caminho que vale a pena ser seguido. É verdade que em muitos casos o líder possuí uma posição hierárquica definida na cadeia de comando da empresa. Não há nenhum problema nisso, muito pelo contrário. Se uma pessoa ocupa uma posição formal na hierarquia e, ainda assim, possui todos os requisitos de um grande líder, podemos afirmar que estamos diante de um casamento perfeito. O ponto mais determinante, no entanto, é saber que para ser líder uma pessoa não precisa estar formalmente empossada em algum cargo. Líderes inspiram os funcionários a seguir seus passos, chefes tendem a pressioná-los para que façam aquilo que ele deseja. Chefes não direcionam, exigem. Em geral são inseguros e vivem em estado de inação, motivo pelo qual seus subordinados trabalham sem orientações específicas e sem expectativas em relação ao que estão tentando conquistar. Líderes propositivos, por sua vez, agem de forma inversa. Eles apresentam ideias e trabalham ao lado de seus liderados. Conversam 20 com sua equipe, comunicam claramente os objetivos e as metas e suas ações estratégicas são construídas no sentido de que todos possam caminhar juntos. O líder propositivo sabe construir sonhos ambiciosos e desejáveis, porque é convicto de que é a partir da idealização de sonhos que se constrói o futuro. Mas o mais importante é que ele não é egocêntrico. Não guarda seus sonhos somente para si, pelo contrário, compartilha sua visão e trabalha intensamente para cooptar as pessoas e fazer dos seus sonhos, os sonhos de todos. O líder propositivo não é, em absoluto, individualista. Entende que precisa das outras pessoas e que, apenas a partir de esforços sinérgicos, poderá realizar seus próprios sonhos. Mas ao fazê-lo, ele não se torna o único dono. Reconhece e valoriza aqueles que lutaram por seus ideais, assim como sabe exatamente como dividir os louros da vitória. Chefes costumam selecionar dentro de sua equipe um ou dois funcionários – dentre os que apresentam melhor desempenho – como seus favoritos. Eles se apoiam nesses funcionários porque acreditam que, por serem os mais habilidosos, são os que irão fazer a roda dos negócios girar. Para estes, ele dá mais atenção e oferece as melhores condições de trabalho. Em geral, ele os coloca em lugar de destaque, bem acima dos demais funcionários. No curto prazo, isso pode até trazer resultados, mas com o passar do tempoessa conduta deteriora a moral da equipe e, consequentemente, destrói sua produtividade. Líderes propositivos são diferentes. Eles tratam todos igualmente. Eles valorizam sim os funcionários capacitados, mas não deixam ninguém para traz. Ao invés de menosprezar os mais fracos, eles trabalham para elevar suas competências. Líderes propositivos não permitem que suas preferencias individuais atrapalhem a harmonia do ambiente. Quando a empresa cria um novo projeto, o líder propositivo entra na trincheira junto com sua equipe. Ele não foge da luta, pelo contrário ele encabeça os ataques. Os chefes, por outro lado, tendem a se afastar do campo de batalha. Eles simplesmente supervisionam à distância o que a equipe está fazendo. Preferem ficar de fora e apenas entram em ação na hora de dar as ordens. Isso prejudica substancialmente a motivação e a criatividade da equipe. Existe o momento e o lugar certo para conversar com um subordinado quando ele comete erros graves. Além disso, grande parte dos problemas a serem tratados com os funcionários pode ser feita por meio de críticas construtivas e não de julgamentos duros e destrutivos, principalmente quando realizados na frente de outras pessoas. Líderes sabem oferecer bons conselhos ou corrigir falhas de modo construtivo, em um ambiente privado. Os chefes, no entanto, tendem a repreender seus funcionários com veemência exagerada e até ameaçar, o que os deixa preocupados, envergonhados e derrotados. Líderes podem também ser disciplinadores, mas ao sê-lo utilizam uma abordagem que transmite aos funcionários 21 uma experiência de aprendizado e a possibilidade de uma mudança positiva de comportamento. Ainda hoje há pessoas em posição de comando que acreditam que é preferível ser temido do que respeitado. Esta é a crença do chefe, certamente