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Página 1 de 58 EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE RESENDE/RJ (competência fazendária) “Que vai fazer agora o governo? Vai demitir o administrador da Casa de Detenção? Daqui a pouco será obrigado a demitir o cidadão que o substituir, e as coisas continuarão no mesmo pé – porque a causa dos abusos não reside na incapacidade de um funcionário, mas num vício essencial do sistema, num defeito orgânico do aparelho penitenciário. E não há de ser a demissão de um administrador que há de consertar o que já nasceu torto e quebrado” (Olavo Bilac) A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, através do Núcleo do Sistema Penitenciário - NUSPEN (Avenida Rio Branco nº 147, 12º andar, Centro, Rio de Janeiro/RJ; tel: 2332-6663; fax: 2332-6666; email: coordenacao.nuspen@gmail.com), do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos - NUDEDH (Rua México nº 58, 11º andar, sala 1501, Centro, Rio de Janeiro/RJ; tel: 2332-6344/6355/6356; email: nudeh@gmail.com), e da Coordenação de Defesa Criminal, com espeque no art. 128, inciso VII, da Lei Complementar nº 80/94, art. 81-A e 81-B, inciso VI, da Lei de Execução Penal, art. 12 Lei nº 7347/85 e art. 303 do Código de Processo Civil, ajuíza AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO, pessoa jurídica de direito público, com representação legal situada na Rua do Carmo nº 27, Centro, Rio de Janeiro/RJ, aduzindo para tanto o seguinte: LEONARDO ROSA MELO DA CUNHA:03808863757 Assinado em 26/09/2016 10:21:21 mailto:coordenacao.nuspen@gmail.com mailto:nudeh@gmail.com Página 2 de 58 1. i) Introdução. UP de Resende. Defensoria Pública. Inspeção Preventiva. 2. Como é notório, o Estado do Rio de Janeiro – ora posto no polo passivo da demanda – edificou, no perímetro territorial da municipalidade de Resende, um novo estabelecimento penal, agregando mais um local de privação de liberdade destinado à retenção carcerária de pessoas ao seu parque prisional. A unidade - ainda não inaugurada pelo poder público - localiza-se na Avenida Egídio Fontanez, com acesso pela Estrada Bulhões Resende s/nº, Bulhões. Até o presente, o estabelecimento não foi oficialmente contemplado com designativo próprio, motivo pelo qual será, no bojo contextual desta peça isagógica, nominado como “UP de Resende”. 3. O Núcleo do Sistema Penitenciário (NUSPEN) e o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (NUDEDH) da Defensoria Pública, no desempenho das funções institucionais hospedadas no art. 4º, inciso XVII, da LC nº 80/94, e art. 81-B, inciso V, da LEP, realizaram inspeção na UP de Resende no dia 07.06.16. A visita da equipe da Defensoria Pública – que contou com assessoramento técnico do Departamento de Engenharia Legal da instituição e com o concurso participativo de membros do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (MEPCT) - foi acompanhada e guiada pelo ISAP Demetrio Pereira Júnior, já alçado ao cargo de Diretor1 da unidade prisional, além de outros 02 ISAP´s, os quais, de forma solícita, prestaram todas as informações postuladas pelo staff das instituições fiscalizadoras. 4. As vistorias levadas a cabo por diversos órgãos e instituições afetas à questão penitenciária – incluindo a própria Defensoria Pública – normalmente ocorrem em estabelecimentos penais já povoados por 1 Extraoficialmente, à Defensoria Pública informou-se que houve troca superveniente de Diretor da unidade. Página 3 de 58 pessoas privadas de liberdade. Estas fiscalizações, exatamente porque miram unidades que já abrigam detentos em suas dependências, ostentam natureza nitidamente repressiva, vale dizer, os órgãos escrutinadores das condições de habitabilidade e do funcionamento do cárcere atuam precipuamente com o objetivo de sanar e estancar as inúmeras ilegalidades e irregularidades já instaladas nos estabelecimentos. 5. O “estado de coisas inconstitucional” que negativamente singulariza o sistema penitenciário brasileiro – tal como recentemente o Supremo Tribunal Federal o predicalizou no contexto da ADPF nº 347 – constitui uma situação fática lamentavelmente já consolidada e cuja remoção esbarra em uma gama infindável de barreiras e obstáculos. Sequer a atuação interventiva-repressiva do Poder Judiciário decorrente de postulações judiciais movidas pelos órgãos de fiscalização tem se mostrado eficaz e capaz de amenizar e/ou erradicar as terríveis e assombrosas agruras a que são coativamente submissas as pessoas privadas de liberdade que habitam os medievalescos estabelecimentos ergastulares país afora. 6. Bem por estas particulares razões, o NUSPEN e o NUDEDH da Defensoria Pública decidiram alterar radicalmente o eixo inspecionário comumente empregado: ao revés de postergar a missão fiscalizatória da instituição em relação à UP de Resende para o futuro, quando o estabelecimento já estará em pleno funcionamento e provavelmente densamente habitado de detentos, os órgãos optaram por antecipar temporalmente a atuação e realizar fiscalização prévia à inauguração da unidade, de cariz preventiva, com o intuito de prevenir e evitar que o “estado de coisas inconstitucional” também se consolide no referido estabelecimento carcerário. Página 4 de 58 7. Assim, como enunciado, o NUSPEN e o NUDEDH compareceram à UP de Resende no dia 07.06.16 e procederam à vistoria da unidade. Fruto da inspeção preventiva ao estabelecimento, o NUDEDH confeccionou relatório circunstanciado (doc. anexo) sobre a visita, apontando alguns problemas já existentes na UP de Resende que, caso persistam e não sejam remediados pelo poder público, certamente constituirão fatores de degradação qualitativa das condições de habitabilidade carcerária idôneos a afetar não somente as pessoas privadas de liberdade, mas também os servidores públicos que lá exercerão suas funções. 8. A Defensoria Pública não pretende, no bojo desta demanda, por sob escrutínio judicial todos os pontos realçados no citado relatório. Porém, há 02 questões particularmente caras e inerentes à qualidade do encarceramento da pessoa privada de liberdade e ao regular funcionamento do próprio estabelecimento que merecem (rectius: impõem) a performance profilática da instituição em caráter precedente ao início das atividades prisionais da UP de Resende, a saber: 1) a real capacidade ocupacional da nova unidade; 2) a probabilidade concreta e real de sobrelotação populacional do estabelecimento. 09. Tendo em vista a independência subjetiva destes específicos pontos – embora ambos contendam diretamente com direitos de pessoas postas coativamente sob a retenção carcerária do Estado – a petição divide-se tematicamente em 02 capítulos estanques e objetivamente compartimentados conforme àquelas 02 matérias. Página 5 de 58 1º Capítulo Capacidade Legal vs. Capacidade Nominal Minimum Living Space 1,17 m2 per capta 10. Geneticamente, a UP de Resende foi idealizada para funcionar como estabelecimento penal destinado ao abrigo de presos provisórios. O art. 4º, inciso I, do Decreto 44.130, de 20.03.13, emanado do Chefe do Poder Executivo Estadual, criou “06 (seis) Cadeias Públicas a serem instaladas nos municípios de São Gonçalo, Magé, Rio Claro, Resende, Região dos Lagos e de Carmo”, evidenciado a orientação finalística-penalógica da nova unidade prisional. 11. No entanto, conforme consta do relatório circunstanciado do NUDEDH e também do relatório do MEPCT (doc. anexo), o ISAP Demetrio relatou que o perfil do contingente prisional da UP de Resende será de condenados a cumprir a pena privativa de liberdade em regime fechado que não “pertençam” a facções ou grupos criminosos e que sejamoriundos de localidades ou regiões adjacentes à municipalidade de Resende. Todos os detentos serão do sexo masculino, embora inicialmente tenha se cogitado alocar mulheres no anexo menor do complexo (§ 14, infra). 12. Seja como for, a UP de Resende ostenta características estruturais e carcerárias que a perfilham a apenas 02 tipos de estabelecimento prisional legalmente previstos. Dentre o catálogo de classificação tipológica da LEP, exclui-se prontamente a sua categorização taxionômica das seguintes espécies de unidades: Página 6 de 58 - Colônia agrícola/industrial/similar (art. 91 e 92 da LEP): sua concepção arquitetônica escapa totalmente de algo minimamente semelhante a uma colônia agrícola ou industrial; sequer uma qualquer manipulação semântica da cláusula analógica-extensiva “similar” é apta a aproximá-lo à essência funcional daquelas espécies de unidades; - Casa do Albergado (art. 93, 94 e 95 da LEP): a localização distante do centro urbano e a proliferação de inúmeros obstáculos físicos contra fuga tornam o estabelecimento totalmente inadequado do regime aberto e à pena restritiva de direito de limitação de fim de semana, descaracterizando-o como uma casa do albergado; - Centro de Observação (art. 96, 97 e 98): a toda evidência, a UP de Resende não se presta a servir de local exclusivo para realização de exames; - Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (art. 99, 100 e 101 da LEP): a unidade não se destina à execução de medidas de segurança detentiva e de tratamento ambulatorial, e suas linhas arquitetônicas em nada se assemelham a um hospital. 