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BITTENCOURT, C. F. Reflexões sobre o ensino de História. Estudos Avançados, [S. l.], v. 32, n. 93, p. 127-149, 2018. Circe Maria Fernandes Bittencourt é graduada em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - USP (1967). Mestre em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - USP (1988) e doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (1993). Atualmente é professora convidada do Programa de Pós Graduação do ProfHistória- UNIFESP- Guarulhos. Tem experiência na área de ensino de História, história das disciplinas e currículos escolares e história da educação indígena. Desenvolve pesquisas sobre história dos livros didáticos brasileiros, mantendo a organização do banco de dados LIVRES referente aos livros didáticos brasileiros de 1810 aos dias atuais na FEUSP Em seu trabalho “Reflexões sobre o ensino de História”, a professora Circe Bittencourt aborda a trajetória do ensino de História no Brasil como disciplina escolar buscando compreender as permanências e rupturas que afetaram a disciplina através da contextualização das transformações que conformaram a disciplina até a atualidade. Nesse sentido, o percurso histórico-pedagógico da disciplina é discutido no desenrolar da disputa de concepção que tem oposto posições mais avançadas ao projeto de poder de uma elite política e econômica que buscou, desde os primórdios coloniais, garantir através do controle da educação, a hegemonia no discurso histórico com fins de legitimar a exclusão dos diferentes grupos sociais que constituíram a identidade nacional. Estruturado em três blocos temáticos, o trabalho da professora Circe, analisa o ensino de História como disciplina escolar a partir de dois aspectos. A forma geral adotada pelas políticas educacionais e a concepção metodológica que determinou objetivos, conteúdos e práticas educacionais no ensino de história ao longo do tempo. Para isso faz sua abordagem do tema através da segmentação: “Ensino de história nas Humanidades clássicas”; “História entre Humanidades clássicas e Humanidades modernas”; e por fim, “O ensino de História sob um Humanismo científico?”. Essa organização permite a autora construir uma linha do tempo onde encadeia as principais mudanças na concepção da disciplina. Nesse sentido, a autora indica que desde o século XVI se percebem as raízes do processo que permite situar o surgimento do ensino de história como disciplina escolar no âmbito do currículo das Humanidades clássicas no século XIX. Entretanto, deve-se registar que esse processo de assimilação na tradição pedagógica ocidental se efetiva concomitantemente a uma reelaboração do conceito sob a perspectiva do pensamento cristão ocidental. Ou seja, a concepção humanista se articulava sob a ótica do projeto colonialista europeu que se propalava ‘civilizador’. Nesse contexto, a autora indica que na América Portuguesa o ensino escolar, sob domínio dos ‘educadores cristãos’, se prestava à promoção de uma “adesão” que buscava reproduzir as formas culturais da metrópole no território colonial para justificar ideologicamente os elementos políticos e econômicos do modelo colonial e escravista. Com essa construção se inicia a prospecção de uma elite local amparada pedagogicamente por um modelo de educação escolar que se prestava muito mais como meio de seleção social do que como instrumento para o desenvolvimento de uma cultura baseada em valores humanísticos. Somente na segunda metade do século XVIII profundas mudanças educacionais dariam lugar ao surgimento de um modelo de escrita da história concebida como “narrativa cronológica”. Esse novo modelo laicizado seria fundamental na sistematização da história dos novos Estados nacionais e na constituição do ensino da história escolar. Essa nova concepção, reelaborada numa identidade moderna, não alterou o sentido elitista da educação no Brasil. Ou seja, na invenção do Brasil permanecia o ensino de História organizado e efetivado a partir dos projetos de uma elite econômica que definia as políticas do Estado, incluindo a educacional, numa perspectiva oligárquica. Ressaltando a disputa de concepção acerca do formato educacional brasileiro que, já em 1823, buscou propor alternativas avançadas ao programa elitista através da apresentação de um projeto de sistema de educação de caráter público e desvinculado da interferência