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DOR ONCOLÓGICA OBJETIVO 01- DISCUTIR OS ASPECTOS FISIOPATOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOR NEOPLÁSICA DOR CAUSADA PELO TUMOR INFILTRAÇÃO ÓSSEA A infiltração óssea tumoral é a causa mais comum de dor no câncer, podendo manifestar-se localmente ou à distância, pelo mecanismo de dor referida. As metástases ósseas mais comuns são as provenientes dos tumores de mama, próstata e pulmão. A dor óssea é comum nos pacientes com mieloma múltiplo. Ela ocorre por conta de estimulação nociva nos nociceptores no periósteo. O crescimento tumoral ou as fraturas secundárias podem ocasionar lesão, compressão, tração ou laceração das estruturas nervosas, ocasionando dor isquêmica, dor neuropática periférica ou dor mielopática. A dor óssea se manifesta com sensação de dolorimento constante, profundo, às vezes contínuo, e surge com os movimentos (dor incidental). COMPRESSÃO OU INFILTRAÇÃO DE NERVOS PERIFÉRICOS A infiltração ou compressão de troncos, plexos e/ou raízes nervosas pelo tumor, linfonodos e/ou fraturas ósseas metastáticas pode determinar dor aguda de forte intensidade, resultando em plexopatia, radiculopatia ou neuropatia, ou seja, dor na distribuição da estrutura nervosa acometida, com apresentação de dor em queimação, contínua, hiperestesia, disestesia e perda progressiva da sensibilidade. As neoplasias de cabeça e pescoço ou as lesões metastáticas para os linfonodos cervicais podem comprimir os plexos cervicais, ocasionando dor local lancinante com disestesia, irradiada para a região da nuca ou retroauricular, ombro ou mandíbula. O comprometimento do plexo braquial ocorre em 2,5 a 4,5% dos pacientes com tumores de mama, ápice de pulmão e linfomas (metátases axilares e supraclaviculares), ocasiona dor no ombro e braço no dermátomo das raízes nervosas de C8-T1; o diagnóstico diferencial deve ser feito entre plexopatia induzida pelo tumor ou plexopatia induzida pela radiação. A síndrome de Horner pode surgir quando houver invasão ou irradiação da cadeia simpática cervical, como no gânglio estrelado; a inervação simpática ascende do pescoço para a cabeça junto à carótida, ocorrendo o fenômeno de anidrose, enoftalmia, ptose palpebral e midríase no lado acometido. A plexopatia sacrolombar é comum em neoplasias de colo uterino e próstata, sarcoma da pelve e metástases de tumores distantes. Essa plexopatia produz dor caracterizada como sensação de peso, pressão e queimação, inicialmente na região sacral, região posterior da coxa e região perineal, associada ou não a alterações da função esfincteriana anal e vesical, e, posteriormente, na panturrilha e calcanhar. Nesses casos, estão envolvidos mecanismos de dor por nocicepção, gerado por persistente estímulo nocivo (lesivo) mecânico de alta intensidade pela expansão tumoral e mecanismos de desaferentação pela lesão dos nervos e membranas nervosas. INFILTRAÇÃO DO NEUROEIXO (SNC). Pode ocorrer dor por invasão tumoral na medula espinal, no encéfalo e em suas meninges. A dor radicular surge por compressão ou infiltração da medula espinal, com alteração motora, sensitiva e autonômica distais ao local da lesão. Podemos observar, além da dor radicular, a primeira manifestação do comprometimento raquimedular, a dor mielopática localizada e a dor-fantasma. A compressão medular é uma urgência médica, necessitando de tratamento de radioterapia ou descompressão cirúrgica ao menor sinal de compressão da medula, como fraqueza de membros inferiores, diminuição do tato e disfunção de esfincteres; devendo ser diagnosticada por meio da identificação do local da compressão e invasão do canal raquidiano pela tomografia computadorizada (TC), ressonância magnética (RM) ou perimielografia. A cefaléia insidiosa e progressiva surge como manifestação das metástases encefálicas. Se há hemorragia pela lesão causal, a dor instala-se subitamente, agravando-se com o decúbito horizontal, tosse ou espirro; piora durante o sono, melhora com a postura ortostática e vem acompanhada de náuseas e vômitos. Com o progredir da lesão encefálica, podem ocorrer sonolência, confusão mental, convulsões e coma. A carcinomatose das meninges manifesta-se em 3 a 8% dos pacientes com neoplasias, especialmente de mama, pulmão e melanomas, sob forma de cefaléia e comprometimento das funções dos nervos cranianos e espinais, em 50 a 75% das vezes. É diagnosticada pelo exame do líquido cerebrospinal, que evidencia hiperproteinorraquia, hipoglicorraquia e/ou hipercitose, e também pela TC ou RM do encéfalo e do canal raquidiano. Tem prognóstico sombrio pela natureza agressiva do tumor e de suas metástases. INFILTRAÇÃO E OCLUSÃO DE VASOS SANGÜÍNEOS E LINFÁTICOS. As células tumorais podem infiltrar e/ou ocluir os vasos sangüíneos e linfáticos, ocasionando vasoespasmo, linfangite e possível irritação nos nervos aferentes perivasculares. O crescimento tumoral nas proximidades dos vasos sangüíneos leva à oclusão desses vasos parcial ou totalmente, produzindo estase venosa ou isquemia arterial, ou ambos. A isquemia causa dor e claudicação. A estase venosa produz edema nas estruturas supridas por esses vasos, determinando distensão dos compartimentos faciais e de outras estruturas nociceptivas. A oclusão arterial produz isquemia e hipoxia com destruição celular. Esses mecanismos causam dor normalmente difusa, cuja intensidade aumenta com a progressão do processo. INFILTRAÇÃO DE VÍSCERAS OCAS OU INVASÃO DE SISTEMAS DUCTAIS DE VÍSCERAS SÓLIDAS. A oclusão de órgãos dos sistemas digestório, urinário e reprodutivo (estômago, intestinos, vias biliares, ureteres, bexiga e útero) produz obstrução do esvaziamento visceral e determina contratura da musculatura lisa, espasmo muscular e isquemia, produzindo dor visceral difusa (tipo cólica) constante, com sensação de peso ou pobremente localizada, referida nas áreas de inervação da víscera comprometida. Órgãos como linfonodos, fígado, pâncreas e supra-renais podem vir a apresentar dor devido à isquemia ou distensão de suas cápsulas. Essas vísceras sólidas também podem apresentar quadro álgico por obstrução de seus sistemas ductais. Nos tumores de fígado, baço, rim e ósseos, o edema e a venocongestão ocasionam distensão das estruturas de revestimento e estruturas nociceptivas. Nos tumores de cabeça e pescoço (boca, orofaringe, lábio e face), tumores do trato gastrintestinal e geniturinário, podem ocorrer ulceração das membranas mucosas, infecção e necrose, e ulceração determinando dor intensa. TIPOS DE DOR As síndromes dolorosas podem ser agudas ou crônicas, nociceptivas, neuropáticas, psicogênicas e/ou mistas. A dor no câncer tem as características da dor crônica ou persistente, sendo decorrente de processo patológico crônico, podendo envolver estruturas somáticas ou viscerais, bem como estruturas nervosas periféricas e/ou centrais, isoladas ou em associações, cursando com dor contínua ou recorrente por meses ou anos. A natureza da dor nociceptiva somática é descrita como dolorosa, latejante, pulsátil ou opressiva. A dor visceral é do tipo cãibra ou cólica, aperto ou latejante. A intensidade da dor relaciona-se geralmente ao estágio da doença, podendo apresentar períodos de remissão com a terapêutica neoplásica e de piora com recidivas e progressão da doença. Pode cursar com episódios de dor aguda, resultantes de procedimentos diagnósticos, cirurgias paliativas, fraturas, obstruções viscerais ou arteriais e agudizações da doença. A dor pode ser um dos primeiros sinais da doença, não sendo necessário aguardar o diagnóstico definitivo, como, por exemplo, o resultado histopatológico de uma biópsia já realizada para dar início à terapia antálgica. Retardar o tratamento causa mais sofrimento ao paciente. A dor por excesso de nocicepção (nociceptiva) é a mais comum no câncer. É causada por estímulos aferentes de grande intensidade,nocivos ou lesivos, produzidos por processo inflamatório ou infiltração de tecidos pelo tumor, capazes de atingir o alto limiar de excitabilidade do nociceptor