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DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR Profª. Cláudia de Fátima Ribeiro Basso Profª. Laura Cristina Peixoto Chaves Profª. Marcia Regina Selpa de Andrade Centro de Formação Profissional SAPIENCE Ltda. Dirigente Prof. Ms. Kiliano Gesser Equipe Administrativa Prof. Carlos Alberto Alves de Oliveira Prof. Dr. Carlo Enrico Bressiani Prof. Ms. Kiliano Gesser Coordenação Pedagógica Profª Olga Sansão Gesser Diagramação Alexandre Adaime 2009 U n i v e r s i d a d e R e g i o n a l d e B l u m e n a u Reitor Prof. Dr. Eduardo Deschamps Vice-Reitor Prof. Dr. Romero Fenili Pró-Reitora de Ensino de Graduação Profa. Ms. Sônia Regina de Andrade Pró-Reitor de Administração Prof. Dr. Edesio Luiz Simionatto Pró-Reitor de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão Prof. Dr. Clodoaldo Machado Divisão de Modalidades de Ensino Coordenação Geral Prof. Ms. Alexander Roberto Valdameri Equipe Multidisciplinar Técnica Airton Zancanaro Alexandre Adaime Gerson Luís de Souza Léo Jonathan Fath Equipe Multidisciplinar Pedagógica Profa. Dra. Daniela Karine Ramos Diego Fernando Negherbon Profa. Ms. Henriette Damm Profa. Ms. Ida Luciana Martins Noriler Profa. Lindamir Aparecida Rosa Junge Profa. Ms. Terezinha Vicenti Administrativo Odair José Albino Viviane Alexandra Machado Saragoça FURB – Universidade Regional de Blumenau Divisão de Modalidades de Ensino Rua Antônio da Veiga, 140 Bairro: Victor Konder Blumenau – SC - 89012-900 Fone: (47) 3321-0577 E-mail: dme@furb.br Site: www.furb.br/ead SAPIENCE Educacional Rua Belarmino João da Silva, 52 Bairro: Santa Terezinha Gaspar – SC – 89110-000 Fone: (47) 3330-5100 E-mail: secretaria@centrosapience.com.br Site: www.centrosapience.com.br Depósito legal na Biblioteca Nacional, conforme decreto nº 1825, de 20 de dezembro de 1907. “Impresso no Brasil / Printed in Brazil” Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da FURB Basso, Cláudia de Fátima Ribeiro B322d Docência na educação superior / Cláudia de Fátima Ribeiro Basso, Laura Cristina Peixoto Chaves e Márcia Regina Selpa de Andrade. - Blumenau : Edifurb ; Gaspar : SAPIENCE Educacional, 2009. 109 p. : il. – (Pós-Graduação. Modalidade a distância) Bibliografia: p. 105-109. ISBN: 973-85-7114-251-0 1. Professores universitários – Formação. 2. Ensino superior. I. Chaves, Laura Cristina Peixoto. II. Andrade, Márcia Regina Selpa de. II. Título. CDD 378.124 Professora Cláudia de Fátima Ribeiro Basso Natural de Brasília/DF. É Mestre em Educação pela UnB. Graduada em Pedagogia, especialista em Metodologia de Ensino. Atua como professora nas Faculdades Integradas Urubupungá/ SP, coordenadora de cursos de pós-graduação no Instituto de Educação Superior Unyahna de Barreiras/BA. Consultora educacional de escolas e prefeituras no Estado de São Paulo e Distrito Federal. Professora Laura Cristina Peixoto Chaves Natural de Cachoeira do Sul/RS. Mestre em Educação pela UnB. Graduada em Educação Física e Pedagogia. Especialista em Psicopedagogia, Supervisão Escolar e Educação Física Escolar. Assessora Pedagógica do Centro Sapience Educacional e consultora educacional. Atua na formação de professores da educação básica. Professora Marcia Regina Selpa de Andrade Professora e Assessora Pedagógica da Universidade Regional de Blumenau. É graduada em Pedagogia pela UNIPLAC, de Lages/SC (1988). Cursou duas especializações: a primeira em 1992, na Área da Educação, “Dificuldades de Aprendizagem”, pela Universidade do Planalto Catarinense, e a segunda, em 2006, focada na Área de Educação e Saúde, em São Paulo, pela FioCruz, com a denominação “Curso de Ativação de Processos de Mudanças na Formação Superior de Profissionais de Saúde”. Em 2002, concluiu o Mestrado em Educação, realizado pela Universidade Regional de Blumenau. Atualmente é doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Estadual de Campinas-Unicamp/SP, na área de currículo SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ....................................................................................................................9 1 EDUCAÇÃO SUPERIOR: HISTÓRIA, FUNÇÃO SOCIAL, ORGANIZAÇÃO E REGULAÇÃO ...................................................................................... 11 1.1 HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL ..................................................12 1.2 FUNÇÃO SOCIAL DA EDUCAÇÃO SUPERIOR .............................................................32 1.3 ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA ..........................................41 1.3.1 Organização Administrativa ...........................................................................................41 1.3.2 Organização Acadêmica................................................................................................42 1.3.3 Organização quanto à formação ...................................................................................45 1.4 REGULAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR ..........................................................................48 1.4.1 A Educação Superior na Legislação Brasileira ..............................................................48 1.4.2 Documentos que dão legitimidade à Instituição de Educação Superior .......................51 1.4.3 SINAES .........................................................................................................................53 2 OS ATORES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ........................................................................57 2.1 A IDENTIDADE E PROFISSIONALIZAÇÃO DO PROFESSOR .....................................58 2.1.1 Profissão, Professor, Docência: os acordos semânticos...............................................58 2.1.2 A Trajetória Histórica do Professor de Ensino Superior.................................................59 2.1.2.1 Modelo Jesuítico.........................................................................................................59 2.1.2.2 Modelos Francês e Alemão ........................................................................................60 2.1.2.3 Período da Ditadura Militar .........................................................................................60 2.1.2.4 Contexto Atual ............................................................................................................60 2.2 SABERES DA DOCÊNCIA ...............................................................................................61 2.3 ALUNO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ..............................................................................64 2.3.1 Andragogia ....................................................................................................................64 2.3.2 As Características do Aluno Adulto................................................................................66 2.3.3 Preceitos para a Prática Docente ..................................................................................67 3 A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR .........73 3.1 PLANEJAMENTO EDUCACIONAL ..................................................................................74 3.1.1 Elementos do Plano da Disciplina .................................................................................78 3.1.1.1 Ementa .......................................................................................................................80 3.1.1.2 Unidades ....................................................................................................................80 3.1.1.3 Objetivos.....................................................................................................................81 3.1.1.4 Procedimentos de Ensino...........................................................................................87 3.1.1.5 Avaliação ....................................................................................................................893.1.1.6 Referências ..............................................................................................................101 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................105 APRESENTAÇÃO Caro(a) aluno(a), Bem-vindo(a) à disciplina Docência na Educação Superior. Este é o nosso Caderno de Estudos, material elaborado com o objetivo de contribuir para a realização de seus estudos e para a ampliação de seus conhecimentos sobre Docência na Educação Superior. Cabe a você administrar sua aprendizagem e determinar o tempo para seus estudos e aprofundamento dos temas tratados. Lembre-se, porém, de que há um prazo limite para a conclusão dos estudos. Você deverá realizar as avaliações presenciais nas datas previstas no cronograma do curso. Os capítulos foram organizados de forma didática e complementar. Eles apresentam os textos básicos, com questões para reflexão e indicam outras referências a serem consultadas. Desejamos a você um bom trabalho e que aproveite ao máximo o estudo dos temas abordados nesta disciplina! 