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Disciplina: Risco e Estrutura de Capital Módulo I Profº Marcelo Cambria Desenvolvimento da Teoria de Risco X Retorno Objetivo de Aprendizagem: é esperado que os discentes compreendam a base para o desenvolvimento da moderna teoria financeira para a avaliação dos riscos dos ativos individualmente e em conjunto (carteira) bem como que tenham contato com alguns dos pesquisadores mais célebres do assunto. 1. Características Gerais Nos últimos dois séculos, em especial após o término da segunda guerra mundial, o cenário internacional sofreu profundas alterações. Passamos de um padrão monetário relativamente estável - fundamentado na moeda plenamente conversível, o padrão ouro, o qual entra em corrosão com a primeira guerra mundial - para um ambiente econômico de incerteza, instabilidade e volatilidade, sem nenhum padrão monetário estabelecido, período este presenciado durante o entre guerras. Ao término da Segunda Guerra mundial, surge um novo esforço para a definição de um novo padrão capaz de conceber novamente estabilidade a economia mundial. Em 1944, realiza-se a conferência de Bretton Woods, estabelecendo um novo padrão monetário, o dólar-ouro sob a hegemonia norte-americana, surgindo instituições reguladoras e corretivas como o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial. Este padrão monetário pode ser mantido, até o início dos anos 70, quando os EUA decretaram a inconversibilidade de sua moeda. Desde então, o dólar tem sido a moeda internacional, em um contexto de taxas de câmbio flutuantes e liberdade de capitais; onde pode observar-se a emergência de novos centros financeiros importantes. Em conjunto com este cenário da evolução econômica, observamos nestes últimos dois séculos, uma fantástica evolução tecnológica. Um grande marco foi a indústria da microeletrônica e informática, permitindo aplicações e grandes avanços em diversas áreas; dentre elas destacamos o avanço das tecnologias de informação, como telecomunicações, teleinformática, entre outras. Ainda neste século, desenvolve-se a Teoria das Finanças, um campo de estudos de Finanças, que analisa fundamentalmente o mercado de capitais, pela disponibilidade e avaliação dos ativos financeiros; criando modelos para a precificação dos contratos financeiros; além de instrumentos de atuação neste mercado. Não existe outra área, que tenha desenvolvido grande número de teorias e técnicas que possuam tanto impacto no comportamento dos agentes econômicos, quanto o estudo das finanças tem provocado; quer no comportamento profissional, quer na prática do mundo real. O núcleo da Teoria das Finanças é o estudo da melhor alocação dos recursos ao longo do tempo em um ambiente de incerteza. Dito em outras palavras, é a busca da formação da carteira ótima onde se procura reduzir ao máximo o risco de perdas. Levando-se em conta este objetivo, esta área vem ao longo dos tempos desenvolvendo instrumentos de gerenciamento de risco. Uma questão fundamental é a quantificação e determinação do preço do risco financeiro. Para esta, se desenvolveram algumas metodologias que permitem decidir sobre um investimento, ou uma carteira de investimentos em condições de incerteza, possuindo como variável chave de análise a rentabilidade do investimento. Em geral, quando estratégias de investimento são comparadas umas às outras, risco e retorno tendem a caminhar juntos, ou seja, títulos com elevados retornos médios, tendem a possuir elevadas quantidades de risco embutidas. 2. Uma Breve Introdução à Harry M. Markowitz e William Sharpe A moderna Teoria das Finanças possui como marco inicial o clássico artigo de Harry M. Markowitz (1952). Harry M. Markowitz Nele foi mostrado como criar uma fronteira de carteiras de investimentos, de forma que cada uma possuísse o maior retorno esperado dado um certo nível de risco. A tese de Markowitz, uma mistura de matemática, estatística e teoria econômica era tão avançada para a época que não havia recursos de informática para viabilizar sua aplicação pela exigência de potentes computadores e grandes bancos de dados. Foi então, como tentativa para contornar estes problemas, que um outro modelo apareceu. Este novo modelo foi devido a William