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Fundamentos da Educação Especial Aspectos Históricos, Legais e Filosóficos Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Natalia Mendonça Conti Revisão Textual: Prof. Esp. Claudio Pereira do Nascimento Revisão Técnica: Prof.ª Dr.ª Célia Regina da Silva Rocha Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva • Recapitulando... A Deficiência ao Longo da História; • As Modificações Legais Relativas às Pessoas com Deficiência no Brasil a partir da Década de 1960. • Conhecer quais são os marcos legais e históricos, a partir da década de 1960, que bali- zam a educação no geral e em especial o ensino voltado às pessoas com defi ciência; • Conhecer e compreender como as Convenções e os Acordos internacionais auxiliaram no avanço do debate sobre a educação inclusiva, bem como seu impacto no Brasil; • Conhecer e debater os limites e avanços das leis, dos programas e das políticas públi- cas voltadas às pessoas com defi ciência no Brasil na primeira década do século XXI. OBJETIVO DE APRENDIZADO Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Recapitulando... A Deficiência ao Longo da História Na unidade anterior se estudou como as sociedades trataram as pessoas com deficiência ao longo da história, no Brasil e no mundo. Essa relação transformou- -se de um tratamento excludente, na qual as pessoas ficavam entregues à própria sorte ou eram eliminadas (das primeiras sociedades até o século V d.C.), para uma incorporação segregadora, quando as pessoas eram “excluídas” em instituições e “toleradas” no convívio familiar de forma restrita (do século VI d.C. ao XV). Com o início da Idade Moderna, junto ao avanço da filosofia humanista, da ciência e da pedagogia, as pessoas com deficiência passam a ser integradas. Dessa forma, desenha-se um tratamento marcado tanto pela institucionalização como pela ideia de normatização: esperava-se através da educação e de tratamentos médicos que a pessoa alcance um “padrão de normalidade” em suas habilidades e em seu compor- tamento, tornando-se uma pessoa “produtiva” à sociedade e ao mundo do trabalho. No Brasil, esse trajeto é similar, sendo que a exclusão e a segregação marca nossa história desde a colonização. A institucionalização dos tratamentos também se faz presente com as primeiras instituições especializadas na educação e no trata- mento terapêutico datadas do século XIX. Já o início do século XX vê o despontar de novas ideias pedagógicas, assim como o aumento no oferecimento do ensino regular à população. A educação dispensada as pessoas com deficiência se modifica substancialmente, sendo implementada a partir de instituições especializadas ou classes especiais nas escolas, reforçando um caráter de segregação e institucionalização do ensino, ao in- vés da integração. Esses espaços acabavam por reunir pessoas com baixo rendimen- to escolar e diagnósticos clínicos precários, espaços marcados pelo abandono e pela exclusão. A escola ainda se organizava a partir de uma cisão rígida no entendimento da normalidade e anormalidade. Na segunda metade do século XX, o tratamento e a concepção sobre as pessoas com deficiência passam a se movimentar, se afastando a convicção de que essas pessoas deveriam se enquadrar, emergindo a ideia de que é compromisso dos governos e da sociedade no geral lidar com a diferença e garantir a inclusão de todos, sem qualquer forma de discriminação. Como estudado anteriormente, após o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945, profundas transformações ocorreram no mundo, tanto na reorganização das forças políticas como nos paradigmas colocados à sociedade. Diante da tre- menda barbaridade que havia sido essa guerra, colocava-se a questão: como tratar os conflitos econômicos e políticos para que não cheguemos a esse ponto? Como garantir que determinados direitos de qualquer ser humano seja respeitado inde- pendente das discordâncias entre as nações e de seus conflitos? A criação da ONU e seu principal documento fundacional - a Declaração Universal dos Direitos Hu- manos - são iniciativas que buscavam responder a esta pergunta. Nesse contexto, 8 9 esta Declaração ocasiona atenção tanto à diversidade que existe entre a humani- dade, como aponta a importância de os direitos tocarem igualitariamente a todas e todos. Dessa forma, a Declaração aponta que todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidade e direitos (Art. 1°.), não cabendo distinção de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, nem origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação (Art. 2°.) e, assim, aponta a necessidade da garantia de acesso aos direitos como cidadãos, independentemente das condi- ções ou peculiaridades das pessoas. Esse caráter universal das possibilidades e dos direitos também se faz sentir na concepção de que a educação deve ser gratuita (ao menos nos graus elementares e fundamentais) e obrigatória (a instrução elementar), devendo favorecer a com- preensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos (Art. 26º). As ideias expressas na Declaração Universal dos Direitos Humanos serviram ao longo das décadas como base para novas leis, tratados e declarações, tanto para legislações nacionais como para documentos de caráter multilateral. No que se refere à educação, esses debates se desdobram na defesa do direito de todos a terem acesso à educação, assim como o movimento pela educa- ção inclusiva será fortemente influenciado pelo debate dos direitos humanos, como veremos ao longo desta unidade. Nesta unidade vamos estudar um pouco dessas transformações históricas, assim como quais foram os marcos legais e institucionais que permitiram o avanço para que se chegasse a uma concepção inclusiva de sociedade. Por fim, visitaremos os documentos governamentais e as políticas públicas que norteiam atualmente a edu- cação inclusiva no Brasil. Bom estudo! As Modifi cações Legais Relativas às Pessoas com Defi ciência no Brasil a partir da Década de 1960 A partir da década de 1960, ocorreu no Brasil uma série de modificações legis- lativas,assim como nas concepções e práticas das instituições e da sociedade rela- tivas à população portadora de deficiência. Em 1961, um marco legal da educação surge quando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN – Lei no 4.024/61), apontando o direito dos “excepcionais” à educação: “A educação de excepcionais, deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema geral de educa- ção, a fim de integrá-los na comunidade” (artigo 88). Esta será alterada em 1971 pela lei n˚5.692/71, que reforça a segregação em classes e escolas específicas, propondo que: “Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial (...)” (artigo 9º). 