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1 REPÚBLICA DE ANGOLA MINISTÉRIO DA SAÚDE DIRECÇÃO NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLO DA MALÁRIA 4ª Edição Luanda, 29 de Julho de 2021 MANUAL DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA MALÁRIA EM ANGOLA Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 2 PREFÁCIO Apesar dos avanços verificados com o aumento da cobertura das acções integradas de controlo da malária, nomeadamente a gestão adequada de casos, o tratamento intermitente e preventivo na grávida, a distribuição de redes mosquiteiras, as acções de controlo vectorial integrado e a pesquisa operacional, a malária continua a ser a principal causa de morbilidade e de mortalidade em Angola com diferentes níveis de endemicidade, afectando principalmente grávidas e crianças menores de cinco anos. A introdução das associações terapêuticas à base de Artemisinina (ACT) em 2006, trouxe uma nova dinâmica e uma melhor perspectiva na redução dos casos graves e consequentemente da mortalidade. O principal desafio actual focaliza-se na utilização correcta das combinações terapêuticas com base em um diagnóstico confirmado por microscopia ou Teste de Diagnóstico Rápido (TDR), e na melhoria do manuseio dos casos graves a nível institucional. A implementação do projecto do controlo da malária na comunidade (ADECOS) foi uma mais- valia através do aumento do diagnóstico precoce da malária na população mais vulnerável nas zonas suburbanas. O aumento da cobertura do tratamento intermitente e preventivo (TIP) na grávida com Sulfadoxina+Pirimetamina (SP) com base nas novas orientações da OMS, deverá permitir a redução da prevalência da doença neste grupo-alvo. Esta componente deverá estar devidamente enquadrada no Programa de Saúde Reprodutiva e implementada através do projecto da revitalização dos cuidados primários de saúde a nível municipal. A orientação da quimioprofilaxia para as populações não imunes completa o quadro de orientação deste manual de manejo de casos e é essencialmente orientada para os grupos de expatriados ou visitantes do País. Pretende-se que este manual seja um instrumento de suporte à implementação das práticas correctas do diagnóstico precoce e do tratamento adequado da malária em todos os níveis do Sistema Nacional de Saúde (sector público e privado), contribuindo assim para a redução da morbimortalidade desta doença em Angola. O conteúdo deste manual não substitui as publicações oficiais sobre a matéria, e estará sujeito a avaliações e actualizações regulares. Luanda, 29 de Julho de 2021 A Ministra da Saúde Dra. Silvia Lucutuca Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 3 Equipa de Revisão Helga Reis Freitas Jose Franco Martins Pedro Rafael Dimbu Elisa Miguel Marília Afonso Fernanda Alves Joana Rosário Fernanda Guimarães Joana Bunga Marques Gomes Rosa Futi Pedro Mangovo Gize Giamona Davista Abílio Alberto Piosso Diavanza Pierre Nlenvo Biata José Capitão Mário Bundo Luis Bolanos Rukaaka Mugizi Paulo Proto Sarah Labuda Yava Ricardo João Júnior Carolina Ferreira Zaida Taylor Augusto Belmira Bondo Arlindo Miranda Inocência Morais Margarida Correia Ludivina Quintas Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 4 ÍNDICE 1. | INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................... 6 2. | EPIDEMIOLOGIA, FARDO DA DOENÇA E TENDÊNCIA .................................................................. 6 2. 1 | EPIDEMIOLOGIA CICLO BIOLÓGICO DO PLASMÓDIO............................................................... 7 3. | DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA MALÁRIA ..................................................................................... 9 3. 1 | RECOMENDAÇÕES DA OMS PARA O DIAGNÓSTICO DA MALÁRIA ................................. 9 3. 2 | MICROSCOPIA ÓPTICA (MO) ...................................................................................................................... 9 3. 3 | MICROSCOPIA ÓPTICA (MO) TESTES DE DIAGNÓSTICO RÁPIDO (TDR) ................. 10 4. | TRATAMENTO DA MALÁRIA ......................................................................................................................... 11 4.1 | OBJECTIVOS DO TRATAMENTO DA MALÁRIA.............................................................................. 11 4.2 | PRINCÍPIOS DA POLÍTICA NACIONAL DE TRATAMENTO ...................................................... 11 4.3 | RESUMO PROTOCOLO NACIONAL DE TRATAMENTO ............................................................ 11 5. | TRATAMENTO DA MALÁRIA NÃO COMPLICADA ............................................................................ 13 5.1 | DEFINIÇÃO DE CASO .................................................................................................................................... 13 5.2 | TRATAMENTO DA MALÁRIA NÃO COMPLICADO POR PLASMÓDIO FALCIPARUM ................................................................................................................................................................. 13 5.3 | TRATAMENTO DA MALÁRIA POR PLASMODIUM VIVAX E OVALE ................................... 17 5.4 | CLASSIFICAÇÃO DA RESPOSTA TERAPÊUTICA ........................................................................ 17 5.5 | CONDUTA PÓS - TRATAMENTO ............................................................................................................. 19 6. | TRATAMENTO DA MALÁRIA COMPLICADA ........................................................................................ 19 6.1 | INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................... 19 6.2 | FORMAS DE APRESENTAÇÃO CLÍNICA ............................................................................................ 19 6.3 | TRATAMENTO DA MALÁRIA COMPLICADA ..................................................................................... 20 6.4 | CARACTERÍSTICAS RELEVANTES E MANUSEIO DAS PRINCIPAIS FORMAS DE APRESENTAÇÃO CLÍNICA DA MALÁRIA COMPLICADA..................................................................... 23 6.5 | COMPLICAÇÕES FREQUENTES DA MALÁRIA COMPLICADA ............................................. 29 6.6 | ASPECTOS PARTICULARES DA MALÁRIA GRAVE/COMPLICADA NA CRIANÇA .... 30 6.7 | FACTORES DE SUCESSO NO MANUSEIO DOS CASOS ......................................................... 31 6.8 | ERROS COMUNS NO DIAGNÓSTICO E GESTÃO ........................................................................ 32 7. | TRATAMENTO DA MALÁRIA NA GRAVIDEZ ....................................................................................... 32 7.1 | ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS ................................................................................ 32 7.2 | TRATAMENTO DA MALÁRIA NÃO COMPLICADA NA GRÁVIDA .......................................... 33 7.3 | PREVENÇÃO DA MALÁRIA NA GRÁVIDA .......................................................................................... 34 8. | NORMAS PARA A PREVENÇÃO DA MALÁRIA EM GRUPOS NÃO - IMUNES ................. 34 Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 5 8.1 | QUIMIOPROFILAXIA........................................................................................................................................ 34 9. | TRATAMENTO DA MALÁRIA EM GRUPOS ESPECIAIS ............................................................... 35 9.1 | PACIENTES CO-INFECTADOS COM VIH e SIDA........................................................................... 35 9.2 | PACIENTES CO-INFECTADOS COM TUBERCULOSE ............................................................... 35 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................................................................... 36 Anexo 1: Tratamento de Malária Simples (Malária não complicada) Com Artesunato + Amodiaquina (ASAQ) .................................................................................................................................................. 37 Anexo 2: Características farmacocinéticas e toxicidade dos derivados da Artemisinina ......... 38 Anexo 3: Características farmacocinéticas e toxicidade dos derivados do Artesunato EV/IM ................................................................................................................................................................................... 39 Anexo 4: Características farmacocinéticas e toxicidade dos derivados do Arteméter IM ........ 40 Anexo 5: Características farmacocinéticas e toxicidade dos derivados da Quinina ................... 41 Anexo 6: Escala de Coma de Glasgow .............................................................................................................. 42 Anexo 7: Escala de Coma Blantyre para crianças ....................................................................................... 43 Anexo 8: Procedimento de Teste Rápido (TDR) para Malária (SD Bioline Malária Ag Pf/PV) .................................................................................................................................................................................. 