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C135e Cain, Michael L. Ecologia [recurso eletrônico] / Michael L. Cain, William D. Bowman, Sally D. Hacker ; revisão técnica: Leandro da Silva Duarte, Fernando Joner. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2011. Editado também como livro impresso em 2011 ISBN 978-85-363-2553-8 1. Ecologia. I. Bowman, William D. II. Hacker, Sally D. III. Título. CDU 574 Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB 10/2052 Equipe de tradução Armando M. Divan Junior (Capítulos 1-6) Doutor em Ciências Agrárias (Fisiologia Vegetal) pela Universidade Federal de Viçosa. Nelsa Cardoso (Capítulos 19-22, 24, glossário, apêndice, respostas, créditos, índice) Bióloga e botânica do Departamento de Biodiversidade e Ecologia, Faculdade de Biociência, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Doutora em Paleontologia pela UFRGS, com sanduíche em Paleoclimatologia pela Eberhard-Karls-Universität Tübingen. Ricardo Lange Hentschel (Capítulos 7-10, 23) Mestre em Botânica pela UFRGS. Ricardo Silva Pereira Mello (Capítulos 11-14) Doutor em Ciências (Ecologia) pela UFRGS. Robert Lawson Foster (Capítulos 11-14) Biólogo. Sandra C. Müller (Capítulos 15-18) Professora adjunta do Departamento de Ecologia, Instituto de Biociências, da UFRGS. Doutora em Ciências (Ecologia) pela UFRGS. Ecologia 527 Condição da paisagem Milhas 0 50 100 PiorMelhor 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 Satélite para uso do GPS (dados reunidos por telemetria) Satélite para a captação da imagem Fotografias aéreas Dados obtidos no solo Imagem final (A) Use um computador para produzir as camadas de dados: (B) Cada região colorida no mapa é uma bacia hidrográfica (bacia de drenagem) na qual diferentes camadas SIG foram combinadas para estimar a condição geral da paisagem. Terras protegidas Malha viária Densidade populacio nal Terras prot egidas Malha viár ia Densidade populacional Esta bacia hidrográfica possui uma condição de paisagem de escore 10, calculada pela combinação de pontos para seis camadas de SIG. Três destas camadas são apresentadas acima. Ecologia de paisagem CONCEITO 23.1 A ecologia de paisagem investiga padrões espaciais e suas relações com mudanças e processos ecológicos. A ecologia de paisagem é uma subdisciplina da ecologia que enfatiza as causas e consequências da va- riação espacial ao longo de uma gama de escalas. Desse modo, ecólogos de paisagem registram os padrões espaciais observados – incluindo aqueles que ocorrem em amplas áreas geográficas – e estudam como esses padrões afetam e são afetados pelos pro- cessos ecológicos. Os padrões de interesse se cons- tituem em arranjos espaciais de diferentes elementos da paisagem na superfície da Terra. Exemplos de ele- mentos da paisagem incluem manchas de florestas circundadas por pastagens ou lagos espalhados por FIGURA 23.3 Sistemas de Informação Geográfica inte- gram dados espaciais de múltiplas fontes Os Sistemas de Informação Geográfica (SIG) são sistemas computacionais que permitem a coleta, armazenamento, análise e apresenta- ção dos dados geograficamente explícitos. (A) Os dados são oriundos de muitas fontes, incluindo fotos aéreas, imagens de satélite e a confirmação dos dados em campo. Camadas de da- dos mapeados podem ser reunidas de modo a auxiliar na so- lução de questões particulares. (B) No Estado de Nova Iorque, informações sobre os padrões de uso de solo (densidade da população humana, malha viária, terras protegidas, barragens) foram combinadas com variáveis naturais (cobertura natu- ral e áreas de florestas) para estimar a condição da paisagem e identificar áreas com as maiores oportunidades de conservação. 