9 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Importante! No “Material Complementar”, ao final desta unidade, você pode encontrar os “links” para as principais leis, decretos, acordos e declarações citados ao longo deste material. Essa lista serve também de sumário para as leis visitadas aqui, auxiliando em seu estudo. Trocando ideias... Em 1973, a partir do Ministério da Cultura e Educação (MEC), é criado o Centro Nacional de Educação Especial – CENESP, responsável por gerenciar a educação especial e promover a expansão e a melhoria no atendimento às pessoas com de- ficiência. O órgão previa as seguintes modalidades de ensino: classe comum com apoio pedagógico especializado, classe comum com apoio de sala de recursos, classe comum com apoio de professor itinerante, classe especial, escola especial, centro de educação precoce, serviço de atendimento psicopedagógico e escola em- presa. Essas leis apontam a integração do aluno portador de deficiência no sistema de ensino regular, entretanto, caminha junto à ideia de “políticas especial” condi- cionada ao tratamento assistencialista e integracionista desses alunos (BARRETO, 2014, p.16). À frente, o CENESP publica a Portaria n˚ 69, de 28 de agosto de 1986, que aponta a educação especial como “parte integrante da Educação e que visa proporcionar, através de atendimento educacional especializado, o desenvolvimen- to das potencialidades do educando com necessidades especiais como fator de autorrealização, qualificação para o trabalho e integração social” (artigo 1˚). Nesse mesmo ano, o CENESP se torna a Secretaria de Educação Especial (SESPE), além de ser criada a Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE) que integrará o Ministério da Ação Social em 1989. Por fim, cabe apontar que é ao longo da década de 1980 o início de uma longa jornada para que a educação inclusiva se faça relevante, como aponta Lourenço: No Brasil, podemos dizer que a educação inclusiva começou a ganhar mais espaço e relevância a partir da década de 1980, com a divulgação de dados alarmantes sobre o fracasso, a evasão e a repetência escolar, e com o aumento das demandas pela criação de classes e escolas especiais. Nes- sa década, as reivindicações de diversas organizações da sociedade civil e associações de pessoas com necessidades especiais contribuíram para que a Constituição Federal de 1988 incorporasse os ideais da educação para todos e para que as políticas educacionais do País sofressem profundas modificações. (LOURENÇO, 2010, p.23) Como veremos, as leis que visam garantir os direitos das pessoas com deficiên- cia passaram por diversas modificações ao longo das décadas e, até hoje, estão em constante transformação, refletindo as mudanças nas concepções e políticas para essa população, assim como o avanço do debate público sobre o tema. Visitaremos os principais ordenamentos jurídicos e acordos internacionais que tocam nessa 10 11 questão, apontando a importância de seus termos quando foram assinados, mas também apontando as atualizações desses documentos. Essas modificações são comuns e ocorrem com o avanço do debate social e jurídico sobre o tema, algumas vezes modificando substancialmente as leis e em outras vezes tratando de pequenas alterações para melhor esclarecer ou definir a aplicação da lei ou tratado. A “Constituição Cidadão” de 1988 A nova Constituição Federal de 1988 é um marco na defesa das igualdades jurídi- cas e sociais no Brasil, refletindo uma série de debates que perpassavam a sociedade e os movimentos sociais da época. Nesse sentido, ela aponta em seu artigo terceiro como objetivos fundamentais da República do Brasil: “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, “garantir o desenvolvimento nacional”, “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”, assim, como “promo- ver o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Já seu quinto artigo aponta que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)”. Em relação à educação, apon- ta em seu artigo 205: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Já em seu artigo 206, a Constituição estabelece que o ensino terá como base os princípios: “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, “li- berdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”, além de “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”, “gestão de- mocrática do ensino público, na forma da lei”, “garantia de padrão de qualidade”, entre outros. Em relação à educação das pessoas com deficiência, estabelece que é dever do Estado garantir: “atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino” (inciso III do art. 208). Dessa forma, a constituição estabelece como parte das atribuições do Estado e da sociedade no geral zelar pela igualdade de todas e todos, sem discriminação, as- sim como garantir seu desenvolvimento e o exercício da cidadania. Também prevê como dever do Estado e da família, com a colaboração da sociedade, promover e acompanhar o desenvolvimento escolar das pessoas. Apesar dos limites práticos e legais, é de extrema importância para a inclusão das pessoas com deficiência que a Constituição tenha afirmado a igualdade jurídica. Assim, também é com os princípios de igualdade de condições de acesso, permanência e a gratuidade do ensino, assim como o dever do Estado de garantir o atendimento educacional es- pecializado, mesmo que ainda “preferencialmente”, e não totalmente atrelado ao ensino regular. 11 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva O artigo 208 da Constituição Federal atualmente: A Constituição quando de sua pro- mulgação previa como dever do Estado a garantia do “ensino fundamental, obrigatório e gratuito”, “progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio” e “aten- dimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade”. Algumas Emendas Constitucionais modificaram essa redação, a fim de avançar na universalização e obriga- toriedade do ensino. A educação básica passa a ser obrigatória e gratuita dos quatro aos dezessete anos (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009); e a “progres- siva extensão” passa a ser: “progressiva universalização do ensino médio gratuito” (Reda- ção dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996). Já a educação infantil, em creche e pré-escola, passa a receber as crianças de até 5 anos de idade (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006). Ex pl or Outra importante lei, promulgada no ano seguinte, foi a lei n˚ 7.853/89, que versara sobre diversos temas como a melhoria na qualidade de vida dos deficientes e a garantia de seus direitos