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Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Instituto de Ciências Humanas e Sociais DHRI - Curso de História Disciplina IM 203 - História da América I Prof° Luís Guilherme de Assis Kalil Alunos: Clara Beatriz Rodrigues Antonio Gonçalves Matrícula: 2017265126 Giuliano Matheus Souza Cavalcanti Matrícula: 20190036898 BIBLIOGRAFIA TROUILLOT, Michel-Rolph. Silenciando o passado. Curitiba: Huya, 2016. Cap. 4. pp. 175-225. EIXO CENTRAL De acordo com o capítulo, Michael-Rolph procura abordar o Desembarque de Colombo através de seu próprio olhar, e, para isso, faz uma profunda crítica à como a historiografia adere ao discurso global sobre esse momento histórico. Sem deixar de ressaltar iniciativas imperialistas como motor capaz de redefinir e impulsionar narrativas históricas, o autor define as últimas como exemplos claros de uma história de poder muito bem construída que serve a intencionalidades políticas e comerciais muitas vezes dominantes. E, diante disso, ensina como as datas, as terminologias, os eventos e principalmente as celebrações são elementos que reforçam esse poder junto à coletividade. Além disso, o pesquisador tenta mostrar que o processo histórico se constitui a partir de como as sociedades revisitam as narrativas que possuem de seu passado. A partir disso, declara que a história é confusa, pois essa não é fixa e indissolúvel, mas contada a partir dos olhares que determinados atores sociais direcionam a ela. Como elementos sociais e, por sua vez, também históricos, esses atores respondem às necessidades de sua própria temporalidade, sejam elas sob carências econômicas ou as questões políticas de sua nacionalidade. Desse 1 modo, quanto mais esses atores se distanciam de seus objetos de estudo histórico, mais a história contida neles se torna aberta apreensão de novas gerações ao ressignificá-los através das experiências de seu próprio tempo. OBJETO DE ESTUDO Para reforçar seu estudo, o autor se debruçou sob como a Europa (com uma atenção especial a Espanha, França e Itália) e as Américas (Estados Unidos e América Latina) realizaram e conduziram as celebrações dos Centenários de Desembarque de Colombo nas Bahamas. Entre elas, em maior destaque, pode-se citar a Comemoração do Quarto Centenário em Madri-1892, a Exposição de Chicago-1893 e a Comemoração do Quinto Centenário em Ohio-1992. RECORTE CRONOLÓGICO 12 de Outubro de 1492 à 12 de Outubro de 1992. ORGANIZAÇÃO DO TEXTO Michael-Rolph organiza seu texto em cinco partes específicas: a) Bom dia, Colombo; b) 12 de outubro de 1492; c) Jubileu em construção; d) O Castelhano e o ianque; e) O 12 de outubro revisitado. FICHAMENTO ● Bom dia, Colombo. (pp. 175-178) Parágrafos de 1 à 9. • O autor inicia o capítulo com um relato que aborda, entre diversas temáticas, o apagamento histórico de personagens, regiões onde o eixo geográfico é considerado relevante para o cenário global e contextos que muito se aplicam as conjunturas presentes nas leituras históricas que se desejam reafirmar através das intencionalidades de seus interlocutores dominantes. Em prosa, o autor contesta os silenciamentos históricos promovidos por esses atores, assim como destaca os eurocentrismos impressos nas narrativas históricas vigentes. 2 ● 12 de outubro de 1492. (pp. 178-191) Parágrafos 10. • Indica que há uma grande disparidade entre o alcance do olhar histórico dos atores do processo e aqueles que o observam, principalmente no que diz respeito a sua continuidade e caráter identitário. “A história é confusa para as pessoas que a tem de viver”. (TROUILLOT, 2016. p. 178.) Parágrafo 11 à 13. • Reforça o sentido de suas palavras, desmembrando a narrativa correspondente a Reconquista do Reino de Castela junto ao controle da Cristandade como parágrafos introdutórios, onde a participação católica é simbólica através das indulgências. • Mesmo havendo difusão e “interpenetração cultural” (TROUILLOT, 2016. p. 179) entre cristãos, mulçumanos e judeus, tais ideologias eram duramente combatidas em prol da pureza e preservação da Cristandade. "É certo