Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 DISCIPLINA: DIREITO CIVIL I PROFESSOR(A): Petrucia Danielle Assunto: DAS PESSOAS JURÍDICAS 1. DAS PESSOAS JURÍDICAS A razão de ser da pessoa jurídica está na necessidade ou conveniência de os indivíduos unirem esforços e utilizarem recursos coletivos para a realização de objetivos comuns, que transcendem as possibilidades individuais. Essa constatação motivou a organização de pessoas e bens com o reconhecimento do direito, que atribui personalidade ao grupo, distinta da de cada um de seus membros, passando este a atuar, na vida jurídica, com personalidade própria. A necessária individualização, com efeito, “só se efetiva se a ordem jurídica atribui personalidade ao grupo, permitindo que atue em nome próprio, com capacidade jurídica igual à das pessoas naturais”. Surge, assim, “a necessidade de personalizar o grupo, para que possa proceder como uma unidade, participando do comércio jurídico com individualidade”. A pessoa jurídica é, portanto, proveniente desse fenômeno histórico e social. Consiste num conjunto de pessoas ou de bens dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei para a consecução de fins comuns. Pode-se afirmar, pois, que pessoas jurídicas são entidades a que a lei confere personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direitos e obrigações. 1.1 Principal característica A principal característica das pessoas jurídicas é a de que atuam na vida jurídica com personalidade diversa da dos indivíduos que as compõem (CC, art. 50,a contrario sensu, e art. 1.024). A nota distintiva repousa, pois, na distinção entre o seu patrimônio e o dos seus instituidores, não se confundindo a condição jurídica autonomamente conferida àquela entidade com a de seus criadores. Em vista disso, não podem, em regra, ser penhorados bens dos sócios por dívida da sociedade. 1.2 Natureza Jurídica 2 Embora subsistam teorias que negam a existência da pessoa jurídica (teorias negativistas), não aceitando possa uma associação formada por um grupo de indivíduos ter personalidade própria, outras, em maior número (teorias afirmativistas), procuram explicar esse fenômeno pelo qual um grupo de pessoas passa a constituir uma unidade orgânica, com individualidade própria reconhecida pelo Estado e distinta das pessoas que a compõem. As diversas teorias afirmativistas existentes podem ser reunidas em dois grupos: a) o das teorias da ficção; e b) o das teorias da realidade. Temos, assim, a seguinte situação: Teorias da ficção As concepções ficcionistas, que são em grande número, desfrutaram largo prestígio no século XIX. Teoria da ficção legal — desenvolvida por Savigny, considera a pessoa jurídica uma criação artificial da lei, um ente fictício, pois somente a pessoa natural pode ser sujeito da relação jurídica e titular de direitos subjetivos. Desse modo, só entendida como uma ficção pode essa capacidade jurídica ser estendida às pessoas jurídicas, para fins patrimoniais. Constrói-se, desse modo, uma ficção jurídica, uma abstração que, diversa da realidade, assim é considerada pelo ordenamento jurídico. Teoria da ficção doutrinária — afirmam os seus adeptos, dentre eles Vareilles- Sommières, que a pessoa jurídica não tem existência real, mas apenas intelectual, ou seja, na inteligência dos juristas, sendo assim uma mera ficção criada pela doutrina. É uma variação da anterior. OBS: As teorias da ficção não são, hoje, aceitas. A crítica que se lhes faz é a de que não explicam a existência do Estado como pessoa jurídica. Teorias da realidade - Para os defensores da teoria da realidade, que representa uma reação contra a teoria da ficção, as pessoas jurídicas são realidades vivas, e não mera abstração, tendo existência própria como os indivíduos. Divergem os seus adeptos apenas no modo de apreciar essa realidade, dando origem a várias concepções, dentre as quais se destacam as seguintes: Teoria da realidade objetiva ou orgânica — sustenta que a pessoa jurídica é uma realidade sociológica, ser com vida própria, que nasce por imposição das forças sociais. De origem germânica (Gierke e Zitelmann), proclama que a vontade, pública ou privada, é capaz de dar vida 3 a um organismo, que passa a ter existência própria, distinta da de seus membros, capaz de tornar- se sujeito de direito, real e verdadeiro. Teoria da realidade jurídica ou institucionalista — defendida por Hauriou, assemelha-se à da realidade objetiva pela ênfase dada ao aspecto sociológico. Considera as pessoas