44 Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 6 1. | INTRODUÇÃO A malária está entre as principais causas de morbilidade e de mortalidade em Angola, afectando todo o País e todas as faixas etárias. No entanto, as crianças menores de 5 anos e as mulheres grávidas são os grupos mais vulneráveis. A demanda nas unidades periféricas por síndroma febril suspeito de malária continua a ser de 55% apesar de se ter verificado uma redução substancial da taxa de letalidade (60%) após a introdução das combinações terapêuticas a base de Artemisinina e do tratamento intermitente e preventivo na grávida com Sulfadoxina+Pirimetamina (SP). A adopção de novos esquemas terapêuticos com combinações terapêuticas à base de Artemisinina (ACT) permite atingir níveis de eficácia terapêutica acima dos 90% no tratamento dos casos simples. A actualização da política nacional de tratamento e a adopção de normas mais estritas de diagnóstico precoce e de tratamento deverá levar a redução de casos graves e/ou complicados, aumentando a possibilidade destes doentes terem uma melhor atenção hospitalar. Este manual terapêutico pretende ser um instrumento de orientação para todos os técnicos que têm a responsabilidade de diagnosticar e de tratar malária em Angola nas suas variadas formas, assim como actualizar as orientações sobre o TIP, tratamento da malária grave e quimioprofilaxia a grupos não imunes. A utilização deste manual não invalida o recurso a outros instrumentos técnico-científicos, devendo ter sempre em consideração que cada doente é um caso. 2. | EPIDEMIOLOGIA, FARDO DA DOENÇA E TENDÊNCIA A malária em Angola é endémica em todo o território nacional. Em 2020, a taxa de incidência da malária foi de 254 casos/1.000hab. a nível nacional. Contudo, nos municípios com muito alto e alto nível de risco, a incidência média é de 939 casos/1.000hab. e a prevalência média é de 37,5%. Cerca de 80% total de casos de malária são reportados em 72 municípios (dos 164 totais). A figura 2 mostra os níveis de endemicidade ou estratos epidemiológicos da malária em Angola (municípios de muito alto, alto, moderado e baixo risco de contaminação) com base nos dados epidemiológicos disponíveis1. Figura 1: Mapa de Angola com estratificação do risco por município Informação chave: Território: 1.246.700 km2 População: 31.127.674 (INE – 2020) Províncias: 18 Municípios: 164 Municípios endémicos: Muito alto: 55 Alto: 45 Moderado: 45 Baixo: 19 Dados epidemiológicos (2020) Casos de malária: 7.050.934 Óbitos: 11.588 Taxa incidência: 226,5 Vectores principais: Anopheles gambiaes.l. Anopheles funestus s.l. Fonte: PNCM – PSI – MAP – CHAI. 2020 1 SIS. Relatórios de casos de rotina de todos os 164 municípios de Angola em uma escala mensal de 2018-2020. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 7 Estudos entomológicos recentes realizados nas províncias do Huambo e Lunda Sul (2019- 2020) mostram que os principais criadouros dos vectores são temporários ou semipermanentes (charcos, pântanos, águas estagnadas, valas de irrigação, reservatórios de água entre outros)21, sendo os principais vectores complexo Gambiae s.l. e o Funestus s.l. Segundo os inquéritos realizados no país, a taxa de prevalência da malária em crianças com menos de cinco anos baixou de 21,1% em 2006 para 13,5% em 2011 (MIS 2006 e MIS 2011), tendo permanecido no mesmo nível (13,5%) até 2016 (IIMS 2015/16). Em geral, observa-se um progresso significativo no controlo da malária em Angola durante o período de 2016 a 2019, mostrando um declínio progressivo no total de óbitos por malária, assim como a taxa de mortalidade específica por malária. Observa-se um declínio constante de 15.997 óbitos em 2016 para 11.757 óbitos em 2020, representando uma redução de 26%, apesar de um aumento de 156,4 a 253,9 na incidência de casos no mesmo período de tempo. No entanto, observou-se um aumento de número de óbitos de 7.923 em 2019 a 11.757 em 2020. A Figura 3 a seguir mostra a tendência da incidência de casos e óbitos 2016-2020. Figura 2: Número de casos e mortes por malária / Taxas de incidência e mortalidade específica no período 2016-2020 Número de casos e óbitos por malária Taxas de incidência e mortalidade especifica Fonte: PNCM, Angola 2020 2. 1 | EPIDEMIOLOGIA CICLO BIOLÓGICO DO PLASMÓDIO Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 8 Fonte: Center for Disease Control and Prevention (CDC) O parasita causador da malária desenvolve-se em 2 hospedeiros nomeadamente: no homem (Ciclo esquizogónico) e no mosquito (Ciclo esporogónio). a) Ciclo esquizogónico (exo-eritrocítico e eritrocítico) O parasita é inoculado no sangue pela picada da fêmea do mosquito Anopheles infectada, sob a forma de esporozoítos, ficando pouco tempo na circulação (cerca de meia hora) e penetram nas células do fígado (hepatócitos) nas quais se multiplicam e formam os esquizontes exo-eritrócitos. Estes esquizontes exo-eritrocíticos em alguns dias (cerca de 7 para o Plasmódio falciparum; 15 para o Plasmódio vivax e ovale; 30 para o Plasmódio malariae) por divisão assexuada dão origem a milhares de merozoítos provocando ruptura do esquizonte e do hepatócito correspondendo assim com o período de incubação e aqui termina o ciclo exo-eritrocítico. Os merozoitos provenientes do esquizonte rompido invadem os eritrócitos na corrente sanguínea e transformam-se em trofozoítos jovens iniciando-se assim o ciclo eritrocítico. OBS:Na infecção pelo Plasmódio vivax e Plasmódio ovale alguns esporozoitos não se transformam inicialmente em esquizontes no hepatócito e permanecem aí como formas latentes (hipnozoitos) sendo eles os responsáveis pelas recaídas. Dentro dos eritrócitos os trofozoitos já adultos multiplicam-se assexuadamente, dando origem aos esquizontes eritrocíticos que ao amadurecerem rompem-se libertando os merozoitos para a circulação que vão invadir novos eritrócitos. A repetição do ciclo eritrocítico dura entre 24-72 horas e leva a um aumento progressivo da parasitémia e a uma destruição acentuada dos eritrócitos: - Plasmódio falciparum, 24 – 48 horas - Plasmódios vivax e ovale, 48 horas - Plasmódio malariae, 72 horas Alguns merozoitos na circulação sanguínea transformam-se em gametócitos responsáveis pela continuidade da espécie sendo um programa de saúde pública não causando a doença. É no ciclo eritrocítico que o paciente apresenta os sintomas relacionados com a doença como consequência da ruptura dos esquizontes e é nesta fase do ciclo que se consegue detectar o parasita pela microscopia ou os seus antigénios pelo teste rápido. b) Ciclo esporogónico A fêmea do mosquito Anopheles infecta-se durante a sua refeição sanguínea. Ao picar um individuo infectado ingere gametócitos. Os microgametócitos e os macrogametócitos transformam-se em gâmetas no intestino médio do mosquito. O gâmeta masculino fertiliza o gâmeta feminino por reprodução sexuada dando origem ao zigoto ou oocineto que é móvel e penetra na parede do intestino médio do mosquito onde se transforma em oocisto que por divisão assexuada dá origem aos esporozoitos de forma fusiforme, o oocisto rompe-se espalhando os esporozoitos por todo o tubo digestivo indo na sua maioria alojar-se nas glândulas salivares do mosquito. Com a picada do mosquito no homem os esporozoitos são inoculados continuando o seu ciclo no homem e consequentemente perpetuando a espécie. O mosquito pode sugar trofozoitos, esquizontes e gametócitos mas apenas os gametócitos continuam com o ciclo do parasita. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 9 3. | DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA MALÁRIA O diagnóstico laboratorial é essencial para a confirmação do diagnóstico da malária. É recomendado para todos os casos suspeitos de malária, em todos os locais de transmissão. As vantagens do diagnóstico laboratorial são: a. Melhores cuidados aos doentes com teste positivo, devido a uma maior certeza de que a doença em causa é, de facto, malária; b. Identificação dos doentes com teste negativo, para os quais se deve procurar outro diagnóstico; c. Evitar o uso desnecessário de antimaláricos, reduzindo assim o risco de efeitos colaterais adversos e de interações medicamentosas; d. Confirmação de insucesso dos tratamentos; e. Melhor detecção e notificação dos casos de malária. 3. 1 | RECOMENDAÇÕES DA OMS PARA O DIAGNÓSTICO DA MALÁRIA Recomenda-se a rápida confirmação parasitológica por microscopia ou TDR, em todos os doentes com suspeita de malária, antes de se iniciar o tratamento. O tratamento apenas com base na suspeita clínica só deverá ser considerado no caso de impossibilidade de se realizar o diagnóstico parasitológico por microscopia óptica ou TDR. O diagnóstico parasitológico deverá estar rapidamente disponível (menos de 2 horas), após o exame clínico do doente. Se tal não for possível, o doente deve ser tratado com base num diagnóstico clínico. 3. 