11 11 EDUCAÇÃO SUPERIOR: HISTÓRIA, FUNÇÃO SOCIAL, ORGANIZAÇÃO E REGULAÇÃO Objetivos de Aprendizagem 1. Caracterizar a educação superior no Brasil ao longo do seu processo histórico, bem como suas implicações no processo educativo do país e seus reflexos nas propostas das instituições atuais; 2. Situar o ensino superior no contexto educacional brasileiro e identificar sua função social; 3. Identificar as bases legais que fundamentam a educação superior no Brasil. INTRODUÇÃO Houve um tempo em que a educação superior no Brasil e no mundo era privilégio de um número bastante reduzido de pessoas da elite, que se diplomavam para exercer as profissões tradicionais – direito, medicina, engenharia – e também para as carreiras militares e religiosas. Há algumas décadas, porém, essa situação vem se modificando sensivelmente. Em razão das intensas mudanças sociais, culturais, políticas e econômicas da sociedade moderna, a educação superior se expandiu e o número instituições de ensino superior tem se multiplicado significativamente. Segundo dados do último Censo da Educação Superior, realizado em 2006 pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), de 1997 a 2006 o índice de matrículas no ensino superior brasileiro aumentou 140%. O número de instituições acompanhou esse crescimento explosivo e registrou aumento de 152% nesse mesmo período. Apesar de os índices serem bastante animadores, refletindo um setor amplo e com forte potencial de crescimento, não podemos nos iludir com essa vertiginosa expansão, pois eles ainda não são suficientes para atender à demanda do País. O número de estudantes matriculados ainda está muito aquém do necessário e, embora mais democrática, a educação superior no nosso país ainda não conseguiu atingir, de maneira significativa, as classes sociais menos privilegiadas. 12 13 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Mas você sabe quando e como surgiram as universidades? Qual a origem da expressão Universidade? A instituição que hoje é chamada de Universidade surgiu na Idade Média. Eram associações de estudantes e professores que obtinham seu reconhecimento formal através de bulas papais (documento selado com o timbre do papa) ou cartas concedidas por imperadores e reis. E sabe qual foi a primeira universidade do mundo? A primeira universidade de que se tem notícia surgiu na Bolonha, norte da Itália, no final do século XI. Embora os registros históricos sejam imprecisos, a data mais aceita é 1088, quando o ensino na cidade se tornou livre e independente das escolas religiosas. Naquela época, o conhecimento era privilégio de poucos e apenas quem podia pagar se associava a outros interessados para contratar um professor sobre alguns dos temas das chamadas “essências universais”. Daí o nome de “universidade” (FARIA, 2008). A segunda foi a Universidade de Paris (Sourbonne), fundada em 1214. Esses dois estabelecimentos deram origem a vários outros na Europa. Embora fossem desvinculadas da Igreja, elas dependiam do aval do clero ou do governo para funcionar. A estrutura curricular era semelhante a das chamadas artes liberais, que se iniciou na Academia de Platão e atravessou a civilização romana: o trivium (estudos dedicados à linguagem: gramática, lógica e retórica) e o quadrivium (aritmética, geometria, astronomia e música). Antes disso, as únicas instituições comparáveis às universidades eram os mosteiros que se dedicavam ao estudo da teologia, filosofia, literatura e eventos naturais sob o ponto de vista da religião, mas que, por muito tempo, foram os responsáveis pela preservação da cultura e dos conhecimentos da época. (FARIA, 2008, s/p). Mas e no Brasil? Você sabe como começou essa história no nosso país? Esse é o nosso próximo assunto: A longa espera... Conforme já destacamos, nossa experiência no campo da educação superior é bem recente quando comparada com a européia, a norte-americana e Uma coisa podemos afirmar com segurança: num mundo cada vez mais competitivo, no qual a elevação do nível de escolaridade da população é um dos fatores decisivos para o desenvolvimento socioeconômico do país, a educação superior no Brasil ainda tem muito caminho pela frente. Além dessa significativa propagação, na medida em que a educação superior expandiu-se também se diversificou, tanto em relação aos estudantes (hoje provenientes das diferentes classes sociais), quanto à organização administrativa (públicas, privadas com ou sem fins lucrativos, comunitárias, confessionais e filantrópicas) e organização acadêmica (instituições universitárias e não-universitárias). Além disso, os cursos tradicionais se mantiveram, mas novos cursos foram criados, assim como novos modelos de oferta (presencial, a distância, concentrados...). Apesar do reconhecimento de que todas estas transformações geraram significativos avanços na educação superior ao longo do tempo, há um discurso geral sobre a ineficiência desse nível de ensino, mais especialmente em relação à função que esse segmento deve desempenhar na atualidade. Você certamente já deve ter ouvido diversas vezes que a nossa educação superior está em crise, que não atende aos seus propósitos, que é elitizada e beneficia poucos, que é um ensino precário e de baixa qualidade, que não forma um cidadão capacitado para atuar no seu tempo, etc. Essas questões têm chamado à atenção de estudiosos não só na área da Educação, mas também de outros segmentos da sociedade, pois atualmente há um notável reconhecimento mundial sobre importância de uma educação superior de qualidade para o crescimento do país. Nesse sentido, um dos caminhos viáveis para melhor compreensão e encaminhamento dessas questões é a análise histórica: é fundamental conhecer o contexto histórico no qual a educação superior se desenvolveu, para se pensar em medidas adequadas aos problemas que o ensino superior enfrenta na atualidade. Esse é o propósito essencial deste capítulo. Vamos percorrer os caminhos da educação superior ao longo da história, discutir sua função social e interpretar a legislação que a torna legítima, assim como suas lutas e transformações no transcorrer dos tempos. Desejamos que seus estudos sejam bastante proveitosos e o ajudem a compreender melhor as barreiras e desafios que foram e ainda estão sendo vencidos por esse importante segmento do ensino. 1.1 HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL 800 anos que separam duas histórias... A história da educação superior no Brasil é recente, se comparada à história do ocidente. Nossas instituições de ensino superior possuem apenas duzentos anos, enquanto as instituições universitárias mais antigas já se aproximam de seu primeiro milênio. 14 15 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES mesmo com a latino-americana. Ao contrário das Américas Espanhola e Inglesa, que tiveram acesso à educação superior ainda do século XVI, o Brasil teve que esperar até o final do século XIX para ver surgirem as primeiras instituições culturais e científicas desse nível. Era uma vez... a história começa mais ou menos assim: Durante três séculos, as poucas iniciativas na área da educação no nosso país vieram dos jesuítas e eram mais voltadas para a doutrinação religiosa. Em princípio, com o propósito de formar novos padres, criaram as escolas de ordenação e, como ação secundária, ofereceram formação aos filhos dos colonos e aos mestiços. Já os altos funcionários da Igreja e da Coroa e os filhos dos grandes latifundiários tinham que ir à Europa para obter formação universitária. Eis que, passados três séculos, a família real chega ao Brasil e, com ela, as Escolas Régias Superiores. Contam que... Somente em 1808, quando a família real estabeleceu-se no Brasil, é que surgiram as primeiras escolas superiores brasileiras. A criação dessas escolas nasceu da necessidade de se instituir uma infraestrutura adequada para o funcionamento do império. O objetivo, portanto, era formar profissionais para exercer os serviços públicos voltados à administração do país. Assim, foram criadas as primeiras instituições de cursos superiores, chamadas Escolas Régias Superiores. As primeiras Escolas Régias Superiores foram inspiradas nas universidades francesas. O modelo, [...] foi o padrão francês de universidade napoleônica, não transplantado na totalidade, mas nas suas características de escola autárquica com uma supervalorização das ciências exatas e tecnológicas e a consequente desvalorização da filosofia, da teologia e das ciências humanas; com a departamentalização estanque dos cursos voltados para a profissionalização (MASETTO, 1998, p.10). A organização curricular era composta por: [...] currículos seriados, programas fechados que constavam unicamente das disciplinas que interessavam imediata e diretamente ao exercício daquela profissão e procuravam formar profissionais competentes em uma determinada área ou especialidade (IDEM, p.10). Como você pode observar, os cursos eram destinados diretamente à formação de profissionais que exerceriam uma determinada profissão. O ensino superior brasileiro também foi influenciado pelo modelo alemão, criado no final do século XIX. O modelo foi criado quando surgiu na Alemanha um processo de edificação nacional. A Alemanha perdia o pioneirismo da Revolução Industrial, já iniciada na França e Inglaterra. O propósito do modelo era impulsionar o avanço da ciência por meio da pesquisa das questões nacionais. Era um esforço para eliminar a dependência e estruturar a autonomia nacional (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002). Demorou, mas finalmente foi criada nossa primeira instituição de educação superior. Que instituição é essa? No Brasil, a primeira instituição de educação superior foi a Escola de Medicina da Bahia, criada em 1808. Nesse mesmo ano foram criadas a Escola de Medicina do Rio de Janeiro e a Escola de Engenharia e Arte Militar, também no Rio de Janeiro. Depois vieram as faculdades de Direito de São Paulo e Olinda, em 1827. Mas a primeira universidade, com cursos em várias áreas, só surgiu um século depois. Mas essa é outra história, que veremos mais adiante. Saiba Mais O professor Luiz Antônio Cunha (1980), na obra A universidade temporã, faz uma alusão bem-humorada aos que lamentam o surgimento tardio desse grau de ensino no Brasil. Em sua visão, o ensino superior brasileiro no período colonial, inspirado na estrutura da Universidade de Coimbra (Portugal), foi muito bem organizado dentro dos moldes da época. Apesar