13. Logo, a UP de Resende apresenta perfil carcerário compatível tão somente com 02 espécies de estabelecimentos: penitenciária (art. 87 a 90 da LEP) e cadeia pública (art. 102 a 104 da LEP). Assim, a unidade pode ser funcionalizada para o recolhimento de pessoas criminalmente condenadas ao regime fechado ou para a custódia cautelar de acusados, tal como inicialmente concepcionou o respectivo ato normativo de sua criação2. 2 Inexiste qualquer impedimento para que a UP de Resende funcione como uma penitenciária. Não é incomum que o poder público, tendo em conta a volatilidade do sistema penitenciário, altere o perfil carcerário de um dado estabelecimento. A título exemplificativo, a Casa do Albergado Coronel PM Francisco Spargoli Rocha foi transformada em Instituto Penal Francisco Spargoli Rocha pelo Decreto nº 44458, de 01.11.13 (segundo o art. 92, inciso II, do Decreto nº 8897/86, “instituto penal” é o estabelecimento, ao lado das colônias agrícola e industrial, para Página 7 de 58 14. Estruturalmente, a UP de Resende foi originalmente concebida para operacionalizar simultaneamente 02 estabelecimentos distintos e funcionalmente autonomizados. Topograficamente inseridos no mesmo perímetro carcerário, estes 02 compartimentos prisionais – dorovante denominados Módulo 01 e Módulo 02 para fins didáticos expositivos – constituem reprodução fiel um do outro, diferenciando-se entre si tão somente pela espacialidade: o Módulo 01 é dimensionalmente maior do que o Módulo 02, ostentando o dobro da capacidade ocupacional: UP de Resende Galerias Celas por Galeria Beliches por Cela Detentos por Cela Capacidade do Módulo Módulo 01 04 12 03 06 288 Módulo 02 02 12 03 06 144 15. A simples operação matemática de adição da quantidade de vagas disponíveis nos Módulos 01 e 02 – 288 e 144, respectivamente – estampa, a priori, a capacidade ocupacional máxima suportada pela UP de Resende: 432 detentos. 16. Porém, conforme demonstrar-se-á, há uma abissal discrepância entre a capacidade nominal (o ser) e a capacidade legal (o dever ser) do estabelecimento. 17. Recepcionada com manifestações apologéticas, a Lei de Execução Penal, no longínquo ano de 1984, colmatou um incômodo hiato legal na temática de Direito de Execução Penal até então existente. Primeiro ato normativo unicamente vocacionado à matéria execucional-penal, a LEP o regime semiaberto), e, posteriormente, convolado para Penitenciária Coronel PM Francisco Spargoli Rocha, “passando a abrigar presos em regime fechado” (art. 5º do Decreto nº 45345, de 18.08.15). Página 8 de 58 estipulou importantes diretrizes referenciadas ao tema, sem, no entanto, aventurar-se em um ponto crucial: a prévia definição da capacidade dos estabelecimentos penais, relegando esta tarefa ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP - (art. 85, parágrafo único). 18. O CNPCP – relevante órgão da execução penal previsto no art. 61, inciso I, da LEP – desincumbiu-se daquela determinação legal por meio da edição da Resolução nº 03, de 23.09.05, através da qual fixa, de forma genérica, as capacidades mínima e máxima que cada espécie de estabelecimento há-de respeitar. Pertinente aos 02 tipos de estabelecimentos penais afinados às características da UP de Resende, tem-se o seguinte: - penitenciária de segurança máxima especial: capacidade máxima de 300, e mínima de 60; - penitenciária de segurança média ou máxima: capacidade máxima de 800, e mínima de 300; - cadeia pública: capacidade máxima de 800, e mínima de 30. 19. A UP de Resende, globalmente perspectivada ou considerando-se os Módulos 01 e 02 isoladamente destacados, alinha-se idealmente aos parâmetros numéricos concernentes aos quantitativos mínimo e máximo no que pertine à capacidade de penitenciárias e cadeias públicas estipulados na norma de regência formatada pelo CNPCP. 20. No entanto, ainda que respeite as capacidades máxima e mínima estipuladas pela Resolução nº 03/05 do CNPCP, a UP de Resende não detém, legalmente, capacidade para custodiar mais do que 144 Página 9 de 58 detentos em simultaneidade temporal – 96 no Módulo 01, e 48 no Módulo 02. Em boa verdade, a sua capacidade legal corresponde a 1/3 de sua capacidade nominal. 21. A redução quantitativa ora explicitada decorre da estrita observância do minimum living space. Explica-se. 22. Embora não tenha se atrevido a quantificar a capacidade dos estabelecimentos penais, a LEP optou pela rígida normatização do dimensionamento geométrico do local de vivência da pessoa privada de liberdade no interior de unidades prisionais. Assim, a lei de regência fixou o tamanho mínimo legalmente admissível do habitáculo em que o condenado deverá resgatar a pena de prisão ou deverá permanecer o preso provisório no curso da constrição cautelar. 23. Tratando-se de penitenciária – estabelecimento penal finalisticamente voltado ao cumprimento de sanção reclusiva em regime fechado (art. 87 da LEP) - determina o art. 88 da LEP que “o condenado será alojado em cela individual que contenha dormitório, aparelho sanitário e lavatório”. A unidade celular de recolhimento da pessoa privada de liberdade, para além da “salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana”, deverá possuir “área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados)” (art. 88, parágrafo único, alíneas “a” e “b”, da LEP; respectivamente). Em razão da remissão expressa do art. 104 da LEP, o preso provisório alocado em cadeia pública deve ser recolhido em recinto espacialmente parametrizado àquele previsto para as penitenciárias. 24. Portanto, a lei estabeleceu, há mais de 32 anos atrás, a metrificação espacial mínima do habitáculo destinado ao condenado alojado em uma penitenciária e ao preso provisório em uma cadeia pública: 06,00 m² Página 10 de 58constitui a menor área legalmente permitida para a insular vivência humana digna da pessoa privada de liberdade durante o cumprimento da sanção detentiva ou no período de custódia cautelar. 25. Embora não contenda diretamente com a capacidade de um estabelecimento penal, a disciplina normativa constitui relevante parâmetro dimensional direcionado a 02 distintos propósitos, a saber: (a) serve de referência legal impositiva em relação às penitenciárias e cadeias públicas a serem edificadas pelo poder público, as quais devem ser conceptualizadas com celas espacialmente adequadas àquela área mínima; (b) configura paradigma metrificador da capacidade ocupacional de penitenciárias e cadeias públicas já construídas e em pleno funcionamento. 26. O parâmetro (a), no presente caso, não restou minimamente observado pelo Réu. 27. De fato, o tamanho das celas coletivizadas3 rompe, com sobras, a dimensão mínima legalmente estipulada. Conforme estampam o Relatório de Vistoria e a Planta de Galeria confeccionados pelo Departamento de Engenharia Legal da Defensoria Pública por ocasião da visita inspecionária do dia 07.06.16 (docs. anexos), cada cela do estabelecimento mede 13,65 m². 28. Ora, considerando que cada recinto é provido com 03 beliches e, portanto, idealizado para o recolhimento simultâneo de 06 pessoas 3 Neste ponto específico, tem-se outra grave violação à lei: as celas deveriam ser destinadas ao acolhimento de apenas 01 pessoa privada de liberdade, conforme expressamente determina o art. 88, caput, e art. 104, ambos da LEP; porém, optou-se pela coletivização dos recintos prisionais, em clara e despudorada afronta ao cogente comando normativo. Página 11 de 58 privadas de liberdade, as celas deveriam medir, mantendo-se a proporcionalidade aritmética normatizada, no mínimo 36,00 m² (06 detentos X 6,00 m2). 29. A defasagem espacial das celas da UP de Resende é assustadora: o habitáculo conta com apenas 1/3 da área que legalmente deveria ostentar para abrigar 06 detentos em concomitância temporal, aproximadamente. Ao recinto faltam notáveis 23,37 m² para atingir o parâmetro dimensional mínimo, devendo desconsiderar-se, neste cômputo, a área ocupada pelos dispositivos componentes do “banheiro” (1,02 m²). Assim, como ressaltado no relatório circunstanciado do NUDEDH, constatou-se “nas celas vistoriadas uma diminuição de 62,1% do tamanho mínimo permitido”. . 30. Mas não é só. 31. A utilização das celas em sua capacidade nominal implica a disponibilização de míseros 2,275 m² para cada detento no interior do habitáculo (13,65 m²/06 detentos). Porém, se for considerada apenas a área de circularidade (floor space) do recinto equivalente ao espaço efetivamente útil Página 12 de 58 que permite que o detento se desloque na parte interna das celas, a situação agrava-se sensivelmente. 32. Com efeito, consoante documenta a Planta da Galeria sem Nomenclatura elaborada pelo setor de Engenharia Legal da Defensoria Pública (doc. anexo), as celas da UP de Resende ofertam 7,03 m² de área interna de circulação. Deste modo, remanescem exíguos 1,17 m² per capta como espaço útil de mobilidade corporal no interior das celas do estabelecimento (7,03 m2/06 detentos). 33. A luta pelo espaço entre detentos certamente marcará a convivência forçada nas celas da UP de Resende. Com 1,17 m² disponíveis, cada pessoa privada de liberdade disputará incessantemente cada milímetro eventualmente desocupado pelo companheiro de infortúnio, potencializando a ocorrência de conflitos interpessoais propiciada pela inevitável promiscuidade corporal. 