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Resumo sobre funções socias do contrato

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Thiago Sacchetto

legal

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Especialistas PD

Sebastião de Assis Neto ensina que:

“A função social da propriedade reflete diretamente no preceito infraconstitucional da função social do contrato (CC, art. 421), já que o contrato é a forma privada mais usual de circulação da propriedade. Em ambos os casos, estabelece-se que o exercício do domínio e as bases contratuais não podem ignorar a prevalência do interesse público sobre o privado, de sorte que as relações jurídicas particulares não podem ferir o interesse coletivo.

Por igual, temos normas que, em aplicação à função social do contrato, garantem a preconizada redução das desigualdades, como na possibilidade de anulação ou revisão do negócio jurídico por lesão ou estado de perigo e nos limites impostos à cláusula penal pelo art. 413 do Código Civil (Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.)” (Manual de Direito Civil. 2ª ed. pg. 840)

Flávio Tartuce, por sua vez, referindo-se ao princípio da função social do contrato apresenta as seguintes indagações:

Conceitua-se o regramento em questão como um princípio de ordem pública – art. 2.035, parágrafo único, do Código Civil –, pelo qual o contrato deve ser, necessariamente,interpretado e visualizado de acordo com o contexto da sociedade.

A palavra função social deve ser visualizada com o sentido de finalidade coletiva, sendo efeito do princípio em questão a mitigação ou relativização da força obrigatória das convenções (pacta sunt servanda).

Nesse contexto, o contrato não pode ser mais visto como uma bolha, que isola as partes do meio social. Simbologicamente, a função social funciona como uma agulha, que fura a bolha, trazendo uma interpretação social dos pactos. Não se deve mais interpretar os contratos somente de acordo com aquilo que foi assinado pelas partes, mas sim levando-se em conta a realidade social que os circunda. Na realidade, à luz da personalização e constitucionalização do Direito Civil, pode-se afirmar que a real função do contrato não é a segurança jurídica, mas sim atender aos interesses da pessoa humana.

Aprimorando o estudo do tema, faz-se necessária a transcrição do art. 421 do Código Civil de 2002, dispositivo que inaugura o tratamento do tema na atual codificação privada: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

(...) merece estudo a questão da dupla eficácia do princípio em questão. Isso porque tem prevalecido a ideia de que a função social do contrato tem tanto eficácia interna (entre as partes), quanto eficácia externa (para além das partes). Vejamos de forma detalhada.

  1. Eficácia interna da função social dos contratos – reconhecida pelo Enunciado n. 360 do CJF/STJ, aprovado na IV Jornada de Direito Civil, por proposição deste autor. A eficácia interna da função social dos contratos tem cinco aspectos principais:

a.1) Proteção dos vulneráveis contratuais – o CDC protege o consumidor, a CLT protege o trabalhador e o CC/2002 protege o aderente em dois dispositivos (arts. 423 e 424). O primeiro comando enuncia que em havendo nos contratos de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, será adotada a interpretação mais favorável ao aderente. Segue-se o exemplo do art. 47 do CDC, que prevê a interpretação pro consumidor. Já o art. 424 do CC segue a experiência do art. 51 do CDC, determinando a nulidade das cláusulas que implicam na renúncia antecipada do aderente a um direito resultante da natureza do negócio. Como primeiro exemplo, tem-se entendido que a cláusula de renúncia ao benefício de ordem pelo fiador será nula quando inserida em contrato de adesão (Enunciado n. 364 do CJF/STJ).

