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Feminismo Perversão E Subversão - Ana Caroline Campagnolo

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perversão e subversão 
ANA CAROLINE 
CAMPAGNOLO 
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1 1//),///11� ,/ /,//., (J,)/('//i'tl�. 
• 
perversão e subversão 
CAMPAGN()LO 
-
-
-
perversão e subversão 
Prefácio 
,Bernardo Pires Küster 
Feminismo: perversão e subversão 
Ana Caroline Campagnolo 
1 ª edição - fevereiro de 2019 - CEDET 
Imagem da capa: Salomé, Jean Benner, c. 1899. 
Os direitos desta edição pertencem ao 
CEDET - Centro de Desenvolvimento Profissional e Tecnológico 
Rua Armando Strazzacappa, 490 
CEP: 13087-605, Campinas SP 
Telefone: 19-3249-0580 
e-mail: livros@cedet.com.br
Editor: 
Thomaz Perroni 
Editor assistente: 
Nelson Dias Corrêa 
Preparação do texto: 
Gabriel Buonpater 
Revisão ortográfica: 
Gabriel Warken Charczuk 
Capa: 
Gabriela Haeitmann 
Diagramação: 
Gabriela Haeitmann e Mariana Kunii 
Conselho editorial: 
Adelice Godoy 
César Kyn d' Ávila 
Sílvio Grimaldo de Camargo 
FICHA CATALOGRÁFICA 
Campagnolo, Ana Caroline. 
Feminismo: perversão e subversão/ Ana Caroline Campagnolo -Campinas, SP: 
VIDE Editorial, 2019. 
ISBN: 978-85-9507-054-7 
1. Feminismo.
1. Título II. Autor
ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO 
1. Feminismo - 305.42
VIDE Editorial - www.videeditorial.com.br 
CDD-305.42
Reservados todos os direitos desta obra. Proibida toda <' qualquer reprodução desta 
edição por qualquer meio ou fonna, seja ela eletrbnicn, rtlrl·ànica, fotocópia, Krava­
ção 011 qualquer outro rnrio de reprodu\·ào, srrn prr111iss1lo t·xprt·ssa Jo rditor. 
Dedico toda tentativa de esmero deste texto a minha mãe Maria Raquel, 
rainha do lar e de nossos corações, 
e a meu pai Job Campagnolo, 
que provou que o amor de um homem lança fora o medo 
e a necessidade de vender-se à ideologia. 
:Prefácio, pclr Bernardo Pires Küster ..... º ............................... 13 
J: 11trc�1dl1ção ..•......•................•....•.•....•...•...........•..•.•....•....•.•.•. 2 3 
(�:;Al,f]'·uio 1: Contestação moral ... religiosa e educa.ção ........... 35 
1" ,,t,t (> f e,.ni11ismo •.•.•..••.•......•.•.•. •••.••••.•••••.•••..•.•..••.•..••••....•..••.....•.... 3 5
Mtir)' Wollstonecrafr 
e f) ,ioci,mento fundador do femitiismo (l 79.2) .............................. 37
( :t.,ntt'st,lçãc, 11toral-religiosa 
,:i e,i,,,:açãc> pública: germes do f eminisn-zo .................................... 38
t' .:> J;erfil ,:las rnulheres do Setecentos: 
.11riuile:,,:ia,las, 1tâ() oprimidas .......................................................... 42
( ,:f,rnbate à /il1ertinagem sexual 
t ,;i• / ,1g'i f . ..J ,i ,n o d és tia .................... " . . . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 7. 
t;. 
(.) t>,lJJt.d esse·,icial lia mulher é ser mãe ........................................... 49
é\ r!dttfilÇlit) p,,b/ica 
to11u:., i11stru11·ie11to de tra·nsf armação sc,cial ..................................... 51.
i\ frjiud,? ,J,z etJi,cação ttzista igu.alitária . ............................................. 5 5 
,,; ( :J,� interesses e o con-iportamento distinto dc1s sexos.,, - - - ·· -""' . d d ~ " Prlo tT>11se,1i-1t�nctas a e ucaçao : 
talie.� ,Ítl iti,l<.,l(>gia de gênero ........................ u ............. --·••u••··· ................ 69
, -:, -.
-
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.-. ·1- ·· - .. :- · d·· - ·lh --· · . · - · - · 1· - 7S , ::AI r l lJLt> 11. 11serçac> a .mu . er n<> universo mascu. 1no...... , 
.
1
�, Ílllt? ;,♦,l ()11,i,1 fe111i11ista .................................................................. 7 5 
; ' . t" .,,---r-.• --,-- , . ' _, -- . ·- ') ., --· !_1-·
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--. "' , 1· -- . I t J 76 l1111_ lt 1rt1;,. f>r(Jpr1e, ,1, t. ,, .. _ Jt-ra,1,,,_1 .......... H• ........ ....... ••• .. ... • ......... ••••• .... • 
,J ,-i:'1·1·,- /·1-,L•"7"' <it-i(')S ,, _,-,,,-·z· fi)·r· Çf•S ,- '1:<J/'i�{"'�-'lz' 1'1(1-S ,--•[1.--- .:1-··v-11/n ... ,,. ,..,-�,-'(),./·1 .. r, ,l_, ·'.•. ,�� it: ;. li,· . . •. • • -,: ... -;i;- _ _,_,�-=- . ,-, ... t "".· · _/.11;;1- _.,.-__ ,._�(:!-_. ;;-�1: �.-.,,,� . ____ ,.,. .,.t __ ,: 
/ ,A •' ''i ,-.-, .. . -1· ... d. ',. , ..... - ,-e .,, ,.,. ,,,,) ··• ,. ,. . � ,r; ',:O " 'v ,,... ·' - " .,J -� .., ·:- ·. ' t ·· I). 8 e···),.,,tr•t't:ch .e) . . e l1t1 ht. ltJ, ,� ,,�1,1,.s.sao (/.1fh.lt;.r esta_.,, . .. .- ......... .... u ....... -� " 
Inauguração do Women's Movement nos EUA (1848) ................. 83 
Direito ao voto ............................................................................. 88
Stuart Mil/ e Harriet Taylor: 
argumento da igualdade ............................................................... 96
Kollontai e o feminismo socialista ...................... ........... .... . .......... 99 
Trabalhar: privilégio ou necessidade? ......................................... 109 
Desigualdade no mercado de trabalho ........................................ 114
Reclamando de barriga cheia .................................... ................. 11 7 
O bem-estar da família 
e a complementaridade de papéis ............................................... 124 
Casa privada versus casa pública ................................................ 129 
O saldo da Primeira Onda ......................................................... 135
CAríTULO 111: Reprodução feminina do vício masculino ..... 137
Segunda Onda feminista ............................................................ 137
Margaret Sanger e o assassinato de bebês ................................... 13 9 
O quase-aborto de Jane Roe ....................................................... 143 
IPPF- multinacional da morte ................................................. 148
Promiscuidade e irresponsabilidade sexual ................................. 156 
O segundo sexo .......................................................................... 162
O primeiro sexo ......................................................................... 16 7
Simone de Beauvoir & Jean-Paul Sartre ...................................... 170 
Olga Kosackiewicz, a primeira vítima ......................................... 176 
A coleção de mulheres de Simone & Sartre ................................ 182
A f a Isa promessa de satisfação ................................................... 186 
Betty Friedan, matrimônio e maternidade .................................. 192
A quem importa casar-se? .......................................................... 201
O problema sem nome não é um problema ,Je t,,,los .................. 220 
O saldo da Segunda C)nda ............................... . .. . . . . . . . . . . . . .. .........224 
( :1\P'Íl'U LO IV: Subversão das identidades ............................... 229 
· 1, 1rceira ()11cia feminista .................................................................. 229 
lt leologia ,ie gênero e ]ztdith Butler ............................................ 231 
.Sul,vt�rsão dos sexos e es112oreci11ze1itcJ d,is idetitidades ............... 234 
e) J1t1drã() lésbico e Monique Witting.u ....................................... 239 
l .inguage111 e ideologia de gê1zero ................................................ 244 
t J J>t1,lt,1<J gay e Alfred Kínsey ............... ...................................... 248 
1) J fil. ,, ,, ·l 
,. '/:: ? 2 ... ').,•, t) ,a e »zetot .e> c1e1zt11,co . ......................................................... �··· ).) 
< > t'ritério 11·1oral seletivo e totalitári<> das fe1ninistas .................... 263 
l' ..... " . - . '] 6. 9, ... ,.,, (<>Y/Jo 1·1ao e u,na fJr1sc1c, .............................................................. -
l\ /1rc>(u1i,lidade dos sexos ............................................................ 2 78
l,lt·olo.itia de gêrzer<J e a fattiilia Rei1ner ......................................... 282 
( :A1•í�ruLo v: O ódio ao cristia.nisino e a reação 
contra o totalitarismo feminist,1 ...................... 297 
r' .,,,e.n e o t.l1'tticatolicis1no u . ... ....... .......... ........ u .......... .................... 3.00 
� > / •· . / d t · . -· � 303 t. "" e a ci, (Ja o mora zsnt<J crista(). . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .• .. .. . . . . . .. . . . .. . .. . ... , 
J >,·sn1istific,.t.1ndo a opressão .cristã .................................................... 307 
l\ f Jro/Josta f e11ii1tista para as niztlheres ......... ................................. 311 
l·,,·111i11isn,10: biogr,1fias cie i11felicidade e proniiscuidade . .............. ..324 
U ,'d(âo antifen1inistt1 ..... ...... .............. u ........... ............................... 331 
{ ) t'sq1,1eci1,nento t.Ío pri1,ieiro sexo .............................................. 3 ... l8
e'\ , /t •ntonizaçiio cÍ<>s 1ne1zinos ........................................................ 34 3
i\ ,i.,:11erra CC)fZt-rd os /Jo-111.ens ........................................................... 348 
l\ (11/tura ,la falsa acusaçà<> de esti,pro ...... º ................................. 355 
( .ºontrc ,/e i,11iversitâri<J e aparelhan-1ento institi1ci<Jn,1I ..........•.....• 362 
Conclusão .......................................................................... 367 
Apêndice, por David Amato ............................................... 379 
Agradecimentos .................................................................. 389 
Obras feministas ................................................................ 393 
Obras de abordagem antifeminista ..................................... 395 
Bibliografia ......................................................................... 397 
S,• ,is mulheres continuarem tão reivindicativas e as crianças tão chatas, 
no primeiro naufrágio que houver por aí, alguém vai gritar bem alto: 
crianças e mulheres por último. 
Millôr Fernandes 
A ação das mulheres [por direitos legítimos] 
nunca passou de uma agitação simbólica, 
só ganharam o que os homens concordaram em lhes conceder, 
elas nada tomaram; elas receberam[ ... ]. 
Recusar a cumplicidade com o homem seria para elas 
renunciar a todas as vantagens que a aliança pode conferir-lhes. 