2 | MICROSCOPIA ÓPTICA (MO) A microscopia óptica proporciona um elevado grau de sensibilidade e especificidade, quando bem realizada. Para além disso, permite a quantificação dos parasitas da malária e a identificação das espécies infeciosas. Não é dispendiosa e é considerada o “padrão de ouro”, em função do qual terão de ser avaliadas a sensibilidade e a especificidade dos outros métodos. Um microscopista competente e capaz de detectar parasitas assexuados em densidades menores do que 10 por microlitro (μl) de sangue, mas em condições normais no terreno o limite de sensibilidade é de, aproximadamente, 100 parasitas por μl. Vantagens da microscopia óptica Baixos custos directos em zonas de elevada rotação de doentes, se houver infraestruturas para manter o serviço; Altamente sensível e especifica na identificação das espécies e fases dos parasitas, quando usada por pessoal devidamente habilitado; Diferenciação entre a espécie Plasmódio e as fases do parasita; Determinação das densidades de parasitas; Pode ser usada para diagnosticar muitas outras doenças, por exemplo a tripanossomíase (em gota espessa), leucemia, leucocitose, eosinofilia e (em esfregaços) vários tipos de anemia, tais como hipocrómica ou macro cítica. Desvantagens da microscopia óptica Necessidade de formação/actualização adequada e supervisão do pessoal de laboratório; Dependência de eletricidade; Tempo necessário para uma interpretação segura; Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 10 Necessidade de manter serviços de garantia de qualidade e de controlo dos laboratórios. 3. 3 | MICROSCOPIA ÓPTICA (MO) TESTES DE DIAGNÓSTICO RÁPIDO (TDR) Os testes de diagnóstico rápido da malária (TDR) detectam antigénios específicos da malária derivados das fases sanguíneas dos parasitas. A presença de antigénios é indicada por uma linha de resultado colorida que atravessa uma banda de nitrocelulose. Os TDR são um bom apoio para o diagnóstico clínico da malária e uma alternativa válida a microscopia no diagnóstico clínico da malária não complicada, particularmente quando não estão imediatamente disponíveis serviços de microscopia de boa qualidade. Mecanismo de acção Os TDR são testes de detecção de antigénios por imune cromatografia de fluxo lateral, que se baseia na captura de anticorpos marcados com corante, para produzir uma faixa visível numa banda de nitrocelulose. No caso dos TDR da malária, o anticorpo marcado com corante liga-se primeiro a um antigénio do parasita, sendo o complexo resultante capturado numa banda por uma faixa de anticorpos ligados, formando uma linha visível colorida. Uma linha de controlo fornece informação sobre a integridade da conjugação anticorpo-corante, mas não confirma que o TDR possa detectar o antigénio do parasita. Alguns TDR detectam apenas uma espécie, P. falciparum, outros detectam esta espécie em combinação com uma ou mais das outras três espécies de parasitas da malária humano (P. vivax, P. ovale e P. malariae) e alguns detectam todas estas espécies. Os TDR disponíveis no mercado detectam a proteína 2 (HRP2) rica em histidina no Plasmodium falciparum, a lactato-desidrogenase do plasmodium (pLDH) e/ou a aldolase (comum a todas as espécies da malária). Variantes diferentes de pLDH estão presentes nos TDR disponíveis no mercado: pLDH-Pan (comum a todas as espécies da malária humana), pLDH-Pf (presente apenas no P. falciparum), pLDH-Pv (presente apenas no P. vivax) e pLDH-Pan (presente em todas as espécies, excepto no P. falciparum). O exemplo (Fig. 3 em anexo 8). Vantagens dos TDR Capacidade de fornecer rapidamente os resultados, permitindo o tratamento imediato no local; Menos exigências de formação e de pessoal qualificado; Não requerem corrente eléctrica; Reforço da confiança do doente no diagnóstico e no serviço de saúde em geral. Desvantagens dos TDR São testes qualitativos que apenas fornecem um resultado positivo ou negativo; Incapazes, no caso de alguns TDR, de distinguir novas infecções de uma infecção recentemente tratada com eficácia; isso deve-se à persistência de certos antigénios-alvo (e.g. HRP2) no sangue durante 1–3 semanas, após um tratamento eficaz; Sensibilidade imprevisívelno terreno; isto pode ser reduzido tendo cuidado na compra, testagem, transporte e armazenamento. A OMS facilita a testagem dos lotes antes do seu envio para o terreno. O antigénio circulante pode ser detectado durante 2–3 semanas após a eliminação de parasitas viáveis. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 11 4. | TRATAMENTO DA MALÁRIA 4.1 | OBJECTIVOS DO TRATAMENTO DA MALÁRIA Reduzir a mortalidade Prevenir as complicações Reduzir a morbilidade Eliminar a parasitémia para minimizar a transmissão Limitar a emergência e a expansão de resistência medicamentosa 4.2 | PRINCÍPIOS DA POLÍTICA NACIONAL DE TRATAMENTO Conjunto de regras relacionadas com a disponibilidade e com o uso racional de medicamentos antimaláricos no país. Objectivo Geral: Permitir que a população tenha acesso a antimaláricos com segurança, de boa qualidade, eficazes, acessíveis e com aceitação. Objectivos Específicos: 1. Garantir uma cura clínica rápida e duradoura; 2. Prevenir a progressão das formas simples para as formas graves de malária e consequentemente a morte; 3. Reduzir os episódios clínicos e a ocorrência de malária associada à anemia; 4. Reduzir as consequências da infecção placentar e da anemia materna associada à malária; 5. Atrasar o desenvolvimento e a expansão da resistência. Vantagens do uso de Combinações à Base de Derivados de Artemisinina: Rápida e substancial redução dos parasitas; Rápida resolução dos sintomas; Eficaz contra as estirpes de P. falciparum resistentes a outros antipalúdicos; Baixa taxa de resistência demonstrada; Poucas reacções adversas; Redução do aparecimento de gametócitos, portanto eficaz na redução da transmissão da doença. 4.3 | RESUMO PROTOCOLO NACIONAL DE TRATAMENTO Tabela 1: Resumo de Protocolo Nacional de Tratamento da Malária Tratamento da Malária não complicado por Plasmódio Falciparum Tratar crianças e adultos (excepto grávidas no primeiro trimestre) com uma das seguintes terapias combinadas à base de artemisina (ACT): Arteméter + Lumefantrina (AL); Artesunato + Amodiaquina (AS + AQ); Dihidroartemisinina + Piperaquina (DHA * PPQ). 2 2 Embora a OMS tenha aprovado até ao momento cinco combinações terapêuticas nomeadamente em Angola em Angola apenas está orientado o uso de três formulações. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 12 Duração do tratamento O tratamento com AL tem a duração de 3 dias e deve ser administrado de acordo com o peso ou idade. Tratamento da Malária não complicado por Plasmodium Falciparum em grupos especiais Grávida no primeiro trimestre Grávidas no primeiro trimestre com malaria não complicada por P. falciparum tratar com Quinino e Clindamicina durante 7 dias. Neonatos e crianças com menos de 5kg de peso corporal Tratar neonatos e crianças de peso inferior a 5 kg com malária não complicada com ACT na mesma dosagem alvo de mg/kg de peso corporal que as crianças de peso de 5kg. Pacientes co-infectados com VIH Em pacientes com VIH e SIDA e malária não complicada tratados como Efavirenz ou Zidovudina, evitar tratamento com Artesunato + Amodiaquina; evitar Tratamento Intermitente preventivo com SP na grávida caso estejam a ser tratados com Co- trimoxazol. Viajantes não imunes Tratar viajantes com malária não complicada com ACTs. Hiper-parasitémia Nas pessoas com hiper-parasitémia por P. falciparum existe um maior risco de falha terapêutica, evolução para malária grave e morte. Devem ser monitorados com mais cuidado além de receberem o ACT. Tratamento P. Vivax e P Ovale Tratar com um dos ACT aprovados seguido de Primaquina 15 mg/ dia durante 14 dias. Despiste de deficiência G6PD deve ser efectuado antes da prescrição da Primaquina. Tratamento malária grave Tratar adultos e crianças com malária grave/complicada (incluindo lactentes e grávidas em todos os trimestres) com Artesunato Intravenoso ou Intramuscular durante pelo menos 24 horas até tolerarem medicação oral. Depois do doente ter recebido terapia por via parenteral durante pelo menos 24h e conseguir tolerar medicação oral, completar tratamento durante 3 dias com ACT. Dose recomendada do Artesunato parenteral em lactentes Crianças < 20 kg devem receber maior dosagem de Artesunato (3mg/kg/dose) do que crianças maiores e adultos (2,4mg/kg peso corporal por dose) para assegurar exposição ao medicamento. Alternativas parenteral quando o Artesunato não tiver disponível Se o Artesunato não tiver disponível, preferir usar Artemeter Intramuscular à Quinina para tratamentos de crianças e adultos. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 13 5. | TRATAMENTO DA MALÁRIA NÃO COMPLICADA 5.1 | DEFINIÇÃO DE CASO Malária não complicada é definida como uma doença sintomática sem sinais de gravidade ou evidência clínica ou laboratorial de disfunção orgânica (OMS, 2015). Os sintomas e sinais da malária simples são inespecíficos, por isso deve ser suspeitada clinicamente na presença de febre ou história de febre. Em Angola, toda a síndrome febril suspeito de malária deve ser confirmado por teste rápido ou microscopia óptica (Orientação da OMS/2010). Na ausência de microscopia ou teste rápido de diagnóstico, todo o caso de febre aguda confirmada (por termómetro) ou referida deve ser tratado como malária depois de excluídas outras causas de febre. Tabela 2: Sintomas e sinais da malária não complicada Febre (temperatura axilar ≥ 37,5º C) Cefaleia Dores articulares Anemia Tosse (em crianças) Arrepios de frio Anorexia Astenia Vómitos e/ou diarreia 5.2 | TRATAMENTO DA MALÁRIA NÃO COMPLICADO POR PLASMÓDIO FALCIPARUM O tratamento da malária simples deve ser feito com ACTs. Em Angola orienta-se o uso: Arteméter + Lumefantrina (AL); Artesunato + Amodiaquina (AS + AQ); Dihidroartemisinina + Piperaquina (DHA * PPQ); 3 Em situações de intolerância comprovada aos ACTs usar: Quinino oral + Tetraciclina Quinino oral + Doxiciclina Quinino oral + Clindamicina Obs: na grávida e na criança menor de 8 anos não dar Tetraciclina ou Doxiciclina. 