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DIREITO TRIBUTÁRIO I 
 
Nome: Patrícia Cristina Fernandes 
Professor: Marciano Buffon 
 
Johnny versus João: uma estória sobre a hipocrisia e a injustiça 
fiscal brasileira 
 
O texto analisado utiliza uma abordagem literária para destacar como a 
desigualdade social é acentuada pelo tratamento tributário às diferentes classes sociais no 
Brasil, demonstrando de forma didática a maneira como os tributos afetam sobremaneira 
a classe trabalhadora. 
É notório que o modelo de tributação adotado no país mostra-se altamente 
conflitante com os propósitos constitucionais, vez que a carga tributária recai, 
principalmente, sobre a parcela mais carente da população, através, especialmente, da 
tributação indireta, atingindo diretamente a dignidade da pessoa humana prevista na 
Constituição, vez que se tributa o mínimo vital para a sobrevivência. 
Não bastasse isso, o imposto incidente sobre a renda do trabalhador, inclusive 
sobre o salário mínimo, é proporcionalmente muito mais expressivo do que a tributação 
sobre a renda das classes mais altas, haja vista a isenção de tributos sobre lucros e 
dividendos, bem como as tarifas reduzidas sobre rendimentos financeiros. Dessa maneira, 
resta evidente que as empresas e seus sócios percebem uma carga tributária 
significativamente menor do que o trabalhador assalariado. 
Nesse sentido, o texto busca demonstrar tal diferenciação adotada no sistema 
tributário brasileiro através das experiências de dois indivíduos chamados João. O 
primeiro, que decidiu mudar seu nome para Johnny, visivelmente de classe mais alta que 
o segundo, vivenciando dessa forma experiências totalmente opostas em relação à carga 
tributária nacional. 
 
Johnny é um advogado de sucesso que sonhava em mudar-se para um país de 
primeiro mundo e não se preocupava muito com escrúpulos, buscando sempre demonstrar 
publicamente todo seu sucesso e sua felicidade, de forma a causar inveja. Em determinado 
momento, Johnny decidiu adquirir um jatinho para aumentar seu prestígio na alta 
sociedade, ocasião em que, após consultar um especialista em tributação, constatou que, 
sem precisar de nenhuma ilegalidade, poderia reduzir significativamente seus gastos 
apenas utilizando-se do sistema tributário adotado. Assim, ao invés de o fabricante do 
jatinho vender-lhe diretamente o produto, optou por exportá-lo, sem nenhum imposto, a 
uma instituição financeira no exterior, de forma a poder, ainda, restituir os impostos que 
tiveram incidência sobre a matéria prima utilizada em sua construção. Dessa forma, 
referida instituição financeira, faria um contrato de leasing com Johnny, isentando-o 
assim de qualquer imposto de importação. Não bastasse isso, Johnny poderia registrar o 
veículo em nome de sua empresa, a qual sofria tributação com base no chamado “lucro 
mais que real”, podendo deduzir, portanto, as parcelas pagas pelo jatinho, reduzindo tal 
lucro e, por consequência, o pagamento de imposto de renda e de contribuição social. 
Ainda, Johnny descobriu que não precisaria preocupar-se com o pagamento de IPVA 
sobre o valor de seu novo jatinho, vez que se entendia que tal imposto não incidiria sobre 
jatos, helicópteros e embarcações. 
Após a descoberta de tantos benefícios concedidos aos mais bem-sucedidos, 
Johnny passou a buscar novas formas de ganhar ainda mais dinheiro, optando, então, por 
fundar uma igreja, haja vista a conhecida imunidade tributária integralmente concedida a 
tais instituições, que eximia de impostos qualquer atividade exercida pelo templo, desde 
que destinada a sua finalidade social. Dessa maneira, Johnny conclui que poderia lucrar 
de várias outras formas através de sua igreja, sem nunca ter que se preocupar com 
qualquer carga tributária. 
Por fim, Johnny decidiu investir um uma empresa voltada à exploração mineral 
para exportação, às margens de um dos principais rios da região sudeste de seu país. 
Assim, considerando a imunidade integral das exportações, inclusive de produtos 
primários, Johnny descobriu que não teria qualquer custo com impostos em sua nova 
empresa, pagando apenas uma pequena taxa a título de royalties. Após consultar seu 
especialista em tributação, Johnny conseguiu, ainda, reduzir significativamente o valor 
do imposto de renda e da contribuição social de sua empresa, subfaturando suas 
 