34. Neste diapasão, consigne-se que as 06 pessoas privadas de liberdade permanecerão aglutinadas coativamente durante 23 horas diárias nos habitáculos celulares. Isto porque, em recente decisão, a Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça, apreciando recurso de agravo de instrumento manejado pela Defensoria Pública em face de decisão indeferitória de pedido de antecipação de tutela, determinou, com fulcro no art. 144 da Resolução nº 14/94 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e Regra 21.15 das Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos da ONU, ao Estado do Rio de Janeiro – réu no bojo da pertinente ação civil pública (Processo 4 “O preso que não se ocupar de tarefa ao ar livre deverá dispor de, pelo menos, uma hora ao dia para a realização de exercícios físicos adequados ao banho de sol”. 5“O preso que não se ocupar de tarefa ao ar livre deverá dispor de, pelo menos, uma hora ao dia para a realização de exercícios físicos adequados ao banho de sol”; a atualização do conjunto de diretrizes consubstanciado nas Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos foi aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 17.12.15; agora conhecidas pelo epíteto de Regras de Mandela, semelhante previsão consta da Regra 23.1 (“Todo preso que não trabalhar a céu aberto deve ter pelo menos uma hora diária de exercícios ao ar livre, se o clima permitir”). Página 13 de 58 nº 0410810-73.2014.8.19.0001) - a implementação de “banho de sol diário, por no mínimo 1 (uma) hora, em local adequado à prática de atividade física, na parte externa integrante das unidades prisionais6”. 35. Ademais, o regime fechado e a prisão provisória são modalidades ergastulares que não são normativamente contempladas com hipóteses de saídas da pessoa privada de liberdade do estabelecimento prisional, ao contrário dos regimes semiaberto (art. 122 da LEP) e aberto (art. 115 da LEP), de modo que os detentos passam o tempo, dia após dia, trancafiados nas celas, deixando-as apenas para o banho de sol e também para outra eventual atividade intracarcerária. 36. Como se percebe, caso 06 pessoas privadas de liberdade sejam inseridas nas celas da UP de Resende ao mesmo tempo, cada detento poderá usufruir de no máximo 1,17 m² para se movimentar durante 23 horas por dia, salvo se os respectivos ocupantes convencionarem entre si um nefasto rodízio corporal no interior dos habitáculos, com alguns “caminhando” pelo solo enquanto outros repousam candidamente nas camas. 37. Há, ainda, um importante e inafastável vetor de compressão redutora do espaço celular e, conseguintemente, da circularidade interna dos habitáculos da UP de Resende que deve ser devidamente considerado. 38. Não se deve olvidar que cada pessoa inserida num ambiente de vivência coletiva não representa, para o próprio espaço disponibilizado, tão somente 01 objeto corporal. Cada detento, como é óbvio, 6 Recurso de Agravo de Instrumento nº 0014521-23.2015.8.19.0000, Rel. Des. Patrícia Ribeiro Serra Vieira, julgado em 10.06.15. O órgão fracionário baseou-se no (O preso que não se ocupar de tarefa ao ar livre deverá dispor de, pelo menos, uma hora ao dia para a realização de exercícios físicos adequados ao banho de sol) e Página 14 de 58 retém em seu domínio pertences pessoais que são indispensáveis à vida doméstica do cárcere. 39. A posse de objetos constitui um direito titularizado pela pessoa privada de liberdade e, correlatamente, uma necessidade inerente a qualquer ser humano. Por tais motivos, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária editou, recentemente, novo ato normativo referenciado à permissibilidade de recepção e retenção de pertences pelos detentos. Conforme viabiliza o art. 1º da Resolução SEAP nº 610, de 18.03.16, cada pessoa privada de liberdade alocada em seu parque prisional pode receber o seguinte de seus respectivos visitantes (doc. anexo): “I- frutas diversas, alimentos cozidos, leiteem pó acondicionado em embalagem tipo saco, biscoitos, bolos, e doces acondicionados em sacos ou vasilhames plásticos transparentes; II - cigarros; III - material de higiene pessoal (escova e pasta de dente, sabonete, papel higiênico, shampoo e absorvente higiênico); IV - lençóis e toalhas; V- calçados; e VI - peças de vestuário”. 40. Em relação aos objetos enumerados nos incisos IV, V e VI, o art. 2º do referido ato normativo especifica a quantidade exata de cada objeto que o detento pode remanescer consigo: 02 toalhas; 02 lençóis; 03 camisas e/ou camisetas; 01 casaco; Página 15 de 58 01 par de tênis; 01 par de sapatos; 02 pares de meias; 02 bermudas e/ou shorts; 01 calça; 02 pares de chinelos; 04 unidades de peças íntimas 41. Assim, em cada unidade celular da UP de Resende, as 06 pessoas privadas de liberdade confinadas nos recintos vão reunir simultaneamente – sem computar no mínimo 06 escovas e 06 pastas de dente, 06 rolos de papel higiênico, 06 sabonetes, 06 tubos de shampoo, alimentos variados et coetera – o seguinte quantitativo: 12 toalhas; 12 lençóis; 18 camisas e/ou camisetas; 06 casacos; 06 pares de tênis; 06 pares de sapatos; 12 pares de meias; 12 bermudas e/ou shorts; 12 calças; 12 pares de chinelos; 24 unidades de peças íntimas Total: 132 peças de vestuário 42. Deve adicionar-se a este conglomerado multitudinário de objetos, produtos e alimentos, o direito atribuído à pessoa privada de liberdade de possuir 01 ventilador/circulador de ar do tamanho Página 16 de 58 máximo de 30 cm e 01 rádio portátil, além de 02 televisores de até 14 polegadas por cela de habitação coletivizada (art. 5º da resolução citada). 43. Como se é capaz de visualizar, o espaço interior das celas, já deveras reduzido para o abrigo concorrente de 06 pessoas privadas de liberdade, sofrerá, irremediavelmente, substancial minoração dimensional em virtude da coexistenciabilidade dos pertences dos detentos no cotidiano carcerário, circunstância agravada pela total ausência de repositórios específicos para a guarda dos objetos nas celas7-8 (armários, guarda-roupas et coetera), conforme percebe-se claramente pelos registros fotográficos. 44. Assim sendo, exsurge a funcionalidade instrumental do art. 88, parágrafo único, alínea “b”, da LEP, como paradigma metrificador da capacidade ocupacional de penitenciárias já existentes (parâmetro b, § 25, supra). 45. Com efeito, a quantificação legal de tamanho mínimo representa a irredutível área espacial do habitáculo celular. Trata-se de um valor geométrico que condiz com a qualidade de vida do detento no interior do aparelho carcerário, de modo que a cada pessoa recolhida no ergástulo há-de destinar-se o espaçamento mínimo de 06,00 m2. 46. A eleição pela coletivização dos alojamentos da UP de Resende – repise-se, opção absolutamente confrontante com o art. 88, caput, art. 92, caput e art. 104, todos da LEP – não dessencializa a imperatividade 7 A Cruz Vermelha Internacional, ao versar sobre a questão espacial, recomenda que os detentos, além de acomodação adequada para dormir e área para deslocaram-se livremente nos dormitórios, “have space for their personal effects” (Water, Sanitation, Hygiene and Habitat in Prisons, International Committee of the Red Cross. ICRC, august 2005, p. 20). 8 Ainda sobre o assunto, a Corte Europeia de Direitos Humanos, em alguns julgamentos, considerou, dentre outros fatores cumulativos, que a falta de mobiliário adequado constitui violação do art. 3º da Convenção Europeia de Direitos Humanos (Case of Drăgan v. Romania, Application nº 65158/09, 2 february 2016, § 72; e Case of Iacov Stanciu v Romania, Application nº 35972/05, 24 july 2012, § 175). Página 17 de 58 normativa vincada à oferta do minimum living space legalmente desenhado a cada pessoa privada de liberdade. Em outras palavras: ainda que as celas tenham sido (ilegalmente) formatadas para a recepção prisional de mais de uma pessoa em seu perímetro limitativo, a área mínima de 06,00 m2 permanece hígida e numericamente inflexível como espaço reservado a cada detento. 47. Desta forma, conclui-se que a capacidade nominal da UP de Resende não encontra correspondência matemática com a sua capacidade legal. O ser não espelha o dever ser no mundo naturalístico. 48. De fato, as 72 celas de convivência concorrencial totalizam 432 camas (216 beliches), aparentemente indicando que a unidade detém competência espacial para abrigar igual número de pessoas privadas de liberdade. No entanto, aplicando-se a regra do espaço mínimo por detento (06,00 m2), cada cela metrificada em 13,65 m2 pode recepcionar, no máximo, 02 detentos em seu interior. Qualquer excedente quantitativo a esta intransponível barreira numérica configura irremediável situação de ilegalidade. 49. Logo, a capacidade legal da UP de Resende, a serem rigorosamente incidentes os parâmetros legais internos e externos já exaustivamente explicitados, equivale à terça parte (1/3) de sua capacidade nominal, vale dizer, o estabelecimento, que somente pode abrigar 02 detentos por cela, ostenta capacidade legal de 144 pessoas privadas de liberdade. 50. Consequentemente, os Módulos 01 e 02 da UP de Resende - cujas capacidades nominais equivalem a 288 e 144 pessoas privadas de liberdade – ostentam capacidade legal notadamente inferior: somente podem recepcionar em suas celas coletivizadas 96 e 48 detentos cada qual, respectivamente. Página 18 de 58 51. Caso o Réu almejasse de fato inserir 432 pessoas no perímetro carcerário da UP de Resende, incumbia-lhe idealizar e edificar o prédio de acordo com as normas espaciais pertinentes, estruturando os locais de vivência – ou convivência - de acordo com o tamanho legal previsto para as celas e, assim, assegurar à pessoa privada da liberdade o minimum living space normativamente estipulado. 