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PNBE Na Escola Literatura fora da caixa Guia 2 Anos iniciais do Ensino Fundamental Presidência da República Ministério da Educação Secretaria Executiva Secretaria da Educação Básica Guia 2 PNBE Na Escola Literatura fora da caixa Anos iniciais do Ensino Fundamental PrEsidêNcia da rEPúBlica MiNistério da Educação sEcrEtaria ExEcutiva sEcrEtaria dE Educação Básica dirEtoria dE ForMulação dE coNtEúdos EducacioNais coordENação GEral dE MatEriais didáticos Equipe técnico-Pedagógica – coGEaM/sEB Andrea Kluge Pereira Cecíl ia Correia Lima José Ricardo Albernás Lima Lucineide Bezerra Dantas Lunalva da Conceição Gomes Maria Marismene Gonzaga Equipe de apoio administrativo – coGEaM/sEB Gabriela Brito de Araújo Gislenilson Silva de Matos Neil iane Caixeta Guimarães Paulo Roberto Gonçalves da Cunha seleção de originais e coordenação da edição Magda Becker Soares Aparecida Paiva Planejamento editorial e preparação de textos Ana Paiva Rogerio Mol Projeto gráfico e diagramação Christ iane Costa tiragem Guia 2 – PNBE: Literatura fora da caixa – Anos iniciais do Ensino Fundamental 651.860 exemplares PNBE na escola : l i teratura fora da caixa / Ministério da Educação ; elaborada pelo Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da Universidade Federal de Minas Gerais. – [Brasí l ia : Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2014]. 3 v. Guia 1 : Educação infanti l – Guia 2: Anos iniciais do Ensino Fundamental – Guia 3: Educação de Jovens e Adultos. ISBN: 978-85-7783-155-5 1. Programa Nacional Bibl ioteca da Escola. 2. Acervo. 3. Mediação pedagógica. 4. Educação l i terária. I. Brasi l. Ministério da Educação. I I. Universidade Federal de Minas Gerais. Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita. CDU 028.1(036) ApresentAção Ministério da Educação introdução Magda Soares Aparecida Paiva teXtos eM Verso – Poema, Quadra, Par lenda, Cant iga, Trava-L íngua, Adiv inha Célia Regina Delácio pArA ForMAr Le itores Bons de prosA João Luís Ceccantini Thiago Alves Valente A L iterAturA Me ALCAnçA peLAs iMAGens Que A Const itueM: Ref lexões epis to lares Flávia Brocchetto Ramos pArA A Le iturA de h istóriAs eM QuAdrinhos e de nArrAt iVAs de F iCção por iMAGens: In t rodução a aspectos narrat ivos e gráf icos Juvenal Zanchetta Jr. pnBe 2014 oBrAs seLeC ionAdAs 7 9 17 29 49 65 79 Sumár io ApresentAção Ministério da Educação A distribuição de obras de literatura pelo Programa Nacional Biblio- teca da Escola (PNBE) já passou por diversos formatos. Em todos eles, o objetivo do Ministério da Educação (MEC) sempre foi proporcionar aos alunos da rede pública o acesso a bens culturais que circulam socialmente, de forma a contribuir para o desenvolvimento das potencialidades dos leitores, favorecendo, assim, a inserção desses alunos na cultura letrada. No entanto, apenas o acesso aos livros não garante sua apropria- ção, sendo de fundamental importância a mediação do professor para a formação dos leitores. Mediar a leitura significa intervir para aproximar o leitor da obra e, nesse sentido, o trabalho do professor assume uma dimensão maior, uma vez que extrapola os limites do texto escrito, pro- movendo o resgate e a ampliação das experiências de vida dos alunos e do professor mediador. Para auxiliar os professores nessa tarefa, o MEC vem, ao longo dos anos, produzindo materiais voltados para o uso dos acervos do PNBE, como o Guia do Livronauta (PNBE 1998),1 História e Histórias (PNBE 1999), o Catálogo Literatura na Infância: imagens e palavras (PNBE 2008),2 além de outras publicações voltadas para a formação de leitores, como a Revista Leituras, o kit Por uma Política de Formação de Leitores3 e o volume 20 – Literatura Infantil – Coleção Explorando o Ensino.4 Dando prosseguimento à essa ação formativa, este Ministério está encaminhando às bibliotecas das escolas que oferecem Educação Infantil (creche e pré-escola), anos iniciais do Ensino Fundamental e/ou Educa- ção de Jovens e Adultos esta publicação PNBE na escola: Literatura fora da caixa. Composta por três volumes, ela traz um conjunto de textos que, certamente, irão contribuir para uma mediação mais efetiva, de forma a proporcionar aos alunos diferentes experiências com a leitura literária. Essa publicação foi elaborada pelo Centro de Alfabetização, Leitura 1 Disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me001878.pdf 2 Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Avalmat/literatura_na_in- fancia.pdf 3 Disponíveis em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=ar- ticle&id=16896&Itemid=1134 4 Disponível em http://portaldoprofessor.mec.gov.br/linksCursosMateriais.html?cate- goria=117 7 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l e Escrita (CEALE), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), responsável pelo processo de avaliação, seleção e composição dos acervos. Cada acervo, concebido para o uso coletivo de alunos e professores, vem acompanhado desta publicação. Os acervos estão organizados em quatro categorias: Categoria 1: Para as instituições de educação infantil que atendem creche foram formados 2 (dois) acervos distintos, com 25 (vinte e cinco) obras cada, num total de 50 (cinquenta) obras. Categoria 2: Para as instituições de educação infantil que atendem pré-escola foram formados 2 (dois) acervos distintos, com 25 (vinte e cinco) obras cada, num total de 50 (cinquenta) obras. Categoria 3: Para as escolas que oferecem os anos iniciais do ensino fundamental foram formados 4 (quatro) acervos distintos, com 25 (vinte e cinco) obras cada, num total de 100 (cem) obras. Categoria 4: Para as escolas que oferecem educação de jovens e adultos foram formados 2 (dois) acervos distintos, com 25 (vinte e cinco) obras cada, num total de 50 (cinquenta) obras. Nem todas as escolas receberão todos os acervos, porque a distribui- ção está relacionada ao número de alunos matriculados. Mas, ao final dos volumes, consta a relação de todas as obras selecionadas de forma que os professores possam conhecer a totalidade dos títulos. As obras selecionadas, além de diversificadas do ponto de vista te- mático, dos gêneros e formatos, também diferem do ponto de vista do grau de complexidade. Portanto, os acervos são compostos por obras que estimulam a leitura autônoma por parte de crianças, jovens e adultos em processo de alfabetização ou propiciam a professores e alunos alternativas interessantes de leitura compartilhada. No que diz respeito à educação infantil, este Ministério, consideran- do a necessidade de garantir material de apoio à educação de crianças nessa etapa de ensino, ampliou a distribuição dos acervos voltados para a educação infantil, encaminhando-os, não apenas às bibliotecas dessas escolas, mas, também, para salas de aula e outros espaços onde se dá o trabalho com crianças de 0 a 3 anos (creche) e de 4 e 5 anos (pré-escola). Este Ministério, ao incluir nos acervos de livros de literatura essa publicação, espera contribuir, de forma efetiva, com a circulação e leitura das obras que compõem os acervos do PNBE 2014 e, de modo especial, com a formação leitora de alunos e professores. 8 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l introdução Magda Soares Aparecida Paiva Você tem em mãos o guia dos anos iniciais do Ensino Fundamental do PNBE 2014. Este volume é um dos dos três guias que serão dis- ponibilizados pelo MEC para acompanhar os acervos selecionados pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola. Além deste guia, foram produzidos mais dois: um para a Educação In- fantil e um para a Educação de Jovens e Adultos, segmentos contemplados por esta edição do Programa. Esperamosque você, de posse deste guia, tenha uma oportunidade concreta de cres- cimento como mediador(a) de leitura literária na escola e de enriquecimento de sua formação como leitor de literatura, o que, acreditamos, o ajudará a dar um novo significado às práticas de leitura literária com seus alunos, em sala de aula, ou na biblioteca escolar. Nosso propósito com esse “guia”, esse ma- terial de apoio, é possibilitar a você um acesso dialogado ao universo literário das obras que constituem os acervos do PNBE 2014, propon- do orientações de uso desses acervos na escola, pelos professores e pelos profissionais que atuam nas bibliotecas escolares, com apresentação e discussão pedagógica de gêneros, autores, temá- ticas, competências literárias e outras formas de conhecimento e apreciação das obras. Assim, além dessa apresentação inicial, que explicita nosso desejo de contribuir efe- tivamente com a circulação e leitura das obras que compõem os acervos do PNBE 2014, e, de modo muito especial, com sua formação leitora, apresentamos a você um conjunto de textos que representam os gêneros selecionados para o acervo: prosa, verso, imagem e história em quadrinhos. divisão interna do Guia Cada um dos textos, impressos após a apre- sentação deste guia, foi planejado especialmente para você, mediador de leitura; são textos escri- tos em linguagem simples e direta onde cada au- tor(a) procura discutir as especificidades de cada gênero, abordando obras que o representam, no intuito de que essas leituras funcionem como exemplos e incentivo para a apropriação dos acervos pelos mediadores