528 Cain, Bowman & Hacker uma grande região de floresta boreal. Em uma escala espacial menor, os elementos da paisagem poderiam consistir em um indivíduo arbustivo de creosoto no deserto. Mas quaisquer que sejam os elementos, eles estão dispostos de certo modo no espaço. Como ve- remos, o padrão espacial dos elementos da paisagem pode influenciar na composição de espécies residentes, assim como na dinâmica de processos ecológicos como distúrbios e dispersão. A paisagem é uma área heterogênea composta de um mosaico dinâmico de ecossistemas que interagem uns com os outros Uma paisagem é uma área em que ao menos um ele- mento é espacialmente heterogêneo (varia de lugar para lugar) (Figura 23.4). Paisagens podem ser hetero- gêneas tanto por sua composição – a paisagem é com- posta de doze tipos de cobertura vegetacionais ou ape- nas três? – quanto pelo modo com que seus elementos estão arranjados – existem muitas manchas pequenas dispostas regularmente na paisagem ou existem poucas manchas grandes? Ecólogos geralmente chamam essa combinação de elementos heterogêneos de mosaico. Os diferentes ecossistemas que formam a paisa- gem são dinâmicos e interagem continuamente uns com os outros. Essas interações podem ocorrer pelo fluxo da água, da energia, dos nutrientes e dos po- luentes entre os ecossistemas, como, por exemplo, de uma floresta para um lago adjacente. Também há o flu- xo biótico entre as manchas adjacentes do mosaico, à medida que animais, sementes, pólen e outros agentes biológicos se movem entre os fragmentos (Forman, 1995). Para que esses movimentos ocorram, as man- chas devem estar diretamente conectadas umas com as outras ou o hábitat do entorno (a matriz) deve ser do tipo que possibilite a dispersão (Figura 23.5). Na Aus- trália, por exemplo, ratos deixam regularmente o meio florestal para forragear em plantações de amêndoas de macadâmia adjacentes, resultando em maiores perdas de produção nas zonas de contato com hábitats flo- restais do que nas divisas com campos ou outras áreas de agricultura (White et al., 1997). Examinaremos essa dinâmica entre fragmentos em maior detalhe a seguir. A heterogeneidade da paisagem é estudada em uma ampla abrangência de escalas, embora a maioria dos estudos de paisagem seja feita na escala de hecta- res e a quilômetros quadrados. A questão da escala é essencial na ecologia de paisagem, uma vez que a es- cala selecionada influenciará nas conclusões encontra- das (Quadro 23.1). Ecólogos da paisagem descrevem a heterogenei- dade observada na natureza em termos de composição e estrutura. A composição da paisagem se refere aos tipos de elementos ou de manchas em uma área natu- ral, assim como o quanto de cada tipo se faz presente. Lago Areia seca e ácida sem subsolo firme Areia seca e ácida com subsolo firme Argila calcárea úmida Argila ácida úmida Argila calcárea encharcada Areia ácida encharcada e lodo Lago Área urbana ou pedreira Floresta decídua de terra firme Floresta perenifólia de terra firme Floresta mista decídua/perenifólia Floresta paludosa Área úmida sem floresta Áreas de pastejo ou cultivo (B) (C)(A) FIGURA 23.4 A heterogeneidade da paisa- gem Paisagens podem ser heterogêneas em muitos tipos diferentes de elementos, que podem ser dispostos de modo independente. (A) Fotografia aérea da Península Superior de Michigan. (B) Mapa com seis tipos diferentes de solo na mesma área. (C) Mapa com sete elementos diferentes de paisagem na mesma área. (Conforme Delcourt, 2002.) Ecologia 529 Esses elementos são definidos pelo investigador e in- fluenciados pela fonte de dados utilizada (Figura 23.6). Em um exemplo do Parque Nacional de Yellowstone, pesquisadores designaram cinco diferentes classes etá- rias de florestas de pinheiro lodgepol utilizando dados de campo, imagens aéreas e SIG (Tinker et al., 2003). A composição dessa paisagem pode ser quantificada pela contagem dos tipos de elementos presentes na área mapeada (cinco neste caso), pelo cálculo da proporção da área de cobertura de cada elemento na área mapea- da ou pela medição da diversidade e da dominância de diferentes elementos da paisagem de modo semelhan- te ao feito com as espécies, utilizando medidas como o índice de Shannon, por exemplo (ver Capítulo 15). Na Figura 23.6, tambémpodemos notar variação em como as diferentes classes etárias estão distribuí- das na paisagem. Quando percebemos que uma área é mais fragmentada que outra, estamos comparando a estrutura da paisagem, ou a configuração física dos diferentes elementos constituintes. Podemos ver que, em algumas partes da paisagem, existem blocos con- tínuos de florestas mais antigas (área B), enquanto que em outras partes a paisagem é mais fragmenta- da, apresentando um mosaico de pequenas manchas de diferentes classes etárias (área A), principalmente devido a episódios de queimadas no passado. Como os ecólogos da paisagem quantificam essas diferen- ças? Centenas de diferentes medições quantitativas têm sido desenvolvidas para medir, analisar e interpre- tar padrões de paisagem, muitas envolvendo análises complexas. De modo geral, elas verificam se a paisa- gem é composta por fragmentos pequenos ou grandes, qual o grau de conexão ou de dispersão dos fragmen- tos, se os fragmentos possuem formatos simples ou re- cortados e o quão fragmentada é a paisagem (Turner et al., 2001). Tinker e colaboradores estavam aptos a utili- zar as métricas da paisagem que eles elaboraram para Yellowstone, para comparar a fragmentação natural causada por queimadas e a fragmentação do entorno do parque causada pelo corte raso de madeira. Não há uma medida simples que congregue todos os aspectos da estrutura da paisagem que podem ser aplicados em diferentes situações. Seja qual for a medida quantita- tiva utilizada, essa abordagem nos permite comparar uma paisagem com outra e relacionar os padrões da paisagem com processos ecológicos e com a dinâmica da mudança da paisagem. Padrões de paisagem afetam processos ecológicos regulando a movimentação de elementos e organismos A configuração espacial dos elementos da paisagem exerce importante papel na dinâmica ecológica. Ela pode influenciar, por exemplo, se e como os animais se Fragmento (A) (B) Matriz 1 Matriz 2 Corredor FIGURA 23.5 Dinâmica entre fragmentos Interações en- tre elementos adjacentes da paisagem podem ocorrer com fre- quência (setas largas) ou raramente (setas finas). (A) Trocas entre um fragmento e a matriz circundante ocorrem com frequência. (B) Trocas entre manchas do mesmo tipo ocorrem frequente- mente, mas trocas com a matriz raramente ocorrem. (Conforme Hersperger, 2006.) Apenas remanescentes de florestas mais velhas permanecem após focos recentes de incêndio. Grandes populações de árvores mais velhas são encontradas nesta região sem queimadas. 1–25 Classes etárias dos bosques 26–158 159–247 248–323 324–560 0 16 km Lago Yellowstone FIGURA 23.6 Composição e estrutura da paisagem Nes- te mapa da floresta de pinheiro lodgepole (Pinus contorta var. la- tifolia), no Parque Nacional de Yellowstone, podemos ver que a paisagem é composta por cinco tipos diferentes de estágios de desenvolvimento. A complexidade estrutural varia na paisagem, como pode ser visto no grau de variação da fragmentação natu- ral. (Conforme Tinker et al., 2003.) 