de não ter o reconhecimento para diplomação dos seus estudantes pelo Estado português, o tinha do papa, pois fazia parte de uma estrutura educacional organizada em escala mundial pelas escolas jesuíticas espalhadas, padronizadas e sistematizadas na ratio studiorum - um plano de ensino que previa um currículo dividido em dois graus: o studia inferiora (que corresponde à atual educação básica), e o studia superiora (correspondente aos atuais estudos superiores). Em 1759 os jesuítas foram expulsos do Brasil, causando a desarticulação do sistema educacional da Colônia e, no seu lugar, foram criadas, tardiamente no Brasil, as aulas régias, baseadas no enciclopedismo. Segundo o autor, o fechamento dos colégios dos jesuítas correspondeu à abertura de aulas de matérias isoladas. Quer saber mais? Acesse o site http://www.luizantonio.cunha.nom.br e conheça também outras obras do autor. Vamos continuar nosso percurso histórico, pois conforme ensina a sabedoria popular, conhecer o passado nos ajuda a entender o presente e preparar o futuro. Então, em frente! A história andou devagar, devagarzinho... Retomando o curso da nossa história, constatamos que até a Proclamação da República, em 1889, a educação superior desenvolveu-se 16 17 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES lentamente. Manteve-se limitada à formação dos profissionais liberais em instituições públicas isoladas (não-universitárias) e destinava-se aos filhos da aristocracia colonial, que não podiam mais estudar na Europa devido ao bloqueio de Napoleão. Com a Proclamação da República, foi liberada a existência de estabelecimentos particulares, que foram chamados de Faculdades Livres. Esse período deu início à história da educação superior privada no Brasil. Moral da história... Até aqui a educação superior no Brasil se consolidou como um modelo de instituição isolada, profissionalizante e elitista. Isso explica algumas das distorções que até hoje embasam nosso sistema educacional. Ah, verifica-se também que a nossa história andou na rota contrária... Outro fato que podemos afirmar é que a educação superior brasileira foi implantada na rota contrária de todos os demais países, pois primeiro criaram- se as universidades e a partir delas as faculdades. No Brasil, a história foi diferente: primeiramente foram constituídas as faculdades isoladas para, bem depois, constituírem-se as universidades. Chegamos à polêmica (talvez bizarra) história da primeira universidade criada no Brasil... o que nos aguarda? Estamos na década de 20... Contrariando o dito popular, dessa vez não é para inglês ver, mas para belga! Existe uma clássica disputa histórica sobre essa questão, mas oficialmente a primeira universidade brasileira foi a Universidade do Rio de Janeiro (URJ), criada em 1920. Entretanto, segundo o professor da UNICAMP, Clayton Levy (2006), a URJ foi criada apenas “para belga ver”. Saiba Mais Em 1920, por ocasião das comemorações do Centenário da Independência, o Brasil recebeu a visita do rei o Rei da Bélgica, Rei Alberto I. Como Sua Alteza era uma pessoa de rara cultura, o governo brasileiro decidiu lhe conceder o título de Doutor Honoris Causa. Acontece, porém, que o título não podia ser outorgado por faculdades isoladas, somente por uma Universidade. Para resolver o problema, então, o presidente brasileiro reuniu os cursos superiores da cidade (a Escola Politécnica, a Faculdade de Medicina e a Faculdade de Direito) e criou Universidade do Rio de Janeiro (LEVY, 2006). Embora um tanto atípico ou até mesmo curioso, precisamos concordar: Não fosse por aquela visita e a ingênua vaidade de um monarca ou o capricho de algum de seus cortesãos, a universidade brasileira talvez tivesse demorado mais 10 ou 20 anos para ser criada. Cem anos depois da Independência e trinta e três anos depois da Proclamação da República, o Brasil ainda não possuía uma universidade. E ela só foi criada para atender às conveniências de um rei europeu. (BUARQUE, 2003, p.21). Esse, segundo o autor, é um pecado original do qual ainda não nos livramos.A primeira universidade de fato! Estamos em 1934... Somente em 1934, ou seja, 14 anos depois, o país ganhou de fato sua primeira universidade, criada e organizada de acordo com as normas do Estatuto das Universidades Brasileiras: a Universidade de São Paulo (USP). 18 19 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Saiba Mais A primeira grande universidade brasileira nasceu em 1934, não mais pela vontade de um rei belga, aliado ao servilismo de políticos brasileiros. A Universidade de São Paulo resultou da vontade de intelectuais brasileiros aliados a intelectuais franceses. O Brasil passou a olhar para dentro, e não mais para fora. Os políticos servis foram substituídos por intelectuais acadêmicos, embora a forte dependência do exterior tenha continuado. Embora não mais servis, eles eram, ainda, fortemente influenciados pelo exterior. Texto extraído do trabalho apresentado por Cristovam Buarque Conferência Mundial de Educação Superior + 5, UNESCO realizada em Paris, 23-25 de junho de 2003. Disponível em http://unesdoc. unesco.org/images/0013/001363/136394por.pdf As décadas de 40 a 60 foram marcadas pela criação de outras instituições de educação superior... Mais e mais universidades... Nas décadas seguintes, diversas outras instituições de educação superior foram criadas no país. Surgiram universidades federais em todo o Brasil (pelo menos uma em cada estado), além de universidades estaduais, municipais e particulares. Chegamos à década de 60 e daí? Chegamos ao período das manifestações estudantis e de muito mais... Na década de 60 o Brasil sofreu profundas mudanças no seu contexto social, político e econômico. Em 1964 a nação viveu o golpe militar e um novo regime de governo foi instalado: o regime totalitário. Nesse período surgiu a necessidade de se formar mão de obra qualificada para atender à industrialização, fazendo com que a formação acadêmica se tornasse cada vez mais necessária. Essa época foi marcada por um forte clima ideológico, e as universidades, que eram vistas como espaços privilegiados de conscientização, tornaram-se um importante cenário de mobilização social. Descontentes com o governo militar, milhares de estudantes saíram às ruas protestando contra a ditadura e lutando por uma educação superior crítica, democrática e a serviço dos interesses majoritários da população. As manifestações estudantis, no entanto, foram violentamente reprimidas pelo então governo, através de sua polícia, provocando mortes, prisões e desaparecimentos. As universidades foram invadidas e as entidades estudantis foram fechadas. Os ativistas foram perseguidos, professores foram afastados de seus cargos, cientistas e pesquisadores foram exilados. Foi implantada a censura e o meio acadêmico passou a ser rigorosamente vigiado. Saiba Mais Se você quer saber mais sobre esse período, acesse o site do Jornal da UFRJ: http://www.ufrj.br/docs/jornal/2008-dezembro_JornalUFRJ40. pdf. Nele você vai encontrar uma série de reportagens que relembram alguns episódios marcantes dessa época sombria da nossa história. Saiba Mais “História da Universidade Regional de Blumenau - FURB As solicitações para a implantação de unidades de Ensino Superior na região do Vale do Itajaí surgiram, em Blumenau, através de movimentos de opinião pública a partir de 1953, como objetivo de contribuir para o desenvolvimento da região e romper com a monopolização do ensino superior exercido pela Capital do Estado. Durante dez anos, os debates e as reivindicações objetivaram sensibilizar os poderes públicos Estadual e Federal, com vistas à interiorização do ensino superior em Santa Catarina. Esse processo de conscientização por um Ensino Superior no Vale do Itajaí despertou o movimento comunitário que decidiu criar, em Blumenau, a primeira unidade de Ensino Superior do interior do Estado de Santa Catarina, a Faculdade de Ciências Econômicas de Blumenau. Assim, sobretudo, como fruto de um movimento comunitário, promulgou- se, em 05 de março de 1964, a Lei Municipal Nº 1233, a qual criou a Faculdade de Ciências Econômicas de Blumenau, consagrando uma Aspiração Cultural encenada aos 02 de maio do mesmo ano, com a aula inaugural da primeira Faculdade do interior do Estado, proferida pelo então Professor, Alcides Abreu. Em 20 de dezembro de 1967, através da Lei Municipal Nº 1458, institui-se a FUB - Fundação Universitária de Blumenau. Na mesma ocasião, pela Lei Municipal Nº 1459, são criadas as Faculdades de: Filosofia, Ciências e Letras de Blumenau e a de Ciências Jurídicas de Blumenau, sendo estas unidades integrantes da já nomeada Fundação. Finalmente, em 13 de fevereiro de 1986, pela Portaria Ministerial Nº 117, o Ensino Superior, mantido pela FURB, é reconhecido e credenciado pelo Ministério da Educação como Universidade, passando, novamente, a Mantenedora a denominar-se: Fundação Universidade Regional de Blumenau, nossa conhecida FURB, conforme previa a Lei Nº 2.016 de 22/07/1974, em seu Art. 3º. A partir de 21 de março de 1995, pela Lei Complementar Municipal Nº 20 21 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES 80, a Universidade Regional de Blumenau figura como uma Instituição de Ensino Superior criada e mantida pela Fundação Universidade Regional de Blumenau. A Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB é incluída como órgão autônomo na estrutura administrativa do Poder Executivo Municipal, uma instituição oficial de direito público. A FURB possui autonomia didático-científica, administrativa, de gestão financeira e patrimonial, conforme os seus Estatutos e Regimento Geral.” A primeira das muitas reformas universitárias (talvez, a mais efetiva!)