de leitura, de forma a enriquecer as atividades de leitura na escola. Além desses textos básicos, há, ao final de cada guia, a relação de todos os títulos selecio- nados no PNBE 2014, separados por segmento, categoria e gênero. Esperamos, com esse nosso esforço, duas coisas: socializar com você os livros selecionados no PNBE 2014, a fim de que você possa usufruir desse acervo como leitor(a) de literatura, independente do segmento em que atue, provocando em você o desejo de lê-los e compartilhá-los com seus alunos. Por outro lado, esse nosso movimento de apresentar visu- almente, ao final de cada guia, todo o acervo do PNBE 2014 também pretende fomentar uma curiosidade nos mediadores de leitura, assim como uma maior circulação das obras na escola, 9 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l ao deixar claro o quanto são tênues as separações por segmento, faixa etária, ou qualquer outro tipo de categorização e que, o mais importante, é a literatura de qualidade estar disponível. Por fim, gostaríamos de ressaltar que a relação das obras adquiridas pelo PNBE ainda oferece um parâmetro relevante a respeito do quadro geral dos livros veiculados nas escolas públicas brasileiras. Ao observar gêneros, autorias e categorias, o professor, ainda que sua escola não tenha alguns desses títulos em seu acervo, dispõe de um conjunto de dados que podem funcionar como baliza para a escolha de material de leitura, considerando que a qualidade literária é item primordial para a seleção dos acervos do PNBE. Para começo de conversa, alguns dados para você se situar O Programa Nacional Biblioteca da Escola – PNBE1 – foi instituído em 1997 e tem como objetivo principal democratizar o acesso a obras de literatura infantojuvenil, brasileiras e estrangeiras, e a materiais de pesquisa e de referência a professores e alunos das escolas públicas brasileiras. O Programa é executado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE – em parceria com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação – SEB/MEC. Você pode obter informações sobre todas as edições do Programa no site do MEC, buscando por PNBE. Para que você tenha uma ideia da magnitude desse Programa, vamos apresentar a seguir dados do investimento feito no período de 2006 a 2013. Os dados de 2014 ainda estão sendo processados. Observe bem o volume de recursos investidos. Agora, com base no quadro a seguir, preste especial atenção na quantidade de escolas e alunos atendidos no período de 2006 a 2013 e projete a espantosa quantidade de livros distribuídos pelo Programa 1 Se você quiser saber mais sobre o PNBE, como por exemplo sua história, processo de seleção e constituição de acervos, cf. FNDE: http://www.fnde.gov.br/ e cf. PAIVA, Aparecida (org.). Literatura fora da caixa: O PNBE na escola – distribuição, circulação e leitura. São Paulo: Editora UNESP, 2012. 10 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l desde sua criação. Muitas vezes, os professores de escolas menores, que recebem uma quantidade pequena de acervos, não imaginam a quantidade de livros de literatura que são distribuídos ano a ano. No entanto, no que pese esse grande número de livros distribuídos, se pensarmos no tamanho do nosso País, na carência das nossas escolas públicas e na quantidade de alunos que elas atendem, sempre haveremos de reivindicar um aumento no volume de investimento. o que foi oferecido para a seleção dos acervos? Para que você tenha uma ideia da quantidade de livros inscritos no PNBE 2014, abarcando os segmentos Educação Infantil, anos iniciais do Ensi- no Fundamental e EJA, observe o gráfico a seguir: Observe que é a categoria 3 – livros inscri- tos para os anos iniciais do Ensino Fundamental – que recebe o maior número de inscrições de livros pelas editoras: mais da metade dos inscri- tos. Por outro lado, a inscrição é muito pequena para livros destinados às crianças de 0 a 3 anos – apenas 3% – o que evidencia a pouca produ- ção editorial que há para esse segmento, ainda não contemplado pelas editoras. No entanto, é uma produção importante, porque já na creche a criança merece oportunidades de contato com livros adequados para a idade, que promovem sua entrada no mundo da escrita. o segmento anos iniciais do Ensino Fundamental Obedecendo ao que foi previsto no edital do PNBE 2014, deveriam ser selecionadas, para cada acervo literário destinado aos anos iniciais do Ensino Fundamental, obras de cada um dos três agrupamentos seguintes: 1. Textos em verso – poema, quadra, par- lenda, cantiga, trava-língua; 2. Textos em prosa – pequenas histórias, novela, conto, crônica, teatro, clássicos da literatura infantil; 3. Livros de imagens e livros de histórias em quadrinhos, dentre os quais se incluem obras clássicas da literatura universal, ar- tisticamente adaptadas ao público dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Os livros inscritos para os anos iniciais do Ensino Fundamental se distribuíram de forma muito diferenciada por esses três agrupamen- tos; observe, no gráfico a seguir, a percentagem dos inscritos por agrupamento e, portanto, as possibilidades de escolha oferecidas para a com- posição dos acervos: Os números evidenciam que a quantidade 11 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l de livros em prosa inscritos pelas editoras é muito superior à dos inscritos nas outras categorias, o que permite supor que a produção de livros para os anos iniciais do Ensino Fundamental vem privilegiando, de forma significativa, a prosa. Sob determinado aspecto, essa predominância da prosa entre os livros inscritos é positiva: é fundamental que a criança, na etapa em que está consolidando seu domínio da leitura autônoma e começando a se inserir, de forma sistemática, no mundo da escrita, vivencie com frequência e intensidade o texto em prosa, para que, além de imergir no mundo do imaginário e da fantasia dos contos e das narrativas, e também no mundo da informação, vá desenvolvendo sua competência leitora e o conheci- mento dos usos e funções da escrita. Entretanto, surpreende a inscrição de número pequeno de livros de poemas, que muito atraem as crianças e são importantes para introduzi-las no mundo da poesia. Apesar dodesequilíbrio no número de livros inscritos em cada categoria e por gênero, na seleção final para compor os acervos destinados aos anos iniciais do Ensino Fundamental, incluímos, em cada um dos acervos, livros de todas categorias – prosa, verso, imagem, história em quadrinhos – mesmo havendo, pelo já exposto, mais alternativas de escolha de prosa – isso explica por que os livros em prosa são mais numerosos nos acervos. Mas você encontrará, nos acervos 2014, livros de todas as categorias previstas no Edital, o que propicia às crianças a vivência de diferentes gêneros e a possibilidade de desenvolver conceitos, conhecimentos e habilidades peculiares a cada um deles. Do grande número de livros inscritos no PNBE, do desequilíbrio na distribuição deles pelas cinco categorias a serem contempladas, dos diversos critérios a serem obedecidos, que serão indicados no item abaixo, enfim, desse universo de possibilidades, foi necessário selecionar apenas os 100 títulos previstos em Edital2 para os anos iniciais do Ensino Fun- damental e distribuí-los por quatro acervos de 25 livros cada. Foi o que fizemos e, pode-se facilmente concluir, não foi uma tarefa fácil. com que critérios foram escolhidos os livros para compor os acervos? Além de constituir cada acervo com diferentes categorias de livro e diferentes gêneros, procuramos ainda selecionar os livros pelo critério de sua qualidade: qualidade textual, que se revela nos aspectos éticos, estéticos e literários, na estruturação narrativa, poética ou imagética, numa escolha vocabular que não só respeite, mas também amplie o repertório linguístico de crianças na faixa etária correspondente à Educação Infan- til; qualidade temática, que se manifesta na diversidade e adequação dos temas, e no atendimento aos interesses das crianças, aos diferentes contextos sociais e culturais em que vivem e ao nível dos conhecimentos 2 Ao final deste guia, você encontrará a relação completa de todos os acervos do PNBE 2014. 12 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l prévios que possuem; qualidade gráfica, que se traduz na excelência de um projeto gráfico capaz de motivar e enriquecer a interação do leitor com o livro: qualidade estética das ilus- trações, articulação entre texto e ilustrações, e uso de recursos gráficos adequados à criança na etapa inicial de inserção no mundo da escrita. Foi ainda critério para constituição dos acervos a seleção, entre as obras consideradas de qualidade, nos vários agrupamentos – prosa, verso, imagem e história em quadrinhos –, da- quelas que representassem diferentes níveis de dificuldades, de modo a atender a crianças em variados níveis tanto de compreensão dos usos e funções da escrita quanto de desenvolvimento de sua competência leitora, possibilitando assim formas diferentes de interação com o livro, seja pela via da leitura autônoma, sobretudo no mo- mento da entrada no ensino fundamental, aos seis anos, seja pela leitura mediada pelo professor. Não basta a presença do livro: o papel dos formadores de leitores O PNBE tem cumprido o importante papel de fazer chegar até as escolas públicas brasileiras livros de literatura para todos os segmentos da escolaridade: educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental, anos finais do ensino fun- damental, ensino médio, educação de jovens e adultos. Em suas várias edições, o Programa vem ampliando o seu alcance, apontando o quanto é diversificado o público leitor que frequenta as bibliotecas escolares. Essa condição variável e múltipla requer o olhar sensível e nuançado para as especificidades de cada fase de formação e também para as peculiaridades das mediações que envolvem cada segmento da escolaridade. Mediações que acontecem nos espaços e tempos dedicados à leitura na escola. Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, em que estão crianças de 6 a 10 anos, não po- deria ser diferente. Nesta fase, a leitura literária ainda conta em grande medida com a mediação de professores e bibliotecários, em atividades de contação de histórias e de leitura de poemas, que possibilitem a construção de sentidos por esse leitor que já pode ler sozinho, mas ainda depen- de da orientação daqueles que se encarregam da formação de leitores. Espera-se que, nesse segmento da escolaridade, as crianças tenham contato permanente com esses bens culturais que são os livros de literatura, para que se fami- liarizem com eles de modo a interagir com a lin- guagem literária – nos textos e nas ilustrações –, desenvolvendo também a compreensão dos usos sociais da escrita. Todo o trabalho com o livro de literatura, se feito de maneira adequada quando as crianças iniciam a sua trajetória escolar, pode despertar o gosto pela leitura e o interesse por livros, e pode ainda contribuir consideravelmen- te para a etapa posterior, quando espera-se que o aluno tenha já domínio da leitura. Mas, para que isso ocorra, as experiências com a leitura literária precisam ser bem-sucedidas, de modo a aguçar a vontade de ler mais e conhecer outros livros que compõem o grande acervo de obras da cultura escrita endereçado a crianças e jovens. Nas situações de leitura autônoma ou media- da que ocorrem nos anos iniciais, vale apostar numa relação cúmplice e aproximada entre o mediador e a criança, em que aquele promo- va e incentive manifestações – palavras, gestos, avaliações, comentários – das crianças diante do que leem, e em geral não leem de forma passiva, podendo-se assim planejar e conduzir de forma mais adequada a leitura literária. Leitura silenciosa, compartilhada ou mediada: incentivar. 13 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l a literatura na escola: formando leitores Depois de um longo caminho percorrido pelo livro, desde sua inscrição no PNBE, pela sua editora, até a sua seleção para compor o acervo do Pro- grama e posterior aquisição pelo FNDE para distribuição, ele, finalmente, chega à escola. Se há dados seguros dessa distribuição, como você pôde observar no início desta introdução, o mesmo não podemos dizer da sua recepção, circulação e uso nas escolas públicas do País. Com menos segurança ainda podemos elencar ações que viabilizam a formação de professores e de profissionais que atuam nas bibliotecas escolares para o reconhecimento do potencial da literatura disponibilizada e suas possibilidades formativas e educativas no cotidiano escolar, em especial, na sala de aula e na biblioteca. Mas por acreditar na qualidade literária destes acervos, nosso papel inclui um desejo de divulgação dos acervos do PNBE, e por isso chega até você este material de apoio, para que os profissionais responsáveis pelo processo de mediação de leitura na escola dele se apropriem e depois façam circular os conhecimentos. Assim, nossa expectativa é a de que você, que está lendo esse guia – o que certamente indica que os acervos do PNBE chegaram em sua escola –, se envolva nesse processo, da forma mais colaborativa possível. Nessa perspectiva, vamos apresentar, desde já, algumas sugestões que podem ser implementadas na escola. chegada e presença dos livros na sua escola Sugerimos que você reflita inicialmente sobre algumas questões: • Os acervos do PNBE estão em minha escola? Onde? • Foi feita ou vai ser feita divulgação sobre a chegada desses acervos na escola? • É ou será desenvolvido algum trabalho de mediação com esses acervos? • Os acervos do PNBE têm sido postos à disposição dos alunos e têm sido procurados por eles? Essas são algumas questões que podem nortear a ação coletiva dos me- diadores de leitura no espaço escolar. E veja que estamos falando de espaço escolar, porque acreditamos que a voz do docente não pode ser isolada, todos são mediadores de leitura, os professores, os profissionais da biblioteca, os gestores, enfim, os diferentes mediadores de leitura do contexto escolar são aqueles que detém o poderde fazer o livro circular. Se os mediadores se propõem a conhecer os acervos do PNBE, suas características e potenciali- dades, e se o trabalho for coletivo, tanto será mais fácil naturalizar, valorizar positivamente a atividade da leitura junto aos leitores iniciantes. O espaço escolar, então, passaria a ser concebido como privilegiado para as atividades de leitura. Enfim, se os próprios mediadores intensificarem suas práticas de leitura, o livro de literatura poderá ocupar o centro da escola. 14 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l os livros na biblioteca A biblioteca precisa ser assumida como o espaço da socialização, não do isolamento; inúmeras atividades positivas e prazerosas de leitura podem ser desenvolvidas nela: a contação ou leitura de histórias, fábulas, contos de fadas; a leitura ou a recitação de poemas; a busca de informações em livros informativos; e tantas outras atividades que levam a criança ainda não alfabetizada a apreciar e diferenciar gêneros. A criança pode ser ela mesma protagonista de atividades, como: atuando em teatrinho de fantoches; narrando oralmente suas experiências; ouvindo e contando causos e histórias de pescador. A biblioteca tem também o papel de aproximar dela as crianças, potenciais leitores. Atividades simples, como uma “festa” para receber novos acervos ou a divulgação em cartazes de novos livros atraem a atenção e o interesse das crianças. O importante é que os profissionais que trabalham nesse local se reconheçam como mediadores no trabalho de formação de leitores. Assim, uma vez concebida como local de leitura, interação e experimentação, a biblioteca se converte em referência de cultura e conhecimento para o leitor. os livros na sala de aula Professor, sua turma está recebendo os acervos do PNBE-2014. São 100 novos livros, que poderão ser usados em espaços variados: salas de aula, bibliotecas escolares, anfiteatros, e em áreas externas tais como pátios, não devendo estar restritos a espaços internos. Para isso, a inte- ração entre responsável pela biblioteca e professor é importante, não só para controle do acervo, mas também para uma colaboração que pode ser rica, entre esses dois mediadores de leitura. 15 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l Várias atividades podem ser desenvolvidas em sala de aula com livros da biblioteca, como: após a leitura pela professora, as crianças podem representar em desenhos partes da história, fábu- la ou conto de fadas; a história ou fábula lida pela professora pode ser dramatizada pelas crianças; as crianças podem apresentar e “ler” um livro de imagem para os colegas de uma outra sala; as crianças podem recontar oralmente uma história que foi lida pela professora; as crianças podem memorizar e recitar poemas curtos; as crianças podem preparar um cartaz de propaganda de um livro de que tenham gostado, para expô-lo na biblioteca e incentivar colegas a procurá-lo; as crianças podem escrever sua avaliação de li- vros lidos, compondo um guia de orientação de Ler pode ser uma deliciosa descoberta para as crianças. escolhas, de modo que este fique na biblioteca para consulta de colegas. Além disso, a professora, em parceria com a pessoa responsável pela biblioteca, pode orientar o empréstimo de livros para as crianças, com objetivos principais: para que a criança leia em casa, ou para que familiares leiam o livro para a criança, no caso de esta ainda não ser capaz de leitura autônoma, ou para que a criança leia o livro para familiares. concluindo Agora, finalmente, você vai poder entrar em contato com os textos que discutem as prin- cipais categorias de seleção voltadas aos anos iniciais do Ensino Fundamental – prosa, verso, imagem e história em quadrinhos. Pesquisadores e professores, com larga experiência na área da leitura e de literatura, comentarão, cada um ao seu modo, a concepção de gênero que subjaz a cada categoria e apresentarão análises textuais e ilustradas de algumas obras selecionadas pelo PNBE 2014, como exemplos das possibilidades de uso e prática das obras para este segmento. Desejamos a você uma boa leitura dos tex- tos que compõem esse guia e, de modo muito especial, uma prazerosa leitura dos livros selecio- nados para 2014, além de um excelente trabalho de mediação com os alunos. 