530 Cain, Bowman & Hacker Considerações sobre escalas não podem ser ignoradas na ecologia de paisagem. Uma paisagem pode ser heterogênea em uma escala relevante para um besouro, mas homogênea para um pássaro canoro ou para um alce. A escala que escolhemos para es- tudar uma paisagem determina os re- sultados que iremos obter. Dessa for- ma, parte da ecologia de paisagem envolve o entendimento das implica- ções da escala. Escala, dimensão espacial ou tem- poral de um objeto ou processo, é ca- racterizada tanto pelo grânulo quanto pela sua extensão. Grânulo é o tama- nho da menor unidade homogênea de um estudo (como o pixel das ima- gens digitais) e determina a resolução na qual vemos a paisagem. A seleção do grânulo afetará a quantidade de dados que devem ser manipulados na análise: usar uma abordagem com grânulos grandes pode ser apropriado quando se estiver procurando por pa- drões de escala regional a continental (Figuras A-C). Extensão se refere à área ou período de tempo envolvido pelo estudo. Considere os modos va- riados pelos quais podemos descre- ver a composição de um ambiente dependendo de como definimos a extensão espacial (Figuras D-F). A Figura D, por exemplo, mostra muito pouco da sucessão final do pinhei- ro-de-casca-branca, enquanto a Fi- gura F contém uma considerável área dessa espécie (Turner et al., 2001). Po- dem existir fronteiras antropogênicas ou naturais que determinam a exten- são de um estudo, ou elas podem ser definidos por um pesquisador. Examinando questões de escala, estudos de ecossistemas e de pai- sagem também devem determinar como processos aumentam ou dimi- nuem de escala. Por exemplo, uma pessoa estudando trocas de carbono em nível de paisagem precisa saber como medições de CO2 baseadas nas folhas mudam aumentando a escala para toda a planta, o ecossistema e por fim, para o mosaico de ecossiste- mas que formam a paisagem. Ecólo- gos têm buscado elucidar princípios gerais que possam ser aplicados em questões de escala, as consequências de se agrupar dados ou simplificar en- tre os níveis de escala, e como os pa- drões e os fenômenos em uma dada escala afetam aqueles que ocorrem abaixo ou acima na hierarquia das es- calas (Levin, 1992). Pensando em escalas QUADRO 23.1 50 x 50 m 10.000 100 x 100 m 2.500 200 x 200 m 625 (A) (D) (E) (F) (B) (C) Não é floresta Pinheiro lodgepole, sucessão inicial (queimado) Pinheiro lodgepole, sucessão intermediária Pinheiro lodgepole, sucessão tardia Pinheiro-de-casca-branca, sucessão inicial (queimado) Pinheiro-de-casca-branca, sucessão intermediária Pinheiro-de-casca-branca, sucessão tardia Tamanho do pixel: Número de pixels: Imagens de A-C são de uma só região de 5 x 5 km no Parque Nacional de Yellowstone. À medida que o grânulo aumenta de A para C... ... a resolução da imagem piora, mas existem menos pixels para armazenar e analisar. De D a F, o tamanho do pixel é de 50 x 50 m em cada painel. Efeitos do grânulo e da extensão (A-C) mos- tram o efeito de aumentar o grânulo; (D-F) mos- tram o efeito de aumentar a extensão. (Conforme Turner et al., 2001.) Ecologia 531 movimentarão e, portanto, indiretamente, influenciar taxas de polinização, dispersão e predação. Na Guiana Francesa, Mickael Henry e colaboradores estudaram a movimentação de um morcego frugívoro (Rhinophylla pumilio) em uma floresta tropical madura seguida de fragmentação causada pela construção de uma barra- gem. Utilizando as métricas da paisagem que quanti- ficam o grau de conectividade da paisagem em seus pontos amostrais, eles concluíram que a conectividade era um fator determinante para a densidade de morce- gos. Fragmentos de hábitat mais isolados tinham me- nor probabilidade de serem visitados pelos morcegos, mesmo se tivessem abundantes estoques de recursos (Henry et al., 2007). Assim, a estrutura da paisagem afetava o comportamento de forrageio dos morcegos e, consequentemente, os padrões de dispersão das plan- tas das quais se alimentam os morcegos. Padrões de paisagem também modulam ciclagens biogeoquímicas. Ecólogos de ecossistemas têm indica- do hotspots biogeoquímicos cujas taxas de reações quí- micas são maiores do que nos ambientes do entorno. A água possui um papel fundamental nessa variação, uma vez que as interfaces entre os ecossistemas terres- tres e aquáticos