5.2.1 Esquema de Tratamento Arteméter + Lumefantrina (AL) Posologia: O tratamento com AL tem a duração de 3 dias e deve ser administrado de acordo com o peso ou idade. 3 Embora a OMS tenha aprovado até ao momento cinco combinações terapêuticas em Angola apenas está orientado o uso de três formulações. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 14 O tratamento deve ser administrado em toma única imediatamente após o diagnóstico (hora 0), repetida 8 horas depois. Continuar com duas tomas diárias (12 em 12 horas) em cada um dos dois dias que se seguem. A primeira dose deve ser tomada na presença do técnico, o qual deve controlar durante os primeiros 30 minutos a eventualidade de vómitos. É importante que o doente complete os 3 dias (6 tomas) de tratamento. Quando o paciente tiver menos de 5 kg deve sempre existir supervisão médica Deve ser manuseada em todos os níveis do sistema nacional de saúde. Tabela 3: Esquema de tratamento com Arteméter + Lumefantrina (20/120mg). Peso Idade Nº de comp./dose1 Nº total de comp. 2 ˂5-14 kg 6 m – 2 anos 1 comprimido 6 comprimidos 15-24 kg >3 – 8 anos 2 comprimidos 12 comprimidos 24-34 kg >8-14 anos 3comprimidos 18 comprimidos > 35 kg > 14 anos 4 comprimidos 24 comprimidos 1Nº de comprimidos por dose administrados 2 vezes por dia durante 3 dias 2Nº total de comprimidos administrados durante os 3 dias Tabela 4: Esquema de tratamento com Arteméter + Lumefantrina (80/480mg). Peso Idade Nº de comprimidos / dose4 Nº total de comprimidos 5 Dias >35 kg >14 anos 1 comprimido 6 comprimidos 3 dias Contraindicações Hipersensibilidade conhecida aos componentes da combinação; Malária grave; Pacientes com VIH e terapêutica com Efavirenz ou Zidovudina; Grávida no primeiro trimestre (contudo, caso não haja disponibilidade de Quinino oral, o tratamento poderá efectuar-se com ACT no primeiro trimestre - ver abaixo). Efeitos adversos No geral o AL é bem tolerado. Os efeitos adversos são raros, sendo os mais comuns do trato gastrointestinal e do sistema nervoso central. Dor abdominal, anorexia, náuseas, vómitos e diarreia. Cefaleia, tonturas, distúrbios do sono e fadiga. Também foram notificados: alteração da marcha, artralgia, mialgia, palpitações, nistagmo, redução da acuidade auditiva, ataxia, tosse, prurido e erupção cutânea. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 15 Nota: O Arteméter+Lumefantrina deve ser administrado de preferência após a ingestão de alimentos ou bebidas com elevado teor de gorduras (exemplo: leite ou alimentos ricos em gordura) para melhorar a sua absorção. 5.2.2 Esquema de Tratamento Artesunato + Amodiaquina (AS+AQ) Posologia O tratamento com AS+AQ tem a duração de 3 dias e deve ser administrado de acordo com o peso ou idade (ver tabela 5); O tratamento deve ser administrado em toma única imediatamente após o diagnóstico (hora 0), repetida no segundo e no terceiro dia; É importante que o doente complete os 3 dias (3 tomas) de tratamento (Anexo 1); Quando o paciente tem ˂ 5 kg sempre utilizar sob supervisão médica. Tabela 5: Esquema de tratamento com Artesunato + Amodiaquina (AS+AQ) Dosagem Peso Idade 1º dia 2º dia 3º dia 25mg/67,5mg 4,5 – 8kg Lactantes 2 – 11 meses 1 comprimido 1 comprimido 1 comprimido 50mg/135mg 9 – 17kg Crianças pequenas 1 – 5 anos 1 comprimido 1 comprimido 1 comprimido 100mg/270mg 18 – 35kg Crianças de 6 – 13 anos 1 comprimido 1 comprimido 1 comprimido 100mg/270mg > 35 kg Adolescentes e Adultos Acima dos 14 anos 2 comprimidos 2 comprimidos 2 comprimidos Contraindicações Hipersensibilidade conhecida a amodiaquina; Alterações hepáticas; Profilaxia (pelo risco de agranulocitose e hepatoxicidade severa); Hipersensibilidade conhecida aos derivados da Artemisinina; Antecedentes de reacção hematológica no curso de tratamento com AQ; Pacientes com VIH com terapêutica com zidovudina/Efavirenz/co-trimoxazole por risco de neutropenia severa e hepatoxicidade; Grávida no primeiro trimestre (caso não haja disponibilidade de Quinino oral, o tratamento poderá efectuar-se com ACT no primeiro trimestre - ver abaixo). Efeitos adversos Na sua maioria os doentes toleram bem o tratamento; contudo 30% deles podem apresentar efeitos indesejáveis; alguns dos sintomas assemelham-se aos da própria doença. Os mais frequentes são: Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 16 Náuseas, vómitos, dor abdominal, diarreia Prurido Raramente bradicardia Ocasionalmente agranulocitose Redução dos reticulócitos Efeito extrapiramidal Em doses elevadas: síncope, convulsões e espasticidade. Cólica abdominal Aumento das transaminases (ligeiro) Insónia/ sonolência Os efeitos mais graves são astenia, anemia e vertigem; retinopatia irreversível, transtornos da acomodação, hepatite (por vezes fatal). 5.2.3 Esquema de tratamento Dihidroartemisinina+ Piperaquina (DHA+PPQ) Posologia O tratamento é geralmente bem tolerado; está indicado para todas as espécies de plasmódio. O tratamento com DHA+PPQ tem a duração de 3 dias e deve ser administrado de acordo com o peso ou idade; (ver tabela 6). O tratamento deve ser administrado em toma única imediatamente após o diagnóstico (hora 0), repetida 24 horas depois. Continuar com uma toma diária em cada um dos dois dias que se seguem. É importante que o doente complete os 3 dias (3 tomas) de tratamento. Os comprimidos devem ser tomados depois de uma refeição com água; para as crianças, os comprimidos podem ser esmagados e administrar com um pouco de água. Quando o paciente tiver menos de 5 kg deve sempre existir supervisão médica Tabela 6: Esquema de tratamento DHA+PPQ (40/320) mg Peso Idade DHA+PPQ comprimidos Dia 1 Dia 2 Dia 3 ˂5-10 kg 6 meses<1 ano ½ ½ ½ 11-20 kg 1 < 8 anos 1 1 1 21-40 kg 9 < 14 anos 2 2 2 40-60 Kg ≥ 14 anos 3 3 3 61-80 Kg 4 4 4 >80 Kg 5 5 5 Contraindicações: Gravidez primeiro trimestre Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 17 Aleitamento Alergia a qualquer um dos seus componentes Malária grave/complicada Efeitos Adversos Como todos os medicamentos, o DHA+PPQ pode causar efeitos secundários, embora nem todos vão apresentá-los. Os seguintes efeitos são muito raros: Raros distúrbios do trato intestinal: diarreia, náusea, anorexia; Reacções alérgicas raras: irritação na pele (erupções), prurido cutâneo; Em alguns casos podem ocorrer alterações nos exames laboratoriais: diminuição de reticulócitos e ligeiro aumento das enzimas hepáticas. Normalmente não há distúrbios clínicos associados a estas alterações. 5.3 | TRATAMENTO DA MALÁRIA POR PLASMODIUM VIVAX E OVALE O objectivo terapêutico do tratamento da malária causada pelo P.vivax e ovale é curar a infecção, quer na fase em que o parasita fica na corrente sanguínea quer na fase hepática (por causa dos hipnozoitos), impedindo o seu reaparecimento. 4.3.1 Adulto (excepto grávida) Administrar um dos ACT aprovados na política nacional (Arteméter+Lumefantrina ou Artesunato+Amodiaquina ou Dihidroartemisinina+Piperaquina) seguido da Primaquina 15 mg/ dia durante 14 dias. 4.3.2 Mulher grávida No primeiro trimestre deverá tomar o Quinino com a Clindamicina em vez de ACT. 4.3.3 Crianças com mais de 12 meses: Administrar um dos ACT aprovados na política nacional (Arteméter+Lumefantrina ou Artesunato+Amodiaquina ou Dihidroartemisinina+Piperaquina) seguido da Primaquina 0,25 ou 0,5 mg/kg durante 14 dias (a decisão da escolha entre a dose maior está dependente da estirpe de P. vivax), dose máxima de 15mg a 30 mg diária. Obs: o uso de Primaquina está contraindicado na gravidez, crianças com menos de 12 meses de idade e nos pacientes com deficiência de G-6-P-Desidrogenase. Na impossibilidade de realizar o título de G-6-P-D ou no caso da pessoa ser G6PD deficiente, deve prescrever-se 0,75 mg/kg uma vez por semana durante 8 semanas sob supervisão médica atenta a potenciais efeitos adversos induzidos pela primaquina como os efeitos hematológicos. Após avaliação do risco/benefício. Para a forma de P. malariae o tratamento é igual ao de P. falciparum. 5.4 | CLASSIFICAÇÃO DA RESPOSTA TERAPÊUTICA Existem 3 categorias de resposta terapêutica: 1. A resposta clínica e parasitológica adequada (Cura); 2. Falência precoce; 3. A falência tardia que pode ser reclassificada como recorrência ou reinfecção. A recorrência por sua vez pode ser recidiva ou recrudescência. