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Discorra sobre o surgimento das constituições e explique os elementos normativos fundamentais para a existência de uma constituição.

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Drielle Porto Marques

 

SISTEMA CONSTITUCIONAL ANTIGO E MODERNO

A grande maioria dos autores brasileiros entende que os dois grandes marcos de surgimento do Direito Constitucional são a Constituição dos Estados Unidos da América de 1787 e a Constituição da França de 1791.

A pertinência de tal argumento depende do conceito que se adote de Direito Constitucional entre o mais amplo e o mais restrito. O conceito mais amplo, associado ao Direito Constitucional moderno, representa o conjunto de normas emanadas do poder máximo de um determinado Estado soberano que disciplina as formas de aquisição, exercício, perda e limitação (liberdades públicas) do poder estatal. O conceito mais restrito, associado ao Direito Constitucional antigo, inclui apenas as formas de aquisição, exercício e perda do poder estatal, excluindo-se as formas de limitação oponíveis ao Estado em favor do cidadão.

A Constituição de 1787 apresentou, no seu texto original, apenas normas de consolidação do federalismo, da tripartição de poderes entre outras normas de organização do Estado, mas não estabeleceu qualquer regra referente a direitos humanos de primeira geração.

De fato, somente as Emendas à Constituição de 1787 consolidaram o rol de liberdades públicas. Assim, a Constituição Americana não pode ser considerada como marco fundamental do Direito Constitucional moderno, pois o seu texto original não apresentou o elemento essencial para o conceito moderno, qual seja, o citado rol.

O surgimento do Direito Constitucional antigo confunde-se com o surgimento do Estado. Já o Direito Constitucional moderno não surgiu de um ato isolado, mas de um processo de afirmação desenvolvido ao longo de vários séculos de implantação dos direitos humanos de primeira geração, considerando-se, segundo os postulados do Direito Positivo, como marco inicial do processo o advento da Magna Charta Libertum, de 15 de junho de 1.215.

É fora de dúvida que, conforme ensinamento do professor Dalmo Dallari, os documentos anteriores àquela data revelam algumas normas não sistemáticas de afirmação de Direitos Humanos como positivações tímidas de direitos reputados naturais e cujo respeito era imposto a todos os governantes independentemente do seu regime ou sistema de governo.

Deve ser observado, porém, que tais documentos mesclavam preceitos jurídicos, morais e religiosos, representando, antes de tudo, normas sociais gerais de imposição de certos comportamentos com nenhuma ou pouca eficácia jurídica. É ponto pacífico, por exemplo, que na idade média não havia grandes sistematizações de Direitos Humanos.

Outros atos do processo de afirmação podem ser citados, entre eles: (i) a Nova Constituição Merton, de 1236; (ii) a Petition of Right, de 1628; (iii) o Habeas Corpus Act, de 1679; (iv) a Bill of Rights, de 1689; e (v) o Act of Settlement, de 1701, mas tais atos tiveram menor importância sistemática do que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, que representou a primeira lista de regras jurídicas de direitos e garantias fundamentais com pretensões de eficácia em todas as nações do planeta. Assim, na França e nos países que a aceitaram, sua natureza era de direito positivo. Nos países que não a integraram formalmente aos seus sistemas jurídicos, a Declaração poderia ser invocada pelo cidadão como direito natural.

Apesar de não se poder esquecer a promulgação das dez primeiras emendas à Constituição dos Estados Unidos da América, ocorrida em 25 de setembro de 1789, a Constituição Francesa consolidou-se como marco inicial de surgimento do constitucionalismo moderno e bem sistematizado.

Resta patente, assim, que a fixação de um ou alguns marcos de surgimento do Direito Constitucional depende do conceito usado para definir a disciplina.

Ressalte-se que Uadi Lamêgo Bulos, apesar de usar de forma invertida o conceito de amplo e restrito aqui apresentados, afirma que, no primeiro sentido, a ideia de constitucionalismo logra amplitude considerável, porque se prende ao fato de que todos os Estados, seja qual for a fase de evolução da humanidade, possuem uma “Constituição” e que, sob a ótica estrita, o constitucionalismo advém do movimento constitucionalista do século XVIII que o alçou ao ponto técnico-jurídico de liberdades públicas.

Assim, não há dúvida de que, considerada a natureza ideal e imputacional da Ciência do Direito, o surgimento de um dos seus ramos não representa uma operação instantânea tal como visto nas ciências físico-químicas, mas apenas, e tão-somente, um processo de amadurecimento social que se traduz em novas normas jurídicas.

 SISTEMA AUTOPOIÉTICO

Humberto Maturana e Francisco Varela definiram os sistemas biológicos como autopoiéticos, ou seja, são conjuntos de elementos e circunstâncias que, ligados, formam um todo diferente da mera soma desses elementos e circunstâncias (sistemas) e são, além disso, formalmente fechados e materialmente abertos (autopoiéticos).

Tais sistemas podem ser descritos como os que integralizam apenas conteúdo, sendo que a sua formatação inteira é produzida pelo próprio sistema, verbi gratia, o organismo humano. Tem-se como exemplo a formação dos órgãos e células humanos que é regida pelo próprio organismo (formalmente fechado), mas importa-se conteúdo do meio tal como os alimentos (materialmente aberto).