da Igreja. No âmbito dessa proposta, o ensino escolar de história se constituiria como disciplina autônoma. Reafirmada a concepção elitista, o ensino escolar da história, compreendido no contexto da renovação das Humanidades clássicas, permaneceu como elemento integrado a um projeto educativo que mantinha o antigo o papel de contribuir para a distinção cultural das classes dominantes. Circe indica que, nesse contexto, os conteúdos de uma História Universal da Civilização e o de uma História do Brasil disputavam a primazia no sentido de uma formação nacionalista na educação. No desenlace dessa disputa, a despeito de contestações, as ideias de “civilização” e de “progresso” como conceitos fundamentais no ensino de História foram incorporados e consagrados pela elite nacional sob uma ótica de alinhamento a um modelo civilizatório europocêntrico. O que marcaria a constituição da disciplina História do Brasil sob os currículos humanísticos e modernos como apêndice da história da civilização europeia. Somente em 1942 haveria o retorno da História do Brasil como disciplina escolar autônoma. Ao abordar a brusca interrupção, pelo início da ditadura civil-militar em 1964, dos movimentos de renovação curricular inseridos na perspectiva das Humanidades científicas que buscavam dar conta dos recentes desafios teóricos que se consolidavam desde a década de 1950 em de propostas de revisão, sobretudo, do ensino da História do Brasil, para que este pudesse incorporar as novas pesquisas que se multiplicavam. Destaque-se que nesse contexto, já se cristalizava uma disputa político-acadêmica que cercava a disciplina da História e que se traduzia no embate entre proposições relacionadas com o social studies. Que propunha um papel para o conhecimento histórico como elemento articulado em círculos concêntricos com a sociologia e a geografia em oposição à manutenção da História como disciplina autônoma. Nesse sentido, o período da ditadura foi marcado por retrocessos, sobretudo com o estabelecimento da imposição do ensino de Estudos Sociais em detrimento da existência autônoma da disciplina história no ensino fundamental. No secundário, o estudo de história seria mantido, porém, restrito a 2 horas de aula semanais ao longo do ano escolar. (SCHMIDT, 2012). Entre os desdobramentos do fim da ditadura e da luta pela redemocratização figura o retorno da história como disciplina escolar no ensino fundamental. Entretanto, a despeito da renovação curricular no âmbito da LDB (1996) e do PCN (1998), persiste o debate sobre a disciplina nas dimensões da cultura histórica e a cultura escolar numa perspectiva mais emancipatória. Nesse sentido, registra-se a preocupação com o soerguimento de um movimento de regresso que, sob o epíteto de conservador e expresso num discurso tecnicista, busca interferir nos conteúdos e na liberdade acadêmica do professor. E amparando-se na ideia de alinhamento às novas características do capitalismo global e tecnológico pode reconduzir o ensino de história aos já superados métodos instrucionais catequéticos e mnemônicos. Esvaziando a construção do senso crítico como elemento essencial na formação para a autonomia cidadã. Portanto, o artigo “Reflexões sobre o ensino de História”, representa uma relevante contribuição ao debate sobre o percurso da disciplina, bem como sobre a relevância das definições sobre seu currículo. Uma leitura que, por sua conexão com os desafios da atualidade, possui significativo valor acadêmico e que certamenteinteressará a todos aqueles que desejem uma introdução ao tema. Referências BITTENCOURT, C. F. Reflexões sobre o ensino de História. Estudos Avançados, [S. l.], v. 32, n. 93, p. 127- 149, 2018. DOI: 10.5935/0103-4014.20180035. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/eav/article/view/15 2562. Acesso em: 27 ago. 2021. CNPQ. Currículo Lattes. BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Disponível em <http://lattes.cnpq.br/344 8016715234781>. Acessado em 27/08/2021 SCHMIDT, Maria Auxiliadora Moreira dos Santos. História do ensino de história no Brasil: uma proposta de periodização. Revista História da Educação, vol. 16, núm. 37, mayo-agosto, 2012, pp. 73-91. Associação Sul- Rio-Grandense de Pesquisadores em História da Educação Rio Grande do Sul, Brasil. Disponível em <https://seer.ufrgs.br/index.php/asphe/article/view/24245>. Acessado em 29/08/2021