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da MaláriaManual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 18 Definição de Cura Consiste na eliminação dos sintomas e das formas assexuadas do parasita no sangue. Nas infecções por P. vivax e P. ovale o conceito é alargado à prevenção das recidivas com o uso de hipnozoíticida. Definição de Falência precoce É o desenvolvimento de sintomas e sinais de perigo com presença de parasitémia no dia 1, 2 e 3 após o início do tratamento; ou Existência de uma parasitémia no dia 2 superior à do dia 0 indepentemente da temperatura axilar; ou Uma temperatura axilar igual ou superior a 37,5ºC no dia 3 com presença de parasitémia; ou Existência de parasitémia no dia 3 igual ou maior que 25% em relação ao Dia 0. Definição de Falência Terapêutica tardia (após 4ºdia) É o desenvolvimento de sinais de malária grave, ou temperatura axilar igual ou maior que 37,5ºC na presença de parasitémia em qualquer dia entre o dia 4 e 28 (ou 42 no caso de DP), com um parasita do mesmo genótipo do tipo do dia 0, sem que anteriormente se tenha verificado qualquer dos critérios de falência terapêutica precoce; ou Presença de parasitémia em qualquer dia entre os Dia 7 e 28 (ou dia 42 no caso de DP), com um parasita do mesmo genótipo que o do parasita do dia 0, com temperatura axilar inferior a 37ºC; Definição de Recorrência A recorrência de parasitémia assexuada depois do tratamento pode ser causada por recrudescência, recidiva (apenas com o P. vivax e P. Ovale) ou uma re-infecção. a) Recrudescência A recorrência de parasitémia assexuada depois do tratamento da infecção com o mesmo agente causador da infecção inicial (em áreas endémicas agora definidas por genotipagem molecular). Isto resulta de uma incompleta clearance da parasitémia pelo tratamento e, por isso, é diferente duma recidiva nas infecções por P. vivax e P. ovale. b) Recidiva Reaparecimento de formas assexuadas do P. vivax e P. ovale pela persistência dos hipnozoítos no fígado, os quais amadurecem para dar lugar aos esquizontes. Depois de um intervalo variável de semanas (estirpes tropicais) ou meses (estirpes temperadas) os esquizontes hepáticos rompem os hepatócitos e libertam merozoítos para a corrente sanguínea. c) Re- infecção Nova Infecção com um parasita de genótipo diferente do inicial. Causas de falência Vómitos Resistência Tratamento incompleto Incumprimento do tratamento Dose insuficiente dos medicamentos Medicamentos de qualidade deficiente Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 19 5.5 | CONDUTA PÓS - TRATAMENTO Após o tratamento com ACT são possíveis as seguintes situações: Persistência dos sintomas e/ou sinais com esfregaço de sangue negativo. Neste caso, deve-se procurar outras causas de doença ou referir o doente para o nível superior. Persistência dos sintomas e/ou sinais com esfregaço de sangue positivo (falência terapêutica). Neste caso, deve-se tratar com ACT diferente do que se tomou inicialmente, se este não estiver disponível, referir o doente para o nível superior. Se a microscopia óptica for positiva para formas assexuadas, tratar com ACT diferente do que se tomou inicialmente e no caso de recidiva associar a primaquina. 6. | TRATAMENTO DA MALÁRIA COMPLICADA 6.1 | INTRODUÇÃO A malária grave é uma forma de apresentação de alto risco, provocada geralmente pela infecção por plasmódio falciparum, embora também possa ser provocada por plasmódios vivax e knowlesi. Pode cursar com disfunção multiorgânica sendo por isso uma emergência médica que requer uma avaliação clínica cuidadosa e tratamento urgente, sempre que possível numa unidade de cuidados diferenciados. Na ausência de sintomas e de outra patologia, o diagnóstico clínico deve ser feito com base na história, nos sintomas e sinais e de doença grave. 6.2 | FORMAS DE APRESENTAÇÃO CLÍNICA Considera-se forma clínica de apresentação de malária complicada, toda aquela em que o doente, na presença de um teste para malária positivo (com formas assexuadas) ou ainda na ausência de possibilidades de fazer testagem, e, após exclusão de outras causas de síndrome febril agudo, apresente uma ou mais das manifestações seguintes: Alterações do estado de consciência: o doente não está consciente (avaliar o grau do coma de acordo com a escala de Glasgow <8 ou Blantyre <3), ou malária com coma que persiste por mais de 30 minutos após uma convulsão. Manifestações de Disfunção Cerebral (agitação psicomotora, delírio, discurso incoerente, confusão, alteração do comportamento, estupor) Convulsões múltiplas (mais de dois episódios em 24 horas) Anemia Severa (Hematócrito <15 % ou Hb <5 g/dl) Hiperparasitémia (> 100.000 parasitas/ µl ou mais 2,5% de glóbulos vermelhos parasitados em indivíduos não imunes) Hipertermia (Tº > 41º C) Hipoglicemia (< 2,2mmol/l ou < 40mg/dl); hiperinsulinismo, atenção à grávida e à criança); Malária álgida (hipotensão arterial, desidratação severa, chock séptico) Edema Pulmonar (A.R.D.S.): Confirmado radiologicamente ou saturação de oxigénio <92% com FR >30 (fervores crepitantes à auscultação) Acidose Metabólica: Déficit de base >8 mEq/L, concentração plasmática de bicarbonato <15 mmol/L, Lactato venoso >5 mmol/L Hiponatrémia (< 136 mEq/L); Insuficiência Renal: Creatinina sérica ou plasmática >3mg/dl ou ureia >20 mmol/L Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 20 C.I.V.D. (alterações da coagulação e hemorragia significante incluindo hemorragia nasal recorrente ou em locais de venopunctura, hematemese ou melena) Disfunção hepática (icterícia); Hemoglobinúria; Choque: Pressão sistólica <70mmHg em crianças ou <80 mmHg em adultos com escassez de perfusão periférica (extremidades frias) 6.3 | TRATAMENTO DA MALÁRIA COMPLICADA 6.3.1 Conduta Geral no Manuseamento da Malária Complicada Perante a suspeita clínica, deverá proceder-se a evacuação rápida e precoce, para um nível mais diferenciado ou de referência. Tratar preferencialmente em Unidade de Cuidados Intensivos. Antes da evacuação dos doentes graves, devem ser tomadas medidas de urgência como: controlo da febre, convulsões, canalização de veia e administrar a primeira dose de Artesunato EV/IM ou Arteméter IM ou supositório rectal (crianças menores 6 anos). Emergência médica que exige a administração imediata de antimaláricos de acção rápida. A via parentérica é a via preferencial, com o medicamento apropriado em doses calculadas com base em mg/kg de peso (ver poster em anexo) e num intervalo mínimo de 24 horas, mesmo que o doente possa tolerar a via oral mais cedo. Na impossibilidade, utilizar a via parenteral utilizar usar como alternativa a sonda nasogástrica. Prevenir, detectar e tratar rapidamente as complicações (convulsões, hipertermia e hipoglicemia). Restabelecer o equilíbrio hidroelectrolítico e ácido-básico. Garantir cuidados especiais de enfermagem (permeabilização das vias aéreas, manter o doente em decúbito lateral, medidas anti-escaras, balanço hídrico, monitorização dos parâmetros vitais, medidas anti-térmicas, medidas de assépsia). Monitorizar a resposta terapêutica, tanto parasitológica (de 6/6 horas nas primeiras 48 horas) como clínica. Identificação e tratamento precoce das infecções; em caso de choque séptico iniciar colheita para hemoculturas e antibioterapia precoce. Monitorização do hematócrito, hemoglobina, glicémia, ureia, creatinina, electrólitos (Na+, K+), E.C.G., P.V.C e parasitémia. 6.3.2 Tratamento Específico da Malária Complicada O tratamento da Malária grave recomendado para crianças e adultos incluindo grávidas em todos os trimestres e mulheres em amamentaçãoé: Artesunato EV/ IM (tratamento de eleição). Ver anexo 3. Arteméter IM (segunda opção) Quinino EV/IM (terceira opção) Logo que clinicamente o doente fique melhor deve passar-se para a terapêutica oral com um ACT e completar o tratamento por um período de 3 dias, independentemente do número de dias que o doente tenha tido a terapêutica com o Artesunato EV, Artemeter ou Quinino. O uso da via parenteral deve ser SEMPRE administrado no mínimo durante 24h. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 21 Uso dos Derivados da Artemisinina (Artesunato/ Arteméter/ Dihidroartemisinina) Artesunato EV/IM a) Posologia Adultos e Crianças >20 kg 2,4 mg/kg EV/IM às 0h, às 12h e às 24h e continuar 2,4 mg/kg EV/IM diariamente até ao 6.