... Diante desse contexto, o governo militar começou uma ampla reforma da educação superior, conhecida como Reforma Universitária. Nesse momento, segundo Buarque (2003), a universidade brasileira foi “destruída” e, ao mesmo tempo, “fundada”. Essa é uma afirmação aparentemente contraditória, não é mesmo? Vamos tentar entender melhor essa questão, segundo as palavras do próprio autor: Em 1964, a universidade brasileira foi paradoxalmente destruída e, ao mesmo tempo, fundada. Destruída pela aposentadoria forçada de centenas de professores, exilados ou expulsos pela ditadura recém-instalada, que pôs fim também à liberdade de cátedra. Não foram poucos os alunos que perderam a vida nesse período sombrio. Ao mesmo tempo, ela foi fundada numa estrutura mais moderna e, pela primeira vez, tentou-se criar um sistema universitário nacionalmente integrado. (BUARQUE, 2003, p.21-22). Essa estrutura mais moderna a que o autor se refere consolidou-se em 1968, quando a Reforma Universitária empreendida pelos militares foi aprovada pelo Congresso Nacional, introduzindo modificações importantes na educação superior. A Reforma foi fruto de um acordo firmado entre o governo brasileiro e o norte-americano, através do Ministério da Educação (MEC) e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). Com o acordo MEC-USAID, as instituições educacionais do país foram submetidas aos critérios e regras utilizados nas universidades dos Estados Unidos. Universidade como ambiente prioritário ao desenvolvimento da Educação Superior... as consequências da Reforma... A proposta revogou os dispositivos da Lei 4.024 de 1961, que faziam referência à educação profissional e apontou a universidade como ambiente prioritário ao desenvolvimento da Educação Superior, embora permitisse a existência dos estabelecimentos isolados. Dentre as proposições descritas estão a indissociabilidade entre o ensino e a pesquisa e o modelo organizacional único para as universidades públicas e privadas. A formação dos professores passou a ser diferenciada, com a criação das licenciaturas. O vestibular tornou- se unificado para todos os cursosda mesma instituição e a extensão passou a ser obrigatória na rotina das universidades. A Reforma estabeleceu ainda a renovação periódica dos estabelecimentos de ensino superior e devolveu às instituições sua autonomia (científica, disciplinar, administrativa e financeira). Reforma, de fato! Perceba que muito do que hoje se vivencia em termos de educação superior é fruto da Reforma da década de 60: indissociabilidade entre o ensino e a pesquisa; formação de professores através das licenciaturas, o vestibular unificado (embora esse já apresente elementos novos: cotas, por exemplo); renovação periódica (regulação da educação superior por meio das visitas da Comissão do MEC); autonomia universitária. Mesmo com todas as ressalvas ao regime ditatorial e centralizador vigente, é inegável que a reforma de 1968 representou um considerável avanço para a educação superior no Brasil, fazendo com que a universidade brasileira desse um grande salto quantitativo e qualitativo. Foi possivelmente: O maior salto já ocorrido em qualquer país do mundo, na área da educação superior. Era como se quiséssemos recuperar, embora sem liberdade, os quinhentos anos que havíamos perdido (BUARQUE, 2003, p.21-22). Para Pensar Observe atentamente as imagens a seguir e reflita: nas décadas de 60 e 70, o movimento estudantil universitário participou ativamente da vida política do país. Suas reivindicações, protestos e manifestações influenciaram significativamente os rumos da política nacional. E hoje? Como o movimento estudantil vem desempenhado seu importante papel social, político e econômico na sociedade brasileira? Pense sobre isso... Imagens disponíveis em: http://tbn2.google. com/images?q=tbn :5zEmDB_80s0ND M:http://www.ler- http://tbn2.google. com/images?q =tbn:3nPS49Z OEVfKiM:http:// portalimprensa.uol. com http://www.zaz. com.br/istoe/ edicoes/2007/ imagens/ 22 23 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Conforme você deve ter observado, cada avanço, cada conquista, cada melhoria e crescimento da nossa educação superior foi resultado de muitas lutas, não é verdade? Mas vamos prosseguir. O que aconteceu a partir daí? Década de 70... a história é marcada pela expansão... o negócio parece bom! Nos anos seguintes, ou seja, na década de 70, ocorreu no Brasil a chamada “explosão da educação superior”. O número de matrículas, segundo Souza (1997), subiu de 300.000 (1970) para um milhão e meio (1980). Esse período marcou profundamente a história da educação superior brasileira, pois foi uma época em que a universidade brasileira passou por um intenso processo de mudanças, tanto na sua concepção quanto na sua estrutura. Nesse período houve um surpreendente crescimento do setor privado, pois como a pressão social para ampliação de vagas era grande e os estabelecimentos existentes não conseguiam atender a demanda, o governo permitiu que o Conselho Federal de Educação aprovasse milhares de cursos novos. Essa crescente “privatização”, porém, não foi acompanhada de um sistema eficiente de avaliação, tendo como consequência a proliferação de cursos de baixa qualidade misturados a cursos de excelência. Esse aumento expressivo, sem adequado planejamento, resultou em uma insuficiência de fiscalização por parte do poder público, uma queda da qualidade de ensino e a imagem “mercantilista” e negativa da iniciativa privada, que persiste até hoje, ao contrário do que prega a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Superior, de 1968 (Lei nº 5.540/68) (SOUZA, 1997, s/p). Uma característica marcante nessa década foi a transformação da educação superior em um negócio altamente rentável, pois as antigas universidades privadas, que eram basicamente mantidas pelas universidades confessionais (principalmente as católicas) e não-lucrativas, deram lugar às instituições criadas pela iniciativa empresarial, que visavam a obtenção de lucro para seus proprietários. Eram instituições voltadas exclusivamente ao atendimento da demanda e com padrões de qualidade bem heterogêneos (Andrade, 2004). As intenções, aos olhos de alguns, se alteraram. As novas instituições privadas, surgidas na década de setenta, passariam a organizar as suas atividades acadêmicas objetivando de forma prioritária a obtenção do lucro e da acumulação do capital (MARTINS, 1988, p.39, grifo nosso). Todas as mudanças decorrentes desse período acabaram fragilizando o sistema educacional e desencadeando uma série de estudos e discussões acerca do controle de qualidade do ensino ministrado no país. Para Pensar Esse momento vivido na década de 70 parece tão atual, não é mesmo? Pense nisso! Década de 80... o que aconteceu com a expansão? Desacelerou? Que história é essa? Diferentemente das décadas anteriores, nos anos 80 houve uma desaceleração no processo de expansão da educação superior. Durante esse período, devido a forte crise econômica enfrentada pelo país, o crescimento da educação superior foi medíocre, chegando quase a uma situação de estagnação do número de matrículas na graduação. Assim, após viver uma ampla expansão durante os anos 70, na década de 80 o setor passou por um momento de franco desânimo. Com a crise econômica que se abateu sobre a América Latina, o sistema universitário público enfrentou anos de caos administrativo (subfinanciamento, crise de autoridade, desvalorização social). Foram promovidas manifestações frequentes pelos estudantes, docentes e servidores, mas não passaram de longas e frustrantes greves. Os motivos que contribuíram para essa situação, segundo Braga e Tramontin (1991), foram: • a redução dos investimentos de recursos financeiros do governo no setor; • a política de contenção de cursos; a retração do mercado de trabalho; • a nova filosofia liberal, limitando a intervenção do Estado e da burocracia estatal. Diante do caos, uma nova reforma... Em 1985 ocorreu uma tentativa, por parte do governo, de se realizar uma reforma universitária para corrigir os equívocos da Reforma de 1968. Foi instituída a Comissão Nacional para Reformulação da Educação Superior, que emitiu um relatório intitulado Uma Nova Política para a Educação Superior Brasileira. O Ministério da Educação recebeu a proposta da comissão, mas nenhum projeto de lei chegou a ser encaminhado ao Congresso Nacional. Não passou, então, de uma proposta, literalmente! Um fato que marcou esse período foi a transformação de escolas isoladas em universidades particulares, até então privilégio apenas das instituições públicas e de algumas de natureza confessional. 