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4. Entrevistas preliminares fT Introdução É sabido que as entrevistas iniciais têm importância decisiva para o futuro do processo terapêutico a ser desenvolvido. No campo da P.B., as principais finalidades de tais entrevis tas são: • O estabelecimento da relação tefapêutica. • A elaboração da história clínica. • A avaliação diagnostica e prognostica. • A devolução diagnóstico-prognóstica. • O contrato sobre metas terapêuticas e duração do tratamento. • A explicitação do método de trabalho e a fixação das demais normas contratuais. O número de entrevistas a se realizar, variável em cada caso, será o que se revele necessário para atingir os fins enunciados. Veremos a seguir cada um destes pontos. O estabelecimento da relação terapêutica Neste aspecto, as entrevistas preliminares desempenham um papel fundamental. Dos primeiros contatos com o paciente de pende, em boa parte, o destino da relação deste com seu terapeuta 64 Psicoterapia breve de orientação psicanalítica (que poderá ser ou nâo aquele que o tenha entrevistado). Trata=se então de poder criar condições favoráveis para a instauração de um vínculo terapêutico, em relação ao qual importa muito a con duta que assuma o entrevistador, quer dizer, sua contribuição para o estabelecimento de uma relação de trabalho. Será benéfico que possa mostrar-sc interessado pelos problemas do paciente, dis posto a oferecer-lhe sua ajuda e confiante em seu método terapêu tico, além de claro e explícito, desde o primeiro momento, em sua comunicação com o paciente. Para isso convém que lhe comuni que previamente a finalidade das primeiras entrevistas (conhece rem-se mutuamente, realizar um estudo o mais completo possível de seu caso para poder decidir a conduta terapêutica a ser seguida, etc.) e que, no decorrer das mesmas, informe-o detalhadamente a respeito dos diferentes aspectos do tratamento que seguirá. A experiência clínica demonstra que tais atitudes ajudam bastante no estabelecimento de uma relação terapêutica. Tenta-se, desse modo, diminuir as resistências produzidas por preconceitos, mal entendidos ou temores a respeito do tratamento, tudo o que pode facilmente conduzir à deserção (4). Em essência, terá que comba ter a ambigüidade, fomentadora de condutas resistenciais e fenô menos regressivos. O entrevistador deverá, além disso, assumir um papel ativo, dirigindo os diversos momentos das entrevistas em função dos objetivos desta fase do procedimento, essencialmente diagnostica e contratual. Formulará perguntas, fornecerá informação, etc., e ízes poderá recorrer a assinalamentos e interpretações. Considero que o emprego de interpretações nas entrevistas ais deva limitar-se principalmente aos seguintes fins: a) esclarecer e orientar a relação transferencial quando sur jam obstáculos a ela que ameaçam inclusive provocar a deserção do paciente; . b) efetuar uma devolução diagnóstico-prognóstica, na qual pode-se recorrer às chamadas interpretações panorâmicas (ver , P. 72); c) detectar a capacidade do paciente para efetuar uma psico terapia de insight, empregando isolada e prudentemente interpre tações de ensaio (1)'. Entrevistas preliminares 65 A história clinica Em P.B. é necessário realizar uma indagação exaustiva dos dados do paciente. Uma história clínica em que se leva em conta esta indicação poderá oferecer-nos elementos valiosos para com preender melhor a natureza dos problemas atuais do paciente, em relação à sua história de vida, mediante a descoberta de situações traumáticas, modos patológicos e repetitivos de conduta, etc. A respeito da metodologia a ser empregada, cabe recomen dar a adoção de um modelo de anamnese cromo ponto de referên cia, embora isso não implique que se tenha de seguir uma ordem rígida para interrogar o paciente. Convém assinalar o interesse particular de quese reveste em P.B. a indagação do motivo da consulta. O habituaf é que este se ache ligado à situação-problema que dará lugar ao tratamento. Será conveniente obter amplas informações sobre os antecedentes dessa situação-problema, os sintomas que a acompanham, os fatores desencadeantes, etc. Essas averiguações podem ser reali zadas deixando-se em primeiro lugar que o paciente exponha li vremente suas dificuldades atuais, ou seja, através dos momentos livres da entrevista, que logo poderá ser