Sharpe, um ex-aluno de Markowitz, que o desenvolveu em 1963, sendo uma versão simplificada desta técnica, conhecido atualmente na literatura como Modelo do Único Fator. Este tomou a teoria das carteiras mais eficiente, mesmo quando empregamos grande diversidade de títulos. William Sharpe Uma questão aberta até aquele momento era a de que, se todos os investidores utilizassem seus recursos, de acordo com a teoria das carteiras, e aplicassem seus recursos em carteiras na fronteira, como é que os preços dos títulos seriam afetados? Três acadêmicos responderam a esta questão de forma independente. Foram eles Sharpe (1964), Lintner (1965) e Mossin (1966). Este modelo ficou conhecido como Modelo de Precificação de Ativos Financeiros (CAPM) e reinou como principal modelo da área de finanças por quase quinze anos. 3. Uma Breve Introdução ao Modelo de Precificação de Ativos CAPM Um aspecto fundamental do CAPM é a linha de mercado de títulos, uma equação linear que relaciona a taxa esperada de retorno de cada ativo (ou de carteiras de ativos) ao retorno de um ativo sem risco. A linha de mercado de títulos nos sugere que o retorno requerido pelos investidores de qualquer ativo arriscado é igual ao retorno de um ativo sem risco incrementado por um ajustamento de risco, que pode ser definido como o peso de risco do mercado, ponderado pelo risco de um ativo individual normalizado pela variância do retorno de mercado, sendo este o beta da regressão, conhecido como prêmio de risco. Estes assuntos serão abordados nos próximos books desta disciplina. O CAPM assume que o mercado funciona de uma maneira eficiente, no sentido de que os individuas atuam como tomadores de preços, todos os ativos são perfeitamente divisíveis e o mercado não possui fricções. Assume-se também que os indivíduos são avessos ao risco e maximizam a utilidade esperada. Diversos trabalhos testam o CAPM em sua forma padrão. De uma maneira geral os resultados confirmam a relação linear entre risco e retorno dos ativos; o que atribui uma certa confiabilidade ao modelo. Entretanto, ocorre que a reta de regressão empírica possui inclinação inferior à sugerida pelo modelo. Este tema também será aprofundado no book pertinente ao assunto. 4. Considerações Iniciais sobre Risco X Retorno Risco e retorno são variáveis básicas da tomada de decisão de investimentos. Genericamente, o risco é uma medida de volatilidade ou incerteza dos retornos e retorno é a expectativa de receitas de qualquer investimento. Em suma, pode-se definir risco como o grau de incerteza associado a um investimento. Quanto maior a volatilidade dos retornos de um investimento, maior será o seu risco. Quando dois ativos têm os mesmos retornos esperados, escolhe-se o de menor risco. 5. Glossário de Conceitos Úteis para a Disciplina Retorno: Principal balizador das decisões. São ganhos gerados por um ativo em certo tempo. Compreende as entradas de caixa e valorização do ativo. Taxa de retorno: Relação percentual entre o retorno e valor do ativo. Risco: É a possibilidade de prejuízo financeiro. É uma medida de probabilidade de ocorrência de prejuízo. É a variabilidade de retornos de um ativo. Incerteza: É uma situação de dúvida ou insegurança de resultados, sem forma de quantificar possibilidades de situações positivas ou negativas. Média: Soma dos valoresobservados dividida pelo número de observações. Variância: Medida que mostra quanto os valores observados se distanciam da média. Essa medida é dada em forma quadrática (segunda potência). Desvio-padrão: Raiz quadrada da variância. Volatilidade: Significa flutuações dos eventos em comparação a uma situação comum. Em um enfoque estatístico, a média é a situação comum e o desvio-padrão é a medida da flutuação. Quanto mais os eventos se distanciam da média, maior o desvio-padrão e maior a volatilidade. Probabilidade: É a representação em percentual de um evento ocorrer. É a medição das chances de um evento acontecer. Usualmente os gestores projetam cenários de eventos prováveis que podem interferir em suas decisões e lhes atribuem probabilidades de ocorrência. Correlação: Tem como significado da palavra relação mútua entre dois termos, matematicamente é a medida padronizada da relação entre duas variáveis. Existe