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criativa, com respeito à diversidade de saberes, 
identidades e culturas. 
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional 
Comum Curricular. Brasília, 2018, p. 494.
No momento em que resgatamos a importân-
cia de toda e qualquer produção artística, inde-
pendentemente do contexto em que ela surge, 
ampliamos o olhar para as referências, para as 
diferentes estéticas e valorizamos o outro.
Além disso, todo o processo instaurado neste ca-
pítulo está voltado para as seguintes questões:
 ■ Qual é a relação entre a desterritorialização da 
música e a imposição dos métodos de ensino?
 ■ Quais são as possíveis abordagens do “fazer 
musical” ou do “ensino musical”, pensando 
em uma desterritorialização do ensino?
Vamos refletir agora sobre um aspecto literal 
dos territórios e das desterritorializações, que 
ocorrem nas situações em que povos são le-
vados – ou forçados – a deixar as localidades 
em que vivem e se tornam nômades. Assim, 
vamos olhar para os movimentos migratórios 
de povos e etnias analisando seus aspectos 
políticos e históricos, considerados em seus 
contextos e multiculturalismos. 
No período de formação das primeiras civiliza-
ções (4.000 a.C.), quando os povos ainda eram 
essencialmente nômades, a vida era pautada 
pelas possibilidades da pesca e da caça na re-
gião, além de outras necessidades do grupo 
que poderiam surgir. Esses grupos estabele-
ciam-se em determinado local e se deslocavam 
quando os recursos naturais dali se esgotavam. 
E, assim, seguiam a pé em busca de um novo 
território onde pudessem se restabelecer. 
Há 10 mil anos a agricultura começou a se de-
senvolver e, por essa razão, muitos nômades 
optaram por se fixar em regiões propícias ao 
cultivo, tornando-se sedentários. À medida que 
essa prática crescia, mais grupos organizaram-
-se em torno da cultura do plantio, dando início 
ao processo de formação de pequenas comu-
nas fincadas em uma única área, delimitando 
seus territórios, criando suas regras sociais, po-
líticas, culturais e a tecnologia. Conforme esse 
processo se desenvolvia, grandes civilizações 
surgiram, como os povos acádios, babilônios, 
assírios e caldeus que, na Antiguidade, habita-
vam a região da Mesopotâmia, considerada o 
“berço da civilização”.
A palavra diáspora tem origem no termo gre-
go diasporá (dia = ‘através’, speirein 5 ‘semear’ 
ou ‘dispersão’), que significa de maneira redu-
zida ‘dispersão forçada de povos por motivos 
religiosos ou políticos’.
Esse processo de dispersão e deslocamentos 
deixou muitas marcas em alguns povos, como 
judeus, gregos, romani (como são designados 
os ciganos), armênios e africanos, que foram 
obrigados a se deslocar e a povoar novos terri-
tórios. Em territórios já povoados, construíram 
novas formas de viver, misturando suas cultu-
ras e saberes às culturas locais. 
O som do tambor, uma herança cultural dos povos 
africanos. 
No Brasil, a diáspora africana marcou o país. Esse 
quadro começou a se delinear quando homens 
e mulheres de diversas etnias, nascidos no con-
tinente africano, foram retirados à força de suas 
terras e chegaram ao país escravizados, trazen-
do com eles uma porção de saberes e fazeres, 
que se misturaram à cultura da terra, a cultura 
indígena, e à dos colonizadores. 
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Em seu trabalho nas terras e na casa dos se-
nhores e senhoras de engenho, os escravizados 
emprestaram sua sabedoria, que se mesclou 
aos fazeres dos colonizadores, delineando as 
culturas em transformação e formação. Assim, 
os cantos e as danças, a culinária e suas formas 
de preparo, as religiões e crenças se misturaram, 
e as sociedades passaram, então, a se miscige-
nar. É claro que a tentativa de destruição total 
da identidade dos povos indígenas e africanos 
ocorreu com mais intensidade, pois os coloni-
zadores não contavam com a força das culturas 
que subestimaram e subjugaram e que se en-
trelaçaram com a deles de maneira irreversível.