dirigida ou semidirigida quando for necessário obter determinados dados do paciente (antecedentes familiares e pessoais). Avaliação diagnostica e prognostica Avaliação diagnostica É preciso efetuar uma ampla e minuciosa avaliação diagnos tica do paciente, que não deve permanecer circunscrita ao diag nóstico clínico, insuficiente para efetuar a formulação prognosti ca e a indicação terapêutica (psicoterapia breve, psicoterapia em que predomine o insight ou de apoio, psicoterapia prolongada, de grupo, etc.), a escolha de objetivos e o planejamento do tratamen to-. Se se decide pela realização de uma terapia de duração limita da, esta demandará, com maior razão ainda, um conhecimento 66 Psicoterapia breve de orientação psicanalíticu prévio do paciente o mais profundo possível (hipótese psicodinâ- mica inicial) para organizar o plano terapêutico correspondente. Os elementos necessários para os distintos diagnósticos devem ser obtidos basicamente por meio de entrevistas clínicas e de testes psicológicos, aos quais podem somar-se outros exames, que as circunstâncias requeiram (exame médico geral, neurológi co, eletroencefalográfico, etc.). Consideramos aqui: 1) O diagnóstico nosográfico-dinâmico, que inclui as condições egóicas; 2) A avaliação do grau de moti vação para o tratamento e de atitudes para o “insigfit”; 3) A deter minação do foco. O diagnóstico nosográfico-dinâmico Implica o diagnóstico atual da enfermidade do paciente (neu rose, caracteropatia, psicopatia, psicose) e de personalidade. Exem plo: depressão reativa num neurótico obsessivo, cuja personalida de apresenta um predomínio de traços paranóide-obsessivos. Devem incluir-se também: O diagnóstico do tipo de grupo familiar de origem, sua inci dência na problemática atuãlT ãíém da influência que possa exer cer o meio ambiente, compondo na realidade um diagnóstico psi- cossociopatológico. Uma avaliação das condições egóicas, para a qual se investi gam os recursos de que dispõe o ego do paciente, quer dizer, seus aspectos adultos ou sadios, que serão os aliados do terapeuta, e suas debilidades. Este último fato permitirá que se tomem os cui dados necessários diante das prováveis dificuldades que pode riam sobrevir durante o tratamento, o qual, além disso, procurará contribuir, por meio do trabalho terapêutico, para que o paciente adquira ou recupere as capacidades egóicas que lhe faltam. Em psicoterapia breve interessa indagar principalmente: <^a) As Junções egóicas básicas (percepção, atenção, memória, pensamento, etc.). E elementar que estas funções se apresentem cm condições mínimas para tomar possível a psicoterapia. b) As relações objetais. Segundo Bellak e Small, elas serão examinadas, no que diz respeito à sua qualidade e intensidade e Entrevistas preliminares 67 aspectos manifestos e latentes (2), a partir da conduta evidenciada pelo paciente durante as entrevistas clínicas, da história de suas relações interpessoais, de suas fantasias, sonhos, recordações, de nossa contratransferência e dos dados fornecidos pelos testes psi cológicos. Essas indagações são de grande valor para efetuar um prognóstico e uma estratégia terapêutica, porque nos permitem prever, em certa medida, as características da relaçào transferen cial durante a terapia, a maior ou menor capacidade do paciente para estabelecer uma boa relaçào terapêutica, os inconvenientes que nesse sentido podem surgir durante o tratamento, e muito especialmente o momento do término da terapia e do desligamen to do terapeuta. 2 4 c) O controle de impulsos. Pode ser excessivo ouí pelo con trário, estar diminuído. Em ambos os casos,será necesfário tomar certas medidas terapêuticas (emprego de técnicas dramáticas em um. aumento do número de sessões em outro, etc.). {I d) A tolerância à ansiedade e à frustração. Trata-se de detec tar as condições do paciente para tolerar uma psicoterapia inter- pretativa, em virtude da mobilização afetiva que esta costuma produzir (para isso, pode-se apelar para diversos recursos, entre cies as interpretações de ensaio [í], nas primeiras entrevistas, para comprovar sua reação às mesmas), assim como sua capacida de para superar sem maiores conseqüências o luto causado por sua separação do terapeuta no fim da terapia (convirá averiguar a existência dc lutos na história do paciente, e que repercussão tive ram nele). K- e) Os mecanismos defensivos. Será necessário precisar as principais defesas empregadas pelo paciente, determinação que é de grande importância para a indicação terapêutica, para o plane jamento e para o prognóstico. Exemplo: um repertório reduzido de defesas estereotipadas será um elemento prognóstico desfavo rável para uma psicoterapia de insight; em contrapartida, a varie dade de mecanismos defensivos tornará favoráveis as perspecti vas prognosticas. f) A regulação da auto-estima. Em geral, os que procuram terapia apresentam uma diminuição da auto-estima, devendo o trabalho terapêutico resultar numa elevação da mesma. 