Simone de Beauvoir, O segundo sexo (1949) 
Bernardo Pires Küster 
spero sinceramente que, até a conclusà<> do ,presente li­
, vr<>, a autora não tenha sofrido, u111 acidente e al>ando­
..... ,,. nado sua substância feminina. C)u n1esn1<>, quen1 sabe, 
,\11�1 ( :arc>line Can1pagnolo tenha iniciadc1 o livre> sendo mulher 
,· tinalizad<> seu inte11t<> sentind<>-se profunda1nente do gênero 
.. l'º'-l<>. () leitor, então, teria e111 suas n1ãos un1a obra escrita 
por u111 auto-dcclaradc> hc>n1en1 - ou qualquer outro gênero 
p• '""( vcl - e, pt>rtant<l ., a idoneidade de seu conteúdo p<)deria 
, · •, r., r i rrt:·n1cd ia veln1ente con1 pron1etida. 
t :.,so (> leitc>r seja de) tipo ultra-se11síve] e encontre-se agc1ra 
i11rontrolavel111ente aborrecido por saber que un1 l1clmem - ó, 
,•1·11"! -- <>usou 1irefaciar uma obra sobre<> fen1ü1isn10, podernios 
, , .... , ► IV'l'r faciln1ente esse ii11passe. In1agine. Apenas in1aginc que, 
.1 d,·'-pl'it<> de eu ser un1 hon1em C<>nl no1ne n1asculi110, eu scJu, 
11.t , t·rd�H.ie, un1a 1nulher; a mais n1ulher de todas; uma mítica 
1.,v.1. ( lu 111elhc,r, a lúbrica Lilith! Resolvido. 11\_final, não é p(>r aí 
q1t•· n frnlinisnl(> n1ainstrea111 resolveu se meter? 
.-\ 111d�\ que tcntad<> a C(>ntinuar, deixo a isonia d,c lado - pelo 
IHl'llt ►-.; por <>ra. 
"l lrn r�eqtH.'11<> err<> no princípio acaba por tornar-se grande 
, H • fin, ., .. i\ rist<'>teles, nesta grave constatação, nc>s cc>nfere u1na 
• 111.1, t· p;1ra l'<>n1prerndl'r o porquê de o fen1inisn1c> ter perdid.o
4't1111pl,·1.11nentt· as l'Strihciras e gl<>rificado <le pé Angela Ponce,
""' hnnH.·tn 1nagrl'I<> qut� venct·u <> l'<>nt·urso Miss r�spanha 2018. 
,.\ lua-..l\l p,,r l·rna1u:ipa\·�t<> <.lesr<>ntrc,L1da das n1ulht'res cr>n1eç<>u 
, • • 11 a d e 11 1. 11 1 d a s r < ) 11 f1 i L 111 t l' s l l li ; 1 11 t e , ; u , s u f r â g i < > <., l" < > n q u i s t l > U ,
1 \ 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVERSÃO 
ironicamente, o prodígio de subverter a própria identidade da 
mulher, como Ana detalha no quarto capítulo deste livro. No 
fundo do movimento feminista jaz o enxofre da mentalidade 
revolucionária: uma sanha que tornou-se o ar que respiramos. 
É aquela perigosa idéia de que reconstruir o paraíso perdido 
não é apenas factível, mas necessário. A sociedade igualitária, 
fraterna e livre está, por conseguinte, ao nosso alcance. 
Conforme se vê pela construção cronológica elaborada em 
cinco capítulos pela autora, o feminismo começou com a pu­
lulação de movimentos populares, ora confluentes, ora discor­
dantes, de mulheres que carregavam motivações parcialmente 
genuínas, que mais ou menos explicam politicamente suas ações 
iniciais, mas não justificam o caminho mendaz para o qual, 
hoje, o feminismo tanto deseja nos conduzir. Problemas com 
direitos de propriedade? É certo que os tínhamos. Desigualda­
des nos contratos matrimoniais? Também isto havia. O sufrá­
gio tinha de ser resolvido? De alguma maneira. Suas deman­
das políticas estão na base mesma da sua constituição inicial e, 
logo, suas demandas públicas acabaram com sua vida privada. 
Ganharam o mundo como casa, e perderam a casa como lar. 
Não restam dúvidas disso quando terminamos a leitura dos ca­
pítulos segundo e terceiro do livro de Campagnolo. 
Freqüentar a escola superior ou uma universidade; ter a pos­
sibilidade de votar e de serem eleitas; abrir conta em banco; 
exercitar formalmente uma profissão; trabalhar em cargos pú­
blicos e ocupar posições diretivas; até mesmo seguir vocações 
artísticas sem serem submetidas ao desprezo social. Resolver, 
digamos, tais problemas para as mulheres envolvia deman­
das políticas e uma ampliação da sua atuação social e pública. 
Queriam romper com a esfera privada e pagaram um preço 
altíssimo. G.K. Chesterton, numa brilhante crônica intitulada 
A mulher, 1 originalmente publicada em 1908, nos coloca diante 
de um fato tão verdadeiro quanto perturbador, jamais trazido 
à tona quando estamos numa altercação sobre o feminismo, 
como é o caso deste livro. Peço licença ao sensível leitor para 
citar outro homem: 
l G.K. Chesrerton, "A mulher�, em Considerando todas as coisas, tr11dui.,\11 Jr
Ma teu� l.cn1c. Can1pinas: E,dcsiac, 201.1, pp. 99-104.
14 
PREFÁCIO 
Dentre os dois sexos, a mulher está em urna posição mais 
poderosa. Pois a mulher comum está à frente de algo que 
pode conduzir à vontade; o homem comum tem de obedecer 
a ordens e nada mais; somar um tedioso número a outro, 
e nada mais. O mundo da mulher talvez seja pequeno, 
masela pode alterá-lo. A mulher pode dizer ao vendedor 
com o qual negocia algumas coisas realistas sobre ele. 
O empregado que faz o mesmo com seu gerente em geral é 
despedido. Sobretudo, a mulher faz um trabalho que é, em uma 
pequena medida, criativo e individual. Pode colocar flores nos 
móveis em arranjos imaginados por ela mesma. Temo que um 
pedreiro não possa assentar tijolos em arranjos imaginados por 
ele, sem causar um desastre a si mesmo e a outros. [ ... J Uma 
mulher que cozinha talvez não o faça sempre artisticamente; 
mesmo assim, pode fazê-lo. Pode introduzir uma alteração 
pessoal e imperceptível na composição de uma sopa. 
O escriturário não é encorajado a introduzir uma alteração 
pessoal e imperceptível nos lançamentos de um balanço. 
Ele ressalta o óbvio e continua: "O problema é que a ver­
Jadeira questão que levantei não é discutida. Discute-se como 
un1 problema de dinheiro, e não como um problema nas pes­
soas". 2 As mulheres conquistaram não o direito de trabalhar, 
,nas o dever de sempre trabalhar. A esfera livre e privada do 
lar, domínio despótico sujeito à justa liberdade feminina, foi 
perdida para que as mulheres tivessem de obedecer a seus pa­
trões e, quando chefes, dançar a música de clientes indiferentes 
e mandões. Tanto isso é verdade que Ana Caroline Campag­
nolo relembra que, durante a Primeira Onda feminista, aquela 
sufragista, "três grupos de mulheres atuavam na luta contra o 
voto feminino: senhoras imperialistas, escritoras e reformado­
ras maternais ... Mary Ward, Louise Creighton, Ethel Harrison, 
Elizabeth Wordsworth e Lucy Soulsby foram as principais líde­
res do movimento". A questão da liberdade apenas as tornou 
111ais dependentes da regulada vida social e cumpriu o sonho de 
llousseau: entregar os filhos aos cuidados do Estado para uma 
t.:<>ndução (supostamente) autônoma da vida. 
A assim chamada luta das n1ulheres foi uma luta coletiva, e não 
individual. Lutou-se pela emancipação das mulheres, e não por 
2 lbid., p. 102. 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVERSÃO 
cada mulher em particular. "Temos razão", finaliza Chesterton, 
"em falar sobre 'A mulher'; apenas canalhas falam sobre mulhe­
res. No entanto todos os homens falam sobre homens, e essa é 
toda a diferença". 3 Ao coletivizar a luta, ela automaticamente 
torna-se política; e, sendo assim, será necessariamente absorvida 
pela cultura política corrente. As vocações espiritual e familiar 
da mulher foram sobrepujadas por uma necessidade irrefreável 
de exercer a profissional, de modo que a mulher, que quando 
perguntada sobre seu estado dizia ser mãe, tia, avó ou esposa, 
seguindo-se sempre a declaração de seu credo - cristã, católica, 
protestante, espírita ou ortodoxa -, hoje declara ser médica, di­
retora, atriz ou professora, como se sua profissão fosse exercida 
mesmo enquanto reza ou troca a fralda do seu filho. 
Por sua vez, os homens, pela virtude do sacrifício, tinham 
de abnegar suas vocações espiritual e familiar justamente para 
manter livres e vivas aquelas de suas respectivas ajudadoras. 
Há detalhes desse processo nos capítulos dois e três. E pontuo: 
não há melhor termo para a mulher do que a expressão bí­
blica ajudadora. Ranja os dentes, sensível leitor. Antes, porém, 
de fechar o livro, permita-me molhar as palavras. Por defini­
ção, quem ajuda está em melhores condições do que o ajudado. 
O bombeiro que salva o náufrago possui urna bóia, enquanto 
a vítima recolhe água nos pulmões. A mãe tem os seios cheios 
e a criança o estômago vazio. A freira piedosa reza o rosário 
para o fiel descrente. O texto mosaico diz que "não é bom que 
o homem esteja só" 4 e que, por isso, uma ajudadora seria feita.
Ele precisava dela. Nas palavras de São João Paulo II, aconte­
ceu a "ultrapassagem do confim da solidão" 5 do homem.
Nenhuma teóloga feminista, por exemplo, faz questão de no­
tar o óbvio: o homem foi feito do barro e a mulher do homem. 
Ela não foi feita da lama, mas da carne. O que isso significa? 
No mínimo, que ela carrega uma origem mais refinada, organi­
zada e - por que não? - superior. São essas as características 
da mulher. Fra Angelico, Michael Pacher e Michelangelo jamais 
3 Jbid., p. 104. 
4 Gn2,18. 
5 Papa São Jo,io l'aulo li, 1'eo/,,>:i" ,lo C<Jr{Jo: o '"""' /J,1111,11,11 110 ('/"'"' J,11i1111. 
C,unp111as: F.,dt·si;1c, .2.014, p. 5 l. 
16 
PREFÁCIO 
puu a ran1 <) Demô11io com feições de mulher. J>elo C<>ntrário, 
,,c1nprc se inspirara1n na rudez que é própria do hon1en1, do 
h.1 rro. Seres angelicais e superiores, por st1a vez, estão repletos
,I(· "-llgcstões e gestos feminit1cls como se quisessem captar e des­
,"ortinar a essência hun1ana n1ais pura e elevada: a da rnulher.
1,so tudo, n<> entanto, está quase perdido por completo. 
;'\" n1ulhcres acl1aram que para ser livres e iguais precisavam fa­
lt'r ;1s 111esmas cclisas que os ho1nens. Sul..,iram aos cargos n1ais 
,·h·v.1d<>s e adquiriram os vícios mais baixos dos hc.1111ens. 
