Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Da Observação Participante a Pesquisa-Ação: uma Comparação Epistemológica para Estudos em Administração Marcos Eduardo dos Santos RESUMO: Este trabalho tem por objetivo compreender mais precisamente o que vêm a ser os métodos de pesquisa sociais denominados observação participante e pesquisa-ação, utilizando-se de comparações e inter-relações entre seus diversos aspectos, tais como conceitos, objetivos e características, visando fornecer uma base referencial a ser aplicada em estudos de Administração. O estudo inicia-se com um debate filosófico entre pesquisa quantitativa e qualitativa, visando contextualizar o escopo do estudo sobre os paradigmas positivistas e interpretativos. Em seguida, são descritos os conceitos, objetivos, características e etapas dos métodos propostos, além de uma visão crítica sobre os métodos de pesquisa de aproximação em relação aos positivistas. Concluindo o artigo percebe-se que a singularidade da pesquisa-ação está em utilizar-se de um processo cíclo interativo a fim de provocar mudanças num dado sistema sócio-técnico. Já a observação participante, que consiste na participação do pesquisador no cotidiano de um grupo ou organização, em contato direto com os observados, como se um deles fosse, permite ao investigador científico captar dados, símbolos, particularidades que não o seriam em uma observação quantitativa. 1 INTRODUÇÃO Os métodos e técnicas utilizados atualmente em pesquisas sociais e humanas são decorrentes da evolução social, cultural e econômica das sociedades. Inicialmente, as teorias formuladas tinham como referência às sociedades primitivas, as quais se organizavam coletivamente, tanto para pescar, caçar, plantar, comer, dormir e se divertir. Havia um líder que exercia o comando sobre todas essas pessoas, determinando como deveriam se comportar perante a sociedade. Apesar de seu poder, esse líder não tinha posse alguma, pois todos os bens eram coletivos. Já na idade média as pessoas passarão a se reunir em feudos, ou seja, o proprietário da terra cedia parte de sua propriedade para seus vassalos morarem e produzirem, cobrando parte da produção em troca. Isto contribuiu para a formação da sociedade burguesa, que se caracterizou pela institucionalização do dinheiro (ouro, prata, papel moeda), surgimento das primeiras empresas e instituições financeiras, concentração de capital nas mãos de poucos e das cidades. Na era moderna, as pessoas sentiram que o campo não fornecia a comodidade necessária à vida moderna. Assim, a migração do campo para as cidades foi intensa neste período, fornecendo mão de obra e consumidores para o crescimento das empresas. Com desenvolvimento desse contexto sócio-econômico-cultural, surgem diversas técnicas e métodos de pesquisa visando à busca pela maior eficiência na execução de tarefas e na maximização de resultados organizacionais. A ênfase no controle quantitativo torna-se o epicentro do positivismo empresarial, levando os clássicos como Taylor e Ford a definirem formas científicas para a organização da produção. Apesar do foco destes autores estar no chão de fábrica, suas propostas (estudo de tempos e movimentos, linha de comando e especialização) atingiu também o escritório, ao demandar controle sobre os recursos de produção, dando espaço à estatística e a contabilidade. No entanto, sua idéia de “homem econômico” choca-se com os interesses dos funcionários, já que estes além de terem uma remuneração justa, desejavam ser reconhecidos como seres racionais e emotivos e não apenas como mais um recurso de produção. Num terceiro momento, a descaracterização do trabalho individual pelo trabalho coletivo, centrado na produção de bens, passa-se, gradativamente, a um retorno da busca do indivíduo no processo de produção, ampliando-se o centro da análise da fábrica para a vida individual e social. O método de pesquisa passa a incorporar a preocupação não somente com o processo de trabalho como meio de produção e produtividade, mas com o próprio agente como ser social. As dimensões humanas passam a ser condicionantes de um processo administrativo. Procurando-se explicar os processos sociais e psicológicos que ocorrem no interior das organizações em decorrência das necessidades humanas. Sendo a observação participante e a pesquisa-ação dois dos métodos de pesquisa social mais utilizados nos estudos da Administração, portanto, justificados de serem estudados em detalhes. Diante do exposto, este trabalho tem por objetivo compreender mais precisamente o que vêm a ser os métodos de pesquisa sociais denominados observação participante e pesquisa-ação, utilizando-se de comparações e inter-relações entre seus diversos aspectos, tais como conceitos, objetivos e características, visando fornecer uma base referencial a ser aplicada em estudos de Administração. 2 DEBATE FILOSÓFICO ENTRE PESQUISA QUANTITATIVA E QUALITATIVA Os métodos de pesquisa podem ser classificados de várias maneiras, entretanto a mais comum é pela distinção entre métodos de pesquisa qualitativos e quantitativos. Os quantitativos foram originalmente desenvolvidos nas ciências naturais a fim de estudar os fenômenos da natureza. Já os métodos qualitativos foram criados nas ciências sociais devido à necessidade de conhecimentos acerca dos fenômenos sociais e culturais dos seres humanos (Myers, 2003). Porém, a motivação em adotar um método qualitativo, em oposição ao quantitativo, foi devido ao fato que distingue o objeto de estudo dessas ciências, o ser humano é capaz de pensar acerca de suas ações e reações. Kaplan e Maxwell (1994) argumentam que “o objetivo de entender o fenômeno do ponto de vista do participante e em um particular contexto social e institucional é altamente dispersado quando dados textuais são quantificados”. No entanto, esta distinção levou alguns investigadores a sentirem-se compelidos a adotar uma ou