6H Psicoterapia hreve de orientação psicanalitica Finalmente chegaremos à avaliação da potência e plasticida de do ego. Avaliação do grau de motivação para o tratamento e das atitudes para o "insight” Diversos indicadores, provenientes das entrevistas diagnosti cas e da realização dos testes psicológicos, nos dão uma idéia acerca do grau de motivação do paciente para receber ajuda tera pêutica, isto é, para assistir às sessões de tratamento, e em espe cial sobre sua motivação e condições para o insight (8). Suas res postas às interpretações de ensaio (1) e assinalamentos nos darão a medida de sua capacidade de auto-observação, sua resistência ou sua permeabilidade ante as intervenções do terapeuta. Diretamente ligado à capacidade de insight do paciente acha- se seu grau de consciência da enfermidade, que também terá de ser detectado. A motivação para o trabalho terapêutico é susceptível de ser estimulada durante as primeiras entrevistas e no decorrer do trata mento. A esse respeito cabe assinalar o papel fundamental que de sempenha a forma pela qual o entrevistador faz a devolução diag- nóstico-prognóstica para o paciente no começo da relação. Determinação do foco Trata-se da possibilidade de precisar e delimitar um foco, passo tecnicamente essencial para nosso trabalho terapêutico pos terior. Quando se trata de quadros agudos (neuroses traumáticas, depressões reativas), que devem resolver-se através do tratamen to, a escolha e a demarcação do foco são facilitadas, do mesmo modo que a definição dos objetivos terapêuticos. Outras vezes torna-se mais dificultosa, se o paciente apresenta transtornos ge neralizados em todas ou em quase todas as áreas de conduta, de tal forma que não conseguimos destacar um problema ou conflito como ponto de partida, sobretudo se não há uma situação definida Entrevistas preliminares 69 de urgência que predomine; em outras palavras, nâo encontramos “a ponta do novelo” para abordar o caso através de uma terapia setorial (trata-se de indivíduos com sérias alterações de personali dade, cuja enfermidade data de muitos anos, em geral caractero- patas, boderline ou neuróticos crônicos). A determinação do foco e o aprofundamento em sua confliti- va engloba o diagnóstico do ponto de urgência e acha-se por sua vez compreendida dentro da formulação psicodinâmica antecipa da, já que esta última não é outra coisa senão uma hipótese diag nostica integral, enquanto os diferentes diagnósticos e avaliações citados até «qui constituem as versões interpretativas parciais de tal formulação. I Papel do psicodiagnóstico Embora este não seja meu campo específico de atividade, desejo fazer algumas considerações a respeito3. A aplicação de testes psicológicos é muito útil para o diag nóstico, prognóstico e para as indicações e contra-indicaçôes da terapia breve. Quando se recomendà esse tipo de tratamento, essa aplicação adquire suma importância no planejamento terapêutico. Tenho dito e o repito: em P.B. coloca-se a necessidade de se obter, de antemão, um conhecimento amplo e profundo acerca do paciente, que facilite a formulação da hipótese psicodinâmica ini cial e conseqüentemente nossa tarefa terapêutica, com a base num plano de trabalho determinado, pelo menos em seus traços princi pais. Sobretudo se a terapia é de duração limitada, não haverá tempo para esperar a emergência de certos conteúdos, como num tratamento analítico. Daí que a aplicação de testes deveria efetuar- se de maneira sistemática em pacientes para os quais se prevê a realização de um tratamento breve e planejado, ou pelo menos nos casos em que se esbarre com dificuldades diagnosticas e/ou tera pêuticas4. Sou dos que pensam que o tempo investido no processo psicodiagnóstico, ainda que considerável, às vezes fica ampla mente compensado, quando se deve empreender uma psicoterapia de duração limitada5. 