e gerar a dor. A dor nociceptiva ocorre como resultado da ativação e sensibilização dos nociceptores em tecidos cutâneos e profundos, localizados preferencialmente na pele, músculo, tecido conjuntivo, osso e víscera torácica ou abdominal. A dor é denominada neuropática se a avaliação sugerir que é mantida por processos somatossensoriais anormais no sistema nervoso periférico (SNP) ou central (SNC). Ela surge quando há disfunção do SNP e/ou do SNC, por invasão tumoral ou pelo tratamento do câncer (cirur- gia, radioterapia e/ou quimioterapia). A fisiopatologia da dor por desaferentação ainda não está completamente esclarecida. A dor neuropática é uma das duas principais manifestações dolorosas crônicas, não havendo, geralmente, nenhum dano tecidual. O que ocorre é uma disfunção das vias que transmitem dor, levando a uma transmissão crônica dos sinais dolorosos. A injúria neural, que produz dor neuropática, pode ser óbvia ou oculta, podendo ocorrer em qualquer nível das vias nociceptivas periféricas ou centrais. As propriedades funcionais dos nervos e das unidades centrais precisam ser mantidas íntegras, para que o processamento central da informação nociceptiva ocorra de modo adequado. Havendo qualquer modificação na função das terminações nervosas periféricas, das vias de condução ou do processamento central da informação nociceptiva (estimulação aferente), não chega a ser incomum que a dor espontânea ou gerada por estímulos não-nocivos venha a se manifestar. Como a dor por desaferentação não aparece em todos os pacientes com lesões similares, admite-se que haja fatores genéticos envolvidos em sua ocorrência. Um exemplo disso é a dor do membro-fantasma, que pode ocorrer após uma amputação. O diagnóstico da dor neuropática é baseado na descrição verbal de dor do paciente, no exame físico e na suspeita de lesão nervosa. A dor é descrita pelos pacientes como ardor, formigamento ou choque elétrico. A dor pode ser definida como psicogênica se houver evidência positiva de que os fatores psicológicos predominam na manutenção do sintoma sem nenhuma evidência de causa orgânica. O evento conhecido como dor incidental, ou breakthrough pain, ocorre quando o controle da dor basal é alcançado, e, ainda assim, o paciente apresenta episódios de dor em picos, de início súbito e agudo. Pode ocorrer espontaneamente ou estar relacionado aos movimentos (pacientes com infiltração óssea), como também pode ocorrer em conseqüência de prescrição analgésica com doses e intervalos inadequados. Essa condição leva o paciente à apreensão e à descrença no tratamento. A intervenção terapêutica consiste na administração de doses de analgésicos de ação rápida, reavaliação do esquema regular, fornecimento de opióide de ação curta antes de atividades dolorosas, evitando falha da última dose. É necessário encontrar um equilíbrio entre a melhor dose analgésica e a presença de efeitos colaterais suportáveis. OBJETIVO 02- DEFINIR E CARACTERIZAR ANESTESIA GERAL, LOCOREGIONAL E BLOQUEIOS ANESTESIA GERAL Etimologicamente, anestesia significa ausência de dor. Porém, conceitualmente, sua definição é mais ampla. A anestesia geral refere-se a um estado de inconsciência reversível, obtido pela administração de fármacos específicos e acompanhado de imobilidade, analgesia, bloqueio dos reflexos autonômicos e amnésia. Os quatro componentes da anestesia geral são: 1. Hipnose; 2. Analgesia; 3. Relaxamento Neuromuscular; 4. Bloqueio Neurovegetativo. A hipnose limita-se à ausência da consciência e não é necessariamente acompanhada de analgesia. A grande maioria dos fármacos hipnóticos não é analgésica. Pode- se ter o sono profundo induzido, como no coma barbitúrico, com manutenção da resposta fisiológica à dor, como a ativação do sistema nervoso autônomo. Ocorre apenas a perda da consciência da dor, obtida com técnicas de sedação ou anestesia geral. Analgesia é o alívio ou a ausência da dor. Pode ser obtida com o uso de anestesia local, com bloqueios centrais ou regionais que impedem o estímulo de atingir o sistema nervoso central ou por meio da utilização de fármacos analgésicos como opióides e cetamina, utilizados na anestesia geral. O relaxamento muscular facilita procedimentos como a intubação traqueal e cirurgias abdominais ou torácicas, que são mais facilmente realizadas com a diminuição do tônus muscular. Em outras situações, o relaxamento muscular pode aumentar a segurança do procedimento cirúrgico, como em cirurgias oftalmológicas e neurológicas, em que a mínima movimentação ou a reação motora do paciente pode provocar lesões graves, impondo até mesmo risco à vida. O relaxamento muscular pode ser alcançado por meio de bloqueios centrais e regionais ou pelo uso de altas concentrações de anestésicos inalatórios. Na anestesia geral, também podem ser utilizados fármacos bloqueadores neuromusculares (curares), desprovidos de qualquer efeito analgésico ou hipnótico. O bloqueio neurovegetativo é secundário a analgesia e hipnose adequadas. Consiste na atenuação da resposta do sistema nervoso autônomo ao estímulo cirúrgico. Na ausência de adequado plano anestésico, o estímulo cirúrgico pode promover elevação da frequência cardíaca, da pressão arterial, sudorese, midríase, aumento do fluxo sanguíneo cerebral, liberação de glucagon e cortisol séricos e aumento dos níveis circulantes de catecolaminas e glicose. O adequado bloqueio neurovegetativo durante a anestesia pode prevenir inúmeras complicações, principalmente cardiovasculares, e contribuir para a melhor evolução pós-operatória do paciente. Durante a anestesia geral é necessário assistência ventilatória, visto que os opioides deprimem o centro respiratório e os bloqueadores neuromusculares paralisam os músculos respiratórios. Dependendo da duração da cirurgia e do ato anestésico, assegura-se a via aérea com intubação traqueal (na maioria dos casos) ou com outro dispositivo (p. ex., máscara laríngea). Pode ser dividida em três fases: 1. Indução: período que compreende desde a administração do anestésico até o início do procedimento cirúrgico; 2. Manutenção: entre o início e término do procedimento; 3. Fase de emergência ou do despertar: reversão da anestesia, período em que o paciente começa a cordar. Tipos de anestesia geral: 1. Inalatória; 2. Endovenosa; 3. Balanceada; ANESTESIA INALATÓRIA ● Apenas os anestésicos inalatórios permitem, em uso isolado, a obtenção dos quatro componentes da anestesia geral. Na maioria das vezes, utiliza-se a associação de agentes anestésicos via inalatória e via venosa, em técnica conhecida como anestesia balanceada. ● Os anestésicos inalatórios são administrados e eliminados pelos pulmões, o que é uma grande vantagem em relação aos anestésicos venosos, pois é possível ter um controle maior e uma modificação rápida da profundidade anestésica. Eles têm ação principalmente no SNC, no qual há inibição da percepção da dor. ● O anestésico inalado é absorvido nos capilares pulmonares e transportado até a barreira hematoencefálica, que é livremente permeável a esses fármacos, com rápida ação cerebral. Uma das propriedades mais importantes de um agente anestésico é a rápida indução e a recuperação do efeito da anestesia, que são determinadas pela solubilidade no sangue e lipossolubilidade. Ao contrário, agentes com pequeno índice de partição sangue/gás produzem indução e recuperação rápidas, como o óxido nitroso, que tem menor solubilidade. ● Logo, um agente muito solúvel no sangue leva um tempo maior para atingir a saturação alveolar e consequentemente produz indução e recuperação lentas. Ele também é depositado no tecido adiposo,o que retarda o tempo de recuperação anestésica, podendo produzir ressaca prolongada quando utilizado em cirurgia demorada (p. ex., o halotano). ● Alguns anestésicos são metabolizados predominantemente no fígado. Isso não é importante para a duração de sua ação, mas contribui para sua toxicidade. ● Os anestésicos inalatórios mais utilizados são óxido nitroso, isoflurano, sevoflurano e desflurano. ● Certamente