jurídicas como organizações sociais destinadas a um serviço ou ofício e, por isso, personificadas. Parte da análise das relações sociais, não da vontade humana, constatando a existência de grupos organizados para a realização de uma ideia socialmente útil, as instituições, sendo estas grupos sociais dotados de ordem e organização próprias. Teoria da realidade técnica — entendem seus adeptos, especialmente Saleilles, que a personificação dos grupos sociais é expediente de ordem técnica, a forma encontrada pelo direito para reconhecer a existência de grupos de indivíduos que se unem na busca de fins determinados. A personificação é atribuída a grupos em que a lei reconhece vontade e objetivos próprios. O Estado, reconhecendo a necessidade e a conveniência de que tais grupos sejam dotados de personalidade própria para poder participar da vida jurídica nas mesmas condições das pessoas naturais, outorga-lhes esse predicado. A personalidade jurídica é, portanto, um atributo que o Estado defere a certas entidades havidas como merecedoras dessa benesse por observarem determinados requisitos por ele estabelecidos. 1.3 Requisitos Para A Constituição Da Pessoa Jurídica A formação da pessoa jurídica exige uma pluralidade de pessoas ou de bens e uma finalidade específica (elementos de ordem material), bem como um ato constitutivo e respectivo registro no órgão competente (elemento formal). Pode-se dizer que são três os requisitos para a constituição da pessoa jurídica, como se pode verificar no gráfico a seguir: • Vontade humana criadora A vontade humana, que significa a intenção de criar uma entidade distinta da de seus membros, materializa-se no ato de constituição, que deve ser escrito. São necessárias duas ou mais pessoas com vontades convergentes, ligadas por uma intenção comum (affectio societatis). OBS: MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL – MEI. • Observância das condições legais: elaboração e registro do ato constitutivo O ato constitutivo é requisito formal exigido pela lei e se denomina: estatuto, em se tratando de associações, que não têm fins lucrativos; 4 • contrato social, no caso de sociedades, simples ou empresárias, antigamente denominadas civis e comerciais; e • escritura pública ou testamento, em se tratando de fundações (CC, art. 62). O ato constitutivo deve ser levado a registro para que comece, então, a existência legal da pessoa jurídica de direito privado (CC, art. 45). Antes do registro, não passará de mera “sociedade de fato” ou “sociedade não personificada”, equiparada por alguns ao nascituro, que já foi concebido, mas que só adquirirá personalidade se nascer com vida. No caso da pessoa jurídica, se o seu ato constitutivo for registrado. O registro será precedido, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo. • Licitude de seu objetivo A licitude de seu objetivo é indispensável para a formação da pessoa jurídica. Deve ele ser, também, determinado e possível. Nas sociedades em geral, civis ou comerciais, o objetivo é o lucro pelo exercício da atividade. Nas fundações, os fins só podem ser: “I — assistência social; II — cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; III — educação; IV — saúde; V — segurança alimentar e nutricional; VI — defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável;VII — pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos; VIII — promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos; IX — atividades religiosas” (CC, art. 62, parágrafo único, com redação dada pela Lei n. 13.151/2015). E nas associações, de fins não econômicos (art. 53), os objetivos colimados são de natureza cultural, educacional, esportiva, religiosa, filantrópica, recreativa, moral etc. Objetivos ilícitos ou nocivos constituem causa de extinção da pessoa jurídica (art. 69). 1.4 Começo da existência legal O ato constitutivo - O impulso volitivo, coletivo nas associações e sociedades e individual nas fundações, formaliza-se no ato constitutivo, como já dito, que pode ser contrato social ou estatuto, de acordo com a espécie de pessoa jurídica a ser criada (conforme tenha ou não fins lucrativos — CC, art. 981). Essa manifestação anímica deve observar os requisitos de validade dos negócios jurídicos exigidos no art. 104 do Código Civil . A declaração de vontade pode revestir-se de forma pública ou particular (CC, art. 997), exceto no caso das fundações, que só podem ser criadas por escritura pública ou testamento (CC, art. 62). Certas pessoas jurídicas, por