Esse movimento diaspórico propicia a obser-
vação de como se dá a confecção dos mapas 
territoriais, que trazem a noção do cartografar, 
ou seja, desenhar a linha que delimita o espa-
ço. Assim, podemos dizer que a cartografia 
está em constante movimento, se considerar-
mos que todas as definições que nomeiam os 
possíveis territórios, como nações, estados, 
províncias, cidades e vilas, criam fronteiras que 
podem ou não ser transgredidas, ultrapassa-
das ou mesmo quebradas. 
No mundo contemporâneo, observamos com-
plexas mudanças no mapa-múndi, que ocorre-
ram em virtude de quedas de muros, destrui-
ções, catástrofes naturais e da quase extinção 
de cidades, provocando o deslocamento de 
pessoas do mundo todo: os chamados refugia-
dos, que podem ser considerados potenciais 
transformadores de territórios, pois levam com 
eles uma bagagem enorme de culturas próprias. 
Os “potenciais transformadores” espalham-se 
e transbordam pelas fronteiras, alcançando 
territórios que não são os seus de nascimen-
to, mas seus de chegada. Com isso, é possível 
perceber quanto a itinerância dos corpos muda 
os traçados dos mapas de tempos em tempos, 
pois o mapa é um território que cria e se recria 
a partir de outros territórios.
Nas temporalidades mais próximas, o Brasil 
recebeu diversos povos europeus e asiáticos, 
entre outros. Cada um desses povos se estabe-
leceu em diferentes regiões e cidades do país 
e, como grandes guetos, buscaram sua própria 
organização em um país estranho, numa tenta-
tiva de manutenção e de sobrevivência de suas 
estruturas sociais e culturais. Dessa maneira, 
fincaram os pés em territórios próprios: em São 
Paulo, por exemplo, no bairro da Liberdade, 
estabeleceram-se os japoneses; no bairro do 
Brás, os italianos e árabes, na Vila Prudente, os 
russos, entre muitos outros. A proximidade dos 
territórios e a possibilidade do livre desloca-
mento pelas cidades provocou a miscigenação 
e a semeadura dessas culturas pelos espaços.
E como não apontar, no século XXI, a intensi-
ficação da globalização, que se faz cada vez 
mais presente com suas conexões, intersec-
ções de pensamentos e trocas de saberes em 
ambientes virtuais? 
O fenômeno do deslocamento e da dispersão 
propicia a criação de territórios moventes de 
pessoas, saberes e modos de vida, em um pro-
cesso rizomático em que um não elimina o ou-
tro, pois ambos se confundem, conectando-se, 
misturando-se e criando novas possibilidades. 
Qualquer território geográfico pode ser des-
territorializado de tempos em tempos, ceden-
do a chegadas e partidas, mudando suas ca-
racterísticas e até mesmo suas formas de se 
viver internamente. As paisagens também se 
transformam dentro desses territórios, quando 
a natureza dá lugar às cidades ou quando as 
cidades são abandonadas e a natureza retoma 
seu espaço. E esse movimento é constante.
No Brasil atual, nas ruas das grandes cidades há 
trânsitos de pessoas de diferentes regiões do 
país, mas também de africanos, árabes, bolivia-
nos, chineses, argentinos, povos que trazem sua 
música e imprimem sua marca. São pessoas vin-
das de lugares diversos e que espalham sua cul-
tura como forma de sobrevivência. A cultura da 
música soa, vai pelo ar e entra em nossos ouvi-
dos. É impossível não nos darmos conta disso, a 
menos que estejamos imersos em nós mesmos, 
de tal forma, que nada nos afeta. Os sons não 
escolhem seus caminhos, eles alcançam todos 
que podem ouvir, invadindo ambientes, e se im-
põem ao delimitar seu território. 
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