uma forma de pensamento que não funciona mais nas empresas contemporâneas. O líder propositivo entende muito bem que intimidar um funcionário ou tentar controlá-lo pelo medo não condiz com o contexto atual. Ele sabe que o medo gera insegurança, que a insegurança inibe a criatividade e que a falta de criatividade destrói a competitividade da organização. Por esse motivo, os líderes propositivos são empáticos, geram entusiasmo, inspiram confiança e são, acima de tudo, extremamente justos e igualitários em suas ações. De certo modo, as diferenças entre líderes e chefes são relativamente simples. Entretanto, nem sempre “simples” é sinônimo de “fácil”. De fato, não é nada fácil assimilar e colocar em prática os atributos de um líder propositivo, o que nos remete a dizer que nem todos os chefes conseguem ser líderes. Líderes fazem um enorme esforço para colocar em prática as boas características da liderança. Eles avaliam seus estilos, reconhecem suas fraquezas, assumem suas limitações e procuram aprender com quem tem mais a oferecer, ainda que seus preceptores sejam seus próprios liderados. Tempos atrás, eu ministrava uma palestra sobre Comunicação Empresarial para um grupo de gerentes de uma empresa. No momento em que comentei sobre a importância da interação e da comunicação entre líderes e liderados, fui subitamente interrompido por um dos participantes, um gerente de meia idade que trabalhava na empresa havia um bom tempo. Disse-me ele: “Em nossa organização existe um personagem inusitado”. Com um riso irônico, ele completou: “Alguns o chamam de evangelista. Ele é muito cotejado pelos funcionários. Tenho pouco relacionamento com ele, mas as pessoas dizem que gostam de ouvir seus conselhos e suas dicas. Esse “cara” parece um profeta, não tem cargo de chefia, mas é mais procurado e ouvido do que os gerentes. O que você acha disso?”. Respirei fundo e disse: “bem... eu não tenho todas as informações de que necessito para tirar conclusões definitivas. Mas, ao que parece, estamos diante de um líder natural”. Antes que eu pudesse completar o raciocínio, ele me interrompeu DESTAQUE O chefe se apoia integralmente na posição hierárquica que ocupa, sua autoridade deriva diretamente da função exercida. Ironicamente falando, é a cadeira que ele ocupa que lhe confere o poder de mando. O líder, ao contrário, não depende de uma posição formal. Seu poder é natural e provem de sua capacidade de inspirar as pessoas, de sua transcendência. 22 novamente, desta vez um pouco mais insultuoso: “Líder? Como assim? Ele não tem cargo de chefia”. Então respondi: “eu disse líder e não chefe”. Ele completou: “Chefe e líder é apenas uma questão semântica. No fundo é tudo a mesma coisa”. O que mais me impressionou no episódio foi perceber a dificuldade daquele gerente em compreender que a essência do verdadeiro líder não decorre da formalização do poder, apesar de todos os fatos à sua frente. Seu modelo mental, sedimentado em conceitos do passado, não lhe permita enxergar o óbvio: o que coloca o líder em evidência não é seu poder, mas seus conhecimentos, seus hábitos, suas ações virtuosas e principalmente sua moral. As pessoas não obedecem ao líder, elas simplesmente o seguem porque, antes de tudo, ele consegue inspirá-las. Você está querendo saber como terminou o embate com o incrédulo participante da minha palestra? Quando eu percebi sua dificuldade em aceitar os fatos, eu disse: “Se estou correto em minhas observações, aquele “cara” está te incomodando e acho que é porque ele é muito popular”. Ele não falou nada, mas sua expressão foi incrivelmente reveladora. Então, eu continuei: “minha sugestão é que você converse sinceramente com as pessoas e veja o que elas mais valorizam nele. Em seguida, faça uma introspecção para entender as diferenças entre vocês dois. Isso é tudo o que eu posso dizer. Infelizmente, não posso lhe dar a resposta completa, você terá que encontrá-la sozinho”. Depois disso ele ficou mudo e eu dei sequência à minha apresentação. 