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1 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 1 Pneumologia Asma 1. Introdução – Aspectos Gerais ▪ A asma consiste em um quadro de inflamação crônica das vias aéreas, caracterizado pela obstrução variável do fluxo aéreo e pela hiperresponsividade brônquica. ▪ É uma doença que cursa com recorrentes episódios de exacerbação, nos quais há aumento progressivo de sintomas, como dispneia, tosse seca, sibilos, sensação de opressão torácica. Todos associados à redução da capacidade funcional pulmonar. ▪ Em geral, as crises asmáticas, ou seja, os processos de exacerbação são desencadeados por algum agente externo, como aeroalérgenos, cheiro forte ou até mesmo o frio. Nessas situações, por exemplo, ocorre a limitação do fluxo aéreo expiratório, uma vez que o brônquio se encontra constrito. ▪ Tal processo de limitação pode ser parcial ou totalmente reversível, sendo minorado a partir do uso de medicações, como os broncodilatadores. Figura 1 – Comparação entre brônquio saudável e brônquio obstruído por processo asmático. 2. Epidemiologia ▪ A asma é uma condição crônica bastante comum, afetando tanto crianças como adultos. ▪ No mundo, estima-se que afete até 300 milhões de pessoas, enquanto no Brasil, por exemplo, estima-se que sejam acometidas 20 milhões de pessoas, o que representa uma prevalência aproximada de 10%. ▪ Além disso, sabe-se que a asma é uma condição ligeiramente mais frequente em crianças do sexo masculino (< 14 anos) e em mulheres adultas. É importante, ainda, destacar que a asma apresenta forte componente hereditário, de modo que, um paciente apresenta 25% de chances de desenvolver asma, caso um de seus genitores seja asmático. 2 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 2 ▪ Fatores desencadeantes – tabagismo ativo e passivo; medicações; alimentos; ácaros; pelos de animais; baratas; mofo; polem; fungos; poluição; mudanças climáticas, etc. 3. Fisiopatologia ▪ O desenvolvimento da asma demanda a associação entre estímulos externos (ambientais, ocupacionais) e fatores genéticos, como a predisposição para exacerbada síntese de IgE em resposta, por exemplo, a agentes ambientais, ou seja, tem-se quadros de hiperresponsividade e de atopia. ▪ Via Alérgica - De modo geral, nos asmáticos existe predomínio de linfócitos Th2, que são responsáveis pela inflamação alérgica e que, por intermédio de citocinas, estimulam a proliferação de mastócitos, a síntese de IgE pelos linfócitos B e o recrutamento de linfócitos para a mucosa respiratória. ▪ Via Eosinofílica – Não há presença do processo alérgico, somente há atuação de citocinas especificas, como IL-13, IL-5 e IL-4, produzindo eosinófilos. ▪ Via Neutrofílica – Desencadeada, por exemplo, por poluentes, por tabagismo, por infecções, apresenta pior resposta ao tratamento e atua também por meio da ação de citocinas, que promovem broncoconstrição e processo inflamatório. Figura 2 – Fisiopatologia da asma e atuação de fármacos nas vias de resposta imunológica. ▪ Os agentes inflamatórios mais importantes na asma são a histamina, a bradicinina, as prostaglandinas, os leucotrienos e o fator de ativação plaquetária. Todos tendem a promover vasodilatação, edema de mucosa e broncoconstrição. Ademais, os leucotrienos também aumentam a síntese de muco e mitigam a atividade ciliar. 4. Fenótipos 3 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 3 ▪ Alérgica – Paciente com asma desde a infância, com histórico familiar de asma e com presença de associação a processos atópicos. Por exemplo, rinite alérgica e dermatite atópica. Atenção para presença de IgE e de eosinófilos aumentados. ▪ Não alérgico – Geralmente, são adultos sem atopia, porem com predomínio da via neutrofílica. Faz-se importante ressaltar que tais indivíduos apresentam baixa responsividade ao tratamento com corticoides inalatórios. ▪ Início tardio – Ocorre em adultos, tanto em homens quanto em mulheres, os quais podem ou não apresentar atopia associada. Respondem aos corticoides inalatórios, porem