estarem ligadas a interesses de ordem coletiva, ainda dependem, como visto, de prévia autorização ou aprovação do Governo 5 Federal, como empresas estrangeiras, agências ou estabelecimentos de seguros, caixas econômicas, cooperativas, instituições financeiras, sociedades de exploração de energia elétrica, de riquezas minerais, de empresas jornalísticas etc. (CF, arts. 21, XII, b; 192, I, II, IV; 176, § 1º; e 223). O registro do ato constitutivo - A existência legal, no entanto, das pessoas jurídicas de direito privado só começa efetivamente com o registro de seu ato constitutivo no órgão competente. Dispõe, com efeito, o art. 45 do Código Civil: “Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo”. O registro do contrato social de uma sociedade empresária faz-se na Junta Comercial, que mantém o Registro Público de Empresas Mercantis. Os estatutos e os atos constitutivos das demais pessoas jurídicas de direito privado são registrados no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, como dispõem os arts. 1.150 do Código Civil e 114 e s. da Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015/73). A capacidade jurídica adquirida com o registro estende-se a todos os campos do direito, não se limitando à esfera patrimonial. O art. 52 do Código Civil dispõe, com efeito, que “a proteção aos direitos da personalidade” aplica-se às pessoas jurídicas. Têm, portanto, direito ao nome, à boa reputação, à própria existência, bem como a serem proprietárias e usufrutuárias (direitos reais), a contratarem (direitos obrigacionais) e adquirirem bens por sucessão causa mortis. Os direitos e deveres das pessoas jurídicas decorrem dos atos de seus diretores no âmbito dos poderes que lhes são concedidos no ato constitutivo. Preceitua o art. 47 do Código Civil a propósito: “Art. 47. Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo.” O cancelamento do registro da pessoa jurídica: O direito de anular a sua constituição por defeito do ato respectivo pode ser exercido dentro do prazo decadencial de três anos, contado da publicação e sua inscrição no registro (art. 45, parágrafo único). 2. SOCIEDADES IRREGULARES OU DE FATO Sem o registro de seu ato constitutivo, a pessoa jurídica será considerada irregular, mera associação ou sociedade de fato, sem personalidade jurídica, ou seja, mera relação contratual disciplinada pelo estatuto ou contrato social. O novo Código Civil disciplina a sociedade irregular ou de fato, no livro concernente ao direito de empresa, como “sociedade não personificada”. 6 Dispõe, inicialmente, o art. 986 do referido diploma: “Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples.” 3. GRUPOS DESPERSONALIZADOS Nem todo grupo social constituído para a consecução de fim comum é dotado de personalidade. Alguns, malgrado possuam características peculiares à pessoa jurídica, carecem de requisitos imprescindíveis à personificação. Reconhece-se-lhes o direito, contudo, na maioria das vezes, da representação processual. A lei prevê, com efeito, certos casos de universalidades de direito e de massas de bens identificáveis como unidade que, mesmo não tendo personalidade jurídica, podem gozar de capacidade processual e ter legitimidade ativa e passiva para acionar e serem acionadas em juízo. São entidades que se formam independentemente da vontade dos seus membros ou em virtude de um ato jurídico que os vincule a determinados bens, sem que haja a affectio societatis. O Código Civil considera universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico (art. 91). O Código de Processo Civil determina a representação processual, dentre outras: • da massa falida pelo administrador judicial; • da herança jacente ou vacante pelo seu curador; • do espólio pelo inventariante; • da sociedade e da associação irregulares e outros entes organizados sem personalidade jurídica pela pessoa a quem couber a administração dos seus bens; e • do condomínio pelo administrador ou pelo síndico (art. 75, V, VI, VII, IX e X). A jurisprudência também admite que os consórcios e os vários fundos existentes no mercado de capitais (fundos de ações, de pensão, de imóveis) possam ser representados em juízo pelos seus administradores. Dentre os diversos grupos despersonalizados, destacam-se: • A família: indubitavelmente a mais importante entidade não personificada. • A massa falida: assim passa a ser denominado o acervo de bens pertencentes ao falido (massa falida objetiva), após a sentença declaratória de falência decretando a perda do direito à administração e à disposição do referido patrimônio, bem como o ente despersonalizado voltado à defesa dos interesses gerais dos credores (massa falida subjetiva). 