1.5. LIDERANÇA E COMUNICAÇÃO Especialistas em gestão são unânimes em afirmar que a comunicação é um requisito fundamental para o sucesso dos negócios. Por esse motivo, a maior parte das pessoas acredita que bons líderes são, em sua essência, bons comunicadores. De fato, a comunicação é uma arma poderosa, que nas mãos certas pode contribuir para a obtenção de resultados fantásticos. Então isso significa que para ser um líder propositivo basta dominar a arte de falar bem em público? Certamente, não! Se apenas um bom discurso fosse suficiente para mover as pessoas na direção desejada, então seria muito fácil ser um líder. E ainda pior, seria muito fácil manipular as pessoas para interesses pessoais. Felizmente, o líder vai muito além do discurso em prol de seus ideais. O líder propositivo se faz pelas ações e não pelas palavras. Antes, porém, de discutirmos essa questão, precisamos compreender um pouco mais sobre alguns conceitos teóricos. 23 Em seu livro “Técnicas de Comunicação Escrita”, o professor Izidoro Blikstein6, uma das maiores autoridades no assunto, diz que a “comunicação é um processo de transmissão de ideias que utiliza os mais variados tipos de ferramentas visando obter respostas”. Respostas, nesse caso, são os objetivos que o remetente (comunicador) tem em mente antes de iniciar o processo de comunicação. A boa comunicação é, portanto, aquela que estimula o destinatário (ouvinte) a se movimentar na direção desejada. Assim, podemos afirmar que a comunicação é eficaz quando os objetivos idealizados antes do início do processo são alcançados. É claro que existem muitos líderes que possuem o “dom da palavra”. São pessoas que sabem falar bem, que se expressam com desenvoltura e, por isso, conseguem envolver seus ouvintes. Não há como desconsiderar o fato de que pessoas com tais habilidades são, em alguma dimensão, diferenciadas. Em regra, para esses indivíduos, é muito mais fácil agregar outras pessoasem torno daquilo que desejam obter. A boa notícia, no entanto, é que, para ser um líder comunicativo, não precisamos saber fazer bons discursos, até mesmo porque as pessoas são muito mais atentas àquilo que vêm do que àquilo que ouvem. Em linhas gerais, estamos afirmando que ter o poder da comunicação é sim cooptar as pessoas para os nossos objetivos, mas isto não precisa acontecer apenas por meio de retóricas brilhantes. Existem duas formas de nos comunicarmos. A primeira é a verbal, que ocorre por meio da comunicação escrita ou falada. Trata-se de um tipo de comunicação que aprendemos desde o nascimento e, portanto, muito presente em nossas vidas. Seja em uma conversa informal com um amigo ou em uma reunião de trabalho com muitas pessoas, seja escrevendo um e-mail ou ainda gravando uma mensagem de voz no WhatsApp, estamos o tempo todo utilizando a comunicação verbal como forma de transmitir ideias e pensamentos. Mas há outro tipo de comunicação, denominada não verbal, que acontece por meio da nossa linguagem corporal, tais como expressões faciais, gestos, maneira de olhar, maneira de se vestir, tom de voz, entonações etc. A comunicação não verbal inclui também a utilização de desenhos, imagens, sons, cheiros, cores, sabores, texturas, símbolos etc. De modo geral, ela é muito mais intensa do que a comunicação verbal, pois se aproveita dos cinco sentidos para se comunicar. Os profissionais de marketing entendem muito bem o poder desse tipo de comunicação. Você já viu alguma propaganda de cerveja em que a tulipa não apareça suada, ou ainda uma propaganda de café que não tenha “fumacinha” saindo da xícara? Pois é, esses recursos fantásticos, que ajudam a valorizar aquilo que está sendo exposto ao público consumidor, são baseados na comunicação não verbal. Observe atentamente uma pessoa falando. Note como ela movimenta os braços e como externa suas emoções por meio de sua entonação de voz e de suas expressões corporais. Fique atento a todos os seus movimentos e gestos. Perceba os 24 movimentos de suas mãos e, principalmente, suas expressões faciais. Notadamente, quando a pessoa não é verdadeira, suas palavras não estarão em harmonia com o que o seu corpo comunica, ou seja, quando uma pessoa não acredita veementemente em seus propósitos, sua comunicação não verbal estará em desacordo com suas palavras. Note, portanto, que a comunicação eficaz é muito mais do que simplesmente fazer