24 25 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Nos aproximamos do final do século XX, qual será o rumo dessa história? A situação permaneceu inalterada até a metade da década seguinte. Embora o número de matrículas da década de 90 tenha sido bem mais expressivo que o dos anos 80, manteve-se em níveis medíocres até 1993. Somente a partir de 1994 é que retomou a tendência anterior de crescimento, acelerando a partir de1997. A retomada do crescimento, entretanto, não foi suficiente para assegurar a democratização do acesso à educação superior, que ainda possui caráter excludente e discriminatório. Em razão das desigualdades sociais e da má distribuição de rendas históricas do nosso país, a grande maioria da população não consegue chegar a esse nível de ensino. No início da década de 90, com a ascensão das políticas neoliberais no país, o Brasil passou por um intenso processo de modernização para se inserir no mundo globalizado. Durante esse processo, o governo implementou reformas em todas as esferas sociais, inclusive na educação superior, seguindo as recomendações do Banco Mundial, que defendia a privatização de empresas estatais e de serviços públicos de uma maneira geral. De acordo com essa orientação, o Estado deveria atender aoensino básico, deixando os demais níveis para a iniciativa privada. O marco de referência dessas reformas foi a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96), que você conhecerá melhor no decorrer desse caderno, quando abordaremos a forma de organização e regulação do ensino superior. Para Pensar Maioria é contra privatizações, aponta pesquisa Carlos Marchi Em 1994, uma pesquisa do Ibope sobre privatização registrou que 57% dos brasileiros eram a favor da privatização total ou parcial e só 31% eram contrários. Em 1995, outra pesquisa do Ibope atestou que 43% eram a favor das privatizações e 34% eram contrários. De lá para cá, isso mudou muito. Hoje, uma robusta maioria acha que a qualidade dos serviços prestados por empresas privatizadas piorou. Confira: Em 2007 o instituto Ipsos, sob encomenda do jornal O Estado de São Paulo, realizou uma pesquisa sobre privatização com mil eleitores brasileiros em 70 cidades e 9 regiões metropolitanas. Essa pesquisa apontou que 62% dos entrevistados é contra a privatização de serviços públicos. Apenas 25% dos eleitores brasileiros aprovam o método. A análise do Ipsos frisou que a população brasileira se posicionou francamente contra as privatizações, mas, se os serviços forem bons ou trouxerem benefícios para as pessoas, essa postura pode ser revertida. E você? O que você pensa a esse respeito? Em relação à educação superior, você é contra ou a favor da privatização? Trechos da reportagem do jornal O Estado de São Paulo, em 11 novembro de 2007. Disponível em: http://txt.estado.com.br/ editorias/2007/11/11/eco-1.93.4.20071111.17.1.xml Vamos prosseguir nosso estudo. As consequências da política neoliberal para a educação superior. Isso dá história... Para cumprir os acordos e as metas do Fundo Monetário Internacional (FMI), o governo brasileiro diminuiu drasticamente os investimentos públicos nas áreas da saúde, da cultura e da educação, inclusive no campo de produções científicas e tecnológicas das universidades. Ao reduzir os investimentos financeiros na educação superior, o governo estimulou as universidades públicas a buscarem recursos no setor privado para o seu custeio, ou seja, transformou a universidade em uma prestadora de serviço subordinada às regras mercantilistas. Como consequência, “o conhecimento deixou de ser uma construção, um processo, passando a ser também uma mercadoria a ser negociada no mercado.” (CHAVES, 2006, p.6). Trata-se, enfim, de transferir a educação da esfera política para a esfera do mercado, negando sua condição de direito social e transformando-a em uma possibilidade de consumo individual, variável segundo o mérito e a capacidade dos consumidores. (GENTILLI, 1998, p.19). ATENÇÃO: Temos aqui uma importante mudança de paradigma: A educação, que até então era assumida como um “direito” passou a ser encarada como um “serviço”. Com isso, estabeleceu-se uma nova identidade para a educação superior. Novos hábitos e novas práticas passaram a fazer parte do dia a dia das instituições, que ampliaram suas funções e começaram a cobrar pelas atividades realizadas (de ensino, pesquisa e extensão) de forma bastante natural, pois ficaram caracterizadas como “prestadoras de serviços”. Entre essas novas práticas, está o estabelecimento de convênios e contratos com empresas privadas, cobranças de taxas para cursos de pós-graduação lato sensu, venda de cursos de licenciaturas para prefeituras do interior dos Estados com recursos do FUNDEF (Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental), entre outros (CHAVES, 2006). Política neoliberal é a que prega a diminuição do Estado na economia. É a política de recuo da participação estatal nas atividades econômicas de um país. A adoção de tal política favorece as privatizações. 26 27 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Saiba Mais Se você quiser se aprofundar nesse assunto, leia o artigo “Público ou mercantil”, do professor Emir Sader, disponível no site http://www. aduff.org.br/manchetes/20040714_emirsader.htm Chegou a vez da EaD... Outra característica marcante dos anos 90 foi o crescimento expressivo da educação a distância (EAD). Nesse período, a EAD avançou consideravelmente em termos de legalização, normatização e tecnologias. Um grande número de instituições de educação superior buscou, nesta modalidade, mais uma alternativa para oferta de seus cursos. Esse crescimento foi visivelmente impulsionado pela expansão da Internet junto às Instituições de Educação Superior, em 1994, e pela publicação da Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB), que oficializou a EaD como modalidade válida e equivalente para todos os níveis de ensino, em 1996. No final da década, a educação a distância se desenvolveu consideravelmente com a criação das Universidades Abertas e Virtuais. Você sabe o que é Universidade Virtual? Vale conferir... Saiba Mais A Universidade Virtual no Brasil* A Universidade Virtual, entendida como ensino superior a distância com uso de Novas Tecnologias de Comunicação e Informação (NTIC), em especial a Internet e a videoconferência, surge no Brasil na segunda metade da década de 1990. Até este período, a modalidade da Educação a Distância (EAD) era utilizada principalmente para ofertar cursos livres de iniciação profissionalizante, dentro do conceito de educação aberta e com os recursos do ensino por correspondência; e para ofertar cursos supletivos, focados na complementação de estudos nos níveis de Ensino Fundamental e de Ensino Médio, utilizando materiais impressos e aulas transmitidas por televisão, em programas de telecurso. * Trabalho apresentado no Seminário Internacional sobre Universidades Virtuais na América Latina, em 2003. Disponível em: http://www. portaldeensino.com.br/ead_historico.pdf Um novo “personagem” aparece na nossa história: PNE... Em meio a essa realidade, o governo criou um plano com o objetivo de melhorar a qualidade de ensino no país: O PNE - Plano Nacional de Educação. Sua elaboração contou com a participação de mais de 60 entidades, entre sindicatos, associações, conselhos e secretarias de Educação. O plano foi enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional em dezembro de 1997, aprovado no final de 2000 e sancionado em 9 de janeiro de 2001. O PNE estabelece diretrizes, metas e prioridades para o setor educacional brasileiro, com um prazo de até dez anos para que todas sejam cumpridas. No que se refere à Educação Superior, a primeira meta diz respeito à necessidade de sua ampliação, visto que, conforme já afirmamos anteriormente, o Brasil tem um dos índices mais baixos de acesso à Educação Superior na América Latina. O PNE, então, definiu como meta até 2010: Prover, até o final da década, a oferta de educação superior para, pelo menos, 30% da faixa etária de 18 a 24 anos. (BRASIL, 2001, p. 43). Observe que a meta busca atingir a faixa etária dos 18 aos 24 anos. Isso significa dizer que as pessoas com mais de 24 anos, com 30, 40, 45 anos, que buscam hoje formação superior e que são em número significativo nas instituições, não interessam para fins de cumprimento da meta e aproximação do Brasil aos níveis de ensino de países mais desenvolvidos. Entenda bem: interessa sim, que todos estudem independente da idade, mas o parâmetro internacional estipula a faixa etária dos 18 aos 24 anos. Para o cumprimento da meta, o plano ressalta a importância da contribuição do setor privado, com parâmetros de qualidade estabelecidos pelos sistemas de ensino, bem como da educação a distância, que possibilita a ampliação de atendimento nos cursos presenciais, regulares ou de educação continuada. Entendimentos feitos, vejamos nossa posição: A posição do Brasil no que se refere ao acesso da juventude ao nível superior, comparada com a de diversos países (em especial na América Latina), é no mínimo lamentável.O número de matriculados corresponde a cerca de 13% da população entre 20 e 24 anos, muito inferior ao da Argentina (39%), Chile (37%), Bolívia (23%), França (50%), Espanha (46%) ou EUA (80%), país que caminha rapidamente para a universalização do ensino superior. Fonte: EDUCAÇÃO: O FUTURO ESTÁ EM NOSSAS MÃOS. José Henrique Vilhena – Folha de São Paulo Disponível em: http://ensinando administrativo. blogspot.com/ 2008/12/educao- o-futuro-est-em- nossas-mos.html Ilustração: Caco Villan 28 29 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Saiba Mais O Presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), prof. Edson Nunes, publicou o documento “Desafio Estratégico da Política Pública: O Ensino Superior Brasileiro”, em conjunto com os pesquisadores da UCAM, onde analisa o crescimento e o desenvolvimento do Ensino Superior no Brasil. De acordo com a pesquisa, o Brasil ainda ocupa uma posição frágil, senão vexatória, quando se comparam os números relativos a adultos brasileiros portadores de diploma superior com adultos de outros países selecionados. Esses dados apontam o quanto nos afastamos dos países centrais no que se refere aos termos de qualidade vida, capacidade técnica e índices de desenvolvimento humano. “A despeito desses números significativos, ao final do século XX, com pouco mais de 6% da população adulta com educação de educação superior, o Brasil se contrapunha ao Canadá que, com cerca de 40% de todos os adultos com educação superior, percentual superior ao dos Estados Unidos, Japão e de tantos outros países”. Para ler o trabalho na íntegra, acesse a página do Observatório Universitário da Universidade Candido Mendes - http://www. observatoriouniversitario.org.br Surge um fato suspeito... qual será o fim dessa história? Algumas estimativas apontam que em 2010 teremos aproximadamente 23,8 milhões de jovens de 18 a 24 anos. E 30% disso é algo em torno de 7,1 milhões, ou seja, temos