os anestésicos inalatórios são os agentes mais utilizados, em associação, na fase de manutenção da anestesia. Contribui para isso a facilidade de administração via inalatória e a segurança na manutenção do plano anestésico, evitando consciência intraoperatória e possibilitando ajustes de forma previsível, a despeito de idade ou de composição corporal, por exemplo. Além disso, essa técnica tem demonstrado alguns efeitos benéficos, como proteção orgânica e preservação do débito cardíaco e do fluxo cerebral. Por outro lado, a ausência de ação analgésica e a associação com náusea e vômito no pós-operatório obrigam o cuidado na sua utilização. Embora os anestésicos inalatórios tenham efeito relaxante muscular, seu uso exclusivo para obtenção desse efeito durante a cirurgia é limitado, necessitando de altas doses. Na maioria dos casos de anestesia geral, utilizam-se fármacos específicos para obtenção do relaxamento muscular. ANESTÉSICOS VENOSOS ● Os anestésicos venosos agem rapidamente, produzindo inconsciência em cerca de 20 segundos, tão logo o fármaco alcance o cérebro, sendo utilizados para indução e manutenção da anestesia. ● As condições clínicas do paciente devem ser levadas em consideração para o ajuste adequado das doses de indução dos anestésicos intravenosos. Por exemplo, idade avançada, doenças preexistentes (hipovolemia, hipotireoidismo), pré-medicação (benzodiazepínicos) e coadministração de fármacos adjuvantes (como opioides) diminuem a dose necessária para indução. ● Os anestésicos voláteis são muito usados para a manutenção da anestesia por conta de suas características de rápida reversibilidade e fácil administração, porém a disponibilidade de medicamentos intravenosos com início de ação mais rápido e recuperação mais curta permite a produção de um estado de anestesia comparável aos inalatórios. Além disso, o uso exclusivo de anestésicos intravenosos para manter a anestesia (TIVA) tem mostrado vantagens em relação ao uso de anestesia inalatória: diminuição da dor pós-operatória e nível de recuperação melhor em pacientes submetidos à cirurgia bariátrica. Entretanto, as técnicas TIVA são mais caras que a técnica inalatória ou a de anestesia balanceada. ● São usados anestésicos não opioides (barbitúricos, cetamina, droperidol, etomidato, propofol e benzodiazepínicos), opioides (fentanil, alfentanil etc) e bloqueadores neuromusculares. ANESTÉSICOS LOCAIS ● São um grupo de fármacos que bloqueiam a condução nervosa de forma reversível em tecidos eletricamente excitáveis, determinando bloqueio tanto das funções motora e sensitiva como da autonômica. ● Os anestésicos locais (ALs) agem em canais iônicos da membrana celular e impedem que a célula gere potenciais de ação e que, portanto, haja estímulo nervoso. A principal teoria para a ação dos ALs é a de que eles entram na célula pela matriz lipídica da membrana, ligam-se à face interna dos canais de Na+ e os inativam. ● Os ALs são administrados no tecido subcutâneo, no espaço subdural ou subaracnóideo e, por isso, a sua absorção depende basicamente da vascularização do local de injeção, da dose administrada, de características farmacológicas do AL e da adição de agentes vasoativos. O fármaco não deve ser administrado na via intravascular (ou seja, deve-se sempre aspirar o conteúdo do local antes de injetar, realizar a dose- teste padronizada e injetar em pequenas doses seguidas). ● Os anestésicos locais são utilizados em uma variedade de situações clínicas, entre elas, as mais comuns são as anestesias regionais e analgesias. As técnicas incluem: ♥ Anestesias peridurais e subaracnóideas – bloqueio de raízes nervosas, principalmente para cirurgias de abdome, pelve e membros inferiores; ♥ Anestesias regionais intravenosas – injeção intravenosa distalmente a um manguito de pressão, usada para cirurgia de extremidades; ♥ Anestesia infiltrativa – injeção direta com o objetivo de alcançar ramos e terminações nervosas, usada em pequenas cirurgias; ♥ Bloqueios nervosos periféricos – injeção próxima a troncos nervosos, produzindo perda de sensibilidade periférica; ♥ Cateteres espinais e peridurais de longa duração – infusões contínuas para analgesias prolongadas; ♥ Anestesia tópica – em vias aéreas, cavidade oral, córnea, trato urinário e pele. É útil principalmente em pequenos procedimentos, como intubação, introdução de cateteres intravenosos ou punção dural. ANESTÉSICOS REGIONAIS ● Quando se compara a incidência de mortalidade e complicações nos pacientes submetidos a bloqueio espinal, seja por peridural ou raquidiana, observa-se menor risco de trombose venosa profunda, tromboembolismo pulmonar, sangramento, falência renal, infarto do miocárdio, pneumonia, depressão respiratória e necessidade de transfusão em relação aos procedimentos realizados com anestesia geral. Já a mortalidade pode ser reduzida em até um terço, sendo que essa redução é mais pronunciada nos casos em que a analgesia promovida pelo bloqueio prolonga-se para o pós-operatório. ● O bloqueio regional também é vantajoso na prevenção de complicações no pós- operatório: sabe-se que o emprego da anestesia regional é capaz de levar a diminuição da dor, náuseas, vômitos, necessidade de opioides no pós-operatório, além de diminuir o tempo de internação hospitalar e antecipar a alta dos pacientes. ● O local da punção depende da região a ser bloqueada. Em muitas anestesias, a punção é realizada na região lombar, sendo que para localização do nível da punção utiliza-se uma linha imaginária entre as bordas superiores das cristas ilíacas (linha de Tuffier) como referência para a vértebra L4. ● Em plano mais profundo, está o espaço peridural. Quando o anestésico é injetado nesse espaço, trata-se de um bloqueio peridural, também conhecido como epidural. ● Na transição entre a aracnoide e a pia-máter, localiza-se o espaço subaracnóideo, que contém o líquido cefalorraquidiano (LCR), as pequenas artérias que fornecem sangue à superfície externa do sistema nervoso, a medula espinal e a cauda eqüina (cone medular e as raízes nervosas lombares, sacrais e coccígeas), revestidas pela pia- máter. Quando o anestésico é injetado nesse espaço, trata-se de um bloqueio subaracnóideo, também chamado de raquidiano ou raquianestesia. ● Vale salientar que a medula espinal termina em L1 nos adultos, enquanto em crianças pode terminar em L2 e, nos recém-nascidos, em L3. ● Finalmente, características físicas como peso, altura e volume do líquido cefalorraquidiano, além da idade, modificam os efeitos do bloqueio subaracnóideo ou do peridura RAQUIANESTESIA ● É uma anestesia regional realizada por meio da introdução de um anestésico local (AL) no espaço subaracnóideo, sendo indicada em intervenções nos membros inferiores, região perineal e abdome. ● A agulha deve ficar posicionada abaixo de L2-L3, para não haver risco de lesão da medula espinal. A agulha deverá transfixar progressivamente pele, tecido subcutâneo, ligamento supraespinal, ligamento interepinal, ligamento amarelo, dura-máter e aracnoide. Deve-se detectar a penetração na dura-máter e obter o gotejamento de um líquido claro (liquor) pela agulha, indicando punção bem-sucedida. ● Ocorre o bloqueio reversível da condução nervosa, provocando analgesia associada a bloqueio motor e simpático. ● As complicações decorrentes dessa técnica anestésica podem ser maiores, especialmenteas lesões neurológicas: meningite e lesão da cauda equina, por exemplo; ou podem ser menores, como hipotensão arterial, depressão ventilatória decorrente de bloqueio alto, cefaleia pós-punção (25% dos pacientes – por perda do LCR o que diminui a pressão liquórica) e lombalgia. ● Três tipos: (1) raquianestesia simples – utiliza-se uma única dose de anestésico local; (2) bloqueio combinado – raquiperidural – introdução da agulha de raqui e, em seguida, o cateter de peridural; (3) raquianestesia contínua – é inserido um cateter subaracnóide. ANESTESIA PERIDURAL ● É uma anestesia regional com administração de anestésico local (AL) no espaço peridural da coluna