um belo discurso ou proferir palavras bonitas para convencer as pessoas. Comunicação vai muito além, pois abrange uma série de recursos a partir da qual é possível transmitir aquilo que efetivamente queremos expressar. Embora seja verdade que muitos líderes têm facilidade em se comunicar publicamente, não é verdade que todo líder precisa saber falar com absoluta desenvoltura. De fato, há muitos líderes que sabem se expressar com competência quando estão diante de um grande público. Esse é um diferencial que em determinadas circunstâncias pode ajudar. Mas há os que não possuem essa competência, pelo contrário, quando estão diante de uma plateia sentem-se inibidos. Mas nem por isso deixam de ser líderes, porque conseguem contornar suas dificuldades utilizando outras formas para transmitir aquilo que desejam. Em regra, utilizam-se da comunicação não verbal. Warren Bennis e Burt Nanus7, dois dos maiores especialistas em liderança no mundo, assim se expressam acerca desse aspecto: “Apesar das variações de estilo – quer seja verbal ou não, quer por meio da música ou de palavras – todo líder de sucesso está consciente de que uma organização se baseia em um conjunto de significados partilhados que definem papéis e autoridade. Ele ou ela também está consciente de que uma responsabilidade-chave é comunicar o “esquema” que molda e interpreta situações, de modo que as ações dos empregados sejam guiadas por interpretações comuns da realidade”. O que se conclui é que os líderes propositivos sabem se comunicar, principalmente no sentido de criar significados na vida das pessoas. Sabem como clarificar o caminho que escolheram para ser trilhado, como também cooptar as pessoas para que todos percorram esse caminho. Mas essa tarefa não precisa ser feita a partir de um lindo discurso. Os líderes propositivos fazem isso sem dizer uma única palavra. Conseguem passar o que sentem ou o que desejam por intermédio de DESTAQUE Para ser um líder comunicativo, não precisamos saber fazer bons discursos, porque as pessoas são muito mais atentas àquilo que vêm do que àquilo que ouvem. Estamos afirmando que ter o poder da comunicação é sim cooptar as pessoas para os nossos objetivos, mas isto não precisa acontecer apenas por meio de retóricas brilhantes. 25 suas ações. Na verdade, as ações são muito mais consistentes do que as palavras. Assim como a criança que observa muito mais as atitudes do pai do que àquilo que ele ensina, os liderados também estão muito mais atentos ao que o líder faz do que ao que efetivamente fala. O líder propositivo sabe que, quando deseja algo, precisa mostrar a importância que aquilo tem para as pessoas. E é exatamente isso que ele faz; ele envolve seus liderados com suas atitudes e ações. Sabe como transmitir aquilo que realmente deseja, mesmo que seja contando uma história, desenhando uma bela paisagem, construindo esquemas ou gráficos, cantando ou fazendo com que todos ouçam uma música, escrevendo ou declamando uma poesia ou, até mesmo, expressando-se por meio de metáforas. Não importa os recursos de que ele se utiliza, seu processo de comunicação tem a capacidade de envolver as pessoas. O líder propositivo sabe que a comunicação ocorre por meio dos sentidos, mas, além disso, sabe como estimular cada um deles. Um som, um sabor ou um cheiro podem ser armas eficientes na hora de se comunicar alguma coisa importante. O toque carinhoso nos ombros de uma pessoa como forma de agradecimento por uma grande conquista pode expressar um significado muito maior do que qualquer palavra. Mas não é somente para passar um comunicado adiante ou transmitir uma ideia que o líder deve utilizar a comunicação. Tão importante quanto essas funções é o processo de feedback que a comunicação proporciona. As pessoas precisam saber o que a empresa espera delas e, ao mesmo tempo, o que podem esperar da empresa. Realimentá-las, sobre sua atuação profissional, é um dos papéis que o líder propositivo sabe exercer com maestria. Elogiar alguém por um trabalho benfeito pode parecer uma tarefa fácil – apesar de nem sempre ser assim. Mas muito mais complicado, sem dúvida, é mostrar para alguém da equipe, com quem se convive dia a dia, os