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/ Alter do Chão Alter do Chão – Um mar subterrâneo Por: Julio Cezar Winkler Com cerca de três vezes o volume de água contida pela represa de Itaipu, foi anunciada por pesquisadores da Universidade Federal do Pará a descoberta do Aquífero Alter do Chão, maior reservatório subterrâneo de água encontrado até agora. Uma ótima notícia em um momento em que a disponibilidade de recursos hídricos é definida como estratégica. Geologia dos aquíferos Aquíferos são porções internas da crosta terrestre com capacidade para armazenar água e cuja porosidade é suficiente para que a água realize movimentos por diferença de pressão hidrostática. A crosta terrestre, ou litosfera, é a porção mais fina entre as principais camadas que formam o nosso planeta. É nela que vivemos, e dela retiramos os recursos naturais necessários para o nosso sustento e desenvolvimento. Afirmar que a litosfera (lito, do grego líthos, significa rocha, pedra) é formada apenas por material sólido é um erro. Com espessura média variando entre 10 e 35 km, constitui-se também por líquidos, como água e gases associados a depósitos fósseis. Materiais em estado sólido representam a maior parte da sua composição; porém, os diferentes níveis de porosidade desses materiais propiciam maior capacidade de armazenar água e formar aquífero. Conheça os principais tipos de aquíferos: Aquífero livre ou freático Os aquíferos livres ou freáticos foram os primeiros explorados pelo ser humano. Apresentam a porção inferior delimitada por rochas permeáveis ou semipermeáveis e a porção superior livre – por isso o nome –, estando, em alguns casos, acima do nível do solo, o que acaba por originar os charcos e pântanos. Em locais como altos de morros e serras, o nível de água pode ser bastante profundo; próximo aos rios, o nível é mais baixo, podendo-se encontrar água a profundidades inferiores a um metro. Sua recarga ocorre de forma livre pela infiltração direta da água das chuvas, sendo que o tipo de cobertura do solo (vegetação, pavimentação, plantações, entre outros) e a inclinação do terreno são fatores que tornam o processo de infiltração variável. A descarga se dá em áreas de contato com rios, lagos, mares e nas nascentes, quando a água brota naturalmente do aquífero freático para a superfície, originando um córrego. Em função da sua pouca profundidade, os aquíferos freáticos são facilmente contaminados, sendo que grande parte desse tipo de depósito de água em área urbana já se encontra nessa situação. Aquífero confinado ou artesiano / Os aquíferos artesianos são aqueles que estão entre camadas de rochas permeáveis ou semipermeáveis a profundidades maiores, onde a circulação de água é menos intensa que nos aquíferos freáticos. Em função da grande profundidade e da pressão exercida pelas camadas adjacentes de rocha, a pressão nos aquíferos artesianos é maior que a pressão atmosférica, portanto a maioria dos poços perfurados nesse tipo de aquífero tende a jorrar. Os aquíferos artesianos apresentam diferenças quanto ao tipo de rocha a que estão associados. Vejamos: Aquífero de fraturas No local de ocorrência de rochas ígneas ou metamórficas formam-se os aquíferos de fraturas ou fissuras, pois esses tipos de rochas tendem a apresentar fraturas que são ocupadas pela água. A perfuração de poços depende da precisão em acertar uma fratura significativa, o que nem sempre é possível de se calcular previamente. Em geral, trata-se dos menos produtivos; mas, por questões de localização geográfica, são muito importantes para o abastecimento em nosso país, pois vários estão localizados em áreas que comportam grandes cidades e, assim, são largamente utilizados no abastecimento. Aquíferos porosos / Consistem nos aquíferos mais relevantes, por apresentarem a maior capacidade de armazenamento de água e por abrangerem grandes áreas. O Aquífero Alter do Chão é desse tipo. Esses aquíferos ocorrem em materiais de origem sedimentar, cuja principal característica é a grande e homogênea porosidade, o que permite à água escoar em qualquer direção. A recarga desse tipo de aquífero é mais intensa do que nos de fissura. Aquíferos cársticos São aquíferos associados a rochas carbonáticas, as quais apresentam bastante sensibilidade ao desgaste por ação da água. Dessa forma, as fraturas nesse tipo de rocha alargam-se pelo fluxo de água, formando verdadeiros rios subterrâneos. Principais aquíferos brasileiros: O Aquífero Alter do Chão já era conhecido havia muito tempo, porém, o que não se sabia era a quantidade de água armazenada por ele. Os estudos mais recentes dos pesquisadores paraenses e cearenses chegaram ao incrível número de 96 mil quilômetros cúbicos de água – quantia que ainda pode crescer, dependendo de investimentos para aprofundar as pesquisas. Com a atual medição de volume, calcula-se que a água existente no Alter do Chão seria suficiente para abastecer toda a população