o desafio de incluir 2,7 milhões de estudantes no ensino superior até 2010. Isso representa um crescimento médio de 10% ao ano a partir da base matriculada em 2005, conforme ilustra o gráfico a seguir: Figura 1 Taxa de escolarização no ensino superior (fontes: IBGE e INEP/MEC) No entanto, o Brasil apresenta uma queda no ritmo de crescimento das matrículas, que ficou estabilizada em 7%. Mantido o atual ritmo de crescimento, teremos 6,2 milhões de alunos em 2010. Todavia, alguns analistas do setor apontam que será muito difícil sustentar esse ritmo de crescimento e sinalizam para taxas máximas de 3%. Neste cenário, atingiríamos 5,2 milhões de matrículas em 2010. Os analistas mais otimistas apontam para 5,7 milhões. Diante disso, teremos um déficit de pelo menos 1,5 milhão de matrículas em 2010, mantidas as condições atuais do segmento. O final provisório da história: não há sinais de que o Brasil consiga atingir a meta do PNE, ou seja, inserir 30% de jovens da faixa etária de 18 a 24 anos no ensino superior até 2010. Conforme você pode perceber, a educação superior no Brasil chegou ao final da década com claros sinais de esgotamento. Terminamos o século XX com vários questionamentos sobre o futuro da educação superior no país. Expressões como a crise da universidade, universidade em questão, universidade em ruínas, universidade na penumbra, universidade na encruzilhada, naufrágio da universidade etc., passaram a fazer parte do vocabulário de estudiosos da área, demonstrando “suas preocupações com os novos desafios que estão sendo colocados para essa instituição no atual ambiente de globalização acelerada.” (LIMA, 2004). Século XXI: o que a história nos reserva? O século XXI chegou, revelando um mundo novo e incerto. Muita coisa mudou e continuará mudando de forma acelerada. O conhecimento que o aluno adquiria no ensino superior para durar a vida inteira e assegurar o seu futuro sofre transformações constantes, precisando ser continuamente renovado para não se tornar ultrapassado. Além disso, não é mais propriedade específica das instituições de ensino. Hoje o conhecimento está em toda parte e alcança pessoas em qualquer lugar do planeta, por diferentes meios. As universidades, faculdades e centros universitários são apenas um desses meios. Nesse cenário de mudanças e incertezas, a universidade “deixou de ser a vanguarda do conhecimento, tendo perdido também a capacidade de assegurar um futuro exitoso a seus alunos” (BUARQUE, 2003, p.8). ATENÇÃO: isso representa outra mudança de paradigma! Diante desse novo paradigma, chegamos ao início do século XXI com 2.281 instituições de educação superior, 23.488 cursos e 4.880.381 estudantes, segundo dados do Censo da Educação Superior 2007, realizado pelo INEP. No que se refere à organização acadêmica, a maioria dos estudantes brasileiros está matriculada em universidades: 2.644.187. Os centros universitários registraram 680.938 matrículas e as faculdades, 1.555.256. Seguindo a tendência dos anos anteriores, as IES privadas continuam responsáveis pela oferta da maioria dos cursos. O maior número de faculdades (92,5%) e de centros universitários (96,7%) está vinculado ao setor privado, enquanto as universidades estão distribuídas em proporção aproximada entre setor público e o privado (52,5% e 47,5% respectivamente). Fonte: Grupo ÂMALUS. Disponível em: http://www. mgar.com.br/ mgPdf/2007_03_ Conspiracao.pdf 30 31 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Esses dados confirmam o fato de que a educação superior no Brasil precisa dos dois sistemas, pois o ensino privado é uma peça fundamental para possibilitar a ampliação do acesso à educação superior. O grande desafio, porém, continua sendo a questão da qualidade, pois como já afirmamos anteriormente, temos um grande número de cursos de baixa qualidade misturado a cursos de excelência, independentemente do tipo de instituição: pública ou privada. No entendimento do governo, a forma mais efetiva de enfrentar esse desafio é através da Reforma da Educação Superior. Uma nova reforma... o que podemos esperar? Diante dessa nova realidade o governo brasileiro, desde o final de 2003, vem trabalhando na proposta de uma nova reforma da educação superior. A proposta de Lei de Reforma da Educação Superior tem como um dos seus objetivos centrais a expansão da educação superior com qualidade e equidade. De acordo com a terceira versão do Anteprojeto da Reforma, concluído em julho de 2005, o Brasil precisa construir uma instituição de educação superior “que seja a expressão de uma sociedade democrática, multiétnica e pluricultural, inspirada nos ideais de liberdade, de respeito pela diferença e de solidariedade” (BRASIL/MEC, 2005, p. 10). E ainda, conclui o projeto, “uma instituição que se constitua numa instância de consciência crítica em que a coletividade encontre seu espaço para repensar suas formas de vida e suas organizações sociais, econômicas e políticas.” (IDEM, p.10). Saiba Mais Conheça o Anteprojeto de lei da reforma da educação superior na íntegra, acessando o site http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ anteprojeto.pdf Há quem seja a favor, há que seja contra... A proposta tem provocado discussões acirradas em diversos segmentos da sociedade e causado polêmica entre os educadores brasileiros: alguns apoiaram sem restrição as proposições governamentais do anteprojeto, defendendo, inclusive, sua implementação imediata por meio de Medida Provisória. Outros se manifestaram radicalmente contra, afirmando que é uma proposta tipicamente neoliberal e que pioraria as condições já precárias das universidades. Como podemos notar, os desafios a serem enfrentados com a reforma são grandes e complexos. Mas, como afirma Lima (2004, s/p), “a idéia de reformar as instituições é sempre uma idéia atraente porque carrega em si a semelhança com modernizar, adequare rejuvenescer.” Nesse sentido, segundo Buarque (2003), essa não é a primeira vez que a universidade se vê diante da necessidade de mudar e nem será a primeira vez que ela irá superar suas dificuldades e se reorganizar para servir à humanidade. Após a nossa breve caminhada pela história da educação superior no Brasil, podemos facilmente comprovar essa afirmativa. Desde a chegada da Família Real, em 1808, até os dias atuais, a educação superior no nosso país passou por inúmeras mudanças. Nesses 200 anos de história, foram mais de 10 reformas educacionais. De acordo com Lima (2004), no entanto, uma reforma universitária deve começar por uma definição consensual de qual deve ser a sua verdadeira missão. Para o autor, falta, no Brasil, a definição de um sistema de educação superior organicamente constituído. A esse respeito, afirma: Antes de avançarmos na discussão da reforma universitária o estado brasileiro necessita intermediar a construção de um novo pacto entre as universidades, o conjunto dos estabelecimentos de ensino superior e a sociedade, definindo uma nova estrutura para nosso sistema de educação superior que hoje se encontra esfacelado. É necessário que se estabeleça um novo acordo universitário que defina de maneira clara o papel e a missão do sistema de ensino superior frente os objetivos coletivos de construção de uma nação soberana e frente os nossos projetos de desenvolvimento econômico e social (LIMA, 2004, s/p, grifo nosso). O autor nos indica, portanto, que o primeiro passo é estabelecermos claramente a função da educação superior, de acordo com os interesses da sociedade na qual está inserida. A propósito, esse é o nosso próximo tema. Qual o papel da educação superior na sociedade contemporânea? As instituições de ensino superior têm uma missão a cumprir na sociedade? Qual é a real finalidade da educação superior? Essas são as questões que buscaremos responder na nossa próxima seção. Antes, porém, que tal fazermos uma síntese do que aprendemos? Nessa seção aprendemos que: • A educação superior, no Brasil, nasceu há 200 anos e teve como principal objetivo a formação e reprodução das elites. • Historicamente a educação superior brasileira se consolidou como um modelo de instituto isolado, profissionalizante e elitista. • A educação superior no Brasil foi estruturada a partir de faculdades e escolas isoladas; somente depois surgiram as universidades. • Na medida em que a educação superior se expandiu, ela se diversificou: de institutos isolados, transformou-se em uma complexa rede de universidades, faculdades e centros universitários; o número de cursos também se multiplicou, assim como sua estrutura se modernizou. 32 33 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES • A educação superior no país teve origem pública (como iniciativa do Estado). Com o tempo, o setor privado elevou sua participação no mercado, enquanto o setor público teve sua participação reduzida. Atualmente, a educação superior no Brasil é um das mais privatizadas do mundo. • A expansão das instituições privadas, apesar de ainda causar polêmica no setor, contribuiu para que o índice de matrículas na educação superior aumentasse consideravelmente. • Um importante fator que impulsionou o acesso à Educação Superior foi o crescimento expressivo da educação a distância (EAD). • Apesar da significativa expansão, o Brasil ainda ocupa uma posição frágil no cenário mundial: dos jovens que concluem o ensino médio, poucos conseguem chegar à universidade. • Não houve um planejamento adequado para o aumento expressivo das instituições de ensino superior, resultando na proliferação de cursos de baixa qualidade. Atualmente, há um grande descontentamento com a qualidade dos cursos de nível superior no Brasil. • A universidade contemporânea passa por momentos de profundas reflexões na busca de redefinir seu papel social (perdeu a exclusividade de ser o local de produção de conhecimento e preparação de mão de obra especializada). • Diante da atual fragilidade do sistema de educação superior no país, o governo brasileiro desenvolveu um projeto de Reforma da Educação Superior, que redefinirá os rumos da universidade brasileira. O objetivo central da proposta é a expansão com qualidade e equidade. 