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Pietro Perlingieri - A doutrina do direito civil na legalidade constitucional

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► 
.. 
1 
A Doutrina do Direito Civil na 
Legalidade Constitucional 1, 2 
Pietro Perlingieri 
1. Este texto divide-se em três partes. A primeira sintetiza os pressupostos 
teóricos e seus corolários sobre os quais se fundamenta a doutrina do direito civil 
na legalidade constitucional, que também no Brasil encontrou respeitável corres-
pondência; a segunda apresenta a experiência de meio século de atividade da Cor-
te constitucional italiana, que foi, nos últimos 20 anos, convicta defensora de tal 
doutrina - e não sem hesitação -; a terceira contém algumas considerações de 
perspectiva sobre o papel e sobre as funções do jurista como agente da legalidade 
constitucional. 
2. Os principais pressupostos teóricos da doutrina do direito civil na lega-
lidade constitucional - concebida como conseqüência inevitável da incidência 
do constitucionalismo contemporâneo sobre o fenômeno da produção legislativa 
e, particularmente, das codificações - referem-se: (a) à natureza normativa das 
constituições; (b) à complexidade e ao caráter unitário do ordenamento jurídico 
e ao pluralismo das fontes do direito; (c) a uma renovada teoria da interpretação 
jurídica com fins aplicativos. 
Em relação à letra (a), é preciso reconhecer não só o valor normativo dos prin-
cípios e das normas constitucionais, mas também a supremacia deles. Desse modo, 
1 
Transcrição de fala introdutória do Congresso Internacional de Direito Civil e Constitucional 
realizado na cidade do Rio de Janeiro sobre interpretação do Direito Civil Contemporâneo: novos 
problemas à luz da legalidade constitucional. 
2 
Tradução de Carolina Tomasi e João Bosco Medeiros. Como se trata de transcrição de fala, o tex-
to original muitas vezes oferece inúmeras dificuldades de tradução para a língua escrita. Como se 
sabe, a língua falada é recheada de elipses, omissões, repetições, truncamentos frásicos, suspensão 
de pensamento, ausência de conectivos. 
• eo • Tepedino 2 Direito Civil Contemporan 
. . , . e bida da natureza exclusivamente programática da 
libera-se seJa da. 1de~a preco~c d . d , . a preconcebida de que tal norma tenha como 
nonnativa constitucional, s~Jª
1 
da 
1 
eid·nan' ·0 A normativa constitucional é respei-. ár · leg1s a or or 1 · exclusivo desunat 1.º .º . , . 
0 
geral da legalidade assim exige. tada por todos os suJettos. O pnnc1p1 ~ 
. . · na verdade, têm um papel que nao pode redu-
As onnas consntue1ona1s, d' , . . . n . . • edimentos à lei or mana ou const1ttur-se em zir-se a representar hmit~s ~ imp ara 
O 
mais completo conhecimento do ordena-
simples suport~s h~r~e~~uuc~s lndamentos e as justificações de normatividade 
mento. E_las, al~~ 
1
~ m icart 
O 
das instituições jurídicas quanto dos institutos jurí-de valor mterd1sc1p mar tan o . 'd d d . ,. t de avaliação dos atos, das atIVI a es e os comporta-d1cos apontam parame ros . 1 ~ . b' . ' • , · de relevância normativa nas re açoes mtersu ~et1vas. mentas como pnnc1p1os 
' - " · a-
0 dos institutos do direito civil à luz da Constituição", A expressao revis . ~ , b' • d rta dose de ambigüidade VIsa destacar nao so que o o ~eto da am a que com ce . . '. . . . fr · · l gu1 · ~ m fi·ns aplicativos seJa o d1spos1t1vo m aconst1tuc1ona , re a-mterpretaçao co , . . 
d d d m dos institutos adequado ou conforme a norma const1tuc10nal, or e ca a u , . • ~ · fr · · · mas também que O objeto da interpretação são as d1sp ... os1çoes m aconst1_tuc1ona1s 
integradas às normas constituciona~s: ~ns em ~nç~o dos o~tros~ e VIce-versa, 
coordenados segundo a conhecida tecmca de aphcaçao, combmaçao de normas. 