outra abordagem como sua principal orientação de pesquisa e formar comunidades de pesquisa onde as palavras “quantitativo” e “qualitativo” são vistas como associadas a “formas impróprias” de investigação (Kock, 1997, citado por Jesus, 2001). Embora muitos pesquisadores façam uma opção em direcionar seus trabalhos para uma abordagem mais quantitativa ou qualitativa, outros têm sugerido combinar dois ou mais métodos de pesquisa na investigação, a chamada triangulação. Boas discussões são realizadas por Kaplan e Duchon (1988). Além da distinção entre quantitativo e qualitativo, outros distinções são comuns, como objetivo e subjetivo (Burrell e Morgan, 1979), formulação de leis gerais versus interesse na singularidade de cada situação e o objetivo de predizer e controlar versus objetivo de explicar e compreender (Myers, 2003). Uma considerável controvérsia circunda o uso destes termos, entretanto, uma discussão destas distinções está além do interesse deste trabalho. Mas uma discussão mais completa pode ser encontrada em Morey e Luthans (1984). Toda pesquisa (quantitativa ou qualitativa) é baseada em alguma suposição fundamental sobre quais métodos de pesquisa são válidos. Portanto, antes de desenvolvermos o debate entre pesquisa-ação e observação participante, ambos métodos de pesquisa qualitativos, devemos conhecer um dos principais fundamentos teóricos, a Epistemologia. A Epistemologia refere ao conhecimento e como ele pode ser obtido. Myers (2003), sugere três paradigmas fundamentais para a pesquisa qualitativa: ϖ positivismo – assume que a realidade pode ser objetivamente conhecida e pode ser descrita por propriedades mensuráveis que são independentes do pesquisador e de seus instrumentos, ênfase em formulações formai, mensuração quantitativa de variáveis, teste de hipóteses e desenho de inferência acerta do fenômeno a partir de amostras da população; ϖ interpretativo – aceita que o acesso à realidade é somente possível através de construções sociais como a linguagem, consciência e compartilhamento dos significados; ϖ teoria crítica – assume que a realidade é historicamente constituída e que esta é produzida e reproduzida pelaspessoas. Entretanto as pessoas podem conscientemente agir modificando as circunstâncias econômicas e sociais, foca na oposição, conflitos e contradições da sociedade contemporânea, e busca ser emancipatória a fim de eliminar as causas da alienação e dominação. Entretanto é preciso dizer que essa distinção epistemológica é realizada filosoficamente, mas na prática da pesquisa social estas distinções não possuem limites claros. 3 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE 3.1 Conceito Quando nos referimos à pesquisa qualitativa e em específico a observação participante surge uma evidente necessidade de construir conhecimentos que podem levar-nos a uma maior compreensão do fenômeno humano, tanto no trabalho, nas organizações como na vida em si onde as pessoas não cessam de construir e reconstruir sua maneira de agir e de viver. Tais conhecimentos provêm de variadas fontes, todas da ciência da vida com predominância das ciências humanas. Os autores assim conceituam a observação participante: “Refere-se à observação procedida quando o pesquisador está desempenhando um papel participante estabelecido na cena estudada” (Atkinson & Hammersley, 1994). “Situação de pesquisa onde observador e observado encontram -se face a face, e onde o processo de coleta de dados se dá no próprio ambiente natural de vida dos observados, que passam a ser vistos não mais como objetos de pesquisa, mas como sujeitos que interagem em dado projeto de estudos” (Serva e Júnior, 1995). “Representa um processo de interação entre a teoria e métodos dirigidos pelo pesquisador na sua busca de conhecimento, não só da "perspectiva humana” como da própria sociedade” (Bruyin, citado por Haguette, 1987). “É um compartilhar consciente e sistemáti co, conforme as circunstâncias o permitam, nas atividades de vida e, eventualmente, nos interesses e afetos de um grupo de pessoas” (Florence Kluckholhn, citada por Haguette, 1987). Para nossos fins, definimos a observação participante como um processo no qual a presença do observador numa situação social é mantida para fins de investigação científica. O observador está em relação face a face com os observados, e, em participando com eles em seu ambiente natural de vida, coleta dados. Logo, o observador é parte do contexto, sendo observado, no qual ele ao mesmo tempo modifica e é modificado por este contexto. O papel do observador participante pode ser tanto formal como informal, encoberto ou revelado, o observador pode dispensar muito ou pouco tempo na situação da pesquisa; o papel do observador participante pode ser uma parte integral da estrutura social ou ser simplesmente periférica com relação a ela (Schwartz e Schwartz, citados por Haguette, 1987). Portanto, observação participante é um método em que o pesquisador toma parte do cotidiano do grupo ou organização pesquisada, até desempenha tarefas regularmente, tudo com o intuito de entender em profundidade aquele ambiente, algo que a metodologia quantitativa não pode fazer. A antropologia é marcada em sua gênese pelo contexto histórico, pela ambientação existente quando da sua origem. Entre as décadas de 80 e 90 vários antropólogos surgem como pesquisadores que passam a utilizar em seus estudos o trabalho de campo. Substituem assim os seus métodos antigos baseados na investigação realizada com alguns informantes, ou a partir de questionários auxiliados por tradutores, ou ainda a observação direta do comportamento dos indivíduos pesquisados, porém de maneira superficial e rápida. Tais pesquisadores, com um destaque para Malinowski, que foi quem introduziu a utilização da observação participante na pesquisa de campo, através da participação cotidiana por longos períodos, na vida de seus pesquisados e realizando