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Resistência Art. 329. 
Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio:
Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 2 (dois) anos. 
§ 1.º Se o ato, em razão da resistência, não se executa: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
 § 2.º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.
Análise do núcleo do tipo: opor-se significa colocar obstáculo ou dar combate. O objeto da conduta é a execução de ato legal. 
Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive o funcionário público. “Se, porém, alguém comete a ação em que importa o fato, sendo embora funcionário, entender-se-á que, no caso, se equipara ao particular, pois não será considerada, logicamente, a sua qualidade eventual de funcionário para eximi-lo da responsabilidade que lhe cabe por um crime que cometeu, não na sua qualidade de funcionário, mas como qualquer particular” O sujeito passivo é o Estado e, secundariamente, o funcionário ou outra pessoa que sofreu a violência ou ameaça. Esta outra pessoa, à qual nos referimos, precisa estar acompanhada do funcionário encarregado de realizar a execução do ato legal (ou agir em seu nome). Não se configura o delito de resistência contra o particular que resolva prender alguém em flagrante (flagrante facultativo – art. 301, CPP), caso haja oposição, ainda que violenta. Qualquer do povo está autorizado a realizar prisão em flagrante, mas isso não o transforma em funcionário competente para realizá-la, razão pela qual aquele que resiste responderá pelo mal causado – por exemplo, por lesões corporais –, mas não como incurso no art. 329 do Código Penal.
Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não existe a forma culposa. Exige-se elemento subjetivo do tipo específico, consistente na vontade de não permitir a realização do ato legal. Por isso, havendo dúvida fundada (razoável e consistente) quanto à legalidade do ato ou competência do agente, pode o particular resistir, sem a configuração do delito. 
Ato legal: é preciso que o funcionário público esteja fazendo cumprir um ato lícito. Caso pretenda concretizar algo ilegítimo, é natural que o particular possa resistir, pois está no exercício regular de direito (ou em legítima defesa, se houver agressão), já que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5.º, II, CF). O conceito de legalidade do ato não se confunde com justiça, pois contra ato injusto, mas legal, não é admissível a oposição, sem que se configure o delito de resistência.
Violência ou ameaça: violência é a coerção física, enquanto ameaça é a intimidação. Neste caso, não exige o tipo penal seja a ameaça grave (séria), embora deva ser a promessa de causar um mal injusto. Não se configura o delito se a pessoa “ameaça” o funcionário de representá-lo aos superiores, uma vez que é direito de qualquer um fazê-lo. Por outro lado, é preciso que tanto a violência quanto a ameaça sejam dirigidas contra a pessoa do funcionário, e não contra coisas (ex.: se alguém, ao ser preso, chutar a viatura policial, não há crime de resistência. Porém, se houver dano ao veículo, pode ser processado, conforme o caso, pelo delito de dano – art. 163, parágrafo único, III). Lembremos, ainda, que ofensas não são ameaças, de modo que podem dar azo à configuração do desacato. 
Roubo e resistência: cremos perfeitamente possível a configuração do crime de resistência se, durante a prática de um roubo, o agente voltar-se violentamente contra agentes da polícia que pretendam prendê-lo. A violência para assegurar a posse da coisa subtraída é uma, não se podendo confundir com a outra, usada para afastar o funcionário público do exercício da sua função, ainda que no mesmo contexto. Os objetos protegidos são diversos (patrimônio, no primeiro caso, e Administração Pública, no outro). Assim, não nos parece ser a violência decorrente do roubo, que tem por fim a obtenção da coisa móvel, a mesma utilizada contra a pessoa humana (agente do Estado) – ou mera decorrência, como alguns afirmam. Ressalte-se que a violência utilizada para matar alguém normalmente não é confundida com a que for usada contra policial que pretenda prender o homicida, respondendo o agente, nesse caso, por homicídio (ou tentativa) e resistência, em concurso material. A mesma visão deveria valer para os crimes patrimoniais violentos. Quando o roubo está consumado, há posição jurisprudencial no sentido que sustentamos: TJSP: “Impossibilidade do segundo crime ser considerado como integrante do de roubo, uma vez que o primeiro já se encontrava consumado” (Ap. 238.312-3, São Paulo, 6.ª C., rel. Debatin Cardoso, 02.04.1998, v. u.). Entretanto, reconhecemos que há posição em sentido contrário: STJ: “A resistência oposta por assaltante para evitar a prisão, quando perseguido logo após a prática do crime de roubo, não constitui crime autônomo; representa, tão somente, um desdobramento da violência caracterizadora do delito patrimonial” (REsp 173.466-PR, 6.ª T., rel. Vicente Leal, 24.08.1999, v. u., DJ 04.10.1999, p. 116). No mesmo sentido: TJSP:, Ap. 200.945-3, São Paulo, 5.ª C., rel. Gomes de Amorim, 16.05.1996, v. u.; Ap. 221.995-3, São Paulo, 6.ª C., rel. Djalma Lofrano, 22.05.1997, v. u.; Ap. 218.917-3, Santa Izabel, 1.ª C., rel. David Haddad, 19.05.1997, v. u.; Ap. 263.052-3, São Vicente, 3.ª C., rel. Gonçalves Nogueira, 03.11.1998, v. u. 
Resistência ativa (vis corporalis ou vis compulsiva) e resistência passiva (vis civilis): a ativa consiste justamente no emprego de violência ou ameaça contra o funcionário público, servindo para configurar o crime; a passiva é a oposição sem ataque ou agressão por parte da pessoa, que se pode dar de variadas maneiras: fazendo “corpo mole” para não ser preso e obrigando os policiais a carregá-lo para a viatura; não se deixar algemar, escondendo as mãos; buscar retirar o carro da garagem antes de ser penhorado; sair correndo após a voz de prisão ou ordem de parada, entre outros. É o que HUNGRIA chama de “atitude ghândica” (Comentários ao Código Penal, v. 9, p. 411), em referência à resistência passiva e política da não violência (satyagraha) recomendada pelo Mahatma Ghandi, na primeira metade do século XX, na Índia, contra os ingleses, através de conduta pela qual os indianos não atacavam os dominadores do seu território, mas também não desocupavam um determinado local, quando instados pelas forças policiais a fazê-lo. Acabavam agredidos pelos próprios agentes do Império Britânico, sem que agissem da mesma forma. Na jurisprudência: TRF, 4.ª Região: “Indispensável à configuração do crime de resistência a oposição do agente à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário público competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio. O simples fugir à perseguição policial não caracteriza o delito de resistência” (HC 2009.04.00.028041-3-RS, 8.ª T., rel. Paulo Afonso Brum Vaz, 02.09.2009, v. u.). 
Embriaguez: de acordo com a lei penal brasileira, o sujeito voluntariamente embriagado deve responder pelo que faz (art. 28, II, CP). Se pode até cometer homicídio, sendo por isso punido, cremos que também a resistência não escapa da esfera de proteção penal. Não há motivo para afastar a aplicação do art. 329 ao agente embriagado, pois o elemento subjetivo específico é, assim como o dolo, presumido (para quem acolhe a tese da presunção de responsabilidade nesse caso) ou projeta-se pela actio libera in causa (para quem aceita o dolo inicial, mesmo que eventual, na conduta). Basta, pois, que o bêbado agrida fisicamente o funcionário público para se configurar a resistência. Quanto à ameaça, dependendo do que falar, por estar embriagado, pode não se configurar o crime, visto que não será considerada intimidação razoável, nem irá impressionar o funcionário. 
Funcionário competente: não basta que a vítima seja funcionário público, pois exige o tipo penal tenha ele competência para executar o ato. Se um oficial de justiçavinculado a uma Vara de Família pretende efetuar uma penhora, referente a mandado de Vara Cível, é evidente que não é “competente” para o ato. Pode, pois, o particular recusar-se a atendê-lo. Ressalte-se que o número de funcionários contra os quais se opõe o agente não faz nascer vários delitos de resistência em concurso formal, pois o objeto jurídico protegido é a Administração Pública, e não o interesse individual de cada um deles. 
Prestador de auxílio: pode o funcionário público valer-se de terceiros para executar o ato legal. Se assim fizer, essa pessoa, que lhe dá assistência, também pode ser vítima do crime de resistência. Exemplo seria o do transportador de móveis, durante uma penhora realizada por oficial de justiça competente. Se ele for agredido, configurado está o delito do art. 329. 
Objetos material e jurídico: o objeto material é a pessoa agredida ou ameaçada. O objeto jurídico é a Administração Pública, nos interesses material e moral. 
Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente na efetiva falta de execução do ato legal). Nessa linha: TJSP: “Consumação com a mera prática do ato de violência ou de ameaça, independente da realização efetiva do fim pretendido pelo agente, que consistia no impedimento à execução do ato legal” (Ap. 147.301-3, 1.ª C., rel. Jarbas Mazzoni, 15.05.1995, v. u., RT 718/378); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“oporse” implica em ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários atos integram a conduta); admite tentativa, embora seja de difícil configuração. 
Figura qualificada: para a configuração da qualificadora, exige-se a não realização do ato legal praticado por funcionário competente. Assim ocorrendo, modifica-se a pena de detenção para reclusão e aumenta-se a faixa de fixação para 1 a 3 anos. Trata-se de mais uma forma de exaurimento do crime, que faz elevar a pena do agente. Anota a jurisprudência que o ato legal precisa deixar de ser praticado por força exclusiva da oposição violenta ou ameaçadora do agente, e não por inépcia do funcionário. 