I··. at1ui que se encontra, sem chaucc de retorno, o pont<> 
d,� 111flexàc> do fe111inismo . .LA.. revolução sexual das n1ulheres 
( >rganizada, ironicamente, por hc>mens - é a n1ancl1a da
",t'gunda Onda do n1<>vimentc1, que cc>mcçou pedindo (iireitos 
t'ºI 1t il.·< >s e melhores C<>n_dições sc>ciais e tc.rminc>u, para che­
J',·" Li, �ritandc) por pílulas anticonce11cionais e abortivas; por 
1 d ,,·L1�;10 sexual e aceitação pública da degradação de seus 
, • •rpos e almas. Todos seus direitc)s políticos e sexuais fc>ran1 
, onqu1stados dentro da catedral dcls direitos l1umancls. Usaran1 
• • l,·,•.,d<) judaicc>-cristão para buscar, ressentidamente, destruir a
111.10 t[Ul.� as trouxe à liberdade. E o que Gabriele K.uby, ao evocar
., N,·Jníhlica de Platã<>,6 chan1c>u de .. ,a destruição da lil)erdade
, · 111 1 u une da I ibcrdade".
Brilhante socjól<>ga alemã, Kuby escreveu <> portentoso l)ie 
, , I, d,,1/e sexuelle Revolution: Zerstóritng der Frei/1eit in1 Nan1e11
. /,·, l·'r,·iheit .,7 cuja tradução livre é A rev<)luçào sexual global: 
., tl, 1slr11içâo tia liberliade e1111101ne ,la liberdade. A q11erela, C<ll11C> 
,·, pl1�.1 a aut<>ra, é que a decadê11cia virou hoje p<llítica de Esta­
d11: "rv1uitas culturas se desintegraram pela degeneração n1oral; 
111.1'. que�, degeneração n1oral venha imposta por meic>s .Polític<>S 
,. ' 1 11.i111r;1I que ;l riranú 1úio se estahdcç.1 a partir de nenhurna outr._t fortna de 
f.t H ('1110 qtl\.' 11;10 �t"j,1 a lk·n1o(rad._1, e, julgo l'U, que ,io �úrnulo da liberdade é que
-.111 r-.,· .1 111.11� "·on1pll·t�, l' 1n.1i� sdv�lgl"lll Jas escravaturas'" íA re/n1hlú:a� tradução 
de• 1'1e1H1 N;1,,t'rt1. \jo Paulo:: .tvt1nin Clarct, 2.000, p. 2.62). 
1 1't1•,,11,, ;1 \'('l"'i�-,o Hnli;111.__1, jú qul' 1neu ;1le1nJo é rudi1ncntar. I .Ll Rit 1oluzio11e Sessualc 
•. / • ./,,,fr: d1.,r,·11;:,,1u,u• cl,·lli1 /1/J,•tti.1 ,u·I nu1nt1 dcllii ldwrt,1, tr�1du\<l<> de Roherta 
H111u.11wllo. rv1,bo: Su�"'lrl'o Fd111011t·, .20 l !. l.'i·ta ohr.1, sóhri�1 t� St'n1 son1bras <le 
ld•,fc·n,i. ltll'llli u,na ,c',lid.1 e .1hu1u.bt11t· dot·unwnta\·�io -..ohn.· a rt·volu\'âo sexual 
alc••,ch• ,t'll') ll·c,ri'-·oN pru,u·vcP, ;11<' �•s .1rth.:ul.1�Úl'� polu1"·as 111ais rl'(entt.·s, �1ssunto 
qw· t.u11lw111 l' ahord.hlo por .-\11,1 ( ;,,1111'-'��j11olo ,w,h· hvro. 
17 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVERSÃO 
e culturais, isto é uma novidade". 8 Esta não é mera opinião de 
uma socióloga antifeminista, mas de feministas críticas de seu 
próprio movimento, como Camille Paglia, que atesta que a de­
cadência de uma civilização é marcada pelo descontrole moral, 
pela ode pública à corrupção sexual. O historiador inglês Edward 
Gibbon, em A história do declínio e queda do Império Romano 
(1776-1788), atribuiu o declínio e fim do Império dos Césares, 
entre outras causas, à obsessão pelo sexo e à excentricidade nas 
artes, mascarada como originalidade e entusiasmo fingido. Kuby, 
logo de início, apresenta um estudo urticante do antropólogo in­
glês Joseph Daniel Unwin,� que analisou oitenta sociedades não 
civilizadas e asgrandes civilizações antigas e modernas - babi­
lônios, sumérios, romanos, gregos, anglo-saxões, etc. - com o 
intuito de compreender a relação entre normas sexuais de cada 
sociedade e o grau de civilização. O resultado é resumido na se­
guinte fórmula: "Quanto mais fortes forem as restrições sexuais, 
tanto mais elevado será o nível de civilização; e quanto menos 
restrições sexuais, mais baixo o nível de civilização" . 10 A esta
regra civilizacional, demonstrada por Unwin, não há exceções. 
O século XX, não esqueçamos, além de ter sido o mais violento 
e repleto de regimes totalitários, foi também o que mais reduziu 
suas restrições sexuais. Analisar se tais restrições causam o declí­
nio civilizacional, ou vice-versa, não contempla os objetivos des­
te prefácio. Para isso, recomendo sem medo a leitura do livro de 
Gabriele Kuby. 
O fato inconteste é que o feminismo, a partir de um pa­
vio aceso por Margaret Sanger no início século XIX, 11 e pela 
confusa, porém influente, obra de Simone de Beauvoir, 12 incluiu 
na sua agenda de "direitos humanos" a necessidade de criar 
uma revolução sexual para alcançar, nas palavras da feminista 
radical socialista Shulamith Firestone, "a liberação das mulhe­
res da tirania da sua biologia reprodutiva por todos os meios 
8 lbid., p. 20. 
9 Joseph D. Unwin, Sex and Culture. Oxford: Oxford University Press, 1934. 
10 Jbid.,p.21. 
11 Para conhecer melhor a indigesta biografia de Sanger, cf. Elasah Drogin, Margaret 
Sanger: father of modem society. New Hope: Cul Publications, 1986. 
12 Cf. Simone de Beauvoir, O segundo sexo, 2 vol., tradução de Sérgio Milliet. 2• ed. 
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016. 
18 
PRP.f'ÁCICl 
disponíveis e a ampliação da função reprc>dutiva e educativa a 
t<>da sociedade globalmente considerada" . 1 ·1
Conforme Campagnolo analisará ao l<>ngo deste livro, de to­
dc>s os caminhos escolhidos para promover a revolução sexual, 
a ideologia de gênero é indiscutivelmente aquele que caiu nas 
graças do feminismo - e de bilionários internacionais. Cinco 
mc>vimentos foram responsáveis por conceber essa quimera:•◄
1) a obra já mencionadade Marx e Engels sobre a família; 2) o
feminismo socialista do fim da década de 1960, que assume a
herança do feminismo radical e depois adota a ideologia de gê­
'1ero como conteúdo ideológico e a perspectiva de gênero como
estratégia para inocular a ideologia; 15 3) as técnicas de mudança
de comportamento através de instrumentos psico-sociológicos,
como aquelas desenvolvidas pelo americano Kingsley Davis; 16
4) o grande bloco filosófico da nova esquerda, chamada revisio­
nista, com nomes como Karl Korsch, Max Horkheimer, Louis
Althusser, Jacques Derrida e Michel Foucault, cuja maior dádi­
va ao movimento feminista foi ensinar que a revolução deveria
ocorrer no campo da linguagem; e 5) a fracassada experiência
do doutor John Money, que forneceu às feministas o instrumen­
to para realizar a subversão da identidade: o gênero.
13 Shulamith Firestone, The Dialect of Sex: the case for feminist revolution. New 
York: Farrar, Strauss and Giroux, 2003 ( 1970), pp. 185-6 [grifo meu]. 
14 Estou ciente de que a teoria de gênero na verdade é um conjunto de teorias, 
ora conflitantes, ora concordantes. Aquela parida por Judith Butler, no entanto, 
tornou-se mainstream e tem como concorrente a de Joan Scott, que foca na 
compreensão e revisão histórica através da perspectiva de gênero em seu Gender 
and the Politics of History. Revised edition. New York: Columbia Universiry Press, 
2000. Ver também Felipe Nery et ai., Gênero: ferramenta de desconstrução da
identidade, 1 • ed., São Paulo: Katechesis, 2015; Jorge Scala, Ideologia de gênero, 
tradução de Lyege Carvalho. São Paulo: Katechesis, 2015; Eugenia Roc.cella e 
Lucena Scaraffia, Contra o cristianismo: a ONU e a União Européia como nova 
ideologia, tradução de Ruby Albino de Assunção. Campinas: Ecclesiae, 2014; Juan 
Claudio Sanahuja, Poder Global e Religião Universal li, 2ª edição aumentada. 
Tradução de Carlos Nougué. São Paulo: Katechesis, 2017; Juan Claudio Sanahuja, 
Cultura da Morte: o grande desafio da lgreia, tradução de Lyege Carvalho. São 
Paulo: Katechesis, 2014; Maria Isabel L. Bermejo, Dei Sexo ai Género: na nuova 
revoluciona social. Navarra: EUNSA, 2010. 
1 S Jesús Trillo-Figueroa, Una Rivoluciôn Silenciosa: la política sexual dei feminismo 
socialista. Madrid: Espniia, 2007, p. 208. 
16 Cf. Kingsley Davis, "Política populacional: os programas atuais terão sucesso?" 
na revista Science, 10 de novembro de 14167. 
19 
FEMINISMO: PERVERSÃO F. SUBVERSÃO 
O gênero virou o bisturi lingüístico mágico que faz a sepa­
ração entre corpo e alma, ou melhor, entre o corpo humano 
e o que quer que possa atuar de modo super-rogatório sobre 
o próprio corpo. É algo parecido com o que o autor da Carta
aos Hebreus afirmou sobre o poder da Palavra de Deus: capaz
de separar a alma do espírito, juntas e medulas, discernir pen­
samentos e propósitos do coração. É uma tecnologia lingüís­
tica parentemente mentirosa, danosa, e não por isso menos
eficaz. O fato de algo ser uma mentira deslavada não impede
que suas conseqüências possam ser calculadas de antemão
justamente para um fim específico, geralmente não declarado.
Esta é a característica de uma ideologia. O objetivo públi­
co e declarado é libertar as mulheres e construir um mundo
melhor sem preconceitos, desigualdade e injustiça. O esco­
po real, escondido pelo véu de idéias rebuscadas, é simples:
quebrar a ordem presente, numa espécie de grande antítese
psicológica hegeliana 17 aplicada em massa, a fim de instau­
rar o império da igualdade, cujo sucesso inigualável vemos
florescer na Coréia do Norte, Venezuela e Brasil. Em última
análise, o gênero é a submissão dos sentidos ao imaginário do
indivíduo ou de terceiros; é a substituição do real pelo imagi­
nário; em termos aristotélicos, é o primado do acidente sobre
a substância. É, tristemente, o fim da identidade. Butler chega
ao cúmulo da insanidade: "O gênero é sempre um feito, ainda
que não seja obra de um sujeito tido como preexistente à obra
[ ... ] não há identidade por trás das expressões do gênero; essa
identidade é performativamente constituída, pelas próprias
'expressões' tidas como seus resultados". 18 O leitor percebe a
loucura? É o velho truque de Heráclito! Quem é que escreveu
o livro?
Se não há uma identidade por trás das expressões de gêne­
ro, 19 como propõe Butler, logo, não há mais homem nem mulher. 