aspectos em que ele necessita evoluir. Esse é, sem dúvida, o maior e mais importante objetivo do feedback. Daniel Goleman8, escritor, psicólogo e consultor americano, conhecido em todo o mundo pela relevância de seus trabalhos na área da Inteligência Emocional, assim se expressa acerca da importância do feedback: “Numa empresa, todos fazem parte de um sistema e, neste caso, o feedback é a possibilidade de evitar a entropia – a troca de informação permite que as pessoas saibam que seus respectivos trabalhos estão sendo bem executados, que precisam aprimorá-los, melhorar ou reformular totalmente. Sem feedback, as pessoas ficam no escuro; não têm ideia da avaliação que o líder faz de seu trabalho, com os colegas, ou o que é esperado delas, e qualquer problema que eventualmente exista só tende a se agravar com o passar do tempo. Num certo sentido, a crítica é uma das mais importantes tarefas de um líder. [...] Também a eficiência, satisfação e produtividade das pessoas no trabalho dependem de como lhes são transmitidos os problemas incômodos. Na verdade, a maneira como 26 são feitas e como são recebidas as críticas diz muito sobre até ondeas pessoas estão satisfeitas com seu trabalho, com os que trabalham com elas e com a liderança”. Outro aspecto importante em relação à comunicação diz respeito aos ruídos de comunicação, que são interferências de ordem física, cultural, psicológica ou semântica que podem afetar negativamente as funções básicas da comunicação. Os ruídos ocorrem frequentemente, porque o processo de comunicação dentro de uma empresa envolve pessoas diferentes que, pensam, agem e se comportam de modo diferente. Além disso, aspectos do ambiente também contribuem de maneira significativa, gerando as mais variadas formas de interferência na comunicação. O barulho excessivo de uma moto que passa na rua, por exemplo, é um tipo de ruído físico que pode interferir na comunicação de pessoas que estão trabalhando em uma sala adjacente. Mas, os ruídos não são apenas físicos. Se você está com uma tremenda dor de cabeça, por exemplo, isso vai interferir diretamente no seu poder de comunicação. Se o seu local de trabalho é excessivamente quente, seu nível de compreensão em relação ao que você ouve, será drasticamente reduzido. Se você não está inteirado sobre os valores culturais de seu interlocutor, terá dificuldades de compreender o que ele diz e assim por diante. Ruídos de comunicação deterioram o clima e criam problemas em todas as esferas organizacionais. Em geral eles elevam substancialmente os conflitos pessoais, geram desmotivação, reduzem drasticamente o rendimento das equipes, provocam falta de aderência das pessoas com os objetivos organizacionais, desorientam os funcionários em relação à condução dos seus trabalhos, provocam queda na qualidade e produtividade, aumentam os retrabalhos e estimulam a rotatividade de pessoal. Vale ainda destacar, que os problemas de comunicação não afetam apenas o ambiente interno da organização. Quando a comunicação e ineficaz, ela também pode ter reflexos danosos em relação ao relacionamento com o público externo, como clientes e fornecedores, por exemplo. O papel do líder propositivo é reduzir os níveis de ruído de comunicação. Desorganização no ambiente de trabalho, causa ruído. E-mails e whatsapps, quando mal elaborados, geram ruídos. Documentos mal redigidos, geram ruídos. Questões mal resolvidas entre os membros da equipe, geram enormes ruídos. Neste tocante, o líder propositivo trabalha conscientizando sua equipe sobre a importância da comunicação eficaz, promove debates, dinâmicas e treinamentos sobre a comunicação, solicita registro de retorno em relação às mensagens encaminhadas, cria regras e protocolos de comunicação e difunde os princípios e valores que a organização respeita. Mas, o principal: ele atua para ser o exemplo, promovendo um ambiente harmônico e organizado, bem como, praticando uma comunicação correta, transparente e didática. 