16 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l teXtos eM Verso – Poema, Quad ra , Pa r l enda , Can t i ga , Trava-L íngua , Ad i v i nha Célia Regina Delácio1 A educação do ser poético Por que motivo as crianças, de modo geral, são poetas e, com o tempo, deixam de sê-lo? Será a poesia um estado de infância relacionada com a necessidade de jogo, a ausência de conhecimento livresco, a despreocupação com os mandamentos práticos de viver – estado de pureza da mente, em suma? [...] O que eu pediria à escola, se não me faltassem luzes pedagógicas, era considerar a poesia como primeira visão direta das coisas e, depois, como veículo de informação prática e teórica, preservando em cada aluno o fundo mágico, lúdico, intuitivo e criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética. [...] E a arte, como a educação e tudo o mais, que fim mais alto pode ter em mira senão este, de contribuir para a educação do ser humano à vida, o que, numa palavra, se chama felicidade? Carlos Drummond de Andrade 1 Doutora em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas. Professora adjunta e pesquisadora da Faculdade de Comunicação, Artes e Letras da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). introdução: começo de conversa Caro(a) Professor(a), Em primeiro lugar, queremos esclarecer que esta proposta de trabalho é apenas um caminho possível de ser trilhado, entre muitos outros caminhos que podem surgir da sua própria tra- jetória, da leitura do acervo PNBE/2014 e das leituras sugeridas no final deste texto. Temos certeza de que é você, professor, com toda a sua experiência e seu conhecimento de cada turma, quem saberá utilizar essas sugestões da melhor maneira, adaptando-as e enriquecendo-as com suas vivências e a de seus alunos. Como sabemos, de um lado, alguns estudos apontam que boa parte dos professores não tra- balha com a poesia na escola porque a concebem como um gênero difícil e pouco apreciado pe- las crianças (CUNHA, 1976, 1986; COELHO, 1987, 1991; SORRENTI, 2007; entre outros). De outro lado, muitos pesquisadores da área do ensino de literatura (ABRAMOVICH, 1991; AVERBUCK, 1988; LAJOLO, 2002; SOARES, 2006; PINHEIRO, 2002; entre outros) reve- lam o trabalho equivocado que é realizado por diversos professores ao utilizar a poesia apenas 17 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l para comemorar determinadas datas, transmitir lições de moral, inculcar determinados valores, ensinar gramática, medir as sílabas, responder questões objetivas de reprodução do texto, cir- cular substantivos, adjetivos ou verbos entre outras atividades óbvias, mecânicas e desesti- mulantes, tendo muitas vezes o livro didático como principal intermediário. Apesar dessas constatações frustrantes, é pre- ciso sublinhar que também existem professores fazendo trabalhos significativos com o gênero no contexto escolar. Essas práticas concretizadas por alguns professores fazem a diferença e se tornam inesquecíveis na vida de seus alunos. Considerando a infância como o momento essencial de jogos e brincadeiras, ludismo e fan- tasia (BORDINI, 1986; KIRINUS, 1998); a im- portância da poesia na educação do ser humano; o fato de que para milhares de crianças brasileiras o contato com a poesia ocorre apenas na escola; a escolarização incorreta da literatura nos livros didáticos (LAJOLO, 2002; SOARES, 2006) e a necessidade urgente de uma escolarização correta desse gênero (SOARES, 2006), estamos trazendoesta proposta para colocarmos a poesia no lugar de honra que ela merece ocupar na escola. Você, professor, é a figura principal para fazer a aproximação entre os textos em versos que compõem o PNBE/2014 e os seus alunos. Por isso, antes de iniciar as atividades indicadas, procure resgatar e escrever as suas memórias de leitura (cf. LAJOLO, 2005, p.39) e identificar os textos em verso mais marcantes. Lembre-se que cantigas de roda, parlendas, trava-línguas, poemas, quadras e adivinhas – considerados textos em verso nesse acervo – fazem parte das brincadeiras infantis e de nossa experiência com a função poética da linguagem (CADEMAR- TORI, 2009, p.116-117). Recorde-se dos versos que fizeram parte de sua infância, adolescência e juventude, e como eles foram (ou não) traba- lhados na escola. Não importa qual tenha sido suas experiências com esse gênero, positivas ou negativas, procure registrá-las. Se o seu contato com o gênero foi pequeno ou insignificante, não se preocupe porque isso pode ser mudado. Abra seus olhos e o seu coração para conhecer esse belíssimo acervo e embarque com a turma nessa aventura literária. A leitura é o seu passaporte! Memorial de versos Sugerimos o registro de todo esse trabalho de leitura, a ser desenvolvido ao longo do ano letivo em cada classe, em um livro ou caderno grande intitulado Memorial de Versos. Esse Me- morial, que pode ser confeccionado artesanal- mente e ilustrado pelas mãos da própria turma, registrará depoimentos, comentários, desenhos, impressões, poemas, entre outros, durante o pro- cesso de leitura dos livros do acervo e poderá fazer parte da exposição de Antologias Poéticas a serem feitas pelos alunos e apresentadas a toda comunidade escolar em um evento de encer- ramento das atividades que vamos recomendar mais adiante: um Sarau poético. No final, você terá nesse Memorial um valioso documento para avaliar o trabalho realizado e planejar sua continuidade no próximo ano escolar. Memória de versos nas cantigas de roda Para resgatar a experiência dos alunos com textos em versos, num primeiro momento, pro- ponha uma brincadeira de roda para aflorar a memória e a vivência das cantigas de roda pre- sentes no cotidiano das crianças. Os alunos, de mãos dadas em forma de um círculo, giram em sentido horário cantando músicas folclóricas de roda como, por exemplo, “Ciranda, Cirandinha”. Uma música puxa a outra e, assim, os versos memorizados vão surgindo nessa brincadeira lúdica com as cantigas de roda. Depois dessa atividade, convide os alunos para registrarem essas cantigas juntos no Memorial de Versos. O objetivo desta atividade é conhecer o repertório de textos em versos dos alunos para ampliá-lo por meio do acervo do PNBE/2014, a fim de que eles possam se aproximar da lingua- gem poética, compreender e gostar de ler poesia. 18 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l conhecer o repertório de versos dos alunos Em outro momento, organize os alunos em grupos pequenos para conversarem sobre os textos em verso que conhecem e de que se lembram. Cada grupo escolhe um relator para sintetizar a conversa e depois apresentar para a turma. O professor registra no Memorial de Versos os poemas lembrados pelos alunos. Converse com a classe sobre esse repertório e procure descobrir o motivo da memorização: os poemas que eles mais gostaram, o que senti- ram, que imagem lhes veio à mente, o que mais lhes chamou atenção. Procure anotar os aspectos levantados na conversa observando o que eles re- conhecem como características do gênero (verso, estrofe, rima, ritmo, sonoridade, visualidade etc.). conhecer a história de leitura da comunidade Agora vamos ampliar um pouco mais esse levantamento do nosso repertório de versos e do repertório de nossos alunos para conhecer também o da comunidade. Para tanto, solicite aos alunos uma entrevista com os funcionários da escola, os familiares ou a vizinhança, a fim de que seja feito um levantamento sobre o que a comunidade conhece como textos em verso ou poesia. Elabore um roteiro, junto com eles, das perguntas a serem feitas para resgatar as memórias de pessoas mais velhas do bairro tais como: quais poemas e poetas você conhece, quais poemas foram mais marcantes em sua vida, quem mos- trou esses poemas para você etc. Decida com a turma se a conversa com os entrevistados será feita individualmente, em duplas ou em grupos pequenos. Explique aos alunos que, ao entrevistar as pessoas, precisam anotar as respostas ou gravar as falas – desde que o entrevistado dê permissão – para serem transcritas depois. Em classe, os alunos socializam as falas dos entrevistados e registram os versos mencionados no Memorial de Versos. Somado a isso, peça-lhes para convidarem algum (uns) dos entrevistados para ir até a sala recitar os versos que lembra ou cantar alguma canção. criar um ambiente favoravel à recepção dos textos em versos Além de dar voz e socializar suas memó- rias de versos, a dos alunos e a dos convidados trazidos por eles, outra atividade que antecede a apresentação do acervo pode ser a de criar espaços interessantes para favorecer o trabalho na sala de aula, na biblioteca escolar, na sala de leitura entre outras possibilidades. É importante disponibilizar os livros em espaços com boa lu- minosidade, que chamem a atenção, e as crianças devem ter acesso livre às obras quando deseja- rem. Planeje um lugar confortável e acolhedor para a leitura. É possível fazer isso com poucos recursos e muita criatividade. Com almofadas e tapetes, por exemplo, o ambiente fica informal e acolhedor. Planeje espaços com cenários que deem vazão para o imaginário como um jardim de versos, uma floresta ou uma nave espacial. Algumas atividades podem acontecer no pátio, na quadra ou no palco da escola (anfiteatro) e até mesmo numa praça do bairro. O trabalho preparatório do ambiente pode incluir a colagem de cópias coloridas das capas dos livros do acervo pelas paredes da escola para criar expectativa em torno do acervo. Pelo título e pela ilustração da capa de cada obra, você pode fazer perguntas e oferecer pistas aos estudantes para estes inferirem a respeito do que acham que vai ser abordado num livro, com o intuito de instigar a leitura, a observação, a atenção e verificar se as hipóteses dos alunos se confirmam. Para ampliar o trabalho preparatório, esco- lha um poema de sua preferência e ensaie com cuidado sua leitura. A leitura de um poema feita pelo professor pode ser bastante instigante e provocar encantamento nas crianças, se for bem ensaiada e caprichada, feita com a entoação adequada, com expressividade e entusiasmo. Para isso, o professor precisa alimentar sua sensibili- dade, ampliar seu repertório de leitura de poe- mas, ousar a experimentação, vivenciar poemas de diferentes formas, temas e autores. Por fim, vale a pena criar espaços de encantamento, um ambiente propício para uma educação estética. 