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Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 10: TANATOLOGIA FORENSE PART2 1 1. Introdução Tanatologia Forense é a parte da Medicina Legal que se ocupa da morte e dos problemas médico-legais com ela relacionados, naquilo que possa interessar ao Direito (BENFICA E VAZ, 2008, p. 121). Conforme a própria etimologia que seu nome indica – tanathos, morte, e logos, estudo, ou seja, está ciência aborda o diagnóstico da realidade da morte, a causa da morte (causa mortis médica), a maneira da morte (causa mortis jurídica), o mecanismo da morte, o momento em que ocorreu, assim como outros elementos relacionados ao óbito, restos mortais, e as evidências que transmitem (VANRELL, 2004, p. 29). Bina (2014, p. 18) define Tanatologia Forense como “a ciência que estuda a morte e os efeitos desta, destacando-se o estudo das fases da putrefação e decomposição do corpo”. E é por meio dela que o investigador perito médico poderá identificar informações relevantes como o local e data, precisamente, da morte de um indivíduo. O objeto de estudo da tanatologia não se restringe apenas em morte, mas sim em sua evolução, dos efeitos imediatos aos mais tardios. O médico legista apresentará informações importantes na investigação criminal, como há quanto tempo se deu a morte, em quais condições, onde o corpo se encontrava, dentre outras particularidades (BINA, 2014, p. 254). A Tanatognose é o segmento da Tanatologia Forense que compreende o diagnóstico da realidade da morte. Este diagnóstico se torna mais difícil quanto mais próximo o momento da morte, pois antes do surgimento dos fenômenos transformativos do cadáver, não existe sinal patognomônico de morte. Deverá o perito observar dois tipos de fenômenos cadavéricos: os abióticos, avitais ou vitais negativos, imediatos e consecutivos, e os transformativos, destrutivos ou conservadores (CROCE E CROCE JÚNIOR, 2010, p. 465). Cronotanatognose é o procedimento realizado pelo médico legista em que é constatada a hora estimada da morte, sendo observados os fenômenos cadavéricos (BINA, 2014, p. 265). Tais determinações são baseadas nos prazos em que se processam os fenômenos transformativos, destrutivos ou conservadores que podem ser encontrados no cadáver. Para o Código Civil, este procedimento é de suma importância quando há mortes muito próximas, prevalecendo-se de dois critérios: premoriência (sequência legalmente presumida) e comoriência (falecimentos simultâneos) (BRASIL, 2002). A determinação da cronologia de mortes muito próximas, quando possível, possui extrema relevância em questões sucessórias, e por essa razão, a lei civil não permite presunção no sentido da premoriência. No entanto, se o exame pericial determinar, sem dúvida alguma, aquele que veio a óbito primeiro, estabelece-se a ordem sucessória em favor de seus descendentes, caso contrário, a comoriência será presumida (DEL-CAMPO, 2005, p. 247). O artigo 8º do Código Civil trata sobre a comoriência, fazendo possível sua presunção, caso a perícia não chegue a um laudo conclusivo: “Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos” (BRASIL, 2002). França (2017, p. 1170) chama de “Sobrevivência” o período que decorre desde o evento danoso até a morte. Ou seja, os últimos momentos de vida que precedem a morte. A perícia deve manter-se em volta dos meios que esclarecem as condições da morte e sua causa determinante, dedicando-se para isso a necropsia e os exames subsidiários. Pode ter importância relativa o exame de local dos fatos, que através de um estudo cuidadoso do ambiente, da posição do cadáver, da ausência ou não de meios nocivos e vestígios de luta, é um elemento fundamental de esclarecimento; e a informação testemunhal, que embora não seja fundamental à ação pericial, constitui peça valiosa na marcha do processo ou das averiguações oficiais (FRANÇA, 2017, p. 1170). Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 10: TANATOLOGIA FORENSE PART2 2 Não obstante, embora haja tentativa, é improvável determinar, entre várias vítimas de um evento infortunístico, qual a sequência cronológica em que se sucederam os óbitos. E para esta situação, será estabelecida a comoriência, a qual é ocorrência da morte simultânea de duas ou mais pessoas (VANRELL, 2004, p. 208). A importância desse estudo ultrapassa o foco nas soluções de questões civis ligadas à premoriência e comoriência no interesse na sucessão, incluindo também em determinar-se a responsabilidade criminal (FRANÇA, 2017, p. 1132). O calendário tanatológico permite a aproximação entre uma faixa de tempo segura e possível, incluindo o real momento da morte. Em posse destas informações, é possível evitar a