52. Como não o fez, mister adequar o estabelecimento aos parâmetros normativos pertinentes e, consequentemente, operar a adequabilidade quantitativa da capacidade nominal à capacidade legal, fixando-se judicialmente a ocupação máxima da unidade em 144 pessoas privadas de liberdade em simultaneidade temporal – 96 detentos no Módulo 01, e 48 no Módulo 02. Módulo 01 UP de Resende Galerias Celas por Galeria Beliches por Cela Detentos por Cela Capacidade do Módulo Capacidade Nominal 04 12 03 06 288 Capacidade Legal 04 12 03 02 96 Módulo 02 UP de Resende Galerias Celas por Galeria Beliches por Cela Detentos por Cela Capacidade do Módulo Capacidade Nominal 02 12 03 06 144 Capacidade Legal 02 12 03 02 48 Página 19 de 58 2º Capítulo Capacidade da UP de Resende Superlotação Carcerária 53. É um lugar-comum já enfadonhamente propalado e repetido afirmar-se que o sistema penitenciário ostenta altíssimas taxas de superlotação. Dados, números, gráficos, pesquisas, estatísticas e outros instrumentos informativos já foram suficientemente produzidos sobre o assunto e evidenciam a robustez fática da asserção. Mas é sempre necessário volver ao clichê do lugar-comum com o escopo de firmar o superpovoamento dos estabelecimentos prisionais como uma realidade dada indiscutível. 54. De acordo com compilação sintetizada pelo Conselho Nacional de Justiça9, a população carcerária do Brasil é composta por 963.296 pessoas aprisionadas em unidades para o cumprimento de pena privativa de liberdade em regime fechado, semiaberto e aberto, além daqueles postos sob a modalidade de prisão domiciliar10. Deste quantitativo, 261.344 pessoas privadas de liberdade ostentam acondição jurídico-penal de “presos provisórios”. 55. Ainda conforme referida pesquisa, há, no país, 2777 estabelecimentos penais que hospedam 649.159 pessoas privadas de liberdade e 392.898 vagas disponíveis. O sistema prisional apresenta, portanto, um déficit numérico de 256.261 vagas. 9 Acessível pela ferramenta “Geopresídios” ofertada no sítio do CNJ na rede mundial de computadores (disponível em http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php; capturado em 20.09.16). 10 Há, ainda, 3532 internadas sob medida de segurança estacionária. http://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php Página 20 de 58 56. Este dramático panorama nacional, lamentavelmente, reproduz-se fiel e simetricamente no Estado do Rio de Janeiro. 57. Com efeito, de acordo com dados referenciados ao efetivo carcerário de 20.09.1611 (doc. anexo), as unidades prisionais fluminenses encontram-se inchadas e abarrotadas de detentos. Um quantitativo totalizado no patamar de 50.742 pessoas privadas de liberdade espreme-se em apenas 27.242 vagas disponibilizadas nos 53 estabelecimentos penais – penitenciárias, institutos penais, casa do albergado, hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico e cadeias públicas. 58. A atual quadra de superlotação regional – cuja exuberante taxa de superlotação alcança a marca de 86% - decorre diretamente da conjugação sistemática de 02 fatores: a - a exponencial majoração quantitativa dos índices de aprisionamento e/ou de retenção carcerária; e b - a exígua criação de novas vagas no parque prisional fluminense. 59. De fato, extrai-se do gráfico evolutivo concebido pelo Promotor de Justiça Tiago Joffily12 e gentilmente cedido à Defensoria Pública (doc. anexo), que, no mês de dezembro de 2003, havia 18.562 pessoas privadas de liberdade em cárceres regionais e 27.721 vagas existentes nos estabelecimentos. Há mais de uma década, portanto, o sistema já não detinha 11 Fornecido pelo Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro. 12 Titular da Promotoria de Tutela Coletiva do Sistema Prisional e Direitos Humanos do Ministério Público até o mês de junho de 2016. Página 21 de 58 vagas suficientes para recepcionar e absorver a população prisional que se propunha a custodiar. 60. O transcurso do tempo revela substancial agudização deste quadro. Em pouco mais de 12 anos, o efetivo carcerário experimentou um aumento próximo a 30.000 detentos, alcançando, no mês de setembro de 2016, mais de 50.000 detentos, ao passo que a quantidade de vagas não acompanhou o crescimento progressivo do incremento do contingente carcerário: no mesmo período temporal, adicionou-se ao parque prisional um pouco menos do que 10.000 novas vagas, totalizando 27.242. 61. Os números estatísticos revelam uma perversa tendência das práticas penal e penitenciária no curso dos anos no âmbito do Estado do Rio de Janeiro: o aprisionamento massivo de pessoas representado por exorbitantes alíquotas de encarceramento13 , por um lado, e a correlata exiguidade na concepção de vagas no sistema, por outro. O resultado, por óbvio, é o inexorável desequilíbrio quantitativo no binômio detento-vaga e a consequencial superlotação dos estabelecimentos prisionais. 62. A título exemplificativo cita-se 09 paradigmáticos estabelecimentos penais fluminenses em que o percentual ocupacional rompe a barreira de 100% (efetivo carcerário de 20.09.16; doc. anexo): UP ESPÉCIE CAPACIDADE EFETIVO EXCEDENTE TAXA Penitenciária Alfredo Fechado Masculino 960 2894 1934 201% 13 Consoante releva o INFOPEN/14, em 1990 o Brasil retinha 90.000 pessoas privadas de liberdade; passados 14 anos, este quantitativo alcançou a marca de 607.700 detentos, num espantoso crescimento de 575%; a explosão da população prisional no país deve-se a um significativo aumento da taxa de encarceramento: em 2000, para cada 100 mil habitantes havia 137 pessoas aprisionadas, ao passo que, em 2014, 299,7 pessoas estavam retidas em prisões para cada 100 mil habitantes; a se manter o crescimento experimentado neste período da taxa de aprisionamento (119%), em 2022 a população carcerária romperá a barreira de 1 milhão de detentos, e em 2075 uma em cada dez brasileiros estará em situação de privação de liberdade (INFOPEN/14). Página 22 de 58 Tranjan (Gericinó) Cadeia Pública Milton Dias Moreira (Japeri) Fechado Masculino 884 2823 1939 219% Presídio João Carlos da Silva (Japeri) Provisório Masculino 884 1870 986 112% Cadeia Pública Cotrim Neto (Japeri) Provisório Masculino 750 1777 1027 137% Cadeia Pública Romeiro Neto (Magé) Provisório Masculino 564 1455 891 158% Cadeia Pública Juíza de Direito Patrícia Acioli (São Gonçalo) Provisório Masculino 616 1659 1043 169% Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho (Gericinó) Semiaberto Masculino 1699 3577 1878 111%14 Instituto Penal Vi cente Piragibe (Gericinó) Semiaberto Masculino 1444 2627 1183 82%15 Presídio Ary Franco (Água Santa) Fechado Masculino 968 2271 1303 135% 14 Vide § 72, infra. 15 Vide § 73, infra. Página 23 de 58 63. Neste contexto tenebroso de estabelecimentos penais absolutamente superpovoados, surpreendentemente há unidades que não apresentam um quadro crônico de overcrowding, destacando-se positivamente no dantesco parque prisional fluminense. 64. Descontando-se os locais de privação de liberdade que apresentam perfil nosocomial16, remanescem 44 unidades prisionais sob o julgo da SEAP/RJ voltadas ao cumprimento de pena privativa de liberdade – penitenciárias e presídios para regime fechado; colônia agrícola/industrial e institutos penais para regime semiaberto; casa do albergado para regime aberto - e para o recolhimento de presos provisórios – cadeias públicas. 65. Deste quantitativo de estabelecimentos, o efetivo carcerário de 20.09.16 demonstra que 36 locais de privação de liberdade estão com a capacidade ocupacional acima do limite numérico máximo, ao passo que apenas 10 unidades não apresentam situação inflacionária de superlotação carcerária 17 . Assim, aproximadamente 82% dos estabelecimentos penais administrados pela SEAP/RJ apresentam índices de ocupação superiores à capacidade de abrigamento concorrencial de detentos. 66. É relevante explicitar o porquê de algumas unidades ergastulares não serem atingidas pelo quadro de superlotação prisional no Estado do Rio de Janeiro, já que a prática penitenciária aponta justamente reversa tendência. Ver-se-á que a explicação deste raro fenômeno carcerário escora-se em 02 distintas vertentes: 16 Hospital Dr. Hamilton Agostinho Vieira de Castro, Instituto de Perícias Heitor Carrilho, Instituto de Perícias Heitor Carrilho-FEM, Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Henrique Roxo, Hospital Penal Fábio Soares Maciel, Hospital Penal Fábio Soares Maciel-FEM, Hospital Psiquiátrico Roberto Medeiros, Sanatório Penal e Sanatório Penal-FEM. 17 O descompasso numérico ora constatado deve-se ao fato de que a Penitenciária Joaquim Ferreira de Souza aloja 03 categorias diversas de pessoas privadas de liberdade do sexo feminino – “provisória comum”, “provisória federal” e “outros” – sendo que o extravasamento da capacidade ocorre em 02 setores da unidade. Página 24 de 58 - peculiaridades da população prisional de determinados estabelecimentos; - limitação quantitativa imposta por atuação interventiva do Poder Judiciário. 