Técnica esta destinada a evitar que a Constituição seja lida e interpretada à luz da 
lei ordinária, em uma espécie de direção hermenêutica de duas mãos, precursora 
de grandes ambigüidades. 
Em relação à letra (b), é indispensável conceber o ordenamento jurídico 
como uno e complexo, em que os princípios constitucionais exercem a função de 
valores guias e assumem um papel central na articulada pluralidade das fontes 
do direito, o que exclui que se possa configurar o sistema jurídico dividido em 
ramos autônomos ou em tantos microssistemas policêntricos, em categorias ou 
níveis normativos separados e não comunicáveis entre si. 
A fragmentação do saber jurídico, a traiçoeira e excessiva divisão do direito 
em ramos e em especializações, inevitavelmente fariam do jurista, fechado em 
seu microssistema, um especialista competente, dotado mesmo de refinados ins-
trumentos técnico-setoriais, mas acrítico e insensível ao projeto abrangente da 
sociedade, mesmo quando este projeto, traduzido na máxima lei do Estado - que 
é a Carta Constitucional -, está claramente em confronto com grupos de poder ou 
de pressão. 
O pluralismo das fontes de direito, emancipado de uma concepção estatal, 
bem como a enxurrada de atos e fatos com relevância normativa, reencontram 
u~a mesma difícil razão de reductio ad unitatem por meio do controle de legiti-
~tda?e, do ~so e da aplicação dos princípios constitucionais também nas rela-çoes mtersubJetivas. 
Urna_ ní~i~a distinção entre validade, legalidade e legitimidade da lei exige 
~~e~ 0 prmc1p10 de legalidade constitucional configure-se como garantia de su-
Jeiçao aos valores fundantes do ordenamento jurídico. Portanto, o controle da 
A Doutrina do Direito Civ il na Legalidade Constitucional 3 
legitimidade da lei é sobretudo controle de legitimidade constitucional relativo 
não somente ao aspecto procedimental (iter formativo da lei) , mas também e 
principalmente relativo ao conteúdo da lei. 
Tal controle compreende não apenas a lei, mas também os atos e as ativida-
des que são expressões da autonomia individual, coletiva e da discricionariedade 
administrativa. As autonomias, então, e a mesma singular liberdade representada 
pela iniciativa econômica privada e mercantil não podem fugir do controle de 
merecimento diante dos valores constitucionais. Função e destinação dos atos 
assumem um valor decisivo em relação ao seu conceito meramente estrutural. 
Nesse contexto, a iniciativa econômica não pode não ter uma utilidade social e 
deve ser exercida de maneira que não cause dano à segurança, à liberdade e à 
dignidade humana. 
Finalmente, em relação à letra (e), é preciso elaborar uma teoria da interpre-
tação jurídica, que não seja formalística - fundamentada no mecanismo lógico-
teórico da subsunção do fato concreto à norma abstrata -, que saiba propor uma 
interpretação das disposições normativas no que se refere à hierarquia das fontes 
e dos valores, em uma acepção necessariamente sistemática e axiológica. 
Daí, a impossibilidade de manter separada a teoria da interpretação das leis 
ordinárias e a teoria da interpretação das normas constitucionais. O cânone sis-
temático exige que o ordenamento seja interpretado em sua unidade; enquanto 
o cânone axiológico pressupõe que os valores constitucionais, comunitários e in-
ternacionais vivifiquem e atualizem cada uma das normas ou conjunto de normas 
que devem necessariamente ser lidas e interpretadas sempre, mesmo que sejam 
aparentemente claras. Essa necessidade é verificada no controle obrigatório que o 
intérprete deve fazer da legitimidade constitucional de qualquer disposição, seja 
esta recente seja antiga, que seja aplicada ao caso concreto pelo juiz. A clareza, 
na verdade, é uma eventual posterius, não um prius da interpretação. A norma, 
clara ou não, deve estar em conformidade com os princípios e os valores do or-
denamento e deve resultar de procedimento argumentativo não somente lógico, 
mas axiologicamente de acordo com as escolhas de fundo do ordenamento. 