70 Psicoterapia breve de orientação psicanalítica Embora pareça contraditório destinar um número apreciável de horas à realização do psicodiagnóstico quando se trata de pou par tempo (como ocorre no caso das terapias hospitalares de curto prazo), não o é, na realidade, pois a riqueza dos dados que podem ser obtidos não só pode contribuir para a consecução de bons resultados, mas também para agilizar o processo terapêutico, cuja duração poderá eventualmente abreviar-se no alcance dos objeti vos propostos. A bateria de testes a ser empregada pode constar do Teste de Rorscharch (5) (7) (10), do Teste das Relações Objetais de Phillipson (5) (10) ou do Teste de Apercepção Temática de Murray (5), e completar-se com o de Bender, desenho livre, figura huma na, casal, desiderativo, etc. Quando as circunstâncias o aconse lhem, acrescentem-se os testes de inteligência. Os dados que se extraem são muitos e valiosos: diagnóstico da personalidade c do quadro psicopatológico; psicodinamismos; capacidade de insight, condições egóicas. Dentro destas últimas, o psicodiagnóstico descreve as características das relações objetais (por diversos indícios dos testes projetivos, como, por exemplo, o Phillipson ou o T.A.T. [5]), os mecanismos defensivos, a tolerância à ansiedade e à frustração, especialmente quanto à capacidade de suportar a separação do terapeuta6, a força do ego, etc. Também poderão efetuar-se recomendações terapêuticas, a partir dos dados obtidos (sobre o tipo de tratamento, sexo do tera peuta, etc.)7, e apreciações prognósticas. Avaliação prognostica Em geral é possível realizar uma avaliação prognostica, so bretudo do momento ou quadro atual que motiva o tratamento. Os resultados deste dependerão de fatores provenientes do paciente, do terapeuta e do âmbito assistencial em que tenha lugar (hospi tal, clínica, consultório particular). Tais fatores devem ser consi derados sempre em conjunto, e não de maneira isolada. Com relação ao paciente, influirão especialmente as diversas condições diagnosticas a respeito dos aspectos já citados. São_ele- mentos para um prognóstico favorável: — • Início recente e agudo do sofrimento ou problema atual a ser abordado ou, como assinala Courtenay (3), que se trate de um “momento propício” numa enfermidade relativamente crônica. • Leveza e limitação da patologia (3). • Condições favoráveis do meio familiar e social para o desenvolvimento da tarefa terapêutica e aceitação das mudanças do paciente. • Ego forte, com funções básicas em bom estado, capacidade de estabelecer boas relações objetais e de tolerar adequadamente a separação que sobrevirá ao finalizar-se a terapia (relação transferencial com grau leve de ambivalência e dependência),plasticidade de defesas, etc. • Alto grau de motivação para o tratamento. Incide conside ravelmente na produção de bons resultados terapêuficos, mesmo nos casos que apresentem certa gravidade (8). • Capacidade de insight. • Possibilidade de determinar o foco antecipadamente (antes de iniciado o tratamento ou em suas primeiras sessões)*. Com relação ao terapeuta, as perspectivas prognosticas são favoráveis quando, além de este reunir as condições necessárias para o exercício da P.B. (ver capítulo L4), existe uma contratransferên- cia positiva que facilita a instauração dc um bom vínculo com o paciente. Com relação ao contexto assistência!interessam as possibi lidades terapêuticas que oferece em seus aspectos temporais, es paciais, equipe de profissionais, etc. É claro que o prognóstico terapêutico, além disso, deve ser feito em fimção das metas combinadas, segundo estas pareçam ou não alcançáveis dentro das condições gerais que regerão o traba lho terapêutico. A devolução diagnóstico-prognóstica Além da devolução dos dados do psicodiagnóstico, a cargo do psicólogo que o efetuou - que por diversas razões, em nenhum caso deveria se omitir (12) - e mesmo que tenha sido outro o pro fissional que realizou as entrevistas clínicas, cabe uma nova devo Entrevistas preliminares___ ______ ______ ______ _______ _______ ____________ 72 Psicoterapia breve de orientação psicanalítica lução da parte deste último, a qual naturalmente será baseada nas conclusões a que chegou, nào só depois das entrevistas, mas tam