67. No primeiro grupo, constamas seguintes unidades: - Penitenciária Coronel PM Francisco Spargoli da Rocha: situado no município de Niterói, o estabelecimento acolhe pessoas privadas de liberdade que cumpriam pena na extinta Penitenciária Vieira Ferreira Neto, a qual, por seu turno, passou a denominar-se Unidade Prisional da Polícia Militar (art. 4º do Decreto nº 45345/15); de acordo com o Anexo I, inciso XV, da Resolução SEAP nº 338/10, a composição carcerária congloba condenados à pena de até 08 anos que não possuam outros processos criminais pendentes, condenados a qualquer quantum punitivo que sejam maiores de 60 anos ou que sejam portadores de deficiência física grave que diminua a capacidade de locomoção, e condenados enquadrados nas hipóteses do art. 15 da Lei nº 9807/99; - Cadeia Pública José Frederico Marques: criada pelo Decreto nº 40152/06, a unidade é utilizada pela SEAP/RJ como “porta de entrada” do sistema penitenciário na capital do Estado do Rio de Janeiro; isto significa que a pessoa privada de liberdade permanece retida no estabelecimento apenas o tempo necessário para ser transferida para estabelecimento adequado ao seu perfil; é intensa a rotatividade de detentos, razão pela qual não possui efetivo carcerário fixo e estabilizado; - Cadeia Pública Constantino Cokotós: segundo o art. 3º do Decreto 45345/15, o estabelecimento abriga população prisional Página 25 de 58 singular: “servidores de órgãos da segurança pública 18 e Inspetores de Segurança e Administração Penitenciária, quando sujeitos à prisão antes de condenação definitiva”, fator que explica a baixa densidade carcerária da unidade; - Colônia Agrícola Marco Aurélio Vergas Tavares de Mattos: na conformidade do Anexo I, inciso VII, da Resolução SEAP nº 338/140, a unidade comporta condenados ao regime semiaberto que já gozem de saída temporária de visita à família e que tenham aptidão para o desempenho de atividades agrícolas, sendo a admissão precedida de entrevista; - Penitenciária Talavera Bruce: sede de concorridos concursos de beleza, a unidade abriga pessoas do sexo feminino condenadas ao cumprimento de pena em regime fechado, independentemente do quantum sancionatório (Anexo I, inciso XVII, da Resolução SEAP nº 338/10); - Penitenciária Laercio da Costa Pellegrino: certamente um dos estabelecimentos penais mais famosos do país, o Bangu I é uma unidade de pequena capacidade, contando com apenas 48 celas individuais distribuídas em 04 galerias; vocacionado ao recolhimento de condenados a regime fechado e ao abrigo de presos provisórios (Anexo I, inciso XII, da Resolução SEAP nº 338/140), Bangu I acolhe pessoas privadas de liberdade que cumprem punição disciplinar e que, a juízo da administração penitenciária, não devem permanecer em outros estabelecimentos, assim como detentos que aguardam ingresso no sistema penitenciário federal; devido ao peculiar perfil da unidade, raramente Bangu I atinge a sua lotação máxima; 18 Excluem-se os Policiais Militares, os quais, até o eventual advento de decisão penal condenatória provida de definitividade, permanecem custodiados na Unidade Prisional da Polícia Militar (art. 4º do Decreto nº 45345/15). Página 26 de 58 - Instituto Penal Cândido Mendes: localizando no centro da cidade do Rio de Janeiro, a unidade abriga pessoas privadas de liberdade condenadas a cumprir a sanção em regime semiaberto que possuam autorização judicial de trabalho externo (Anexo I, inciso III, da Resolução SEAP nº 338/140); o reduzido número de detentos em relação à capacidade deve-se justamente à exigência de que a pessoa privada de liberdade ostente permissibilidade autorizativa para trabalhar, fato raro no mundo prisional; - Cadeia Pública Pedrolino Werling de Oliveira: a notoriedade midiática deste estabelecimento – mais conhecido como Bangu 8 – deita raízes na categoria de detentos que abriga: “custodiados diplomados em nível superior e aqueles sob ordem de prisão por inadimplência de pensão alimentícia” (art. 5º do Decreto nº 45345/15); segundo dados estatísticos divulgados pelo INFOPEN/14, apenas 1% da população carcerária brasileira possui ensino superior completo, o que explica a baixa densidade prisional da unidade. 68. Consoante demonstrou-se, os referidos estabelecimentos não padecem de um quadro de superlotação em razão das específicas peculiaridades que apresentam em relação ao contingente prisional. Como são finalisticamente voltadas à recolha de grupos de detentos com características próprias e bem destacadas da parcela amplamente majoritária da população carcerária, referidas unidades dificilmente alcançam ou ultrapassam a lotação máxima e, quando raramente tal fenômeno ocorre, o extravasamento quantitativo da capacidade ocupacional não instala propriamente uma crônica situação de superpovoamento. 69. Por outro lado, os demais estabelecimentos que igualmente escapam à regra prisional da sobrelotação de detentos devem Página 27 de 58 tributo unicamente à intervenção performática do Poder Judiciário. São unidades que não ostentam qualquer particularidade especial referenciada às características das pessoas privadas de liberdade que abrigam: ao reverso, tais estabelecimentos são destinados ao recolhimento de presos que ou pertencem a alguma facção criminosa – Comando Vermelho (CV), Terceiro Comando Puro (TCP), Amigo dos Amigos (ADA) e Milícia – ou que são membros dissidentes daqueles grupos e/ou são condenados por delitos que os impedem de conviver com segurança no seio das facções (“presos de seguro”). 70. Vejamos a parca lista dos estabelecimentos penais em que a superlotação carcerária somente não se faz presente exclusivamente em virtude da existência de decisões judiciais limitativas do quantitativo prisional: - Cadeia Pública Hélio Gomes (Processo nº 0010759- 77.2013.8.19.0029, 1º Vara Cível da Comarca de Magé): a capacidade ocupacional da unidade foi inicialmente limitada por decisão liminar proferida em 20.09.13 no bojo de ação civil pública manejada pelo Ministério Público; o decisum antecipatório da tutela foi consolidado na sentença de 02.12.14 e confirmado em sede recursal pela Nona Câmara Cível; atualmente, o feito encontra-se no aguardo de apreciação de agravos de instrumentos interpostos alvejando decisões de inadmissão de recursos especial e extraordinário; - Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth (Processo nº 0016621-49.2012.8.19.0066, 4º Vara Cível da Comarca de Volta Redonda): também em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público, o patamar número ocupacional da unidade restou liminarmente limitado em 21.06.12 e preservado no julgamento de recurso de agravo em 14.12.12 pela Sexta Câmara Cível (em 04.09.12 a Presidência do Tribunal de Justiça havia concedido pedido de suspensão da medida liminar); a sentença meritória de Página 28 de 58 04.04.13, que igualmente fixou limite à capacidade da cadeia pública, foi mantida no julgamento de recurso de apelação em 23.07.14; diante do insucesso das impugnações excepcionais manejadas, já se consolidou materialmente o trânsito em julgado; - Instituto Penal Benjamim de Moraes Filho (Procedimento Especial nº 2012/0120311-2, VEP/RJ): situado no complexo penitenciário de Gericinó e vocacionado a condenados ao regime intermediário que não possuam saída temporária de visita e/ou trabalho externo (Anexo I, inciso IV, da Resolução SEAP nº 338/140), a demarcação quantitativa da população prisional advém de decisão do juízo da execução penal fluminense em procedimento especial (doc. anexo). 71. Como se vê, de todo o parque prisional fluminense, apenas 03 unidades prisionais não são negativamente atingidas pelo overcrowdingem função de atuações interventivas do Poder Judiciário, o que evidencia que, caso não haja a interferência jurisdicional nos estabelecimentos, a superlotação é um fenômeno inevitável no sistema penitenciário estadual. 72. Ainda sob esse propósito, consigna-se que em outras situações o Poder Judiciário foi convocado a atuar no que pertine ao quadro de superlotação. Porém, a renitência da intervenção judicial viabilizou o incremento da população carcerária em várias unidades prisionais. Sem pretensão alguma de exaustividade, inventariam-se exemplos paradigmáticos de superpovoamento decorrentes diretamente da não intervenção judicante: - Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho (Procedimentos Especiais nº 2012/0021501-8, 2014/0184116-6 e 2015/0002112-4, VEP/RJ): desde o longínquo ano de 2012, a Defensoria Pública e o Ministério Página 29 de 58 Pública tentam obter decisão judicial referente ao estabelecimento penal no que toca às condições degradantes de habitabilidade e a superlotação; em fevereiro de 2012 – data do propositura do 1º procedimento especial – a unidade contava com 1542 detentos e, passados mais de 04 anos, abriga 3577; em virtude da acinesia judicial – nenhuma decisão, positiva ou negativa, restou proferida pelo juízo da execução penal fluminense quanto aos reclamos das instituições – a Defensoria Pública recorreu ao sistema interamericano de direitos humanos (doc. anexo) e obteve, em 18.07.16, a decretação de medidas cautelares da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, dentre as quais a impositividade ao Estado do Brasil para que “tome ações imediatas para reduzir substancialmente a superlotação dentro do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, de acordo com padrões internacionais” (doc. anexo); - Presídio Diomedes Vinhosa Muniz (Processo nº 0009272-81.2013.8.19.0026, 2ª Vara Cível da Comarca de Itaperuna): em 30.08.13, a capacidade do estabelecimento foi judicialmente limitada em 455 detentos por decisão liminar proferida em ação civil pública; no entanto, decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça em sede de pedido de suspensão e agravos de instrumento cassaram a eficácia da decisão antecipatória da tutela; assim, diante da não interferência judicial, atualmente a unidade, cuja capacidade máxima é de 466 detentos, abriga 782 pessoas privadas de liberdade, com taxa de superlotação de 68%; - Cadeia Pública Dalton Crespo de Castro (Processo nº 0059535-27.20118.19.0014, 1ª Vara Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes): também em sede de ação civil pública, decisão antecipatória de tutela limitou a capacidade da unidade ao patamar de 500 detentos em 17.11.11; porém, em 10.09.12, a Presidência do Tribunal de Justiça acolheu pedido de suspensão e cassou a liminar então concedida; como consequência, a unidade Página 30 de 58 ostenta, atualmente, contingente prisional de 864 detentos, ou seja, superlotação de 73% de sua capacidade; - Cadeia Pública Milton Dias Moreira (Processo nº 0001642-89.2016.8.19.0083, 2ª Vara da Comarca de Japeri): em 29.03.16, o Ministério Público ajuizou ação civil pública postulando, dentre outras providências, a concessão de liminar limitativa da capacidade da unidade em 884 detentos e a transferência do excedente prisional (a respectiva peça isagógica evidencia exponencial incremento quantitativa da população carcerária: 899 presos em janeiro de 2015; 1676 em março de 2015; 1771 no mês de junho e 2286 em setembro de 2015; e 2619 em fevereiro de 2016; doc. anexo); em 30.05.16, o pedido de antecipação de tutela foi indeferido; assim, face à não intervenção jurisdicional, o estabelecimento comporta hoje 2823 pessoas privadas de liberdade (excesso de 219%); - Cadeia Pública Pedro Melo da Silva (Procedimento Especial n° 2014/0190795-9, Vara de Execuções Penais): este pedido de providências foi despoletado pela Defensoria Pública em 30.10.14, ocasião em que o estabelecimento retinha 971 detentos (taxa 29% superior à sua capacidade); transcorrido 01 ano e 05 meses sem que a autoridade judicial tenha adotado qualquer medida contra a superlotação – transferência do excedente prisional e proibição do ingresso de novos detentos em número superior à capacidade – a unidade atualmente conta com 1467 “hóspedes”; em 08.03.16, o juízo da execução penal determinou o arquivamento do procedimento. 73. Há, ainda, 02 outros casos que merecem especial menção pelas especificidades que apresentam no que concerne à relação que se estabelece entre superlotação carcerária X intervenção judicial. Veja-se: Página 31 de 58 - Presídio Evaristo de Moraes (Procedimento Especial nº 2012/0162032-3, VEP/RJ): em 19.10.12, o juízo da execução penal promoveu a interdição gradual do estabelecimento – à época, 1900 detentos superpovoavam a unidade, com capacidade para 1490 – e, posteriormente, em 12.04.13, reverteu a decisão anterior e fixou a capacidade em 1437 pessoas privadas de liberdade; por fim, atendendo pleito da administração penitenciária, o juízo da execução penal fluminense permitiu um aumento provisório da capacidade ocupacional em mais 250 detentos (docs. anexos); no entanto, apesar das referidas decisões judiciais, o estabelecimento alberga atualmente 2146 detentos (43% acima do limite máximo); - Instituto Penal Vicente Piragibe (Processo nº 0358308-65.2011.8.19.0001, 6ª Vara de Fazenda Pública da Comarca da Capital): em outubro de 2011, a unidade prisional – destinada ao abrigo de condenados a cumprir pena privativa de liberdade em regime semiaberto que não detêm saída temporária de visita à família e trabalho externo (Anexo I, inciso I, da Resolução SEAP nº 338/140) – ostentava população carcerária de 1999 detentos para capacidade máxima de 1444, sendo que o juízo fazendário, em 06.10.11, deferiu parcialmente pedido liminar e proibiu o ingresso de novos presos até que se atingisse o patamar ocupacional adequado; esta decisão, porém, foi revogada pelo próprio juízo apenas 05 dias depois; em razão da ausência de decisão judicial limitativa, o contingente prisional experimentou majoração exponencial, atingindo a exuberante marca de 3539 detentos em 16.05.16; atendendo a pedido formulado pela Defensoria Pública – autora da ação civil pública – o juízo fazendário repristinou, em 30.05.16, a limitação judicial referente à capacidade da unidade e proibiu o ingresso de novas pessoas privadas de liberdade no estabelecimento; em razão desta recente decisão, o contingente prisional vem sendo paulatinamente reduzido mediante a saída de detentos, encontrando-se atualmente no patamar de 2627. Página 32 de 58 74. Estes 02 últimos casos denotam que nem sempre a pronta atuação intervencionista do Poder Judiciário se mostra capaz de evitar a instalação da superlotação carcerária (Presídio Evaristo de Moraes), e que, ainda que temporalmente tardia, a intromissão judicial desponta como o único recurso apto a estancar e reverter o atômico crescimento demográfico de um estabelecimento penal (Instituto Penal Vicente Piragibe). 75. A anamnese realizada sobre o panorama dos estabelecimentos prisionais do Estado do Rio de Janeiro e a necessária conexão equacionada pela relação superlotação carcerária X intervenção judicial permite a firmação dos seguintes diagnósticos: - o Estado do Rio de Janeiro, ao longo dos anos, experimenta uma majoração exponencial das taxas de encarceramento; - à curva ascendente e contínua de aprisionamento não corresponde, proporcionalmente, a velocidade de criação de novas vagas no sistema penitenciário; - a superlotação dos estabelecimentos é a regra e a prática penitenciária no parque prisional estadual; - a não atuação judicial é causa direta da consequencial explosão demográfica em vários estabelecimentosprisionais fluminenses; Página 33 de 58 - somente a intervenção judicial detém aptidão para prevenir, brecar e/ou desinstalar quadro de superpovoamento em determinada unidade prisional. 76. Estas premissas diagnosticais permitem perspectivamente prognosticar que a transposição da caoticidade do sistema penitenciário do Estado do Rio de Janeiro para a UP de Resende é uma probabilidade concreta e real, calcada em dados estatísticos enunciadores que a superlotação certamente se replicará no novo estabelecimento prisional. 77. Acima de mera suposição profética e abstrata desconexão da realidade, a instauração do quadro de superpovoação carcerária na UP de Resende conta com um indesejado e incômodo aliado, aliado este, aliás, já “transitado em julgado”. 78. Com efeito, com a edificação do novo estabelecimento, o Sul do Estado do Rio de Janeiro passa a contar com 02 locais de privação de liberdade: a UP de Resende e a Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth. Assim, a região sul fluminense começará a recepcionar mais detentos em razão do aumento da capacidade de recolhimento compulsório de pessoas privadas de liberdade propiciado justamente pela UP de Resende. 79. No entanto, a Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth, como já se avançou, foi objeto de ação civil pública em que se fixou judicialmente a capacidade máxima de ocupação do estabelecimento. Somente em virtude desta decisão, a administração penitenciária não aloca na unidade detentos além do patamar judicialmente estipulado, respeitando rigorosamente os parâmetros quantitativos estabelecidos pelo Poder Judiciário. A preclusão Página 34 de 58 formal e material da decisão meritória proferida no bojo contextual da ação coletiva impede qualquer possibilidade de reversão do atual quadro. 80. Em virtude da conformação jurídico-processual da coisa julgada no Processo nº 0016621-49.2012.8.19.0066, remanesce, na Região Sul, apenas a UP de Resende como insular estabelecimento de privação de liberdade para receber os novos detentos da região, uma vez que sobre a outra unidade prisional - Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth - já recai a limitação judicial referida. Assim, a UP de Resende, dada a tendência prática e concreta de superlotação de estabelecimentos penais no Estado do Rio de Janeiro decorrente do progressivo incremento dos índices de encarceramento, desponta como único local passível de absorver a massa carcerária da região. 81. Registre-se, por oportuno, que nos meses de novembro e dezembro de 2015 e janeiro de 2016, as cidades de Volta Redonda, Barra Mansa, Barra do Piraí, Pinheiral, Porto Real/Quatis, Resende, Itatiaia, Rio das Flores e Valença registraram, conjuntamente, 352 prisões em flagrante (doc. anexo19). Operando-se com esta média de prisões - 117 novos detentos por mês -, em pouco mais de 03 meses a UP de Resende já estaria com sua capacidade ultrapassada, evidenciando a vocação que a Região Sul apresenta para sobrelotar o estabelecimento penal em voga. 82. Este quantitativo de novos detentos provoca um fluxo migratório intenso e contínuo de pessoas privadas de liberdade da Região Sul para unidades prisionais da capital do Estado. A interdição ocupacional da Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth é causa direta da superlotação de outros estabelecimentos, tais como a Cadeia Pública Pedro Melo da Silva, localizada no complexo penitenciário de Gericinó. Esta unidade sistematicamente absorve detentos oriundos da Cadeia Pública Franz de 19 Dados coletados pelo Núcleo de Cadeias Públicas e Apoio ao Preso Provisório da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Página 35 de 58 Castro Holzwarth, apresentando, atualmente, quadro de sobrelotação carcerária (§ 72, supra). Os dados numéricos 20 referentes ao ano de 2016 estampam a exuberância da transposição de detentos de um estabelecimento a outro (docs. anexos): . Marco: 126 transferências; . Abril: 90 transferências; . Maio: 82 transferências; . Junho: 101 transferências; . Julho: 87 transferências; . Agosto: 98 transferências. 