Para essa finalidade é necessário: 
a) Em primeiro lugar, repelir qualquer abordagem hermenêutica distinta 
cronológica ou logicamente em fases ou graus de interpretação, quer 
literal, quer lógica, quer a possível argumentação analógica, quer de 
recurso aos princípios. A interpretação do fato e da lei e a qualificação 
normativa do fato configuram um processo unitário e não divisível, emque o problema concreto e o sistema do ordenamento são indissolúveis 
e compreensíveis, não em fases distintas, mas unitariamente. 
b) Em segundo lugar, ter consciência de que o controle de conformidade 
da lei à Constituição é uma constante de qualquer interpretação para 
fins aplicativos, de qualquer aplicação que procure individualizar, em 
4 Direi to Ci\ 11 Contemporâneo • Tepcd1110 
uma quaestio Jacti, em um caso concreto, a solução que não poderá não 
ser coerente, adequada e razoável e então correspondente à tábua dos 
valores normativamente relevantes, presentes na Constituição. Uma lex 
clara em seu texto ou dura na sua aplicação, que esteja em contraste 
com os princípios normativos da Constituição, é ilegítima, teria uma 
ratio inconstitucional e não integraria à legalidade constitucional a que 
o intérprete está vinculado. 
c) Em terceiro lugar, adequar as técnicas e as noções aos valores princi-
pais, evitando aceitar passivamente como válidas as práxis oficiais e as 
interpretações correntes. A cultura "oficial" não se legitima a condicio-
nar a atuação dos valores principais do ordenamento jurídico e a pôr-se 
em aberta violação da legalidade constitucional. Atitude condenável 
quanto mais a legalidade seja portadora de maior e mais qualificada 
promoção e tutela da pessoa humana e das suas exigências. 
d) Em quarto lugar, levar em consideração que a passagem da lei ao direito 
é um processo contínuo, constituído pelo impacto com a peculiaridade 
do fato, em uma atividade hermenêutica que tem como parâmetro pri-
vilegiado os valores-guia da Constituição, assumidos pela historicidade 
e pela totalidade da experiência, em um justo equilíbrio entre o dever-
ser e o ser; sem perigosas concessões em relação ao pragmatismo e ao 
niilismo; e sabendo colher a natureza desses interesses e desses valores 
em conflito, ponderando-os - em relação ao caso concreto - segundo a 
axiologia constitucional, pronto a reconhecer nos aspectos valorativos 
de descontinuidade, o respeito à tradição, fatores, a um só tempo, de 
promoção e de garantia do pacto constitucional. 
e) Em quinto lugar, atentar para os critérios hermenêuticos inovadores, 
como a ponderação dos interesses e dos valores, da razoabilidade, da 
proporcionalidade, da adequação, da subsidiariedade, recuperando a 
factividade para a juridicidade. A solução do problema concreto é pro-
curada necessariamente na totalidade do ordenamento jurídico sem 
violentar as peculiaridades dos fatos, para assumir não corno ocasiões 
maçantes para o conhecimento da norma, mas corno fatores decisivos 
para a individualização da normativa. 
f) Em sexto lugar, finalmente, formar urna classe de juristas, adequada-
mente preparada para tais obrigações, capazes de construir uma juris-
prudência avaliativa, atenta às conseqüências das decisões. Uma classe 
de juristas que abandone os brocardos do in claris non fit interpretatio 
e da dura lex sed lex, e contribua para realizar urna justiça segundo os 
valores da Constituição, concretizados no impacto com a totalidade da 
experiência cultural como historicamente se determina e se evolui. 