bém como conseqüência do emprego dos diferentes meios auxi liares de diagnóstico. Esta segunda devolução é resultante da tare fa desenvolvida em equipe e deve antes de tudo manter coerência com relação à devolução psicodiagnóstica. O entrevistador transmitirá oralmente ao paciente, numa lin guagem simples e clara, impressões gerais a respeito de sua pro blemática. Mencionarei, a seguir, alguns dos objetivos de tal con duta: » a) Fazer o paciente sentir que se presta atenção nele e se pensa em suas dificuldades, procurando compreendê-las. Trata-se de uma nova contribuição em busca de uma aliança de trabalho. b) Fornecer-lhe certo esclarecimento preliminar a respeito de sua problemática. c) Reforçar sua motivação para entender e resolver suas difi culdades por meio da psicoterapia. d) Facilitar o passo seguinte, que será a escolha de metas te rapêuticas, ao lhe apresentar, e em parte sugerir, o conflito do qual julgamos poderiam surgir tais metas. (Em outras palavras, a devo lução será centrada naquilo que em nossa opinião deve converter- se na problemática central do tratamento, com o que além disso se irá delineando o provável foco terapêutico.) Como foi dito, serão transmitidas ao paciente apenas algu mas apreciações acerca dc sua problemática, sem se estender nem aprofundar em demasia, já que não é proveitoso fazê-lo nesta etapa. Para isso pode-se recorrer às interpretações denominadas panorâmicas (4), que permitem esboçar, de maneira global, psi- codinamismos subjacentes à situação-problema. A devolução, além dos aspectos diagnósticos, deve abranger referências ao prognóstico capazes de tranqüilizar e reanimar o paciente. Isto lhe dará a idéia de que podemos oferecer-lhe nossa ajuda e de que tem possibilidade de resolver seus sofrimentos ou pelo menos de ali viá-los. Poderíamos reiterar o mesmo com relação às metas tera pêuticas, uma vez combinadas. Contrato sobre as metas terapêuticas e a duração do tratamento Depois de efetuada a devolução diagnostica, paciente e entrevistador trocarão opiniões acerca dos possíveis objetivos da terapia a ser realizada, até chegar a estabelecê-los claramente e de comum acordo. Devem-se em princípio conhecer e levar em conta os pontos de vista do paciente acerca das metas do tratamento, equivocados ou não segundo nosso julgamento. Com essa finalidade, já se terá formulado ao paciente perguntas, como: Que expectativas tem acerca do tratamento? Em que problemas você crê necessitar de ajuda? Em que supõe que tem de consistir essa ajuda?, etc. As respostas correspondentes nos darão além disso alguma idéia de suas fantasias a respeito de enfermidade e de cura, dasjquais pro vêm os objetivos que ele se coloca, assim como de suajrnotivação e capacidade de insight. Isso não exclui que por meio de devolu ção efetuada se tente chamar sua atenção sobre determinada “con- flitiva” e acrescentar sua motivação para enfrentá-la. O terapeuta se referirá aos objetivos do modo mais claro e simples possível. Por exemplo, dirá ao paciente que entre ambos poderiam tratar de esclarecer por que ele sente tanto temor quan do lhe solicitam qualquer tarefa em' seu emprego e de conseguir que enfrente essas situações de forma mais adequada. Também dirá que se procurará melhorar seu estado de ânimo e esclarecer também o que sucede com sua família, etc. Paralelamente, o tera peuta deve formular os fins terapêuticos de um ponto de vista psi- codinâmico: em um caso pensará sobretudo em elevar a auto-esti- ma; em outro, em atenuar as exigências superegóicas; num tercei ro, em revelar o significado inconsciente de tal conduta e atacar determinados mecanismos defensivos, etc. É preciso que os objetivos a que se proponham sejam presu mivelmente alcançáveis, isto é, que se ajustem às possibilidades que oferecem paciente e terapeuta e às condições gerais em que terá lugar a terapia. Poder-se-ão classificar como primordiais e secundários, segundo sua importância; em imediatos e mediatos, de acordo com a ordem cronológica em que se procure alcançá- los, seguindo, se necessário, um escalonamento estratégico; e em explícitos e implícitos, se tiverem ou não sido verbalizados e com- Entrevistas preliminares__ _____ ______ ______ ______ ______ _ binados cora o paciente. (Toda terapia breve de insight pressupõe a existência de fins terapêuticos inerentes à natureza mesma do