27 Finalmente, faz-se necessário realçar novamente a importância da credibilidade no processo de liderança. Ao líder, não basta comunicar, é preciso ser autêntico, ético, transparente, justo e, principalmente, verdadeiro em sua comunicação. Como sabemos, o líder sabe indicar um caminho que vale a pena ser percorrido além de ser hábil em idealizar o que as pessoas podem encontrar ao seu final, mas não é só isso. As pessoas não seguem líderes em quem não confiam. Aliás, se não houver confiança, nem se pode dizer que existe liderança, porque, a bem da verdade, a liderança só existe no coração daqueles que confiam e, portanto, nela acreditam. Falando francamente, sabemos que existem falsos líderes, de caráter duvidoso, mas que sabem se expressar com precisão. Em geral, eles utilizam sua habilidade de comunicação como engodo. Por meio de discursos grandiosos, traçam cenários mirabolantes e prometem “mundos e fundos”, muito mais do que realmente podem cumprir. São internamente inconsistentes e vazios, mas convincentes em suas oratórias. Esses líderes não podem, de modo algum, serem chamados de líderes propositivos. Para nossa felicidade, eles não duram muito. Um líder falso, que sabe se comunicar bem, pode enganar seus liderados, mas certamente não será por muito tempo. Vale lembrar que as ações de um líder propositivo devem falar mais alto do que suas palavras. O líder pode usar uma bela retórica, mas se não for verdadeiro em suas ações e, principalmente, se estas não estiverem em sintonia com suas promessas discursivas, ele certamente não se tornará um líder longevo. É apenas questão de tempo – basta esperar para ver sua máscara cair. 1.6. LIDERANÇA E FEEDBACK Feedback é uma palavra de origem inglesa, que em tradução livre significa realimentação. O termo é utilizado no campo das ciências, em especial nas áreas de engenharia, física, química e biologia. Resumidamente, o feedback pode ser compreendido como um processo onde uma informação do passado é usada para ajustar condições presentes e futuras. A título de exemplo, pense em quando vamos tomar um banho. Em geral, colocamos uma das mãos na água para avaliar a temperatura, antes de entrarmos debaixo do chuveiro. Se a água estiver muito quente, abrimos um pouco mais a torneira e se estiver muito gelada fazemos o inverso. Repetimos a operação, até que a água fique na temperatura ideal. Esse processo de avaliar a temperatura atual da água (condição passada) para ajustá-la à temperatura ideal (condição presente e futura), chama-se feedback. Esse conceito, a exemplo de vários outros nascidos no campo da ciência, foi incorporado pela área de administração. Significa a utilização de informações críticas e valiosas 28 (condição passada), utilizadas para o ajuste do desempenho e do comportamento de uma pessoa (condição futura). O feedback é uma ferramenta poderosa que o líder propositivo usa no seu dia- a-dia de trabalho. Embora seja um processo difícil de ser implementado, quando líderes e liderados se tornam especialistas em dar e receber feedback, o processo cria uma base concreta, na qual a confiança é sedimentada. Quando bem realizado, ele não gera ansiedade em nenhuma das partes, ao contrário, serve como experiência de aprendizado para ajudar as pessoas a melhorarem seus desempenhos e serem mais produtivas. De modo mais detalhado, feedbacks são informações que uma pessoa (ou organização) recebe a partir de uma avaliação feita por um agente interno ou externo. Em geral, dizem respeito ao comportamento, às atitudes, e ao desempenho da pessoa em relação às suas atribuições ou funções. Feedbacks consistentes permitem à pessoa que os recebe melhore seu desempenho, alcance seus objetivos e mude sua forma de agir, quando necessário. Feedbacks devem ser vistos como oportunidades de melhoria. Em geral, são os líderes que dão feedback, mas isso não significa que eles também não devam receber feedback dos seus liderados. Na verdade, os melhores líderes são ávidos em receber feedback. Pesquisas mostram que os líderes mais abertos para receber feedback em geral estão listados entre os mais eficazes. Existem muitos benefícios para a organização quando o líder sabe trabalhar com feedbacks. Vamos listar alguns. Minimiza a ocorrência de erros. O feedback cria um canal de comunicação claro e honesto, por meio do qual as informações fluem com mais precisão e rapidez. As pessoas