prisão de um inocente ou a liberação de um culpado, de forma que o álibi garanta que esteja a salvo da estreita faixa delimitada pela perícia. É importante destacar que há variáveis que interferem neste processo, acelerando, retardando ou distorcendo o ritmo, e até impedindo, natural ou artificialmente, o curso com que se processam os fenômenos cadavéricos (VANRELL, 2004, p. 181-182). Tanto a tanatognose quanto a cronotanatognose baseiam-se nos chamados fenômenos cadavéricos. Cronatanatognose → (do grego, kronos = tempo, thanatos = morte e gnosis = conhecimento) é o capítulo da Tanatologia que estuda os meios de determinação do tempo transcorrido entre a morte e o exame necroscópico. A cronotanatognose trata-se de estudar os fenômenos cadavéricos que acontecem no corpo humano após a morte. 2. Conceito Cessação de fenômenos vitais, pela parada das funções cerebral, respiratória e circulatória. ❖ Tríade de Thoinot → Imobilidade, ausência de respiração e ausência de circulação (critérios de morte aparente) Fenômenos que surgem após a morte ❖ Abióticos, avitais ou vitais negativos ➢ Imediatos ➢ Consecutivos ❖ Transformativos ➢ Tafonomia → Estudo da transição dos restos biológicos a partir da morte até a fossilização ➢ Transformativos destrutivos Autólise Putrefação Maceração ➢ Transformativos conservadores Mumificação Saponificação Calcificação Corificação 3. CPP – Decreto de Lei nº 3.689 de 03 de outubro de 1941 Art. 162. A autópsia será feita pelo menos seis horas depois do óbito, salvo se os peritos, pela evidência dos sinais de morte, julgarem que possa ser feita antes daquele prazo, o que declararão no auto. Parágrafo único. Nos casos de morte violenta, bastará o simples exame externo do cadáver, quando não houver infração penal que apurar, ou quando as lesões externas Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 10: TANATOLOGIA FORENSE PART2 3 permitirem precisar a causa da morte e não houver necessidade de exame interno para a verificação de alguma circunstância relevante 4. Fenômenos abióticos imediatos Perda de consciência Perda de sensibilidade Sensibilidade geral Sensibilidade especial Abolição da motilidade e do tono muscular Face hipocrática Relaxamento muscular → Dilatação pupilar, abertura das pálpebras, relaxamento esfincteriano, abertura da boca Cessação da respiração Ausência dos murmúrios vesiculares Cessação da circulação Cessação da atividade cerebral 5. Fenômenos abióticos consecutivos Desidratação cadavérica ❖ Decréscimo do peso ❖ Pele apergaminhada ❖ Dessecamento de mucosas dos lábios ❖ Modificação dos globos oculares ➢ Sinal de Louis → Perda da tensão compressiva do globo ocular pela ausência do humor vítrio, deixando uma depressão no globo ocular ➢ Sinal de Sommer e Larcher → Visualização da coroide; mancha acastanhada ➢ Sinal de Stenon-Louis → Opacificação ocular Esfriamento cadavérico (Algor mortis) ❖ Perda de meio grau/hora nas primeiras 3 horas ❖ Perda de 1 grau/hora nas 6 a 8 horas seguintes❖ Atinje temperatura do ambiente em 20 a 24 horas ❖ 20ºC, incompatível com a vida *O esfriamento do cadáver é um dos fenômenos abióticos imediatos que podem ser utilizados – com grandes ressalvas, e que sói ser útil apenas pela sua praticidade – na estimativa aproximada do momento da morte. Com efeito, sabe-se que o corpo, uma vez cessadas as funções vitais, passa a perder calor, por diversos mecanismos – convecção, condução, irradiação e evaporação –, à razão de 1,0ºC a 1,5ºC por hora, igualando em termos gerais, a temperatura do ambiente, no máximo, até a 24ª hora após o decesso. Manchas de hipóstase (Livor mortis) ❖ Início → 2 a 3h após o óbito ❖ Fixação →12 h após o óbito ❖ Duração → Até putrefação (cerca de 24h) ❖ Diferenciação entre equimose (rotura do vaso após o trauma extravasado) e hematoma (coleção após rotura do vaso após o trauma) X hipóstase (apenas saída do sangue dos vasos) *Começam a aparecer sob a forma de um pontilhado (sugilações), cujos elementos coalescem para formar placas de cor variável, dentro das nuanças vermelho-arroxeadas, dependendo da Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 10: TANATOLOGIA FORENSE PART2 4 causa mortis. Desaparecem pela compressão, inclusive digital, recurso que serve para diferenciá- las das equimoses, que são constantes. Os livores cadavéricos são difíceis de observar nas pessoas melanodermas ou, mesmo, faiodermas; podem não ser observáveis mesmo em leuco ou xantodermas, quando nessas pessoas o óbito ocorre em condições de anemia aguda após hemorragias maciças; e podem observar-se ainda em vida, na fase agônica ou terminal, em pessoas extremamente debilitadas e com hipotensão arterial. Rigidez cadavérica (Rigor mortis) ❖ Início → 1 a 2h após o óbito ❖ Pico → 8h após o óbito ❖ Duração → Até a putrefação (cerca de 24h) ❖ Sentido → Craniocaudal que se faz e se desfaz (Lei de Nysten) *Também a rigidez cadavérica poderá ser útil para aquilatar o tempo transcorrido desde o óbito, lembrando que, à semelhança do que ocorre com o esfriamento do corpo, muitos são os fatores que podem, ora acelerá-la (frio), ora retardá-la (calor), razão pela qual nunca deverá ser assumida como valor absoluto, mas apenas como orientação. Regra de Bonnet – A rigidez se inicia logo após a morte, atingindo o seu total desenvolvimento até a 15ª hora, e depois desaparece lentamente. Acaba quando os fenômenos destrutivos, de putrefação, se instalam. Regra de Fávero – O processo se inicia logo na primeira hora e se generaliza após 2 a 3 horas, atingindo o seu máximo depois de 5 a 8 horas. Regra de Niderkorn – Considera-se precoce a rigidez que ocorre até a 3ª hora; é normal entre a 3ª e 6ª horas; diz tardia quando sobrevém entre a 6ª e 9ª horas; por fim, chama-se de muito tardia quando ocorre depois da 9ª hora. *Reação de Chambert – Presença de grande quantidade de proteínas do plasma no líquido existente na bolha indica lesão durante a vida; pequena quantidade ou ausência de proteínas plasmáticas no interior das bolhas indica lesão após a morte; diagnóstico diferencial de queimadura; não muito utilizada na prática 6. Fenômenos transformantes destrutivos Autólise → Destruição das células pela ação de enzimas Putrefação ❖ Fatores influenciadores ➢ Condição individual ➢ Causa mortis ➢ Local de decomposição do corpo ❖ Evolução da putrefação ➢ Período cromático ou de coloração Mancha verde → Entre 18 e 24 horas após a morte ➢ Período gasoso ou enfisematoso Posição de lutador → Ocorre pela produção de gases de dentro para fora causando um aumento de tensão interna, bem como a modificação o comportamento posicional do corpo Projeção de olhos e língua, distensão abdominal, prolapsos intestinal e uterino, parto post mortem Circulação póstuma de Brouardel → Assemelha-se a circulação portal; os vários gases de putrefação, progressivamente aumentados, empurram o sangue que desceu para as regiões de maior declive, de volta às porções mais elevadas do corpo; surge o Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 10: TANATOLOGIA FORENSE PART2 5 desenho das veias novamente contendo sangue, agora putrefeito; indica a fase de gaseificação em ação Destacamento epidérmico Fogo fátuo → Combustão do gás produzido pela decomposição tendo a coloração esverdeada ➢ Período coliquativo ou de liquefação ➢ Período de esqueletização ❖ Fauna cadavérica Maceração ❖ Maceração asséptica → Cadáver do feto no útero materno (a partir do quinto mês) ❖ Maceração séptica → Afogamento 7. Fenômenos transformativos conservadores Mumificação ❖ Classificação ➢ Natural ➢ Artificial ➢ Mista ❖ Fatores influenciadores ➢ Local de exposição do cadáver ➢ Fatores individuais ➢ Causa mortis ❖ Características do cadáver Saponificação (ou adipocera) ❖ Mais comumente é parcial, em áreas com maior quantidade de gordura ❖ Fatores influenciadores ➢ Local de exposição do cadáver → Principalmente em solos argilosos ➢ Fatores individuais ➢ Causa mortis Calcificação ❖ “Petrificação” do corpo ❖ Litopédio Corificação ❖ Raro, visto no uso de urnas metálicas fechadas hermeticamente ❖ Ocorre por inibição dos fenômenos transformativos ❖ Pele com cor e aspecto de couro curtido Congelação → Preservação do cadáver por longo tempo Fossilização → Raro, preservação da forma sem preservar a estrutura orgânica 8. Lesões antemortem x lesões postmortem Antemortem → Infiltração de sangue nos tecidos Postmortem → Sem infiltração de sangue nos tecidos 9. Estimativa do tempo de morte – cronotanatognose Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 10: TANATOLOGIA FORENSE PART2 6 Referências bibliográficas Aula de Dra. Adriana Mello (04/11/2021) Pareta, J. M. M. (1992). Tanatologia Forense. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, 87, 239-252. de OLIVEIRA, E. R., de Miranda ARAÚJO, C. G., & BARROS, S. M. M. TANATOLOGIA FORENSE E O CIRURGIÃO-DENTISTA. Prova MaterialISSN 1679-818X, 5. Santos, A. (2003). Tanatologia forense. Medicina Legal. Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Porto. ADEGAS, N., & COXE, R. TANATOLOGIA FORENSE: A IMPORTÂNCIA DESTA CIÊNCIA COMO MEIO DE PROVA PERICIAL NO ÂMBITO JURÍDICO FORENSIC TANATOLOGY: THE IMPORTANCE OF THIS SCIENCE AS A MEANS OF EXPERT EVIDENCE IN THE LEGAL FRAMEWORK. Galdioli, L., Ferraz, C. P., Delai, R. R., Freitas, A. R., Hartamann, G., & Garcia, R. D. C. M. Infográfico Tanatologia Forense-Cronologia da Morte.
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