que a interpretação cultural ocorrida entre os cristãos, muçulmanos e judeus seguia seu curso na península e mesmo a norte dos Pirineus, muito depois de Afonso Henriques ter tomado Lisboa das mãos dos árabes e colocado Portugal sob a tutela da Igreja no início do século XII. Mas a retórica dos papas e a fusão da igreja com o poder estatal nos domínios ibéricos, que remetia a era visigótica, criaram um espaço ideal lógico no qual religiões e culturas que se confundiam na vida cotidiana eram vistas como oficialmente incompatíveis. Dentro desse espaço, a defesa da cristandade, projetada como pura e ameaçada, tornou-se um emblema predominante nas campanhas militares.". (TROUILLOT, 2016. pp. 179-180). • O ímpeto religioso e militar se intensificou com o reinado de Isabel e a vitória na reconquista de Granada. • Religião como “arena pública”. (TROUILLOT, 2016. p.180) • Figuras religiosas como líderes das massas. • Içar das cruzes da Cristandade como marco simbólico de fé e poder político. Parágrafos de 14 à 16 • Usando de um olhar historiográfico, faz uma crítica ao recorte dado ao Desembarque de Colombo sob a América Hispânica. • Segundo o autor, os historiadores detém um olhar muito factual sobre o Desembarque, esquecendo-se de pensá-lo como um processo e facilitando a “narrativização da história”. (TROUILLOT, 2016. p. 182). “Primeiro, a cronologia ocupa lugar do processo. Todos os eventos são situados numa linha única, que conduz ao desembarque. Os anos de Colombo passou em Portugal, o conhecimento acumulado junto aos marinheiros portugueses e norte-africanos e seus esforços 3 junto a diversos monarcas para vender seu projeto são todos incorporados como o exame "antecedentes" ao Descobrimento. Outras ocorrências, como a participação dos irmãos Pizón, são incluídas entre os "preparativos", apesar de, no tempo vivido pelos atores, essa participação ter sido um pressuposto do desembarque, sobrepondo-se a ele e prolongando-se para além dele. Em segundo lugar, na medida em que processos interligados submergem numa continuidade linear, o contexto também se desfaz.". (TROUILLOT, 2016. pp. 182-183). Parágrafos 17 e 18. • Caracterização do “fato” como um produto e narrativa de poder. • O isolamento de um processo histórico rico em contextos e contradições, concentrando-o em uma única narrativa vazia de seus demais sentidos é um produto de poder. • A nomeação desse arranjo como um fato também é um produto de poder por já impugnar uma leitura limitada a um conjunto de intencionalidades ao mesmo. Parágrafos 19 e 20. • Faz uma crítica à composição factual do processo de Conquista Espanhola e ao Desembarque de Colombo. • Exemplifica com auxílio das discussões em torno dos debates que aconteceram durante as celebrações do Quinto Centenário do Desembarque de Colombo nas Bahamas, 1992. • Nesse contexto, aborda a importância dos usos corretos das terminologias científicas, priorizando seus significados. Parágrafos 21 à 23. • Ressalta a observação rigorosa das terminologias como locais de demarcação e disputa política e epistemológica. Pois, estando ligadas ao intelecto, se destacam como campos de poder e construção narrativa. • Poder para decidir o que é trivial. (cláusula de trivialidade). “A cláusula de trivialidade - pois é uma cláusula e não um argumento - proíbe que se descreva o que quer que tenha ocorrido sob o ponto de vista de algumas das pessoas que viram isso ocorrer ou a quem isso ocorreu. É uma forma de poder arquivístico. Com o exercício desse poder, os “fatos” se tornam limpos, purificados.”. (TROUILLOT, 2016. p. 186). Parágrafos 24 e 25. • Cita as celebrações como pontos que reforçam a cláusula de trivialidade porque são auxiliadores no “processo contínuo de mistificação”. (TROUILLOT, 2016. p. 186). • As celebrações são importantes instrumentos para perpetuar no imaginário social e na memória coletiva “os significados públicos associadosaos eventos historiográficos considerados merecedores de uma celebração em massa”. (TROUILLOT, 2016. p. 186). 