17 Não posso deixar de lembrar ao leitor que Burler obteve seu doutorado pela 
Universidade de Yale, em 1�84, com uma dissertação sobre o conceito de desejo 
cm Hegel e, atualn1cnte, é docente de retórica na Univcrsid,1Jc de Berkeley, 
Califórnia. 
18 lbid., p. 56 !grifo meu!. 
19 Gayle Ruhin está de acordo: uAcho que o movin1r11111 írn11111�1.1 drvr �onhar ,om 
algo n1aior do que a elin1ina,;ão da oprt•ss,in d," 111ullwri·,. 1· Ir ,lrvr No11h,1r t·111 
20 
, 
PREFACIO 
r--.J,·111 gt1y, lésbica, transexual, trans-gênero, pan-sexual, bisse­
'i 11.tl, .,gênero, gender fli,id ou qualquer outro gênero possível. 
1 , , liu1 dt>s rótulos, dos coletivos, elas ONGs e o genocídio da 
• , u11u11iJade I-iGBTQQICAPF2K+.20 E a vitória dos metacapitalis-
1.,,. •· l lc ,s dc>nos do poder, agora perante uma massa desorganiza­
d, de· indivíduos atomizados, burros e facilmente manipuláveis 
I'' •t ,,u�1lqucr pressão externa. Se negan1 c>s próprios sentidos, 
1•• •• q,u· dcvcrã(> acreditar no que vêem? E se não precisam .mais 
• 11·1 110 c.1uc vêem, acreclitarão em quem diz enxergar por eles.
1 1111111, l1,l"an1<>s em face do fato i11egável: o movimento feminista,
., .. qnl'n:r (<.lnquistar a ind.ependência total, conseguiu apenas
,h .. 111, ., si 111esmo e granjear o dever de sempre depender do
, \1,,h/1.�IJ,11ent.
I · •,1 ,. 1 i v rc> de Ana Caroli11e Campagno,lo, mais necessário 
.1 .. , p u· 11 un,a, conta, de modc> sóbrio e analítico, u111a história 
H "·'•·• por vezes côn1ica, mas se.nlpre verdadeira sobre como as 
1111 d I u · rt ·��1 bol iram a m ull1er, porque, como disse Chesterton, 
,. 1t1 1,·11.1, t\tnalhas falan1 sobre mulheres". 
Ro1na, julho de 2018. 
, h11,u1,tt ., ... ,c·xu.1h<tadc.·s �.-n1nput�úrí;1s e os papéis sexuais. O sonho que rne parece 
,11,1,,. , .111 , .• 1ntt· é o <ll' urna socú•dad,, dn,irtigind t' S(,'11 gênl'ro ( n1as não sem sexo),
,.,. q1 M 1 •• anarorni,l sc.•xu.1 l dl· urna pr.�soa st·ia i rrl'll·vantr". 1 hid., p. 55 (grifo meu]. 
'11 e • p tt 11.al '/'/,,· ( ;,,,, ll K, t.•rn 1.\ (le Jitn,·irn dt• 201 H. puhl�cou essa n1ais nov;1 forn1a 
,11 •.iHl,1. �·tal ,alw1n dt·s qul· ;Únll.l L1lt;1u1 tnuira, lt·cra�, "itnholo� l' t.'sp;1ços va1.ios. 
11 
enho de família e forn1ação cristãs. Aos 18 anos, eu ha­
via firmado noivado com um rapaz da minha igreja que 
assentia em viver um relacionamento casto. Dez anos 
·,,· p.1ssaran1, ainda lembro de uma noite em que min.ha roda
.11· .1111ig<>s descobriu o significado de "nam<lr<> casto". Todos
1111· .1t·us�1van1 de ingenuidade: "Nenhu,m hc>mem esperaria a.nos 
p.11.1 ter relações sexuais", "ele é gay", '"sexo s{1 depois do casa-
11u·11tc •, en1 plen<J século XXI, só pode ser piada". Não é precis(l
.l11t·r que esses epis{)dic>s me impactaram, ,mas principalmente
po1 qut· percebi q,ue aquela cosmovisão era hegemônica 1 e aque-
1. ··• pr1n(ipi<)S (ou falta deles) era111 quase unânimes. 1,\q·uele foi
, • .111<, d<> n1eu prirneiro contate> c<>n1 o fen1inisn10.
N,1 sala de aula, eu me encontrava com colegas de todas as 
,
1
• ,11fi�,c-,es religiosas e, também, com cétic<)s de todo tipo: pe-
1 P,I .,, .. tucan<)s, comunistas, anarquistas e até quem dizia odiar 
pul1tu:a. l)urante o primeiro sernestre do curs<J, eu me escondia 
111111, cant<> t<lda vez que meus amigos fazian1 chacclta das mi-
11h.1" r<>nvicç<'"ies - que, a bem da verdade, ainda nãcl estavan1 
t .,. , l-L1ras. Ao chegar em casa, eu refletia sobre o que tinha ou­
," 1( , .. pesquisava cada assunto, duvidava e voltava a ter certeza. 
t'-J, u 1i ; 1 pensei que escolher <> curs{> de história e a 1 icenciatura 
··•·• 1.1 11111 salt<1 para c1 precipício ideológico. 
Pq�gv ( )n·11'h"Ín - íc111inista - pl·squi�ou e.> rdatou a pressão que as n1oças têJn 
•,4 ,t, ,d,, qu,1111• 1 a ,t1.1s vida, Sl'Xt1;11,. lnfdi.1.1nt.·nt<.',t. .. t1 sú ti V(' n1,nuridade para entender 
•·••"· .. c-p1�odios "-01110 ·•ft·núnH.•nos soc1ai," ,:1110, ,n�lis t:ude. Eta t'S('reveu: ... Agora, a�
••,,11ot;1, ,1u<· �t· ;1hsri·1n d,· ,t.·xo r (llll' autt·, l'f'.HII VÍ'if.t"i l·on10 "ho;ts n1etti:nas' ta111bénl
•,1· t·11v,·rgo11ha111, f11tul.1c.b, d(· •v1ri�l'll'."'i' jo qul' 11.io t· ho., (ni,.1) 011 'puritanas"�. 
2.l
l'l'MINISMll: l'l!RVERSÃ<> E SlJRVl,KSÃll 
Hoje sei que esse cenário é c<>mum a muitos jovens cristã<)S 
universitários, e não apenas no Brasil. A jornalista fen1inista 
Peggy Orenstein fez recentemente uma pesquisa com jovens e 
adolescentes dos Estados Unidos e uma das moças entrevista­
das relatou que, nos últimos anos, 
é muito fácil ser qualquer coisa na minha escola, menos cristã. 
As pessoas aceitam que você adote o gênero que quiser. Isso é 
tranqüilo. E você pode ter a sexualidade que quiser, também, 
exceto ser pura. É estranho. A maioria das pessoas com quem 
eu falo me acusa de julgar muito. E eu digo: "Você está me 
julgando!". 2
A jornalista também entrevistou alguns pais americanos que 
estavam cientes do problema, porque também passaram pela 
universidade e se deixaram influenciar pelo cenário - e não sei 
dizer se a maioria de nossos pais brasileiros têm a mesma clareza: 
Fraquejei !quanto aos meus princípios], porque fui para a 
faculdade e fiquei por minha conta. E me desviei do caminho. 
Não me cerquei de pessoas parecidas comigo. Havia angústia 
e muito sofrimento. Diziam-me o tempo todo que ninguém 
praticará a abstinência, que não há como praticá-la. Por quê? 
É tudo uma questão de escolha.3
Mas eu só descobri essas pesquisas, depoimentos, livros e 
teorias muito mais tarde. Eu sabia que alguma coisa estranha 
estava acontecendo comigo, estudante em uma cidade no inte­
rior do sul do Brasil, mas não imaginava que alguma coisa real­
mente grande estava acontecendo no mundo todo desde 1960. 
Durante os quatro anos do curso de história, vi todos os 
meus colegas serem conformados ao esquema "esquerdista e 
feminista". Eu não entendia de onde vinham todos aqueles ró­
tulos político-ideológicos que me impunham, sendo que a única 
coisa que eu fazia era tirar boas notas e ler a Bíblia nos interva­
los. Não debatia em sala de aula nem contestava os professores, 
mas fui jogada à extrema-direita - na solenidade de formatu­
ra, a oradora me descreveu como "defensora da ditadura". 
2 Peggy Orenstein, Garotas & sexo. Rio de Janeiro: Zah.ir, 201 7, p. 91. 
3 lbid., p. 95. 
24 
1 NTR<ll>llÇÃ<l 
Desconcertada, rescllvi procurar a origcrn d<> fenômeno que 
me distanciava das minhas colegas. A ,ninha primeira descoberta 
Í<>i que eu estava perdendo minhas amigas porque elas estavam 
se tornando feministas convictas. Os artigos que li para entender 
o que era feminismo dissertavam sobre direitos civis, igualdade
salarial e combate à violência doméstica. Ora, nada disso me soa­
va estranho: meu pai sempre se preocupou com minha educação
formal e me ajudou a arrumar o primeiro emprego; ele me leva­
va junto em comícios e jantares políticos, orgulhava-se do meu
desempenho escolar, dava o mesmo tratamento amoroso a mim
e ao meu irmão, jamais foi violento com minha mãe. Minha fa­
mília era cristã, tradicional e natural, mas não se parecia em nada
com a descrição que as feministas faziam de uma família assim.
Minha mãe era dona de casa, mas não se considerava entre as
vítimas do "problema sem nome" que Betty Friedan dizia ser a
grande aflição da esposa dona de casa. Nem eu nem minha mãe
sofríamos algum problema de discriminação por sermos mulhe­
res, não nos sentíamos oprimidas por nenhum homem de nossa
convivência, não pensávamos mal de nossa condição feminina.
Por outro lado, concordávamos que as mulheres deveriam ter
seus direitos civis assegurados, ter condições iguais no mercado
de trabalho e estar a salvo da violência doméstica. Então, pronto:
eu e mamãe também éramos feministas. Estava resolvido.
Não foi tão simples. Apesar de subscrever, desde o primeiro 
momento, o tripé da propaganda feminista - igualdade sala­
rial, direitos civis e combate à violência-, pessoas como eu e 
minha mãe jamais seriam aceitas nos coletivos engajados. Para 
que pudéssemos fazer parte do clubinho, faltava-nos a renúncia 
moral, aquela mesma que fazia rirem os meus colegas que nada 
entendiam sobre casamento, castidade e continência. 
Foi vasculhando os livros das próprias feministas que me 
dei conta de qual era o teste de iniciação do movimento: a ade­
são à revolução sexual. Toda aquela conversa sobre direitos das 
mulheres não passava de maquiagem. Esses direitos não são 
tão importantes assim; aliás, são até negociáveis, desde que os 
objetivos da revolução sexual se mantenham intactos.4
4 As feministas anarquistas, por exemplo, afirmavam que lutar pelo sufrágio 
universal - o direito ao voto para as mulheres - era um tremendo desserviço. 
25 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVERSÃO 
O que toda feminista tem em comum é o compromisso com 
a revolução sexual, a mesma que alcançou as universidades e 
fincou suas raízes no coração dos jovens. Todos as outras pau­
tas e direitos podem ser usados ou descartados à medida que 
catalisem ou não a revolução. 