são locais típicos de altas taxas de ro- tatividade biogeoquímica, mas outros fatores também podem influenciar (McClain et al., 2003). Por exemplo, Kathleen Weathers e colaboradores constataram que acréscimos de enxofre, cálcio e nitrogênio oriundos de deposição atmosférica eram maiores nas bordas das florestas do que no interior das florestas, basicamente em decorrência da maior interceptação de partículas aéreas pelas copas mais densas das árvores e da maior complexidade física tipicamente encontrada nas bor- das florestais. Dessa forma, as florestas fragmentadas próximasde áreas urbanas podem ser significativa- mente influenciadas por entradas de poluentes e nu- trientes – descoberta que tem implicações na dinâmica de micro-organismos de solo, no crescimento da vege- tação herbácea e nas comunidades animais nas bordas destes fragmentos (Weathers et al., 2001). Em geral, fragmentos da paisagem variam em qua- lidade de hábitat e em disponibilidade de recursos. Esta variação pode afetar as densidades populacionais de espécies habitando cada mancha, o tempo em que os animais permanecem forrageando na mancha e o deslocamento dos organismos entre manchas. As fron- teiras das manchas, as conexões entre os fragmentos e a matriz entre os fragmentos também podem afetar a dinâmica populacional, tanto dentro como entre as manchas. Schtickzelle e Baguette, por exemplo, estu- daram os padrões de deslocamento da borboleta bog fritillary (Proclossiana eunomia) entre fragmentos da paisagem na Bélgica (Figura 23.7). Onde os fragmen- tos apropriados de hábitat estavam agregados, as fê- meas atravessavam prontamente de um fragmento a outro. No entanto, onde o hábitat era mais fragmenta- do e havia uma distância maior de matriz para atraves- sar, as borboletas hesitaram mais em deixar a mancha (Schtickzelle & Baguette, 2003). O formato e a orientação dos elementos da paisa- gem também podem ser importantes na interceptação física dos organismos e, assim, serem funcionais na determinação da composição das espécies. Gutzwiller e Anderson concluíram que as aves em época repro- dutiva na rota migratória para o norte estavam mais propensas a nidificar nos fragmentos florestais orienta- dos em um eixo leste-oeste nas pradarias do Wyoming, de tal forma que o fragmento de hábitat viesse a atuar efetivamente como uma rede, interceptando as aves quando migram para o norte. Eles não verificaram essa associação em espécies de pássaros residentes. Nes- se caso, a estrutura da paisagem determina em parte a composição das espécies da comunidade das aves (Gutzwiller & Anderson, 1992). Interações entre padrões da paisagem e processos ecológicos são recíprocas. Processos ecológicos são re- gulados pelos padrões da paisagem, como acabamos de ver, mas os padrões da paisagem, por sua vez, po- dem ser resultados dos processos ecológicos, como quando grandes mamíferos pastejadores moldam a paisagem na qual vivem. Os efeitos do alce (Alces alces) na Ilha Royale no Lago Superior têm sido estudados pelo uso de cercas instaladas desde a década de 1940. A alta taxa de consumo do alce diminui a produção primária líquida do ecossistema, não apenas pela re- moção direta de biomassa, mas também indiretamente FIGURA 23.7 Padrões de deslocamento da borboleta bog fritillary Os padrões de deslocamento desta borboleta (Proclossiana eunomia) são influenciados pelas características da paisagem ao redor. As borboletas hesitam em deixar os fragmen- tos onde habitam se não houver outro fragmento com hábitat apropriado nas cercanias, mas atravessam uma matriz de hábitat não apropriado do entorno quando o fragmento seguinte esti- ver próximo. 