4 Parágrafo 26. • Quanto maior o número e variedade de pessoas que se juntam a uma celebração, mais a alusão a narrativa direcionada ao “fato” ganha sentido. Dessa forma, o emprego de datas e as cronologias que o comprovam como acontecimento são elementos de reforço. O autor chama esse mecanismo como “jogo dos números”. (TROUILLOT, 2016. p.186). Parágrafos 27 e 30. • Já a ocorrência de uma “data precisa” (TROUILLOT, 2016. p. 188) age de encontro ao “jogo dos números” (TROUILLOT, 2016. p. 186), perpetuando-o junto a memória coletiva enquanto a mesma delimita o “fato”, segregando-o à uma rodada de acontecimentos e/ou um acontecimento específico. • Nesse meio, os ciclos se direcionam a atuar sob caráter anual. “Como marcadores arbitrários do tempo, as datas relacionam uma série de eventos desiguais, todos igualmente descontextualizados e igualmente suscetíveis a mistificação. Quanto mais longa a lista de eventos celebrada na mesma data, tanto mais a lista se parecerá à resposta de um jogo de perguntas e respostas. Mas precisamente por isso que as celebrações trivializam o processo histórico (historicidade 1), ao mesmo tempo que mistificam a história (historicidade 2).”. (TROUILLOT, 2016. p. 189). Parágrafo 31. • Ainda sobre a mistificação, vale a pena ressaltar: "O processo de mistificação não opera, contudo, de modo simétrico, e a lista anterior deixa isso evidente. Pois se - teoricamente - todos os eventos podem ser descontextualizados até o limite do esvaziamento, na prática, nem todos são configurados pelas mesmas operações de poder e nem todos terão o mesmo significado para os novos atores que entraram em cena e que, com afinco, reformulam o passado e dele se apropriam. Em suma, as celebrações são criadas e essa criação é parte integrante do processo de produção histórica. Celebrações esparramam-se para ambos os lados da historicidade. Impõe silêncio aos eventos ignorados e preenchem esse silêncio com narrativas de poder a respeito do evento que celebram.". (TROUILLOT, 2016. pp. 189-190. Parágrafo 32. • A abordagem, a datação e a apropriação de dados históricos é um um ambiente de disputa e de história de poder que requer dois historiadores um olhar mais aprofundado para desde andar os interesses e intencionalidades que esses ambientes carregam dentre as interpretações de cada época. ● Um jubileu em construção. (pp. 191-200) Parágrafos 33 e 34. • O autor alega que a visão de águia "Descobrimento" da América foi uma construção e que demorou-se tempo para que essa construção se tornasse um "evento" (TROUILLOT, 2016. p. 191) e Colombo, um herói. 5 • Ressalta a disparidade entre a realidade nos trópicos e as alegorias idealizadas pelos intelectuais e burocratas espanhóis acerca das Américas, atribuindo-se aos últimos como primeiros admiradores de Colombo. • indica ausência de celebrações públicas da figura de Colombo durante os primeiros séculos de seu feito, por convenções feudais e de Cultura das famílias castelhanas. Parágrafo 35. • O mito de Colombo só pôde aparecer com maior força nas ex-colônias espanholas e nos Estados Unidos. • Esse último devido ao surgimento de um público moderno influenciado pelas luzes pós iluministas. Parágrafo 36. • As colônias da América Latina mantinham simbolicamente a imagem de Colombo com ambivalência até 1880. • Disputavam com a Espanha entre o corpo e o nome de Colombo. Lutas essas prejudicadas por ideologias independentistas e políticas, como a Guerra dos Dez Anos. Parágrafos 37 e 38. "A etnicidade - ou melhor, ideologias de etnicidade - aliaram-se à ambivalência latino-americana em torno de Colombo. Ideologias latino-americanas atribuíam à situação do Novo Mundo um papel ativo na produção de categorias sócio-raciais. Não se tratava apenas de categorias que requeriam novos nomes (criollos, zambos, mestizos) ou novos ingredientes sob nomes arcaicos (mamelucos, morenos, ladinos; as regras segundo as quais as categorias eram produzidas também eram diferentes daquelas válidas na Europa e eram reconhecidas como tais. Os discursos mesclavam-se com essas regras e a reprodução das categorias crioulas atribuía um papel central, implícito ou explícito, às metáforas da "mistura", a despeito da depreciação secular de certas tradições culturais e a despeito de sistemas de estratificação que manipulavam a percepção de fenótipos. Por mais distorcida que fosse, uma mistura realmente havia ocorrido.". (TROUILLOT, 2016. pp. 195-196. "Por mais brutal que tivesse sido, a colonização espanhola não dizimou os americanos pré-colombianos na porção meridional do continente da mesma forma como os anglo-saxões fizeram no Norte ou como os próprios espanhóis fizeram nas ilhas caribenhas, se não outra razão, simplesmente porque as populações aborígenes do México e dois andares eram imensas. As práticas culturais frequentemente combinavam elementos europeus e nativos. Manifestações de uma identidade local específica incluíam certo conteúdo de "indigenidade". (TROUILLOT, 2016. pp. 196. Parágrafo 39. • Os latino-americanos "não privaram as culturas nativas de seus mitos de origem". (TROUILLOT, 2016. p. 197). Portanto também não poderiam ver em Colombo um 6 personagem de suas histórias originais pois "serviam como criollos e mestizos de diferentes estirpes, povos do Novo Mundo.". (TROUILLOT, 2016. p. 197). • Ruptura com os pensamentos do Velho Mundo. Parágrafo 40. • A política de etnicidade nos Estados Unidos aproximou os "americanos" (TROUILLOT, 2016. p.198) da figura de Colombo como um conquistador e de suas heranças europeias com o Velho Mundo. • Povos ameríndios quase completamente dizimados. • Reivindicavam a ancestralidade europeia através da figura de Colombo. Parágrafo 41 e 42. • Celebração do Desembarque de Colombo e da figura de Colombo como um exemplo cívico estadunidense. Parágrafo 43. • Reforça a influência católica, das mídias e das associações estadunidenses em tornar a celebração e a própria simbologia do desembarque de Colombo em um evento de real sentido patriótico durante a década de 1890. • Cita o reforço escolar e a anexação da data nos calendários das escolas até 1890. • Cita também o financiamento espanhol e estadunidense nas celebrações do Quarto Centenário do Desembarque de Colombo. ● O castelhano e o ianque. (pp. 200-219) Parágrafo 44. • Ênfase no gerenciamento do discurso político em países de classe trabalhadora numerosa e amplo direitos eleitorais. • Reforço em "produção planejada de tradições que através em identidades de classe e reforcem o Estado nacional". (TROUILLOT, 2016. p. 200). Parágrafos 45 à 48. • Faz uma retrospectiva sobre o estado econômico e político da Espanha no cenário da Europa e sua queda de prestígio moral, ressaltando a figura de Antonio Cánovas del Castillo como principal responsável pela revitalização da Espanha junto a comunidade internacional. • Arquiteto e historiador, Cánovas remodela não só as cidades espanholas, colocando novas edificações, estátuas e honrarias que homenageiam Colombo e sua 7 "Descoberta", mas reconta o desembarque como um evento de comemoração histórica que reafirmou a grandeza e importância da Espanha, recuperando seu prestígio internacional. • Abrem-se discussões sobre a temática do Quarto Centenário de Descobrimento que se perpetuaram até 1992. • O evento foi carregado de simbologias que se remetiam à grandeza de Colombo e da Espanha. "O enorme envolvimento internacional deveu-se, em grande medida, a cuidadosa imagem que Cánovas imprimiu à celebração ostentatória, mas como um desafio as mentes mais esclarecidas, um simpósio que durou um ano inteiro sobre a política atual e a política do passado, sobre o papel da Espanha no mundo, sobre a civilização ocidental e sobre a relevância da história. Numa sucessão de lances que anteciparam o quinto Centenário em 1992, a junta do quadricentenário promoveu uma série deatividades intelectuais que legitimaram a celebração.". (TROUILLOT, 2016. p. 203. Parágrafo 49. • A junta do quadricentenário por meio de suas atividades e estudos, influenciou o meio acadêmico e impulsionou trabalhos na Europa e nos Estados Unidos. "Essas atividades não apenas influenciaram os acadêmicos que delas participaram, como também definiram a percepção do grande público sobre o que estava em questão. Em primeiro lugar, ao