De todo modo, naquela época, minhas investigações eram 
incipientes. O consenso continuava sendo o discurso acerca dos 
"direitos das mulheres". Eu procurava por livros que confron­
tassem o feminismo, mas eram escassos, especialmente no Bra­
sil. Qualquer pessoa que levantasse suspeitas sobre a pureza de 
intenções do movimento feminista sofria retaliações imediata­
mente - como aconteceu com Christina Sommers, Camille Pa­
glia e Warren Farrell. Quem pesquisasse e ousasse demonstrar 
o caráter subversivo do feminismo era acusado de legitimar a
violênciacontra a mulher ou de ser cúmplice de todo o sofri­
mento feminino ao longo da história inteira da humanidade.
Confirmando minhas suspeitas, finalmente encontrei o livro 
mais famoso da escritora feminista Kate Millett. Estava tudo 
lá. As feministas não costumam maquiar a verdadeira natureza 
do movimento em seus próprios livros. Para a autora da obra 
Política sexual, a definição do feminismo está visceralmente 
atrelada a uma estratégia de modificação dos comportamentos 
sexuais. Para Millett, o feminismo é "a formulação completa e 
satisfatória dos fins da revolução sexual". 5
Quando publicou essa confissão, em 1969, a almejada re­
volução ainda era incerta. Não fazia uma década que o anti­
concepcional circulava entre as mulheres e os movimentos de 
contracultura eram muito recentes. Modificar os padrões mo­
rais e revolucionar a sexualidade ainda era um projeto. Hoje, 
contudo, o estágio revolucionário está avançado e floresce em 
todos os países do Ocidente. 
Algumas feministas socialistas de renome, como Alexandra Kollontai ( 1872-1952), 
chegaram a afirmar que ser inserida no mercado de trabalho era quase uma 
condição escrava, melhor era ficar em casa. Outras celebridades feministas as 
contrariavam: nenhuma mulher deveria ser esposa e dona de casa, sob nenhu,na 
hipótese. Elas divergem sobre estas pautas supostamente centrais no movilnento 
- liberdade feminina, direito ao voto e mercado de trabalho - jusra111rntl' porque
não são centrais.
-� Kare Milletr, 1974, p. 2f>.
26 
INTRODUÇÃO 
Um dos livros6 mais recentes sobre o assunto, publicado em 
2017, comemora o sucesso do projeto feminista: 
A chamada Revolução Sexual começou no plano teórico com 
as idéias de pensadores como Freud7 e Reich,8 continuando com 
Herbert Marcuse9 e Norman O. Brown.'º Mas ela só ganhou 
verdadeiro significado para a civilização ocidental quando 
atingiu grandes segmentos da população, modificando as 
mentalidades e, principalmente, o comportamento das pessoas. 
Os movimentos de contracultura - movimento hippie, 
movimento feminista, movimento gay - constituem o início 
de um modelo ocidental radicalmente diferente do passado. 
Existem diversas formas de chegar à mesma conclusão, seja 
analisando a biografia das feministas ou consultando seus ar­
gumentos. É através da exposição desse projeto de revolução 
sexual como essencial - o que alguns tentaram em vão con­
testar - que pretendo demonstrar a verdadeira identidade do 
movimento feminista, a qual tem mais a ver com engenharia 
social e subversão cultural do que com o reconhecimento dos 
direitos civis femininos. 
* * ,.
É de conhecimento geral a periodização temporal que as 
feministas fazem do próprio movimento, a que chamam de 
"ondas" ,11 passando a impressão de que o movimento tenha 
tido suas idas e vindas. Considerando que, apesar das etapas 
Trata-se do best-seller do New York Times em 2017, da jornalista Peggy Orenstein, 
prefaciado pela psicanalista brasileira Regina Navarro Lins, Garotas & Sexo, 1 • 
edição. Rio de Janeiro: Zahar, 2017, p. 8. 
7 Sigmund Freud (1856-1939) foi médico neurologista, conhecido como pai da 
psicanálise. Ao estudar emoções reprimidas, histeria e neurose, revolucionou a 
psiquiatria criando uma ponte direta com a sexualidade. 
K Wilhelm Reich foi um médico, psicanalista e cientista natural. Ex-colaborador de
Sigmund Freud, é autor do famosíssimo livro A Revolução Sexual, publicado em 1936. 
'' Importante filósofo e sociólogo da Escola de Frankfurt, o alemão Marcuse ( 1898-
1979) é referenciado aqui pela sua ohra Eros e civilização. 
1 O Norn1an Brown ( 1913-2002), escritor e filósofo americano, é autor do livro 
Corpo do amor, publicado em 1966. 
11 A divis.'lo en1 "ondas R mais m:nrrente {: 11 que postula o seguinte: Primeira Onda, até os 
111111s 1960; Segundo ()ndo, de 1960 a 1990; e lrrceira ()nda, após a década de 1990. 
27 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVERSÃO 
• 
reacionárias, o movimento não recuou nem fez concessões en-
quanto lapidava seu absolutismo misândrico, escolhi tratar da 
trajetória dessa ideologia através de cinco fases sucessivas, de­
marcadas arbitrariamente: contestação, inserção, reprodução, 
subversão e aniquilação. Dedico um capítulo para cada fase, 
levando em conta o período histórico de cada teórico e sua 
relação direta com a revolução sexual. Essas etapas estratégicas 
remontam ao século XV e se estendem até nossos dias, em que 
se vê ameaçada a civilização que nossos antepassados levanta­
ram a peso de ouro e esforço de sangue. 
A contestação a que me refiro no primeiro capítulo estava 
diretamente voltada para as questões educacionais que são, evi­
dentemente, nucleadas pela concepção moral e religiosa de cada 
época. Algumas publicações nesse sentido já haviam surgido no 
século XV - como a obra Cidade das mulheres de Christine de 
Pisa-, mas as querelas femininas mais significativas dão sinais 
no século XVIII com a publicação de petições especialmente 
na França e Inglaterra. Saltando do século XV para o XVIII, 
apresento a principal protofeminista inglesa e de que forma ela 
representa o espírito contestador dos iluministas. O protofemi­
nismo do século XVIII, o Século das Luzes, traz a contestação 
dos direitos de propriedade e desigualdades contratuais do ca­
samento e os primeiros sinais de luta pelo voto feminino - que 
será solicitado com ênfase no final do século XIX. Antecedidas 
pelo preciosismo 12 e contextualizadas entre a Era Vitoriana, os 
iluministas, a Revolução Americana e a Francesa, Olympe de 
Gouges (1748-1793) e Mary Wollstonecraft (1759-1797) são 
as personagens centrais do primeiro capítulo. Wollstonecraft 
planta algumas sementes feministas ao levantar a bandeira de 
educação igualitária - a maior urgência em qualquer plano de 
modificação de comportamento ou engenharia social. 
Nesse primeiro capítulo, denunciei essa esperança utópica 
do movimento feminista com a educação pública, mista, uni­
forme e compulsória. Sem perder o foco da revolução sexual, 
demonstro a agência da escola como um braço do movimen­
to revolucionário, tirando da Igreja e da família a autoridade 
moral que sempre tiveram. Abordo brevemente a atuação dos 
12 Movimento social e literário de mulheres na França do século XVII. 
28 
INTRODUÇÃO 
�lobalistas e das fundações internacionais no controle e ma­
nipulação comportamental através das escolas. Há ainda um 
pequeno espaço no capítulo que se destina a abordar como a 
l'scritora protofeminista contestava acertadamente o duplo pa­
drão sexual, assim estabelecido pela "moral burguesa" - que, 
romo irei demonstrar, não é a mesma coisa que "moral cristã" 
-, que fazia tanto as mulheres quanto os homens sofrerem. 
Apresento o equívoco da esperança do século no progresso e no 
culto à Razão como solução para a guerra dos sexos. 
No segundo capítulo, indico como a mulher for inserida nos 
ambientes masculinos de exploração e repressão. Por explora­
ção, entendo a severidade da jornada de trabalho nas primeiras 
indústrias e a conseqüente indispensabilidade da mulher pobre 
no mercado de trabalho; e, por repressão, entendo a extensão 
do poder e a coação do Estado - fatores que juntos compõem 
a verdadeira opressão a que a mulher foi submetida a partir da 
Primeira Onda feminista. 
Esse período é comumente sinalizado entre o início das rei­
vindicações pelo sufrágio feminino no final do século XIX e o 
lançamento da pílula anticoncepcional em 1960, marcado pela 
inserção no mercado de trabalho, "emancipação econômica" 
e os primeiros passos do controle de natalidade. Suas figuras 
centrais foram as suffragettes no Reino Unido e nos Estados 
Unidos, Lucretia Mott, Susan B. Anthony e Elizabeth C. Stan­
ton que inauguraram associações femininas e organizaram, em 
1848, a primeira convenção de mulheres. Enquanto o movi­
mento seguia com ares mais liberais, o deputado e economista 
inglês John Stuart Mill e sua esposa Harriet Taylor escreviam 
os textos que seriam fundamentais nesta primeira onda e na 
articulação dosmovimentos sufragistas. Também se destacam 
nesse período as marxistas Alexandra Kollontai (1872-1952), 
russa e defensora da experiência de seu povo com a revolução 
socialista, e Clara Zetkin, que criou o movimento das traba­
lhadoras na Alemanha e organizou a I Conferência Internacio­
nal de Mulheres Socialistas em 1907. Arbitrariamente, separei 
para esse segundo capítulo apenas as querelas relacionadas à 
inserção da mulher no mercad<> de trabalho e na política, 
deixando a segunda fase da primeira onda - que corresponde 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVERSÃO 
à libertação sexual - para o terceiro capítulo, pois entendo que 
é parte do mote específico da segunda onda. 
Conquistados os direitos ao voto e à propriedade, tem início 
uma nova fase. A partir da década de 1920, ainda na primeira 
onda, as discussões acerca da contracepção e do aborto come­
çam a pipocar na América do Norte e na Europa. Essas duas 
pautas apontam para o que será a segunda onda do movimento 
feminista, datada de 1960 em diante, e marcam o início da re­
produção feminina dos vícios masculinos: promiscuidade, imo­
ralidade sexual e irresponsabilidade paterna. 
O final da primeira onda e início da segunda se destaca pela 
atuação da eugenista Margaret Higgins Sanger (1879-1966), 
responsável pela criação de uma instituição abortista pioneira 
nos Estados Unidos: Planned Parenthood. A questão do papel 
da mulher como mãe e esposa assume a centralidade; as fe­
ministas propõem uma mulher livre do controle marital e re­
ligioso, bem como a liberdade sexual. Modelo clássico dessa 
proposta é a francesa, amante de Jean-Paul Sartre, socialista 
e autora do livro seminal da segunda onda: Simone de Beau­
voir (1908-1986). Na mesma década trágica do lançamento do 
anticoncepcional, Jktty Friedan é _lembrada como bandeira da 
iiresponsabilidade materna. É este o conteúdo do capítulo ter­
ceiro onde apresento a consagração da revolução sexual como 
inconteste objetivo do movimento feminista. 
Denominado "subversão das identidades", o capítulo quar­
to traz dois nomes distintos no projeto subversivo para os se­
xos: Alfred Charles Kinsey (1894-1956) e John William Money 
( 1921-2006). Depois deles e colhendo seus resultados, Judith 
Butler (1956) aparece como a famigerada ama de leite da ideo­
logia de gênero, com um feminismo que enfatiza a micropolítica 
e a teoria queer. Monique Wittig também aparece relacionada 
à teoria, ela propõe às mulheres um padrão lésbico de com­
portamento que complementa a escala gay de Alfred Kinsey. 