suas observações pertinentes, criando assim, um novo método de pesquisa denominado de observação participante. A observação refere-se, segundo Serva e Júnior (1995), a uma situação de pesquisa onde observador e observado encontram-se numa relação face a face e onde o processo de coleta de dados se dá no próprio ambiente natural de vida do observado, que passa a ver isto não mais como um objeto de pesquisa, mas como sujeito que interage em um dado projeto de estudo. A vivência dessas situações pode proporcionar maiores angústias no pesquisador, comparativamente às outras metodologias de pesquisa, pois traz maiores dificuldades e obstáculos comportamentais a serem transpostos. Tão logo se coleta os dados durante a observação participante é importante adotar um modo de organizar as anotações escritas. Pode simplesmente colocar as notas, do estágio exploratório em ordem cronológica em uma pasta e arquivar; ou quando se trata de um assunto mais extenso e complicado, com maior volume de anotações, diferentes grupos e/ou problemas, faz-se necessário subdividir as notas, organizando-as por tópicos, com pastas para cada assunto da pesquisa, para cada tópico da entrevista, ou simplesmente organizar as anotações por grupo de foco, e se necessário, mais tarde reorganizar-se. Como se pode observar, “a escolha para utilizar a observação participante dá primazia à experiência pessoal vivida no campo, evitando o aprisionamento do pesquisador em apriorismos. Por outro lado, isso não significa, em absoluto, que não se disponha de quadros referenciais teóricos sólidos. Estes se constituem, inclusive, numa das condições básicas para a boa implementação da metodologia”. (Serva e Júnior,1995). O pesquisador de campo depende inteiramente da inspiração que lhe oferecem os estudos teóricos, conhecer bem a teoria e estar a par de suas últimas descobertas não significa estar sobrecarregado de idéias preconcebidas. Se um homem parte numa expedição decidido a provar certas hipóteses e é incapaz de mudar seus pontos de vista constantemente, abandonando-os sem hesitar ante a pressão da evidência, sem dúvida seu trabalho será inútil. As idéias preconcebidas são perniciosas a qualquer estudo científico; a capacidade de levantar problemas, no entanto, constitui uma das maiores virtudes do cientista, esses estudos são revelados ao observador através de seus estudos teóricos (Richard, 1987 citado por Serva e Júnior, 1995) Saber entender e respeitar o ritmo de ação e de interação do grupo pesquisado é um passo decisivo para se viver à vida de uma unidade social, e ser aceito e legitimado pelo grupo é essencial, mas isso é eminentemente fruto de um processo relacional, variando bastante de um grupo a outro. Não se pode esperar que todos os membros do grupo observado aceitem o pesquisador e forneçam as informações desejadas, é preciso respeitar os que não querem participar da pesquisa. A humildade, o saber escutar também são indispensáveis à característica do observador. 3.2 Características A principal característica que pode ser observada em uma pesquisa que se utiliza da observação participante é que esta realiza uma análise seqüencial, ou seja, algumas das análises são realizadas durante o próprio processo de coleta dados; fazendo com que a próxima coleta tome um sentido a partir de análises condicionais . A utilização da observação participante requer algumas habilidades adicionais face às metodologias tradicionalmente empregadas na pesquisa. É necessário operar uma mudança profunda na postura do pesquisador, que deve assumir a postura do antropólogo, principalmente durante o trabalho de campo. Esta favorece o desenvolvimento de habilidades de ordem comportamental. A observação participante é indicada em situações nas quais a evidência qualitativa é usada para captar dados psicológicos que são reprimidos ou não facilmente articulados como atitudes, motivos, pressupostos, quadros de referência ou situações nas quais simples observações qualitativas são usadas como indicadores do funcionamento complexo de estruturas e organizações complexas que difíceis de submeter à observação direta (Haguette, 1987). O método pode ser indicado para testar hipóteses ou estabelecê-las a partir da pesquisa de campo, ou mesmo, modificá-las no decorrer do processo. Mas de qualquer forma,é indispensável que o pesquisador tenha uma boa base teórica a respeito do que vai ser o objeto de estudo. Quanto maior o conhecimento teórico a respeito do tema, mais eficaz será o trabalho. Esse tipo de pesquisa permite um aumento da compreensão dos processos organizacionais, pois possibilita o pesquisador um acesso direto aos dados da pesquisa, permitindo um maior nível de obtenção das informações pertinentes ao observador; o que faz desse método de pesquisa ser considerado, por parte dos pesquisadores, o melhor método dentre os da metodologia qualitativa. A coleta de dados se dá através da participação do pesquisador na vida cotidiana do grupo ou organização que estuda, observando as pessoas que está estudando para ver situações com que se deparam normalmente e como se comportam diante delas; entabula conversações com participantes e descobre as interpretações que eles têm dos acontecimentos, isto segundo Becker (1987), ou seja, há a presença constante do observador nas atividades do grupo ou organização pesquisada a fim de que ele possa “ver as coisas de dentro” (Haguette, 1987). Nesse caso o pesquisador adota dois papéis, participa das atividades da organização ao mesmo tempo em que as observa (Godoy, 1995). O pesquisador pode ter uma postura passiva – quando interage com os observadores o mínimo possível – ou ativa – que maximiza sua participação, no sentido de obter uma qualidade maior de dados. Entretanto, essa metodologia possui suas desvantagens, pois a partir do momento em que as informações são filtradas pelo pesquisador, esse passa a assumir praticamente toda a responsabilidade frente à interpretação, que se baseia na subjetividade e no pensamento racional de cada entrevistador, podendo assim, distorcer as informações recebidas, além do que, com o convívio pessoal entre pesquisador e seus pesquisados, poder influenciar negativamente durante a realização da entrevista e da interpretação dos dados. Portanto, o reconhecimento dos limites e dos riscos dessa metodologia deve ser considerado quando o pesquisador vai “a campo”, e fazem parte de alguns entraves dos processos que a antropologia deve considerar, para estar sempre se evoluindo no conjunto das ciências humanas. 