Niklas Luhmann adequou a teoria da biologia para o Direito, afirmando que os sistemas jurídicos produzem suas próprias normas, vide, v. g., os artigos 59 a 69 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, mas importam conteúdo do meio, o que pode ser visto em relação ao conceito de aborto, monopólio etc. Aquele trazido pela medicina e este pela economia.

Assim, o sistema jurídico ou sistema constitucional fundador seria autopoiético para Luhmann, pois as formas de existência, validade e eficácia jurídicas, os processos ou procedimentos de elaboração e os legitimados para criar normas jurídicas não são definidos por critérios psicológicos, econômicos, químicos, físicos, médicos e sim pelo próprio ordenamento jurídico.

O inverso temperado da autopoiese é a alopoiese, pois nesta o sistema seria formalmente aberto e materialmente aberto, importando forma e conteúdo, sendo certo que os sistemas jurídicos realistas tendem para a alopoiese.

A tentativa de classificação do sistema constitucional fundador como alopoiético ou autopoiético ilustra um grave problema que deve ser sempre levado em consideração, qual seja, a distinção entre o momento de criação de um sistema e o momento que tal sistema se apresenta criado.

Nos Estados Constitucionais, o ordenamento jurídico, como já foi dito, tem como marco de surgimento as suas constituições. A decisão de elaborar uma nova constituição divide-se na criação de regras pré-constitucionais provisórias destinadas a dar uma primeira forma jurídica ao novo estado de coisas e na definição da linha orientadora representativa do procedimento constituinte propriamente dito.

Uma segunda expressão foi apresentada por Olivier Beaud: decisão pré-constituinte, representando aquela que regula o procedimento constituinte adequado. Compreende-se que, nesta fase, estabeleçam-se apenas as condições mínimas e as regras indispensáveis para a criação de uma constituição legítima. Entretanto, as normas pré-constitucionais são descartadas pelo novo ordenamento jurídico criado pela nova constituição no momento da sua entrada em vigor, ou seja, aquelas normas anteriores não farão parte do sistema e sempre serão classificadas como elementos exógenos de criação.

Chega-se à conclusão de que, no momento inicial, os sistemas constitucionais hodiernos não podem ser classificados como autopoiéticos, pois são elementos externos que determinam tanto a sua forma quanto o seu conteúdo.

Em um primeiro momento, há integralização de forma e conteúdo; apenas após a sua criação, o sistema jurídico torna-se formalmente fechado e materialmente aberto.

Não se pode alegar que inexiste conjunto normativo quando da formação do texto constitucional futuro, pois, considerados os três planos (existência, validade e eficácia), existem normas que ainda não são válidas nem eficazes.

Tais constatações ilustram que não há classificação perfeita para os sistemas jurídicos; restam apenas classificações ocasionais.

Assim, a Constituição, estatuto fundador do ordenamento jurídico, pode ser classificada, após a sua entrada em vigor, como autopoiética e o marco de surgimento do Direito Constitucional pode variar de acordo com o referencial adotado.

 

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DLRV Advogados

A primeira constituição, ao menos do ponto de vista da maioria dos autores, foi a dos Estados Unidos da América, em 1787, seguindo-se-lhe a da França, 1791, cuja causa foi a Revolução francesa de 1789.

O movimento político-jurídico-social que originou o conceito de Constituição, seu conteúdo e o detentor do poder nos Estados, é chamado de constitucionalismo.

Tal movimento ocorreu quase que simultâneamente em duas frentes diversas. Uma na França, e outra nos Estados Unidos, sendo certo que ambas concorreram para a formação da idéia de constituição.

Na Europa o constitucionalismo teve início com a revolta burguesa, detentora do poder econômico, contra o absolutismo monarquico, onde todo poder político se concentrava nas mãos do monarca. Munidos do arcabouço teórico dos pensadores iluministas e contratualistas (Locke, Hobes e Rousseau) e dos ideais de Estado de Montesquieu, a burguesia passou a pressionar a monarquia, o que culminou com a revolução francesa e, logo após, com a proclamação da nova Constituição Francesa, a primeira que trazia apenas normas de organização do Estado e direitos e garantias de primeira geração (liberdades individuais).

Nos Estados Unidos o movimento ocorreu de forma diversa. Ao se tornarem independentes da Inglaterra, os estados se reuniram e optaram, na Convenção da Filadélfia, por produzir uma Constituição. Adotaram um Estado Federado Republicano, tendo o consitucionalismo evoluido para garantir direitos já conquistados (civis e políticos) e para a implantação de direitos econômicos e sociais e direitos de igualdades.

Há diversos autores que dão conceitos diversos para constituição, apresentando diversos elementos normativos fundamentais diferentes para que se possa considerar um documento uma constituição. Para nós, o conceito de constituição mais correto é aquele dado por J. J. Gomes Canotilho.

Segundo o jurista português, "constituição é a ordenação sistemática e racional da comunidade política, através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os limites do poder político.

Temos então os seguintes pontos:

  • deve haver ordenação sistematica e racional da comunidade política em documento escrito;
  • deve declarar os direitos e liberdades individuais; e
  • deve impor limites ao poder político.
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