torná-los objeto do discurso acadêmico, fizeram da descoberta e de Colombo algo digno do crescente interesse público. Em segundo lugar, asseguraram a qualquer um disposto a dedicar esse interesse - indivíduos, partidos, Estados - um estatuto aparentemente neutro, que permite a se juntar a celebração mesmo a despeito de conotações e intenções divergentes.". (TROUILLOT, 2016. p. 204). Parágrafo 50. • Por outro lado, o público espanhol via no quadricentenário uma homenagem à glória da Espanha e uma prova simbólica de revitalização. Parágrafo 51. • Para Cánovas, além de revitalização emergente e simbólica, estava o coadjuvantismo e o enaltecimento de sua própria figura política junto a sociedade espanhola. • Contexto de sufrágio universal (masculino) na Espanha. Parágrafo 52. • Unido a isso, outros objetivos estavam incluídos às celebrações: • Recuperação da dignidade da Espanha perante Europa. • Abertura de espaço para novas conquistas no Atlântico e nas Américas. • Reforço os laços comerciais com a América Latina. • Estabelecimento do contato com firmas e agências norte-americanas. 8 Parágrafo 53. Nos Estados Unidos, por seu turno, agentes comerciais também buscavam o contato, mas sob condições que eles próprios pudessem definir. O seu país era o único cujo nome englobava um continente (a África do Sul só surgiria bem mais tarde) e cujo destino imperial trilhava caminhos manifestos. Assim, se para a Espanha o quadricentenário era uma oportunidade para corroborar os esplendores do passado e imaginar glórias futuras, para muitos nos Estados Unidos era a oportunidade de consolidar e celebrar sua situação presente. Concretamente, funcionários estadunidenses prestigiaram as festividades de Cánovas, mas investiram sua energia em seu próprio quadricentenário, a Exposição Colombiana Mundial de Chicago. (TROUILLOT, 2016. p. 206). Parágrafos 54 à 56. • Os Estados Unidos tinham o intuito de tornar Colombo um herói norte-americano e assim o fizeram. Em suas celebrações de 1893 na Exposição de Chicago, o intuito principal era lucrar com a comemoração, tornando sólida a imagem norte-americana de gigante comercial frente à Europa e à América Latina. • O interesse era fixar e vender a imagem de Colombo como um ianque explorador e bem sucedido, um modelo a ser seguido para as ambições expansionistas norte-americanas. Parágrafo 57. O autor declara que é feito um apagamento e uma nova narração da história contada sobre novos termos no século XIX, termos dos até então dominadores deste século. É certo que a metamorfose de Colombo num herói ianque, no cavaleiro solitário dos mares ocidentais, parecia um tanto banal fora de Chicago. Mesmo assim, vista do extremo Sul, a exposição fazia parte de uma série de processos políticos e econômicos, dos quais extrairia seu simbolismo. A estória de Colombo escrita em Chicago sobrepunha-se à narrativa da conquista em curso que o poder estadunidense estava escrevendo nas terras do hemisfério. O que se dizia ter ocorrido em 1492 legitimava o que estava efetivamente ocorrendo no final do século XIX. (TROUILLOT, 2016. p. 208). • Primeiro Encontro dos Estados Americanos. • Medidas expansionistas foram tomadas por chefes de Estado estadunidenses para tomar posse de territórios em diferentes países da América Latina. Parágrafo 58. • Além disso, os Estados Unidos tinham uma estratégia de bloqueio das "incursões europeias" (TROUILLOT, 2016. p. 209) no hemisfério sul, na tentativa de refrear os ganhos de seus concorrentes europeus. 1888-1889. • Projeção de uma nova interpretação da cultura histórica do hemisfério Sul para os europeus e suas representações sobre a figura de Colombo. Parágrafo 59. 