Concurso de crimes: tendo em vista que a violência contra a pessoa deve ser sempre punida com rigor, o tipo penal prevê, como em várias outras oportunidades, o sistema da acumulação material, isto é, o agente responde pela resistência e pelo que causou à vítima, diante do emprego da coerção física (ver a nota 101-A ao art. 69). 
Absorção do desacato e da desobediência: a ressalva feita para os crimes violentos não se aplica ao desacato e à desobediência. Pode o agente, durante a prisão, resistir ativamente contra os policiais e ainda valer-se de ofensas verbais contra os mesmos, deixando de cumprir suas ordens. Todo esse contexto faz parte, em último grau, da intenção nítida de não se deixar prender, de modo que deve absorver os demais delitos. Somente quando o agente já está preso, cessando a resistência, pode configurar-se o crime de desacato, na hipótese de ofender o delegado que lavra o auto de prisão em flagrante, por exemplo. Nesse prisma: TJPR: “O crime de resistência absorve os de desobediência, ameaça e desacato, quando praticados em um mesmo episódio, e também a contravenção de vias de fato, mas não o de lesões corporais, mesmo leves (CP, art. 329, § 2.º)” (Ap. 12.410-7, 2.ª C., rel. Edson Malachini, 27.09.1990, v. u., RT 680/369).
Desobediência Art. 330. 
Desobedecer a ordem legal de funcionário público: Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa.
Análise do núcleo do tipo: desobedecer significa não ceder à autoridade ou força de alguém, resistir ou infringir. É preciso que a ordem dada seja do conhecimento direto de quem necessita cumpri-la. Nessa linha: STJ: “O crime de desobediência (CP, art. 330) só se configura se a ordem legal é endereçada diretamente a quem tem o dever legal de cumpri-la” (HC 10.150-RN, 5.ª T., rel. Edson Vidigal, 07.12.1999, v. u., DJ 21.02.2000, p. 143). 
Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive funcionário público. Nessa hipótese, torna-se indispensável verificar se a ordem dada tem ou não relação com a função exercida, uma vez que, se tiver e não for cumprida, pode configurar-se o delito de prevaricação. Se o funcionário, que recebe ordem legal de outro, não pertinente ao exercício das suas funções, deixa de obedecer, é possível se configurar a desobediência, pois, nessa hipótese, age como particular. Entretanto, se receber a ordem e for da sua competência realizar o ato, pode concretizar-se outro tipo penal, como o supramencionado (art. 319). O sujeito passivo é o Estado. Confira-se a jurisprudência a respeito: STJ: “Os dirigentes de universidade privada, no exercício de funções pertinentes ao ensino superior, atuam como agentes públicos por delegação, e nessa qualidade não cometem o crime de desobediência, pois tal delito pressupõe a atuação criminosa do particular contra a Administração” (HC 8.593-SE, 6.ª T., rel. Vicente Leal, 15.04.1999, v. u., DJ 13.12.1999, p. 179). Idem: HC 6.000-DF, 6.ª T., rel. Anselmo Santiago, 17.11.1997, v. u., DJ 19.12.1997, p. 67.533; HC 5.043-RS, 5.ª T., rel. José Dantas, 22.10.1996, v. u., DJ 02.12.1996, p. 47.692. 
Prefeito como sujeito ativo: impossibilidade, se estiver no exercício das funções, cabendo processá-lo por crime de responsabilidade, tipificado no art. 1.º, XIV, do Decreto-lei 201/67 (STF, HC 76.888-PI, 2.ª T., rel. Carlos Velloso, 29.09.1998, v. u., DJ 20.11.1998, p. 3). 
Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo específico, nem se pune a forma culposa. Note-se que o verbo desobedecer é do tipo que contém, em si mesmo, a vontade específica de contrariar ordem alheia, infringindo, violando. O engano quanto à ordem a ser cumprida (modo, lugar, forma, entre outros) exclui o dolo: TJMG: “O não comparecimento de testemunha na audiência, por ter-se enganado quanto à data da realização da mesma, descaracteriza o crime de desobediência, visto que, não havendo dolo, que é vontade livre e consciente de desobedecer à ordem legal emanada, não há que falar em crime” (Ap.26.049-1, 1.ª C., rel. Guimarães Mendonça, 15.09.1992, v. u., RT 696/381). 
Ordem legal: é indispensável que o comando (determinação para fazer algo, e não simples pedido ou solicitação) seja legal, isto é, previsto em lei, formal (ex.: emitido por autoridade competente) e substancialmente (ex.: estar de acordo com a lei). Não se trata de ordem dada para satisfazer uma vontade qualquer do superior, fruto de capricho ou prepotência. Por outro lado, como já mencionado na análise do núcleo do tipo, exige-se conhecimento direto (na presença de quem emite o comando, por notificação ou outra forma inequívoca, não valendo o simples envio de ofício ou carta) por parte do funcionário ao qual se destina a ordem, sem ser por interposta pessoa, a fim de não existir punição por mero “erro de comunicação”, que seria uma indevida responsabilidade penal objetiva. Ver: STJ: “Em faltando justa causa para a ação penal, como ocorre quando se imputa desobediência a quem não foi destinatário da ordem legal, faz-se imperativa a concessão de habeas corpus para o seu trancamento” (RHC 8.637-SP, 6.ª T., rel. Hamilton Carvalhido, 13.09.1999, v. u., DJ 17.12.1999, p. 400, grifamos). Sob outro aspecto, a legalidade da ordem não se confunde com sua justiça ou injustiça. Ordens legais, ainda que injustas, devem ser cumpridas. 
Proibição de venda e uso de bebida alcoólica em dia de eleição: não se constitui ordem legal, logo, caso seja desobedecida, é fato atípico. Tornou-se costume – embora venha sendo gradativamente extinto em vários Estados da Federação – que autoridades judiciárias ou policiaiseditem portarias ou resoluções proibindo a venda e o consumo de bebidas alcoólicas no dia do pleito, sob o fundamento de garantir a regularidade dos trabalhos, impedindo distúrbios e contendo exageros. Alega-se, para justificar tais atos, o poder geral de cautela do juiz ou mesmo o poder de polícia do Estado. Há nítidos desvios de perspectiva nessa atuação. O princípio da legalidade, conquista inestimável dos direitos humanos fundamentais, preceitua que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, bem como que só há crime caso lei assim o defina (art. 5.º, II e XXXIX, CF). Ora, não cabe ao juiz e muito menos a qualquer autoridade policial (mesmo que seja o Secretário da Segurança Pública) editar “leis”. Não está na esfera de sua competência. Enfim, é uma irregularidade que vem sendo praticada há muito tempo, ainda que nobres sejam as intenções. Mas não é com propósito elevado que se constrói segurança jurídica. Por isso, a desobediência a tais portarias e resoluções não pode ser considerada crime. Ao contrário, inibir o comerciante, por meio da força, de vender bebida alcoólica, ou mesmo o consumidor de utilizá-lo, constitui abuso de autoridade. Destacam MONIQUE VON HERTWIG BITTENCOURT e VICTOR JOSÉ SEBEM FERREIRA que “a previsão de sanção mediante aplicação do art. 330 do Código Penal por desobediência à portaria administrativa oriunda de Secretaria de Segurança Pública não pode ser aplicada, vez que o funcionário público – mesmo que Secretário ou Delegado – não tem competência para publicar ato tipificando como crime aquilo que não consta em lei” (A proibição do comércio e consumo de bebidas alcoólicas em locais públicos no dia do pleito, p. 2). Outra não é a orientação tranquila da jurisprudência: TSE: “Crime de desobediência (Cód. Eleitoral, art. 347): consumo de duas cervejas no dia do plebiscito de 1993 em contrariedade à portaria de Juiz Eleitoral. Princípio da reserva legal (Constituição, art. 5.º, XXXIX): inexistente norma legal, descabe a tipificação da conduta em portaria administrativa, ainda que a título de prevenir distúrbio público e assegurar a tranquilidade no dia das eleições” (HC 233-SP, rel. Torquato Jardim, 31.05.1994, v. u.). TRE/ SP: RE 1468, rel. Vito José Guglielmi, 12.11.1998, DOE 19.11.1998; RE 1282, rel. Francisco Prado, 08.05.1997, DOE 19.05.1997; TRE/ MG: RO 52/94, rel. José Nepomuceno da Silva, 08.11.1994, DJMG 24.02.1995. 
Ordem emanada de juiz impedido: não tem validade para efeito de gerar o crime de desobediência. Se o magistrado está impedido de funcionar no processo, qualquer ordem que dê é considerada ilegal, não configurando o crime de desobediência o seu não cumprimento: TJSP: CJ 25.318-0, Dracena, Câmara Especial, rel. Dirceu de Mello, 06.07.1995, v. u., JTJ 176/339. 