83. Em apenas 06 meses, 584 pessoas privadas de liberdade da Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth foram transferidas para a Cadeia Pública Pedro Melo da Silva, contingente populacional que já seria suficiente para acarretar o extravasamento ocupacional da UP de Resende. Logo, a Região Sul fluminense ostenta a indesejável aptidão de “produzir” expressiva população carcerária acima dos limites de capacidade de seus 02 estabelecimentos penais. 84. Nestes termos, a imposição de limitação judicial quantitativa em caráter preventivo constitui providência indispensável em virtude de 03 fatores: - a Região Sul do Estado do Rio de Janeiro apresenta elevados índices de encarceramento que superam o número de vagas atualmente disponíveis na Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth e na UP de Resende; 20 Informações fornecidas pela Defensora Pública Ana Lúcia Tavares Ferreira, do Núcleo do Sistema Penitenciário da Defensoria Pública. Página 36 de 58 - a UP de Resende, a exemplo de outros estabelecimentos penais, é forte candidata a ingressar no vergonhoso rol de unidades prisionais do Estado do Rio de Janeiro que apresentam quadro de superlotação carcerária marcada pela tendência inflacionária e expansionista que se anaboliza significativamente no transcurso do tempo; - a superlotação da UP de Resende, diante dos dados e estatísticas apresentados, é uma probabilidade concreta, mormente porque a outra unidade prisional localizada na mesma região geográfica - Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth – já ostenta limitação judicial quanto à sua capacidade ocupacional e, portanto, não detém autorização para recepcionar novos detentos, remanescendo, conseguintemente, apenas a UP de Resende na condição de estabelecimento receptor de novas pessoas privadas de liberdade na Região Sul do Estado do Rio de Janeiro. 85. Não custa rememorar que a historiografia penitenciária fluminense revela a existência de unidades prisionais com aberrantes índices de superlotação – abrangendo situações nas quais o Poder Judiciário, de um modo ou de outro, deixou de opor limites ocupacionais – e estabelecimentos cujo perímetro carcerário não comporta pessoas privadas de liberdade além do quantitativo máximo – incluem-se neste grupo os 03 estabelecimentos em que a capacidade ocupacional decorre de intervenção do Poder Judiciário (§ 70, supra). 86. A UP de Resende ainda não conta com o mesmo escudo imunizador impeditivo da instalação do quadro de superlotação carcerária. Já se evidenciou à exaustão que somente a intervenção preventiva da tutela jurisdicional detém aptidão para estancar e/ou remover o excesso do contingente populacional em um estabelecimento prisional. Os Página 37 de 58 paradigmáticos casos da Cadeia Pública Hélio Gomes (§ 70, supra), da Cadeia Pública Franz de Castro Holzwarth (§ 70, supra) e do Instituto Penal Benjamim de Moraes Filho (§ 70, supra) são os exemplos positivos que estampam a imprescindibilidade da prévia intervenção do Poder Judiciário também em relação à UP de Resende. 87. ii) Privação de Liberdade. Condições de Detenção. Estado. Posição de Garante. Dever de Prevenção. 88. A privação de liberdade de uma pessoa – e neste domínio desimporta a natureza jurídica do respectivo título prisional – a coloca sob controle total21 do Estado, que o exerce de forma hierarquizada durante o período temporal de durabilidade da detenção. Esta posição de vulnerabilidade decorrente do encarceramento acarreta para o ente estatal um especial dever de tutelaem virtude da posição de garante22-23-24 que assume em face dos direitos titularizados pelas pessoas privada de liberdade. 89. A Constituição da República, tendo em mira justamente a relação de dominância que se estabelece na ambiência penitenciária e reconhecendo expressamente a condição de debilidade ôntica em que se encontram as pessoas privadas de liberdade, elegeu este seleto grupo 21 Corte IDH, Caso Bulacio Vs. Argentina, sentencia de 18 de septiembre de 2003, fondo, reparaciones y costas, § 126 e Caso Montero Aranguren y otros (Retén de Catia) Vs. Venezuela, sentencia de 5 de julio de 2006, excepcion preliminar, fondo, reparaciones y costas, § 87; no mesmo sentido, Corte EDH: “It must be further emphasised that the authorities exercise full control over a person held in custody and their way of treating a detainee must, in view of his or her vulnerability, be subjected to strict scrutiny under the Convention” (Case of Iwańczik v. Poland, Application nº 25196/94, 15 november 2001, § 53). 22 Principio I (trato humano) dos Princípios e Buenas Práticas sobre la Protección de las Personas de Liberdad em las Americas (Resolución 01/08, CIDH). 23 Corte IDH, Caso Neira Alegría y otros Vs. Perú. Fondo, sentencia de 19 de enero de 1995, § 60; Caso Yvon Neptune, § 130; Caso Montero Aranguren y otros (Retén de Catia) Vs. Venezuela, sentencia de 5 de julio de 2006, fondo, reparaciones y costas, §§ 85 y 87; e Caso Vélez Loor Vs. Panamá, sentencia de 23 de noviembre de 2010, excepciones preliminares, fondo, reparaciones, y costas, § 198. 24 A posição de garante do Estado frente à pessoas privadas de liberdade conduziu a Corte IDH a estabelecer a presunção iuris tantum da responsabilidade estatal: “Que, en virtud de la responsabilidad del Estado de adoptar medidas de seguridad para proteger a las personas que estén sujetas a su jurisdicción, la Corte estima que este deber es más evidente al tratarse de personas recluidas en un centro de detención estatal, caso en el cual se debe presumir la responsabilidad estatal en lo que les ocurra a las personas que están bajo su custodia” (Medidas Provisionales no Caso de La Cárcel de Urso Branco/Brasil, de 18 de junio de 2002, § 8º). Página 38 de 58 vulnerável como destinatário específico de protetividade constitucional. Além do valor axiológico centrado na dignidade da pessoa humana, o texto constitucional expressamente normatiza que “é assegurado aos presos a integridade física e moral25”. 90. No plano ordinário, a tutela constitucional direcionada à pessoa privada de liberdade é normativamente replicada pelo legislador: tanto o art. 38 do Código Penal26 quanto o art. 40 da LEP27 veiculam conjugadamente comandos legais de proteção à integridade física e moral daquele submetido à detenção compulsória. 91. Na esfera adventícia, o panorama não é diferente. Inúmeros tratados, convenções e resoluções de organismos internacionais dedicam-se a promover e garantir a tutela da pessoa privada de liberdade. A título exemplificativo, a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) – a que o Brasil voluntariamente aderiu28 - defere tutela específica ao detento ao prever que “toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano 29 ”, orientação convencional igualmente constante do art. 10.130 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos31 e na Regra 132 das Regras de Mandela. 92. Não se questiona, portanto, que à pessoa privada de liberdade o Estado há-de outorgar forma tratamental compatível com a 25 Art. 5º, inciso XLIX. 26 “O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral”. 27 “Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios”. 28 Decreto nº 678 de 06.11.92. 29 Art. 5.2 da CADH. 30 “Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa humana”. 31 A internalização normativa do PIDCP deu-se pelo Decreto nº 592/92. 32 “Todos os presos devem ser tratados com respeito, devido a seu valor e dignidade inerentes ao ser humano. Nenhum preso deverá ser submetido a tortura ou tratamentos ou sanções cruéis, desumanos ou degradantes e deverá ser protegido de tais atos, não sendo estes justificáveis em qualquer circunstância. A segurança dos presos, dos servidores prisionais, dos prestadores de serviço e dos visitantes deve ser sempre assegurada”. Página 39 de 58 dignidade existencial inerente a todo ser humano, incumbindo-lhe abster-se da prática de condutas que menoscabem e/ou ponham em risco de periclitação direitos fundamentais das pessoas que se encontram retidas coativamente em estabelecimentos prisionais. Em outras palavras: ao Estado, como decorrência da posição de garante, corresponde um dever de prevenção, o qual, conforme assentado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos – Corte IDH - no paradigmático Caso Velásquez Rodrigues Vs. Honduras, constitui uma obrigação do Estado consistente em “prevenir, investigar y sancionar toda violación de los derechos reconocidos por la Convención33”. 93. A contextualização tematizada do dever de prevenção referenciado à privação de liberdade resulta na consequencial obrigação de respeito e garantia dos direitos dos detentos, que, não obstante a apartação compulsória inerente à supressão temporária do direito ambulatorial, preservam “todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade 34 ” e “não atingidos pela sentença ou pela lei35”. Neste sentido, na tutela da higidez física e moral da pessoa privada de liberdade, o Estado deve garantir que “la manera y el método de privación de libertad no exceda el nivel inevitable de sufrimiento inherente a la detención36-37”. 