3.3 FASES A observação participante apresenta três estágios na análise de campo, que são: 1) a seleção e definição de problemas, conceitos e índices; 2) controle sobre a freqüência e a distribuição de fenômenos; 3) a incorporação de descobertas individuais num modelo da organização em estudo. Após a fase da análise de campo, tem-se o quarto estágio, que é a análise final e diz respeito à apresentação de evidências e provas (Becker, 1987). 3.3.1 Seleção e definição de problemas, conceitos e índices Para tornar uma observação parte de um contexto teórico sociológico, é preciso que um observador defina conceitos e identifique problemas para serem pesquisados e estudados. Ele da vida a um modelo teórico se baseando no caso particular em que se encontra sua investigação, mas direciona seus prováveis modelos de forma que venha a atender descobertas futuras. Este estágio consiste na identificação de possíveis entraves e conceitos, que venham a promover um maior esclarecimento e conhecimento das organizações que fazem parte do foco de estudo, e onde o pesquisador procura por “objetos” que o subsidie de importantes informações, o que seria muito difícil e complicado de ser identificado, caso não houvesse essa investigação. “Esteja ele definindo problemas ou selecionando conceitos e indicadores, o pesquisador está, neste estagio, utilizando seus dados somente para especular sobre possibilidades. Operações posteriores nos estágios seguintes pode forçá-lo a abandonar a maioria de suas hipóteses provisórias. Todavia, problemas de evidência se colocam mesmo nesse ponto, pois o pesquisador precisa avaliar os itens individuais nos quais suas especulações estão baseadas, de modo a não desperdiçar tempo seguindo pistas falsas.” ( Becker, 1997) O pesquisador precisa estar atento às pistas falsas e a manipulação de respostas, assim como, a obtenção de informações incorretas e incompletas. Para reduzir ou mesmo eliminar tais problemas, ele pode adotar alguns testes a aplica-los à medida parecerem ser recomendáveis e que se faz necessário. Os possíveis testes que podem ser aplicados são os seguintes: a credibilidade de informantes, declarações espontâneas ou dirigidas, a equação grupo-informante-observador. 3.3.2 Controle da freqüência e da distribuição de fenômenos Após o estágio de identificação dos problemas de criação dos conceitos e dos indicadores provisórios, o observador precisa saber escolher quais desses que compensam e que devem ser levados à diante no seu processo de pesquisa. “Em parte, ele o fez descobrindo se os acontecimentos que incitaram seu desenvolvimento são típicos e disseminados, e observando como estes acontecimentos estão distribuídos entre as categorias de pessoas e subunidades organizacionais. chegam assim a conclusões que são essencialmente qualitativas, utilizando-as para descrever a organização que estuda.” ( Becker, 1997) Os dados adquiridos pela observação participante são dados padronizados que permitem que se façam observações e perguntas semelhantes a diversos entrevistados, e se não fosse a existência do campo para a coleta de dados, tais dados poderiam ser considerados estatisticamente ou como dados estatísticos legítimos, mas são reconhecidos pelos pesquisadores como dados “quase estatísticos”. Portanto suas conclusões não requerem quantificação precisa. Portanto, o observador na hora de determinar sua conclusão, poderá seguir as características dos estatísticos, os quais usam a probabilidade, baseada em valores de variáveis de correlação e significância, onde sua conclusão se apresenta sob a forma de poder ser mais ou menos exata, ao contrário de quando argumenta que sua conclusão é totalmente verdadeira ou totalmente falsa. 3.3.3 Construção de modelos de sistema sociais Este é o estágio final da pesquisa de campo, que se baseia na absorção de descobertas relacionadas ao modelo de sistemas ou de organização social que faz parte do estudo. Neste estágio, o observador descreve seu relatório final sobre a coleta de campo, proporcionado uma explicação eficaz sobre os dados que reuniu. Porém, para conseguir tal conclusão, o pesquisador inicia seus modelos relacionando- os às partes das organizações em que possa gradativamente obter contato, e daí, vão surgindo novos conceitos e problemas. A partir do momento em que determina seu modelo final, que retrata todas as relações descobertas entre os objetos que estão inseridos nessa parte, o observador refina seu modelo, melhorando assim, a precisão do seu modelo, lhe proporcionando maior garantia das evidencias que não se encaixava com suas formulações posteriores. E assim, após o acumulo desse vários modelos, ele busca conexões existentes entre eles e passa a construir um modelo global da organização, que envolve um todo. Segundo Becker (1997), a conclusão típica deste estágio da pesquisa é uma afirmação sobre o conjunto de complicadas inter-relações entre muitas variáveis. Embora algum progresso venha sendo realizado na formalização desta operação, através do uso da análise fatorial e da análise de relações para dados de “survey”, os que trabalham com a observação geralmente encaram as técnicas estatísticas correntemente disponíveis como inadequadas para expressar suas concepções, e acham necessário utilizar palavras. As conclusões mais comuns neste nível abrangem: afirmações complexas sobre as condições necessárias e suficientes para a existência de algum fenômeno; afirmação de algum fenômeno é um elemento “importante” ou “básico” na organização; afirmações que identificam uma situação como um exemplo de algum processo ou fenômeno descrito mais abstratamente na teoria sociológica. 