vertebral, sendo comumente empregada nas cirurgias de membros inferiores, região perineal, abdome e tórax. ● Trabalhos recentes mostram o benefício do bloqueio regional no controle álgico no pós-operatório, reduzindo o tempo de internação hospitalar e a morbidade associada ao pós-operatório. ● As agulhas peridurais são de grosso calibre, de ponta romba (agulha de Tuohy) e possuem abertura lateral. Elas permitem a passagem do cateter peridural, possibilitando a administração de AL em doses fracionadas e por tempo prolongado, técnica chamada de anestesia peridural contínua, utilizada em cirurgias de longa duração, analgesia pós-operatória e controle de dor crônica. ● O bloqueio pode ser realizado em qualquer espaço intervertebral. Porém, os processos espinhosos mais angulados em T2 a T8 tornam o espaço mais estreito, dificultando a punção. Entre C7 a T1 e T1 a T2 a punção é semelhante à da região lombar. ● O espaço pode ser facilmente identificado pela técnica de Dogliotti, em que há o deslizamento do êmbolo para dentro da seringa após perda súbita de resistência. Também pode ser identificado pela técnica da “gota pendente” de Gutierrez, colocando-se uma gota de solução fisiológica dentro do canhão da agulha, que será aspirada em decorrência da pressão negativa do espaço peridural. ● O mecanismo de ação dos bloqueios peridurais é semelhante ao da raquianestesia (ou seja, bloqueio reversível da condução nervosa). Porém, como o AL não entra em contato direto com a medula espinal e por causa das estruturas vasculares no espaço peridural, a anestesia peridural requer maiores quantidades do anestésico. Assim, a ação do AL é diminuída e os efeitos sistêmicos são maiores. (EX: cirurgia abdominal, a dose do bloqueio subaracnóideo é de 20 mg de bupivacaína hiperbárica, enquanto na peridural essa dose é seis vezes maior). ● O início do bloqueio é mais lento do que na anestesia subaracnóidea e a intensidade do bloqueio sensitivo e motor é menor. Não prejudica a mecânica respiratória e por isso apresenta menor incidência de complicações respiratórias. Aracnóide – Peridural combinada Essa técnica é utilizada para bloqueio do neuroeixo, associando os bloqueios peridural e subaracnóideo. Sua singularidade consiste em ser capaz de combinar a rapidez e confiabilidade do bloqueio subaracnóideo com a flexibilidade do bloqueio peridural contínuo no pós-operatório. ● Tanto o bloqueio subaracnóideo como o peridural possuem suas vantagens e desvantagens, o que torna cada técnica mais adequada dependendo do paciente e do procedimento. Estudos controlados que comparam as duas formas de bloqueios mostram que a anestesia subaracnóidea leva menos tempo para ser realizada, produz um controle mais adequado do bloqueio sensomotor e está associada a menos dor durante o ato operatório. Entre as principais vantagens da peridural, cita-se menor risco de cefaleia pós-punção, menor incidência de hipotensão, possibilidade de prolongar ou estender o bloqueio por meio do manejo do cateter e a opção de usá-lo para analgesia pós-operatória. BLOQUEIO DE NERVOS PERIFÉRICOS ● O bloqueio das fibras nervosas periféricas obedece comumente a seguinte ordem: desaparecimento da sensação térmica, seguida da proprioceptiva, função motora, sensibilidade dolorosa e, por último, sensação de pressão ou toque. ● Podem ser usados como técnica anestésica única, combinados com anestesia geral ou utiliza- dos para controle da dor pós-operatória. ● O bloqueio do plexo braquial vem sendo cada vez mais difundido, sendo hoje parte da rotina anestésica diária. A introdução do estimulador de nervos periféricos e o uso da ultrassonografia possibilitaram o aprimoramento das técnicas e a redução de complicações, facilitando o aprendizado e sua execução por parte dos anestesiologistas. ● Como qualquer outra técnica de anestesia, os bloqueios periféricos apresentam indicações específicas, não substituindo os bloqueios centrais. No entanto, quando utilizados de maneira racional, promovem benefícios e condições satisfatórias para a realização da maior parte das cirurgias unilaterais; portanto, essas técnicas são importantes elementos do arsenal anestésico, visto que: 1. Não promovem os efeitos colaterais dos bloqueios centrais – bloqueio simpático maciço (hipotensão e bradicardia), cefaleia pós-raquianestesia, meningite, absces- sos e hematomas no neuroeixo; 2. Não necessitam do uso de drogas coadjuvantes, evitando-se os seus respectivos efeitos colaterais (opioides: depressão respiratória, prurido, retenção urinária, náuseas e vômitos; alfa-2-agonista: sedação e hipotensão); 3. Promovem analgesia pós-operatória prolongada, podendo estender-se por 18 +/- 6 horas; 4. podem ser utilizados exclusivamente no pós-operatório, promovendo excelente analgesia e substituindo outras abordagens com mais efeitos colaterais, reduzindo a estadia hospitalar, além de náuseas e vômitos e contribuindo para mobilização mais precoce; 5. Possibilitam o uso de técnicas de analgesia controlada pelo paciente, reduzindo o consumo de analgésicos via sistêmica; 6. Podem ser utilizados em pacientes ambulatoriais, não retardando a alta hospitalar. Referência: anestesiologia básica – USP OBJETIVO 03- RECONHECER A ESCADA ANALGÉSICA DE DOR DA OMS Existem cada vez mais evidências de que o controle dos sintomas relacionados ao câncer contribui para melhora da sobrevida, destacando-se o controle da dor, com impacto direto na qualidade de vida. O controle efetivo da dor requer não apenas a utilização de analgésicos, mas também a atuação de equipe multidisciplinar para alívio de vários sintomas associados. Decisões clínicas apropriadas requerem avaliação abrangente do quadro doloroso: localização, intensidade, frequência, características distintivas, fatores de piora e de alívio, experiências vividas como conseqüência da dor, tratamento atualmente utilizado e resposta a tratamentos anteriores. É importante avaliar a dor além da intensidade e entendê-la dentro de um determinado contexto. A utilização de ferramentas estruturadas de avaliação (p. ex.: Breve Inventário de Dor, Questionário DN4) ajudam a compreender o impacto e o sofrimento desencadeados pela dor e, consequentemente, a elaboração do plano terapêutico. Uma vez definida a fisiopatologia subjacente, tratamento específico deve ser iniciado. Não é raro que pacientes oncológicos apresentem quadros de dor mista, em que estão presentes tanto o componente nociceptivo quanto o neuropático. Em situações de dor nociceptiva são utilizados agentes anti-inflamatórios não esteroidais [AINEs] (p. ex.: diclofenaco, ibuprofeno, naproxeno), adjuvantes (p. ex.: anticonvulsivantes, antidepressivos, anestésicos tópicos) associados a opioides fracos (p. ex.: codeína, tramadol) ou fortes (p. ex.: buprenorfina, hidromorfona, metadona, morfina, oxicodona), de acordo com a escada analgésica recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Para situações de dor neuropática, os anticonvulsivantes, antidepressivos, antipsicóticos, ansiolíticos têm papel fundamental e são comumente utilizados. Os opioides também devem ser usados para tratamento de dor neuropática; sendo, portanto, considerados analgésicosde “amplo espectro”. Analgésicos adjuvantes devem ser utilizados (p. ex.: anticonvulsivantes, antidepressivos, ansiolíticos, AINEs) para proporcionar melhor alívio da dor, graças a seus diferentes mecanismos de ação. Se a dor for controlada de maneira satisfatória, deve-se reavaliar periodicamente o paciente e ajustar as medicações de acordo com o quadro álgico; caso o controle da dor não seja satisfatório, deve-se reavaliá-lo a cada 30 minutos, seguir os protocolos de titulação de dose de opioides e considerar a hospitalização quando justificável. Para pacientes com dor intermitente, os opioides de ação breve podem ser suficientes. Entretanto, para aqueles com dor contínua ou com combinação de dor contínua e piora intermitente há indicação de iniciar com opioides de ação prolongada. Os opioides de ação prolongada, como a oxicodona ou