7 • As heranças jacente e vacante: disciplinadas nos arts. 1.819 a 1.823 do Código Civil, constituem o conjunto de bens deixados pelo de cujus, enquanto não entregue a sucessor devidamente habilitado. Quando se abre a sucessão sem que o de cujus tenha deixado testamento e não há conhecimento da existência de algum herdeiro, diz-se que a herança é jacente (art. 1.819). • O espólio: é o complexo de direitos e obrigações do falecido, abrangendo bens de toda natureza. Essa massa patrimonial não personificada surge com a abertura da sucessão, sendo a princípio representada no inventário, ativa e passivamente, pelo administrador pelo provisório, até a nomeação do inventariante (CPC, arts. 614 e 75, VII), sendo identificada como uma unidade até a partilha, com a atribuição dos quinhões hereditários aos sucessores (CPC, arts. 618 e 655). Com o julgamento da partilha, cessa a comunhão hereditária, desaparecendo a figura do espólio, que será substituída pelo herdeiro a quem coube o direito ou a coisa. Segue-se daí que o espólio não tem legitimidade para propor ação depois de julgada a partilha. • As sociedades e associações sem personalidade jurídica: denominadas sociedades de fato ou irregulares, serão representadas em juízo, ativa e passivamente, “pela pessoa a quem couber a administração dos seusbens” (CPC, art. 75, IX). São as entidades já criadas e em funcionamento que, no entanto, não têm existência legal, por falta de registro no órgão competente ou por falta de autorização legal (CC, art. 986), estudadas no item anterior. • O condomínio: pode ser geral (tradicional ou comum) e edilício (CC, arts. 1.314 a 1.358). O primeiro, sem dúvida, não tem personalidade jurídica. Não passa de propriedade comum ou copropriedade de determinada coisa, cabendo a cada condômino uma parte ideal. Diverge a doutrina, no entanto, no tocante à natureza jurídica do condomínio em edificações, também chamado de edilício ou horizontal. Expressiva corrente lhe nega a condição de pessoa jurídica, dela fazendo parte, dentre outros, Caio Mário da Silva Pereira e João Batista Lopes, autores de consagradas monografias sobre o tema. Outros autores, todavia, a admitem, principalmente pelo fato de a Lei n. 4.591/94 dispor, no art. 63, § 3º, que, “no prazo de 24 horas após a realização do leilão final, o condomínio, por decisão unânime da Assembleia Geral em condições de igualdade com terceiros, terá preferência na aquisição dos bens, caso em que serão adjudicados ao condomínio”. Tal dispositivo vem sendo entendido como admissão implícita da personalidade do condomínio, autorizando-o a tornar-se proprietário dos bens adjudicados, como assevera Maria Helena Diniz. 8 4. CLASSIFICAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA 5. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA O ordenamento jurídico confere às pessoas jurídicas personalidade distinta da dos seus membros. Esse princípio da autonomia patrimonial possibilita que sociedades empresárias sejam utilizadas como instrumento para a prática de fraudes e abusos de direito contra credores, acarretando-lhes prejuízos. Pessoas inescrupulosas têm-se aproveitado desse princípio com a intenção de se locupletarem em detrimento de terceiros, utilizando a pessoa jurídica como uma espécie de “capa” ou “véu” para proteger os seus negócios escusos. A reação a esses abusos ocorreu em diversos países, dando origem à teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Permite tal teoria que o juiz, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere o princípio de que as pessoas jurídicas têm existência distinta da de seus membros e os efeitos dessa autonomia para atingir e vincular os bens particulares dos sócios à satisfação das dívidas da sociedade (erguendo-se o véu da personalidade jurídica). Como bem esclarece fábio ulhoa coelho, “a decisão judicial que desconsidera a personalidade jurídica da sociedade não desfaz o seu ato constitutivo, não o invalida, nem importa a sua dissolução. Trata, apenas e rigorosamente, de suspensão episódica da eficácia desse ato. Quer dizer, a constituição da 9 pessoa jurídica não produz efeitos apenas no caso em julgamento, permanecendo válida e inteiramente eficaz para todos os outros fins... Em suma, a aplicação da teoria da desconsideração não importa dissolução ou anulação da sociedade”. IMPORTANTE!!!!! Cumpre distinguir, pois, despersonalização de desconsideração da personalidade jurídica. A primeira acarreta a dissolução da pessoa jurídica ou a cassação da autorização para seu funcionamento, enquanto na segunda “subsiste o princípio da autonomia subjetiva da pessoa coletiva, distinta da pessoa de seus sócios ou componentes, mas essa distinção é afastada, provisoriamente e tão só para o caso concreto”. 