sentem-se à vontade para apontar falhas, discutir sobre problemas e propor alternativas, porque sabem que suas colocações serão ouvidas e consideradas. Direciona o caminho da equipe. Quando feito regularmente, o processo de feedback ajuda na condução das ações estratégicas da empresa. As dúvidas são dirimidas com mais facilidade, porque as pessoas não têm medo de pedir ajuda quando se sentem desorientadas. Preserva os relacionamentos. Nas empresas onde o feedback está incorporado à cultura, as pessoas se sentem mais confortáveis para tecer críticasconstrutivas, pois ao fazê-lo entendem que estão agindo em conformidade com as regras. Isso diminui o constrangimento e resguarda a integridade da equipe. DESTAQUE Feedbacks consistentes permitem à pessoa que os recebe melhore seu desempenho, alcance seus objetivos e mude sua forma de agir, quando necessário. Feedbacks devem ser vistos como oportunidades de melhoria. 29 Promove crescimento pessoal e profissional. Ao receber feedback, o funcionário deve ouvir atentamente, dedicar um bom tempo para analisar as questões apresentadas e, finalmente, buscar uma solução que lhe permita corrigir possíveis falhas. Quando isso ocorre adequadamente, o funcionário cresce como pessoa e como profissional. Inspira as pessoas. Processos de feedback cuidadosamente trabalhados, servem como estímulos e incentivos. Quando uma pessoa percebe que o processo está contribuindo com o seu crescimento, ela se sente mais estimuladas a ir em frente, torna-se mais produtiva e, consequentemente, mais feliz. Favorece o clima organizacional. Nas empresas onde todos estão abertos a críticas e sugestões e até buscam por feedback, o engajamento e a cooperação florescem de maneira espontânea e natural. Consequentemente, o ambiente torna-se mais descontraído, não há espaço para intrigas e desavenças e o clima fica mais leve e amigável. Contribui com o sucesso do negócio. A partir da somatória de todos os benefícios acima, é fácil perceber como o feedback contribui, ainda que indiretamente, para alavancar o negócio da empresa. O feedback construtivo é uma ferramenta robusta para criar um ambiente saudável, aumentar a produtividade e o engajamento e alcançar melhores resultados. Isso funciona para negócios, esportes, educação e muitas outras atividades. O líder propositivo é habilidoso no uso dessa ferramenta. Primeiro: ele procura agir de modo honesto e transparente para gerar confiança e segurança junto às pessoas. Ele não é impulsivo e nem irascível em relação aos acontecimentos. Quando detecta um problema ou um erro, espera o melhor momento e encontra o melhor lugar para dialogar. Ele age de maneira calma e racional, procurando não transformar a conversa em um momento de tensão e angustia. Sabe que se for muito contundente e/ou agressivo, irá provocar uma reação contrária no liderado e que este, naturalmente, vai reagir de modo defensivo. Segundo: o líder propositivo é cuidadoso, mas franco e claro em sua comunicação. Ele não dá voltas, vai direto ao assunto. Ele evita criar o costumeiro sanduiche de elogios, críticas, elogios, criticas... Sabe que essa alternância excessiva de coisas boas e ruins dissolvem as verdadeiras mensagens que ele quer transmitir e que no final ninguém sairá satisfeito. Um ponto importante: o líder propositivo sabe que dar feedback é sinônimo de transmitir conhecimentos. Por isso, sua forma de falar, seu tom de voz e a estrutura de sua mensagem são constituídos de maneira que o liderado sinta que está sendo ensinado e não julgado ou criticado. Terceiro: o líder propositivo é específico e preciso nos assuntos que deseja abordar. Ao conversar abertamente com seus liderados ele evita expressões do tipo: 30 “acho que”, “ouvi dizer”, “me disseram” etc. Em outras palavras, ele só dá feedbacks relacionados aos assuntos sobre os quais tem bom conhecimento e, se possível, possui fatos comprovados. Além disso, evita abordar muitos temas ao mesmo tempo, o que torna a conversa muito extensa. Ele sabe que conversas longas e genéricas, em geral desviam a atenção do avaliado, tornando o feedback ineficiente. Quarto: o líder propositivo não apenas aponta os defeitos, mas indica