na área da saúde, educação e trabalho. Prevê na área educacional, entre outras medidas, por exemplo: “a oferta, obrigatóriae gratui- ta, da Educação Especial em estabelecimento público de ensino” e “o acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsas de estudo” (artigo 2˚). Além disso, essa lei criminaliza a discriminação ao portador de deficiência, constituindo- -se crime recusar, suspender, adiar, cancelar ou extinguir matrícula de um estudante devido a sua deficiência. Atribui ainda ao Ministério Público a defesa dos interesses das pessoas com deficiência e regulamenta a acessibilidade aos edifícios de acesso ao público. Essa lei será regulada em 1999 através do Decreto n˚ 3.298/99. Declarações e esforços internacionais ao longo da década de 1990 Como comentado anteriormente, as modificações legais ao longo da década de 1990 foram fortemente influenciadas por um contexto internacional de reconheci- mento dos direitos humanos, assim como da necessidade de avançar na questão da educação. Sem dúvida, esse reconhecimento também perpassou interesses e a luta pelos direitos das pessoas portadoras de deficiência. Um marco foi os documentos advindos da “Conferência Mundial sobre Necessidades Básicas de Aprendizagem” realizada em Jomtien na Tailândia em 1990: a “Declaração Mundial sobre Educa- ção para Todos” e o “Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem”, na qual os países que a assinaram – como o Brasil – se compro- metiam a erradicar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental no país. Já em 1994, a UNESCO realizou em Salamanca, na Espanha, a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade, com o intuito de discutir a atenção aos processos educacionais para os alunos com necessidades edu- cacionais especiais. Dessa Conferência surge a “Declaração de Salamanca: sobre 12 13 princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais”, que ratifica a “Declaração Mundial sobre Educação para Todos” e aponta a necessidade de inclusão das pessoas com deficiência nas escolas regulares. Anteriormente, em 1991, a Conferência Geral da UNESCO convocou uma missão internacional para refletir sobre o ensino no século XXI, sendo criado em 1993 a Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI. Seu relatório foi divulgado em 1996 e se tornou o livro “Educação: um tesouro a descobrir” que propõem que a educação deve se organizar em torno de quatro aprendizagens ini- ciais: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. De destaque é ainda a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, realizada na Guatemala em 1999. Essa convecção reforçou a igualdade de direitos e liberda- des fundamentais das pessoas com deficiência em face as outras pessoas, inclusive assegurando o direito de não ser discriminadas com base em sua deficiência. Esse documento foi ratificado no Brasil em 2001 com a assinatura do Decreto n˚ 3.956. O Estatuto da Criança e do Adolescente Outra importante conquista na garantia dos direitos tanto das crianças e dos adoles- centes, como também das pessoas com deficiência, foi a criação do Estatuto da Crian- ça e do Adolescente (ECA), em 1990, através da lei n˚ 8.069/90. O ECA aponta: Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportu- nidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, men- tal, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Dessa forma, a criança e o adolescente, além dos dispositivos legais presentas na Constituição e em outros ordenamentos, também tem seus direitos assegurados por essa “legislação especial”. Atualização do ECA: Um adendo ao terceiro artigo do ECA ocorreu recentemente, reafi r- mando sua aplicação a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação, aparecendo nele a questão da defi ciência: “Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crian- ças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, defi ciência, condição pessoal de desenvolvimento e apren- dizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem” (incluído pela Lei nº 13.257, de 2016). Ex pl or 13 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Além disso, o ECA reforça os deveres da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Estado em assegurar diversos direitos da criança, tais como o direito: à vida, à saúde, à educação, à alimentação, ao esporte, ao lazer, à profissionaliza- ção, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e co- munitária, entre outros (artigo 4˚). Prevê também a obrigação dos pais ou respon- sáveis em matricular seus filhos na rede regular de ensino (artigo 55), assim como assegura a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (inciso I, artigo 53). Por fim, o inciso III do artigo 54 do ECA prevê que é dever do Estado assegurar: “atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”. Em relação à saúde, quando de sua promulgação, o ECA assegurava o “aten- dimento médico” às crianças e aos adolescentes através do SUS, apontando o atendimento especializado aos portadores de deficiência e a incumbência do po- der público em fornecer gratuitamente, àqueles que necessitassem, medicamentos, próteses e outros recursos voltados ao tratamento, habilitação e reabilitação (artigo 11 e seu §1 o e §2 o). Atualização do ECA: Sem divergência com sua essência, atualmente a redação do artigo 11 e seus parágrafos assegura: “acesso integral às linhas de cuidado voltadas à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde” (artigo 11, Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016), assim como: “§ 1o A criança e o adolescente com deficiência serão atendidos, sem discriminação ou segregação, em suas necessidades gerais de saúde e es- pecíficas de habilitação e reabilitação.(Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016); § 2o In- cumbe ao poder público fornecer gratuitamente, àqueles que necessitarem, medicamentos, órteses, próteses e outras tecnologias assistivas relativas ao tratamento, habilitação ou rea- bilitação para crianças e adolescentes, de acordo com as linhas de cuidado voltadas às suas necessidades específicas. (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016) Ex pl or Por fim, outras garantias às pessoas com deficiência se fazem presentes como: “Ao adolescente portador de deficiência é assegurado trabalho protegido” (Art. 66); quando da pratica de ato infracional: “Os adolescentes portadores de doença ou de- ficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições” (§3º do artigo 112). Dessa forma, o ECA constitui-se como um mecanismo legal específico para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes que se encontram em um momento impar da vida, no qual estão amadurecendo suas concepções filosóficas e morais, assim como suas referências sociais e comunitárias. Como se percebe pelos seus artigos, ele encontra-se em conformidade com a Consti- tuição e em relação à educação das pessoas com deficiência, apresentando a mesma ideia do atendimento especializado, preferencialmente na rede regular de ensino. 