A Do ut rina do Di reito Civil na Lega lidade Constituciona l 5 
• 
3. Para tais press~postos teóricos, verifica-se uma série de conseqüências re-
levantes, entre as quais: 
a) o reconhecimento de que, segundo o moderno constitucionalismo e os 
tratados internacionais, a pessoa humana e seus direitos fundamentais 
são um valor conquistado, embora de formas diversas. A dignidade 
humana já não é uma aquisição do assim chamado direito natural, mas 
é elemento constitutivo e caracterizante do direito positivo, uma vez 
que a Constituição é lei e é lei antes de qualquer outra coisa. O dever 
ser, enriquecido de conteúdos sobretudo exclusivos do plano moral, 
assume o papel determinante de um novo e bem diferente positivismo 
ético. A constitucionalização do direito afirma: "No centro dos sistemas 
jurídicos contemporâneos dos documentos jurídicos, como são as cons-
tituições, que contém princípios éticos, estas devem ser evolutivamente 
interpretadas de acordo com a modificação dos valores ético-políticos 
da comunidade a que a constituição se refere." 
Conseqüentemente, o primado dos valores da pessoa humana e 
dos seus direitos fundamentais exclui que a área do direito civil possa 
ser exaurida em uma concepção patrimonialista fundada ora sobre a 
centralidade da propriedade, ora sobre a noção de empresa. O direito 
civil constitucional - segundo a tendência do constitucionalismo con-
temporâneo - reconhece que a forte idéia do sistema é não somente o 
mercado, mas também a dignidade da pessoa, de uma perspectiva que 
tende a despatrimonializar o direito. 
b) A supremacia do direito e da política sobre o mercado e sobre a eco-
nomia representa a epifania do direito civil constitucional. Este último, 
ao assinalar a superação da separação do direito privado e do direito 
constitucional, realiza a concretização da ordem pública constitucional 
como sistema aberto também à internacionalização das relações civis, 
mas sob controle vigiado, que não invalida a atuação dos direitos huma-
nos democraticamente colocados no centro do pacto de convivência. 
c) A mesma contraposição de privado-público se enfraquece e determina 
uma nova composição dos institutos e das instituições reavivados pela 
igualdade e pela diferenciação, mas sobretudo pela solidariedade como 
função primária de um Estado moderno. 
d) Nos ordenamentos nos quais a questão da legitimidade constitucional 
de um ato com força de lei é proposta perante a Corte constitucional, 
na via incidental da parte do juiz comum (chamado exatamente juiz a 
quo) é indispensável que o papel deste último mude. Dele se espera que 
decida se entre a lei ordinária e a Constituição há un1a incompatibili-
dade absoluta e insanável, ou seja, uma antinomia insuperável, tal que 
da aplicação da primeira derive inevitavelmente a não-aplicação do 
6 Direito Civil Contemporâneo • Tepedino 
• t't·ticional. ou se ao contrário, seja reconhecível não uma 
preceito cons 1 , ' - f 'd d · 
. ·b·t·dade absoluta mas uma nao-con orm1 a e, uma made-
mcompau 1 1 ' · d 
- d nor·ma que pode ser superada, todavta, o ponto de vista quaçao a d - . . , . 
l
. · medi'ante uma completa coor enaçao, que evite o 1mc10 de 
ap ~auvo, . . · · 1 ' 
de legitimidade diante da Corte const1tuc1ona . E prer-un1 processo 1 d'f 
• d ·ui·z comum desenvolver um contra e 1 uso, que se junte 
rogatlva o J . 1 d , 
, I centrado na Corte constitucional, a qua po era sempre in-aque e con , , 1 d 'd' 1. . _ dicar a interpretação que julgara sustentave .ºu ec1. ir a e 1mmaçao, a 
ah-rogação do texto por força da lei porque irremediavelmente avalia-
do inconstitucional. 