Isso porque o fiador tem como direito-regra o citado benefício de ordem (art. 827 do CC), cabendo a sua renúncia também em regra (art. 828 do CC). Como segundo exemplo, destaque-se enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: “A cláusula de renúncia antecipada ao direito de indenização e retenção por benfeitorias necessárias é nula em contrato de locação de imóvel urbano feito nos moldes do contrato de adesão” (Enunciado n. 433). O enunciado doutrinário acaba funcionando como exceção à regra da possibilidade de renúncia às benfeitorias necessárias, nos termos da Súmula 335 do STJ. Nos contratos de adesão, a renúncia às citadas benfeitorias deve ser tida como nula, eis que o locatário, como possuidor de boa-fé, tem como inerente ao negócio o referido direito assegurado pelo art. 1.219 do CC. Em suma, as cláusulas abusivas não ocorrem exclusivamente nos contratos de consumo, mas também nos contratos civis comuns (Enunciado n. 172 do CJF/STJ da III Jornada de Direito Civil).

a.2) Vedação da onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual (efeito gangorra) – o que pode motivar a anulação (arts. 156 e 157 do CC), a revisão (art. 317 do CC), ou mesmo a resolução do contrato (art. 478 do CC). Muitos julgados nacionais têm estabelecido tal correlação (por todos: TJMG, Apelação Cível 1.0024.08.2818899/0011, Belo Horizonte, 12.ª Câmara Cível, Rel. Des. Alvimar de Ávila, j. 07.04.2010, DJEMG 19.04.2010; TJRS, Acórdão 70033733569, Passo Fundo, 13.ª Câmara Cível, Rel. Des. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, j. 18.03.2010, DJERS 14/04/201001; TJRJ, Acórdão 2007.001.02957, 5.ª Câmara Cível, Rel. Des. Cristina Tereza Gaulia, j. 13.02.2007).

a.3) Proteção da dignidade humana e dos direitos da personalidade no contrato, conforme consta do Enunciado n. 23 do CJF/STJ, da I Jornada de Direito Civil, outrora transcrito.

Em suma, não pode prevalecer o conteúdo do contrato que traz claro prejuízo à proteção da pessoa humana, retirada do art. 1.º, III, da CF/1988 (visão civilconstitucional).

Trazendo essa correlação, com interessante adequação à realidade social, do Tribunal de São Paulo: “Agravo de Instrumento. Internação de emergência. Prazo de carência. Menor, com 10 meses de idade, com seguros sintomas de H1N1. Limitação a 12 horas. Restrição inadmissível, com prevalência da hipossuficiência, da tutela da dignidade da pessoa humana e da função social do contrato. Precedentes jurisprudenciais favoráveis, não se desconhecendo posicionamentos contrários. Recurso improvido” (TJSP, Agravo de Instrumento 994.09.2822247,

Acórdão 4368888, Atibaia, 6.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. José Joaquim dos Santos, j. 11.03.2010, DJESP 16.04.2010). Cite-se, ainda, o excelente Enunciado n. 542, da VI Jornada de Direito Civil, realizada em 2013, segundo o qual a recusa de renovação das apólices de seguro de vida pelas seguradoras em razão da idade do segurado é discriminatória e atenta contra a função social do contrato. Ato contínuo, não se olvide que o descumprimento de um contrato pode gerar dano moral, especialmente quando envolver valor fundamental protegido na CF/1988, caso da saúde e moradia. Nesse sentido, enunciado doutrinário aprovado na V Jornada de Direito Civil, proposto pelo presente autor (Enunciado n. 411), perfeitamente aplicável para as hipóteses em que a empresa de plano de saúde, sem justo motivo, nega a internação do paciente, cabendo indenização por danos morais em casos tais (veja-se, por todos: STJ, REsp 880.035/PR, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 21.11.2006).