3.3.4 Análise final e a apresentação dos resultados Esta análise final que é feita após todo o trabalho de coleta de dados no campo, compreende em realizaruma nova conferência e reestruturar os modelos até então desenvolvidos, e com uma atenção redobrada, pois é uma fase de suma importância para o observador. Nesse estágio, que muitos pesquisadores denominam de pós-trabalho de campo, serve para proceder na construção do modelo final. E finalmente, o observador termina seu trabalho de construção desse novo modelo, quando reestrutura e reorganiza as interconexões dentre todos os modelos até então desenvolvidos, de modo a obter um resultado final dos aglomerados de conclusões anteriores. 4 O CONHECIMENTO PELA PESQUISA E INTERVENÇÃO 4.1 O recorte teórico da pesquisa-ação – conceitos e objetivos Remotamente já havia traços da pesquisa-ação nos trabalhos dos teóricos clássicos da Administração, como Max Weber, Émile Durkheim e até mesmo em Karl Marx, os quais são citados como pais da sociologia. A fim de desenvolver suas teorias sociais eles consequentemente criaram novos métodos de investigação. Weber estudou o fenômeno burocrático nas organizações; Durkheim utilizou a estatística no estudo do suicídio e Marx não só analisou a concentração do capital a partir da mais-valia sobre o trabalho dos operários como propôs a estes sua organização para lutar contra esta alienação e exploração. Assim, quando o pesquisador participa das ações pesquisadas com um esforço de planejamento com vistas à resolução de problemas ou transformação de situações, estamos diante de uma metodologia de pesquisa-ação (Becker, 1987). No entanto, Kurt Lewin nos anos 40 foi o primeiro pesquisador a utilizar o termo “pesquisa-ação” para referir a uma pesquisa de aproximação em que o pesquisador procura novos conhecimentos sociais acerca de um sistema social, ao mesmo tempo em que tenta modificá-lo (Alavi, 1993). Uma das razões para a emergência da pesquisa-ação é o reconhecimento de que um sistema social pode ser mais profundamente entendido se o pesquisador torna-se parte do sistema sócio-técnico que está sendo estudado, que pode ser realizado com sucesso aplicando intervenções positivas no sistema. Este envolvimento também favorece a cooperação entre pesquisador e aquele que estão sendo estudados, troca de informações, e o comprometimento da qualidade da pesquisa e o desenvolvimento organizacional. Esta situação pode ser observada no estudo de Eric Trist (Fox, 1990 citado por Kock Jr., McQueen, Scott, 2003). Nesse momento torna-se relevante buscar nos conceitos dos teóricos de pesquisa-ação mais citados elucidações para este método. Para Rapoport (1970), a pesquisa-ação “objetiva contribuir tanto para interesse práticos das pessoas em uma situação de imediata problemática tanto para as metas da ciência social pela união colaborativa em uma estrutura étnica aceitável”. Esta definição chama a atenção para o aspecto colaborativo da deste método de pesquisa e para a possibilidade de dilemas étnicos. Já O’Brian (2001), um pouco mais sintético, define pesquisa-ação como “aprender fazendo”, ou seja, um grupo de pessoas identifica um problema, fazem algo para resolve-lo, vêem se obtiveram sucesso, se não tentam novamente. No Brasil um dos grandes nomes da pesquisa-ação é o professor Michel Thiollent que define pesquisa ação como “um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo” (Thiollent, 1994). Como o próprio nome sugere, a pesquisa-ação tem como objetivos, a pesquisa e a ação: ϖ pesquisa para aumentar o entendimento por parte do investigador ou do cliente, ou ambos. ϖ ação para provocar mudança em alguma comunidade ou organização ou programa; 4.2 Princípios e características Winter (1989), citado por O’Brien (2001), apresenta em seu trabalho seis princípios que guiam a pesquisa-ação, os quais são sintetizados em seis palavras-chave: ϖ reflexão crítica – este princípio assegura que os participantes refletem sobre as questões e processos e tornam explícita a interpretação, vieses, suposições e preocupações sobre os julgamentos que eles fazem. Desta forma, avaliações práticas podem originar considerações teóricas. ϖ crítica dialética – faz-se necessária para entender o conjunto de relacionamento entre o fenômeno pesquisado e seu contexto, e entre os elementos que o constituem. Os elementos chaves a serem focados são aqueles que o participante considera instáveis ou contrários a outros, esses são os que mais provavelmente provocarão mudanças. ϖ recursos colaborativos – os participantes de um projeto de pesquisa-ação são co- pesquisadores. Esse princípio pressupõe que as idéias de cada participante são recursos potenciais para a análise interpretativa, negociada entre as partes. Isto evita a condição de idéia-proprietária, tornando possível a manifestação de vários pontos de vistas. ϖ risco – o processo de mudança potencialmente ameaça todos os caminhos previamente estabelecidos, assim criando um temor psíquico nos participantes. Um dos maiores medos vem da dúvida de como idéias e julgamentos em uma discussão aberta serão interpretados por cada participante, ameaçando todo o processo. ϖ estrutura plural – a natureza deste tipo de pesquisa encorpora uma multiplicidade de visões, comentários e críticas, conduzindo a múltiplas interpretações e ações. Esta estrutura plural de investigação requer um texto plural para ser relatado. Isto significa que haverá muitos apontamentos explícitos, com comentários sobre cada contradição, e uma série de sugestões a ser apresentada. Um