mundial por 100 vezes. Para efeito de comparação, o Aquífero Guarani, considerado até então o maior do Brasil, tem um reservatório de 45 mil quilômetros cúbicos, sendo a Alter do Chão duas vezes maior que o Guarani. Veja abaixo algumas das suas principais funções. Estocagem e regularização da água – Durante o período de chuvas, os aquíferos funcionam como receptores de água. Parcela significativa das águas pluviais infiltram-se, abastecendo os aquíferos, que, em períodos de estiagem, fazem a manutenção do nível dos rios e lagos de forma lenta e interrupta. Filtragem – Uma das grandes vantagens no aproveitamento das águas dos aquíferos é o fato de que elas, na maioria das vezes, são potáveis, não necessitando de tratamento para o consumo, fato que barateia o seu uso. Quando a água infiltra-se nas camadas inferiores da crosta terrestre, passa por diferentes materiais, que a filtram. Entretanto, os aquíferos também sofrem contaminação, quando na sua área de recarga são encontrados agentes poluidores, como lixões; quando são áreas em que ocorre intenso uso de agrotóxicos; ou em áreas grandemente urbanizadas. / Crédito: CEDOC - Agência Nacional de Águas - ANA Produzindo um filtro Que tal produzirmos um filtro? Para isso, você vai precisar dos seguintes materiais: -Três garrafas PET; -Areia fina; -Pedregulhos (pedras pequenas); -Água barrenta. Corte o fundo de uma das garrafas PET. Em seguida, coloque algumas pedras no interior da garrafa, de forma que fiquem presas junto ao bico. Depois, complete com uma camada de areia e outra de pedra, mais uma de areia e outra de pedra, cada uma com cerca de três centímetros. É importante que tanto as pedras como a areia sejam bem lavada em água corrente antes de montar o filtro, para um resultado mais adequado. Depois de pronto, pegue a solução com água barrenta, despeje dentro do seu filtro e colete a água na outra extremidade (bico da garrafa). Guarde um pouco de água barrenta e depois compare o resultado. Para purificar ainda mais a água, você pode passá-la mais vezes pelo filtro. Você notará que ela ficará cada vez mais pura. Agora, imagine um filtro de pedra e areia com centenas ou até mesmo milhares de metros. Parece que claro que quando a água chegar ao aquífero estará totalmente livre de impurezas. Crédito:Julio Cezar Winkler / Use três garrafas pets, sendo uma inteira para coletar a água suja, outra, grande, cortada o fundo e com furos na tampa para formar o filtro e outra, cortada na altura do gargalo para funcionar como coletora da água após passagem pelo filtro. Crédito:Julio Cezar Winkler Usando areia e pedras limpas e de diversas granulações, da mais fina para a mais grossa, faça camadas conforme indicado nas fotos. Crédito:Julio Cezar Winkler Usando areia e pedras limpas e de diversas granulações, da mais fina para a mais grossa, faça camadas conforme indicado nas fotos. Crédito:Julio Cezar Winkler Usando areia e pedras limpas e de diversas granulações, da mais fina para a mais grossa, faça camadas conforme indicado nas fotos. / Crédito:Julio Cezar Winkler Coloque o filtro sobre o coletor e em seguida derramea água barrenta na extremidade do filtro. Crédito:Julio Cezar Winkler Coloque o filtro sobre o coletor e em seguida derrame a água barrenta na extremidade do filtro. Crédito:Julio Cezar Winkler Espere que lentamente a água deverá fluir por entre a areia e as pedras, precipitando-se na garrafa coletora. / Crédito:Julio Cezar Winkler para obter um melhor resultado, passe a água mais de uma vez pelo filtro. Ao final, compare a água filtrada com a água barrenta e anote os resultados, explicando o que aconteceu. A importância das águas subterrâneas: Estima-se que atualmente mais de 95% de toda a água doce disponível para a humanidade esteja confinada nos aquíferos, podendo estar localizada a até 4 mil metros de profundidade. Atualmente, segundo a Unesco, a Europa conta com cerca de 75% de seu consumo diário de água proveniente das águas subterrâneas, sendo que em países como a Alemanha, Holanda e Suécia, esse índice está acima dos 90%. No Brasil, muitas cidades pequenas e médias usam água do Aquífero Guarani para garantir o abastecimento, e aproximadamente 80% dos municípios do Estado de São Paulo utilizam água proveniente das profundezas da Terra. Esses números demonstram a importância dos aquíferos, que cada dia mais se tornam uma alternativa viável e confiável para suprir as populações com uma água de boa qualidade e que, em muitos casos, dispensa tratamento. É preciso destacar que as águas subterrâneas também fazem parte do ciclo hidrológico, não estando confinadas eternamente no subsolo. Elas fluem e acabam por alimentar os rios, lagos e oceanos, voltando à superfície, evaporando-se e precipitando-se em forma de chuvas, que abastecerão novamente os aquíferos. Questão de sustentabilidade Apesar de abundantes, as águas subterrâneas não são inesgotáveis, e o seu uso sem uma gestão consciente