a morfina, ambas de liberação lenta, têm início de ação em cerca de 1 hora, atingem efeito máximo em 3-4 horas, com duração de 8-12 horas. Para a escolha apropriada da dose dos opioides de ação prolongada, algumas etapas devem ser seguidas. Primeiro, determinar a dose total diária do opioide de ação curta necessária para analgesia adequada. Segundo, escolher a forma de preparação para a ação prolongada. Finalmente, converter a dose do opioide de ação curta para a dose correspondente da preparação de ação prolongada. Comumente utiliza-se morfina ou oxicodona em preparação de ação curta, já que ambas possuem apresentação com ação prolongada de baixo custo e bem tolerada. Ao utilizar morfina ou oxicodona, a dose total diária do opioide de ação curta pode ser diretamente convertida para a preparação de ação prolongada. Por exemplo, um paciente requerendo 5 mg de oxicodona a cada 3 horas consome um total de 40 mg do medicamento em 24 horas. Esse paciente pode iniciar com 20 mg de oxicodona de ação prolongada a cada 12 horas. Alternativamente, se o paciente necessitar de outro opioide de ação prolongada, é possível determinar a dose correta usando tabelas de equivalência analgésica. Ao trocar o opioide do paciente, é importante considerar a possibilidade de tolerância cruzada incompleta e reduzir a dose do novo opioide em 25 a 50%. FARMACOCINÉTICA Quando se discute a farmacocinética dos opióides, é importante dividi-los em dois tipos — os hidrofílicos e os lipofílicos. As principais diferenças entre os opióides hidro- fílicos e lipofílicos estão nos seus perfis farmacocinéticos e metabólicos. OPIOIDES HIDROFÍLICOS Morfina, codeína , hidrocodona, oxicodona e hidromorfona são exemplos de opióides hidrofílicos clinicamente úteis. Os opióides hidrofílicos compartilham um perfil farmacocinético similar. A biodisponibilidade oral dos opióides hidrofílicos varia de 35 a 70%. Há um extenso efeito de primeira passagem hepático. Por causa desse efeito, a conversão da administração oral para parenteral requer uma redução por um fator de aproximadamente três. Por exemplo, 30 mg de morfina oral devem ser convertidos em 10 mg de morfina EV. A morfina tem um metabólito ativo, o morfina-6-glicu- ronídio (M6G), que é ainda mais potente do que a própria morfina. O M6G deve ser depurado no rim. Quando a depuração de creatinina está comprometida, o M6G pode acumular-se e causar neurotoxicidade por opióide (p. ex., mioclonia, delírio, convulsões). Acredita-se que outros opi- óides hidrofílicos possam também ter metabólitos depura- dos pelo rim que causam toxicidade com a acumulação. Quanto aos opióides hidrofílicos de ação curta, o tempo para a concentração sérica máxima (Cmáx.) depende da via de administração: VO, a Cmáx. é de 60 min; SC, a Cmáx. é de 30 min; IV; a Cmáx. é de cerca de 6 min. A meia-vida dos opióides hidrofílicos é de aproximadamente 4 h. Os níveis em equilíbrio são alcançados após 4 a 5 meias-vidas, ou seja em16a20h. Esses opióides de curta ação podem estar sujeitos aos efeitos de injeção de bolos. Os pacientes podem experimen- tar efeitos colaterais quando os níveis séricos são máximos e ainda ter, mais tarde, recorrência da dor quando os níveis mínimos se aproximam, antes do momento programado para a nova dose. A infusão contínua ou os opióides de longa duração são necessários para evitar esses efeitos da injeção em bolus. Exemplos de formas de opióides hidrofílicos de ação prolongada são a morfina, a oxicodona e a hidromorfona. Dependendo da formulação, a meia-vida é de 12 a 24 h. Em estado de equilíbrio, os picos e vales são reduzidos, evitando-se assim os efeitos da injeção em bolus. As formu- lações de ação prolongada também melhoram a adesão do paciente reduzindo a freqüência das doses, a carga de pílulas e as interrupções do sono pela dor ou pela necessidade de administrar o medicamento. Morfina: Pacientes que não estão com controle adequado da dor, no segundo degrau da escada analgésica, devem iniciar o tratamento com morfina, nas doses ideais-5 a 10 mg, de 4/4 h, aumentando de acordo com a necessidade. Dois terços dos pacientes com câncer necessitam de dosagem acima de 180mg/ dia. Dois terços, irá necessitar doses mais altas, no decurso de sua doença. Complicações: - morfina causa dependência: dependência psicológica ocorre raramente (4 casos/ 12000) e dependência física é uma propriedade das drogas Opiáceos, que não é importante clinicamente, desde que os pacientes sejam instruídos a não descontinuar a medicação abruptamente. OPIOIDES LIPOFÍLICOS exemplos dos principais opióides lipofílicos são a fentanila e a metadona. Dada a sua afinidade por lipídios, a fentanila e a metadona têm alta biodisponibilidade e rapidamente cruzam a barreira hematencefálica. O fígado metaboliza a fentanila e a metadona, mas não há metabólitos ativos ou tóxicos conhecidos (diferentemente do que ocorre com os opióides hidrofílicos). As formas não-invasivas de fentanila incluem o adesivo tran sdérmico e a pastilha transmucosa. O sistema de administração transdérmica estabelece com o tecido subcutâneo um equilíbrio que resulta na liberação sistêmica, a cada hora, de uma quantidade definida do medicamento. A biodisponibilidade se aproxima dos 100%. Estão disponíveis adesivos que liberam 12,5; 25; 50; 75 e 100 mcg/h. Após a colocação de um adesivo, são necessárias 12 a 16 h para se chegar a níveis clinicamente significantes. Durante esse tempo, é necessário empregar outros opióides de curta ação para manter a analgesia. O adesivo é geralmente substituído a cada 3 dias, embora alguns pacientes possam necessitar de substituição a cada 2 dias. A pastilha contém fentanila em uma matriz de confeito que é aplicada na boca: deve-se fazê-la girar contra a mucosa bucal até que seja consumida. Está disponível em doses de 200; 400; 600; 800; 1.200 e 1.600 mcg. A dose deve ser especialmente titulada conforme a dor de cada paciente. A dose eficaz não tem correlação com a dose equivalente de morfina oral que o paciente recebe correntemente. A dose usual de início para a pastilha de fentanila é de 200 mcg. Se a dor não se alivia em 15 min, deve-se administrar uma segunda pastilha de 200 mcg. Se isso controlar a dor, a dose apropriada é de 400 mcg. Se esta dose não controlar a dor, a titulação é reiniciada no próximo episódio de dor, começando com 400 mcg e repetindo-se o procedimento anterior. A metadona tem uma meia-vida longa e variável, que pode ser de 8 a 72 h. Pode, assim, levar 1 a 15 dias para alcançar o estado de equilíbrio . É necessária uma titulação individual cuidadosa para evitar o acúmulo com o tempo. A metadona é geralmente tomada a cada 8 h, mas alguns pacientes podem necessitar de apenas uma ou duas doses por dia. A metadona tem algumas interações medicamentosas. A carbamazepina, o fenobarbital, a fenitoína e a rifampicina podem aumentar o metabolismo da metadona; ao passo que a amitriptilina e a cimetidina podem diminuir o seu metabolismo. A metadona também pode aumentar os níveis de zidovudina. OBJETIVO 04- DESCREVER A AÇÃO FARMACOLÓGICADOS OPIOIDES FORTES E SUAS INDICAÇÕES MECANISMO DE AÇÃO Os agonistas opioides produzem analgesia por meio de sua ligação a receptores específicos acoplados à proteína G, que se localizam no cérebro e em regiões da medula espinal envolvidas na transmissão e na modulação da dor. Alguns efeitos são mediados por receptores opioides presentes nas terminações nervosas sensitivas periféricas. TIPOS DE RECEPTORES Conforme assinalado anteriormente, foram identificadas três classes principais de receptores de opioides (m, d e k) em vários locais do sistema nervoso e em outros tecidos. Cada um dos três principais receptores já foi clonado. Todos são membros da família de receptores acoplados à proteína G e apresentam homologias significativas na sequência de aminoácidos. Foi proposta a existência de múltiplos subtipos de receptores com base em critérios farmacológicos, incluindo m1, m2; d1, d2; e k1, k2 e k3. Entretanto, foram isolados genes que codificam