demandam doses mais elevadas do que o habitual para um paciente asmático. ▪ Limitação fixa ao fluxo aéreo – Nesse caso, a obstrução permanece fixa, mesmo após o uso de broncodilatadores. É um quadro muito semelhante ao que se observa na DPOC. Comum em pacientes que não trataram a asma durante longo período de tempo (vários anos), acarretando processo de remodelamento inflamatório fixo das vias aéreas inferiores. ▪ Obesidade – Pacientes com inflamação Eosinofílica, que respondem de modo insatisfatório aos corticoides inalatórios. Figura 3 – Fenótipos asmáticos associados a características e a marcadores imunológicos. 5. Quadro Clínico ▪ As manifestações mais comuns da asma são sibilância, dispneia, aperto no peito e tosse seca, especialmente no período noturno e ao acordar. ▪ Como já mencionado, os episódios podem ser desencadeados por múltiplos fatores, como exposição a poluentes, pela realização de atividade física, entre outros. ▪ Além disso, durante o episodio da crise asmática, é possível observar presença de taquipneia, de tiragem intercostal, de tiragem supraventricular, de batimento da asa nasal e de respiração abdominal no paciente. ▪ A asma pode ser classificada de acordo com o grau de gravidade das crises. Vejamos: ▪ Asma Intermitente – Sintomas 2 ou menos vezes na semana; despertar noturno 2 ou menos vezes na semana; necessidade de medicações de alivio 2 ou menos vezes na 4 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 4 semana; nenhuma limitação de atividade; uma ou nenhuma exacerbação durante o ano. VEF ou PFE ≥ 80% do previsto; variação do VEF1 ou PEF < 20%. ▪ Asma Persistente Leve – Sintomas > 2x/semana, porém não diariamente; despertares noturnos 3 a 4x/mês; necessidade de medicação de alivio menos de 2 vezes por semana; limitações das atividades somente nas crises; duas ou mais exacerbações ao ano. VEF ou PFE ≥ 80%; variação VEF1 ou PEF < 20-30%. ▪ Asma Persistente Moderada – Sintomas diários; despertar noturno ≥ 1x/semana; necessidade diária de medicação de alivio; limitação de atividades apenas nas crises; duas ou mais exacerbações por ano. VEF ou PFE 60 – 80%; VEF ou PEF > 30%. ▪ Asma Persistente Grave – Sintomas diários; despertar noturno quase diariamente; necessidade diária de medicação de alivio; duas ou mais exacerbações ao não. VEF1 ou PFE ≤ 60%; VEF1 ou PEF > 30%. Figura 4 – Classificação da asma antes do tratamento. ▪ Na tabela acima, tem-se a representação de como deve ser caracterizado a asma do paciente, de modo que possa ser prosseguido o tratamento mediante instituição da terapêutica mais adequada para cada caso. 5 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 5 ▪ Sumarizando, temos o seguinte: ▪ É importante ressaltar que esses parâmetros devem ser principalmente corresponde às últimas 4 semanas. ▪ Além da gravidade dos sintomas, é necessário que seja avaliado o controle da asma. Para tanto, utilizamos dois parâmetros: o controle dos sintomas e o risco futuro para eventos adversos. ➢ Controle dos Sintomas – De acordo com o GINA, avalia-se o paciente em 4 parâmetros relativos às ultimas 4 semanas. Figura 5 – Controle da asma: como classificar o paciente. ▪ Nenhum parâmetro – Asma controlada. ▪ 1 ou 2 parâmetros – Asma parcialmente controlada. ▪ ≥ 3 parâmetros – Asma não controlada. ➢ Fatores de Risco para Eventos Adversos – São fatores que devem ser avaliados tanto no momento do diagnostico quanto no subsequente acompanhamento do paciente, especialmente nos indivíduos que já apresentaram episódios de exacerbação. Deve-se realizar espirometria com medida do VEF1 logo ao inicio do tratamento. Em seguida, realizar novar espirometria com 3 a 6 meses e 6 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 6 manter acompanhamento período. Os fatores de risco aqui elencados são capazes de elevar o risco de exacerbações, mesmo que o paciente apresenteasma leve. Vejamos abaixo os principais fatores. ▪ Asma não controlada; ▪ Medicações – SABA (uso excessivo como resgate); Corticoide inalatório – baixa adesão e uso