14 15 Atualização do ECA: na última década, o ECA apresentou modifi cações também no que diz respeito às políticas de adoção, prevenção e proteção às pessoas com defi ciência. Seu parágrafo 9º, artigo 47, aponta a “prioridade de tramitação dos processos de adoção em que o adotando for criança ou adolescente com defi ciência ou com doença crônica(Incluído pela Lei nº 12.955, de 2014). Já o parágrafo 15 do artigo 50 aponta: “Será assegurada prioridade no cadastro a pessoas interessadas em adotar criança ou adolescente com defi ciência, com doença crônica ou com necessidades específi cas de saúde, além de grupo de irmãos (Inclu- ído pela Lei nº 13.509, de 2017). Além disso, o Parágrafo único do artigo 70-A aponta que: “As famílias com crianças e adolescentes com defi ciência terão prioridade de atendimento nas ações e políticas públicas de prevenção e proteção (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014). Ex pl or A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 No Brasil, em 1994, publica-se o documento “Política Nacional de Educação especial” que orientará o processo de “integração instrucional” no qual as crianças com capacidade de acompanhar e desenvolver atividades curriculares do ensino co- mum, no mesmo ritmo que os alunos “normais”, deveriam ser integradas em classes comuns. Essa orientação pode ser apontada como um retrocesso naquele momento e contraditória com o movimento da educação inclusiva, pois propõem uma inte- gração pautada na normalização e homogeneização da aprendizagem, excluindo as pessoas com deficiência, contrário a valorização das diferenças como potência pedagógica e humana. Outra importante alteração relativa à educação no Brasil foi a nova LDBEN - lei n˚9.394/96, que afirma a educação como dever da família e do Estado, visando o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (artigo 2º). Em conformidade com a Constituição Federal, para a LDBEN o ensino deve ser ministrado com base a diversos princí- pios, tais como: “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas”; “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”, “gestão democrática do ensino público (...)”, entre outros (incisos do artigo 3˚). Atualização da LDBEN: Nota-se a importância da adição de dois incisos recentemente, apontando como princípio da educação também a “consideração com a diversidade étnico- -racial (inciso XII incluído pela Lei nº 12.796, de 2013), além da “garantia do direito à edu- cação e à aprendizagem ao longo da vida” (inciso XIII incluído pela Lei nº 13.632, de 2018). Ex pl or 15 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva É de importância também ressaltar as diferenças entre a LDBEN e outras normas legislativas que tocam na educação. O artigo 54 do ECA, visto anteriormente, prevê em seu inciso II: “progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio”. Como já mostrado, essa redação foi superada na Constituição que modificou esse inciso para “progressiva universalização do ensino médio gratuito” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996). Apesar de permane- cer a redação superada no ECA, a legislação prevê atualmente através da LDBEN: educação infantil gratuita às crianças de até cinco anos; educação básica (pré- -escola, ensino fundamental e ensino médio) obrigatória e gratuita dos quatro aos dezessete anos de idade; acesso público e gratuito, mas não obrigatório, ao ensino fundamental e médio para todos os que não concluíram na idade própria (incisos do artigo 4˚ da LDBEN). Além disso, a LDBEN apresenta um capítulo voltado à educação especial, sendo que em seu artigo 58 definia que essa educação se voltava para “educandos por- tadores de necessidades especiais” e que deveria ser oferecida preferencialmente na rede regular, além de prever “serviços de apoio especializado na rede regular” e o atendimento em escolas especializados, caso não seja possível a integração nas classes comuns do ensino regular. Atualização da LDBEN: Apesar dos parágrafos permanecerem como na redação de 1996, o artigo 58 sofreu alteração a fim de aumentar o escopo do que se entende por educação especial, refletindo a atualização dos debates: Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de edu- cação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.” (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013). § 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. § 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integra- ção nas classes comuns de ensino regular. Ex pl or A LDBEN prevê ainda que os sistemas de ensino assegurem aos educandos com necessidades especiais: currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicas para atender às suas necessidades; terminalidade espe- cífica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especia- lizado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante 16 17 articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresen- tam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular (incisos do artigo 59). Além disso, o artigo 60 dessa lei prevê que os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabeleçam os critérios para que as instituições privadas sem fins lucrati- vos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, possam receber apoio técnico e financeiro do Poder Público. Prevê também que o poder público adotará como alternativa preferencial a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino. Atualização da LDBEN: Assim como o artigo 58, o artigo 59 e 60 não utiliza mais apenas a defi nição “educando com necessidades especiais”, mas aumenta o escopo das garantias de seus artigos aos “educandos com defi ciência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação” (Redação dada pela lei nº 12.796, de 2013). Além dis- so, recentemente o artigo 59-A aponta como responsabilidade do poder público instaurar um “cadastro nacional de alunos com altas habilidades ou superdotação matriculados na educação básica e na educação superior, a fi m de fomentar a execução de políticas públicas destinadas ao desenvolvimento pleno das potencialidades desse alunado” (Incluído pela Lei nº 13.234, de 2015). Ex pl or A LDBEN institui ainda a Década da Educação (artigo 87), determinando o pra- zo de um ano para a União encaminhar ao Poder Legislativo o Plano