1.2 FUNÇÃO SOCIAL DA EDUCAÇÃO SUPERIOR A discussão sobre a função social da Educação Superior pode ser extraída da sua própria história. Nem poderia ser diferente. Assim, a partir de nossos estudos anteriores, podemos destacar algumas funções assumidas pela educação superior brasileira ao longo dos anos: • Doutrinar com o propósito de formar novos padres. • Formar profissionais para exercer os serviços públicos voltados à administração do país. • Formar a elite para exercer as profissões liberais. • Formar mão de obra qualificada. • Articular formação acadêmica e industrial. • Reproduzir a força de trabalho, conservar as classes sociais. O fato é que chegamos aos dias atuais e não temos ainda muito claro a função da educação superior. Podem-se observar claramente distintas posições em relação às suas funções na sociedade contemporânea: há os que defendem como prioridade: • a formação técnica e especializada do homem para o trabalho; • os que defendem como suas funções básicas desenvolver a pesquisa científica além de formar profissionais e; • os que ampliam essas funções, como é o caso da concepção proposta pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) de 1987. Vamos detalhar cada uma das posições: 1) Formação técnica e especializada do homem para o trabalho Tradicionalmente, conforme afirma Dowbor (2001, p. 28), a educação seria um instrumento destinado a adequar o futuro profissional ao mundo do trabalho, disciplinando-o, e municiando-o de certa maneira com conhecimentos técnicos, para que possa “vencer na vida”, inserindo-se de forma vantajosa no mundo como existe. Esta inserção vantajosa, por sua vez, asseguraria reconhecimento e remuneração, ou seja, “sucesso”. Esse modelo, segundo Brom (2006), é fruto de uma visão ultrapassada acerca da educação e do trabalho e de noções que exprimiam apenas o desejo da economia industrial de atender às suas necessidades mais urgentes. São idéias que ficaram enraizadas, gerando expectativas descabidas e equivocadas a respeito do papel da educação superior. O mercado de trabalho, conforme argumenta o autor, é mais do que nunca mutante e instável. Assim, a educação superior ao preparar os estudantes para o atendimento das necessidades do mercado, prepara-os para uma realidade que em breve não mais existirá. Dessa forma, o egresso da universidade, quando dotado exclusivamente de conhecimento instrumental, de utilização imediata, está condenado a uma curta vida profissional. A aquisição de conhecimentos técnicos e instrumentais, aliás, dispensa qualquer passagem pelo ensino superior. Não é preciso fazer faculdade para se conhecer um software ou uma nova técnica profissional. (BROM, 2006). 34 35 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES 2) Desenvolver a pesquisa científica além de formar profissionais A posição anterior, ainda dominante, é contestada por outra visão, que defende a educação superior como local de produção do conhecimento, voltado para a garantia dos processos de humanização. A educação, nessa perspectiva, tem por finalidade preparar o aluno para exercer sua cidadania e não apenas formar um profissional integrado no mercado de trabalho. Nesse modelo, a educação superior tem como foco a inclusão e o desenvolvimento, conforme podemos observar nas idéias de Teixeira (1998, p. 35): A função da universidade é uma função única e exclusiva. Não se trata, somente, de difundir conhecimentos. O livro também os difunde. Não se trata, somente, de conservar a experiência humana. O livrotambém a conserva. Não se trata, somente, de preparar práticos ou profissionais, de ofícios ou artes. A aprendizagem direta os prepara, ou, em último caso, escolas muito mais singelas do que as universidades. Com essas palavras, o autor destaca uma das principais características da universidade: ser local de investigação e de produção do conhecimento. 3) Ampliam essas funções E, finalmente, o outro modo de compreender o papel da educação superior encontra-se expresso no relatório da OCDE, de 1987, que atribui às universidades, dez funções principais: • educação geral pós-secundária; • investigação; • fornecimento de mão de obra qualificada; • educação e treinamento altamente especializados; • fortalecimento da competitividade da economia; • mecanismo de seleção para empregos de alto nível através da credencialização; • mobilidade social para os filhos e filhas das famílias operárias; • prestação de serviços à região e à comunidade local; • paradigmas de aplicação de políticas nacionais (ex.: igualdade de oportunidades para mulheres e minorias raciais); • preparação para os papéis de liderança social (Santos, 1995 p.189). Em consonância com esse enfoque, a Conferência Mundial sobre o Ensino Superior, realizada em Paris, em outubro de 1998, ampliou ainda mais essas funções. Confira: Artigo 1 A missão de educar, formar e realizar investigações com os seguintes desdobramentos: (a) formar diplomados altamente qualificados; (b) constituir um espaço aberto para formação superior que proporcione a aprendizagem permanente; (c) promover, gerar e difundir conhecimentos por meio da investigação; (d) ajudar a compreender, interpretar, preservar, reforçar, fomentar e difundir as culturas nacionais e regionais, internacionais e históricas, em um contexto de pluralismo e diversidade cultural; e) contribuir para proteger e consolidar os valores da sociedade; (f) contribuir para o desenvolvimento e melhoria da educação em todos os níveis. Artigo 2 Função ética, autonomia, responsabilidade e prospectiva com os seguintes desdobramentos: (a) preservar e desenvolver suas funções fundamentais submetendo-as às exigências da ética e ao rigor científico e intelectual; (b) opinar sobre os problemas éticos, culturais e sociais com autonomia; (c) reforçar suas funções críticas e progressistas mediante uma análise constante das novas tendências sociais, econômicas e culturais e políticas; (d) utilizar sua capacidade intelectual e prestígio moral para defender e difundir ativamente os valores universalmente aceitos e em particular a paz, a justiça, a liberdade, a igualdade, e a solidariedade; (e) desfrutar plenamente da liberdade acadêmica e autonomia; (f) envolver-se com os problemas que afetam o bem-estar das comunidades. Quanta coisa, não? Mas não pode ser diferente. Vamos pensar em termos práticos. Um exemplo: Uma pessoa está com um sério problema de saúde. O diagnóstico correto e o tratamento adequado poderão lhe devolver a esperança de viver. Precisará, portanto, da intervenção de um médico qualificado, ou seja, cuja formação em nível superior (graduação e pós-graduação) tenha sido de alta qualidade. Isso é muito, mas não é tudo! Esse médico precisará ser ético, responsável, comprometido com a sua vida e seu bem-estar, aberto a questionamentos e a novas aprendizagens. Também, atento, observador, crítico, valoroso, rigoroso... Então, com base nisso, pode-se afirmar que não é nem um pecado a educação superior ter como uma das suas prioridades a formação profissional ou para o mercado de trabalho, desde que o entendimento de profissional e mercado de trabalho contemple às exigências contemporâneas. Ninguém 36 37 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES deseja ser atendido por um médico “mal formado”, incapaz, por exemplo, de identificar um resfriado. Por outro lado, ninguém deseja ser atendido por um médico que desconsidere sua história, suas crenças e valores ou, que não aceite ser questionado. Ainda, que não saiba conversar, informar ou apontar caminhos ao paciente. Queremos médicos competentes e engajados com a promoção da saúde para todos. Esse foi apenas um exemplo para mostrar o quanto se faz necessário definir a função da educação superior, pois tal definição servirá como princípio primeiro para as decisões acerca de currículo, conteúdo, estratégias de ensino e avaliação, entre outros. Por exemplo, para formar um médico como o que descrevemos anteriormente, serão necessárias disciplinas específicas voltadas à atuação médica, mas também disciplinas que contemplem conteúdos sociais e humanos. Para entender melhor isso, leia a mensagem a seguir: Terminada a última guerra mundial foi encontrada, num campo de concentração nazista, a seguinte mensagem dirigida aos professores: “Prezado Professor, Sou sobrevivente de um campo de concentração. Meus olhos viram o que nenhum homem deveria ver. Câmaras de gás construídas por engenheiros formados. Crianças envenenadas por médicos diplomados. Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês fuzilados e queimados por graduados de colégios e universidades. Assim, tenho minhas suspeitas sobre a Educação. Meu pedido é: ajude seus alunos a tornarem-se humanos. Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados ou psicopatas hábeis. Ler, escrever e aritmética só são importantes para fazer nossas crianças mais humanas.” (DOWBOR, 2001, p. 21). Para Pensar “Se o conhecimento não serve para inserir os homens de forma consciente na sociedade, para que serve então”? Questionamento do cientista Emir Sader, em palestra proferida no Fórum Mundial da Educação (2003). Chegando ao final dessa seção, faz-se necessário polemizar. Prepare-se! Parece que conseguimos chegar a uma definição ideal acerca da função social da educação superior. Entretanto, não podemos fugir da nossa realidade. Você já deve ter ouvido falar, por meio de comentários de professores de educação superior, que os alunos chegam a esse nível de ensino despreparados, não sabem escrever e nem ler, não pensam... Se isso for verdade, como atingir com essas pessoas o nível ideal de educação superior? Esse é o desafio da educação superior e o maior dilema com o qual se depara o professor. Além disso, esse é um assunto polêmico e árido. Veja: Há quem defenda a seleção rigorosa dos ingressantes ao ensino superior. Ao não sabe ler, nem escrever e nem tantas outras coisas, a pessoa não poderá ingressar na educação superior. Você concorda com isso? Paralelo a isso, há quem diga que principalmente a rede privada está banalizando a educação superior, pois basta que o aluno tenha diploma de ensino médio e ele já está dentro. São questões polêmicas e não há respostas conclusivas sobre elas. Mas há aspectos legais a serem observados. Primeiro, educação é direito. Segundo, a educação brasileira está organizada em níveis sequenciais, ou seja, concluída uma etapa ou nível de ensino com a devida aprovação, o cidadão está apto a ingressar na próxima etapa ou nível. A negação a esse direito resultaria na condenação da etapa anterior – do ensino médio. E quem seria o culpado? O aluno! Ele deve pagar a conta? Se considerarmos coerente o ingresso na educação superior depois de comprovada competência, não deveríamos, também, exigir a existência de processo seletivo eliminatório da educação infantil para o ensino fundamental? E do fundamental para o ensino médio? Mais uma para encerrar: há quem defenda o fechamento das instituições privadas de educação superior e, naturalmente, o fortalecimento da universidade pública. Essa medida é viável? Quem seriam os beneficiados com ela? Onde se encontra a solução? Há instituições de educação superior tidas como de excelência no Brasil, como por exemplo, a Universidade de São Paulo (USP). Nela há vagas para toda a demanda de alunos provenientes do ensino médio? Não!Parece então, que a forma “mais justa” é selecionar os candidatos. Tendo em vista o rigor das provas de ingresso da USP, obviamente, os alunos que lá ingressarem têm alto potencial de aprendizagem, assim como alto grau de conhecimento. O que se espera deles? Que saiam de lá com alto grau de formação superior. Mas isso não é a nossa realidade maciça. A maioria dos alunos ingressantes na educação superior vem de uma educação básica deficitária. O que se pode esperar deles? Que saiam da educação superior muito melhor do que entraram. Nossa conclusão provisória: as instituições e professores que recebem esses alunos não podem ser omissas e tampouco irresponsáveis. Ingressar todos podem, mas sair somente quando os resultados desejados (refere-se aquilo que é essencial saber) forem atingidos. Um pacto pedagógico de comprometimento entre as partes envolvidas, talvez seja um caminho viável. Por fim, sugerimos a leitura do texto do colunista da Revista Veja, Gustavo Ioshpe, conhecido pela sua capacidade de polemizar. 38 39 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES Saiba Mais Pelo direito à ruindade Gustavo Ioschpe “Se o aluno não está em universidade melhor, é sinal de que não tem condições intelectuais ou financeiras de chegar lá. A pergunta que faz sentido não é se seria melhor para esse aluno e para o país que ele cursasse a USP ou a faculdad'oréia aumentou sua taxa de matrícula universitária em 353%, a Turquia em 320%, Portugal em 255%, e assim por diante. O resultado é que vários países, inclusive aqueles que partiram de um patamar muito baixo, chegaram aos dias de hoje em condições de sonhar. O Chile, por exemplo, tem atualmente 48% dos seus alunos em idade universitária no ensino superior. O Líbano tem 46%. O Panamá tem 44%, o Uruguai tem 42%, a Venezuela tem 41%. A China vem assombrando o mundo com a rapidez da sua ascensão: de 6% de matriculados em 1999, passou para 22% em 2006. O Brasil foi mais uma vez a exceção negativa. Apesar de termos universidades tradicionais, no período 1980-1997 aumentamos nossa matrícula em apenas 36%, e mesmo o crescimento acelerado nos últimos dez anos ainda nos deixa com apenas 24% de matrícula no ensino superior. Praticamente um terço dos países desenvolvidos e metade de vários dos nossos vizinhos continentais, portanto. Estagnamos por três razões. A primeira é a péssima qualidade da educação básica, que gera um número pequeno de concluintes aptos a entrar no ensino superior. A segunda é o estrangulamento do modelo financeiro: as universidades públicas brasileiras estão entre as mais caras do mundo e sua replicação em escala é inviável, e falta renda na população para custear mais ensino privado. Finalmente, faltavam até há pouco opções de cursos superiores mais adaptadas às demandas desse novo contingente de estudantes, que querem programas mais curtos e mais direcionados às necessidades do mercado de trabalho, sem ter interesse em uma formação acadêmica, humanista. Nos países desenvolvidos, entre 15% e 30% da matrícula costuma ser nesses cursos mais curtos e profissionalizantes, contra 4% no Brasil. Em um cenário como esse, de tremenda defasagem do Brasil em relação ao resto do mundo, deveríamos estar correndo a todo o vapor para recuperar o tempo perdido, focando na melhoria do ensino básico, na expansão das vagas em universidades públicas, na criação de mecanismos de financiamento das universidades privadas e em campanhas antievasão dos alunos já matriculados. Causa estranheza e certo desalento, portanto, que nesse cenário o Ministério da Educação tenha iniciado uma campanha para monitorar e eventualmente fechar os cursos de baixa avaliação institucional, primeiro na área de direito, agora na área de pedagogia. A ação parte do pressuposto de que esses maus cursos são uma arapuca, que enganam seus alunos oferecendo um ensino que não os prepara para nada. Seriam meras fábricas de diploma, prejudicando seus alunos e pondo em risco a sociedade atendida por seus formandos. É mais um caso do viés ideológico antiliberal contaminando uma área estratégica para o país. A idéia de que os alunos são enganados não se sustenta. Quem está em idade universitária e já passou por todo o sistema de ensino, e trabalha para poder pagar suas mensalidades (dos sessenta cursos de pedagogia, 57 são privados; todos os oitenta de direito também), não é exatamente um ingênuo, uma criança perdida. Todas as instituições brasileiras passam por um amplo processo de avaliação, tanto externa como por meio de exames feitos pelos próprios alunos, e seus resultados estão disponíveis na internet. Quando um aluno se matricula em um curso barato de uma instituição de pouco prestígio, ele não está atrás de uma posição de presidente de empresa ou de eminência intelectual: ele quer subir um pouco na vida, ganhar um pouco mais. Como em qualquer área, há serviços melhores e piores, com preços correspondentes. Se o aluno não está em universidade melhor, é sinal de que não tem condições intelectuais ou financeiras de chegar lá. Sem a universidade ruim, esse aluno não cursará faculdade alguma. A pergunta que faz sentido não é se seria melhor para esse aluno e para o país que ele cursasse a USP ou a faculdade da esquina. A pergunta certa: é melhor que ele curse a faculdade da esquina ou faculdade nenhuma? A resposta a essa pergunta é dada de forma categórica pelo mercado de trabalho. Uma pessoa com ensino superior concluído ganha cerca de três vezes mais do que outra que tenha cursado apenas alguns anos do ensino superior, e quase cinco vezes mais do que aquela que cursou somente o ensino secundário. Estudo recente aponta que a taxa de retorno a um diplomado de ensino superior – isto é, o aumento salarial decorrente desse nível de estudo, descontado o seu custo – é de incríveis 19% a 20% ao ano. Educação superior, no Brasil, é melhor do que qualquer investimento – e não precisa ser economista para ter esse conhecimento intuitivo. A idéia de que universidades, ou o sistema escolar como um todo, possam ser meras fábricas de diplomas é antiga. Sua formulação acadêmica já surgia na década de 70. Faz sentido imaginar que um empregador busque, no meio da incerteza do mercado de trabalho, um indicador para garantir a competência e a confiabilidade do futuro empregado. Um diploma seria esse indicador. A escola não agregaria muito em termos de conteúdo, mas seria mera ferramenta de sinalização, como que dizendo: “pode me contratar. Eu passei dez anos sem bater nas minhas professoras quando tirava nota baixa nem ficar pelado cada vez que me sentia atraído por uma coleguinha. Não vou espancá-lo se não me der um aumento, nem lhe causar processos de assédio sexual”. Se essa hipótese fosse correta, os salários das pessoas – com diploma e sem – tenderiam a seguir um padrão aleatório ao longo do tempo, à medida que a produtividade de cada uma determinasse seus ganhos. Em realidade, acontece exatamente o oposto: não só as pessoas com maior instrução recebem maiores salários ao longo de toda a vida como a diferença entre os com e os sem-instrução aumenta com o passar dos anos. O mercado de trabalho não paga maiores salários aos mais instruídos pela beleza do seu diploma: 40 41 Docência na Educação Superior FURB / SAPIENCEANOTAÇÕES Capítulo 1 Docência na Educação Superior ANOTAÇÕES paga mais porque essas pessoas vêm mais preparadas e aprendem mais com a sua experiência profissional. As reportagens e editoriais que reclamam dos bacharéis que viram donos de armazém cometem erro duplo: primeiro, ao retratarem a exceção como se fosse regra; segundo, por não entenderem que é preferível para o país ter um balconista com diploma superior a outro analfabeto. Os alunos que cursam faculdades ruins não estão sendo enganados nem vitimados. Estão dando duro para galgar o seu degrau na escada social, com poucos recursos
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