o coeficiente de correlação: ( - 1 < 0 < 1). Uma correlação próxima ao zero indica que as duas variáveis não estão relacionadas, uma correlação positiva indica que as duas variáveis movem-se juntas, e a correlação é forte quanto mais se aproxima de 1, já uma correlação negativa indica que as duas variáveis movem-se em direções opostas, e a correlação também fica mais forte quanto mais próxima de -1. Covariância: A covariância verifica a relação de risco entre duas variáveis. Se a covariância for nula, significa que as variáveis analisadas são independentes. Já se for diferente de zero, as variáveis podem apresentar determinada dependência entre si. A covariância costuma ser chamada de medida da dependência linear de duas variáveis aleatórias (essa definição é apenas introdutória, pois os conceitos envolvidos no cálculo da covariância depende de outros conceitos). 6. Uma Introdução às Duas Únicas Formas de Retorno: Alfa e Beta Existem duas formas de se ganhar dinheiro no mercado financeiro: tomando risco sistemático (beta) ou tirando dinheiro de outros participantes do mercado (alfa). Para melhor avaliar os investimentos, é essencial que você aprenda a diferenciar essas duas formas de gerar retorno. O beta, ou risco sistemático, é o risco geral de um determinado mercado. Ele explica as diferenças entre as expectativas de retornos das diversas classes de ativos disponíveis no mercado financeiro. Ou seja, em qualquer momento no tempo os ativos podem estar caros ou baratos. No entanto, independente de seus preços, no longo prazo, a expectativa de retorno de classes de ativos consideradas arriscadas será superior ao retorno das classes de ativos com menos risco. Exemplos: . ações possuem maior expectativa de retorno que títulos públicos; . debêntures e outros títulos privados tendem a gerar maior retorno que os títulos públicos; . títulos emitidos por países em desenvolvimento geram maior retorno que títulos de países desenvolvidos. O retorno gerado de maneira generalizada por uma classe de ativos é resultado do beta daquela classe. Em tese, você pode obter maiores retornos simplesmente posicionando seus investimentos em classes de ativos mais arriscadas, aproveitando o beta daquela classe. Assim, é possível capturar o retorno decorrente do beta com estratégias simples ou facilmente replicáveis. Além disso, apesar do retorno de longo prazo decorrente do risco sistemático ser positivo, ele costuma ser baixo e muito volátil. A outra forma de se ganhar dinheiro no mercado financeiro é tirando de outros participantes do mercado. Isto é denominado “alfa”. Gerar “alfa” é o principal objetivo dos gestores de fundos de investimento e implica no chamado “jogo de soma zero”. Visto que em qualquer operação no mercado financeiro existe um comprador e um vendedor, haverá nestas operações sempre um ganhador e um perdedor, sendo que o retorno que o ganhador obtiver coincidirá com o prejuízo que o perdedor vai sofrer. Por exemplo, se o Investidor A comprou ações de uma companhia aberta por R$ 10 mil, certamente na outra ponta há um ou vários outros investidores que venderam essas ações por esse mesmo preço. Se as ações agora valem R$ 12 mil, o Investidor A ganhou R$ 2 mil e os vendedores deixaram de ganhar esse mesmo valor. Como exemplo de estratégias que geram alfa é possível citar estratégias do tipo market timing (que buscam identificar os momentos certos de comprar e vender ativos) e de seleção de ativos (que buscam comprar ativos com distorção de preço ou que tenham uma performance ainda não percebida pelo mercado). Apesar de controvertida no meio acadêmico, a existência de gestores excepcionais, tanto no mercado internacional quanto no local, capazes de gerar retornos consistentes por diversas décadas parece demonstrar a viabilidade da geração de alfa. Presumindo que ela exista, essa habilidade para gerar alfa é certamente rara. Assim, seria justificável o preço alto que os gestores capazes de obtê-lo cobram por seus serviços. O maior problema é que existem muitos outros gestores cobrando o mesmo preço, sem possuir a habilidade de gerar alfa para seus cotistas. E é uma tarefa difícil diferenciar os gestores que geram alfa daqueles cujo retorno é obtido apenas por assumir mais risco com o dinheiro de outrem. 