Inexistência de outro tipo de punição: ressalta, com pertinência, NÉLSON HUNGRIA que “se, pela desobediência de tal ou qual ordem oficial, alguma lei comina determinada penalidade administrativa ou civil, não se deverá reconhecer o crime em exame, salvo se a dita lei ressalvar expressamente a cumulativa aplicação do art. 330 (ex.: a testemunha faltosa, segundo o art. 219 do Código de Processo Penal, está sujeita não só à prisão administrativa e pagamento das custas da diligência da intimação, como a ‘processo penal por crime de desobediência’)” (Comentários ao Código Penal, v. 9, p. 420). O mesmo não ocorre com a testemunha arrolada em processo civil, que, intimada, deixa de comparecer à audiência. Pode ser conduzida coercitivamente, mas não será processada por desobediência, em face da inexistência de preceito autorizador, como existe no Código de Processo Penal em relação à testemunha arrolada em processo criminal. Aliás, nesse contexto inclua-se o caso da ausência do réu, que tem o direito de estar presente às audiências do seu processo, mas não o dever. Logo, a sua falta já provoca consequência, que é o seu desinteresse em acompanhar a instrução com prejuízo para a autodefesa. Além do mais, conforme o caso, havendo indispensável necessidade da sua presença, pode o juiz conduzi-lo coercitivamente ao fórum ou, conforme a situação, decretar a sua prisão processual. Não pode, no entanto, determinar que seja processado por desobediência. A negativa do acusado, por outro lado, ao fornecimento de seus dados pessoais para a qualificação, algo que não está abrangido pelo direito ao silêncio, pode configurar o delito do art. 330 (questão que abordamos ao tratar do direito ao silêncio em nossa obra O valor da confissão como meio de prova no processo penal, p. 169). Portanto, havendo sanção administrativa ou processual, sem qualquer ressalva à possibilidade de punir pelo crime de desobediência, não se configura este. Assim: STJ: RHC 4.250-SP, 5.ª T., rel. Assis Toledo, 06.03.1995, v. u., RT 715/533. No mesmo sentido, quando o não cumprimento der ensejo ao ajuizamento de ação própria, também não se configura o delito de desobediência (é o caso da parte que é intimada para depositar, em determinado prazo, os salários do perito e não o faz): TJSP: HC 190.924-SP, 10.ª C., rel. Nelson Hanada, 27.02.1992, v. u., RJTJSP 136/403. Mais recentemente: STF: “Não há crime de desobediência (CP, art. 330), no plano da tipicidade penal, se a inexecução da ordem, emanada de servidor público, revelar-se passível de sanção administrativa prevista em lei, que não ressalva a dupla penalidade. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus para anular condenação imposta ao paciente, que se recusara a exibir, a policial militar encarregado de vistoria de trânsito, seus documentos e os do veículo automotor que dirigia. Considerou-se que a conduta do paciente já está sujeita à sanção prevista no art. 238 do Código de Trânsito Brasileiro. Precedente citado: HC 86254/RS (DJU 10.03.2006)” (HC 88452/RS, 2.ª T., rel. Eros Grau, 02.05.2006, Informativo 425); “Crime de desobediência: caracterização: descumprimento de ordem judicial que determinou apreensão e entrega de veículo, sob expressa cominação das penas da desobediência. Caso diverso daquele em que há cominação legal exclusiva de sanção civil ou administrativa para um fato específico, quando, para a doutrina majoritária e a jurisprudência do Supremo Tribunal (v.g. RHC 59.610, 1.ª T., 13.04.1982, Néri da Silveira, RTJ 104/599; RHC 64.142, 2.ª T., 02.09.1986, Célio Borja, RTJ 613/413), deve ser excluída a sanção penal se a mesma lei dela não faz ressalva expressa. Por isso, incide na espécie o princípio da independência das instâncias civil, administrativa e penal” (HC 86.047-SP, 1.ª T., rel. Sepúlveda Pertence, 04.10.2005, m. v., DJ 18.11.2005, p. 10). 
Descumprimento das condições impostas na suspensão condicional do processo: não configura o crime de desobediência, pois a consequência para isso é a revogação do benefício, com o prosseguimento da ação penal (TRF-4.ª Região, Ap. 2001.70.02.002803-4-PR, 7.ª T., rel. Vladimir Freitas, 03.09.2002, v. u.). 
Descumprimento das imposições feitas ao usuário de drogas: não gera crime de desobediência. O art. 28 da Lei 11.343/2006 instituiu a quem adquira, guarde, tenha em depósito, transporte ou traga consigo, para consumo pessoal, drogas ilícitas, as seguintes penas: a) advertência sobre os efeitos da droga; b) prestação de serviços à comunidade; c) medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. O descumprimento de qualquer medida restritiva imposta tem as consequências previstas no art. 28, § 6.º: a) admoestação verbal; b) multa. 
Dever da vítima de colaborar com a investigação ou processo criminal: recusando-se a colaborar com a polícia judiciária na investigação criminal, não participando, por exemplo, da elaboração do exame de corpo de delito, que não prescinde da sua presença, no Instituto Médico Legal, pode ser processada por desobediência. Em juízo, no entanto, uma vez que pode ser conduzida coercitivamente, não será processada por desobediência, caso falte à audiência. Mas se outra diligência importante, determinada pelo magistrado, necessitar da sua participação,não sendo o caso de mera condução coercitiva, é possível o processo por desobediência. Ressalta, com pertinência, ANTONIO SCARANCE FERNANDES, que, “se a vítima pode se constituir em importante auxílio, pode também representar pesado óbice para a investigação, quando se recuse a colaborar em diligências que, sem a sua participação, não podem ser efetuadas. Imagine-se, por exemplo, se ela deliberadamente não comparece para realizar exame de corpo de delito em crime de lesão corporal, fazendo com que desapareçam os vestígios; dificilmente será provada a materialidade da infração. (...) No Código de Processo Penal, ficou evidente a intenção de prestigiar o interesse na repressão ao crime. Pode, então, a autoridade adotar medidas rigorosas para forçá-la a auxiliar na investigação. Assim, se a vítima, intimada, não comparece para prestar declarações, pode ser conduzida coercitivamente (art. 201, parágrafo único, Código de Processo Penal [atual art. 201, § 1.º, com redação determinada pela Lei 11.690/2008]), exceto nos crimes de ação penal privada, quando a recusa pode configurar renúncia tácita ao direito de queixa. Pode a polícia, se a vítima não quiser ser submetida a exame de corpo de delito, instaurar inquérito policial por desobediência à ordem legal e conduzi-la para perícias externas de fácil realização (lesão corporal), não contudo para exame que implique ofensa à sua integridade, à sua intimidade” (La víctima en el proceso penal, p. 126). 
Autoacusação: como abordamos em nota anterior, o réu pode não comparecer às audiências, mas deve fornecer seus dados pessoais para a qualificação em interrogatório. É preciso verificar que o direito ao silêncio guarda importante sintonia com a ausência do dever de se autoacusar. Nessa esteira: STF: “Recusa a fornecer padrões gráficos do próprio punho, para exames periciais, visando a instruir procedimento investigatório do crime de falsificação de documento. (...) Diante do princípio nemo tenetur se detegere, que informa o nosso direito de punir, é fora de dúvida que o dispositivo do inciso IV do art. 174 do Código de Processo Penal há de ser interpretado no sentido de não poder ser o indiciado compelido a fornecer padrões gráficos do próprio punho, para os exames periciais, cabendo apenas ser intimado para fazê-lo a seu alvedrio. É que a comparação gráfica configura ato de caráter essencialmente probatório, não se podendo, em face do privilégio de que desfruta o indiciado contra a autoincriminação, obrigar o suposto autor do delito a fornecer prova capaz de levar à caracterização de sua culpa” (HC 77.135-SP, 1.ª T., rel. Ilmar Galvão, 08.08.1998, v. u., DJ 06.11.1998, p. 3). 
Ordem dada por autoridade (juiz criminal, delegado ou CPI) à testemunha ou ao indiciado ou réu: em face do direito que toda pessoa possui de não se autoacusar, como bem anotado por DELMANTO (Código Penal comentado, p. 583), a testemunha arrolada para depor – embora tratada como se fosse acusada – não está obrigada a entregar documentos ao juiz, ao delegado ou aos parlamentares, caso esta documentação seja suficiente para incriminá-la de algum modo. 