A terceira onda - a partir de 1990 - extrapola os interesses 
da mulher ocidental e passa a questionar a própria consistên­
cia do "feminino". Desafia as noções milenares da feminilida­
de, traz uma interpretação pós-estruturalista da sexualidade e 
do gênero, termo que não aparecia antes de 1950. Aqui ainda 
.30 
INTRODUÇÃO 
demonstro as ligações do movimento feminista com práticas 
escusas e experimentos científicos fracassados envolvendo in­
cesto, pedofilia, adultério e prostituição. A fim de demonstrar 
que o corpo não é uma prisão, como fazem crer as feministas, 
evoco escritores e filósofos como Roger Scruton, Fabrice Had­
jadj e Olivier Bonnewijin. 
O ódiQ contra o cristianismo fic_a evident� em cada onda 
do movjmemo feminista e nas obra.s....çékbr_e_s.de_çadª.-es_çrjt.Q.r? 
fundante.Jlll.pensaroento_.ce.volucionário. O quinto e último ca­
pítulo demonstra que o feminismo detesta e combate a cultura 
ocidental, a moral judaico-cristã e os nossos pilares filosóficos. 
No �g_ar _ do __ çr_istiª1_1-��!'1<?, �s __ fel)!iajg��-P-�QPÕ..�f.1:1 um. e�!i!2-de 
vida irresponsável e nociyamente_pwwscuQ s.9b a falsa.J?_rop_ª� 
ganda de liberdade, Apresento brevemente a vida infeliz que al­
gumas feministas levaram a fim de demonstrar a necessidade de 
uma reação ou fuga para longe desse movimento. Algumas mu­
lheres e até mesmo ex-feministas já têm percebido o problema 
profundo dessa ideologia; nesse sentido, apresento o livro 
O homem domado, de Esther Vilar, que traz uma nova aborda­
gem para a guerra dos sexos: o verdadeiro sexo oprimido é o 
masculino. Em 1990, Camille Anna Paglia publica �;cual Per­
sonae e\alerta acerca dos perigos de um feminismo\"que foi lon­
ge demais". Nessa denúncia, encontra Christina Hoff Sommers, 
que se torna sua aliada nessa empreitada contra o radicalismo 
nocivo do movimento. Paglia também aparece para demons­
trar o perigo civilizacional que muitas agendas do movimento 
- como a ideologia de gênero - representam para o Ociden­
te. Todas elas, ainda que feministas, representam um pouco de
lucidez diante do radicalismo das esquerdistas e apresentam o
tema da demonização dos garotos e do ódio contra os homens.
No mesmo capítulo, demonstro a hegemonia da ideologia 
feminista nos programas de pesquisa do Ensino Superior e de 
que forma o movimento utiliza a máquina estatal de educação 
para formar militantes. 
.. .. .. 
.'l l 
FEMINISMO: PERVERSÃO E SUBVF.RSÃ<J 
Não pretendo convencer o leitor acerca da minha religião ou 
da virtude da pureza sexual. Eu mesma considero um trabalho 
hercúleo, realizável apenas voluntariamente e com a graça divi­
na, viver em conformidade com amba_s. Contei minha história 
no início apenas para apresentar de que forma meus olhos se 
abriram para a verdadeira intenção do movimento feminista. 
É verdade que muitas mulheres aderiram ao movimen­
to feminista cientes de tudo isso; portanto, são culpadas e 
partícipes de cada avanço revolucionário. Não escrevo para 
elas. Escrevo para toda moça enganada e desiludida com o 
pensamento revolucionário, para as feministas que o são por 
conveniência ou, quem sabe, inocência. Escrevo para quem 
tem dúvida; duvidar é dar uma chance à próp_ria __ inteligência� 
Escrevo para quem Já desconfia, mas não sabe exatamente o 
que está errado ou como começar a descobrir. Enquanto tra­
balho neste texto, penso também em quem já tomou posição 
contra toda manifestação do pensamento revolucionário ou, 
pelo menos, contra uma poderosa parte dele: a subversão da 
mulher. Cada linha foi parida com a absoluta sinceridade de 
quem também já teve muitas dúvidas, percebeu que não sabia 
quase nada e se sentiu desamparada por não encontrar um 
ponto de partida confiável. 
Depois deste livro, estou ciente de que minha vida acadê­
mica restará arruinada - como já anunciava estar quando me 
declarei não-feminista - e em nada lamento essa condição. 
Fico igualmente pessimista acerca da minha vida profissional 
como professora. Entrego estas páginas sabendo que minha 
vida pessoal será vasculhada, sem sombra de dúvida, caluniada, 
difamada e muito raramente avaliada com justiça ou miseri­
córdia. Imagino todos os meus erros sendo descobertos, dis­
torcidos e alarmados. Assim como aconteceu com a escritora e 
antifeminista Suzanne Venker, prevejo que serei acertadamente 
questionada pelo meu divórcio e precipitadamente condenada 
por causa dele. Serei classificada como hipócrita, porque con­
tinuo considerando a separação de um casal um dos maiores 
fracassos humanos. Alguns me acusarão de não ser a autora de 
meu próprio livro, assim como as feministas acusaram Esther 
Katzt>.n quando ousou entregar os macetes femininos. 
32 
INTRODUÇÃO 
Sabendo de tudo isso, não deixei que o risco interferisse no 
conteúdo produzido, nem coloquei meus interesses ou qualquer 
necessidade de aceitação social acima do meu dever de escrever 
com o máximo de verdade. Não afrouxei meu discurso acerca 
do divórcio por causa de minha própria condição. Não empres­
tei nenhuma pauta investigada apenas porque toca em erros 
que eu mesma cometi. Ambiciono que este livro seja maior do 
que eu mesma e faça mais bem do que jamais fiz. 
Apesar de ser talvez a primeira publicação brasileira com 
pretensões tão diretamente contrárias ao feminismo, as muitas 
formas de combatê-lo não se encerram nas abordagens deste 
livro. Desejo que meu texto seja superado, que multiplique e 
dê frutos. Não pretendo determinar quem é verdadeiramente 
,nulherconservadora ou cristã nem quem pode ser antifemi­
nista, mas espero cumprir meu objetivo de descrever as diver­
sas facetas da mulher revolucionária. Estou convicta, e quero 
l'Onvencer o meu leitor de uma verdade apenas: o feminismo é
11n1 movimento político qu� C<>!l!Iibui_para-9 desentendimento 
t· a crescente amargura entre os __ sexos, a_celer.i é:l cles�greg4ç_ão 
fan,iliar, induz à eterna insatisfação e à libertinagem sexual, 
. - - - - - - • - -· . . . - - ~ 
valendo-se para isso de discursos sofistas, pesquisas fajutas e 
1nanchetes tendenciosas, geralmente às custas do dinheiro de 
rontribuintes alheios ou contrários a tais objetivos. 
JJ 
I 
ara o correto entendimento da trajetória 1 da ideologia 
feminista, é necessário voltar aos originários textos de 
reivindicações escritos pelos "defensores das mulheres". 
Proponho e apresento uma revisão histórica e bibliográfica das 
<>bras e textos que construíram o movimento ao longo dos úl­
timos séculos. Há quem considere o século XV como a fon­
te desde a qual jorrou a primeira gota das idéias feministas, e 
há quem indique que o movimento só se tornou significativo 
Jurante a Revolução Francesa. Seja como for, os teóricos con­
sentem em denominar esse estágio anterior ao séc. XVIII de 
J1rotofeminismo. 
Pro to feminismo 
() vocábulo grego npwToc; (prôtos) indica aquilo que é "ante­
rior" ou "primeiro", referindo-se, portanto, às manifestações 
.111tcriores ao que oficialmente foi chamado de "feminismo". 
( > protofeminismo do século XVIII, o "Século das Luzes", tinha
l·,11110 centralidade a contestação dos direitos civis, em espe­
l'ial os relativos à repartição da propriedade e às disparidades 
Para rrforçar o entendimento do conteúdo deste capítulo, recomendo 
Vlºl"llll"lltt'n1ente a leitura de: Reivindicação dos direitos da mulher (Wollstonccraft), 
/lrr•r,e hist,iria do feminismo (Carla Cristina Garcia), Direitos das mulheres e 
11111utiça dos hor,,e,is (Nísia Floresta), O 1,iundo q11e eu vi: minhas memórias 
(Stefan Zwcig), Quem controla a escola governa o mundo (Gary DeMar), 
( :,111trt1 a escol11 (Fausto Zan1honi) e Maq11ia1Jel pedagogo (Pascal Rcrnardin) . 
.35 
CAPÍTULO I 
contratuais do casamento, às primeiras insinuações a respei­
to do sufrágio universal e da participação pc>lítica feminina. 
No cerne de todas essas pautas, tremulava a bandeira da edu­
cação igualitária. 
Algumas publicações também já haviam apontado para os 
brotos do germe feminista no século XV com a obra Cidade das 
mulheres de Christine de Pisan.2 Ela é considerada a primeira 
mulher a viver de fato da arte literária, a primeira escritora pro­
fissional. Seu livro era uma resposta ao célebre Cidade de Deus 
de Santo Agostinho. Christine publicou seu texto em 1405, no 
qual dialogavam entre si três figuras alegóricas - a Razão, a 
Justiça e a Retidão - como forma de apresentar uma alter­
nativa a um mundo dominado pelo masculino. Depois dela, 
Laura Cereta3 escreveu sobre educação e matrimônio. Marie 
de Gournay (1565-1645) com sua pena tratou da educação e 
instrução como forma de libertar as mulheres da dependência 
masculina. Todas essas obras deixam bastante evidente que o 
protofeminismo é uma fase marcada principalmente pela con­
testação à educação. Esse é também o tema central de Poullain 
de La Barre,4 que foi, por sua vez, mais direto. É de sua autoria 
a célebre frase: "A mente não tem sexo". Em seu livro A igual­
dade dos sexos, publicado em 1673, reivindicou ações afirmati­
vas em favor das mulheres. Outra reivindicação importante do 
período diz respeito ao direito à propriedade. Sob esse aspecto, 
a britânica Lady Anne Clifford (1590-1676) foi uma expoente 
do pensamento igualitário, atuando principalmente em causa 
própria, abrindo caminhos para o direito à herança de bens. 5
2 A obra é citada por Simone de Beauvoir em O segundo sexo. 
3 Cereta ( 1469-1499) escrevia valendo-se de cartas trocadas entre intelectuais. 
4 Poullain de la Barre (1647-1723 ), formado em teologia pela Universidade de 
Sorbonne, escreveu sobre a igualdade dos sexos. Alguns teóricos consideram que 
a primeira onda do movimento feminista já começava com essa publicação que 
versava sobre a mulher como sujeito epistemológico. 
5 Conforme McCulley (2017), essa característica jurídica durou até o século XIX, 
quando podia ser descrita como "o conceito legal que subordinava os direitos de 
propriedade de uma mulher no casamento. Naquele tempo, antes do matri1nônio, 
a mulher poderia livremente executar um testamento, assinar contrato, processar 
ou ser processada em nome próprio, e vender ou doar suas posses e propriedades 
pessoais conforme desejasse. Com o matrin1Ílnio, porém, su.1 existência 
e identidade legal como indivíduo eram suspens;1s" (p. 49) . 