19 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l Para encantar, é preciso encantar-se Com efeito, antes de mostrar o acervo para os alunos, é preciso criar oportunidades para os professores e outros mediadores da esco- la conhecerem os livros por fora (capa, título, autores, orelhas, quarta capa, formato, textura etc.) e por dentro (conteúdo e forma). A equipe escolar precisa aproximar-se e envolver-se com os textos em verso do PNBE/2014, adentrar as páginas, criando uma familiaridade com os livros para utilizá-los de maneira inventiva e significativa tanto para os educandos quanto para os educadores. Esse belo acervo literário possibilita uma viagem poética para diversos lugares, épocas e para dentro do próprio “viajante”. Cada poeta tem seu estilo para expressar suas emoções e seus sentimentos, com ou sem rima, em versos curtos ou longos, e cada um tem um jeito diferente e especial de olhar paraas coisas e fazer o leitor se surpreender com os sentidos do texto. Ao lermos poemas, rimos, choramos, sonhamos, pensamos, compreendemos melhor o mundo e a nossa existência. Viajar no mundo imaginário da poesia viabiliza descobertas extraordinárias, sensações e pensamentos. Na poesia, o autor diz muito com poucas palavras. Alguns exemplos de poemas curtos, os haicais formados por três versos com 17 sílabas, podem ser encontrados em Antologia Ilustrada da poesia brasileira para crianças de qualquer idade. Em duas outras obras, os haicais aparecem com exclusividade: Jardim de menino poeta e Palavras são pássaros. Neste acervo do PNBE, há muitas vozes com diversos tons e modos de expressão das ideias e sentimentos – bem-humorado, român- tico, dramático, melancólico, brincalhão etc. Há poetas vivos e outros que já morreram, mas se tornaram inesquecíveis como Cecília Meireles, Manuel Bandeira, Mario Quintana e Sylvia Or- thof; há poetas de várias partes do Brasil, criando diferentes paisagens, pessoas, bichos e assuntos. Além dos poetas nacionais, também temos a presença de um ilustre estrangeiro: Robert Louis Stevenson, escritor escocês que figura nesse acervo com poemas selecionados e traduzidos da clássica obra de poesia infantil Jardim de versos de uma criança (1885). O acervo do PNBE 2014 apresenta ainda uma variedade de temas e formas, com uma diversidade de tendências e de vivências. Ao ler os livros, você verá que o trabalho de cada poeta é muito diferente mesmo que o tema seja semelhante. Observe que há uma multiplicidade enorme de poemas sobre bichos, temática que, segundo os especialistas (LAJOLO, ZILBER- MAN, 1987, p. 151-152; ZILBERMAN, 2005, p. 131-135), tem forte apelo sobre as crianças especialmente porque proporciona a simbo- lização dos infantes. Os bichos aparecem em Antologia ilustrada da poesia brasileira, Ou isto ou aquilo, Jardim de menino poeta, Lili inventa o mundo, Trinca-trova, 111 poemas para crianças, entre outros. Alguns desses livros tematizam os animais do princípio ao fim como é o caso de Bichos do lixo, Cobras e lagartos, Rindo escondido e O livro dos pássaros mágicos. Também temos bichos que falam e têm as qualidades e as fraquezas dos seres humanos em Três fábulas de Esopo, obra que reconta três narrativas curtas em verso com uma moral da história no final. Como vê, há muitas maneiras diferentes para abordar o mesmo tema; explique para os alunos que cada poeta tem um jeito de enxer- gar o mundo e de organizá-lo por meio das palavras. Experimente fazer comparações com os alunos entre essas várias formas encontradas pelos autores de dizer os bichos. Apresente dois ou mais poemas do acervo com temas semelhantes e peça uma apreciação oral dos alunos sobre as semelhanças e diferenças entre eles. Aproveite para mostrar como um autor relê o outro depois de muitos anos ou até mesmo séculos e em outro contexto. Paulo Garfunkel, por exemplo, reconta no Brasil do século XXI fábulas que foram criadas na Grécia do século VI a.C. com humor e atualidade. Trata-se de narrativas poéticas cujas histórias refletem sobre a natureza humana. 20 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l Outra bela narrativa contemporânea em verso que dialoga com a versão da tradição oral é o Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque. A história é uma releitura do conto clássico Cha- peuzinho Vermelho que inova ao brincar com as palavras e inverte a história original, mostrando o poder da palavra para eliminar o medo e a valorização da linguagem. Peça para os alunos compararem as personagens das duas histórias, verificando como Chapeuzinho Amarelo e o Lobo dialogam com a versão tradicional do con- to Chapeuzinho Vermelho, dos Irmãos Grimm. Temos outros poemas em forma de nar- rativas humorísticas, líricas ou dramáticas. Chá de sumiço são poemas curtos que jogam com as palavras, de forma lúdica, lírica e bem-humo- rada. Também temos os poemas que tematizam brincadeiras e que brincam com as próprias palavras, a exemplo de: Alfabeto escalafobético. Enfim, os livros têm diferentes cores, ta- manhos e formatos. Do mesmo modo, encon- tramos diferentes formas do ilustrador olhar o poema e diferentes técnicas: desenho, aquarela, origami, colagens em papel artesanal, gravura, computação gráfica, entre outros. Segue abaixo um quadro dos livros e seus respectivos autores e temas para você visualizar a riqueza do material que a escola recebeu no acervo do PNBE/2014. Quadro dos livros de poemas infantis e seus autores e temas do acervo pnBe/2014 Alfabeto escalafobético Claudio Fragata Brincadeiras com letras e palavras. A menina e o céu Leo Cunha Poemas sobre o céu: sol, estrelas, chuva, co- meta etc. Antologia ilustrada da poesia brasileira: para crianças de qualquer idade Adriana Calcanhotto (organização e ilustrações) Temas variados: relação do ser humano com a natureza, a saudade da infância perdida, a pureza, o trabalho, o desejo ou a sua falta etc. Bichos do lixo Ferreira Gullar Animais feitos com recortes coloridos de restos de papéis. Chá de sumiço e outros poemas assombrados André Ricardo Aguiar Minicontos e a crônica dos personagens de terror com suas aflições e dilemas cotidianos. Medos infantis. Chapeuzinho Amarelo Chico Buarque Medo do desconhecido, descoberta da ale- gria de viver, poder da palavra. Cobras e lagartos Wania Amarante Poemas sobre animais leves e pequenos, grandes e pesados, misteriosos etc. Jardim de menino poeta Maria Valéria Rezende Haicais inspirados na observação da natureza e em momentos do cotidiano. Jardim de versos Robert Louis Stevenson (seleção e tradução de Ligia Cademartori) O cotidiano, as brincadeiras e fantasias do universo infantil. Lili inventa o mundo Mario Quintana A reinvenção do mundo pelo olhar infantil: a rotina, as coisas simples, os pequenos acon- tecimentos, a natureza, as pessoas, os animais. Limeriques do bípede apaixonado Tatiana Belinky Aventuras de um menino apaixonado que se disfarça de bichos para atrair a atenção de sua amada. 21 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l Mula sem cabeça e outras histórias Sylvia Orthof Três narrativas em versos sobre folclore, identidade, aniversários, receitas. O livro dos pássaros mágicos Heloisa Prieto Histórias que envolvem aves – reais ou fan- tásticas – presentes em diferentes culturas. Os sinos Manuel Bandeira Anunciação/chamamento de momentos de alegria, sofrimento e morte. Ou isto ou aquilo Cecília Meireles O cotidiano marcado pela dúvida e pela dificuldade de decisão: as escolhas. Palavras são pássaros Angela Leite de Souza Haicais que apresentam obras de artistas re- nomados, tanto brasileiros quanto estrangei- ros, abordando várias manifestações da arte (pintura, cinema, música, teatro, dança etc.). Receitas da vó para salvar a vida Neide Barros O carinho das avós para seus netos. Rindo escondido João Proteti Bichos vivendo situações divertidas. Três fábulas de Esopo Paulo Garfunkel Três histórias com reflexões sobre a natureza humana. Trinca-trova Ciça Temas populares próximos do universo in- fantil: hora do almoço, avós, brincadeiras com as palavras, bichos de estimação, hora de dormir etc. 111 poemas para crianças Sérgio Capparelli Diversos assuntos do mundo infantil: coisas, animais, casa, cidade, identidade, nonsense, jogos e adivinhas, música de ouvido, poemas visuais, a natureza, os dias e as noites. todo dia é dia de poesia Para conhecer esse maravilhoso acervo, na sequência, vamos apresentar para você algumas sugestões de atividade mais gerais a partir de uma obra específica do acervo para instigar os alunos na leitura de todo o restante. Como você sabe, a poesia provoca o inusi- tado, o inesperado e o extraordinário, por isso precisa estar presente diariamente no ambiente escolar. Brinde o início e o final de cada dia com um verso, alimentandopor toda a vida a alma das crianças com poesia e criando oportunida- des para despertar o prazer da audição/leitura de poemas nos alunos. Assim como o pão nosso é alimento de cada dia, cabe a você, professor, oferecer “a poesia de cada dia” todos os dias. Dê também oportunidade para que o aluno possa compartilhar seus versos preferidos com os co- legas e o professor. Para tanto, propomos que os alunos dos pri- meiros anos do ensino fundamental convivam dia- riamente com os textos em verso, ouvindo/lendo poesias, declamando, musicando, dramatizando, en- fim, desenvolvendo inúmeras atividades relacionadas ao universo poético e às infinitas possibilidades da palavra durante o ano letivo e não apenas em um determinado momento. Além dos horários diários reservados à leitura compartilhada e à audição de poemas sem compromisso, procure reservar pelo menos uma hora de aula semanal para garantir que o espaço da poesia seja de fato efetivado em sua classe. Então, a partir de agora, vamos decretar que todo dia é dia de poesia? 