processo, por exemplo, que o paciente alcance maior consciência da enfermidade ou eleve sua auto-estima. Esses fins, quase cons tantemente presentes, também constituem por conseguinte objeti vos terapêuticos gerais, diferenciados dos particulares, que sur gem em cada caso.) Quando não se chega a um acordo real sobre as metas da te rapia (pode tratar-se, inclusive, de um pseudo-acordo por submis são do paciente às sugestões do terapeuta, que atuam naquele como ordens), cabem várias alternativas: / a) aceitar o que propõe o paciente, caso em que o terapeuta deverá renunciar aos propósitos terapêuticos que tinha previa mente, ou postergá-los para uma segunda etapa, b) realizar uma tarefa de esclarecimento que tenda a motivar o paciente a em- j preender uma terapia com base nas metas que consideram conve nientes, c) se as dissidências forem muito grandes, não efetuar V nenhum tratamento9. A duração de um tratamento breve varia segundo as circuns tâncias: • Pode estar predeterminada por modalidades institucionais, que estabelecem prazos para os tratamentos geralmente de modo convencional e que correspondem a necessidades organizacionais dentro do planejamento assistencial que tais instituições adotam (de 3 ,6,12 meses, etc.). • Em muitas oportunidades, situações próprias do paciente, que inclusive podem ter motivado o tratamento, colocam, por sua vez, uma limitação temporal espontânea ao mesmo: acontecimen tos como uma viagem, por exemplo, poderão determinar uma finalização obrigatória, por acaso também adequada. • Em outras ocasiões, que se apresentam especialmente no consultório particular, a duração do tratamento depende do que o terapeuta e o paciente resolvam. Assim, poderá contar ou não com um final prefixado. Não só os objetivos, mas também a duração do tratamento deveriam, dentro do possível, ser estabelecidos de comum acordo entre terapeuta e paciente, antes de seu início. A isso se tem referi do, entre nós, Ulloa (13). Em lugar de encarregar da duração do 4 _____Psicoterapia breve de orientaçãopsicanalitica Entrevistas preliminares 75 tratamento fatores alheios à situação mesma do paciente, ou que este tenha a impressão de que é imposta pelo terapeuta, seria pre ferível que se pudesse obter uma vez mais a opinião do paciente sobre essa questão, a fim de a elaborarem conjuntamente. O que é pouco - ou muito - tempo para um pode não ser para o outro. “A fixação do tempo - assinala Ulloa - faz-se com a participação explícita do paciente no nível em que ele esteja capacitado para tal elaboração” (13). Isso não implica que aceitaremos ingenuamente as idéias do paciente, mas que buscaremos soluções depois de uma revisão adequada da situação. Quando a duração do tratamento for determinada de antemão, o terapeuta deve procurar, como condição primordial, que a mesma guarde relação direta com os objetivos terapêuticos pro postos, quer dizer, com o tempo que empiricamente estime neces sário para cada paciente alcançar esses objetivos (sem que isso seja um impedimento para efetuar uma recontratação do tratamento, sg, uma vez chegado o seu término, seus fins não se cumprirem)10. Fixar previamente uma data para o término da terapia supõe vantagens e desvantagens. Com freqüência, o melhor será não limitá-la, mas às vezes ocorre o contrário: para antepacientes que apresentem uma atitude receosa e. de desconfiança (habitualmen te com marcados traços fóbicos ou paranóicos), pode ser conve niente determinar uma data exata - não muito longínqua - para a finalização, com o objetivo de evitar fantasias de ser preso numa armadilha pelo terapeuta; tranqüiliza-os saber, desde o começo, que existe uma data em que o tratamento será concluído/Dessa maneira aceitam com menos dificuldades serem tratados, do que quando se acham ante uma terapia de duração indeterminada. Esta situação se apresenta mais comumente em pacientes de es trato socioeconômico baixo, os quais em princípio não concebem que a psicoterapia deva estender-se demasiadamente no tempo para solucionar seus padecimentos. Se não apelarmos com flexi bilidade para este recurso estratégico, o mais comum é que a abandonem em algum momento ou que simplesmente não a ini ciem. Em contrapartida, se se fixa um prazo, seus receios diante do tratamento são menores, sendo até possível que depois dese jem prolongá-lo. Por último, outras vezes a