5.1 As Teorias “Maior” E “Menor” Da Desconsideração A doutrina e a jurisprudência reconhecem a existência, no direito brasileiro, de duas teorias da desconsideração: • A teoria maior, que prestigia a contribuição doutrinária e em que a comprovação da fraude e do abuso por parte dos sócios constitui requisito para que o juiz possa ignorar a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas; • A teoria menor, que considera o simples prejuízo do credor motivo suficiente para a desconsideração. Esta última não se preocupa em verificar se houve ou não utilização fraudulenta do princípio da autonomia patrimonial, nem se houve ou não abuso da personalidade. Se a sociedade não possui patrimônio, mas o sócio é solvente, isso basta para responsabilizá-lo por obrigações daquela. Nessa linha, têm os tribunais determinado a desconsideração da personalidade jurídica nos casos em que a promiscuidade patrimonial é demonstrada, autorizando a penhora de bens dos sócios, pois se trata de eloquente indicativo de fraude. A doutrina, em geral, considera, no entanto, que o art. 28 e § 5º do Código de Defesa do Consumidor, o art. 4º da Lei do Meio Ambiente e o art. 18 da Lei Antitruste adotaram a teoria menor, contentando-se com a demonstração do mero prejuízo do credor para o deferimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica. A desconsideração da pessoa jurídica exige, em verdade, comprovação de fraude, abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial para que se aplique a mencionada teoria, não se podendo aceitar como tal a mera insolvência da pessoa jurídica ou dissolução irregular da empresa. Teoria Maior adotada pelo Código Civil. A propósito, proclamou o Superior Tribunal de Justiça que o fato de o credor não ter recebido seu crédito frente à sociedade, em decorrência de insuficiência do patrimônio social, não 10 é requisito bastante para autorizar a desconsideração da pessoa jurídica. A excepcionalidade da aplicação da aludida teoria vem reconhecida no Enunciado 146 da II Jornada de Direito Civil do Conselho Nacional de Justiça, segundo o qual: “Nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no art. 50” 5.2 Desconsideração inversa Caracteriza-se a desconsideração inversa quando é afastado o princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar a sociedade por obrigação do sócio, por exemplo, na hipótese de um dos cônjuges, ao adquirir bens de maior valor, registrá-los em nome de pessoa jurídica sob seu controle para livrá-los da partilha a ser realizada nos autos da separação judicial. Ao se desconsiderar a autonomia patrimonial, será possível responsabilizar a pessoa jurídica pelo devido ao ex-cônjuge do sócio. 6. RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS JURÍDICAS A responsabilidade jurídica por danos em geral pode ser penal e civil. A primeira é prevista, como inovação em nosso ordenamento, na Lei n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que trata dos crimes ambientais. A citada Lei veio atender a esse reclamo, responsabilizando administrativa, civil e penalmente as pessoas jurídicas “nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade” (art. 3º), não excluída “a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato” (parágrafo único). As penas aplicáveis são: multa, restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade (art. 21). 6.1 Responsabilidade das pessoas jurídicas de direito privado No âmbito civil, a responsabilidade da pessoa jurídica pode ser contratual e extracontratual, sendo, para esse fim, equiparada à pessoa natural. Na órbita contratual, essa responsabilidade, de caráter patrimonial, emerge do art. 389 do Código Civil, verbis: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.” O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, responsabiliza de forma objetiva as pessoas jurídicas pelo fato e por vício do produto e do serviço (arts. 12 e s. e 18 e s.). No campo extracontratual, a responsabilidade aquiliana provém dos arts. 186, 187 e 927, bem como dos arts. 932, III, e 933 do Código Civil, que