. l6 
CONTESTAÇÃO MORAL-RELIGIOSA E EDUCAÇÃO 
Enfrentou o próprio tio por quase quarenta anos na luta por 
uma propriedade que fora de seu pai. 
De todo modo, apesar desses levantamentos pontuais entre 
os séculos XV e XVI, com o florescimento de muitas escritoras, 
as querelas femininas que repercutiriam mais significativamente 
só dariam sinais no fim do século XVIII, com a publicação de 
petições, especialmente na França e Inglaterra. 
Mary Wollstonecraft 
e o documento fundador do feminismo (1792) 
Antecedidas pelo preciosismo, movimento social francês do sé­
l'ulo XVII, pela querei/e des femmes que se deu entre os ilumi­
nistas durante as revoluções americana e francesa, Olympe de 
(;ouges (1748-1793) e Mary Wollstonecraft ( 1759-1797) sã<> 
as personagens centrais desse primeiro momento. 6
Para vasta parte das teóricas feministas,7 o movimento be­
hcu da fonte das revoluções burguesas do século XVIII: Ilumi­
nismo, Revolução Francesa, Revolução Gloriosa e Independên­
cia Americana. Em suma, se se olha para a França setecentista, 
verifica-se que as mulheres alcançaram alguns avanços na es­
fera civil e jurídica após a Revolução Francesa e voltaram a 
perdê-los com a ascensão de Napoleão Bonaparte. Desse modo, 
é irnportante atentar brevemente a esse período histórico. 
F<lrnund Burke, considerado o pai do conservadorismo inglês, 
puhlicou,em 1790,umadesuasmais famosas obras: Reflexõesso-
1,rea Revo/uçãonaFrança.Burkedelatavaoaspectosombrioda 
!{evolução Francesa8 que começara havia cerca de um ano. 
A relação de Burke com o fortalecimento do protofeminis-
1110 do século XVIII deve-se ao fato de que a fama de seus escri­
tos provocou a desaprovação de uma conterrânea sua e inimiga 
dl·clarada de> regime monarquista. Mary Wollstonecraft, que 
visitou a França durante o período revolucionário, leu as prin­
ripais <>hras de Burke e tentou refutá-las. Com contornos anar­
quistas e individualistas, Mary publicou, em 1792, a dita obra 
h No Brasil, drstaca-se Nísia Floresta, qu1• tn1<luzi:1, divulgava e comentava a ohra 
da inglesa Wollstonccraft rm 18.'\2. 
7 M;iry Wollstonrcraft, Katr Millct, Sirnonl" <lce 8e1111voir, rnrre outras. 
H < > 111,ut:o inii:ial J.1 Revolu'ião foi a Qu,·dn 1l11 B,1,11l h,1, datadn 1l1· 14 dr julho de l 7H'>.
17 
CAPfTIJLO I 
inaugural do movimento feminista: Vindication of the Rights 
of Woman (Reivindicação dos direitos da mulher}.9 Teóricos do 
assunto tendem a colocá-la como divisora'º de águas entre as 
feministas e as protofeministas e, por isso, foi escolhida como 
marco inicial dessa primeira etapa histórica indispensável para 
compreender a trajetória desse movimento. 
São quatro as frentes de atuação que merecem destaque ao 
se tratar da publicação desse documento fundador do movi­
mento feminista: as discussões sobre direitos humanos, os ide­
ais republicanos, as disputas sobre a condição jurídica da mu­
lher enquanto esposa e a educação dada a ela. 
Contestação moral-religiosa e educação pública: 
ge,mes do feminismo 
Conforme se percebe na exposição das idéias centrais de seu 
texto, a preocupação principal de Mary dizia respeito à res­
trição da educação formal feminina. Influenciada pelos ideais 
iluministas, mas sem abdicar totalmentedo discurso cristão -
dado o contexto moral do período -, inicialmente, a autora 
busca convencer os leitores, notem bem, de que a libertação 
feminina poderia ser benéfica para formação de uma cristã e de 
uma esposa mais virtuosa. Ela escreveu: 
Na luta pelos direitos da mulher, meu principal argumento 
baseia-se neste simples princípio: se a mulher não for 
preparada pela educação para se tornar a companheira do 
homem, ela interromperá o progresso do conhecimento e 
da virtude; pois a verdade deve ser comum a todos ou será 
ineficaz no que diz respeito a sua influência na conduta geral. 
Como se pode esperar de uma mulher que ela colabore, se 
nem ao menos sabe por que deve ser virtuosa? A não ser que 
a liberdade fortaleça sua razão, até que ela compreenda seu 
dever e veja de que maneira [ele] está associado ao seu bem real. 
9 Mary Wollstonecraft, Reivindicação dos direitos da mulher, tradução de lvania 
Pocinho Morta, 1• edição. São Paulo: Boitempo, 2016. 
1 O Outros teóricos defendem que o prorofeminismo estende-se até o século XIX e o 
surgimento das sufr:igistas. 
]8 
CONTESTAÇÃO MORAL-RELIGIOSA E EDUCAÇÃO 
Se as crianças têm de ser educadas para entender o verdadeiro 
princípio do patriotismo, suas mães devem ser patriotas. 11
Na abertura do livro que leva este trecho, encontramos o 
que Mary chama de sua "primeira dedicatória" dirigida a um 
"homem de espírito" capaz de entender as suas queixas. Quem 
é ele? Um revolucionário jacobino anticlerical? Não. Trata-se 
do bispo de Autun, de quem Mary Wollstonecraft declara ter 
"lido com grande prazer" as considerações sobre direito e polí­
tica. Nessa mesma carta-dedicatória - não bastando o fato de 
explicitar o apoio encontrado entre os religiosos -, Wollsto­
necraft escandaliza ainda mais as feministas atuais ao criticar12
o comportamento masculinizado que algumas mulheres de seu
tempo vinham adotando e afirmar que as mulheres jamais serão
totalmente independentes dos homens.
É importante lembrar que as pri!(leiras mulheres _qu� 
c�nseguiram vez e voz para manifestarem-� �blicament� 
sobr�-� queixas fegiininas, o fizeram sob a tutela _«:._proteção 
dill. religiosos cristãos, tanto na França do século X\allquanto 
na América_do....s.éc.ulo. XIX. Apesar de as opções de sua vida 
privada demonstrarem pouco respeito pelos preceitos cristãos, 13
Mary obrigava-se a trabalhar próxima aos clérigos e religiosos. 
O movimento abolicionista 14 do qual Mary participava havia 
partido da ação de 22 religiosos ingleses em 1787. Essa soli­
dariedade quase obrigatória entre esses dois movimentos era 
conseqüência da pouca abertura dos demais setores a essas 
discussões femininas. 
Iluminista e deísta, mais anarquista do que republicana, mais 
republicana do que monarquista, Wollstonecraft causava mais 
escândalo entre a nobreza e a alta burguesia do que entre os re­
ligiosos - sempre sensíveis ao drama humano, diferentemente 
do que o Estado é capaz de ser. Aliás, o espírito revolucionário 
l' esquerdista não teve nem uma pequena parcela da empatia 
11 Mary Wollstonecraft, Reivindicação dos direitos da mulher, p. 18. 
11. /1,id., p. 26.
1.1 Veremos adiante quais são essas escolhas privadas e mais detalhes sobre a 
biografia da escritora ..
14 A aholição do comércio de escravos no Império Britânico em 1807 foi influenciada 
pela pressão desse movi1nento. Ahordo mais de1alhadan1ente a imporrância do 
11111vin1rnr11 a111irscravagista na segunda etapa do movimento feminista. 
]9 
CAPÍTULO 1 
que os religiosos 15 tinham pela verdadeira dignidade feminina. 
Não é segredo que Robespierre mandou executar aquela que 
hoje é considerada uma das primeiras feministas da história: 
Marie Gouze. Mais conhecida como Olympe de Gouges, escre­
veu a Declaração dos direitos da mulher e da cidadã em 1791. 
Sua publicação pretendia demonstrar que a Revolução France­
sa não era tão revolucionária quanto deveria ser, uma vez que 
ignorava a condição das mulheres. Os jacobinos consideraram 
uma afronta e a autora foi guilhotinada. 
De volta à carta dirigida a Charles-Maurice de Talleyrand­
-Périgord, bispo de Autun. Nela, Mary Wollstonecraft evoca 
o fim do princípio de dupla moralidade entre os sexos. É im­
portante fazermos um esclarecimento nesse tópico. Se durante
o século XXI a queixa a respeito do padrão duplo de moral
deveu-se ao fato de se exigir das mulheres uma pureza sexual
maior do que a cobrada dos homens - dizem elas -, aqui, no
século XVIII, a autora queixa-se do contrário. Para Mary, os
homens tratavam a mulher como se fora uma criança incapaz
de aspirar a grandes virtudes e, por isso, lhe faziam cobranças
leves e pouco desafiadoras. Ela escreve:
De fato, me parece que os homens agem de maneira muito 
pouco filosófica quando tentam assegurar a conduta das 
mulheres, tratando de mantê-las sempre em um estado infantil 
[ ... ]. Porque, se admitirmos que as mulheres foram destinadas 
pela Providência a obter virtudes humanas e, pelo exercício do 
entendimento, podem chegar àquela estabilidade de caráter 
que é base sólida para nossas esperanças futuras, a elas deve 
ser permitido voltarem-se para a fonte de luz. (p. 40). 
Segundo a autora, essa inferioridade intelectual em relação 
aos homens fazia com que o corpo feminino e a sua beleza 
fossem os únicos atrativos da mulher. A centralidade desses 
atrativos, por sua vez, prejudica toda a humanidade, na me­
dida em que dificulta a vivência da castidade. Ela afirma que 
15 Também é dos grupos religiosos que surgirão as primeiras su{ragettes americanas. 
No início da primeira onda, que começa no século XIX, veremos as lideranças 
femininas se formaren1 em meio a grupos religiosos como os quackers. 
O movimento quacker permitia uma liberdade de expressão fentinina muito mais 
abrangente do que qualquer outro grupo religioso ou s1Kial <la época. 
40 
CONTESTAÇÃO MORAL-RELIGIOSA E EDUCAÇÃO 
"essa castidade nunca será respeitada no mundo masculino até 
que a pessoa da mulher deixe, por assim dizer, de ser idolatrada, 
quando um pouco de bom senso e de virtude a embelezarem,, 16
e, adiante, aponta que "os homens se queixam, com razão, da 
insensatez e dos caprichos de nosso sexo, quando não satirizam 
de forma mordaz nossas paixões impetuosas e nossos vícios ab­
jetos". 17
Nesse sentido, há um distanciamento gigante entre o dis­
curso da "primeira feminista" e o que se vê sair da boca das 
militantes mais recentes. Diferentemente destas, aquela não 
desprezava - ao menos teoricamente - as virtudes cristãs da 
castidade, da modéstia e da temperança. Portanto, não há razão 
para esperar que essa primeira reivindicação fosse objetada por 
toda a comunidade cristã. A preocupação dos cristãos, que nes­
sa altura já se dividiam entre católicos e protestantes, quanto à 
alma dos fiéis, sempre manteve o desenvolvimento das virtudes 
no cerne e os desfrutes da carne na periferia. Também é antiga 
a postura cristã de que tanto homens quanto mulheres devem 
evitar o pecado e buscar a santidade. Não há quem possa argu­
mentar que os cristãos incentivassem mais a busca pela beleza 
do que a busca pela virtude, 18 que era a acusação recorrente de 
Mary contra os homens de seu tempo. O que nos leva a conclu­
são óbvia de que, se os homens estavam sendo carnais demais 
ou viscerais demais, era exatamente por estarem sendo cristãos 
de menos. 