94. Ora, a convivência forçada de 06 pessoas nas celas da UP de Resende – Capítulo 1 – e a concreta e real probabilidade da 33 Caso Velásquez Rodrigues Vs. Honduras, sentencia de 29 de julio de 1988, fondo, § 166; assim também, Caso González y otras (“Campo Algodonero”) Vs. México. excepción preliminar, fondo, reparaciones y costas, sentencia de 16 de noviembre de 2009, § 252, Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña, fondo, reparaciones y costas, sentencia de 1 de septiembre de 2010, § 63, e Caso Gomes Lund y otros (“Guerrilha do Araguaia”) Vs. Brasil, sentencia de 24 de noviembre de 2010, excepciones preliminares, fondo, reparaciones y costas, § 106. 34 Art. 40 do Código Penal. 35 Art. 3º da LEP. 36 Caso Boyce y otros Vs. Barbados, sentencia de 20 de novimebre de 2007, excepción preliminar, fondo, reparaciones y costas, § 88, e Caso Vélez Loor Vs. Panamá, sentencia de 23 de noviembre de 2010, excepciones preliminares, fondo, reparaciones y costas, § 198. 37 Na jurisprudência europeia, a Corte EDH caminha na mesma direção: “Nevertheless, under this provision the State must ensure that a person is detained in conditions which are compatible with respect for his human dignity, that the manner and method of the execution of the measure do not subject him to distress or hardship of an intensity exceeding the unavoidable level of suffering inherent in detention and that, given the practical demands of imprisonment, his health and well-being are adequately secured” (Case of Kalashnikov v. Russia, Application nº 47095/99, 15 july 2002, § 95); ainda, Case of Karalevičius v. Lithuania, Application nº 53254/99, 7 april 2005, § 34, e Case Drăgan v. Romania, Application nº 65158/09, 2 february 2016, § 69. Página 40 de 58 instalação de quadro de superlotação carcerária no estabelecimento– Capítulo 2 – caracterizam situações de lesão e conspurcação da dignidade da pessoa cuja privação da liberdade será executada na unidade prisional. 95. ii.a) Celas. Dimensão Espacial. Circularidade Interna. 96. A questão atinente ao minimum living space insere-se na pauta de organismos internacionais afetos à temática penitenciária. O Comitê para a Prevenção da Tortura do Conselho da Europa e Cruz Vermelha Internacional e outros órgãos externos – alguns providos de poder jurisdicional no âmbito internacional de protetividade de direitos humanos – veiculam regras e decisões atinentes à matéria espacial dos locais de privação de liberdade. 97. No final do ano de 2015, o Comitê para a Prevenção da Tortura do Conselho da Europa expediu recomendação em que estipula, para alojamentos coletivizados, 06,00 m2 de espaço mínimo para 01 detento e, a cada detento adicionado ao mesmo local, mais 04,00 m2, sem computar a área dos banheiros. Assim, se o local abrigar 06 pessoas privadas de liberdade – tal como se pretende em relação à UP de Resende -, o espaço deverá ser de 26,00 m2, no mínimo 38 (6+4+4+4+4+4). Significa dizer que as celas coletivas do estabelecimento estão com aproximadamente 13,00 m2 a menos do que o padrão fixado pelo CPT. 98. Aliás, segundo o CPT, as celas da UP de Resende não devem comportar simultaneamente mais do que 02 pessoas privadas de liberdade. Veja-se: 38 Living space per prisioner in prison establishmentes: CPT standards. European Committee for the Prevention of Torture and Inhuman or Degrading Treatment of Punishment, Council of Europe, CPT/Inf (2015) 44, p. 04. Página 41 de 58 “In other words, it would be desirable for a cell of 8 to 9m² to hold no more than one prisoner, and a cell of 12m² no more than two prisoners39”. 99. Por seu turno, a Cruz Vermelha Internacional também recomenda especificações mínimas para o tamanho de celas: tratando- se de habitáculo individual, o recinto deve ter 05,4 m2, não se computando o banheiro; em caso de recintos de habitação compartida, cada “condômino” deve dispor de 3,4 m2-40-41, de modo que as celas da UP de Resende deveriam ter sido engendradas com área espacial não inferior a 20,4 m2. 100. Transcorridos 60 anos desde a sua primeva edição, a Assembleia Geral da ONU aprovou, em 17.12.15, a atualização das Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos (United Nations Standard Minimum Rules for the Treatment of Prisioners), conjunto de modernas diretrizes a serem observadas pelos Estados aderentes na questão penitenciária. 101. Sob o epíteto de Regras de Mandela (The Nelson Mandela Rules), as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos da ONU veiculam relevantes paradigmas normativos de Direito de Execução Penal e, pertinente ao propósito específico ora deduzido, diretivas conformadoras mínimas sobre os ambientes de inserção da pessoa privada de liberdade em estabelecimentos penais. Neste contexto, a Regra 13 impõe a garantia de “espaço mínimo” no interior dos locais de vivência dos detentos: “Todos os ambientes de uso dos presos e, em particular, todos os quartos, celas e dormitórios, devem satisfazer as exigências 39 op.cit., p. 04. 40 Water, Sanitation, Hygiene and Habitat in Prisons: supplementary guidance. International Committee of the Red Cross. ICRC, april 2012, p. 32/33. 41 Segundo a Cruz Vermelha Internacional, mesmo em situações de marcada excepcionalidade, a área espacial de circulação das celas não deve ser inferior a 02,00 m2: “Even in exceptional crisis situations, the floor space in cells and dormitories must never be less than 2m2 per person” (Water, Sanitation, Hygiene and Habitat in Prisons, International Committee of the Red Cross. ICRC, august 2005, p. 21). Página 42 de 58 de higiene e saúde, levando-se em conta as condições climáticas e, particularmente, o conteúdo volumétrico de ar, o espaço mínimo, a iluminação, o aquecimento e a ventilação42- 43”. 102. No âmbito do sistema interamericano de direitos humanos o panorama normativo não é diferente. O Princípio XII.1 do conjunto de Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade 44 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) igualmente assegura à pessoa privada de liberdade área espacial mínima: “As pessoas privadas de liberdade deverão dispor de espaço suficiente, com exposição diária à luz natural, ventilação e calefação apropriadas, segundo as condições climáticas do local de privação de liberdade. Receberão a cama individual, roupa de cama adequada e às demais condições indispensáveis para o descanso noturno. As instalações deverão levar em conta, entre outras, as necessidades especiais das pessoas doentes, das portadoras de deficiência, das crianças, das mulheres grávidas ou mães lactantes e dos idosos”. 103. Na esfera da jurisdição da Corte Europeia de Direitos Humanos - Corte EDH - o tamanho espacial das celas e a falta de espaço nos recintos de privação de liberdade ocupam centralidade temática em inúmeros julgados da corte acerca de violações ao art. 3º da Convenção Europeia de Direitos Humanos. Assim, no Case of Karalevičius v. Lithuania, assentou o tribunal de Estrasburgo o seguinte: 42 “All accommodation provided for the use of prisoners and in particular all sleeping accommodation shall meet all requirements of health, due regard being paid to climatic conditions and particularly to cubic content of air, minimum floor space, lighting, heating and ventilation”. 43 Versão em língua portuguesa disponibilizada pelo Conselho Nacional de Justiça (disponível em http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/05/39ae8bd2085fdbc4a1b02fa6e3944ba2.pdf). 44 Disponível em http://www.oas.org/pt/cidh/mandato/Basicos/principiosPPL.asp. (captura em 20.09.16). http://www.oas.org/pt/cidh/mandato/Basicos/principiosPPL.asp Página 43 de 58 “Hence, as in those cases, the Court considers the extreme lack of space as a central factor in its analysis of compliance of the applicant's detention conditions with Article 3. The fact of the applicant being obliged to live, sleep and use the toilet in the same cell with so many other inmates was itself sufficient to cause distress or hardship of an intensity exceeding the unavoidable level of suffering inherent in detention, and arouse in the applicant the feelings of fear, anguish and inferiority capable of humiliating and debasing him45”. 104. A Corte EDH, ainda sobre o assunto, já se deparou com concretas situações em que a metragem de celas não atendia aos parâmetros espaciais fixados pelo Comitê para a Prevenção da Tortura do Conselho da Europa. No caso Case of Ostrovar v. Moldova, apurou-se que a pessoa privada de liberdade foi alocada em 02 celas distintas que ofertavam ínfimo espaço a cada detento – entre 1,78 e 2.02 m2 em um habitáculo, e entre 1,5 e 1,93 m2 em outro46. A conclusão da Corte EDH é enfática: “The Court considers that such accommodation cannot be regarded as attaining acceptable standards. In this connection it recalls that the CPT has stated in a report, drafted following a visit to Azerbaijan between 24 November and 4 December 2002, that 4 m² per prisoner was an appropriate and desirable guideline for a detention cell47-48”. 45 Case of Karalevičius v. Lithuania, Application nº 53254/99, 7 april 2005, § 39; no mesmo sentido, Case of Drăgan v. Romania, nota 10, supra, § 71. 46 “It is noted that the two cells in which the applicant was detained measured 25 m² and 15 m² (according to the applicant) and 28.4 m² and 19.3
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