inadequado do dispositivo; ▪ Comorbidades – Obesidade, DRGE, Rinossinusite crônica, alergia alimentar; ▪ Exposições – Tabagismo, poluição aérea, aeroalérgenos; ▪ Contexto de Vida – Problemas psicossociais e socioeconômicos; ▪ Função Pulmonar – VEF < 60% do previsto; resposta acentuado a BD. ▪ Outros Parâmetros – Padrão de inflamação tipo 2; eosinofilia; ▪ Fatores de Risco Independentes – Intubação ou internação em UTI decorrente da asma e uma ou mais exacerbações no último ano. 6. Diagnóstico ▪ O diagnostico pode ser estabelecido a partir de critérios clínicos e funcionais, que serão obtidos pela anamnese, pelo exame físico e pela prova de função pulmonar (espirometria). Vejamos os principais achados de cada critério: ▪ Obs.: Em crianças de até 5 anos, diagnostico é predominantemente clinico, uma vez que a realização da espirometria nesses pacientes pode ser bastante difícil. ▪ Anamnese – Paciente relata episódios de tosse seca, de sibilância recorrente, de dispneia aos esforços, de aperto no peito, que piora a noite ou ao despertar e que são desencadeados por agente específicos, como fumaça, odores fortes e aeroalérgenos. Nessas situações, é fundamental investigar atopias, bem como o histórico parental do paciente. ▪ Exame Físico – Tende a ser inespecífico, caso o paciente não se encontra em crise ao momento do exame. Todavia, pode haver presença de sibilos difusos e de tosse. ▪ Espirometria – Fundamental para estabelecimento do diagnostico, para documentação da gravidade do quadro e para acompanhamento da asma do paciente. Vejamos os principais parâmetros da espirometria. ➢ VEF1 (Volume Expiratório Forçado no 1º Segundo) – Reduzido na crise asmática e também momentos após a crise. O aumento desse parâmetro após uso de broncodilatador configura critério diagnóstico. ➢ CVF (Capacidade Vital Forçada) – Pode estar diminuída ou não no paciente asmático. ➢ PEF (Pico de Fluxo Expiratório) ou Peak Flow – Consiste no maior fluxo gerado por esforço respiratório após inspiração máxima. ➢ VEF1/CVF (Índice de Tiffenau) – Define presença de doença obstrutiva. Encontra-se reduzido na asma. 7 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 7 ➢ FEF 25-75 (Fluxo Expiratório Forçado Entre 25 e 75%) – Bastante reduzido na asma, sendo o parâmetro com maior sensibilidade para diagnostico de asma e de DPOC. ➢ Critério Diagnóstico – Aumento de VEF1 > 12% e > 200ml em relação ao basal após 10-15min da administração do broncodilatador (200 a 400 mcg de Salbutamol ou de equivalente) ▪ Teste de Broncoprovocação – Mede a hiperresponsividade das vias aéreas a partir da inalação de substancias broncoconstritoras ou por meio de exercício físico. Utilizado quando a espirometria é normal, porém ainda há suspeita clínica. ▪ Medidas Seriadas de Pico de Fluxo Expiratório (PFE) – Medidas matutinas e vespertinas do PFE são realizadas ao longo de duas semanas. A diferença entre os valores matinais e vespertinos é dividida pelo maior valor e expressa em porcentagem. Variação diurnas > 20% são consideradas positivas para asma. Figura 6 – Exemplo de espirometria de paciente asmático. Note reduções dos parâmetros circulados. 7. Tratamento e Controle da Asma ▪ Não Farmacológico – Consiste principalmente na redução da exposição a fatores desencadeantes. Além disso, é importante orientar o paciente acerca da técnica de uso das medicações, do reconhecimento de sinais de alerta e de mudanças de estilo de vida, como a pratica de atividades físicas orientadas, que possam melhorar a qualidade de vida desse paciente. ▪ Farmacológico – Existem diversos medicamentos que podem ser utilizados para tratamento e para controle da asma. Vejamos os principais e algumas condutas de utilização deles. 