limitação de tempo parece necessária para estimular e agilizar o trabalho terapêutico do paciente./ 76 Psicoterapia breve de orientação psicanalitica Além disso, é mister explicar ao paciente, que uma vez ter minada a terapia, realizará, junto com o terapeuta, um balanço dos resultados obtidos, para o que ambos levarão em conta seu estado nesse momento, e que a partir daí se resolverá a conduta mais ade quada a assumir (separação final, fixação de entrevistas de con trole, recontrato, indicação de outro tratamento, etc.). Explicitação do método de trabalho. Fixação das demais normas contratuais É útil oferecer ao paciente uma idéia acerca das característi cas do tratamento que terá de seguir, ou seja, quais serão, respecti vamente, suas funções, as do terapeuta e eventualmente as da equipe terapêutica. O benefício dessa tarefa informativa reside em que o paciente, em vez de resistir, à intolerância das ansieda des provocadas pelo desconhecido, poderá pelo contrário coope rar com o terapeuta, tomando conhecimento da técnica que orien tará o trabalho de ambos. No que diz respeito às funções do paciente, dever-se-á fazer empenho em explicar-lhe cuidadosa e detalhadamente o que será sua regra básica de funcionamento no decorrer da psicoterapia. (Da regra básica de funcionamento ocupo-me no capítulo 6, pp. 89 ss.) Convém que o paciente tenha uma noção prévia do papel do terapeuta. Quando se pensa em efetuar uma psicoterapia interpre- tativa, poder-se-á explicar-lhe que se trata fundamentalmente de ajudá-lo a compreender melhor sua situação, tentando trazer-lhe um ponto de vista diferente, que vá mais além do que lhe permite seu senso comum; que será baseado sobretudo em revelar-lhe aspectos obscuros ou desconhecidos para ele, que podem estar provocando e/ou incrementandq seus sofrimentos, e que isso será efetuado através de interpretações, das quais se dará alguma idéia elementar. Desse modo, procuraremos fazer com que se familiari ze o mais rápido possível com o tratamento e se abrevie a etapa de ansiedade, desconcerto ou estranheza, que em princípio costu mam provocar as interpretações, e que em P.B. considero que possa ser prejudicial. Com relação a isso costumo advertir ao pa- Entrevistas preliminares 77 cicnte que é possível que minhas intervenções, particularmente no início do tratamento, lhe pareçam apesar de tudo um pouco es tranhas, e que na realidade notará alguma diferença em relação às conversas que mantém habitualmente com as pessoas. A todos esses esclarecimentos podem agregar-se outros, não menos benéficos para o desenvolvimento do tratamento: cabe as sinalar ao paciente que nossa tentativa de fazê-lo entender suas dificuldades a partir de uma nova perspectiva, que lhe permita en frentá-las melhor, corresponde ao fato de que tais dificuldades superam suas^possibilidades de solucioná-las jíor sua conta; mas, acrescento ante uma sugestão de Montevechio (9) é de se esperar que ao protagonista de uma situação perturbadora resulte difícil compreender com clareza o que está acontecenjio ao seu redor e que, para o terapeuta, do lado de fora, pode tornar-se pos sível entendê-lo e ajudá-lo, graças a seus conhecimentos e expe riência. Com isto tende-se a contrabalançar sua sensação de fra casso ao ter de ir à consulta, como também a fantasia de onipotên cia do terapeuta, sendo conveniente que se ajuste desde o primeiro momento a uma relação mais “real” com este (9). Também convém informar o paciente se se pretende empre gar outros recursos terapêuticos (psicofármacos, entrevistas com familiares, etc.), comunicando, ainda que minimamente, seu sen tido e alcance. Por último, devem fixar-se as diferentes condições do conta to terapêutico, em especial as correspondentes aos aspectos espa- ço-temporais do enquadramento: posição espacial do terapeuta e paciente (geralmente devem sentar-se frente a frente), horários, freqüência e duração das sessões; eventualmente, datas do térmi no do tratamento, das entrevistas de avaliação e do novo psico- diagnóstico. Os demais detalhes não diferem do que já se conhece (férias do terapeuta, feriados, honorários, etc.). Referências bibliográficas 1. Alexander, F., “Indieaciones para la terapia”, em F. Àlcxander e T. French, Terapêutica psicoanalitica, Paidós, Buenos Aires, 1965, cap. VI.
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