apenas um subtipo de cada uma das famílias de receptores m, d e k, os quais foram caracterizados. Uma explicação plausível é a de que os subtipos dos receptores m surgem a partir de variantes de um gene comum por splice alternado. Essa ideia foi sustentada pela identificação de variantes de receptores por splice em camundongos e seres humanos, e um relato recente apontou para a associação seletiva de uma variante por splice de receptor opioide m (MOR1D), com indução de prurido, em lugar de supressão da dor. Tendo em vista que um opioide pode atuar com diferentes potências como agonista, agonista parcial ou antagonista em mais de uma classe ou subtipo de receptores, não surpreende que esses agentes exerçam efeitos farmacológicos diversos. AÇÕES CELULARES Em nível molecular, os receptores de opioides formam uma família de proteínas que fisicamente se acoplam às proteínas G e, por meio dessa interação, afetam a regulação de canais iônicos, modulam o processamento intracelular do Ca2+ e alteram a fosforilação das proteínas. Os opioides exercem duas ações diretas bem estabelecidas acopladas à proteína Gi/0: (1) fecham os canais de Ca2+ regulados por voltagem nos terminais nervosos pré-sinápticos e, portanto, reduzem a liberação de transmissores, e (2) abrem os canais de K+ e hiperpolarizam e, portanto, inibem os neurônios pós-sinápticos. A ação pré-sináptica – depressão da liberação de transmissores – foi demonstrada para a liberação de um grande número de neurotransmissores, inclusive o glutamato, o principal aminoácido excitatório liberado dos terminais nervosos nociceptivos, bem como a acetilcolina, norepinefrina, serotonina e substância P. RELAÇÃO DOS EFEITOS FISIOLÓGICOS COM O TIPO DE RECEPTOR Os analgésicos opioides atualmente disponíveis atuam, em sua maioria, principalmente nos receptores de opioides m. Tanto a analgesia como as propriedades euforizantes, depressoras respiratórias e de dependência física da morfina resultam principalmente de suas ações nos receptores m. Com efeito, o receptor m foi originalmente definido ao utilizar as potências relativas de uma série de alcaloides opioides para analgesia clínica. Todavia, os efeitos analgésicos dos opioides são complexos e incluem uma interação com os receptores d e k. Essa interação é sustentada, em parte, pelo estudo de nocautes (knockouts) genéticos dos genes m, d, e k em camundongos. O desenvolvimento de agonistas seletivos dos receptores m poderia ser clinicamente útil, se o perfil de seus efeitos colaterais (depressão respiratória, risco de dependência) fosse mais favorável do que aquele observado com os agonistas atuais dos receptores m, como a morfina. Apesar de a morfina atuar efetivamente em sítios dos receptores k e d, não se sabe ao certo até que ponto isso contribui para a ação analgésica do fármaco. Os peptídeos opioides endógenos diferem da maioria dos alcaloides na sua afinidade pelos receptores d e k. Em um esforço de desenvolver analgésicos opioides com incidência reduzida de depressão respiratória ou propensão à adição e dependência, foram produzidos compostos que demonstram preferência pelos receptores opioides k. O butorfanol e a nalbufina demonstraram algum sucesso clínico como analgésicos; todavia, podem causar reações disfóricas e apresentam potência limitada. É interessante assinalar que o butorfanol também demonstrou uma analgesia significativamente melhor nas mulheres do que nos homens. Com efeito, foi amplamente relatada a ocorrência de diferenças baseadas no sexo na analgesia mediada pela ativação dos receptores m e d. FARMACOCINÉTICA OBJETIVO 05- DISCUTIR TOLERÂNCIA E DEPENDÊNCIA NA PRESCRIÇÃO DE ANALGÉSICOS OPIÓIDES TOLERÂNCIA AOS OPIOIDES É o fenômeno pelo qual doses repetidas de opioides apresentam uma diminuição do efeito analgésico. Clinicamente, tem sido descrita como uma necessidade de doses crescentes de opioides para obter a analgesia observada no início da administração de opioides. Embora o desenvolvimento de tolerância já comece com a primeira dose de um opioide, ela pode só se tornar clinicamente manifesta depois de 2 a 3 semanas de exposição frequente a doses terapêuticas habituais. Entretanto, foi constatado que o uso de analgésicos opioides ultrapotentes, como a remifentanila, em cuidados críticos e no perioperatório, provoca tolerância aos opioides dentro de poucas horas. A tolerância desenvolve-se mais rapidamente quando são administradas grandes doses a intervalos curtos, enquanto é minimizada pela administração de pequenas doses a intervalos maiores. Pode haver desenvolvimento de alto grau de tolerância aos efeitos analgésicos, sedativos e de depressão respiratória de agonistas opioides. É possível provocar parada respiratória em um indivíduo não tolerante com uma dose de 60 mg de morfina. Todavia, em um paciente com dependência de opioides ou que exige um escalonamento dos opioides para controlar a dor refratária do câncer, doses de até 2.000 mg de morfina administradas no decorrer de um período de 2 ou 3 horas podem não provocar depressão respiratória significativa. Ocorre também tolerância aos efeitos antidiuréticos, eméticos e hipotensores, mas não às ações mióticas, convulsivantes e constipantes. Após a interrupção do uso de opioides, a perda da tolerância aos efeitos sedativos e respiratórios desses fármacos é variável e difícil de prever. Entretanto, a tolerância aos efeitos eméticos pode persistir por vários meses após a interrupção do fármaco. Por conseguinte, a tolerância aos opioides difere de acordo com o efeito, o fármaco, o tempo e o indivíduo (fatores genéticos-epigenéticos). Verifica-se também o desenvolvimento de tolerância a analgésicos com efeitos mistos nos receptores, porém em menor grau do que os agonistas. Certos efeitos adversos, como alucinações, sedação, hipotermia e depressão respiratória, diminuem após a administração repetida de fármacos com efeitos mistos nos receptores. Entretanto, a tolerância a esses últimos agentes geralmente não inclui tolerância cruzada aos opioides agonistas. É também importante observar que não ocorre tolerância às ações antagonistas dos fármacos mistos, nem àquelas dos antagonistas puros. TOLERÂNCIA CRUZADA A tolerância cruzada constitui uma característica extremamente importante dos opioides, isto é, pacientes com tolerância à morfina com frequência exibem redução da resposta analgésica a outros opioides agonistas. Isto é particularmente verdadeiro no caso de fármacos com atividade agonista sobretudo nos receptores m. A morfina e seus congêneres exibem tolerância cruzada não apenas em relação às suas ações analgésicas, mas também a seus efeitos euforizantes, sedativos e respiratórios. Entretanto, a tolerância cruzada observada entre os agonistas dos receptores m pode ser parcial ou incompleta. Essa observação clínica levou ao conceito de“revezamento de opioides”, que tem sido utilizado durante muitos anos no tratamento da dor causada pelo câncer. Assim, em um paciente que apresenta redução da eficiência de um esquema de analgésicos opioides, efetua-se um “revezamento” para um analgésico opioide diferente (p. ex., morfina substituída pela hidromorfona; hidromorfona substituída pela metadona); como resultado, o paciente normalmente exibe uma melhora significativa da analgesia com uma dose total equivalente reduzida. Outra abordagem consiste em reacoplar a função dos receptores de opioides, conforme descrito anteriormente, por meio do uso de agentes não opioides adjuvantes. Os antagonistas dos receptores NMDA (p. ex., cetamina) mostraram-se promissores na prevenção ou na reversão da tolerância induzida por opioides em animais e seres humanos. O uso da cetamina está aumentando, pois estudos bem controlados demonstraram uma eficácia clínica na redução da dor no pós-operatório e das necessidades de opioides em pacientes com tolerância a esses fármacos. Os agentes que aumentam independentemente a reciclagem dos receptores m também podem ser promissores na melhora da analgesia em pacientes com tolerância a