8 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 8 ➢ Beta 2 Agonistas de Curta Duração (SABA) – Fármacos de escolha para reversão do broncoespasmo em crises asmáticas. Estimula a musculatura lisa dos brônquios, promovendo dilatação de inicio imediato. Exemplos – Salbutamol (AEROLIN); Fenoterol (BEROTEC); Terbutalina (BRICANYL). ➢ Beta 2 Agonistas de Longa Duração (LABA) – Efeito broncodilatador persiste por até 12h. Exemplos – Salmeterol; Formoterol (ALENIA). ➢ Corticoides Inalatórios (ICS) – Anti inflamatórios mais uteis para tratamento da asma crônica sintomática. Exemplos – Beclometasona (CLENIL); Budesonida (ALENIA); Fluticasona; Triancinolona. ➢ Corticoides Sistêmicos (CS) – Mais utilizados em pacientes com asma grave. Exemplos – Prednisona; Prednisolona. ➢ Anti Colinérgico de Curta Duração (SAMA) – Ipratrópio. ➢ Anti Colinérgico de Longa Duração (LAMA) – Tiotrópio. ▪ Conduta Inicial – Varia de acordo com o tipo de asma do paciente. Lembre-se sempre de classificar o paciente antes de iniciar o tratamento. Vejamos a conduta de acordo com cada etapa. ➢ Etapa 1 (Step 1): Sintomas ≤ 4x/semana – Formoterol (ALENA) + corticoide inalatório em baixas doses, conforme necessário. ➢ Etapa 2 (Step 2): Sintomas ≤ 4x/semana – Formoterol (ALENIA) + corticoide inalatório em baixas doses, conforme necessário. ➢ Etapa 3 (Step 3): Sintomas na maioria dos dias da semana OU despertar noturno ≥ 1x/semana – Formoterol (ALENIA) + corticoide inalatório em baixas doses (manutenção). ➢ Etapa 4 (Step 4): Sintomas na maioria dos dias da semana OU despertar noturno ≥ 1x/semana OU função pulmonar reduzida – Formoterol (ALENIA) + corticoide inalatório em doses moderadas (manutenção) ➢ Etapa 5 (Step 5): Refratariedade – Adicionar Tiotrópio + referenciar para avaliação fenotípica + anti IgE; anti IL5; anti IL4 + considerar Formoterol associado a ICS em doses altas. ▪ Conduta de Seguimento – Agora, vejamos o cenário de acompanhamento de um paciente já com asma diagnóstica e em tratamento estabelecido. ➢ De acordo com o GINA 2021, o controle e o resgate preferencial devem ser realizados com uso de FORMOTEROL + ICS. ➢ Etapa 1 + Etapa 2 – Formoterol + ICS baixa dose conforme necessário. ➢ Etapa 3 – Formoterol + ICS em baixa dose de manutenção. ➢ Etapa 4 – Formoterol + ICS em moderada dose de manutenção. ➢ Etapa 5 – Associar Tiotrópio + avaliação com pneumologista + imunobiológicos (anti IgE; anti IL5; anti IL4) + considerar Formoterol + ICS em altas doses de manutenção. 9 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 9 Figura 7 – Etapas do tratamento da asma – GINA 2021. ▪ Tão logo o diagnostico de asma é estabelecido, o tratamento com corticoide inalatório deve ser iniciado. Lembre-se que pacientes mesmo com asma leve podem desenvolver exacerbações severas e, nesse cenário, baixas doses de ICS reduzem o risco de morte de hospitalização, além de reduzir e de prevenir novas crises. ▪ Todo paciente que inicia o tratamento medicamentoso da asma deve ser reavaliado em 2 a 3 meses. Posteriormente, pode-se que essa avaliação seja realizada em 3 a 12 meses, dependendo do contexto clinico do paciente. ▪ Obs.: Em gestante, a avaliação deve ser realizada em 4 a 6 semanas. ▪ Resposta Terapêutica – Avaliação ➢ Inicialmente, deve-se avaliar a técnica de inalação do paciente (caso use algum dispositivo); avaliar o controle ambiental (presença de aeroalérgenos, de poluentes, etc.); avaliar a adesão terapêutica e a presença de fatores de risco/comorbidades associadas. ➢ O step up deve ser realizado se os sintomas e/ou as exacerbações persistirem após 2-3 meses de tratamento medicamentoso. ➢ O step down deve ser realizado quando se obtém um controle da asma por 3 meses. Em geral, faz-se redução de 25 a 50% da dose do ICS+LABA em intervalos de 2 a 3 meses. ➢ Obs.: O tratamento com ICS nunca deve ser interrompido completamente em adultos/adolescentes. 10 Helano Brilhante – Med79 - UFCG 10Figura 8 – Gravidade da asma e conduta de manutenção a ser adotada. 8. Referências Bibliográficas 1. Global Initiative for Asthma. Global Strategy for Asthma Management and Prevention, 2021. 2. Brasil, Ministério da Saúde. Secretaria de atenção à saúde. Protocolo clinico e diretrizes terapêuticas: Asma. Brasília, 2013. 3. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia para o Manejo da Asma. Jornal Brasileiro de Pneumologia, 2020.