Sigilo médico e recusa em fornecer dados sobre o paciente: cremos, conforme o caso, poder configurar o crime de desobediência. É certo que o sigilo profissional é previsto em lei e até mesmo o Código Penal o reconhece e protege (art. 154 – violação de segredo profissional), embora nenhum direito seja absoluto. O médico deve guardar sigilo sobre o prontuário do paciente, a fim de assegurar o seu direito à intimidade, como preceitua o Código de Ética Médica (ainda assim, pode revelar fato de que tenha conhecimento em razão da profissão se houver justa causa, dever legal ou autorização do paciente). E, do mesmo modo, o gerente de um banco deve assegurar o sigilo pertinente à movimentação da conta bancária do seu cliente, com o mesmo fito de garantir a intimidade. Ocorre que, para colaborar com o Poder Judiciário, na sua tarefa de apurar lesões ou ameaças a direito, pode o sigilo ser rompido, visto não haver direito absoluto. Se pode o sigilo bancário ser quebrado por ordem do magistrado, por que não poderia o sigilo médico? Por isso, quando for indispensável para apurar um crime – como a configuração da materialidade em crimes que deixam vestígios –, é lógico que deve o médico enviar ao juiz a ficha de atendimento do paciente (por vezes, vítima do crime que está sendo apurado), a fim de se formar um juízo acerca da prova. Não fosse assim e estar-se-ia negando aplicação ao art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). É evidente que o caso concreto irá determinar o melhor caminho a seguir. Se o juiz deseja informações sobre o prontuário de um paciente que faz terapia, a fim de melhor conhecer sua personalidade, pode o médico recusar-se a fornecer, embora deva responder ao ofício, e não simplesmente ignorá-lo. Entretanto, no caso da ficha de atendimento, onde constam lesões corporais aptas a demonstrar até mesmo a ocorrência de uma tentativa de homicídio ou de outro crime grave qualquer, não se pode assimilar o sigilo médico como razoável. A lesão causada à vítima precisa ser apurada e depende, diretamente, da colaboração do médico, de forma que o Código de Ética não será, jamais, superior à própria Constituição Federal. Registre-se o disposto, atualmente, no art. 12, § 3.º, da Lei 11.340/ 2006, que cuida da violência doméstica: “Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde”. Confirma-se a inviabilidade de se alegar sigilo médico para a formação da materialidade de um crime. Em sentido contrário, considerando justa causa para romper o sigilo apenas o consentimento do ofendido, denúncia de doença cuja notificação é compulsória, estado de necessidade e exercício regular de direito, encontramos: TJSP: MS 102.893-3, 5.ª C., rel. Denser de Sá, 20.02.1991, v. u., RT 668/280. 
Sigilo do advogado: compreende-se como razoável e não passível de punição por desobediência o sigilo do advogado, a respeito de seu cliente, pois é inerente à sua própria função ouvir e conhecer detalhes que não podem comprometer, depois, o sujeito que os narrou. Se ninguém é obrigado a se autoacusar, ao procurar o advogado, é justamente esse direito que se está exercitando. Logo, não há hipótese que obrigue o profissional da advocacia a quebrar o sigilo. A característica da sua profissão é inerente ao direito de não se autoincriminar que todos possuem. 
Identificação dactiloscópica: sendo ela indispensável não pode o sujeito recusar-se a empreendê-la, sob pena de responder por desobediência. Entretanto, em outras situações, somente quando a autoridade policial tiver sérias dúvidas a respeito da identidade do indiciado poderá exigir-lhe a identificação dactiloscópica. Recusando-se, pode configurar o crime de desobediência. Atualmente, está em vigor a Lei 12.037/2009, disciplinando em quais casos pode ser colhida a identificação criminal da pessoa, a despeito de já ter sido apresentado documento de identificação civil. São os seguintes: “o documento apresentar rasura ou tiver indício de falsificação”, “o documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado”, “o indiciado portar documentos de identidade distintos, com informações conflitantes entre si”, “a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa”, “constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações”, “o estado de conservação ou a distância temporal ou da localidade da expedição do documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais” (art. 3.º, da referida Lei). É preciso ressaltar a modificação introduzida pela Lei n. 12.654/2012, acrescentando, também, a identificação pela colheita de material biológico. A negativa,em qualquer caso, dá ensejo à tipificação do delito de desobediência. 
Distinção do delito de desobediência e da contravenção de recusa de dados sobre a própria identidade ou qualificação: preceitua o art. 68, caput, da Lei de Contravenções Penais que configura infração penal “recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado, profissão, domicílio e residência”. Aparentemente, o delito de desobediência deverá ceder espaço à contravenção toda vez que o indiciado/réu se recusar a fornecer seus dados de qualificação, o que não nos parece correto. A Lei de Contravenções Penais estipulou, no art. 3.º, que, “para a existência da contravenção, basta a ação ou omissão voluntária”. O dolo ou a culpa somente são exigidos quando expressamente constarem do tipo. Assim, confrontando-se o disposto nessa Lei com o Código Penal, nota-se que, havendo dolo (embutido no verbo, como já mencionado, o elemento subjetivo específico, que é a vontade de insurgir-se contra quem deu a ordem), é caso de aplicação do crime de desobediência e não simplesmente da contravenção penal. Resta a esta, para quem ainda entende possível a sua configuração livre de dolo, bastando a voluntariedade, um campo de aplicação mais restrito (ex.: pessoa que não fornece seus dados à polícia, na via pública, para evitar ser testemunha de algum delito, mas sem a intenção de transgredir ordem legal). Por outro lado, caso seja acolhida a posição tomada por doutrina majoritária, atualmente, no sentido de que para todas as contravenções penais também deve ser exigida a prova do dolo ou da culpa, torna-se inaplicável a contravenção do art. 68, tendo em vista que a intenção de violação, de afronta à ordem dada legalmente, acarreta infração penal mais grave, que é a desobediência. É também a nossa posição, incluindo-se como fundamento o princípio da intervenção mínima, associado, naturalmente, ao princípio da culpabilidade (ver as notas 386 e 387 à Lei de Contravenções Penais em nosso Leis penais e processuais penais comentadas – vol. 1). Há nítida subsidiariedade da contravenção do art. 68 em face do disposto no art. 330 do Código Penal. Aliás, é a mesma situação que ocorre quando o sujeito atribui a si mesmo falsa identidade, com o fito de obter vantagem (note-se nesse caso que, além do dolo, há a especificidade da vontade). Havendo o referido elemento subjetivo específico, deve responder pelo art. 307 do Código Penal, e não pela contravenção penal do art. 68, parágrafo único (“quem, nas mesmas circunstâncias, faz declarações inverídicas a respeito de sua identidade pessoal, estado, profissão, domicílio e residência”), que é igualmente subsidiário – a bem da verdade, nesta hipótese, explicitamente, ao mencionar: “se o fato não constitui infração penal mais grave”. Finalize-se, ressaltando que o delito previsto no art. 330 tem como objeto jurídico a administração em geral, que é seriamente comprometida, quando o indiciado/réu nega a sua qualificação. Deve-se, pois, reservar a contravenção penal para casos outros, que não envolvam esse específico contexto, para quem a entenda ainda aplicável. 
Embriaguez: como já sustentamos na nota 15 ao art. 329, a embriaguez do agente não afasta a tipificação do delito de desobediência. Nessa ótica: TJSP: “Ameaça e desobediência – Lei de violência doméstica ou familiar – Quadro probatório que se mostra seguro e coeso para evidenciar autoria e materialidade delitiva – Inexistência de dúvida que justifica o decreto condenatório – Embriaguez voluntária – Circunstância que não exime de responsabilização o acusado – Crime de desobediência caracterizado – Pena e regime criteriosamente fixados – Recurso improvido – (voto 14098)..” (AP 0002369-37.2010.8.26.0415, 16.ª C., rel. Newton Neves, 08.11.2011, v.u.). 
Objetos material e jurídico: o objeto material é a ordem dada. O objeto jurídico é a Administração Pública, nos interesses material e moral. 
Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente na ocorrência de algum prejuízo efetivo para a Administração por conta do não cumprimento da ordem); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (implicando em ação) ou omissivo (implicando em abstenção), conforme o caso concreto. O sujeito pode desobedecer ao comando dado, fazendo, ou não, aquilo que lhe é ordenado cumprir. E, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); unissubsistente (praticado num único ato) ou plurissubsistente (em regra, vários atos integram a conduta); admite tentativa na forma comissiva, quando plurissubsistente.
Desacato Art. 331. 
Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.
Análise do núcleo do tipo: desacatar quer dizer desprezar, faltar com o respeito ou humilhar. O objeto da conduta é o funcionário. Pode implicar em qualquer tipo de palavra grosseira ou ato ofensivo contra a pessoa que exerce função pública, incluindo ameaças e agressões físicas. Não se concretiza o crime se houver reclamação ou crítica contra a atuação funcional de alguém. “Simples censura, ou desabafo, em termos queixosos, mas sem tom insólito, não pode constituir desacato. Nem importa que o fato não tenha tido a publicidade que o agravasse, especialmente. Importa, unicamente, que ele tenha dado, de modo a não deixar dúvida, com o objetivo de acinte e de reação indevida ao livre exercício da função pública. (...) No que toca às palavras oralmente pronunciadas, importam o tom acre e a inflexão dada à voz, quando as testemunhas possam, ao depor sobre o fato, auxiliar na prova de que a configuração do desacato é ou pode ser concluída como inegável” (cf. FERNANDO HENRIQUE MENDES DE ALMEIDA, DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, p. 186). Deve constar na denúncia e na sentença quais foram exatamente as expressões utilizadas pelo agente, mesmo que de baixo calão. Nesse sentido: TRF, 4.ª Região: “Se o denunciado se limita a criticar a atuação funcional do agente, não constando na denúncia as expressões por ele utilizadas, não há falar no crime de desacato” (HC 2009.04.00.028041-3-RS, 8.ª T., rel. Paulo Afonso Brum Vaz, 02.09.2009, v. u.). 
Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo é o Estado e, em segundo plano, também o funcionário público. Aliás, para o conceito de funcionário público, quando no polo passivo, a maioria tem entendido ser aplicável o art. 327 do Código Penal (TRF, 4.ª R., HC 1999.04.01.43627-RS, Turma de Férias, rel. Vilson Darós, 15.07.1999, v. u., RT 772/721). Consultar a nota 213 ao art. 327. Quanto ao funcionário como sujeito ativo, entendemos, na esteira de FRAGOSO e NORONHA (Direito penal, v. 4, p. 307), poder haver desacato, pouco importando se de idêntica hierarquia, superior ou inferior. Um policial, prestando depoimento, pode desacatar o juiz, enquanto este pode desacatar o colega, em igual situação. Pode, ainda, o delegado desacatar o investigador de polícia (ou detetive). Nessa linha: TJRJ: “O funcionário público que agride verbalmente Promotor de Justiça pode ser sujeito ativo do crime de desacato, pois o bem jurídico tutelado pela norma do art. 331 do CP é o prestígio da função pública, não se restringindo tal lesão jurídica a fato praticado somente por particular” (Ap. 62.633, 6.ª C., rel. Adilson Vieira Macabu, 19.05.1998, v. u., RT 760/692). Cremos, no entanto, ser preciso cautela na tipificação do delito, pois a intenção do agente pode não ser o desprestígio da função pública, mas o abuso do poder que detém. Quanto ao advogado como sujeito ativo, apesar de o Estatuto da Advocacia (art. 7.º, § 2.º) preceituar que há imunidadeprofissional e, no exercício da sua atividade, não poder constituir desacato qualquer manifestação de sua parte, esse trecho está com a eficácia suspensa por julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal. 
Pluralidade de funcionários ofendidos: o crime é único, pois o sujeito passivo é único, ou seja, o Estado. Assim, o agente que desacata mais de um policial, no mesmo contexto, pratica um desacato: TACRIM-SP [atual TJSP]: Ap. 1.061.419-9, 15.ª C., rel. Décio Barretti, 30.10.1997, v. u., RT 750/636. 
Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não existe a forma culposa, nem se exige elemento subjetivo do tipo específico. Há posição em contrário, sustentando haver a vontade específica de desprestigiar a função pública, proferindo ou tomando postura injuriosa. Assim não cremos, pois o verbo é suficiente para essa conclusão. Desacatar significa, por si só, humilhar ou menosprezar, implicando algo injurioso, que tem por fim desacreditar a função pública. Acolhendo a tese de ser exigido somente o dolo genérico: TJSP: Ap. 194.172-3, Santa Rosa do Viterbo, 3.ª C. Extraordinária Criminal, rel. Prado de Toledo, 23.06.1997, v. u. Entretanto, cremos correta a posição de quem, para a análise do dolo, leva em consideração as condições pessoais do agressor, como sua classe social, grau de cultura, entre outros fatores (cf. DAMÁSIO, Código Penal anotado, p. 933). Nesse prisma: STJ: “O crime de desacato significa menosprezo ao funcionário público. Reclama, por isso, elemento subjetivo, voltado para a desconsideração. Não se confunde apenas com o vocábulo grosseiro. Este, em si mesmo, é restrito à falta de educação ou de nível cultural” (HC 7.515-RS, 6.ª T., rel. Cernicchiaro, 25.05.1999, v. u., DJ 02.08.1999, p. 223). Deve-se ter a mesma cautela quando o agente estiver descontrolado ou profundamente emocionado ou irado, pois, nessa hipótese, pode (embora não deva ser regra geral) não se configurar a vontade de depreciar a função pública – o que está ínsito ao conceito de desacato, como já mencionado. No sentido de que a expressão ofensiva, usada em meio a uma discussão acalorada, não configura o crime de desacato: TJSP: Ap. 253.067-3, Paulo de Faria, 5.ª C., rel. Celso Limongi, 09.09.1999, v. u. 
Funcionário que não se identifica pode cometer o crime contra outro funcionário: “a recusa em se identificar o despe da condição de funcionário público, equiparando-o ao particular, e, se nestas circunstâncias dirige expressões dotadas de poder ofensivo ao policial que solicita sua carteira funcional, caracterizado está o delito de desacato, não obstante a situação de funcionário público do agente” (TJMG, Ap. 93.677-3, 2.ª C., rel. Alves de Andrade, 21.08.1997, v. u., RT 750/691). 
Exercício da função ou em sua razão: exige-se que, a palavra ofensiva ou o ato injurioso seja, dirigido ao funcionário que esteja exercendo suas atividades ou, ainda que ausente delas, tenha o autor levado em consideração a função pública. 
Presença do funcionário: é indispensável, pois o menoscabo necessita ter alvo certo, de forma que o funcionário público deve ouvir a palavra injuriosa ou sofrer diretamente o ato. Ainda que esteja à distância, precisa captar por seus próprios sentidos a ofensa, inclusive se for assistindo um programa de televisão (cf. ANTONIO PAGLIARO e PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 209). Se a ofensa for por escrito, caracteriza-se injúria, mas não desacato. 
Funcionário que provoca a ofensa: não configura desacato se o particular devolve provocação do funcionário público, tendo em vista que não busca desprestigiar a função pública, mas dar resposta ao que julgou indevido. 
Embriaguez do agressor: conforme já expusemos ao tratar do crime de resistência (art. 329, nota 15), cremos se configurar o crime ainda que o ofensor esteja sob efeito do álcool ou substância de efeito análogo (art. 28, II, CP). Nesse sentido: TARS [atual TJRS]: “A embriaguez do agente não dirime a sua responsabilidade criminal quanto ao crime de desacato, salvo se for total e proveniente de força maior ou caso fortuito” (Ap. 297.028, 4.ª C., rel. Aido Faustino Bertocchi, 29.10.1997, v. u. Idem: TARJ [atual TJRJ]: Ap. 60.478, 4.ª C., rel. Sérvio Túlio Vieira, 03.03.1997, v. u., RT 748/ 716; TJSP: Ap. 240.804-3, 4.ª C., rel. Passos de Freitas, 12.05.1998, v. u. Em sentido oposto: TACRIM-SP [atual TJSP]: “O estado de embriaguez despoja o agente da plena integridade de suas faculdades psíquicas, exonerando, por tal forma, a intenção certa de ofender, de desacatar, que é o substrato do crime de desacato, o seu dolo específico” (Ap. 918.125-8, 11.ª C., rel. Xavier de Aquino, 15.05.1995, m. v., RT 719/444). Há posição intermediária, mencionando que somente a embriaguez leve, aquela que coloca o agente em estado de euforia, não descaracteriza o crime: TACRIM/SP [atual TJSP]: Ap. 1.098.539-6, 7.ª C., rel. Luiz Ambra, 21.05.1998, v. u., RT 756/603. 
Objetos material e jurídico: o objeto material é o funcionário. O objeto jurídico é a Administração Pública, nos seus interesses material e moral. É considerado delito pluriofensivo, por atingir a honra do funcionário e o prestígio da Administração Pública.
Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente no efetivo desprestígio da função pública); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“desacatar” implica em ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); unissubsistente (praticado num único ato) ou plurissubsistente (em regra, vários atos integram a conduta); admite tentativa na forma plurissubsistente, embora seja de difícil configuração. 
Concurso de crimes: mencionamos que o desacato pode ser praticado de variadas formas, inclusive com agressões físicas. Portanto, conforme a gravidade da violência ou da ameaça utilizada, pode ou não absorver tais delitos. Se praticar lesão corporal contra o funcionário, cremos deva responder por concurso formal (lesão + desacato); porém, cometendo vias de fato, deve responder somente pelo desacato. 
Indiferença do ofendido: se o funcionário público demonstra completo desinteresse pelo ato ofensivo proferido pelo agressor, não há que se falar em crime, pois a função pública não chegou a ser desprestigiada. É o que pode acontecer quando um delegado, percebendo que alguém está completamente histérico, em virtude de algum acidente ou porque é vítima de um delito, releva eventuais palavras ofensivas que essa pessoa lhe dirige. Não se pode considerar fato típico, desde que o prestígio da Administração tenha permanecido inabalável. Mas caso o funcionário seja efetivamente humilhado, no exercício da sua função, a sua concordância é irrelevante, pois o crime é de ação pública incondicionada.
Corrupção ativa Art. 333. 
Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
Análise do núcleo do tipo: oferecer (propor ou apresentar para que seja aceito) ou prometer (obrigar-se a dar algo a alguém), cujo objeto é a vantagem, conjuga-se com determinar (prescrever ou estabelecer) a praticar (executar ou levar a efeito), omitir (não fazer) ou retardar (atrasar), cujo objeto é ato de ofício. Portanto, se alguém, exemplificando, propõe vantagem a um funcionário público, levando-o a executar um ato que é sua obrigação, comete o delito previsto neste artigo. A consumação se dá por ocasião do oferecimento ou da promessa, independendo da efetiva entrega. Na jurisprudência: TJSP:“(...) Corrupção ativa – Concurso – Concorrência não caracterizada – Corréu que leva dinheiro ao local, como solicitado pelo apelante preso em flagrante – Crime já consumado com o oferecimento da vantagem indevida – Ato de levar o dinheiro ao local, executado por terceiro, que se mostra estranho ao tipo penal – Absolvição decretada – Recurso provido, com expedição de alvará de soltura” (Ap. 0002672-22.2008.8.26.0609, 16.ª C., rel. Newton Neves, 13.12.2011, v.u.). 
Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo é o Estado. Sobre outras hipóteses de configuração do crime, consultar a nota 95 ao art. 317. 
Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Exige-se elemento subjetivo específico, consistente na vontade de fazer o funcionário praticar, omitir ou retardar ato de ofício. Não há forma culposa. 