º dia (Total de 7 dias) Crianças < 20Kg utilizar 3mg/kg por peso corporal por dose A dosagem dos derivados da Artemisinina não necessita de ajuste na disfunção dos órgãos vitais. Anexo 2. Logo que clinicamente o doente fique melhor deve passar-se para a terapêutica oral com um ACT e completar o tratamento por um período de 3 dias, independentemente do número de dias que o doente tenha de terapêutica com o Artesunato EV. O uso do Artesunato EV deve ser administrado no mínimo durante 24h. b) Preparação O Artesunato é um derivado éster solúvel na água que está disponível sob a forma de pó. Este pó deve ser dissolvido em 1 ml de bicarbonato de sódio a 5% (normalmente fornecido com o frasco) e agitado durante 2 a 3 minutos. Depois deve ser diluido em 5 ml de soro glicosado a 5% ou soro fisiológico para uso EV ou diluido apenas em 2 ml para uso IM. Na ampola padrão de 60 mg, cada 1 ml da diluição EV corresponde a 10 mg de Artesunato.Para mais informação veja figura 3 abaixo e Anexo 3. Figura 3: Artesunato Injectável para tratamento da malária grave Fonte: Medicines for Malaria Venture Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 22 Arteméter IM a) Posologia do arteméter IM Adultos – 160 mg no 1º dia e continuar com 80 mg durante 6 dias IM ou passar à via oral com um ACTs se evolução clínica e parasitológica favorável (Ver anexo 4) Crianças– Iniciar no 1º dia com dose de carga de 3,2 mg/Kg de peso e continuar com dose de manutenção de 1,6 mg/kg de peso durante mais 6 dias (ou passar a via oral segundo o esquema habitual). O uso do Artemeter IM deve ser sempre administrado, no mínimo, durante 24h. Quinina a) Posologia da Dihidrocloridrato de Quinina - Via Endovenosa Dose de Carga/Ataque: 20 mg sal /Kg / dose, diluída em 5 a 10 ml/Kg de solução salina ou glicosada isotónica (de preferência a glicosada a 5% ou 10%) máximo 500ml, a correr durante 4 horas - 42 gotas /minuto. Não ultrapassar 750-800 mg por dose nos adultos. Obs.: Não deve ser utilizada a dose de carga nas grávidas, devido ao efeito hiperinsulinémico da Quinina que agrava ainda mais a hipoglicemia. Ter em atenção, na dose de carga, a possibilidade do efeito cardiotóxico. De preferência administrar a dose de carga através de bomba volumétrica, seringa infusora ou sistema de micro-gotas (pediatria), para minimizar estes efeitos. “Dose de Manutenção” - 10 mg sal / Kg / dose, na mesma diluição, repetir de 8/8 horas e correr durante 4 horas. (Ver anexo 5) O uso do Quinino IV deve ser sempre administrado, no mínimo, durante 24h. b) Posologia da Dihidrocloridrato de Quinina – Intra Muscular Se não houver viabilidade para a perfusão, usar a via I.M. na mesma dose na face anterior da coxa, numa concentração de 60 - 100mg/ml, em dois sítios diferentes, para evitar uma injecção de grande volume no mesmo local. Vigiar a eficácia do uso de quinino em pacientes submetidos a terapêutica com Rifampicina. c) Ajuste nas doses na falência renal ou disfunção hepática Os níveis de Quinino (e Quinidina) podem acumular-se se houver severa disfunção de órgãos vitais. Se não houver melhoria clínica ou o doente permanecer em falência renal aguda a dose deverá ser reduzida para 1/3 depois de 48 h. No entanto, este ajuste não é necessário se os doentes estiverem sob hemodiálise ou hemofiltração. O ajuste de 1/3 da dose é necessário nos doentes com disfunção hepática. 6.3.3 PRÉ – REFERÊNCIA Se o tempo esperado entre a referência e o início definitivo do tratamento for superior a 6 horas, dar um dos seguintes fármacos por ordem de preferência: Artesunato I.M. - 2,4 mg/kg Artesunato rectal -10mg/kg (apenas em crianças menores que 6 anos, ver tabela 5 abaixo) Arteméter I.M. - 3,2mg/kg Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 23 Quinino I.M - 20mg/kg (divididos em 10mg em cada coxa). Deve-se igualmente associar um antibiótico de amplo espectro. A tabela 7 ilustra a dosagem para tratamento inicial (pré-referência) em crianças menores 6 anos e peso superior a 5kg. Tabela 7: Dosagem para tratamento inicial (pré-referência) em crianças menores 6 anos Peso (kg) Idade Dose de Artesunato (mg) Regime (dose única) 5 - 8,9 0 - 12 meses 50 Uma 50mg supositório 9 - 19 13 - 42 meses 100 Uma 100mg supositório 20 - 29 43 - 60 meses 200 Duas 100mg supositórios 30 - 39 60 - 72 meses 300 Três 100mg supositórios 6.4 | CARACTERÍSTICAS RELEVANTES E MANUSEIO DAS PRINCIPAIS FORMAS DE APRESENTAÇÃO CLÍNICA DA MALÁRIA COMPLICADA 1. Malária Cerebral É a forma de apresentação mais frequente e a mais letal. O doente com malária cerebral (coma) tem alteração variável do seu nível de inconsciência, devendo ser avaliado de acordo com a escala de coma de Glasgow ou de Blantyre (ver tabelas correspondentes); tem no sangue periférico formas assexuadas de plasmódio falciparum e foram excluídas outras causas de encefalopatia6. O início pode ser insidioso ou o quadro pode estabelecer-se de forma brutal através duma convulsão generalizada, seguida de perda de consciência. Ocasionalmente tem sido observado tanto nos adultos como nas crianças, distúrbios de comportamento (bizarro), confusão, delírio, comportamento estereotipado tais como a protusão da língua, que progridem rapidamente para o coma. As convulsões são comuns, tanto nos adultos como nas crianças. A duração do coma nos adultos varia de cerca de 6 a 96 horas. Nos adultos, as hemorragias da retina estão associadas com mau prognóstico, e é rara a ocorrência de edema da papila. Ocorre também uma hipertonia do pescoço, mas raramente se verifica rigidez da nuca. São comuns a rigidez da mandíbula e o ranger dos dentes. Podem ocorrer anomalias motoras, tais como rigidez da descerebração, rigidez da descorticação e opistótono, ausência dos reflexos corneanos, alterações do ritmo respiratório os quais constituem sinais de muita gravidade. Nas situações de malária cerebral seguir as seguintes recomendações: a) Avaliar e registar as alterações da consciência (Ver Escala de coma de Glasgow em Anexo 6, ou Escala de Coma de Blantyre em Anexo 7) b) Excluir outras causas de encefalopatia existentes na região (realizar sistematicamente punção lombar). c) Realizar precocemente fundoscopia (hemorragias da retina) d) Não usar na Malária Cerebral: 6 Esta definição não inclui casos em que a pesquisa de plasmódio é sistematicamente negativa em pesquisas seriadas ou testes rápidos negativos, em doentes que apresentam distúrbios profundos do S.N.C., Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 24 Corticosteróides ( hemorragia, prolonga coma, infecções); Outros anti-inflamatórios( hemorragia, acidose); Manitol (diurese osmótica e risco de edema cerebral); Ureia (diurese osmótica e risco de edema cerebral e transtornos hemorrágicos); Dextran de Baixo Peso Molecular ( transtornos hemorrágicos por PLT e Fibrinogénio, risco de edema cerebral e anafilaxia); Adrenalina (cardiotoxicidade, potencia efeito adverso do quinino); Heparina ( hemorragia); Prostaciclina ( transtornos hemorrágicos, vasodilatação, TA e choque); Oxipentoxifilina ( transtornos hemorrágicos); Oxigénio Hiperbárico ( risco de hemólise de hemácias parasitadas); Ciclosporina (Anafilaxia, risco de infecções, Ureia e Creatinina, TGO, TGP e BT); Soros hiperimunes ( Anafilaxia e resposta inflamatória); Mefloquina (risco de reacções neuropsiquiáricas). 2. Convulsões: Assegure-se que as vias respiratórias estejam livres e que o doente respire. As convulsões devem ser controladas com: Diazepam 0,3mg/kg administrado através de injecções intravenosas lentas durante 2 minutos; ou 0,5mg/Kg por via rectal. Pode repetir-se se necessário passados 10 minutos, mas, em alguns pacientes, esta dose pode provocar uma alteração respiratória grave. Midazolam pode ser usado na mesma dose em vez do Diazepam quer por via intravenosa ou sublingual. Fenitoína 18mg/kg dose carga seguida dose manutenção de 5mg/kg por dia por 48h. Pacientes cujas convulsões não terminem após duas doses de diazepam devem ser considerados em Estado Epilético e receber Fenitoína. Fenobarbital- Quando usado, deve monitorar-se a respiração do paciente, já que pode causar depressão respiratória necessitando de suporte ventilatório. Doses elevadas (20mg/kg) podem aumentar risco de morte. Deve estar-se preparado para utilizar a ventilação manual com “Ambu” ou mecânica se o paciente respirar de forma inadequada. Assim, na ausência de mais informações não são recomendados os anticonvulsivantes profiláticos. 3. Anemia Grave Fala-se em anemia grave aquando da existência de um Hematócrito < 15Vol% ou Hb < 5 g/dl. A anemia é uma complicação comum da malária, habitualmente secundária à hemólise dos eritrócitos parasitados e não parasitados através de mecanismos autoimunes. A sua intensidade nem sempre está associada à parasitémia, podendo ser devido a uma infecção bacteriana secundária, à gravidez ou à existência de hemorragias espontâneas. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 25 A parasitémia é muitas vezes baixa, porém existe abundante pigmento malárico nos monócitos e outras células fagocitárias, refletindo infecção recente ou infecção em processo de cura. Geralmente a anemia é microcítica com o hematócrito baixo (inferior a 20%), constituindo sinal de prognóstico reservado quando se situa abaixo dos 15%. Actualmente também estão indicados agentes estimulantes da eritropoiese, como por exemplo, a eritropoietina recombinante e outros antianémicos por via parentérica (hidróxido de ferro III sacarose), eficazes mesmo com níveis de hemoglobina muito baixos (estudos efectuados pelo Programa de Pesquisa Médica da Comissão Europeia – 1994). CONDUTA A necessidade de transfusão de sangue deve ser analisada em cada caso. Não apenas pelo hematócrito ou concentração de hemoglobina, mas também a densidade parasitária e a condição clínica têm de ser tomadas em conta. Antes de qualquer transfusão de sangue o doente deve fazer o controle das infecções transmitidas pelo sangue como: VIH e SIDA, hepatite B, hepatite C, malária, sífilis, doença de chagas, HTLV (I e II), leishmaniose, tripanossomose; Após a transfusão o doente deve ficar sobre vigilância epidemiologica particularmente para as quatro primeiras infecções, durante um ano. Tabela 8: Critérios para transfusão de concentrado de hemácias Transfusão de concentrado de hemácias Anemia grave - indicação baseada no nível de hemoglobina HB < 5.0 g / dl Deve-se