22 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l Possibilidades de utilização dos textos em verso na escola Nas várias obras teóricas sobre como trabalhar poesia com crianças (ABRAMOVICH, 1991; AVERBUCK, 1988; BORDINI, 1986; PINHEI- RO, 2002; entre outras), há uma convergência no que diz respeito à criação de oportunidades para que o aluno seja motivado e sinta prazer em ouvir/ ler poemas por meio da voz do professor, da própria voz, da voz dos colegas de turma e, ainda, dos próprios poetas ou mesmo dos atores (é o caso de Paulo Autran) lendo poemas em CDs ou DVDs disponíveis no mercado ou na internet. Observe que é consenso entre os estudiosos que as diferentes abordagens do poema em sala de aula, sobretudo nas fases iniciais de ensino fundamental, consideram a leitura oral um de seus procedimentos básicos. o professor lê para os alunos Leia ou recite poemas sempre para seus alunos, todos os dias, porque, além do encantamento das palavras, pode levar as crianças à compreensão do sentido. Lembre-se que você é modelo para os alunos, portanto, precisa treinar antes para caprichar na leitura oral, cuidando da entonação, do ritmo e da pausa. É preciso contagiar os alunos para que eles tragam e leiam os poemas de que mais gostam. Nas recomendações de Fanny Abramovich (1991, p.95): Se a professora for ler um poema para a classe – que o conheça bem, que o tenha lido várias vezes antes, que o tenha sentido, percebido, saboreado. Para que passe a emoção verdadeira, o ritmo e a cadência pedidos, que sublinhe o importante, que faça pausas para que cada ouvinte possa cobrir – por si próprio – cada passagem, cada estrofe, cada mudança... leitura silenciosa Você precisa motivar e despertar o interesse de seus alunos para o exercício da leitura de poesia. Para isso, disponibilize o acervo dos textos em verso na sala de aula ou na biblioteca escolar, deixando os alunos à vontade para explorarem os livros e conhecê-los por meio de uma leitura silenciosa para somente mais adiante ousar recitá-la. Em seguida, faça co- mentários sobre o autor, a leitura e o poema; elabore perguntas, ouça os questionamentos, sugira uma nova leitura pelos alunos para, finalmente, pedir uma apresentação da poesia por todos, formando um grupo de vozes. leitura oral A leitura oral do poema com crianças menores sempre cumpre o importante papel de aproximá-las da materialidade do poema, possibili- tando que memorizem versos, percebam sons e ritmos, recriem situações, descubram imagens etc. (COELHO, 1987; CUNHA, 1976; PINHEIRO, 2002; entre outros). Por essas e outras razões, poesia pede voz, individual ou coletiva, em duplas, trios, quartetos etc. Tais vozes, por meio de diferentes 23 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l leituras e releituras orais, auxiliam os alunos a encontrarem o tom e o ritmo adequado do po- ema, além de contribuírem com a compreensão do poema e para a formação do gosto da poesia. Essa diversidade de modalidades de leitura é uma prática fundamental para conhecer o acervo do PNBE/2014, de maneira lúdica, livre e envolvente, podendo ser acompanhada de anotações dos poemas favoritos para posterior- mente cada aluno fazer sua antologia poética com os poemas mais apreciados por cada um. caça aos poemas: antologia poética Vamos propor um projeto para os anos ini- ciais do Ensino Fundamental conhecerem todo o acervo de textos em verso do PNBE 2014. Inspirado na obra Antologia ilustrada da poesia brasileira mobilize os alunos para conhecerem os livros do acervo de fora para dentro e de dentro para fora. A organizadora dessa obra, Adriana Calcanhotto, selecionou e ilustrou poemas curtos de 41 escritores brasileiros de diferentes períodos – do século XIX ao XXI: de Gonçalves Dias a Gregório Duviver, com desenhos feitos com lápis e aquarela. Na quarta capa do livro, o professor de poesia Eduardo Coelho apresenta essa antologia com ênfase na variedade de formas poéticas (e de temas) para ampliar a educação estética (e sentimental) de crianças de qualquer idade: “[...] metrificada e rimada; em versos livres, com linguagem mais prosaica, textos sintéticos e visuais, típicos da poesia concreta ou, nos casos dos haicais, em diálogo com a poesia japonesa”. Esta antologia foi escolhida como nosso modelo exemplar por ser uma amostra muito rica do que podemos encontrar na poesia brasi- leira. Apesar de toda essa diversidade numa única obra, o acervo do PNBE oferece mais, muito mais... E essa riqueza precisa ser descoberta pelas crianças. Desse modo, a proposta é fazer uma espécie de “caça ao tesouro”, ou melhor, “caça aos poemas”. Com esse espírito de aventura, os alunos vão ler livremente todos os livros do acervo, ao longo do ano, para garimparem seus poemas preferi- dos. Mas isso requer muitas leituras, indi- viduais e silenciosas, orais e comparti- lhadas. É preciso se aproximar dos versos e criar alguma inti- midade com eles. Em nosso mo- delo, a “antologiazi- nha íntima”, como chama Adriana Calcanhotto, os critérios para selecionar os poemas vieram da intimidade estabelecida entre textos e autora, ou seja, de como ela conseguiu “enxergar” a primei- ra imagem trazida pelos poemas e rabiscá-los. O critério de seleção pode ser o mesmo da cantora/ poeta ou você pode criar outros critérios para cada aluno produzir sua antologia pessoal. Você pode, por exemplo, combinar de cada aluno escolher um ou dois poemas de cada autor por obra para copiar e ilustrar na elaboração da antologia pessoal. Peça para eles escolherem apenas os poemas que falaram mais fundo no coração, que emocionaram pela beleza, que cau- saram sensações. Para tanto, é necessário realizar muitas leituras e conversas sobre os poemas, uma aproximação efetiva e afetiva com os textos lidos, criando espaços de vivência de interação. A seguir, sugerimos uma série de atividades possíveis de serem realizadas: 1. Leitura feita pelo professor; 2. Leitura silenciosa individual feita pelos alunos; 3. Leitura em voz alta, individual, feita pelos alunos; 4. Leitura em pares; 5. Leitura em coro; 6. Jograis; 7. Leitura rítmica para explorar o aspecto rítmico do poema; 8. Leitura de poemas visuais; 9. Leitura musicalizada do poema, uti- lizando melodias de cantiga de roda, canções folclóricas etc.; 24 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l 10. Audição de poemas que estão musica- dos ou declamados; 11. Criação de ritmos com a batida de ins- trumentos ou do próprio corpo; 12. Montagem teatral com poesia ou perfor- mances poéticas: trabalho de voz, gestos, expressão corporal, caracterização da personagem do poema; 13. Releitura dos alunos com comentários e discussões. Como vemos, são muitas e diversas as opções de leitura de poemas na escola. Depois de tra- balhar essasatividades de apreciação e de leitura, de fruição e curtição, é chegado o momento de releitura para aprofundar um pouco mais o conhecimento do aluno, privilegiando conversas sobre o texto, a respeito dos sentidos do poema, para posteriormente registrar no Memorial o que foi apreendido. Pergunte aos alunos sobre o que fala o poema que foi lido e escreva suas respostas no quadro, observando que os leitores podem interpretar um mesmo poema de forma diferente, porém a multiplicidade de interpretações precisa ser coerente com o texto. Relacione os senti- mentos expressos pelo poeta com as experiências e os sentimentos dos alunos. Também instigue seus alunos a identificarem os elementos que compõem o poema, ou seja, a forma e os recur- sos poéticos utilizados nos versos, acionando os conhecimentos prévios e trocando opiniões para reconhecerem as características da organização do poema. Quando for necessário, faça esclare- cimentos sobre o gênero, o tema e o vocabulário utilizados, assim como busque informações a respeito do autor e da sua obra em outras fontes. Poesia na internet Para saber mais sobre cada autor e sua obra, você