Segundo Faraco (2020), durante as duas primeiras décadas do século XX, diferentes filósofos, sem conexão entre si, oriundos de tendências muito diferentes, se ocuparam em deslindar dimensões nos processos de significação que transcendem a perspectiva da semântica representacional. Todos esses pensadores (quais sejam, Cassirer, Gramsci, Wittgenstein, o próprio Bakhtin em seu isolamento) defendem em quadros teóricos e conceituais bem diferentes que a significação é sempre refratada (Faraco, 2020), ou seja, os enunciados significam em relação a um jogo de linguagem, em relação à ação, como em Wittgenstein; ou em relação a uma concepção socio-historica do mundo, como em Bakhtin.
Segundo Faraco (2020), Mikhail Bakhtin estava afinado com o próprio tempo de transformações do fazer artístico do fim do século XIX e começo do século XX, e definiu sua concepção de linguagem na década de 1920 a 1930. Como filósofo, seu foco de atenção era a estética formal, mas com a particularidade de incluir o aspecto histórico, social e cultural no específico da arte, visão oposta ao formalismo russo vigente à época. Entre os pressupostos que atravessam a obra de Bakhtin, Faraco (2020) reconhece três perspectivas conceituais: a vida vivida, a própria existência; uma axiologia ou filosofia de valores; e o foco no encontro, na interação entre diferentes centros de valores, ou seja, “uma arquitetônica tripartite: existência, valores e interação” (Faraco, 2020). Esta arquitetônica tripartite, segundo Faraco (2020), também sustenta a peculiar visão bakhtiniana de linguagem. A linguagem é vista como atividade, como vida vivida, não como sistema; antes como interação social do que como expressão individual; e como uma realidade saturada de valores. Em outras palavras, “o significado do dizer remete a complexos verbo axiológicos e não apenas a uma combinatória sintática ou a uma semântica referencial” (Faraco, 2020). Assim, em termos bakhtinianos, a linguagem é heteroglósia, em outras palavras, a linguagem é um conjunto múltiplo e heterogêneo de línguas e vozes sociais que constituem uma imensa teia dialógica, ou “uma heteroglosia dialogizada” (Faraco, 2020). Porém, a visão de língua bakhtiniana transcende a interação face a face, sendo que para Bakhtin a dialogização é uma metáfora para o diálogo entre o presente e o passado (Faraco, 2020).
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