transfundir independentemente dos factores de risco HB entre 6.0 e 8.0 g/ dl Transfundir apenas com a presença de factores de risco cardiovascular e com sinais de hipóxia HB > 8 e ≤ 10 g /dl Transfundir somente com a presença de sinais de hipóxia (ainda assim há baixo nível de evidência clínica) HB > 10 g/ dl Habitualmente não se deve transfundir O concentrado de hemácias deve ser indicado na dose de 10 a 20 ml/kg peso Malária grave em situações especiais na presença de comorbilidade como: desnutrição; anemia falciforme; e cardiopatias; Para indicação deve ser indicado dose de 10 ml /kg, evitando a sobrecarga hídrica e consequente risco de complicações congestivas. No geral, em contextos de elevada transmissão, um hematócrito menor ou igual que 12% ou concentração de hemoglobina menor ou igual a 4 g/dl é uma indicação para transfusão sanguínea, independente da condição clínica da criança. Num contexto de baixa transmissão um hematócrito de 20% ou concentração de hemoglobina de 7 g/dl é o limiar recomendado para a transfusão (10ml/kg de concentrado de hemácias ou 20ml/ kg peso corporal de sangue total durante 4h) Em crianças com anemia menos grave (hematócrito de 13-18%, hemoglobina 4-6 g/dl), a transfusão deve ser considerada para as que apresentem as seguintes manifestações clínicas: distress respiratório (acidose), agravamento do estado de consciência, hiperparasitémia (>20% ou >100 mil parasitas/l sangue), choque ou insuficiência cardíaca. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 26 As crianças anémicas com distress respiratório raramente estão em insuficiência cardíaca congestiva. Mas habitualmente, a sua dispneia é devida à acidose, resultante da hipóxia, muitas vezes associada com hipovolémia. Quanto mais doente a criança está, mais rapidamente a transfusão deverá ser dada. Um diurético não é habitualmente indicado, já que muitas destas crianças estão hipovolêmicas. Se, contudo, existe evidência clínica de excesso de hidratação (um dos sinais mais comuns é o fígado aumentado; sinais adicionais são ritmo cardíaco galopante, fervores crepitantes nas bases pulmonares e/ou ingurgitamento jugular em posição vertical), poderá ser administrada Furosemida a 1-2 mg/kg de peso corporal num máximo de 20mg quando dada por via endovenosa. É essencial fazer-se o seguimento dos níveis de hemoglobina (hematócrito). Muitas crianças necessitam de mais transfusões nas próximas horas, dias ou semanas. 4. Edema Agudo do Pulmão (EAP) O edema agudo do pulmão é uma grave complicação da malária, com alto índice de mortalidade (mais de 80%). Pode ser uma manifestação precoce ou de instalação súbita, ou surgir vários dias depois do início da quimioterapia, durante o período de recuperação do doente e com diminuição da parasitémia (mais frequente nos adultos). A hiperparasitémia, a insuficiência renal e a gravidez, são elementos favorecedores do desencadeamento de um edema pulmonar num doente parasitado por plasmódio falciparum. Por vezes surge como uma complicação da anemia, ou consequência duma sobre hidratação (pulmão iatrogénico). Na grávida pode instalar-se bruscamente logo após o parto. Habitualmente encontra-se associada hipoglicemia e acidose metabólica. Clinicamente suspeita-se do edema agudo do pulmão, quando ocorre aumento da frequência respiratória, que precede outros sinais de insuficiência respiratória. A hipóxia pode causar convulsões e deterioração do nível de consciência e o doente pode morrer dentro de algumas horas. CONDUTA: Manter o doente em posição de fowler; Administrar alta concentração de oxigénio Administrados medicamentos habitualmente indicados para a EAP 5. Hipoglicemia Quando a glicose sanguínea total inferior é 2,2 mmol/l (menorou igual 40 mg/dl) Trata-se de uma complicação grave que deve ser sempre suspeitada e excluída sobretudo em casos de coma. A hipoglicemia não diagnosticada e prolongada, pode ser a causa de lesões neurológicas definitivas e por vezes fatais. Figura 4: Aparência radiográfica de edema pulmonar agudo, demonstrando síndrome de distress respiratório agudo num paciente com malária cerebral (WHO, 2017) Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 27 As crianças gravemente doentes e a mulher grávida são particularmente predispostas à hipoglicemia. A terapêutica com Quinina ou Quinidina pode igualmente desencadear esta situação e agravar o quadro, mesmo em doentes que recuperaram o estado da consciência, alguns dias depois do tratamento. A suspeita clínica deve ser feita na base do estado de ansiedade do doente, sudorese profusa, dilatação da pupila, dispneia (respiração difícil e/ou ruidosa), oligúria, taquicardia, tonturas, sensação de frio, etc. Este quadro pode causar deterioração do nível de consciência, convulsões generalizadas, hiperextensão dos membros, choque e coma. O diagnóstico é sempre difícil, porque muitas vezes pode ser confundido com os sintomas da própria malária grave. CONDUTA Deve ser sempre suspeitada e excluída sobretudo em casos de coma Efectuar a monitorização da glicémia (através do uso de fitas reactivas ou métodos bioquímicos). Em casos de doentes em coma ou em estado grave, deve ser efectuada uma prova terapêutica com Glucose a 50%. Contudo, não é recomendada a administração por rotina de Dextrose a 50% a todos os pacientes com malária grave devido à hipoglicemia reactiva, além de que essas formulações são viscosas e irritantes. Manter injecções regulares de Dextrose a 20% e 10% até a glicémia ser superior a 60 mg/dl A monitorização da situação clínica e da glicémia devem prosseguir mesmo se a hipoglicemia for corrigida e o doente estiver a receber glicose intravenosa. 6. Insuficiência Renal Aguda (IRA) A insuficiência renal aguda, na malária grave geralmente é reversível e está praticamente limitada aos adultos. Pode existir oligúria ou anúria, raramente poliúria. Um aumento da creatinina e ureia séricas, podem ser decorrentes da necrose tubular aguda. Há hipercaliémia traduzida no E.C.G. pelo alargamento do complexo QRS, encurtamento do intervalo QT e ondas T de grande amplitude. Constituem indicação de diálise: Manifestações de urémia (pericardite, encefalopatia, ureia 50 mmol/l, oligúria (<0.4 ml de urina/kg de peso/hora) ou anúria, depois da hidratação adequada Manifestações de acidose metabólica Sinais de hipercaliémia Sinais de sobrecarga hídrica. CONDUTA Para prevenir a I.R.A, deve-se corrigir a hipovolémia e manter a P.V.C. acima dos 5 cm de H2O (ver em anexo quadro de hidratação pediátrico). A I.R.A. geralmente é reversível. Frequentemente é iatrogénica por deficiente balanço hidroelectrolítico. A avaliação cuidadosa do paciente permite as seguintes correcções: Se Na + urinário 20 mmol /L e desidratação, corrigir com a perfusão de soro fisiológico, até P.V.C. 0 a +5 cm H20 Se após correcção hidroelectrolítica a diurese não for restabelecida referir o doente para nefrologista já que pode estar indicada a fazer diálise peritoneal, hemodiálise ou transplante renal. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 28 7. Acidose Metabólica A acidose metabólica é comum na malária grave e uma importante causa de morte. É atribuível à acidose láctica. Deve-se suspeitar de acidose láctica se o intervalo aniônico [Na+ + (Cl-+HCO3-)] ultrapassar 10 a 12 mEq/l, devendo-se ter atenção essencialmente a sinais clínicos como taquipneia, respiração de Kussmaul e diminuição do débito urinário. CONDUTA A oxigenação dos tecidos deve ser melhorada por meio da correcção da hipovolemia com solução salina isotônica a 0,9% muito lentamente para não precipitar um edema pulmonar fatal (ver anexo-fluidoterapia), através do aumento da concentração do oxigénio inspirado (ver anexo) e da desobstrução das vias aéreas. A correcção da acidémia com bicarbonato deve ser tentada apenas se o PH arterial descer abaixo dos 7,20 e só após a correcção da hipovolémia e oxigenação. Monitorar a pressão arterial, pressão venosa central e débito urinário (hora a hora) 8. Coagulação Intravascular Disseminada (CID) Sangramento das gengivas, epistaxis, petechiae e hemorragias subconjugais pode ocorrer ocasionalmente. Coagulação intravascular disseminada, agravada por sangramente critico (haematemesis ou malaena) ocorre em menos 5% dos pacientes. Trata-se de uma manifestação mais frequente em doentes não imunes. CONDUTA Administrar sangue fresco total (ou tratamento alternativo), factores coagulantes e plaquetas se necessário. Administrar 10 mg de Vit K por via endovenosa se o tempo de protrombina e de tromboplastina estiverem prolongados. Iniciar proteção gástrica parenteral (ex Ranitidina ou Omeprazol); Nestes casos está contra-indicado o uso de A.A.S e Corticosteróides. 9. Hemoglobinúria Raramente é associada à malária nos adultos. Pode vir associada com anemia e insuficiência renal. Pacientes com deficiência em G-6-PD podem desenvolver hemólise intravascular e hemoglobinúria precipitada pela Primaquina ou outros medicamentos oxidentes, mesmo na ausência de malária. CONDUTA Continuar tratamento antimalária apropriado (ver acima). Efectuar transfusão de sangue fresco total se necessário. Se existir oligúria, ureia e creatinina aumentadas referir para nefrologia, pois o paciente poderá necessitar de terapia de substituição. 