relatório, portanto, agirá como um suporte à contínua discussão entre os colaboradores, em oposição a uma conclusão final de fato. ϖ teoria, prática e transformação – para os pesquisadores da pesquisa-ação a teoria instrui a prática, a prática refina a teoria, em uma transformação contínua. Em alguns grupos, as ações das pessoas são baseadas em uma estrutura implícita de suposições, teorias e hipóteses, e a partir dos resultados observados, o conhecimento teórico é desenvolvido. Isto é necessário para que o pesquisador possa tornar explícitas as justificações teóricas pela ação, e para questionar as bases destas justificações. Os resultados práticos decorrentes das justificações apoiam as análises, em um ciclo transformativo que continuamente alterna ênfase entre teoria e prática. Para Susman e Evered (1978), o ponto forte da pesquisa-ação é o seu caráter prático. Para estes autores, suas principais características são: ϖ orientação para o futuro, facilitando a criação de soluções voltadas para um futuro desejável pelos interessados. ϖ colaboração entre pesquisadores e clientes; ϖ desenvolvimento de sistema, ou seja, o dispositivo de pesquisa-ação desenvolve a capacidade do sistema de identificar e resolver problemas; ϖ geração de teoria fundamentada na ação, que pode ser corroborada ou revisada por meio da avaliação de sua adequação à ação; ϖ não-predeterminação e adaptação situacional, as próprias relações estabelecidas na situação de pesquisa variam e não são totalmente previsíveis. Já para Thiollent (1994) os principais aspectos da pesquisa-ação, considerando-a uma estratégia metodológica de pesquisa, são: ϖ há uma ampla e explicita interação entre pesquisadores e pessoas implicadas na situação investigada; ϖ desta interação resulta ordem de prioridade dos problemas a serem pesquisados e das soluções a serem encaminhadas sob forma de ação concreta; ϖ o objetivo de investigação não é constituído pelas pessoas e sim pela situação social e pelos problemas de diferentes naturezas encontrados nesta situação; ϖ o objetivo da pesquisa-ação consiste em resolver ou, pelo menos, e esclarecer os problemas da situação observada; ϖ há, durante o processo, um acompanhamento das decisões, das ações e de toda a atividade intencional dos atores da situação; ϖ a pesquisa não se limita a uma forma de ação (risco de ativismo), pretende-se aumentaro conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento ou o “nível de consciência” das pessoas e grupos considerados. O que distingue este tipo de pesquisa das práticas profissionais de consultoria, ou resolução cotidiana de problemas é a ênfase no estudo científico, que diz ao pesquisador para estudar o problema sistematicamente e garantir que a intervenção seja baseada em considerações teóricas. 4.3 Etapas de um projeto de pesquisa-ação Antes de mencionarmos quais são as etapas de um projeto de pesquisa-ação, o pesquisador deve antes refletir sobre algumas questões que o guiarão durante o processo, as quais, segundo Field (2003) poderiam ser: ϖ O que você quer aprender com o resultado desta pesquisa? ϖ Que QUESTÕES você irá explorar? ϖ O que você quer modificar? ϖ O que você quer testar? ϖ Que ESTRATÉGIA você usará para obter informações antes e durante o estudo? ϖ Que tipo de ANÁLISE você irá fazer para descobrir se houve mudanças? ϖ Alguma coisa mudou em decorrência de sua intervenção? ϖ Como você sabe? A pesquisa-ação apresenta-se como uma proposta de pesquisa de natureza cíclica, qualitativa e participativa. A participação pode gerar um compromisso maior e, consequentemente, ação. Quando a mudança é o resultado desejado, ela é mais facilmente alcançada se as pessoas estão comprometidas com o processo de mudança. Além de ser normalmente participativa, a pesquisa-ação representa uma sociedade ou aliança entre o pesquisador e seus “clientes” (Jesus, 2001). Susman e Evered (1978) vêem um projeto genérico de pesquisa-ação como um processo cíclico que estes autores denominam “ciclo da pesquisa-ação”, compreendendo cinco etapas: diagnóstico, planejamento da ação, ação, avaliação e aprendizagem, como visto na Figura 1. FIGURA 1 O ciclo da pesquisa-ação Fonte: adaptado de Susman e Evered (1978). Planejamento da AçãoAprendizado AçãoAvaliação Diagnóstico A fase de diagnóstico envolve a identificação e definição de uma oportunidade de melhoria ou de um problema a ser resolvido na organização. O planejamento da ação envolve a consideração de cursos alternativos de ação para atingir a melhoria ou para resolver o problema. A etapa de ação envolve a seleção e a realização de um dos cursos de ação considerados na etapa de planejamento. A etapa de avaliação envolve a reunião e classificação das evidências de pesquisa pertinente, baseada na implementação do curso de ação selecionada. Finalmente, a etapa de aprendizado corresponde à avaliação do aprendizado da organização e do pesquisador com a realização do trabalho. Esta etapa especifica e identifica os ensinamentos da experiência (Jesus, 2001). Uma das principais razões por que a pesquisa-ação é vista preferivelmente em ciclos é a oportunidade de fortalecer as descobertas da pesquisa pelas evidências advindas nas diversas interações. 