532 Cain, Bowman & Hacker pela alteração das taxas de mineralização do nitrogênio e das taxas de decomposição do folhiço. Pastando, o alce também modifica a composição das árvores en- contradas na paisagem em favor do espruce, e o pre- domínio do espruce por sua vez acaba determinando as taxas dos processos biogeoquímicos (Pastor et al., 1988). Assim, ao mesmo tempo, os alces respondem à paisagem e atuam como seus modificadores. Em escala mais ampla, padrões da paisagem interagem com dis- túrbios de larga escala, como veremos adiante. O distúrbio tanto cria heterogeneidade da paisagem quanto responde a ela Paisagens são naturalmente dinâmicas. Na natureza, as mudanças às vezes chegam aos ecossistemas de modo catastrófico – florestas e pradarias são queimadas em grandes extensões, e enchentes trazem súbitos acrés- cimos de sedimento em ecossistemas fluviais – e, em outros momentos, de modo vagaroso, como resultado da mudança do clima e movimentação dos continen- tes. Vimos no Capítulo 16 que o distúrbio é um fator importante na determinação da composição da comu- nidade. Ecólogos da paisagem têm perguntado se pa- drões particulares de paisagem tornam mais lenta ou aceleram a disseminação de distúrbios e se aumentam ou diminuem a vulnerabilidade dos ecossistemas aos distúrbios (Turner, 2005). Em 1988, um incêndio florestal queimou pratica- mente um terço dos 900.000 hectares do Parque Na- cional de Yellowstone. Essa queimada sucedeu décadas de supressão antropogênica do fogo e veio num verão de seca extrema e de fortes ventos. Nos últimos 10.000 anos, grandes queimadas como essa parecem ter ocor- rido no norte das Montanhas Rochosas, em intervalos de 100 a 500 anos. O fogo queimou manchas de flo- restas de diversos estágios de desenvolvimento e com diferentes espécies, deixando um complexo mosaico de fragmentos queimados em intensidades distintas (Figura 23.8). Esse distúrbio de larga escala era parcial- mente controlado pelas condições florestais existentes naquela época e era favorecido pelo vento e pela seca de um verão em particular. A queimada de 1988 defini- rá provavelmente a composição da paisagem durante as próximas décadas ou séculos (Turner et al., 2003). Aqui, o distúrbio – fogo – era a força primária a mol- dar o padrão da paisagem do futuro. Ao mesmo tempo, também respondia à estrutura da paisagem existente. Essa interação recíproca entre paisagem e distúrbio é um tanto comum. Com o aumento da pegada ecológica da humani- dade, o tipo e a extensão dos níveis de distúrbios na paisagem foram alterados. Alguns locais estão mais sujeitos aos distúrbios humanos do que outros. Os pri- meiros povoadores se fixaram e desbravaram áreas com os solos mais férteis para a agricultura. Naturalmente atraídos para boas localizações portuárias, sujeitaram assim os ecossistemas desses locais aos primeiros dis- túrbios antrópicos. Áreas próximas às aldeias tiveram a madeira extraída, foram convertidas em lavouras e so- freram com a caça mais cedo do que as áreas restantes. Esses padrões de distúrbio continuam interferindo na biodiversidade atual, mesmo depois dos povoamentos terem abandonado as terras e que elas tenham voltado a ser floresta (Butzer, 1992). Tais legados da paisagem moldam as comunidades vegetais de maneiras que apenas começamos a enten- der. Os efeitos dos distúrbios antropogênicos podem ser detectados em comunidades ecológicas até mesmo séculos após o distúrbio. Na França Central, Etienne Dambrine e colaboradores demonstraram que comu- nidades de plantas florestais em locais onde foram os acampamentos dos romanos há 1.600 anos ainda apre- sentam sinais desses distúrbios. A área de floresta ma- peada não tinha mudado substancialmente desde 1665 e foi, provavelmente, mantida como floresta durante séculos antes dessa data. Os pesquisadores analisa- ram a diversidade de plantas na floresta em diferentes distâncias dos locais das ruínas romanas recentemente desvendadas e constataram que a riqueza de