Nacional da Educação, que deveria ser elaborado em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Jomtiem, 1990), sendo que esse Plano acabou por ser apro- vado em janeiro de 2001 (lei n˚ 10.172/01). É possível falar que nas décadas estudadas, a legislação avançou em relação à garantia dos direitos às pessoas com deficiência, assim como esteve, de forma ge- ral, em sintonia com os debates e documentos internacionais. Entretanto, o ensino “preferencialmente no ensino regular” na pratica deu-se como institucionalização dos educandos em instituições apartadas ou em classes especiais, sendo que no fi- nal da década de 1990 ainda era muito precária a promoção da educação inclusiva. Comenta Barreto: Entre as décadas de 1970 e 1990, as opções para os alunos com defici- ência erama escola especial filantrópica ou a classe especial nas escolas públicas. Ambas não eram garantia de escolarização, pois ainda impera- va a cultura da institucionalização ou da integração. Nesses espaços, os “alunos deficientes” recebiam uma abordagem de socialização, de auto- cuidado e, em algumas situações, uma alfabetização para situações de fun- cionalidade. Podiam também “aprender” um ofício, mas sem a intenção de ingresso no mercado de trabalho formal. O objetivo instrucional se limitava a atividades passíveis de repetição, centrado em um modelo de treinamento. (BARRETO, 2014, p.18) 17 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Legislação, convenções internacionais e os desafios do século XXI No âmbito internacional, nos anos 2000, dois importantes eventos ocorreram em Dakar, no Senegal, a fim de avaliar a situação da educação no mundo, assim como o resultado de pactos e acordos internacionais como o “Educação para Todos”. Um deles foi realizado contando com representantes de 300 ONGs e resultou no docu- mento “Declaração das ONGs sobre Educação para Todos”. Também ocorreu nessa oportunidade o Fórum Mundial da Educação e um novo compromisso foi firmado entre os países participantes - a “Declaração Educação para Todos: o compromisso de Dakar” – que se comprometeram a criar ou fortalecer os planos nacionais de educação existentes. Tendo a UNESCO à frente, outro encontro ocorre em 2001 em Cochabamba, na Bolívia, reunindo os ministros da educação da América Latina e do Caribe. Nele objetivou-se elaborar estratégias para melhoria da qualidade da educação, universalizar a escolarização fundamental e alfabetizar jovens e adultos. Os países presentes assinam a “Declaração de Cochabamba: Educação para Todos: cumprindo nossos compromissos coletivos”. Esses diversos encontros internacio- nais contaram com a participação tanto de representantes dos governos dos países membros da UNESCO como de representantes da sociedade civil. Ao redor dos encontros, diversos movimentos de combate à discriminação das pessoas com de- ficiência física se formaram, assim como de combate ao preconceito racial e outras formas de discriminação, influenciando esses espaços. Em 2006, a ONU aprovaria o importante documento “Convenção sobre os Di- reitos das Pessoas com Deficiência” (CDPD) e seu “Protocolo Facultativo” (PF), ela- borada ao longo de 4 anos, com a participação de 192 países membros da ONU e centenas de representantes da sociedade civil. Os textos foram assinados pelo Brasil 2007, sendo ratificados como Emenda Constitucional pelo Senado no ano seguin- te, sendo promulgados pela presidência em 2009 através do Decreto n° 6.949/90. Esses documentos buscam salvaguardar a igualdade jurídica e de acesso das pessoas com deficiência, apresentando diretrizes e princípios relativos a vários campos da vida social, apresentando pontos relativos a: igualdade e não-discriminação; mu- lheres e crianças com deficiência; acessibilidade; direito a saúde e a educação; ha- bilidade e reabilitação; participação da vida política e pública; participação na vida cultural e em recreação, lazer e esporte, entre diversos outros pontos. Em relação à educação, traça como diretriz o atendimento escolar inclusivo em todos os níveis de ensino, buscando o compromisso de não haver a exclusão do sistema educacional gratuito e compulsório da pessoa com deficiência em hipótese alguma: 18 19 Art. 24 1. Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à educação. Para efetivar esse direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os Estados Partes assegurarão sistema edu- cacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida [...] 2. Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que: a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de deficiência; O Plano Nacional de Educação de 2001 Em consonância com esses compromissos internacionais assumidos pelo Bra- sil, assim como com a Constituição Federal e a LDBEN, após três anos de trami- tação legislativa, aprovou-se em 2001, no Brasil, o Plano Nacional de Educação (lei n˚ 10.172, de 9 de Janeiro de 2001). O PNE apontará o “Diagnóstico”, as “Diretrizes” e os “Objetivos e Metas” para a educação em seus diversos âmbi- tos - educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, educação superior, educação de jovens e adultos, educação a distância e tecnologias educacionais, educação tecnológica e formação profissional, educação especial, educação indí- gena – assim como para a formação dos professores e valorização do magistério e o financiamento e a gestão da educação. De forma geral, o plano propõem estratégias para elevar o nível de escolaridade da população, melhorar a qualidade do ensino, diminuir as desigualdades regionais de acesso e permanência na educa- ção, assim como democratizar a gestão do ensino público. Além disso, os Estados e municípios são orientados a elaborarem seus planos de educação tendo como referência o PNE. No que diz respeito à Educação Especial, o PNE apresenta um capítulo dedicado ao tema, buscando um diagnóstico da situação, apesar dos dados precários que haveriam sobre o tema, assim como propõem uma série de diretrizes e metas. O documento parte da garantia constitucional de integração dessas pessoas no sis- tema regular de ensino, “preferencialmente na rede regular de ensino”, argumen- tando ainda as tendências recentes dos sistemas de ensino: integração/inclusão do aluno com necessidades especiais no sistema regular de ensino e, se isto não for possível em função das necessidades do educando, realizar o atendimento em clas- ses e escolas especializadas; ampliação do regulamento das escolas especiais para prestarem apoio e orientação aos programas de integração, além do atendimento específico; melhoria da qualificação dos professores do ensino fundamental para essa clientela; expansão da oferta dos cursos de formação/especialização pelas universidades e escolas normais. 