pode trazer problemas a curto e a médio prazos. Veja os principais problemas ambientais causados pelo mau uso dos aquíferos. Contaminação dos aquíferos Mesmo confinados nas camadas inferiores da crosta terrestre, os aquíferos também sofrem com a poluição, pois, como foi dito, as suas águas também estão no ciclo hidrológico e, por isso, podem receber substâncias contaminantes. Isso pode ocorrer caso a região de recarga esteja sob uma área urbana densamente povoada; caso se realize a prática da agricultura comercial em suas áreas de recarga, pois agrotóxicos e outros insumos agrícolas podem chegar até o aquífero; ou na ocorrência de lixões, que contaminam a água com o chorume que produzem – substância altamente poluente; ainda não há estudos para reter esse tipo de dejeto. Outro meio de contaminação são poços abertos e abandonados sem o devido cuidado. Esses poços passam a ser porta de entrada para elementos poluentes que podem contaminar a água. Em 2006, pesquisadores da Universidade de Manaus realizaram um trabalho por meio do qual detectaram que o lixão da cidade estava contaminando o Aquífero Alter do Chão, que ainda não fazia parte das notícias nacionais. Se as águas de aquíferos são mais difíceis de serem contaminadas que as águas de superfícies, o mesmo não se pode dizer sobre sua recuperação. Uma vez que se contamine um aquífero, é muito difícil limpá-lo, e o capital despendido nessa missão é na maioria das vezes proibitivo, ou seja, é demasiadamente caro recuperar um aquífero contaminado; portanto, devemos evitar que isso aconteça. Uso excessivo / Quando vários poços são perfurados sem critério ou sem que se faça um estudo da quantidade de água disponível, a descarga excede a recarga, fazendo com o volume de água disponível diminua. Nesses casos, poços mais rasos secam, e é preciso perfurar cada vez mais fundo para obter-se água, o que encarece o processo. Porém, esse não é o maior problema, pois existem ligações entre os aquíferos livres e os confinados, levando a uma diminuição no nível dos livres, responsáveis diretos na alimentação dos rios e nascentes. Dessa forma, períodos de grande estiagem podem gerar enormes problemas para a população, como a falta de água para indústrias e ate mesmo para os afazeres domésticos. Terremotos de mentira Outro problema associado à exploração excessiva das águas existentes nos aquíferos está relacionado aos aquíferos cársticos, que se desenvolvem em rochas carbonáticas, as quais, por sua composição são facilmente diluídas na presença de água. Dessa forma, a água infiltra em pequenas rachaduras na rocha e, à medida que flui por essas fraturas, vai ampliando o canal, formando verdadeiros rios subterrâneos, nos quais, sob pressão, atua no sentido de fortalecer as paredes desses canais subterrâneos. Quando a água é escoada para a superfície através de poços em um ritmo maior que a recarga, podem-se originar espaços ocos, que estão sujeitos a acomodações ou desmoronamentos. Quando esses desmoronamentos subterrâneos são muito próximos da superfície, podem causar danos à população local. Um exemplo desse problema ocorreu no município de Almirante Tamandaré, no Estado do Paraná. O município está sobre o Aquífero Karst, associado a rochas carbonáticas. Com o crescimento da população da zona urbana, a companhia de saneamento do Estado perfurou uma série de poços no centro da cidade. A partir da década de 1990, casas começaram a rachar, calçadas e ruas quebraram e buracos (dolinas) começaram a se formar. Em função disso, a empresa encomendou estudos, que apontaram a necessidade de fechar cinco poços existentes na cidade, entre outras ações no sentindo de evitar maiores problemas. Água e esperança A descoberta do enorme volume de água do Aquífero Alter do Chão mostra-nos que conhecemos pouco as profundezas do nosso planeta. Já enviamos sondas espaciais para os confins do sistema solar, mas, em se tratando de perfurar poços, somos barramos por dificuldades naturais ao atingimos alguns quilômetros. Vivemos um momento interessante. No final do século passado, vários pseudopesquisadores anunciavam o fim próximo do petróleo. “Nossas jazidas são limitadas!”, alardeavam. Alguns chegaram a desenhar uma atualidade sem petróleo. Recentemente, a Petrobras anunciou a descoberta de reservas imensas do chamado “ouro negro” em camadas profundas da crosta terrestre, colocando o Brasil no mapa dos potenciais produtores de petróleo. A descoberta do Alter do Chão deve servir como um alerta para muitos que visualizam um mundo árido no futuro. É claro que devemos ter muito cuidado com a água no nosso planeta, pois ela só nos serve limpa, e se continuarmos a poluir as nossas reservas, poderemos enfrentar problemas econômicos, como o encarecimento do custo de tratamento da água para as nossas populações. Copyright © 1999 - 2020. Portal Educacional . Todos os direitos reservados.
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