9 A imposição dessa nova interpretação demandava a produção de uma série de silêncios. Considerando que alguns traços não podiam ser inteiramente rasurados, sua importância histórica tinha de ser redimensionada. Eles se tornavam irrelevantes ou relevantes apenas à luz da nova interpretação. Assim, o guia oficial da exposição considerava irrelevantes os primeiros 280 anos da história euro-americana: a história deste hemisfério antes de 1776 era apenas o "período preparatório" para a emergência dos Estados Unidos. O significado do descobrimento podia ser medido pelo número de toneladas de trigo que os Estados Unidos produziam então ou pela extensão de suas estradas de ferro. Afastando Europa e a América Latina com uma só tacada, o guia insistia: "Nada mais apropriado, portanto, que o povo da maior nação do continente descoberto por Cristóvão Colombo seja quem conduza a celebração do Quadrigentésimo Jubileu desse evento". (TROUILLOT, 2016. p. 210). Parágrafo 60. • Até os estadunidenses precisarão ser educados para projetar a imagem de Colombo. • A nova imagem de Colombo ajudou a legitimar a narrativa dos imigrantes vindos da Europa como parte dos Estados Unidos, como proprietários irlandeses e italianos, o que coincide na alta de números de imigrantes europeus nos Estados Unidos durante o período. Parágrafo 61. • Ainda assim, havia "ideias que sugeriam a inferioridade biológica dos imigrantes "meridionais" e a ameaça que eles representavam para a "raça futura" dos Estados Unidos". (TROUILLOT, 2016. p. 211). • O autor discorre sobre a questão racial de supremacia branca, apontando que essas ideias ganharam bastante força no ano de 1890 e voltaram a ser intensificar no século XX, com um novo público alvo (mexicanos e caribenhos), uma vez que os imigrantes irlandeses e italianos já haviam se embranquecido através das gerações. (eugenia). Parágrafo 62. Não obstante a vaidade dos que escreveram o roteiro da exposição de Chicago, eles não podiam controlar todas as leituras possíveis de seu roteiro. Seu triunfo era devido, em parte, a uma descontextualização de Colombo ainda mais radical do que a que tinha feito seus predecessores. Uma vez isso feito, porém, Colombo não lhe pertencia em exclusividade. Celebrações bem-sucedidas descontextualizadas vão com sucesso seus efeitos que celebravam, mas, ao fazê-lo, abriam as portas para leituras divergentes desses mesmos eventos. Quanto mais elaborado ritual, tanto mais provável que os festejos subsequentes alterações em outras partes do roteiro ou impusessem novas interpretações. (TROUILLOT, 2016. p. 211-212). Parágrafos 63 à 65. • Apropriação de Colombo como um fenômeno nacional para a cultura estadunidense em 1890 foi uma construção. • Naturalização da figura de Colombo como fator racial. Parágrafo 66. 10 • Explica o processo de engajamento das celebrações do Dia de Colombo nas comunidades imigrantes italianos e irlandeses e sua correlação com a aceitação do 12 de Outubro como feriado oficial. • Ganhos na disputa por legitimidade racial e histórica. Parágrafos 67 e 68. • Na América Latina a apropriação de Colombo aconteceu de maneira a mesclar as apropriações feitas por norte-americanos e espanhóis, e, somado a isso, potencializar o 12 de outubro como "El dia da Raza" (TROUILLOT, 2016. p. 216), dia do povo, ampliando o alcance da celebração para os adeptos de ambas as culturas. • Colombo não era o herói vaqueiro norte-americano e, tampouco, era a imagem renascentista pregada pelos espanhóis, mas uma mistura de ambas as simbologias com a caracterização de elementos latino-americanos. • Usam o discurso de mistura espanhol e desmembram a apropriação feita pelos estadunidenses do termo "americano" para dar reforço a essa conjunção. ● O 12 de outubro revisitado. (pp. 219-225) Parágrafo 69. • Aborda as narrativas sobre Colombo junto ao 5º Centenário do desembarquenas Bahamas. • O autor inicia o discurso ressaltando o quanto o caráter das apropriações da figura de Colombo os distanciaram do Colombo verdadeiro. Parágrafo 70. • Ressalta as melhorias e inovações do quinto Centenário, sem deixar de indicar o valor da história pública do período mais recente como um sinônimo inestimável de história de poder. Parágrafos 71 à 73. • Tanto Espanha, França e Estados Unidos, quanto a América Latina tinham a pretensão de transformar o quinto Centenário em um espetáculo, com auxílio das novas tecnologias, investimentos e apoio intelectual, um novo fenômeno global. • Cada um intensificou mais seus heróis e referências do passado e produziu novos instrumentos que intermediacem aí massas as suas projeções de Colombo com filmes, livros, adaptações, etc. • O autor salienta que até certo ponto foram bem-sucedidos, mas no que diz respeito à produção histórica, fracassaram. 