19 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Normas e Programas relativos à inclusão da pessoa com deficiência Os dispositivos legais estudados até aqui (Constituição Federal, ECA, LDBEN e PNE, principalmente) apontam princípios legais, diretrizes e direitos tanto de forma ampla como no que toca especificamente a garantir os direitos das pessoas com deficiência. Regulamentando, complementando e objetivando viabilizar essas indi- cações, os primeiros anos do século XXI também viram uma série de leis, decretos, programas e resoluções no sentido de promover a inclusão das pessoas com defi- ciência, tanto na área educacional como na democratização do acesso aos espaços físicos e simbólicos da sociedade. Nesse sentido, no ano de 2001 é divulgada a Resolução CNE/CEB n˚ 2/2001, que institui diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. A resolução reconhece a educação especial como modalidade da educação escolar, o compromisso dos sistemas de ensino em matri- cular e as escolas de se organizarem para receber os estudantes com “necessidades educacionais especiais” (artigo 2˚). Além disso, aponta: Art. 3º Por educação especial, modalidade da educação escolar, en- tende-se um processo educacional definido por uma proposta pedagógi- ca que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em to- das as etapas e modalidades da educação básica. Apesar de apontar a responsabilidade das escolas em receberem os alunos com necessidadeseducacionais especiais, ao apontar a possibilidade da educação espe- cial, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, acaba por não favorecer a educação inclusiva na rede regular de ensino. Já em 2002, o Ministério da Educação publica a Portaria n˚ 2.678 que aprova o projeto da Grafia Braille para a Língua Portuguesa e recomenda o seu uso em todo o território nacional. Nesse mesmo ano, a lei n˚ 10.436/02 reconhece a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como meio legal de comunica- ção e expressão e determina a garantia institucional de apoio ao uso e difusão, assim como a inclusão da disciplina sobre a língua nos currículos de formação de professores e de fonoaudiologia. Essa lei seria regulamentada alguns anos à frente pelo Decreto n˚ 5.626/2005. Já o Decreto n˚ 5.296/2004 regulamen- tou as leis n˚ 10.048/2000 e n˚ 10.098/2000, estabelecendo o atendimento prioritário em órgãos da administração pública direta, indireta e fundacional, nas empresas prestadoras de serviços públicos e nas instituições financeiras, além de estabelecer normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida. Além 20 21 disso, no mesmo ano de 2004, o Ministério das Cidades lança o “Programa Brasil Acessível”, que tem como objetivo desenvolver, através da Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana, a Mobilidade Urbana Susten- tável, ou seja, uma política de transporte e circulação que permita o acesso amplo e democrático ao espaço urbano. De importância também é a resolução CNE/CP n˚ 1/2002, que estabeleceu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica. Essa resolução define que os cursos de nível superior, de licenciatura e de graduação plena que formem professores para a educação básica, devem observar em sua organização curricular “o acolhimento e o trato da diversidade” (inciso II do artigo 2), assim como seus projetos pedagógicos deve prever a inserção de de- bates, envolvendo questões culturais, sociais, econômicas e o conhecimento sobre o desenvolvimento humano e a própria docência, contemplando: “conhecimentos sobre crianças, adolescentes, jovens e adultos, aí incluídas as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais e as das comunidades indígenas” (inciso II, § 3˚, artigo 6). A partir de 2003, o “Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade” realiza seminários de formação para dirigentes escolares, presta apoio técnico, financeiro e orientação, assim como disponibiliza referência pedagógicas no campo da edu- cação inclusiva, como aponta seu documento orientador: “O objetivo é a formação de gestores e educadores para efetivar a transformação dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos, tendo como princípio a garantia do direito dos alunos com necessidades educacionais especiais de acesso e permanência, com qualidade, nas escolas regulares”. É parte desse programa o documento ela- borado a partir da Secretaria de Educação Especial, “A fundamentação filosófica” de 2004, estudado na primeira unidade desta disciplina. Além disso, junto ao pro- grama “Direito à diversidade”, a partir de 2005 é lançado o projeto de formação docente “Educar na Diversidade”, que desenvolve uma série de atividades e publica materiais didáticos a fim de consolidar a política nacional de educação inclusiva. Além do mais, em 2003 tem início à elaboração do Plano Nacional de Edu- cação em Direitos Humanos, com a criação do Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos (CNEDH), em um esforço conjunto de especialistas, re- presentantes da sociedade civil, instituições públicas e privadas e organismos in- ternacionais. Após anos de debate e formulação, lança em 2006 um documento orientador para a implementação de políticas, programas e ações comprometidas com a cultura de respeito e promoção dos direitos humanos, constando nele con- cepções, princípios e ações programáticas para a educação básica, superior, não formal e dos profissionais dos sistemas de justiça e segurança, além de orientações sobre “educação e mídia”. 21 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Em 2004 houve o lançamento da cartilha “O acesso de alunos com deficiência às escolas comuns da rede regular”, no qual objetiva “divulgar os conceitos mais atuais e adequados às diretrizes mundiais de inclusão da pessoa com deficiência na área educacional.” A cartilha perpassa os “aspectos jurídicos” da educação inclusiva, assim como aponta “orientações pedagógicas” para os educadores e orientações (“recados”) aos pais e responsáveis de crianças com e sem deficiência, assim como aos professores. Apesar do enfoque em crianças e adolescentes com deficiência, as mais vulneráveis em razão da não-adaptação arquitetônica e pedagógica das escolas, o documento justifica partir da defesa de uma educação que se preocupe com todas as pessoas. Além disso, em 2005 foi implementado os Núcleos de Ativi- dades de Altas Habilidades/Superdotação – NAAH/S em todos estados brasileiros, tratando-se de centros de referência na área das altas habilidades/superdotação. Esses centros objetivam tanto o atendimento educacional especializado como a orientação