pode aproveitar o interesse das crianças no mundo digital e propor uma pesquisa na rede mundial de computadores. Trata-se de uma ati- vidade que, além de ampliar o conhecimento e familiarizar a criança com o gênero e os autores, possibilitará ao educando perceber que a literatura circula em outros tipos de suportes textuais. Há muitos endereços eletrônicos sobre poesia na in- ternet que reúnem poetas, obras e informações, mas para esta atividade sugerimos que os alunos comecem a pesquisar os sítios dos próprios es- critores contemporâneos presentes nesse acervo como, por exemplo, Adriana Calcanhotto, Claudio Fragata, Chico Buarque, Leo Cunha entre outros: • Adriana Calcanhotto http://www.adrianacalcanhotto.com • Claudio Fragata http://www.quintaldoclaudio.com.br • Chico Buarque http://www.chicobuarque.com.br • Leo Cunha http://www.leocunha.jex.com.br Nos sítios de cada escritor(a) podemos en- contrar muitas informações para enriquecer o trabalho em sala de aula, tais como a biografia, fotos, todos os livros, poemas animados, galeria, notícias, prêmios, fortuna crítica, entrevista, can- ções etc. Verifique se os poetas vivos que fazem parte do acervo têm blog, facebook ou twitter. Então, vamos navegar no oceano virtual da poesia? Nessa navegação, também podemos ouvir poemas que compõem a obra Ou isto ou aquilo, de Cecília Meireles, declamados pelo ator Paulo Autran – disponível em http://www.youtube. com/watch?v=wEh8MmYnFGY. Entre outras opções, essa mesma obra de Cecília Meireles é musicada por Luís Pedro Fonseca em 1978, para a peça de teatro ho- mônima, e gravada por Lena d’ Água em 1992, cujo acesso está disponível em http://www. youtube.com/playlist?list=PL3E090FB52BA- 54FB9 e ainda no endereço eletrônico: http:// aguaparacriancas.blogspot.com.br. Antes da audição, explique para os alunos que as canções que serão ouvidas foram cria- das primeiro como poemas para serem lidos e somente depois é que foram musicados. É o caso igualmente do clássico da música infantil A arca de Noé, de Vinicius de Moraes, cujo poema 25 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l “A casa”, que integra a Antologia ilustrada da poesia brasileira, foi gravado por um grande in- térprete e pode ser acessado em http://www. youtube.com/watch?v=A_Ad_BkOml8. Além da musicalização dos poemas, po- demos fazer muitas outras boas descobertas na internet de atividades realizadas com os textos em verso que compõem o acervo do PNBE/2014 – por exemplo, a história de Cha- peuzinho Amarelo, de Chico Buarque, contada por Carol Levy em http://www.youtube.com/ watch?v=Wvy560Pqz0c. Ao realizar buscas de vídeos infantis na rede referentes a esta narrativa poética, encontramos ainda recitais, coros, peças teatrais, entre outras manifestações artísticas, concretizadas por alunos. imagens visuais Após o importante trabalho de voz com os alunos, chamando a atenção para a música das palavras (sonoridade e ritmo), é preciso mostrar que um poema não é somente som, mas as pa- lavras também sugerem imagens na mente do leitor. Para Cademartori (2009, p.106), os re- cursos da poesia são inúmeros, porém há textos em que as imagens sugestivas se impõem sobre as ideias: “Há a poesia em que predominam as intenções plásticas, com a disposição de dar a ver as coisas concretas ao nosso redor.” Não se esqueça de que a visualidade foi o critério de seleção dos poemas utilizado por Adriana Cal- canhotto para organizar sua Antologia, ou seja, sua escolha foi pautada na imagem trazida pelos poemas quando ela os lia. Com essa inspiração, depois da leitura oral do poema, proponha para as crianças fazerem ilustrações, ou seja, cada um interpreta o poema escolhido por meio de um desenho, desenvolven- do sua capacidade de expressão. Não é necessário a escola dispor de recursos materiais, apenas lápis e papel. Os alunos entram com o entusiasmo e a criatividade, orientados para o fato de que a ima- gem a ser elaborada precisa dialogar com o tex- to, ampliando seus significados. Convide-os para sentir a emoção da palavra traduzida na imagem, com a orientação de que é preciso ler e reler bem o poema para “enxergar” seu texto visual. Destacamos que esse é um momento pro- pício para você, professor, valorizar o trabalho do ilustrador com o devido crédito, mostrando que este artista também é considerado coautor da obra, por isso seu nome e sua biografia estão presentes nos livros. Essa atividade pode ser feita em parceria com a disciplina de Artes para, a partir do próprio acervo de textos em verso, oferecer subsídios acerca dos tipos de materiais e das possibilidades de téc- nicas a serem utilizadas (origami, recortes de papel, aquarela etc.). Além disso, aproveite para chamar a atenção sobre a importância do projeto gráfico na elaboração do livro infantil: qualidade do papel, diagramação, capa, quarta capa, tipo de letra etc. Na sequência, cada aluno apresenta seu de- senho para os colegas da classe e conversa sobre sua interpretação. Aos poucos, os alunos vão ad- quirindo proximidade com os seus poetas favo- ritos. Finalizada essa atividade, o poema copiado junto com o desenho na folha de cada um pode ser exposto em um mural (confeccionado pelos alunos, se for o caso) na sala de aula, na biblioteca ou nos corredores da escola durante o período de uma semana ou de um mês. Após esse perío- do de exposição, os trabalhos são retirados com cuidado e guardados para serem encadernados como antologias poéticas no final do ano letivo. sarau poético Em festa de final do ano letivo, organize um sarau para que os estudantes leiam, recitem, can- tem e/ou dramatizem seus poemas preferidos para a comunidade escolar. A declamação pode ser feita junto com a exposição das antologias poéticas organizadas e ilustradas por cada aluno ao longo do ano escolar para divulgar e com- partilhar o trabalho realizado com a apreciação dos familiares e da comunidade escolar. Explique-lhes que sarau é uma reunião fes- tiva entre amigos, uma prática social em que as pessoas se reúnem para apreciarem manifestações artísticas, nesse caso para apresentação/audição de poesia e interação com o público ouvinte. 26 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l Se possível, procure envolver toda escola nesse evento e até mesmo decorar o lugar para esse acontecimento de encerramento. Cada tur- ma da escola participa do sarau para fazer alguma atividade que mostre às pessoas da comunida- de o quanto o poema escolhido é importante. Sugerimos que cada aluno selecione e leia dois poemas que mais tenha gostado. A leitura pode ser individual, em dupla ou em grupo. Deixe-os à vontade para tomar a decisão, encaminhando as atividades preparatórias dosarau de maneira participativa, prazerosa, lúdica e criativa. Como atividade complementar, com a ajuda de outros professores, construa com os alunos o convite para o público ouvinte e a arte dos car- tazes para divulgação, depois peça para eles se en- carregarem da distribuição. O mais importante, no entanto, é ensaiar a exibição dos poemas com os alunos, atentando para a exploração dos re- cursos da oralidade: a entonação de voz, o ritmo, a fluência e a dicção. Ao lado disso, oriente-os para valorizarem os sentimentos que o texto faz emergir a fim de partilharem conhecimentos e se deliciarem com a nutrição dos poemas. Cui- de de tudo procurando envolvê-los em todo o processo de planejamento e execução do sarau. Não se esqueça de que o êxito dessa propos- ta depende, sobretudo, do seu entusiasmo e de sua condução, afinal de contas você, professor, é o modelo a ser seguido. Finalize este projeto deixando uma marca positiva e inesquecível na história de leitura em versos de cada aluno e da comunidade em que a escola está inserida. Caro professor, essa história não termina aqui, ano que vem tem mais, como uma história sem fim... considerações finais de um começo de conversa Como últimas palavras, queremos enfati- zar que o gênero escolhido pode possibilitar às crianças vivências de contato aprofundado primeiramente consigo mesmas e posterior- mente com o mundo ao seu redor, porque se- rão revividas memórias da mais tenra infância, com textos que exploram o ritmo, a melodia, o lúdico, entre muitos outros recursos. No de- correr deste trabalho, pretendemos ampliar essa vivência/esse repertório ofertando textos em versos de alta qualidade de maneira lúdica e atrativa, procurando desenvolver a familiaridade da criança com a linguagem poética, a percep- ção de si, do outro e da realidade, bem como o enriquecimento da sensibilidade. Depois de todas essas atividades, os alunos geralmente se sentem motivados para se aventu- rarem na escrita ou reescrita de poemas. Nesta proposta não trabalhamos com a produção es- crita de poemas como objetivo, mas como um trabalho subsequente porque acreditamos que antes de os estudantes escreverem seus próprios poemas precisam ser imersos no universo da poesia. Eles precisam de bons modelos para se influenciar e emocionar, deixar seus sentimen- tos aflorarem e, enfim, se encantar. Feita essa aproximação afetiva das crianças com os textos em verso, de maneira gradual e efetiva ao longo do ano, cumpriremos nosso objetivo principal porque, por meio da educação do ser poético na escola, conseguiremos formar leitores sensíveis e pessoas melhores para o exercício poético da escrita e da vida. Desejamos a você um excelente trabalho com o acervo do PNBE 2014! referências bibliográficas ABRAMOVICH, Fanny. Literatura infantil: gos- tosuras e bobices. 