4. Na Itália, nos primeiros 60 anos de vig~nc~a da Constituição ~~ República, 
d · do direito civil na legalidade const1tuc1onal teve grande dificuldade de a oun1na . · d. " d. 
firmar-se. Marcas desse fato são vistas nos meus escritos que m 1co no apen ice 
deste texto. 
Valor paradigmático tem a contribuição oferecida pela jurisprudência da Cor-
te constitucional. 
Este ano nos seus celebrados 50 anos de atividade, as associações dos juris-
tas italianos' realizaram uma monumental obra em 27 volumes, dos quais oito 
foram oferecidos pela Associação italiana dos estudiosos do direito civil - da qual 
me honra ser o presidente - e um volume oferecido pela Rassegna di diritto civile, 
realizado sob o cuidado do colega Pasquale Femia, que tem o título Interpretação 
para fins aplicativos e legitimidade constitucional. No volume 'justiça segundo a 
Constituição e a Hermenêutica. A interpretação denominada adequada", elaborei 
o ensaio, embora com uma inevitável aproximação com uma "periodização" da 
evolução da jurisprudência constitucional. Neste Congresso, eu proporia tal evo-
lução novamente para assinalar um percurso difícil, mas que, pelo menos sob o 
perfil metodológico, me parece que já tenha atingido a maturidade. 
Em uma primeirafase, dos anos de 1956 até o final dos anos de 1970, não se 
verifica da parte da Corte constitucional um particular envolvimento dos juízes 
comuns na imediata garantia dos valores constitucionais. O cânone da interpre-
tação denominada adequada parece relegado ao papel de técnica exclusiva do 
controle de legitimidade, inerente unicamente ao exercício das prerrogativas da 
Corte, de maneira a apresentar "a Corte como vestal da Constituição; a Magistra-
tura como vestal da Lei". O dever de explanar interpretações em conformidade 
com a Constituição diz respeito sobretudo à Corte constitucional que deve evitar 
pronunciamento de inconstitucionalidade sempre que uma diversa construção 
h:rmenêutica tome, possível uma decisão interpretativa rejeitada. O juiz comum 
na? pare~e responsa_vel por tal tarefa, visto que o cumprimento da honra de pes-
qmsar a mterpretaçao denominada adequada ainda não foi expresso em termos 
do pressuposto de admissibilidade da legitimidade. E a Corte limita-se a lamentar 
o e~c_es~ivo número de processos pendentes que deve julgar, por causa do insatis-
fatono Julgamento exercido pelos juízes a quibus na resolução das questões. 
A Doutrina do Direito Civil na Legalidade Constitucional 7 
No curso dos anos setenta, inicia-se uma segunda fase em que se verificam 
significativas tomadas de posição "qu~ podem r_esumir-se no reconhecimento "fun-
damental" do "princípio hermeneuuco de unidade do ordenamento que tem os 
receitas constitucionais no topo" e como preceptivos, e não como programáti-
~os, que a Constituição "não seja um limbo de ~on~ propós~tos, q~e os p~deres 
públicos possam a seu prazer não observar; porem e u,~ª lei que sistema~iza to-
das as demais, que no sistema encontra instrumentos vahdos para ver confirmada 
e tutelada a sua intangibilidade". 
Uma terceira fase compreende os anos oitenta. Com a presidência de Leopol-
do Elia, viu-se uma reviravolta. O juiz comum é chamado a enfrentar "com uma 
linha interpretativa mais aprofundada" as questões de constitucionalidade sem 
remetê-las à Corte, a "conformar" o texto legislativo às normas da Carta Magna. A 
falta de cumprimento de tal dever é punida com a inadmissibilidade de legitimi-
dade - inicialmente pronunciada pela Corte através de acórdãos (sentenza) e, de-
pois, de forma constante por decisões (ordinanza) -, porque, "não pela decisão da 
Corte, mas pela simples aplicação do sistema vigente, é possível chegar ao resul-
tado evocado pela decisão (ordinanza)". A jurisprudência inteira da Corte segue 
um "desenho das relações com juízes remissivos que deixa um espaço mais largo à 
interpretação adequada das normas de lei à luz das normas constitucionais". 