4.4 Críticas à pesquisa-ação Neste ponto tornam se necessários comentários sobre três aspectos que geralmente são alvos de críticas de teóricos positivistas, a saber: contingência das descobertas da pesquisa; baixo controle do ambiente e superenvolvimento pessoal. Segundo Orlikowski e Baroudi (1991) citados por Kock Jr., McQueen, Scott (2003), a contingência das descoberta de pesquisa é uma característica criticada devido ao fato de que relações entre variáveis não são reveladas por métodos determinísticos, assim a pesquisa-ação seria inapropriada para produzir modelos com alta validade externa, ou seja, resultados válidos fora do contexto do projeto onde foi aplicada. Para Galliers (1992) citado por Kock Jr., McQueen, Scott (2003), isto ocorre porque a maioria dos projetos de pesquisa-ação envolve pequeno número de participantes estudados em profundidade e freqüentemente estudos longitudinais, e muito raramente o nível de generalização é aceitável. Baixo controle do ambiente é criticado por Orlikowski e Baroudi (1991) citado por Kock Jr., McQueen, Scott (2003) como a principal razão da pesquisa-ação ser vista como inapropriada para testar ou produzir boas teorias, ou reconstruir modelos de pesquisa baseados em evidências concretas. A influência de uma variável particular pode levar muito tempo até que seja isolada em estudos de pesquisa-ação; testar e refinar um modelo causal onde uma variável dependente seja influenciada por um conjunto de variáveis independentes necessita de um exame cuidadoso. Orlikowski e Baroudi (1991) citado por Kock Jr., McQueen, Scott (2003), também comenta que um superenvolvimento pessoal entre pesquisadores e seus “clientes” impede uma boa pesquisa por introduzir viéses pessoais nas conclusões. Isto é particularmente verdadeiro em situações que envolvem conflito de interesses. Ketchum e Trist (1992) vêem a freqüência das interações no ciclo da pesquisa-ação como melhoria da concepção do pesquisador sobre o sistema sócio-técnico, Figura 2, expresso nas descobertas da pesquisa e no estágio de aprendizado em cada ciclo. Isto pode ser obtido devido à expansão do escopo da pesquisa e reconstrução de resultados por meio da identificação de padrões invariáveis, consequentemente incrementando o rigor metodológico e a validade externa da pesquisa. Figura 2 Relacionamento entre escopo de pesquisa e generalidade do modelo. Obs.: di – diagnóstico, pj – planejamento, ac – ação, av – avaliação e ap – aprendizado. Fonte: adaptado de Kock Jr., McQueen, Scott, 2003. À luz das pressuposições de Ketchum e Trist (1992), não temos como interesse fornecer uma justificativa ao uso da pesquisa-ação para que seja tolerada pelos positivistas, mas em melhor demonstrar que esse método possui vantagens que tornam infundadas algumas de suas críticas. A validade interna é uma medida da consistência dos resultados da pesquisa e não é necessariamente relacionada com a validade externa, que uma medida do grau de generalização dos resultados do estudo. Dizer que os resultados de uma pesquisa são altamente contigenciais é o mesmo que dizer que eles têm uma baixa “validade externa”. Porém, a principal razão de confiança na alta validade externa dos resultados de pesquisa citados por Kock Jr., McQueen, Scott (2003) foi a observação fundamentada nas interações. De acordo com a aproximação cíclica descrita pela pesquisa-ação, as sucessivas mudanças através das interações auxiliaram a expandir o escopo da pesquisa, incrementando a generalização dos resultados. Este efeito é análogo ao escolher uma amostra em uma população em estudos estatísticos. A vantagem extra desta aproximação é que a experiência adquirida em interações prévia pode ajudar o pesquisador a melhorar os efeitos da intervenção em futuras interações, através da coleta de dados sobre as mesmas unidades de análise em situações relativamente independentes. Quanto ao baixo controle do ambiente, Kock Jr., McQueen, Scott (2003), comentam que é inegável que um baixo controle sobre as variáveis de um sistema sócio-técnico que está sendo estudado pode impedir testes causai entre estas variáveis. Testes entre variáveis, no entanto, requerem que ambas variáveis sejam claramente definidas antes do pesquisador iniciar seu projeto. Isto é comumente limita os resultados de pesquisa ao focar a pesquisa em um conjunto de variáveis, abandonando outras que poderiam ser relevante para o entendimento do evento considerado. Em alguns casos este caminho guia o estudo sobre questões que são irrelevantes para uma perspectiva organizacional, enquanto em outros poderá guiar para resultados que não apoiados pela situação real porque eles são influenciados Escopo da Pesquisa Generalização do modelo ciclo 1 ciclo 2 ciclo n-1 ciclo n di pj ac av ap di pj ac av ap di pj ac av ap di pj ac av ap por outros efeitos que não foram considerados no estudo original. Isto pode ser uma das razões para o relato de um grande número de efeitos controversos na literatura de pesquisa empírica referente a organizações em rede, que predominantemente utilizaram pesquisa experimental, por exemplo (DeSanctis et al., 1993, citados por Kock Jr., McQueen, Scott, 2003).Como Mintzberg (1979) e outros apontam, o comportamento humano não é previsível como o comportamento do rato, e portanto muitas das descobertas baseadas em análise estatísticas de relacionamentos simples de causa-e-efeito que ingenuamente desprezam este fato têm sido irrelevantes. Dados estes problemas, podemos dizer que o baixo controle sobre o ambiente estudado, característica da maioria dos projetos de pesquisa-ação, são mais uma vantagem do que uma desvantagem na generalização de relevantes e válidos conhecimentos. Quanto ao superenvolvimento pessoal do pesquisador causar um viés nos resultados da pesquisa, Kock Jr., McQueen, Scott (2003) ressaltam que isto é inerente tanto nesse método como em qualquer outro método de aproximação, porque é impossível para um pesquisador, segundo eles, ter uma posição neutra e ainda exercer uma intervenção positiva no sistema sócio-técnico estudado. Isto é particularmente verdadeiro quando o número de situações experimentadas pelo pesquisador é pequeno e a intensidade deste envolvimento é alta. Pesquisadores da cognição humana tem demonstrado não somente que o ser humano tem confiado mais no aprendizado experimental para aquisição de conhecimento, mas também que essas experiências que são acompanhadas por intensiva descarga emocional são relembradas mais claramente que aquelas em que há pouco envolvimento emocional. O principal benefício para os praticantes da pesquisa-ação, resultante das sucessivas interações no ciclo da pesquisa-ação é que futuras interações podem ajudar a corrigir distorções nos resultados das primeiras interações. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar de autores como Green e Merce (2001) citados por Cappelle (2002) defenderem que as pesquisa-ação é sinônimo da observação participativa, há algumas diferenças entre as duas como mostra essa mesma autora no Quadro 1. QUADRO 1 – A pesquisa-ação e a obserrvação participante PESQUISA-AÇÃO OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE ϖ Caráter participativo (interação entre pesquisadores e membros da situação investigada) ϖ Produz uma ação planejada sobre os problemas detectados ϖ requer legitimidade dos diferentes atores e convergência de interesses ϖ Não se limita a descrever uma situação. Gera acontecimentos ou resultados que podem desencadear mudanças. ϖ Discussão entre pesquisadores e membros da situação investigada ϖ Nem sempre possui uma ação planejada. ϖ Lida com situações de contestação de legitimidade do poder vigente. ϖ Descreve uma situação Fonte:Thiollent (1997), citado por Cappelle (2002). Da comparação entre os dois métodos de pesquisa, pesquisa-ação e observação participante, torna-se claro que a primeira sugere uma intervenção conduzida por um caminho que pode ser benéfico aos participantes do estudo, apesar de reconhecer que a observação causal afeta o sistema. O outro método é baseado somente em observações e análises em separado, completamente desconsiderando a possibilidade de uma intervenção positiva do pesquisador. Outro atributo que separa a pesquisa-ação da observação participante é o foco nas pessoas envolvidas na pesquisa, as pessoas aprendem melhor quando fazem por si mesmas. Também existe uma dimensão social, a pesquisa dá lugar em um mundo de situações reais, e objetiva resolver problemas reais. Portanto, a escolha do método de pesquisa não seconstitui na avaliação do melhor método em detrimento de outros e sim do método adequado a determinada situação e objetivo de estudo. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADLER, P.; ADLER, P. Observational techniques. In: DENZIN, N.K.; LINCOLN, Y.S. Handbook of qualitative research. Londres, Sage, 1994. p. 377-392. ALAVI, M. An Assessment of Electronic Meeting Systems in a Corporate Setting. Information & Management: 25(4), 1993. pp. 175-182. ATKINSON, P.; HAMMERSLEY, M. (1994). Ethnography and participant observation. In: Handbook of qualitative research. Londres, Sage, 1994. p. 248-261. BECKER, H. Métodos de pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Hucitec, 1987. 178p. BURRELL, G.; MORGAN, G. Sociological Paradigms and Organisational Analysis. London: Heinemann, 1979. CAPELLE, M.C.A. Pesquisa-ação: uma proposta metodológica para investigação e intervenção nas organizações. Anais do XXVI ENANPAD, Salvador, 22-25/9/2002, ANPAD: Salvador, 2002, Anais...2002, cd-rom. FOOTE-WHYTE, W. Treinando a observação participante. In: GUIMARÃES, A. Z. Desvendando máscaras sociais. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1980. p. 77-86. GODOY, A. S. A pesquisa qualitativa e sua utilização em administração de empresas. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.35, n.4, p.65-71, jul/ago 1995b. GODOY, A. S. Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.35, n.3, p.20-29, mai/jun 1995a. HAGUETTE, T.M.F. Metodologias qualitativas na sociologia. Petrópolis, Vozes, 1987. 163p. JESUS, J.C. dos S. Sistema de informação para o gerenciamento da colheita de café: concepção, desenvolvimento, implementação e avaliação dos seus impactos. Rio de Janeiro: COPPE/UFRJ, 2001. (Tese de doutorado). KAPLAN, B.; DUCHON, D. Combining Qualitative and Quantitative Methods in Information Systems Research: a case study. MIS Quarterly (12:4) 1988. pp. 571-587. KAPLAN, B.; MAXWELL, J.A. Qualitative Research Methods for Evaluating Computer Information Systems. In: Evaluating Health Care Information Systems: Methods and Applications, J.G. Anderson, C.E. Aydin and S.J. Jay (eds.), Sage, Thousand Oaks, CA, 1994. pp. 45-68. KETCHUM, L.D.; TRIST, E. All Teams are not Created Equal. Newbury Park: Sage. 1992. KOCK JR, N.F.; MCQUIN, R.J.; SCOTT, J.L. Can action research be made more rigorous in a positivist sense? The contribution of an iterative approach. Disponível em: <http://www.scu.edu.au/schools/gcm/ar/arr/arow/kms.html>. Acesso em: 06 jun. 2003. MINTZBERG, H. An Emerging Strategy of "Direct" Research. Administrative Science Quarterly, 24(4), 1979. pp. 582-589. MOREY, N.C.; LUTHANS, F. An Emic Perspective and Ethnoscience Methods for Organizational Research. Academy of Management Review (9:1), January 1984. pp. 27- 36. MYERS, M. D. Qualitative Research in Information Systems. MIS Quarterly (21:2), June 1997, pp. 241-242. MISQ Discovery, archival version, June 1997. Disponível em: <www.misq.org/misqd961/isworld/>. Acesso em: 05 jun. 2003. O'BRIEN, R. Um exame da abordagem metodológica da pesquisa ação. In: Roberto Richardson (Ed.), Teoria e Prática da Pesquisa Ação. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba. 2001. Disponível em: <http://www.web.ca/~robrien/ papers/arfinal.html>. Acessado em 04 jun. 2003. RAPOPORT, R.N. Three Dilemmas in Action Research. Human Relations, 23 (6), 1970. SERVA, M.; JAIME JR, P. Observação participante e pesquisa em administração: uma postura antropológica. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.35, n.1, p. 64-79, mai/jun 1995. SUSMAN, G.I.; EVERED, R.D. An Assessment of the Scientific Merits of Action Research. Administrative Science Quarterly, v.23, December, 1978. pp. 582-603. THIOLLENT, M. Metodologia de Pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 6.ed. 1994. ZALUAR, A. A teoria e prática do trabalho de campo. In: CARDOSO, R. A aventura antropológica. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986. p. 107-125.
Compartilhar