soluções, abre novos caminhos, oferece oportunidades. Sempre que possível, se coloca em posição de mentor do liderado ou indica alguém que possa exercer esse papel. O líder propositivo preocupa-se sinceramente com seus subordinados e, por isso, seu feedback é sempre construtivo. Quinto: o líder propositivo trabalha com feedbacks de mão dupla. Sua comunicação é bidirecional; ele incentiva seus liderados a também falarem sobre suas experiências, sejam boas ou ruins. Tem convicção de que essa é uma das melhores maneira de descobrir os problemas que estão latentes nos níveis mais baixos da hierarquia. O líder propositivo é um exemplo para seus liderados, motivo pelo qual está sempre pronto a ouvir genuinamente o que eles têm a dizer, sem menosprezar ou retrucar. Sexto: o líder propositivo cria uma cultura de feedback na organização, ou seja, uma cultura focada na realimentação honesta entre todas as pessoas: líderes e funcionários, funcionários e pares, líderes e pares. Trata-se de uma cultura onde todos possuem o direito de dar feedback às outras pessoas, assim como também, estão devidamente preparadas para recebe-lo, não importa a posição que cada um ocupe na estrutura organizacional. O feedback é sempre imensamente fascinante e revitalizante. Quando bem realizado, promove conexões resilientes com a satisfação dos funcionários e, portanto, está diretamente associado à produtividade e ao sucesso do negócio. Trabalhar com feedback construtivo é mais uma das habilidades do líder propositivo. 1.7. LIDERANÇA, DIVERSIDADE E INCLUSÃO Cada vez mais as empresas estão percebendo que cultivar a igualdade não é apenas a coisa certa a fazer, mas a coisa inteligente. Pesquisas mostram que empresas que criam culturas de diversidade e inclusão (D&I), apresentam resultados surpreendentes. Uma empresa que promove o equilíbrio saudável entre homens e mulheres, por exemplo, tem 21% a mais de probabilidade de superar suas concorrentes. Quando, além do equilíbrio de sexo, a empresa tem uma boa mistura de origens étnicas, as chances sobem para 33%. Equipes com alto índice de 31 diversidade em todas as nuances, por sua vez, são até 87% mais eficazes na tomada de decisão. Mas, afinal, qual é o verdadeiro significado de diversidade e inclusão? A diversidade pode ser definida, em poucas palavras, como um conceito utilizado para diferenciar grupos e pessoas uns dos outros. Significa aceitar as pessoas, respeitando e apreciando o que as diferencia, em termos de idade, gênero, etnia, religião, deficiência, orientação sexual, educação e origem nacional. Estar aberto à diversidade é a melhor forma de explorar as diferenças em um ambiente seguro, promissor e estimulante. É compreender que diferentes mindsets9 são determinantes para estimular novos olhares e novas formas de apreender a realidade, algo que hoje é essencial para o futuro de qualquer organização. A inclusão, por sua vez, representa todos os esforços e ações que são realizadas dentro da organização, com o objetivo de criar uma cultura de respeito e legitimação da diversidade. Culturas inclusivas reforçam o sentimento de pertença, porque as pessoas sentem que são importantes para a organização. Organizações inclusivas fomentam a aceitação e a tolerância, cientes de que são as singularidades no modo de ser, pensar e agir de cada pessoa, que alavancam a autorrealização da coletividade e garantem o sucesso da organização. Há uma verdade incontestável no mundo empresarial da atualidade: sem talentos especiais nenhuma organização consegue sobreviver e prosperar por muito tempo. Isso é o mesmo que dizer, que as organizações precisam ir além do recrutamento tradicional para atrair as melhores mentes, assim como as pessoas com comportamentos motivacionais mais adaptados à realidade da Era Digital. Mas, há ainda mais um ponto a ser considerado: hoje a maioria das pessoas acredita que as empresas têm a responsabilidade de ir além do lucro, ou seja, devem não apenas evitar as externalidades negativas10, como também promover a melhoria das condições gerais da sociedade. Isso tudo nos remete à questão da diversidade e inclusão. Os líderes
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