10. Choque Alguns pacientes são admitidos num estado de colapso, com uma pressão arterial sistólica menor 80 mm Hg em posição supina com pele fria, pegajosa e cianótica, vasoconstrição periférica e pulso filiforme (fraco e rápido). Este quadro clínico pode indicar septicémia e devem-se procurar focos de infecção bacteriana como por exemplo a meningite, pneumonia, infecções do tracto urinário (especialmente se houver um cateter) ou infecção no local da injecção intramuscular ou cateter venoso. Doentes com edema pulmonar, acidose metabólica ou hemorragia gastrointestinal massiva (uma potencial complicação da infecção por P. vivax) podem também apresentar choque. A desidratação com hipovolémia pode também contribuir para a hipotensão. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 29 Tabela 9: Principais patologias a valorizar no diagnóstico diferencial da malária grave/complicada Baterianas Virais Septicémia Leptospirose Salmoneloses Endocardite bacteriana subaguda Tétano Tuberculose Pneumonias Infecções urinárias Hepatite viral Febres hemorrágicas víricas Arboviroses (ex: Dengue – Chikungunya) Rotavirus Meningoencefalites (mais frequentes nas crianças) Síndromes virais em fase pré- exantemática VIH descompensado/neurológico Covid 19 Outras viroses Doenças não infeciosas Parasitárias Convulsão febril (na criança) Eclâmpsia Acidente Vascular Cerebral Traumatismo craneoencefálico Doenças auto-imunes (colagenoses) Tripanossomose (a ter em conta nas zonas endémicas) 6.5 | COMPLICAÇÕES FREQUENTES DA MALÁRIA COMPLICADA Pneumonia por aspiração Septicémia a gram negativos Hemorragia gastrintestinal Infecções associadas (salmoneloses, reacção leucemóide, rabdomiólise) Tabela 10: Indicadores clínicos e laboratoriais de mau prognóstico Clínicos Laboratoriais Criança menor que 3 anos Coma profundo Convulsões(nas 3h seguintes à hospitalização) Ausência de reflexos corneanos Hemorragia retiniana Edema papilar Rigidez de descerebração, de corticação ou opistótonos (atenção particular nas crianças). Colapso circulatório Distress respiratório Hiperparasitémia > 250 000/µl ou > 5% Esquizontémia periférica Leucocitose Periférica > 12 000/ µl Parasitas maturos pigmentados (>20% dos parasitas) Leucócitos periféricos com pigmentação malárica visível (>5%) Hematócrito 15% Hemoglobina 5 g/dl Glicémia 40 mg/dl (<2,2 mmol/l) Ureia 60 mg/dl Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 30 Clínicos Laboratoriais Choque Sinais clínicos de disfunção orgânica (I.R.A., E.P.A.) Creatinina 3,0 mg/dl (<265 µmol/l) Glicose no L.C.R. Acido Láctico no L.C.R. (> 6mmol /l) Acido Láctico Venoso (> 5 mmol /l) Aminotransferases 3x Aumento da Gama-GT e 5’ Nucleotidase Plasmática Baixos níveis de Antitrombina III Enzimas musculares aumentadas 6.6 | ASPECTOS PARTICULARES DA MALÁRIA GRAVE/COMPLICADA NA CRIANÇA A malária na criança, nos primeiros 28 dias após a nascença, apresenta-se em duas fases: congénita e neonatal. A congénita é aquela que evoluí nos primeiros 7 dias, transmitida de mãe para filho, e a neonatal depois dos 7 dias, no primeiro mês. Implicações Importante causa de morbi-mortalidade Aumento da mortalidade perinatal Baixo peso à nascença Paludismo do recém-nascido (neonatal) Paludismo congénito Anemia crónica Sequelas neurológicas (hemiparesia, ataxia cerebelosa, atraso mental, afasia e espasticidade generalizada) Absentismo escolar/baixo rendimento escolar. Aspectos Clínicos As crianças nascidas de mães não imunes que tenham sido infectadas pelo plasmódio no decorrer da gravidez, podem desenvolver uma parasitémia positiva e/ou um quadro de paludismo durante as primeiras semanas de vida. A malária cerebral e a anemia grave são as formas predominantes na criança. Os sintomas e sinais mais frequentes são: Febre; Vómitos; Tosse, diarreia; Convulsões; Hepato esplenomegália; E alterações da consciência. A respiração pode ser ruidosa e/ou ampla sugerindo acidose. A hipoglicemia coexiste com certa frequência; Podem aparecer sinais de falência cardíaca (por anemia severa). A profundidade do coma pode ser avaliada com a escala de Blantyre (adaptada da escala de Glasgow, ver anexos 7 e 6 respectivamente). Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 31 Se a criança com febre tem perda de consciência após uma convulsão e a recupera ao fim de meia hora, não é muito sugestiva de malária cerebral, correspondendo esta mais provavelmente a uma convulsão febril. Importante realçar as diferenças na evolução clínica entre adultos e crianças destacadas na tabela 11 abaixo. Tabela 11: Sintomas e sinais de malária grave em adultos e crianças Sintomas e sinais e Adultos Crianças Duração da doença 5-7 dias Mais curto (1-2 dias) Resolução do coma 2-4 dias +rápida (1-2 dias) Distress respiratório/ acidose Comum Comum Convulsões Comum (12%) Muito comum (30%) Prostação/ obnubilado Comum Comum Acidose metabólica Comum Comum Rigidez de descerebração, de corticação ou opistótonos Raro Comum Pressão LCR Geralmente normal Geralmente elevado Sequelas neurológicas após malária cerebral Raro (1%) Comum (5-30 %) Icterícia Comum Raro Insuficiência renal Comum Raro Hipoglicemia Menos comum Comum Edema Pulmonar Menos comum Raro Transtornos dos factores de coagulação Até 10% Raro Infecções bacterianas invasivas/co-infecções Raro (Menos de 5%) Comum (10% 6.7 | FACTORES DE SUCESSO NO MANUSEIO DOS CASOS Anamnese cuidadosa, com atenção para historial de viagem e o diagnóstico diferencial e para a identificação de infecções associadas; Evacuação imediata dos casos graves para níveis de atendimento mais adequados; Selecção e utilização correcta dos fármacos a serem usados; Identificação e tratamento precoce de complicações como a hipoglicemia, a insuficiência renal e o edema agudo do pulmão entre outras; Correcção do desequilíbrio hidroelectrolítico e cuidados de enfermagem adequados; Utilização correcta das vias de administração dos fármacos. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 32 6.8 | ERROS COMUNS NO DIAGNÓSTICO E GESTÃO Os erros comuns no diagnóstico e gestão da malária grave encontram-se listados na tabela abaixo. ERROS DE DIAGNÓSTICO Anamnese insuficiente relativa às deslocações (viagens) do doente a zonas endémicas ou a zonas de alta transmissibilidade. Negligenciar outras formas de transmissão da doença não anofelínicas. Subestimar a gravidade da doença. Problemas técnicos ligados ao diagnóstico. Não identificação das complicações (Hipoglicemia, IRA, EPA) e de outras infecções associadas à malária. Erros na avaliação do estado de hidratação e na administração de líquidos e electrólitos. ERROS DE CONDUTA Cuidados inadequados de enfermagem. Demora no início da quimioterapia antimalárica. Utilização de um determinado antimalárico de maneira injustificada. Cálculo incorrecto da dosagem. Falta de informação sobre a quimioterapia antimalárica prévia. Via de administração inadequada. Suspensão injustificada do tratamento Falta de controlo do início e da velocidade da perfusão. Não prever os efeitos cumulativos dos antimaláricas. Negligência a passagem da via parentérica para a oral. Entubação endotraqueal, traqueostomia intempestiva ou outras medidas intempestivas. Não reconhecimento de um S.D.R.A. Não reconhecer e tratar as convulsões discretas. Não reconhecimento e tratamento da anemia severa. Não efectuar fundoscopia. Demora no início da hemodiálise ou diálise peritoneal. 7. | TRATAMENTO DA MALÁRIA NA GRAVIDEZ " Salvar a mãe e preservar o feto" 7.1 | ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS Durante a gravidez, a malária é mais frequente e mais grave. As mulheres grávidas têm duas ou três vezes maior risco de contrair malária grave do que as não grávidas. Ministério de Saúde | Direção Nacional de Saúde Pública |Programa Nacional de Controlo da Malária Manual de Diagnóstico e Tratamento da Malária | Luanda, Angola 33 Nas regiões hiperendémicas de paludismo, as mulheres grávidas são frequentemente portadoras de hemazotoários. A presença destes é mais facilmente identificada a nível da placenta, podendo estar ausentes a nível do sangue periférico. A malária na gravidez é uma infecção de alto risco que pode evoluir rapidamente para doença grave na mãe e no feto. As grávidas expostas a esta doença têm uma prevalência relativamente elevada de abortos, nados mortos, baixo peso à nascença, malária congénita e parto prematuro. O risco associado a infecção placentar é maior na primeira gravidez, sendo ainda importante na segunda e menor nas subsequentes. Em áreas hiperendémicas, durante a gravidez, a malária é muitas vezes assintomática. Nestes casos, o principal efeito da infecção plasmódica na mãe é a anemia, que muitas vezes é grave, resultando em baixo peso à nascença. O quadro clínico da malária durante a gravidez é variável, apresentando nos casos graves com maior frequência a hipoglicemia, anemia grave, edema pulmonar, insuficiência renal, hiperpirexia e malária placentar. A hipoglicemia, para além de pôr em risco a saúde da mãe pode igualmente conduzir a uma situação de distress fetal, por induzir bradicardia
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