Em uma quarta fase, dos primeiros anos de noventa até hoje, a Corte parece 
ter superado aquela discutível posição que divide o momento interpretativo das 
leis ordinárias com aquele aplicativo das normas constitucionais. E igualmente 
reconhecido que a interpretação elaborada pela Corte constitucional se vale da 
"coordenação dos princípios da Carta Magna com as normas ordinárias". A in-
terpretação denominada adequada resolve-se sempre mais facilmente com uma 
aplicação do combinado disposto nas leis infraconstitucionais e dos princípios 
constitucionais. Chega-se à inequívoca afirmação da necessidade de uma imedia-
ta aplicação das normas constitucionais, não subordinada à mediação legislativa 
ou administrativa e - no corpo das decisões e nas relações presidenciais - mul-
tiplicam-se os convites e as exortações a uma imediata e autônoma aplicação da 
parte dos juízes comuns das normas constitucionais, até em presença de um di-
reito contrário que vive na Corte di Cassazione. Finalmente, a interpretação dita 
adequada é definida sistemática e, então, não é apenas um cânone meramente 
hermenêutico, mas também o fundamento da aplicação da Constituição segundo 
a técnica da "conformidade". 
A interpretação adequada da Corte constitucional - posta na base de suas 
decisões interpretativas de recusa - é oficialmente identificada com: "aquela cuja 
Corte tira do texto de lei, combinando-o com as normas constitucionais um sen-
tido compatível com a Constituição". Para esta, a Corte atribui o papel "~xemplar 
que chama cada operador à imediata aplicação da norma constitucional e então 
ao dever de preferir, em cada caso, o significado da disposição normativa que 
~upere a oposição com a Carta Magna". Os juízes comuns são chamados a uma 
i~te~retação da Carta que favoreça o ''princípio de difusão dos valores constitu-
cionais", enquanto a Corte "considera não ser a única intérprete da Constituição, 
8 Direno Cn il Contempot âneo • Tcpedino 
mas que a interpretação desta última caiba a uma platéia de sujeitos institucio-
nais muito mais ampla". 
s. Em resumo, para dar solução a um problema concreto a norma constitu-
cional é usada, de qualquer maneira, seja na aplicação combinada com a legisla-
ção ordinária específica, ou com as cláusulas gerais ou princípios gerais do direi-
to, seja na aplicação direta, definida desse modo pela ausência de intermediação 
de qualquer enunciado normativo ordinário (hipótese definida impropriamente 
como lacunosa). 
A doutrina do direito civil na legalidade constitucional, portanto, impõe ao 
civilista um vasto e sugestivo programa de estudos, apenas em parte realizado, 
que se propõe à concretização de objetivos indicados há tempo, sendo-me con-
sentido propor novamente aos estimados colegas: individuar um sistema do di-
reito civil harmonizado com os valores constitucionais e, antes de tudo, ao valor 
da pessoa humana; redefinir os fundamentos, as rationes e assim as extensões 
dos institutos, ressaltando-lhes seus perfis funcionais; adequar as técnicas e os 
conceitos tradicionais e sobretudo renovar funditus a argumentação jurídica, pro-
pondo uma teoria da interpretação respeitosa da legalidade constitucional. 
Um percurso árduo, que sobretudo os mais jovens poderão fazer seguindo 
o caminho duro indicado, destinado a dar um rumo novo ao direito civil, na 
consciência - que se vai difundindo - que o constitucionalismo "transformou a 
configuração tradicional do sistema jurídico". 
A superação do formalismo e do conceitualismo na hermenêutica pressupõe 
que a teoria da interpretação seja mostrada não de forma sub specie aetemitatis, 
mas de forma histórica e relativa: estreitamente dependente sobretudo da enge-
nharia constitucional dos poderes do Estado e mais amplamente da organização 
sociojurídica dos poderes, dos valores que representam o pacto constitutivo de 
tal organização e, conseqüentemente, da hierarquia das fontes com relevância 
normativa e, finalmente, das relativas técnicas legislativas. 
