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Mariana Gomes
03/06/2017
Mylla Christie
12.11.2017
Como ponto de partida, cabe fazer menção ao contexto no qual John Locke desenvolveu sua teoria da propriedade, posto que o momento histórico influenciou o desenvolvimento de suas ideias. A obra de John Locke está inserida no contexto das revoluções inglesas do século XVII, ou seja, período de tensões políticas marcado pela contraposição entre absolutismo e liberalismo. Opositor do absolutismo defendido pela Coroa inglesa, sobretudo no período da dinastia dos Stuart, Locke direcionou-se para uma visão liberal, contribuindo, através de suas obras, para o estabelecimento das bases teóricas do Estado Liberal. Refugiou-se na Holanda durante determinado período por ter se envolvidos supostos conspiradores da Coroa inglesa, retornando à Inglaterra no mesmo navio de Guilherme de Orange, aquele que viria a ser o símbolo da consolidação da monarquia parlamentar inglesa. Tornou-se, posteriormente, o teórico da revolução liberal inglesa. “Suas ideias políticas fecundaram todo o século XVIII, dando o fundamento filosófico das revoluções liberais ocorridas na Europa e nas Américas.” (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 304). Entre suas principais obras, destacam-se os Dois tratados sobre o governo civil. No segundo desses tratados é que estão consubstanciados a origem, extensão e objetivo do governo civil. As bases do direito de propriedade passariam a ser construídas na sua obra. 2.2 Delineamentos do direito de propriedade: características, fundamento e desdobramentos Locke revelou, através de seus escritos, o seu modelo jusnaturalista, sendo, por essa razão, considerado um dos importantes representantes do direito natural. No sistema de direitos naturais proposto pelo pensador é que se insere a teoria da propriedade, diretamente relacionada com a concepção que Locke tinha do trinômio estado natural/contrato social/estado civil, relações que merecem a devida explicação. O estado de natureza para Locke era caracterizado por ambiente de relativa paz e harmonia, no qual os homens detinham plena liberdade e igualdade. Segundo Leonel Itaussu Almeida Mello (2006, p. 84-85): Locke afirma ser a existência do indivíduo anterior ao surgimento da sociedade e do Estado. Na sua concepção individualista, os homens viviam originalmente num estágio pré-social e pré-político, caracterizado pela mais perfeita liberdade e igualdade, denominado estado de natureza. […] Nesse estado pacífico os homens já eram dotados de razão e desfrutavam da propriedade que, numa primeira acepção genérica utilizada por Locke, designava simultaneamente a vida, a liberdade e os bens como direitos naturais do ser humano. Como se depreende da citação, a propriedade é preexistente à instituição da sociedade civil, estando ligada diretamente à cada indivíduo. Observa-se, justamente nesse ponto, a relação que existe entre a teoria da propriedade e o estado de natureza: como a propriedade precede à sociedade civil, ela já se fazia presente no próprio estado de natureza; a liberdade tão característica desse estado pré-social vai estar contida no próprio conceito de propriedade. A propriedade para Locke, portanto, pode ser encarada sob duas acepções. Primeiramente, pode se falar em propriedade num sentido amplo, segundo o qual ela designa, de forma simultânea, tanto a vida, quanto a liberdade e os bens do ser humano, ou seja, é “tudo o que pertence a cada indivíduo” sendo que “a primeira coisa que a pessoa possui, portanto, é o seu corpo: todo indivíduo é proprietário de si mesmo e de suas capacidades” (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 305). De outro lado, a propriedade, em sentido estrito, remete à posse de bens móveis ou imóveis. Em suma, Locke coloca a propriedade como um direito natural, ou seja, um direito inerente ao homem, dele não se destacando. Segundo o filósofo: cada homem tem uma ‘propriedade’ em sua própria ‘pessoa’; a esta ninguém tem qualquer direito senão ele mesmo. Podemos dizer que o ‘trabalho’ do seu corpo e a ‘obra’ das suas mãos são propriamente seus. Seja o que for que ele retire do estado que a natureza lhe forneceu e no qual o deixou, fica-lhe misturado ao próprio trabalho, juntando-se-lhe algo que lhe pertence e, por isso mesmo, tornando-o propriedade dele. (MELLO, 2006, p. 94). Para complementar, Locke atribuiu à propriedade uma origem divina, visto que Deus teria instituído, “no momento de criação do mundo e do homem, o direito à propriedade privada como fruto legítimo do trabalho” (CHAUÍ, 2007, p. 207). Era a efetivação da propriedade como direito natural de origem divina. Outra decorrência do pensamento de Locke, no contexto da teoria da propriedade, é a indicação do trabalho como fundamento da propriedade. Ao mesmo tempo que é fundamento, o trabalho também é forma de aquisição da propriedade pelo homem: O trabalho de seu corpo é propriamente dele; portanto, o trabalho dá início ao direito de propriedade em sentido estrito (bens, patrimônio). Isso significa que, na concepção de Locke, todos são proprietários: mesmo quem não possui bens é proprietário de sua vida, seu corpo, seu trabalho e, portanto, dos frutos do seu trabalho. (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 305). Segue-se o fato de que: o trabalho exercido pelo homem constitui sua propriedade, assim como os frutos que dele obtiver. É primariamente a partir do trabalho que o homem consegue sair de sua carência inercial para alcançar bens que saciem suas necessidades básicas (LEAL, 2012, p. 54). Conquanto Locke tenha delineado o estado de natureza como um ambiente de paz, igualdade e coexistência de liberdades, ele não estava imune à algumas perturbações na sua ordem harmônica, pois poderiam ocorrer violações aos direitos das pessoas. Não havia, nesse estágio, o necessário amparo e segurança tendentes a salvaguardar o direito à propriedade de transgressões pelos outros indivíduos. Assim é que evidenciou-se a necessidade do estabelecimento do contrato social para conter os inconvenientes do estado de natureza. O contrato social é o instrumento que marca a passagem do estado de natureza para a sociedade civil. Essa sociedade civil nasce com o objetivo de, justamente, propiciar a proteção da propriedade e da comunidade dos perigos internos e externos. Logo, aqui se revela a relação existente entre a propriedade e outras duas ideias trabalhadas por Locke: relação entre a propriedade e o contrato social e relação entre propriedade e sociedade civil. As duas relações entram em contato, pois a sociedade civil nasce como forma protetiva da sociedade e o instrumento apto à fazer a transição entre o estado de natureza e o estado civil é o contrato social.
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