exportações, destinando-as a sua subsidiária constituída em uma país que não fosse, 
oficialmente, um paraíso fiscal, tudo com uma simples “troca de papéis”, sem qualquer 
despesa com logística extra. 
João, por sua vez, era um trabalhador da área construção civil, mais 
especificamente atuando como pedreiro. Sua infância foi difícil, sem uma família bem 
estruturada, sua educação encerrou-se no ensino fundamental, tendo iniciado cedo seu 
labor como servente de pedreiro. Recebendo dois salários mínimos e meio por mês, já 
havia formado uma família, junto a sua esposa e seus dois filhos. 
Com o pouco salário que recebe, mesmo contando com a ajuda de sua esposa, que 
trabalha informalmente, João encontrava dificuldades em zerar as despesas de sua casa, 
pois, mesmo sem compreender direito, acabava arcando com uma carga tributária 
altíssima, tendo em vista que, além dos descontos que percebia em sua folha de 
pagamento mensal como INSS e IRRF, acabava tendo um custo elevadíssimo em 
impostos incidentes sobre os produtos que adquire no supermercado, como ICMS, IPI, 
PIS, COFINS e etc. Assim, embora acreditasse não ser ele o pagador de tais impostos, 
evidente que tais valores eram repassados a ele no valor em quem pagava pelo produto 
adquirido. 
Outrossim, embora sua condição financeira fosse delicada, João adquiriu um 
veículo usado, realizando seu pagamento em diversas parcelas, de modo que o valor final 
acabaria sendo o dobro do valor do bem, mesmo sem que ele compreendesse o motivo 
para isso. Além disso, acabava arcando anualmente com o pagamento do IPVA, além de 
pagar um valor absurdo pela gasolina em cada abastecimento, metade do qual composto 
por tributos. Não bastasse tudo isso, ainda pagava anualmente o IPTU de sua residência, 
apesar de não perceber nenhum investimento dessa valor no local onde morava. 
Em determinado momento, João decidiu demitir-se da empresa em que trabalhava 
e montar um negócio próprio, socorrendo-se de um amigo contador para tentar 
compreender o que necessitaria providenciar. Nessa ocasião, João descobriu que 
necessitaria de um alvará de funcionamento, além de um contrato social, já que seu 
cunhado entraria de sócio na empresa, bem como deveria pagar as taxas para registrar seu 
negócio na Junta Comercial, além de providenciar a inscrição estadual. 
 
Após ser informado de que poderia enquadrar sua empresa no sistema 
SUPERSIMPLES, João descobriu que, embora o nome do sistema sugira o contrário, 
teria que verificar as possíveis tabelas em que sua empresa estaria enquadrada, bem como 
haveria uma série de obrigações acessórias a cumprir, as quais poderiam gerar 
penalidades duras se não cumpridas. Por fim, descobriu que, caso sua empresa viesse a 
crescer, teria que optar por outras formas de tributação, que importariam na incidência de 
tantos outros impostos quanto poderia imaginar, muitos dos quais sequer tinha 
conhecimento da existência. 
De tal maneira, João, de tão desiludido com a burocracia e a altíssima carga 
tributária que teria que enfrentar, optou por desistir de seu sonho de empreender, 
acabando por acreditar que seria muito melhor viver na informalidade, trabalhando como 
motoboy e realizando entregas sem qualquer nota fiscal ou imposto. 
Dessa forma, o texto nos demonstra de forma acessível todas as injustiças 
cometidas diariamente no campo da tributação brasileira, tendo em vista as diversas 
maneiras que a legislação tributária atualmente oferece às classes mais altas para que 
possam se furtar de pagar uma alta carga tributária e, por outro lado, impõe tributos 
infindáveis que acabam por acarretaruma sobrecarga às classes mais baixas, de forma a 
se desequilibrar ainda mais a balança social no país.