reprimem a prática de atos ilícitos e estabelecem, para o seu autor, a obrigação de repararo prejuízo causado, impondo a todos, indiretamente, o dever de não lesar a outrem. No sistema da responsabilidade subjetiva, deve haver nexo de 11 causalidade entre o dano indenizável e o ato ilícito praticado pelo agente. Só responde pelo dano, em princípio, aquele que lhe der causa. É a responsabilidade por fato próprio, que deflui do art. 186 do Código Civil. A lei, entretanto, estabelece alguns casos em que o agente deve suportar as consequências do fato de terceiro. Nesse particular, estabelece o art. 932, III, do Código Civil que são também responsáveis pela reparação civil “o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”. Acrescenta o art. 933 que essa responsabilidade independe de culpa, sendo, portanto, objetiva. Toda pessoa jurídica de direito privado, tenha ou não fins lucrativos, responde pelos danos causados a terceiros, qualquer que seja a sua natureza e os seus fins (corporações e fundações). Responde, assim, a pessoa jurídica civilmente pelos atos de seus dirigentes ou administradores, bem como de seus empregados ou prepostos que, nessa qualidade, causem dano a outrem. Responde como preponente pelos atos de seus empregados ou prepostos (responsabilidade por fato de terceiro) e também pelos de seus órgãos (diretores, administradores, assembleias etc.), o que resulta na responsabilidade direta ou por fato próprio. A responsabilidade direta da pessoa jurídica coexiste com a responsabilidade individual do órgão culposo. Em consequência, a vítima pode agir contra ambos. Já se decidiu que “o administrador de pessoa jurídica só responde civilmente pelos danos causados pela empresa a terceiros quando tiver agido com dolo ou culpa, ou, ainda, com violação da lei ou dos estatutos”. 7. EXTINÇÃO DA PESSOA JURÍDICA As pessoas jurídicas nascem, desenvolvem-se, modificam-se e extinguem-se. Nas sociedades comerciais, as modificações compreendem a transformação, a incorporação e a fusão. As sociedades civis devem manter a forma específica. O começo da existência legal das pessoas jurídicas de direito privado se dá com o registro do ato constitutivo no órgão competente (CC, art. 45), mas o seu término pode decorrer de diversas causas, especificadas nos arts. 54, VI, segunda parte, 69, 1.028, II, e 1.033 e s. 7.1 Formas de dissolução O ato de dissolução pode assumir quatro formas distintas, conforme a natureza e a origem, correspondentes às seguintes modalidades de extinção: • Convencional — por deliberação de seus membros, conforme quórum previsto nos estatutos ou na lei. A vontade humana criadora, hábil a gerar uma entidade com personalidade distinta da de seus membros, é também capaz de extingui-la. Dispõe o art. 1.033 do Código Civil que a sociedade se dissolve quando ocorre a “deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo 12 indeterminado” (inc. III). Na de prazo determinado, quando há “consenso unânime dos sócios” (inc. II). • Legal — em razão de motivo determinante na lei (arts. 1.028, II, 1.033 e 1.034), como, a decretação da falência (Lei n. 11.101, de 9.2.2005), a morte dos sócios 320 (CC, art. 1.028) ou desaparecimento do capital nas sociedades de fins lucrativos. As associações que não os têm não se extinguem pelo desaparecimento do capital, que não é requisito de sua existência. • Administrativa — quando as pessoas jurídicas dependem de autorização do Poder Público e esta é cassada (CC, art. 1.033), seja por infração a disposição de ordem pública ou prática de atos contrários aos fins declarados no seu estatuto (art. 1.125), seja por se tornar ilícita, impossível ou inútil a sua finalidade (art. 69, primeira parte). Pode, nesses casos, haver provocação de qualquer do povo ou do Ministério Público (CPC de 1939, art. 676, que continua em vigor, juntamente com todo o procedimento para a dissolução e liquidação da sociedade, por força do disposto no art. 1.218 do Código de Processo Civil de 1973 e no art. 1.046, § 3º, do atual diploma processual). • Judicial — quando se configura algum dos casos de dissolução previstos em lei ou no estatuto, especialmente quando a entidade se desvia dos fins para os quais se constituiu, mas continua a existir, obrigando um dos sócios a ingressar em juízo. Dispõe o art. 1.034 do Código Civil que a sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando: “I — anulada a sua constituição; II — exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade”.
Compartilhar