Vantagem indevida: pode ser qualquer lucro, ganho, privilégio ou benefício ilícito, ou seja, contrário ao direito, ainda que ofensivo apenas aos bons costumes. Entendíamos que o conteúdo da vantagem indevida deveria possuir algum conteúdo econômico, mesmo que indireto. Ampliamos o nosso pensamento, pois há casos concretos em que o funcionário deseja obter somente um elogio, uma vingança ou mesmo um favor sexual, enfim, algo imponderável no campo econômico e, ainda assim, corrompe-se para prejudicar ato de ofício. Por vezes, já que a natureza humana é complexa para abarcar essas situações, uma vantagem não econômica pode surtir mais efeito do que se tivesse algum conteúdo patrimonial. Não se tratando de delitos patrimoniais, pode-se acolher essa amplitude. 
Suborno para fugir: trata-se de vantagem indevida, configurando-se o crime de corrupção ativa, quando o preso oferece algum valor ao guarda, para deixá-lo escapar. Dizer que a fuga sem violência é ato lícito não afasta a corrupção do agente penitenciário, pois a conduta do agente ofende, de qualquer modo, a Administração Pública. Escapar, sem usar violência, pode ser conduta atípica, o que não significa corromper funcionário.
Oferecimento ou promessa anterior ao ato: exige-se. Quando qualquer vantagem for dada depois da prática do ato, sem ter havido qualquer tipo de promessa ou oferta anterior, não se trata de corrupção ativa, podendo, conforme o caso, constituir outro tipo de ilícito não penal (por exemplo: improbidade administrativa – art. 9.º, Lei 8.429/92) ou delito por parte do funcionário (ilustrando: corrupção passiva para o funcionário, com participação daquele que fornece o presente – ver a nota 94 ao art. 317). Conferir: TRF-3.ª Região: “O crime de corrupção ativa, em princípio, se configura quando a promessa de vantagem indevida é feita, previamente à prática do ato, ao funcionário (e não pelo funcionário) que tenha atribuição ou competência para a prática desse mesmo ato de ofício, o que não é a hipótese dos autos, uma vez que a solicitação ter-se-ia dado após o fornecimento da informação. Para que o crime de corrupção ativa se configure é mister que a oferta ou promessa de vantagem indevida ao funcionário seja feita antes da pretendida omissão ou prática do ato funcional” (HC 2008.03.00.002665-4-SP, 2.ª T., rel. Cecília Mello, 27.04.2010, m. v.). 
Ato de ofício: é o ato inerente às atividades do funcionário. Portanto, o ato visado deve estar na esfera de atribuição do funcionário, não necessitando ser ilícito. 
Objetos material e jurídico: o objeto material é a vantagem. O objeto jurídico é a Administração Pública, nos interesses material e moral. 
Classificação: trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente no efetivo recebimento do suborno); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); unissubsistente (praticado num único ato) ou plurissubsistente (em regra, vários atos integram a conduta); admite tentativa na forma plurissubsistente. 
“Carteirada”: é a expressão utilizada para demonstrar o ato de autoridade que, fazendo uso de sua função, exibe seu documento funcional para conseguir algum préstimo de outra autoridade ou funcionário público. Tal ato não é corrupção ativa, podendo, no máximo, conforme o caso, configurar o crime de tráfico de influência. 
Crime bilateral: não se exige que, para a configuração da corrupção ativa, esteja devidamente demonstrada a corrupção passiva. Logo, não se trata de delito bilateral. 
Embriaguez: não afasta o crime (art. 28, II, CP). Ver nota 15 ao art. 329. 
Aumento de pena: elevou-se a pena da corrupção ativa de 1 a 8 anos para 2 a 12 anos, mantendo-se a cominação de multa, conforme previsão da Lei 10.763/2003. Somente se pode considerar que o referido aumento teve por finalidade bloquear o benefício da suspensão condicional do processo, que exige a pena mínima de 1 ano, aos autores de corrupção. O aumento do teto da pena é inoperante no direito brasileiro, seja porque vige a política da pena mínima (praticamente inexiste a fixação da pena em grau máximo), seja porque a prescrição que realmente importa é a que leva em conta a pena concreta (normalmente no patamar mínimo) e não a da pena em abstrato, que levaria em consideração o máximo previsto para o crime. Por outro lado, tomando-se por base o novo mínimo previsto para o crime (2 anos), continua a ser viável a concessão de inúmeros benefícios penais, como a pena alternativa, o sursis e o regime aberto. Portanto, a alteração pouco efeito produzirá.
Causa de aumento da pena: eleva-se a pena em um terço quando, em razão da promessa ou da vantagem, efetivamente o agente atrasa ou não faz o que deveria, ou mesmo pratica o ato, infringindo dever funcional. Nessa hipótese, o crime é material, isto é, exige resultado naturalístico.
Corrupção passiva Art. 317. (com o artigo 333 acima)
Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1.º A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
§ 2.º Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
Análise do núcleo do tipo: solicitar significa pedir ou requerer; receber quer dizer aceitar em pagamento ou simplesmente aceitar algo. A segunda parte do tipo penal prevê a conduta de aceitar promessa, isto é, consentir em receber dádiva futura. Classifica a doutrina como corrupção própria a solicitação, recebimento ou aceitação de promessa de vantagem indevida para a prática de ato ilícito, contrário aos deveres funcionais, bem como de corrupção imprópria, quando a prática se refere a ato lícito, inerente aos deveres impostos pelo cargo ou função. Pensávamos, ainda, que a modalidade “receber” implicaria num delito necessariamente bilateral, isto é, demandaria a presença de um corruptor (autor de corrupção ativa) para que o corrupto também fosse punido. E, se assim fosse, logicamente, a não identificação do corruptor não impediria a punição do corrupto, embora a absolvição do primeiro, conforme o caso (fato inexistente, por exemplo), devesse implicar na absolvição do segundo. Melhor refletindo e contrastando este tipo penal do art. 317 com a descrição típica feita no art. 333, nota-se que existe possibilidade de se configurar a corrupção passiva, sem que haja a corrupção ativa. Afinal, esta demanda o oferecimento ou a promessa de vantagem indevida para que o funcionário façaou deixe de fazer algo. Logo, a corrupção ativa é prévia à realização do ato (o que destacaremos na nota 67 ao art. 333). Ora, se um funcionário público receber, para si, vantagem indevida, em razão de seu cargo, configura-se, com perfeição, o tipo penal do art. 317, caput. A pessoa que fornece a vantagem indevida pode estar preparando o funcionário para que, um dia, dele necessitando, solicite algo, mas nada pretenda no momento da entrega do mimo. Ou, ainda, pode presentear o funcionário, após ter este realizado um ato de ofício. Cuida-se de corrupção passiva do mesmo modo, pois fere a moralidade administrativa, sem que se possa sustentar (por ausência de elementos típicos) a ocorrência da corrupção ativa. Em igual prisma, conferir BASILEU GARCIA (Dos crimes contra a Administração Pública, p. 228). Classifica-se, ainda, a corrupção em antecedente, quando a retribuição é pedida ou aceita antes da realização do ato, e subsequente, quando o funcionário a solicita ou aceita somente após o cumprimento do ato (cf. ANTONIO PAGLIARO e PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 102). Esclarece BASILEU GARCIA que “o crime de corrupção existia na Consolidação das Leis Penais sob nome diverso. Intitulava-se ‘peita ou suborno’. Embora as palavras fossem empregadas como sinônimas, enunciavam, realmente, duas modalidades. Já era assim no Código Criminal do Império. No velho estatuto de 1830, havia a peita quando recebesse o funcionário dinheiro ou (acrescentava alternativamente o texto na colorida linguagem da época) ‘ou algum donativo’. Suborno ocorria, quando se deixasse corromper o funcionário por influência ou (é textual) ‘outro peditório de alguém’.” (Dos crimes contra a Administração Pública, p. 226). 
Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é somente o funcionário público. O sujeito passivo é o Estado; secundariamente, a entidade de direito público ou a pessoa prejudicada. Vale destacar as exceções expostas por BASILEU GARCIA: “um funcionário pode ser autor do crime de corrupção ativa e o particular pode sê-lo do crime de corrupção passiva. Quanto à corrupção passiva, a lei adverte que o crime se poderá dar através de pedido ou recebimento indiretamente efetuado. Suponha-se que o funcionário relapso se utilize dos préstimos de um intermediário, que poderá ser outro funcionário, como também um particular. O nexo de coautoria o vinculará à responsabilidade do principal protagonista. Pode dar-se, também, que determinado servidor do Estado assedie outro, para obter dele a prática de algum ato funcional mediante remuneração: aí teremos como réu de corrupção ativa um funcionário” (Dos crimes contra a Administração Pública, p. 228-229). 
Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Exige-se elemento subjetivo específico, consistente na vontade de praticar a conduta “para si ou para outrem”. Não há a forma culposa. 
Modos de atuação: ver nota 68 ao art. 316. 
Utilização da função: ver nota 69 ao art. 316. 
Necessidade de mencionar expressamente na denúncia o ato de ofício: não se pode aceitar denúncia oferecida contra funcionário público sem a indicação de qual é o ato funcional vinculado à suposta vantagem indevida. Nessa esteira: TJSP: HC 261.928, Nova Granada, 3.ª C., rel. Gonçalves Nogueira, 18.08.1998, v. u., JUBI 30/99. 