7. Retorno Esperado ou Taxa de Retorno Esperada Retorno esperado ou Taxa de Retorno Esperada é a remuneração que os investidores solicitam para manter suas aplicações no ativo considerado. Vale ressaltar que o retorno esperado se difere do retorno efetivo apenas por se tratar ex-ante, enquanto que o retorno efetivo já foi efetivamente conhecido. A probabilidade será usada como forma de quantificar o nível de possibilidade de um projeto ter os seus valores projetados correspondidos efetivamente, levando sempre em consideração os cenários projetados para cada um deles. Exemplo: Probabilidade Investimento A Investimento B Cenário 01: Expansão Econômica 0,3 100% 20% Cenário 02: Estabilidade - Normal 0,4 15% 15% Cenário 03: Recessão Econômica 0,3 - 70% 10% Total: 1,0 Valor Esperado do Investimento A E(RA) = (0,30 x 100%) + (0, 40 x 15%) + (0,30 x -70%) E(RA) = 15% Valor Esperado do Investimento B E(RB) = (0,30 x 20%) + (0,40 x 15%) + (0,30 x10%) E(RB) = 15% Se se multiplica a probabilidade pela taxa de retorno projetada e se somam esses produtos, então obtém-se a taxa de retorno esperada ou retorno esperado. 8. Relação entre Risco e Retorno O conhecimento da relação entre risco e retorno pode ser a intenção principal de qualquer investidor. O investidor está sempre interessado em obter alto retorno com baixo risco. Se ele conseguir quantificar o relacionamento e sua direção, poderá administrar seu investimento de uma maneira melhor. Discutir esse conceito é importante para explicar que tipo de relação entre risco e retorno pode ocorrer. A relação entre risco e retorno significa estudar o efeito de ambos os elementos, um ao outro. É possível medir o efeito do aumento ou diminuição do risco no retorno do investimento. 8.1. Relação Direta entre Risco e Retorno (A) Alto Risco - Alto Retorno Nesse tipo de relacionamento, se o investidor corre mais risco, terá mais retorno. Existe a possibilidade de, no caso de investimento de milhões, há risco de perda ou ganho de milhões de reais. (B) Baixo risco - Baixo retorno É também relação direta entre risco e retorno. Ou seja, se um determinado investidor decidir pela redução do seu risco de perda, neste mesmo momento, seu retorno também está sujeito à diminuição. 8.2. Relação Negativa entre Risco e Retorno (A) Alto Risco - Baixo Retorno Emalguns cenários e ocasiões, um determinado investidor pode decidir pelo aumento do valor do investimento para obter um retorno mais alto. Entretanto, é possível que, com o aumento do investimento, ele enfrente um retorno menor! Isto ocorre porque a natureza do projeto pode ter sido negligenciada. Para tornar um pouco mais claro, suponha que um apostador tenha comprado 1.000.000 de bilhetes de 6 números da loteria mega-sena. Esta aposta alta pode ter sua analogia em um empreendimento ou investimento em que um empresário coloque muitas ou todas as suas fichas. Entretanto, como é sabido, a chance de obter êxito com esta empreitada é muito baixo: 1/ 50.063.860. Ou seja, para garantir a possibilidade de ganho, seriam necessários mais de 50 milhões de bilhetes, sem repetições, para que as chances de êxito fossem garantidas. Caso haja o lapso de não preencher uma destas combinações, o prêmio estará sob risco! (B) Baixo Risco - Alto Retorno Existem alguns projetos em que há uma relação prêmio versus risco bem interessante. Como exemplo, é possível relatar o trade-off existente entre risco e retorno com títulos públicos emitidos pela Secretaria do Tesouro Nacional do Brasil. Estes títulos públicos e bonds (emissões no exterior) frequentemente oferecem taxas convidativas para investidores. Ao mesmo tempo em que investidores do mundo inteiro (grandes fundos de gestão de riscos, fundos de pensão, instituições governamentais, etc...) praticam o sell-off (venda maciça) quando fraudes ou instabilidades políticas aumentam o risco de inadimplência dos títulos públicos brasileiros, há a via de mão dupla: os títulos do Brasil são amplamente conhecidos no mundo pela boa relação risco X retorno que oferecem. Se houver a oportunidade de investir o dinheiro, historicamente há um retorno relevante em relação ao risco baixo da perda de capital.
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