a.4) Nulidade de cláusulas antissociais, tidas como abusivas – para tal conclusão podem ser utilizados, em complementaridade ao art. 421 do CC, os arts. 187 e 166, II, do próprio Código. A primeira norma enuncia a ilicitude, por abuso de direito, havendo excesso contratual que desrespeita a finalidade social (= função social). A segunda dispõe que é nulo o negócio jurídico se o seu conteúdo for ilícito. Na esteira dessa conclusão, na V Jornada de Direito Civil, foi aprovado enunciado colocando a função social do contrato no plano da validade do negócio. Vejamos a redação da proposta de Gerson Luiz Carlos Branco, que traduz pensamento sempre seguido pelo presente autor: “A violação do art. 421 conduz à invalidade ou à ineficácia do contrato ou de cláusulas contratuais” (Enunciado n. 431). Ilustrando com típica cláusula que viola a função social, a Súmula 302 do STJ determina a nulidade, no contrato de plano de saúde, da cláusula que limita a internação. Ainda a título de exemplo a respeito das cláusulas antissociais, destaque-se outro enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil, de autoria de Wladimir A. Marinho Falcão Cunha: “Em contratos de financiamento bancário são abusivas cláusulas contratuais de repasse de custos administrativos (como análise do crédito, abertura de cadastro, emissão de fichas de compensação bancária etc.), seja por estarem intrinsecamente vinculadas ao exercício da atividade econômica, seja por violação ao princípio da boa-fé objetiva” (Enunciado n. 432). Ressalve-se que, a apesar da menção à boa-fé objetiva, o presente autor entende que o melhor caminho seria o entendimento pela violação à função social do contrato. Apesar desse enunciado, destaque-se que a jurisprudência superior aceita a cobrança de tais taxas. Conforme a Súmula 566 do STJ, “nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da ResoluçãoCMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”. Em complemento, estabelece a Súmula 565 da mesma Corte que “a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, é válida apenas nos contratos bancários anteriores ao início da vigência da Resolução CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008”. O presente autor não se filia ao teor das sumulares superiores, com o devido respeito, sendo tais cobranças abusivas em qualquer vigência legislativa.

a.5) Tendência de conservação contratual, sendo a extinção do contrato, a última medida a ser tomada, a ultima ratio. Essa correlação foi reconhecida pelo Enunciado n. 22 do CJF/STJ da I Jornada de Direito Civil, in verbis: “a função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas”. Esse aspecto já havia sido destacado em vários trechos do Capítulo 2 desta obra, como na abordagem da lesão (art. 157 do CC).

Presente esse vício do negócio, aplicando-se a função social e a conservação, a regra é a revisão e não a anulação do contrato. Ato contínuo de ilustração, recente julgado do Superior Tribunal de Justiça estabeleceu a relação entre função social do contrato e conservação do negócio jurídico, ao determinar a continuidade de um contrato de seguro de vida celebrado por longo período (STJ, REsp 1.073.595/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 23.03.2011 – Informativo n. 467 do STJ).

  1. Eficácia externa da função social do contrato – reconhecida pelo Enunciado n. 21 do CJF/STJ, da I Jornada de Direito Civil. Há dois aspectos principais:

b.1) Proteção dos direitos difusos e coletivos – conforme consta do sempre citado Enunciado n. 23 do CFJ/STJ, não podendo o contrato prejudicá-los.

Por isso, sustenta-se doutrinariamente a função socioambiental do contrato.22

b.2) Tutela externa do crédito – possibilidade do contrato gerar efeitos perante terceiros ou de condutas de terceiros repercutirem no contrato. Como exemplo, pode ser citada a norma do art. 608 do CC, segundo a qual aquele que aliciar pessoas obrigadas por contrato escrito a prestar serviços a outrem, pagará a este o correspondente a dois anos da prestação de serviços. Há, assim, a responsabilidade do terceiro aliciador, ou terceiro cúmplice, que desrespeita a existência do contrato aliciando uma das partes.23 O dispositivo serve como luva para responsabilizar uma cervejaria, frente a outra, pelo fato de ter aliciado o famoso pagodeiro, que tinha contrato de prestação de serviços publicitários com a primeira cervejaria. Nesse sentido, aliás, decidiu a Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação 911279379.2007.8.26.000, conforme acórdão proferido em 12 de junho de 2013 e relatado pelo Desembargador Mônaco da Silva.

Ressalve-se apenas que o julgado está fundamentado na função social do contrato e no art. 209 da Lei 9.279/1996, que trata da concorrência desleal, e não no art. 608 do CC. (Manual de Direito Civil. 7ª ed. pgs. 411-414)

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