Conceito de vantagem indevida: pode ser qualquer lucro, ganho, privilégio ou benefício ilícito, ou seja, contrário ao direito, ainda que ofensivo apenas aos bons costumes. Entendíamos que o conteúdo da vantagem indevida deveria possuir algum conteúdo econômico, mesmo que indireto. Ampliamos o nosso pensamento, pois há casos concretos em que o funcionário deseja obter somente um elogio, uma vingança ou mesmo um favor sexual, enfim, algo imponderável no campo econômico e, ainda assim, corrompe-se para prejudicar ato de ofício. Por vezes, já que a natureza humana é complexa para abarcar essas situações, uma vantagem não econômica pode surtir mais efeito do que se tivesse algum conteúdo patrimonial. Não se tratando de delitos patrimoniais, pode-se acolher essa amplitude. Na jurisprudência: TJSC: “No delito de corrupção passiva (CP, art. 317), assim como no crime de corrupção ativa (CP, art. 333), o bem jurídico tutelado pelo Estado é a moralidade e a probidade da Administração Pública, estendida sobre o vértice de seu longa manus, a saber, o funcionário público (CP, art. 327), irradiando efeitos protetivos sobre sua posição (função) dentro da estrutura administrativa, que, num conceito residual, designa uma unidade de atribuições, poderes e deveres estatais, distribuídos por lei. Esse resguardo da administração pública em seus interesses moral e material é efetivado por meio de descrição de uma conduta típica alternativa, cujo respectivo tipo objetivo compõe-se pelos núcleos dos verbos ‘solicitar’, ‘receber’ ou ‘aceitar promessa’ de vantagem indevida para a prática de ato ilícito e contrário aos deveres funcionais, em razão da posição exercida na estrutura da administração pública. Há que se frisar, ainda, que a vantagem indevida, alçada à condição de elemento normativo jurídico que se inclui no tipo do injusto penal em foco, não necessita ser econômica, admitindo-se benefício de qualquer natureza, seja moral ou material, mas desde que conste dentre os interesses pessoais do detentor de função pública a praticar ou retardar ato em contraprestação a imerecida retribuição” (Ap. 2009.017998-6-SC, 2.ª C.C., rel. Salete Silva Sommariva, 15.03.2011). 
Princípio da insignificância: tem aplicação, neste caso, o princípio da bagatela, ou seja, pequenos mimos ou lembranças, destinados a funcionários públicos, por exemplo, em datas comemorativas – como Natal, Páscoa etc. – é conduta penalmente irrelevante, não configurando o tipo penal da corrupção passiva. “É certo que, para chegar à compreensão de que a cortesia é desinteressada, é preciso que não nos inspiremos no exemplo exagerado daquilo que, por costume (mas, evidentemente, mau costume apenas) se justifique entre altos funcionários. A regra limitativa deve ser esta: a) que o presente seja ocasional e não habitual, ou contínuo; b) que não ocorra correspondência alguma entre o seu valor econômico e o ato de ofício, isto é, que não se possa formular, em face do fato, a relação que induza o caráter retributivo” (cf. FERNANDO HENRIQUE MENDES DE ALMEIDA, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 84-85). 
Vantagem indevida idônea: não bastam meras ofertas de vantagens impossíveis ou não factíveis, incapazes de gerar no funcionário público uma real cobiça ou um atentado à moralidade administrativa. É preciso que o agente ofereça algo idôneo e verossímil, de acordo com suas condições, bem como harmônico com o seu contexto de vida. Nesse sentido: TJSP: “Embora delito unissubsistente e formal, a aperfeiçoar-se com o simples oferecimento ou promessa de vantagem indevida, a corrupção ativa reclama seja essa oferta ou promessa, além de certa, factível em relação ao agente e idônea de molde a agredir a consciência do funcionário” (hipótese de foragido de presídio, de aspecto esquálido, que, preso de madrugada, foi colocado na cela, oferecendo ao delegado elevada soma para ser libertado, sem que a autoridade policial desse a menor atenção ao fato) (Ap. 314.877-3, São Paulo, 3.ª C., rel. Gonçalves Nogueira, 19.12.2000, v. u., JUBI 57/01). 
Objetos material e jurídico: o objeto material é a vantagem indevida. O objeto jurídico é a Administração Pública (aspectos patrimonial e moral). 
Classificação: trata-se de crime próprio (aquele que somente pode ser cometido por sujeito ativo qualificado ou especial); formal (delito que não exige resultado naturalístico, bastando a conduta para consumar-se). Nesse prisma: TRF-1.ª Região: “O crime é formal porque a corrupção passiva atinge o momento consumativo no instante em que a solicitação chega ao conhecimento do terceiro, ou em que o funcionário recebe a vantagem ou aceita a promessa de sua entrega” (ACR 000558-32.2005.4.01.4300-TO, 3.ª T., rel. para o acórdão Guilherme Mendonça Doheler, 28.09.2010,m.v.); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações) e, excepcionalmente, omissivo impróprio ou comissivo por omissão (quando o agente tem o dever jurídico de evitar o resultado, nos termos do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo, dando-se em momento determinado); unissubjetivo (aquele que pode ser cometido por um único sujeito); unissubsistente (delito praticado por um ato) ou plurissubsistente (delito cuja ação é composta por vários atos, permitindo-se o seu fracionamento), conforme o caso concreto; admite tentativa na forma plurissubsistente. Em contrário, desautorizando a hipótese da tentativa em qualquer caso, ANTONIO PAGLIARO e PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 121; BASILEU GARCIA, Dos crimes contra a Administração Pública, p. 228. Convém mencionar a posição intermediária de FERNANDO HENRIQUE MENDES DE ALMEIDA: “Entendemos, entretanto, que a tentativa da corrupção passiva, dependente como é este delito, deve existir, apenas, quando também a corrupção ativa fica igualmente frustrada. A tentativa da solicitação não é punível, se o agente não chega a realizar a solicitação de modo a colher eco ou resistência do particular. No primeiro caso, haverá tentativa de ambos os delitos (da corrupção ativa e da corrupção passiva) se for frustrada ação de ambos os sujeitos ativos do delito. Frustrado apenas por um, por iniciativa do particular, haverá tentativa, de um lado apenas, já que solicitar o indevido em razão de ofício ‘já é, só por só, começo de crime’” (Dos crimes contra a Administração Pública, p. 67-69). 
Concurso de pessoas: o Código Penal, mais uma vez, abriu exceção à teoria unitária do crime (ou monista), criando outra figura típica (art. 333) para a pessoa que corrompe o funcionário. Assim, o particular que dá a vantagem indevida, em lugar de responder como partícipe do delito de corrupção passiva, comete o crime de corrupção ativa. Porém, pode o fornecedor do presente ao funcionário ser punido como partícipe do delito de corrupção passiva, caso o mimo seja fornecido após a prática do ato funcional ou sem que haja a promessa de realização de ato de ofício (ver a nota 94 supra), pois não há caracterização do crime de corrupção ativa. 
Defesa preliminar: é cabível. Ver nota 14 ao artigo 312. 
Crime militar ou comum, conforme o caso: se o delito de corrupção ativa ou passiva for cometido por militar, no exercício da função, aplica-se o disposto no Código Penal Militar (arts. 308 e 309). Do contrário, é competência da justiça comum. Nesse prisma: STJ: “Se o policial militar, ao cometer o delito, não está no exercício de suas funções ou em situação de atividade, não se configura crime militar, sendo competente para o julgamento a Justiça Comum” (HC 9.808-SP, 5.ª T., rel. Felix Fischer, 04.11.1999, v. u., DJ 06.12.1999, p. 104). 
Aumento de pena: elevou-se a pena da corrupção passiva de 1 a 8 anos para 2 a 12 anos, mantendo-se a cominação de multa, conforme previsão da Lei 10.763/2003. Somente se pode considerar que o referido aumento teve por finalidade bloquear o benefício da suspensão condicional do processo, que exige a pena mínima de 1 ano, aos autores de corrupção. O aumento do teto da pena é inoperante no direito brasileiro, seja porque vige a política da pena mínima (praticamente inexiste a fixação da pena em grau máximo), seja porque a prescrição que realmente importa é a que leva em conta a pena concreta (normalmente no patamar mínimo) e não a da pena em abstrato, que levaria em consideração o máximo previsto para o crime. Por outro lado, tomando-se por base o novo mínimo previsto para o crime (2 anos), continua a ser viável a concessão de inúmeros benefícios penais, como a pena alternativa, o sursis e o regime aberto. Portanto, a alteração pouco efeito produzirá. 
Causa de aumento da pena: eleva-se em um terço a pena do agente que, em razão da vantagem recebida ou prometida, efetivamente retarda (atrasa ou procrastina) ou deixa de praticar (não leva a efeito) ato de ofício que lhe competia desempenhar ou termina praticando o ato, mas desrespeitando o dever funcional. É o que a doutrina classifica de corrupção exaurida. De fato, tendo em vista que o tipo penal é formal, isto é, consuma-se com a simples solicitação, aceitação da promessa ou recebimento de vantagem, mesmo que inexista prejuízo material para o Estado ou para o particular, quando o funcionário atinge o resultado naturalístico exaure-se (esgota-se) o crime. 