É indispensável, portanto: 
a) Reconhecer que "a Constituição, como qualquer outra lei, é sempre 
e antes de tudo um ato normativo que contém disposições precepti-
vas" e que "tanto os juízes comuns, ao julgarem, com base nas normas 
constitucionais, as controvérsias submetidas às suas decisões, quanto 
os juízes constitucionais, que operam como intérpretes 'autorizados' da 
Constituição e como juízes de constitucionalidade da lei, encontram-se 
também vinculados aos textos constitucionais". 
b) Argumentar sobre normas-princípios, sobre a aplicação de qual deles 
"não assume a forma silogística da subsunção, mas aquela que otimiza 
a realização do preceito", não só segundo uma hierarquia própria, mas 
também segundo uma ponderação razoável que se refere à decisão do 
caso concreto. 
..... _ 
A Doutrina do Direito Civil na Legalidade Constitucional 9 
c) Levar em consideração que não pode não ser relevante a idéia de so-
ciedade e de ética pressuposta à Constituição, e que desse modo pe-
netram no ordenamento positivo valores e princípios historicamente 
reconhecidos. 
Tudo isto não parece traduzir-se na afirmação de que "o momento de verda-
de das ciências está na relação das ciências com o senso comum", quanto antes 
postula um confronto contínuo entre o que é e o que poderia ser, entre as deci-
sõesassumidas e as que serão assumidas também na modificação das primeiras 
em um continuum cultural que dá substância ao direito. Isso especialmente em 
uma fase histórica, como a contemporânea, caracterizada pela pluralidade de 
culturas que convivem e que não engrandecem a fixação dos procedentes, nem a 
primazia da autoridade do Estado, mas exigem a concretização do justo no tempo 
e no espaço. Seria aceitável por todos que a hermenêutica se inspira no princípio 
do respeito da dignidade da pessoa humana como prioritário nos confrontos dos 
interesses superiores do Estado e do Mercado. 
Direito e justiça terminam por reencontrar-se nesta perspectiva ética e filo-
sófica, de modo que "uma leitura hermenêutica da Constituição não poderá ser 
outra coisa - corno sustenta Dworkin - que moral". 
A evolução de um ordenamento e de um sistema jurídico não é puramente 
lógica nem pode depender exclusivamente da tecnologia, mas da filosofia de vida 
que saberá incorporar e realizar. Útil seria estudar mais a fundo a filosofia que 
existe no ordenamento constitucional, para fazê-la reviver com as adaptações do 
tempo transcorrido nas decisões dos juristas. Os filósofos poderiam contribuir, 
individualizando a filosofia que existe no direito. 
Neste trabalho reconstrutivo, tendente a verificar a atualidade e a adequa-
bilidade das prescrições normativas, um papel pode e deve desenvolver o senso 
comum entendido como correlação com os valores comuns, "com os princípios 
fundamentais" da convivência corno co-participação do direito na vida prática, 
a qual é urna "totalidade que não se decompõe", sínteses conflitantes de conhe-
cimentos, valores, símbolos produzidos e utilizados pelo homem dentro de ho-
rizontes culturais e ideais que se renovam sempre de maneira diacrônica e sin-
crônica, no norte e no sul do mundo, que não se deixam nunca compreender 
completamente. 
Nesta problemática de conhecimentos da vida, tem responsabilidade tam-
bém a categoria dos juristas empenhados em dissertações impecáveis formal-
mente, mas pouco úteis para conhecer a realidade e para resolver seus complexos 
problemas. 
Este texto3 volta-se "ainda uma vez" para o papel do jurista e para a sua for-
mação. 
~' No congresso, este texto foi fa lado. No original em italiano a palavra seria "este discurso" e não este texto" .

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