11 As transformações na natureza do público, nós laços que unem as coletividades e na velocidade e intensidade das comunicações eletrônicas produziram resultados contraditórios. Ao mesmo tempo em que as massas são um alvo de fácil alcance em todos os lugares, as réplicas produzidas por minorias dissidentes também alcançam uma audiência mais ampla. Ao mesmo tempo em que o público é hoje em dia cada vez mais internacional, é também cada vez mais fragmentado. (TROUILLOT, 2016. pp. 220-221). Parágrafo 74-75. • Por um lado, essa fragmentação de narrativas detonou parte das intenções das indústrias, que tiveram de recuar proporcionalmente. Por outro, abriu espaço amplo para discussões em torno das problemáticas sobre a definição do desembarque de Colombo como Conquista. Parágrafo 76. • Para os organizadores do quinto Centenário de 1992, esse debate não era tão relevante. A narrativa do descobrimento da América por Colombo já era um elemento fixo e consolidado cultural e historicamente de maneira global. • Porém, para os ativistas e estudiosos do período, assim como para os grupos étnicos afetados por essa construção, muito havia o que se debater. Parágrafo 77. Tratava-se, como vimos, tanto em Madri como em Chicago, de uma celebração do presente. Mas tanto Madrid como Chicago podiam efetivamente falar do presente enlatando um passado que parecia fixo e ordenado: em 12 de outubro de 1492, Cristóvão Colombo descobriu o Novo Mundo. [...] A maior parte dos ativistas e observadores-e uma boa parte dos organizadores concordavam que a importância daquele dia surgiu daquilo que aconteceu depois dele. (TROUILLOT, 2016. p. 222). Parágrafo 78. Entre nós e Colombo estão milhões de homens e mulheres que o sucederam na travessia, voluntária e forçada, do Atlântico e outros milhões que testemunharam essas travessias de um lado ou de outro do Oceano. Eles ofereceram, por sua vez, suas próprias visões sobre o que ocorreu e seus descendentes continuam a alterar o roteiro, com palavras e atos. Narrativas que atravessam eras e continentes rearranjam continuamente o desembarque nas Bahamas no presente de sua própria posteridade. Assim, se o desembarque de Colombo tornou possível a história mundial como a conhecemos, a história pós-colombiana continua a definir os próprios termos em que se descreve o desembarque. A história pós-colombiana acumulada até o fim do século XIX tornou possível a narrativa de Chicago, mas a história dos nossos tempos torna impossível repetir Chicago. Tanto o que ocorreu quanto o que se diz ter ocorrido misturam indissoluvelmente os dois lados da historicidade. (TROUILLOT, 2016. pp. 222-223). Parágrafo 79. Se a auto-identificação pode indicar uma disposição para entrar na história como sujeitos, o leque de possibilidades concretas de escolha de nomes e subjetividades não é ilimitado. A identidade coletiva em nome da qual, do Arizona à Amazônia, os americanos nativos desafiaram o quinto Centenário é ela mesma resultado de um tardio desenvolvimento pós-colombiano. (TROUILLOT, 2016. p. 223). Parágrafo 80. 12 Mas também é assim como a identidade coletiva dos euro-americanos que reivindicaram Colombo como um ancestral. E, dessa forma e sobre este aspecto, foi a consciência nacional que deu as cores do quinto Centenário na Espanha e na Itália. A incapacidade de sair da história para escrevê-la ou rescrevê-la aplica-se a todos os atores e narradores. O fato de que algumas ambiguidades sejam mais evidentes no Arizona e em Belém do que em Chicago, Madri ou Paris tem muito mais a ver com o controle desigual dos meios de produção histórica do que com a objetividade inerente de um grupo específico de narradores. Isso não quer dizer que a história jamais é honesta, mas indica que ela sempre é confusa, precisamente por conta de suas misturas constitutivas. (TROUILLOT, 2016. pp. 223-224). 13