Figura privilegiada: a corrupção tem forma privilegiada, alterando-se a pena de reclusão para detenção e os limites para 3 meses a 1 ano ou multa, quando o funcionário pratica ou retarda o ato, bem como deixa de praticá-lo, levando em conta pedido (solicitação) ou influência (prestígio ou inspiração), mas sem qualquer vantagem indevida em questão. 
Defesa preliminar: é cabível. Ver nota 14 ao artigo 312.
Contrabando ou descaminho Art. 334. 
Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. 
§ 1.º Incorre na mesma pena quem: a) pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei; b) pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando ou descaminho; c) vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem; d) adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal, ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos. 
§ 2.º Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências. 
§ 3.º A pena aplica-se em dobro, se o crime de contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo.
Análise do núcleo do tipo: na primeira parte, caracterizando o contrabando, temos: a) importar significa trazer algo de fora do País para dentro de suas fronteiras; b) exportar quer dizer levar algo para fora do País. O objeto é mercadoria proibida. É o contrabando próprio. Na segunda parte, configurando o descaminho, temos iludir (enganar ou frustrar), cujo objeto é o pagamento de direito ou imposto. Trata-se do denominado contrabando impróprio. 
Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Se houver a participação de funcionário, pode configurar-se o tipo autônomo do art. 318 (facilitação de contrabando ou descaminho). O sujeito passivo é o Estado. 
Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo específico, nem se pune a forma culposa. 
Conceito de mercadoria: é qualquer coisa móvel passível de comercialização. 
Norma penal em branco: a proibição deve ser captada em outras leis, havendo, pois, necessidade de complementar o conteúdo da norma do art. 334. Conferir: TRF, 4.ª Região: “A figura típica descrita no art. 334, do Código Penal, por se tratar de norma penal em branco, é complementada pelo art. 3.º do Decreto-Lei n. 399/68, que equipara a contrabando ou descaminho a conduta do agente que transporta cigarros de procedência estrangeira, sem documentação comprobatória de sua regular importação” (ACR 0001597-94.2007.404.7118-RS, 8.ª T., rel. Artur César de Souza, 23.02.2011, v. u.). 
Modo de descaminho (perda ou extravio): pode a fraude ao pagamento de direito ou imposto ser total (completa, isto é, sem o pagamento de qualquer valor) ou parcial (pagando-se quantia inferior à devida). Tal situação, no entanto, deve ser levada em consideração paraa fixação da pena. Se o agente ludibria o Estado completamente, sem nada pagar, merece pena maior do que aquele que paga ao menos uma parte do devido. Na jurisprudência: TRF, 3.ª Região: “O caput do artigo 334 do Código Penal alcança não apenas o imposto de importação e de exportação, como também o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e o ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços)” (HC 2008.03.00.004202-7-SP, 2.ª T., rel. Nelton dos Santos, 25.08.2009, v. u.). 
Direito ou imposto: imposto é uma espécie de tributo (prestação monetária compulsória devida ao Estado em virtude de lei – ver o art. 16 do Código Tributário Nacional), podendo haver outros pagamentos necessários para a importação ou exportação de mercadorias, como a tarifa de armazenagem ou a taxa para liberação da guia de importação. 
Imposto sobre consumo: na realidade, atualmente, não mais se caracteriza o imposto incidente sobre o consumo de bens como tal, embora persista no sistema tributário brasileiro. Podem-se considerar como impostos sobre o consumo o IPI e o ICMS. Preceitua o Código Tributário Nacional: “Art. 46. O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador: I – o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira; II – a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do art. 51; III – a sua arrematação, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão. Parágrafo único. Para os efeitos deste imposto, considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo”. Quanto ao ICMS, convém ressaltar o disposto no art. 155, IX, a, da Constituição Federal: “IX – incidirá também: a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço”. 
Objetos material e jurídico: o objeto material pode ser a mercadoria, o direito ou o imposto devido. O objeto jurídico é a Administração Pública, nos seus interesses patrimonial e moral. Conferir: TRF, 3.ª Região: “O crime de descaminho não ofende somente o erário, atingindo também a soberania nacional, a autodeterminação do Estado, a segurança nacional e a eficácia das políticas governamentais de defesa do desenvolvimento da indústria pátria. Por isso, o descaminho é classificado como crime contra a Administração Pública e contra a ordem tributária” (HC 2008.03.00.004202-7-SP, 2.ª T., rel. Nelton dos Santos, 25.08.2009, v.u.). 
Classificação: trata-se de crime comum (aquele que pode ser cometido por qualquer pessoa); formal (crime que não exige, para sua consumação, resultado naturalístico, consistente na produção de efetivo dano para a Administração Pública) nas modalidades “importar” e “exportar”. Se a mercadoria é proibida de ingressar ou sair do País, o simples fato de fazê-lo consuma o crime, embora não se tenha produzido um resultado passível de realização fática. É formal (delito que não exige, para sua consumação, a ocorrência de resultado naturalístico), também na forma “iludir o pagamento”. Entretanto, nesse caso, o Estado deixa de arrecadar valores importantes para a Administração Pública, o que se pode constatar faticamente. É de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações), na forma “importar” e “exportar”, bem como comissivo ou omissivo (implicando em abstenção) na modalidade “iludir o pagamento”, conforme o caso concreto. E, excepcionalmente, omissivo impróprio ou comissivo por omissão (quando o agente tem o dever jurídico de evitar o resultado, nos termos do art. 13, § 2.º, CP); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo, dando-se em momento determinado), na importação ou exportação, quando a mercadoria for liberada, clandestinamente, na alfândega; se não passar pela via normal, assim que invadir as fronteiras do País ou traspassá-las ao sair. É unissubjetivo (aquele que pode ser cometido por um único sujeito); unissubsistente (praticado num único ato) ou plurissubsistente (delito cuja ação é composta por vários atos, permitindo-se o seu fracionamento), conforme o caso concreto; admite tentativa na forma plurissubsistente e quando comissivo. Conferir: STJ: “Na espécie, a fiscalização aduaneira verificou que um grande número de bolsas e porta-maquiagens supostamente de grifes famosas e de alto valor agregado havia sido importado por meio das remessas postais por pessoas físicas. Após as referidas mercadorias terem sido fotografadas e catalogadas, a matriz francesa elaborou laudo de constatação, o qual concluiu pela falsidade delas. O Min. Nilson Naves, o Relator, entendeu que, se a importação ou exportação faz-se através de alfândega, o crime somente estará consumado depois de ter sido a mercadoria liberada pelas autoridades ou transposta a zona fiscal. Diante disso, a Turma, ao prosseguir o julgamento, concedeu a ordem para reduzir a pena imposta a cada um dos pacientes, fixando-a em oito meses de reclusão no regime aberto, e substituiu a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade, ficando a implementação da restritiva de direitos a cargo do juiz da execução. Os Ministros Og Fernandes e Maria Thereza de Assis Moura a concediam em menor extensão” (HC 120.586-SP, 6.ª T., rel. Nilson Naves, 05.11.2009). 
Princípio da insignificância: encontra aplicação neste delito. A introdução, no território nacional, de mercadoria proibida, mas em quantidade ínfima, ou o não pagamento de pequena parcela do imposto devido configuram típicas infrações de bagatela, passíveis de punição fiscal, mas não penal. Há vários exemplos de aplicação do referido princípio, que serão citados abaixo. Porém, é preciso ressaltar a atual posição do STJ, mencionando precedente do STF, no sentido de ser considerado insignificante, no contexto do descaminho, valores inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais). O fundamento encontra-se no art. Art. 20 da Lei 10.522/02: “Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais)”. Se é bagatela para a União cobrar valores iguais ou inferiores a esse patamar, por que o contribuinte haveria de pagar? STJ: “O recorrente foi denunciado pela prática do delito de descaminho, o TJ trancou a ação penal, mas o MPF interpôs recurso especial, ao qual a Turma deu provimento em 30.08.2007, determinando o recebimento da denúncia. Depois de recebida a denúncia, o recorrente foi condenado por infringência ao art. 334, caput (2ª parte), do CP, por ter sonegado R$ 1.681,00 de impostos de importação. E ele impetrou mandamus no TJ e novamente pediu o trancamento da ação penal diante de novo entendimento do STF. O TJ, por sua vez, não conheceu da ação devido a decisão anterior deste Superior Tribunal, daí o RHC. Explica o Min. Relator que, no REsp anteriormente interposto, discutiu-se, somente, a possibilidade do recebimento da denúncia, tanto que a ação penal foi processada e julgada. Por isso, entende ser cabível o presente recurso ordinário, pois não se trata de reiteração de pedido. Isso posto, com a ressalva do entendimento pessoal do Min. Relator, a Turma deu provimento ao recurso para trancar a ação penal, conforme a orientação do STF de aplicar o princípio da insignificância aos débitos tributários que não ultrapassem o limite de R$ 10 mil, a teor do disposto na Lei 10.522/2002. Precedente citado: REsp 1.112.748-TO, DJe 13.10.2009” (RHC 25.834-RS, 5.ª T., rel. Felix Fisher, 26.11.2009). Outros exemplos de aplicação do princípio: STJ: “No caso sub

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