Mary, conhecedora desse ponto pacífico e de vários outros a 
respeito da dignidade da mulher no cristianismo, fará evocá-los 
c,n certas ocasiões e debatê-los em outras. Se em um momento 
nega a cosmogonia da criação de Adão e Eva - e o papel de 
submissão da mulher-, em outro, afirma: "[estou) convenci­
da firmemente de que não existe mal no mundo fora dos de­
sígnios divinos, baseio minha crença na perfeição de Deus" . 19
I <, Mary Wollstonecrah, Reil'indicação dos direitos da mulher, p. 19. 
17 //,id., p. 39. 
111 1 PJ .1, .l: Que o er,feite das mulheres não se;a o exterior, "º frisado dos cabelos, 
110 uso de ;,iias de '"""· na con,postura dos l'estidos; maso homem encoberto no 
cora,·ão: 110 innirr11pti1 1rl trtJj,• J,, un, espírito. 
l 'I Mary Wollstunecrah, Rei1,in,licaçao dos dirl'itos da 1nulher, p. 34. 
41 
CAPÍTULO 1 
Existem, portanto, grandiosas distinções entre os rumos do 
feminismo hodiernamente e os seus primeiros passos nos tem­
pos da Revolução Francesa - o que não significa dizer que ele 
já foi cristão ou socialmente desejável. 
O perfi.l das mulheres do Setecentos: 
privilegiadas, não oprimidas 
Historicamente, as mulheres viveram em condições geralmente 
mais confortáveis do que os homens. O historiador holandês e 
teórico militar israelense Martin van Creveld (1946-) realizou 
uma vasta pesquisa que resultou em um verdadeiro catálogo da 
condição feminina desde milênios atrás. Ele dedica um capítulo 
inteiro de sua obra - publicada no Brasil em 2004 - para 
demonstrar que a presença das mulheres em um país, região ou 
estado, esteve sempre diretamente ligada ao grau de segurança 
e conforto oferecido. 
[ ... ] Quanto mais adversas e primitivas as condições de um 
dado lugar e época, menos mulheres há nele; inversamente, 
o número relativo de mulheres em um dado lugar e época
reflete o progresso da civilização e seus confortos. Ao longo da
história, a ausência de mulheres foi praticamente total em áreas
de mineração e extração florestal, canteiro de obras, aterros
sanitários etc. Hoje em dia isso também se aplica a plataformas
petrolíferas, estações meteorológicas árticas e similares. 20
Para corroborar sua afirmação, Martin traz vários contextos 
históricos onde esse fenômeno pode ser observado. Durante a 
segunda metade do século XIX, vários chineses imigraram para 
os Estados Unidos fugindo da fome. As condições de trabalho 
que tinham que aceitar na América eram terríveis: salários mi­
seráveis, moradia em barracas em locais incertos e muita humi­
lhação. Havia cem vezes (cem vezes é muita coisa!) mais homens 
que mulheres, mesmo que nenhuma lei ou obstáculo social im­
pedisse que as mulheres se aventurassem em terras americanas. 
Coisa semelhante se passou no início da colonização da Virgínia, 
EUA, "inicialmente a proporção era de uma mulher para cada 
20 Martin Van Crcvdd, Sexo privilegiado. Rio de Janeiro: 1'.dinurn, llKI◄, rp. \◄fl- \7K. 
42 
CC)NTESTAÇÃO MORAL-RF.LIGIOSA E .EDUCAÇÃO
sete homens" .21 Ele ainda cita casos da Dixieland, dos condados 
de Cheshire e Grafto.n, os estados de> meio-oeste americanc> -
()hio, Illinois, Iowa e Kansas - o·u mesmo Nevada e Colora,io, 
n1ais a oeste. Todos os períodos históricos narrados demonstram 
a tese do autclr de que, quando existe u1n equilíbrio d.cmográfico 
<>u uma propc>rçã<1 nclrmal, a numérica existência feminina é "re-· 
sultado de os homens ·proporcionaren1 às mulheres as amenida­
des da vida civilizada". Até porque, em condições n1ais bárbaras, 
as n1ulheres acaban1 n1<.>rrendo primeiro. Se e.las viven1 n1ais hoje 
é porqt1e 111nita facilidade fc1i ergtiida sobre os ombros de escava­
dores, mineradores e cc.lnstrut<>res homens. 
A queixa de Mary Wotlstonecraft, por incrível que pareça, 
era exata111ente esta: a de que as 1nulheres sempre tiveran1 uma 
vida nzi,ito fácil em relação à que levavam <>s homens, e que 
delas nunca fclra exigido mais qt1e superficialidade e aparência. 
,,. 
Fia escreveu: '4,E verdade que as mulheres sãc.> pr(1vidas 1com. co-
s t t· fi '' .., ) E . d 1111( a e roupa, sen1 que se es {lrccm nen1 e1n .-... v1 entemente, 
t� prl'CÍso notar que essas mulheres sobre quem discursava a 
.lt1t<>ra e.ram_ principalmente as nobres e burguesas, p(lSt,o que as 
1u.1is pc>bres sen1pre trabalharan123 arduan1ente, sc)bretudc> no 
'- .11np<>. A própria Wollstonecraft faz um pequeno co1nparativ<>: 
•,f\ p<>r ur;n lado., critica as m,adan1es que passam seu ternpo com 
t utílid .. 1des da n1oda e bordados, p<lr <lutro, elogia a nobreza das 
111.,cs que se sacrificavan1 na c.onfecçãcl das poucas peças que 
l cJhr�n1 <> ce_lrp<> de seus filhos. 24 E a divisãc> sexual esbarrando
·111 u1n,1 clutra realidade n1ujto só.lida: a econôn1ica.
' ' 
•• 
.t 1
• 1
11,,d., p. J47. 
11,,.J.� p. 81. 
• 
(}11.11H.tn unia n111lher se queixava do ócio e do tédio, no século XVIII, é difíc,il 
,,,1pnr c.llll' fosse tuna pobre ca1nponcba aran:fada cornos filhos, a �asa e o trabalho 
, l.1 l.1 vou r.:1. E quando un1a nrulher burguesa se queixava da falta de uo1a atividade 
p11 ,,llu 1v,1. e: Lidl supor (lue OélO falava do seu desejo de trabalhar _no campo soh o 
··• 1 .1tn·1dadr essencialtnente produtiva, diga-se de passagem - com.o faziam as 
1.iutrl1t'rt''i nwnos hen1-na';�i<las.
· ( \ .. lin1nt·11, 111a11Ja1.11 f.:11.l'r suas roupas e c1cab,1n1 con1 o assunto� as nnilhcrcs faze1n
·,1 q•, p11 ') ,n.,, n }Upa,, ncccssá rias ou nrn.1n1t:'ntais, e estão continuan1cnte falando sobre
, 1., .. , t· e,\ pt·n,m.Ht·nto� se�ut·rn as n1Jos. I)c fato, não é a confecção que enfraquec:e a 
i 111·111t·, ruas o c,1110 <.'1npolado dl· �e vt:·stir, c.JlJando uma n,ulhcr de baixa escala social 
1.n, .1, , oupa\ dl' �t·u n1.uido e.· dl' l'.-.t'U' filho,, l'lHnpr(' l;cun a sua obrigação, isso é parte
d,· •,u,r-.. tan·fa, ta,niliarcs� 111:1, quando �,4-i rnuflwrc-s t111h.,,•lh�nn apenas p�ua se vc·srír
11 wUu , r, tln qut· poden.1111 -..e pc.·nnit ar, l·. pi.or do l}Ul' a ,i111plc, pc:rd.1 dt· te111p<• •• ( p. 104 ).
4l 
CAPÍTULO l 
Compar3:�d_o_ ��a_ vid� à de um homem pobre e camponês, 
uma mulher burguesa não tinha do _que recl;imar. Mary r�ç9-
nhece Que "a maioria dos_h_omen�_ à_s vezes tem de suportar rjs­
cos f�jços_� oçªsionalm�nte agµ�ntar .a inclçmência d9_1J1eio 
social" .25 A massa de homens ingleses do século XVIII vivia, 
certamente, com menos da metade do conforto de que desfruta­
va a própria Wollstonecraft nos últimos anos de sua vida. 
Até hoje, esse é um forte elemento desagregador da causa 
feminista. Muitas mulheres proletárias, que trabalham dura 
e incansavelmente, desejariam ter a vida da mulher burguesa, 
sustentada pelo marido e cercada de confortos e poucas respon­
sabilidades. Já as mulheres burguesas tiram de algum lugar a 
sensação de que deveriam fazer de suas vidas algo mais produ­
tivo, ingressando no mercado de trabalho - obviamente, não 
no mesmo trabalho das mulheres proletárias. E ambas têm em 
mente a remuneração e a condição de aposentaria que, algum 
dia, lhes permita parar de trabalhar e ficar em casa para "apro­
veitar mais a vida", exatamente como já faziam as burguesas 
do Setecentos, sustentadas pelos pais ou pelo marido, antes de 
inventarem o "feminismo". 
Simone de Beauvoir, célebre feminista da segunda onda, teve 
o disparate de comparar as mulheres casadas aos escravos ne­
gros do tráfico iniciado no século XVI. Mas Mary escreveu,
em 1792, que as mulheres de sua época eram tão mimadas
quanto os nobres e ricos. Como ela não conseguia ver gran­
des virtudes na maioria das mulheres - elas demonstravam ser
um poço sem fundo de narcisismo, de egoísmo e de apatia ao
conhecimento-, escreveu: "Desde o nascimento, homens ricos
e mulheres são colocados sob o sol do prazer. Como poderiam
reforçar suas mentes?".
Baseados em algumas premissas, como a da inconteste frag!­
lidade._físic�feminina. da "superioridade natural do homem " 26
� da proteção da prole, os homens mantif!halJl_ sµa� _espq�as 
em casa, desobrigadas de qualquer serviço braçal ou _respon­
sªbilidacle finaru;eira. Basicamente, as mulheres levavam a vida 
çle um nobre. A autora conclui: "Encontrei um perfil geral das 
25 Mary Wollstonci:rah, Reivi11dicação Jus direitos da n1ulher, p. 67. 
26 lbid .• p. 62. 
44 
CONTESTAÇÃO MORAL-RELIGIOSA E EDUCAÇÃO 
pessoas de posição e fortuna que, em minha opinião, poderia 
com maior propriedade ser aplicado ao sexo feminino". 27 Fica 
difícil oe&ar Que os homens concediam inúmeros privilé&iQtis 
ro11lbeces da Setecentas - privilégios esses que muitas mulhe­
res independentes de hoie em dia levam uma vida inteira para 
alcançar, e muitas vezes não conseguem .. 
Q__faSélil_!!:_n_!o, tantas vezes difamado pelo movimento femi­

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