opioides. DEPENDÊNCIA O desenvolvimento de dependência física acompanha invariavelmente a tolerância à administração repetida de um opioide do tipo m. A interrupção da administração do fármaco resulta em uma síndrome de abstinência característica, a qual reflete um rebote exagerado dos efeitos farmacológicos agudos do opioide. Os sinais e sintomas de abstinência consistem em rinorreia, lacrimejamento, bocejos, calafrios, arrepios (piloereção), hiperventilação, hipertermia, midríase, dores musculares, vômitos, diarreia, ansiedade e hostilidade. O número e a intensidade dos sinais e sintomas dependem, em grande parte, do grau de dependência física que se desenvolveu. A administração de um opioide nessa ocasião suprime quase que de imediato os sinais e sintomas de abstinência. O momento de início, a intensidade e a duração da síndrome de abstinência dependem do fármaco previamente usado e podem estar relacionados com a sua meia-vida biológica. No caso da morfina ou da heroína, os sinais de abstinência surgem geralmente dentro de 6 a 10 horas após a última dose. Os efeitos máximos são observados em 36 a 48 horas, quando a maior parte dos sinais e sintomas começam a regredir de modo gradual. Em 5 dias, a maioria dos efeitos já desapareceu, porém alguns podem persistir por vários meses. No caso da petidina, a síndrome de abstinência regride, em grande parte, em 24 horas, ao passo que, com a metadona, são necessários vários dias para se alcançar o pico da síndrome de abstinência, cuja duração pode estender-se por até duas semanas. O desaparecimento mais lento dos efeitos da metadona está associado a uma síndrome imediata de menor intensidade, que constitui a base de seu uso na desintoxicação de adictos de heroína. Todavia, apesar da perda da dependência física do opioide, o seu desejo compulsivo pode persistir. Além da metadona, a buprenorfina e a clonidina, um agonista α2, constituem tratamentos aprovados pela FDA para desintoxicação de analgésicos opioides. É possível induzir uma síndrome de abstinência explosiva transitória – abstinência precipitada por antagonistas – em um indivíduo com dependência física de opioides por meio da administração de naloxona ou outro antagonista. Em 3 minutos após a injeção do antagonista, surgem sinais e sintomas semelhantes àqueles observados após a suspensão abrupta; esses sinais e sintomas tornam-se máximos em 10 a 20 minutos e desaparecem, em grande parte, depois de 1 hora. Mesmo no caso da metadona, cuja abstinência resulta em uma síndrome de abstinência relativamente leve, a síndrome de abstinência precipitada por antagonistas pode ser muito grave. No caso de fármacos com efeitos mistos, os sinais e sintomas de abstinência podem ser induzidos após administração reduzida seguida de interrupção abrupta de pentazocina, ciclazocina ou nalorfina, porém a síndrome parece um tanto diferente daquela produzida pela morfina e por outros agonistas. Foi observada a ocorrência de ansiedade, perda do apetite e peso corporal, taquicardia, calafrios, aumento da temperatura corporal e cólicas abdominais. VÍCIO Existe uma grande confusão entre os profissionais de saúde no que diz respeito ao significado de vício. É considerado vício ou adição, segundo conceitos atuais, o uso continuado e compulsivo do fármaco prescrito ou da substância ilegal da qual se obtém alguma forma de prazer, sendo, dessa forma, uma alteração psicológica, e não física. Diferentemente de uma situação corriqueira em que o paciente tem pleno controle sobre os momentos em que deve fazer uso da medicação, na situação de adicção, a droga “controla” o intervalo da utilização: sempre que ocorre queda da concentração plasmática da substância, o paciente se vê impelido a repetir a dose. Freqüentemente, o paciente reconhece os malefícios físicos e sociais que ocorrem em conseqüência do abuso da substância, mas ele não consegue interromper a utilização do fármaco. Entretanto, em situações de câncer, a ocorrência de adicção é na ordem de um para cada mil pacientes, geralmente relacionada à história prévia de abuso de substâncias por parte do paciente. Em função dessa raridade, não se pode considerar o vício como um efeito adverso. Deve-se atentar para a diferenciação da verdadeira a situação de adicção da pseudo-adicção. Na pseudo-adicção, o paciente tem um comportamento que pode ser confundido com o vício: procura vários médicos e pronto-socorros, em busca de novas doses de analgésicos. Entre- tanto, esse comportamento ocorre porque o paciente não tem recebido as doses analgésicas suficientes do opióide, o que resulta em dor residual, e isso o impele a procurar ajuda de diversos profissionais. OBJETIVO 06: RECONHECER A IMPORTÂNCIA DOS CUIDADOS PALIATIVOS NO TRATAMENTO DA DOR CRÔNICA, ESPECIALMENTE ONCOLÓGICA, E SUA NECESSIDADE DE INDICAÇÃO PRECOCE Segundo a definição da Organização Mundial de Saúde – OMS, revista em 2002, “Cuidado Paliativo é uma abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes e seus familiares, que enfrentam doenças que ameacem a continuidade da vida, através da prevenção e alívio do sofrimento. Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento da dor e outros problemas de natureza física, psicossocial e espiritual”. O Cuidado Paliativo não se baseia em protocolos, mas sim em princípios. Não se fala mais em terminalidade, mas em doença que ameaça a vida. Indica-se o cuidado desde o diagnóstico, expandindo nosso campo de atuação. Não falaremos também em impossibilidade de cura, mas na possibilidade ou não de tratamento modificador da doença, desta forma afastando a ideia de “não ter mais nada a fazer”. Pela primeira vez, uma abordagem inclui a espiritualidade dentre as dimensões do ser humano. A família é lembrada, portanto assistida também após a morte do paciente, no período de luto. PRINCÍPIOS DOS CUIDADOS PALIATIVOS Os Cuidados Paliativos baseiam-se em conhecimentos inerentes às diversas especialidades, possibilidades de intervenção clínica e terapêutica nas diversas áreas de conhecimento da ciência médica e de conhecimentos específicos. A OMS em 1986 publicou princípios que regem a atuação da equipe multiprofissional de Cuidados Paliativos. Estes princípios foram reafirmados na sua revisão em 2002: 1. PROMOVER O ALÍVIO DA DOR E OUTROS SINTOMAS DESAGRADÁVEIS Desta forma é necessário conhecimento específico para a prescrição de medicamentos, adoção de medidas não farmacológicas e abordagem dos aspectos psicossociais e espirituais que caracterizam o “sintoma total”, plagiando o conceito de DOR TOTAL, criado por Dame Cicely Saunders, onde todos estes fatores podem contribuir para a exacerbação ou atenuação dos sintomas, devendo ser levadosem consideração na abordagem. 2. AFIRMAR A VIDA E CONSIDERAR A MORTE COMO UM PROCESSO NORMAL DA VIDA Bernard Lown em seu livro “A arte perdida de curar” afirma: “As escolas de medicina e o estágio nos hospitais os preparam (os futuros médicos) para tornarem-se oficiais-maiores da Ciência e gerentes de biotecnologias complexas. Muito pouco se ensina sobre a arte de ser médico. Os médicos aprendem pouquíssimo a lidar com moribundos... A realidade mais fundamental é que houve uma revolução biotecnológica que possibilita o prolongamento interminável do morrer”. O Cuidado Paliativo resgata a possibilidade da morte como um evento natural e esperado na presença de doença ameaçadora da vida, colocando ênfase na vida que ainda pode ser vivida. 3. NÃO ACELERAR NEM ADIAR A MORTE Enfatiza-se desta forma que Cuidado Paliativo nada tem a ver com eutanásia, como muitos ainda querem entender. Esta relação ainda causa decisões equivocadas quanto à realização de intervenções desnecessárias e a enorme dificuldade em prognosticar paciente portador de doença progressiva e incurável e definir a linha tênue e delicada do fazer e do não fazer. Um diagnóstico objetivo e bem embasado, o conhecimento da história natural da doença, um acompanhamento ativo, acolhedor e respeitoso e uma relação empática com o paciente e seus familiares nos ajudarão nas decisões. Desta forma erraremos menos e nos sentiremos mais seguros. 