das famílias e a formação continuada de professores. O Plano de Desenvolvimento da Educação - PDE O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) surge ainda em 2007, com o objetivo de melhorar a educação no país em todas suas etapas, mas com prioridade no ensino básico. Em um prazo de quinze anos, ele previa uma série de medidas para a melhoria da educação não apenas nas escolas, mas também junto a políti- cas públicas de combate a desigualdade e a problemas sociais, como os programas “Luz para todos”, “Saúde nas escolas”, “Olhar Brasil”, entre outros. Em relação às pessoas com deficiência, prevê entre seus eixos centrais: a ampliação de números de salas e equipamentos para a Educação Especial; a capacitação de professores para o atendimento educacional especializado; a acessibilidade arquitetônica dos prédios escolares, sendo que as universidades passariam a ter núcleos para am- pliação do acesso das pessoas com deficiência a todos os espaços, ambientes, materiais e processos, objetivando a acessibilidade universal e o monitoramento da entrada e permanência na escola de pessoas com deficiência. O documento do Ministério da Educação intitulado “Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas – PDE” reafirma a necessidade de superar uma série de falsas oposições entre as diversas modalidades de ensino entre si e no que é de interesse a nosso tema, a oposição entre a educação regular e a especial. Como o documento comenta: Essa visão fragmentada também intensificou a oposição entre educa- ção regular e educação especial. Contrariando a concepção sistêmica da transversalidade da educação especial nos diferentes níveis, etapas e modalidades de ensino, a educação não se estruturou na perspectiva da inclusão e do atendimento às necessidades educacionais especiais, limi- tando o cumprimento do princípio constitucional que prevê a igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola e a continuidade nos níveis mais elevados de ensino. O PDE procura superar essas falsas oposi- ções por meio de uma visão sistêmica da educação. (BRASIL, 2008, p.9) 22 23 O Decreto n˚ 6.094/2007 foi publicado para viabilizar a aplicação do PDE, dispondo sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos Pela Educação, que reúne 28 diretrizes para os sistemas municipais e estaduais que o assinassem, buscando apontar e reunir subsídios, metodologias, instrumentos e compromissos (como metas de desempenho e índices como o IDEB) para o desen- volvimento de políticas públicas para a melhoria da educação. No que diz respeito à educação inclusiva, aponta em seu IX compromisso: ”garantir o acesso e perma- nência das pessoas com necessidades educacionais especiaisnas classes comuns do ensino regular, fortalecendo a inclusão educacional nas escolas públicas”. Em 2008 é entregue ao MEC o documento “Política Nacional de Educação Es- pecial na Perspectiva da Educação Inclusiva”, que traça um balanço da legislação relativa à educação das pessoas com deficiência, assim como um panorama dos dados existentes sobre a questão. Por fim, aponta como seu objetivo auxiliar na ga- rantia do acesso, da participação e da aprendizagem dos estudantes com deficiên- cia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas escolas regulares, orientando os sistemas educacionais sobre como responder às necessidades educacionais. O documento aponta ainda a necessidade de garantir: a transversalidade da educação especial desde a educação infantil até a educação superior; o atendimento educacional especializado; a continuidade da escolarização nos níveis mais elevados do ensino; a formação de professores para o atendimen- to educacional especializado e demais profissionais da educação para a inclusão escolar; a participação da família e da comunidade; a acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobiliários e equipamentos, nos transportes, na comunicação e informação; e a articulação intersetorial na implementação das políticas públicas. O Atendimento Educacional Especializado Ainda em 2008, o Decreto nº 6.571 irá apontar diretrizes para o atendimento educacional especializado no sistema regular de ensino, entretanto, ele será re- vogado na integra à frente pelo Decreto n˚ 7.611, em 2011, que passa a dispor então sobre o tema. Faz-se de interesse, ainda, a criação, em 2008, da “Rede de Educação para a Diversidade (REDE)”, um grupo permanente de instituições públicas de ensino superior dedicado à formação continuada de profissionais de educação, objetivando disseminar e desenvolver metodologias educacionais para a inserção dos temas da diversidade no cotidiano das salas de aula. O programa ofer- taria cursos de formação continuada para professores da rede pública da educação básica em oito áreas da diversidade: relações étnico-raciais, gênero e diversidade, formação de tutores, jovens e adultos, educação do campo, educação integral e integrada, ambiental e diversidade e cidadania. 23 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva A fim de garantir uma educação que tenha compromisso com a história do Brasil e sua diver- sidade, é de importância as leis n˚ 10.639/03 e n˚ 11.465/08 que, respectivamente, tornou obrigatório a inclusão da história e da cultura afro-brasileiras no currículo escolar, assim como incluiu o ensino da história e da cultura indígenas no currículo escolar. É de grande importância ainda o plano apresentado em 2009 pelo governo federal, o “Plano Nacional das Diretrizes Curriculares Nacionais das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana”, que objetivava auxiliar a institucionalização e o apoio à prática curricular presente na lei n˚ 10.639/03. Ex pl or Por fim, cabe ressaltar a importância da Resolução n˚ 4 CNE/CEB de 2009, que institui as diretrizes operacionais para o atendimento educacional especializa- do (AEE) na Educação Básica na modalidade Educação Especial. Essa resolução institui que para ter acesso ao atendimento especializada, os estudantes devem ser matriculados tanto nas classes comuns do ensino regular como no AEE. Esse deve ser ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confes- sionais ou filantrópicas sem fins lucrativos (art. 1˚). Além disso: Art. 5º O AEE é realizado, prioritariamente, na sala de recursos multifun- cionais da própria escola ou em outra escola de ensino regular, no turno inverso da escolarização, não sendo substitutivo às classes comuns, poden- do ser realizado, também, em centro de Atendimento Educacional Espe- cializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, conveniadas com a Secretaria de Educa- ção ou órgão equivalente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios. Sua