2.ed. São Paulo: Scipione, 1991. AVERBUCK, Lígia Marrone. A poesia e a es- cola. In: ZILBERMAN, Regina (org.). 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MEIRELES, Cecília. Problemas da literatura infan- til. 3.ed. São Paulo: Summus; Brasília: INL, 1979. 28 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l pArA ForMAr Leitores Bons de prosA João Luís Ceccantini1 Thiago Alves Valente2 Das categorias de obras literárias que compõem os acervos do PNBE, a prosa é uma das mais ricas e possui enorme apelo para despertar nos estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental a paixão pela leitura e pela literatura. A prosa literária (que se opõe ao texto em verso e à poesia) desdobra-se em diversos gêneros textuais narrativos tais como o romance, a novela, o conto, o mito, a fábula, a lenda, entre tantos outros. Permite ao professor uma abordagem dinâmica, criativa e das mais produtivas para desenvolver nos alunos não apenas competências de leitura e de escrita, mas para propiciar a eles uma experiência de formação, no mais amplo sentido da palavra. A leitura de boas obras literárias de prosa de ficção estimulao intelecto dos estudantes, desenvolve sua imaginação, auxilia na elaboração de suas emoções, contribui para a construção de sua identi- dade e de seu amadurecimento cognitivo e ético, além, naturalmente, de desenvolver sua capacidade linguística. Isso, para dizer o mínimo. Por outro lado, esse infinito potencial que as narrativas infantojuvenis têm a oferecer aos alunos pode ser subaproveitado ou mesmo desperdiçado se, no momento de sua exploração na sala de aula, o mediador (professor ou profissional da biblioteca) conferir às obras literárias disponíveis um tratamento excessivamente escolarizado, pragmático, utilitário, ou, num outro modo de dizer, “tarefeiro”. Para que os acervos cumpram de fato seu papel e as obras possam ser fruídas na sua inteireza, é necessário que o mediador deixe de lado práticas cristalizadas no cotidiano escolar e, por vezes, internalizadas no trabalho diário com o livro didático, do qual, naturalmente, se reconhece a importância, mas cuja natureza implica metodologia de trabalho bastante diferente da exigida pela obra literária. 1 Doutor em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e professor assistente da UNESP. 2 Doutor em Letras pela UNESP-Assis e professor da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP-Cornélio Procópio). 29 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l A literatura, para ser fruída como objeto estético pleno, capaz de deixar marcas profundas nos leitores, pede uma condução mais aberta. Não pode ser aniquilada, por exemplo, por um amontoado de tarefas escolares preocupadas apenas em “controlar” se uma determinada lei- tura foi realizada. Sob a pesada coerção de fichas, questionários, provas e similares não há história que resista, não há linguagem que sensibilize, não há enredo que envolva e faça sonhar. Inúmeras pesquisas vêm demonstrando, já há décadas, que os projetos de formação de leitores que alcançam efetivo sucesso nos seus propósitos são, em sua grande maioria, aqueles que não he- sitam em dar um peso substantivo à ideia do “ler por ler”. Ou seja, mais do que atividades tecni- cistas ou mirabolantes realizadas a partir de uma dada leitura, a ênfase do processo é direcionada à leitura em si mesma de uma obra literária de boa qualidade e à conversa sistemática sobre o livro lido, realizada pelo professor com seus alunos e/ ou entre os próprios alunos. O que não significa que não se possa ou não se deva propor atividades a partir da leitura de uma obra literária; estas po- dem e devem ser realizadas, mas, com delicadeza, para não relegar o texto em si a segundo plano, adotando-se, sobretudo, uma perspectiva tanto afinada com a busca contínua da construção de sentidos para a obra lida quanto empenhada em valorizar as dimensões afetivas e lúdicas próprias da leitura literária, que geralmente envolvem a ação de compartilhar com outros sujeitos a leitura realizada. É preciso, de uma vez por todas, varrer para longe a “culpa” de dedicar um grande núme- ro de aulas à leitura de obras literárias para e com os alunos e à conversa alongada sobre as obras lidas. Trata-se de atividade lúdica e de trabalho sério. Há que se reconhecer, decisivamente, o papel inestimável que essa atividade pode desempenhar na formação dos estudantes. A meta a ser alcançada com a leitura do texto literário, por mais fugidia que pareça, tem de evitar arbitrariedades e artificialismos, para buscar responder a uma necessidade interior e legítima do sujeito leitor – ainda que ele a desconheça. E a pessoa mais indicada para de- sencadear esse processo é o mediador experien- te, que está familiarizado com o horizonte de seus leitores, domina os livros à sua disposição, escolhe os mais adequados ao perfil de seus potenciais leitores e se empenha em despertar o desejo para que conheçam tais obras. Para isso, esse mediador sempre as disponibiliza aos alunos (porque, diariamente, leva as obras à sala de aula ou conduz os estudantes à biblioteca); discorre sobre os temas abordados pelas his- tórias; chama a atenção para as ilustrações das obras; cria possibilidades de escolha das obras que serão lidas; apresenta autores e ilustradores, contando sobre seus “feitos e proezas”; apresenta aos estudantes fragmentos das obras nos quais a linguagem se revela bonita, surpreendente, brincalhona, musical, provocadora... É preciso aceitar a concepção do “ler por ler” como um desafio pedagógico, apostando que a boa literatura possui qualidades suficientes para cumprir uma função importante, rica e complexa, se encontrar condições propícias para sua circu- lação, fundadas no esforço contínuo de construir sentidos para as narrativas lidas. No contexto esco- lar, isso significa apostar nas qualidades já evocadas do bom texto literário e, acima de tudo, abrir espaço permanente para que os leitores tenham voz; instigá-los a comentar, sem censura, a obra lida; estimulá-los a comparar uma dada obra com tantas outras e com a realidade à sua volta; levá-los a compartilhar, de diferentes maneiras e com o maior número possível de leitores, os sentidos que propõem para uma obra lida. E cabe ao mediador auxiliar na expansão desses sentidos pelo conhe- cimento privilegiado que pode ter da natureza da literatura, de um modo geral, e do gênero narrativo, em particular, cujas características são comentadas de forma breve a seguir. a narrativa literária A narrativa é uma das formas mais comuns do emprego da linguagem verbal no dia a dia, se não a predominante. Isso porque contar algo que se passou com alguém (ou com alguma coisa) 30 Ca te go ri a 3 . An o s In IC IA Is d o E n sI n o F un d Am En tA l é uma ação desempenhada a todo momento nas mais diversas situações. E para essas situações são desenvolvidos diferentes modos de narrar, ou seja, para dizer o que se deseja ou se precisa dizer recorre-se a determi- nados elementos dispostos ou empregados de determinadas formas. Isso também se faz presente nos textos históricos, jornalísticos e literários. Aqui trataremos especificamente de narrativas literárias com o objetivo de atender à dimensão formadora de crianças leitoras no espaço escolar. Um aspecto básico que o mediador deve levar em conta após uma pri- meira fruição subjetiva da obra é o de que uma narrativa literária se configura por dois níveis essenciais e complementares: aquele nível que diz respeito aos acontecimentos narrados (o que é narrado?) – a história; e o nível que se refere ao modo pelo qual esses acontecimentos são narrados (como se nar- ra?) – a narração3. Assimilar profundamente a ideia dessas duas dimensões que configuram a narrativa confere um olhar muito mais apurado e sensível para a prosa de ficção, pois assim ficamos atentos não apenas aos fatos presentes numa narrativa, mas também à ordem em que se fazem presentes, às relações que mantêm entre si, ao ritmo com que são contados, ao modo como os seres ou coisas envolvidas com esses fatos são apresentados, à voz que conta a história, ao ponto de vista que essa voz assume para contá-la; à linguagem empregada na obra, seja pela voz do narrador, seja pela das personagens etc. Numa das acepções mais elementares do que seja uma narrativa, cos- tuma-se afirmar que ela se constitui pela associação de uma personagem a uma ação principal. A essa acepção, conforme o teórico consultado, se acrescentam muitas outras dimensões, o que, contudo, não invalida essa formulação básica. De modo geral, em uma narrativa encontramos um sujeito que narra (pode ser um narrador fora da história ou nela inserido na condição de personagem principal ou secundário) e o objeto de seu relato; e uma ou mais personagens que realizam ou sofrem ações em um tempo e um espaço, explicitados ou não, conforme as intenções do narrador. Sobre o narrador, é sempre imperativo enfatizar que jamais deve ser confundido com o escritor, ser de carne e osso
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