4. INTEGRAR OS ASPECTOS PSICOLÓGICOS E ESPIRITUAIS NO CUIDADO AO PACIENTE A doença, principalmente aquela que ameaça a continuidade da vida, costuma trazer uma série de perdas, com as quais o paciente e família são obrigados a conviver, quase sempre sem estarem preparados para isto. As perdas da autonomia, da autoimagem, da segurança, da capacidade física, do respeito, sem falar das perdas concretas, materiais, como de emprego, de poder aquisitivo e consequentemente de status social, podem trazer angústia, depressão e desesperança, interferindo objetivamente na evolução da doença, na intensidade e frequência dos sintomas que podem apresentar maior dificuldade de controle. A abordagem desses aspectos sob a ótica da psicologia se faz fundamental. A novidade é a possibilidade de abordá-los também sob o ponto de vista da espiritualidade, que se confundem e se sobrepõem invariavelmente à questão religiosa. Noventa e cinco por cento dos americanos creem numa força superior e 93% gostariam que seus médicos abordassem essas questões, se ficassem gravemente enfermos. Segundo Saporetti, “espírito, do latim ‘spiritus’ significa sopro e se refere a algo que dá ao corpo sua dimensão imaterial, oculta, divina ou sobrenatural que anima a matéria. O espírito conecta o ser humano à sua dimensão divina ou transcendente”. É mais este aspecto, o da transcendência, do significado da vida, aliado ou não à religião, que devemos estar preparados para abordar. Sempre lembrando que o sujeito é o paciente, sua crença, seus princípios. 5. OFERECER UM SISTEMA DE SUPORTE QUE POSSIBILITE O PACIENTE VIVER TÃO ATIVAMENTE QUANTO POSSÍVEL, ATÉ O MOMENTO DA SUA MORTE Não devemos nos esquecer que qualidade de vida e bem-estar implicam a observância de vários aspectos da vida. Problemas sociais, dificuldades de acesso a serviços, medicamentos e outros recursos podem ser também motivos de sofrimento e devem ser incluídos entre os aspectos a serem abordados pela equipe multiprofissional. Viver ativamente, e não simplesmente viver, nos remete à questão da sobrevida “a qualquer custo”, que esperamos combater. Sermos facilitadores para a resolução dos problemas do nosso paciente é nosso dever e nossa responsabilidade. 6. OFERECER SISTEMA DE SUPORTE PARA AUXILIAR OS FAMILIARES DURANTE A DOENÇA DO PACIENTE E A ENFRENTAR O LUTO Nunca estamos completamente sós. O ser humano é por natureza um ser gregário. Todo o núcleo familiar e social do paciente também “adoece”. Segundo Dra. Maria Helena Pereira Franco(11), “a unidade de cuidados paciente-família se coloca como una e específica ao mesmo tempo. A célula de identidade do ser humano é a família, respeitadas todas as condições que fazem dela um universo cultural próprio, muitas vezes distante ou até mesmo alheio ao universo cultural dos profissionais da saúde”. A família, tanto a biológica como a adquirida (amigos, parceiros, etc.), pode e deve ser nossa parceira e colaboradora. Essas pessoas conhecem melhor do que nós o paciente, suas necessidades, suas peculiaridades, seus desejos e angústias, muitas vezes não verbalizados pelo próprio paciente. Da mesma forma, essas pessoas também sofrem e seu sofrimento deve ser acolhido e paliado. 7. ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL PARA FOCAR AS NECESSIDADES DOS PACIENTES E SEUS FAMILIARES, INCLUINDO ACOMPANHAMENTO NO LUTO Na prática do cuidado ao paciente, frequentemente iremos nos deparar com inúmeros fatores que atuarão concomitantemente na modificação da resposta terapêutica medicamentosa, na evolução da própria doença e na relação com o paciente e a família. A integração sugerida pelo Cuidado Paliativo é uma forma de observarmos o paciente sob todas as suas dimensões e a importância de todos estes aspectos na composição do seu perfil para elaborarmos uma proposta de abordagem. Ignorar qualquer dessas dimensões significará uma avaliação incompleta e consequentemente uma abordagem menos efetiva e eficaz dos sintomas. O sujeito da ação é sempre o paciente, respeitado na sua autonomia. Incluir a família no processo do cuidar compreende estender o cuidado no luto, que pode e deve ser realizado por toda a equipe e não somente pelo psicólogo. A equipe multipro-fissional com seus múltiplos “olhares” e percepção individual pode realizar este trabalho de forma abragente. 8. MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA E INFLUENCIAR POSITIVAMENTE O CURSO DA DOENÇA Com uma abordagem holística, observando este paciente como um ser biográfico mais que um ser simplesmente biológico, poderemos, respeitando seus desejos e necessidades, melhorar sim o curso da doença e, segundo a experiência de vários serviços de Cuidados Paliativos, também prolongar sua sobrevida. Vivendo com qualidade, ou seja, sendo respeitado, tendo seus sintomas impecavelmente controlados, seus desejos e suas necessidades atendidas, podendo conviver com seus familiares, resgatando pendências, com certeza nossos pacientes também viverão mais 9. DEVE SER INICIADO O MAIS PRECOCEMENTE POSSÍVEL, JUNTAMENTE COM OUTRAS MEDIDAS DE PROLONGAMENTO DA VIDA, COMO A QUIMIOTERAPIA E A RADIOTERAPIA E INCLUIR TODAS AS INVESTIGAÇÕES NECESSÁRIAS PARA MELHOR COMPREENDER E CONTROLAR SITUAÇÕES CLÍNICAS ESTRESSANTES Pela própria definição de Cuidados Paliativos da OMS, esses devem ser iniciados desde o diagnóstico da doença potencialmente mortal. Desta forma iremos cuidar do paciente em diferentes momentos da evolução da sua doença, portanto não devemos privá-lo dos recursos diagnósticos e terapêuticos que o conhecimento médico pode oferecer. Devemos utilizá-los de forma hierarquizada, levando-se em consideração os benefícios que podem trazer e os malefícios que devem ser evitados. Uma abordagem precoce também permite a prevenção dos sintomas e de complicações inerentes à doença de base, além de propiciar o diagnóstico e tratamento adequados de doenças que possam cursar paralelamente à doença principal. Uma boa avaliação embasada nos exames necessários, além da definição da capacidade funcional do paciente são indispensáveis para a elaboração de um plano integral de cuidados, adequado a cada caso e adaptado a cada momento da evolução da doença. INDICAÇÕES CÂNCER ♥ Qualquer paciente com câncer metastático ou inoperável DOENÇAS CARDÍACAS ♥ Sintomas de insuficiência cardíaca congênita durante o repouso ♥ FE <20% ♥ Uma nova disritmia ♥ Ataque cardíaco, síncope ou AVC ♥ Idas frequentes ao PS devido aos sintomas DOENÇAS PULMONARES ♥ Dispneia durante o repouso ♥ Sinais ou sintomas de insuficiência cardíaca direita ♥ Saturação de O2 < 88% ♥ P CO2 > 5.0 ♥ Perda de peso não intencional DEMÊNCIA ♥ Incapacidade para andar♥ Incontinência ♥ Menos de seis palavras inteligíveis ♥ Albumina < 2,5 ou menor ingestão por via oral ♥ Idas frequentes ao PS DOENÇAS HEPÁTICAS ♥ TP > 5. segundos ♥ Albumina < 2,5 ♥ Ascite refratária ♥ Peritonite bacteriana espontânea ♥ Icterícia ♥ Desnutrição ou perda de massa muscular ♥ Doenças Renais Não candidato à diálise ♥ Depuração da creatinina < 15 ml/minuto ♥ Creatinina sérica > 6,0 SÍNDROME DA FRAGILIDADE ♥ Idas frequentes ao PS ♥ Albumina < 2, ♥ Perda de peso não intencional ♥ Úlceras de decúbito ♥ Confinamento ao leito/ ao domicílio INDICAÇÕES DE CUIDADOS PALIATIVOS SEGUNDO AS CONDIÇÕES DO PACIENTE ♥ Paciente não é candidato à terapia curativa ♥ Paciente tem uma doença grave e prefere não ser submetido a tratamento de prolongamento da vida ♥ Nível inaceitável de dor por mais de 24 horas ♥ Sintomas não controlados (náusea, dispneia, vômitos, etc.) ♥ Sofrimento psicossocial e/ou espiritual não controlado ♥ Visitas frequentes ao atendimento de emergência (mais de 1 vez no mês pelo mesmo diagnóstico) ♥ Mais do que uma admissão hospitalar pelo mesmo diagnóstico nos últimos 30 dias ♥ Internação prolongada sem evidência de melhora ♥ Internação prolongada em UTI ♥ Prognóstico reservado documentado pela equipe médica
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