função seria a de “complementar” ou “suplementar” a formação do aluno por meio de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que eliminem as bar- reiras para plena participação na sociedade e no desenvolvimento da aprendizagem do aluno com deficiência (artigo 2 º). Dessa forma, fica claro que seu papel não é substituir a classe comum, mas auxiliar “complementando” o desenvolvimento do aluno. A elaboração e execução do plano de AEE fica a cargo dos professores que atuam na sala multifuncional ou no centro de AEE, mas em articulação com demais professores do ensino regular, com a participação das famílias e em interface com demais serviços necessários ao atendimento - setor da saúde, da assistência social etc. (artigo 9). Além disso, cabe ao projeto pedagógico da escola institucionalizar a oferta do AEE prevendo a organização de suas necessidades (artigo 10). Por fim, o inciso do artigo 13 atribui ao professor do AEE uma série de responsabilidades: identificar, elaborar, produzir e organizar serviços, recursos pedagógicos, de acessi- bilidade e estratégias considerando as necessidades específicas dos alunos público- -alvo da Educação Especial; elaborar e executar plano de Atendimento Educacional Especializado, avaliando a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos pedagó- gicos e de acessibilidade; organizar o tipo e o número de atendimentos aos alunos na sala de recursos multifuncionais; acompanhar a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos pedagógicos e de acessibilidade na sala de aula comum do ensino 24 25 regular, bem como em outros ambientes da escola; estabelecer parcerias com as áreas intersetoriais na elaboração de estratégias e na disponibilização de recursos de acessibilidade; orientar professores e famílias sobre os recursos pedagógicos e de acessibilidade utilizados pelo aluno; ensinar e usar a tecnologia assistiva de for- ma a ampliar habilidades funcionais dos alunos, promovendo autonomia e partici- pação; estabelecer articulação com os professores da sala de aula comum, visando à disponibilização dos serviços, dos recursos pedagógicos e de acessibilidade e das estratégias que promovem a participação dos alunos nas atividades escolares. Logo, ao longo da primeira década do século XXI, a legislação estabeleceu importantes marcos para o avanço do debate e a implementação da educação inclusiva. Assim, também, foi com a preparação dos professores para esse desafio e as políticas públicas, que viram crescer o respaldo curricular e de material de referência, tanto para a formação dos profissionais como para os apontamentos das políticas para as pessoas com deficiência. Apesar dos avanços, sem dúvida, a educação inclusiva é um desafio que envolve não apenas mudanças nas leis, mas também da cultura, como aponta Barreto: Apesar de todo um direcionamento no sentido da inclusão educacional, é perceptível a cultura ainda predominante, na maioria das escolas, da tentativa de normalização do aluno com necessidades especiais dentro de suas respectivas classes escolares. (...) É esperado que o aluno com neces- sidades educacionais especiais comporte sempre de forma dócil e amável, e, dessa forma, acaba sendo usual a rotina de tentar preparar esse aluno para estar na sala de aula regular, adaptando-se a ela e não o contrário, o que demonstra uma perspectiva ainda de integração e não de inclusão. (BARRETO, 2014, p.21) Dessa forma, continuaremos estudando na próxima unidade não apenas as mu- danças históricas e na legislação, mas também os desafios e possibilidades da edu- cação inclusiva tanto para a sociedade como para os professores e profissionais envolvidos nessa nova forma de pensar e educar o outro, mas também a si mesmo. 25 UNIDADE Aspectos Históricos e Legais da Educação Inclusiva Material ComplementarIndicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Leitura Educação Inclusiva: fundamentos históricos, conceituais e legais CAPELLINI, Vera L. M. F. RODRIGUES, Olga M. P. R. Educação Inclusiva: fundamentos históricos, conceituais e legais. Bauru:UNESP/FC, 2012. v.2. https://goo.gl/DhL0Rx Declaração Universal dos Direitos Humanos https://goo.gl/CquRab Constituição Federal de 1988 https://goo.gl/wUgZP Estatuto da Criança e do Adolescente https://goo.gl/XE9ht Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei n˚ 9.394/96) https://goo.gl/3YQoF Declaração Mundial sobre Educação para Todos e Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem https://goo.gl/367MRd Declaração de Salamanca: sobre princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais https://goo.gl/wohHUD Declaração de Cochabamba: Educação para Todos: cumprindo nossos compromissos coletivos https://goo.gl/WEFj1M Plano Nacional da Educação (Lei n° 010172/01) https://goo.gl/ZD2t6v Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade https://goo.gl/MPxLRG Fundamentação filosófica (Programa Educação Inclusiva: Direito a Diversidade) https://goo.gl/Tzd74b Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos https://goo.gl/A51FKu Cartilha “O acesso de alunos com deficiência às escolas comuns da rede regular” https://goo.gl/twj8Y3 O Plano de Desenvolvimento da Educação: Razões, princípios e programas https://goo.gl/HV5y4u Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva https://goo.gl/wXDwty Resolução n˚ 4 CNE/CEB de 2009 https://goo.gl/957Ee 26 27 Referências ALIAS, Gabriela. Desenvolvimento da aprendizagem na Educação Especial – Princípios, fundamentos e procedimentos na Educação Inclusiva. São Paulo, SP: Cengage, 2016. BARRETO, Maria A. de O. C., BARRETO, Flávia de O. C. Educação Inclusiva: contexto social e histórico, análise das deficiências e uso das tecnologias no proces- so de ensino-aprendizagem. São Paulo: Editora Érica. 2014. CAPELLINI, Vera Lúcia Messias Fialho; RODRIGUES, Olga Maria Piazentin Rolim (organizadoras). Educação Inclusiva: fundamentos históricos, conceituais e legais. Bauru: UNESP/FC, 2012. (Coleção: Práticas educacionais inclusivas). 201 p. il. V. 2. FIGUEIRA, Emílio. Caminhando em Silêncio: uma introdução à trajetória das pessoas com deficiência na história do Brasil. São Paulo: Giz Editorial, 2008. LOURENÇO, Érika. Conceitos e Práticas para refletir sobre a Educação Inclusiva. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010. (Série Cadernos da Diversidade). SILVA. Otto Marques. A Epopeia Ignorada: a pessoa deficiente na história do mundo de ontem e de hoje. São Paulo: Cedas, 1987. SMITH, Deborah Deutsche. Introdução à educação especial: Ensinar em tem- pos de inclusão. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. 27
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