espécies aumentou ao redor das ruínas. A análise das proprie- dades do solo revelou que esse aumento era principal- mente devido a um pH mais elevado, que parece de- FIGURA 23.8 Distúrbios podem moldar padrões da paisa- gem O fogo que queimou aproximadamente um terço do Par- que Nacional de Yellowstone no verão de 1988 resultou em um complexo mosaico de manchas queimadas e não queimadas, que moldará a composição da paisagem nas próximas décadas ou séculos. Áreas que aparecem em preto nesta vista aérea do Cânion Madison foram queimadas por intensas chamas no dos- sel, e as manchas de cor marrom foram queimadas por intenso fogo próximo ao solo; ambos os modos mataram a maior parte ou toda a vegetação. Ecologia 533 correr da argamassa de cal utilizada nas construções romanas e das suas práticas de agricultura. Os níveis de fósforo também foram mais altos nas proximidades doslocais de acampamento (Dambrine et al., 2007) (Figura 23.9). Quantos outros lugares na Terra, depois de serem abandonados, devem apresentar as marcas das ativida- des humanas em suas estruturas de comunidade? Distúrbio, mesmo se natural ou antrópico, é um fator determinante no delineamento da paisagem. Al- guns distúrbios atuais dos humanos estão tendo efei- tos ecológicos muito severos, como veremos na próxi- ma seção. Fragmentação de hábitat CONCEITO 23.2 A fragmentação de hábitat diminui a área de hábitat, isola populações e altera condições nas bordas dos hábitats. Em 1986, o projeto de uma grande hidrelétrica no Rio Caroni em um vale da Venezuela inundou 4.300 km2 de um terreno acidentado, criando um reservató- rio conhecido como Lago Guri (Figura 23.10). O resul- tado foi a formação de várias ilhas de floresta tropical circundadas por água, onde antes havia uma floresta relativamente intacta. Essa mudança na paisagem deu uma oportunidade para John Terborgh e seus alunos e colegas estudarem os efeitos da fragmentação em um ecossistema de floresta tropical seca. Seus resul- tados foram inquietantes. As ilhas pequenas e médias não tinham mais os predadores de topo encontrados na região, principalmente os felinos (onças, pumas, ja- guatiricas), aves de rapina e grandes serpentes. Dessa forma, sem seus predadores, populações de herbívoros generalistas, predadores de sementes e predadores de invertebrados eram de 10 a 100 vezes mais abundantes nas ilhas do que nas florestas intactas. Entre as espé- cies que tiveram aumento na abundância estão for- migas-cortadeiras, pássaros, roedores, sapos, aranhas, micos-pretos, porcos-espinhos, tartarugas e lagartos. O aumento na abundância dessas espécies gerou um efeito drástico na vegetação dessas ilhas, pois o recru- tamento decaiu e a mortalidade das árvores aumentou devido à elevada taxa de herbivoria, causada especial- mente pelas formigas (Figura 23.11). As mudanças que a comunidade vegetal sofreu, segundo Terborgh, eram FIGURA 23.9 Legados da paisagem Na França Central, o legado dos acampamento e das práticas de agricultura dos ro- manos, abandonado há quase dois milênios, ainda é percebido na riqueza das espécies de plantas na floresta que ocupou estes locais. (A) Mais espécies foram encontradas próximas ao cen- tro dos locais dos acampamentos, incluindo mais espécies que preferem pH mais elevado. (B) O pH do solo e (C) o fósforo do solo também foram mais elevados próximo aos acampamentos. (Conforme Dambrine et al., 2007.) N úm er o d e es pé ci es d e pl an ta s –5 –10 0 5 10 15 20 25 30(A) (B) (C) pH d o so lo –0,5 0 0,5 1,0 1,5 –1,0 Fó sf or o d o so lo (m g/ kg ) 0 100 200 300 400 500 Distância do centro do acampamento (m) –10 0 10 20 30 40 –20 Roma Império Romano, 117 d.C. Área de estudo Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Capa Iniciais Ficha Catalográfica
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