Dúvida na sucessão

Inicialmente, importa registrar que o Supremo Tribunal Federal possui jurisprudência sedimentada no sentido de que cônjuges e companheiros possuem equivalência em questões sucessórias (Recurso Extraordinário nº 646.721 e Recurso Extraordinário nº 878.694), tendo declarado a inconstitucionalidade do art. 1.790, CC/02, que dispunha acerca de um regime diferenciado para os companheiros quando da abertura da sucessão.

Portanto, para fins sucessórios, Ana será considerada cônjuge de Adolfo, de quem é, portanto, meeira.

Não havendo escritura de União Estável dispondo acerca do regime de bens, deverá ser considerado que os conviventes viviam sob o regime da comunhão parcial:

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Para tanto, a sucessão deverá se dar nos moldes do que dispõe os artigos 1.829 a 1.838, CC/02. Vejamos.

Morreu Adolfo, deixando patrimônio de R$ 800 mil reais, a viúva/companheira Ana e 4 filhos, sendo 1 oriundo de uma relação anterior ("FILHO A") e 3 filhos advindos da união com Ana (Filhos "B, C e D").

Todo o patrimônio foi constituído na constância da união estável. Desse modo, mesmo estando tudo em nome apenas de Adolfo, não há falar em bens particulares nesse caso, pois o patrimônio se presume constituído sob esforço comum do casal:

CC/02, art. 1.660. Entram na comunhão:

I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;

A ORDEM DE SUCESSÃO

No caso em tela, a ordem de sucessão seria, em tese, a disposta no art. 1.829, I, CC/02:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: 

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

Ora, como Adolfo não deixou bens particulares, somente aqueles adquiridos na constância da união estável, Ana tem assegurada sua meação, isto é, 1/2 dos R$ 800 mil reais.

Como estamos diante de relação havida sob o regime da comunhão parcial de bens, não há que se falar em herança para Ana, pois ela já é meeira, isto é, já sendo titular de R$ 400 mil reais, evitando-se o bis in idem.

Restam assim outros R$ 400 mil reais, correspondentes à cota-parte patrimonial deixada por Adolfo.

Esses 400 mil restantes devem ser igualmente divididos entre seus 4 filhos (1 só dele e 3 da Ana), ficando cada qual com 1/4 desse valor, não sendo relevante de qual relação é fruto cada um dos filhos.

Por fim, o filho que Ana teve no relacionamento anterior era enteado do falecido, não tendo, portanto, qualquer direito ao recebimento dessa herança, já que seu vínculo de parentesco com Adolfo era apenas por afinidade.

Participam da partilha de bens Ana e os filhos de Adolfo. Ana tem direito a 50% dos bens e os demais 50% são divididos igualmente entre os filhos de Adolfo.