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Ecologia de Paisagem

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C135e Cain, Michael L.
 Ecologia [recurso eletrônico] / Michael L. Cain, William D.
 Bowman, Sally D. Hacker ; revisão técnica: Leandro da Silva 
 Duarte, Fernando Joner. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : 
 Artmed, 2011.
 
 Editado também como livro impresso em 2011
 ISBN 978-85-363-2553-8
 1. Ecologia. I. Bowman, William D. II. Hacker, Sally D.
 III. Título.
CDU 574
Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB 10/2052
Equipe de tradução
Armando M. Divan Junior (Capítulos 1-6)
Doutor em Ciências Agrárias (Fisiologia Vegetal) pela Universidade Federal de Viçosa.
Nelsa Cardoso (Capítulos 19-22, 24, glossário, apêndice, respostas, créditos, índice)
Bióloga e botânica do Departamento de Biodiversidade e Ecologia, Faculdade de Biociência, 
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Doutora em Paleontologia pela UFRGS, 
com sanduíche em Paleoclimatologia pela Eberhard-Karls-Universität Tübingen.
Ricardo Lange Hentschel (Capítulos 7-10, 23)
Mestre em Botânica pela UFRGS.
Ricardo Silva Pereira Mello (Capítulos 11-14)
Doutor em Ciências (Ecologia) pela UFRGS.
Robert Lawson Foster (Capítulos 11-14)
Biólogo.
Sandra C. Müller (Capítulos 15-18)
Professora adjunta do Departamento de Ecologia, Instituto de Biociências, da UFRGS.
Doutora em Ciências (Ecologia) pela UFRGS.
Ecologia 527
Condição da paisagem Milhas
0 50 100
PiorMelhor 
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13
Satélite para uso do GPS
(dados reunidos por telemetria)
Satélite para a
captação da imagem
Fotografias aéreas
Dados obtidos
no solo
Imagem final
(A)
Use um computador para produzir as camadas de dados:
(B)
Cada região colorida no mapa é uma 
bacia hidrográfica (bacia de drenagem) 
na qual diferentes camadas SIG foram 
combinadas para estimar a condição 
geral da paisagem.
Terras protegidas
Malha viária
Densidade
 populacio
nal
Terras prot
egidas
Malha viár
ia
Densidade
populacional
Esta bacia hidrográfica possui uma 
condição de paisagem de escore 10, 
calculada pela combinação de pontos 
para seis camadas de SIG. Três destas 
camadas são apresentadas acima.
Ecologia de paisagem
CONCEITO 23.1
A ecologia de paisagem investiga padrões espaciais e 
suas relações com mudanças e processos ecológicos.
A ecologia de paisagem é uma subdisciplina da 
ecologia que enfatiza as causas e consequências da va-
riação espacial ao longo de uma gama de escalas.
Desse modo, ecólogos de paisagem registram os 
padrões espaciais observados – incluindo aqueles que 
ocorrem em amplas áreas geográficas – e estudam 
como esses padrões afetam e são afetados pelos pro-
cessos ecológicos. Os padrões de interesse se cons-
tituem em arranjos espaciais de diferentes elementos 
da paisagem na superfície da Terra. Exemplos de ele-
mentos da paisagem incluem manchas de florestas 
circundadas por pastagens ou lagos espalhados por 
FIGURA 23.3 Sistemas de Informação Geográfica inte-
gram dados espaciais de múltiplas fontes Os Sistemas 
de Informação Geográfica (SIG) são sistemas computacionais 
que permitem a coleta, armazenamento, análise e apresenta-
ção dos dados geograficamente explícitos. (A) Os dados são 
oriundos de muitas fontes, incluindo fotos aéreas, imagens de 
satélite e a confirmação dos dados em campo. Camadas de da-
dos mapeados podem ser reunidas de modo a auxiliar na so-
lução de questões particulares. (B) No Estado de Nova Iorque, 
informações sobre os padrões de uso de solo (densidade da 
população humana, malha viária, terras protegidas, barragens) 
foram combinadas com variáveis naturais (cobertura natu-
ral e áreas de florestas) para estimar a condição da paisagem 
e identificar áreas com as maiores oportunidades de conservação.
528 Cain, Bowman & Hacker
uma grande região de floresta boreal. Em uma escala 
espacial menor, os elementos da paisagem poderiam 
consistir em um indivíduo arbustivo de creosoto no 
deserto. Mas quaisquer que sejam os elementos, eles 
estão dispostos de certo modo no espaço. Como ve-
remos, o padrão espacial dos elementos da paisagem 
pode influenciar na composição de espécies residentes, 
assim como na dinâmica de processos ecológicos como 
distúrbios e dispersão.
A paisagem é uma área heterogênea composta 
de um mosaico dinâmico de ecossistemas que 
interagem uns com os outros
Uma paisagem é uma área em que ao menos um ele-
mento é espacialmente heterogêneo (varia de lugar 
para lugar) (Figura 23.4). Paisagens podem ser hetero-
gêneas tanto por sua composição – a paisagem é com-
posta de doze tipos de cobertura vegetacionais ou ape-
nas três? – quanto pelo modo com que seus elementos 
estão arranjados – existem muitas manchas pequenas 
dispostas regularmente na paisagem ou existem poucas 
manchas grandes? Ecólogos geralmente chamam essa 
combinação de elementos heterogêneos de mosaico.
Os diferentes ecossistemas que formam a paisa-
gem são dinâmicos e interagem continuamente uns 
com os outros. Essas interações podem ocorrer pelo 
fluxo da água, da energia, dos nutrientes e dos po-
luentes entre os ecossistemas, como, por exemplo, de 
uma floresta para um lago adjacente. Também há o flu-
xo biótico entre as manchas adjacentes do mosaico, à 
medida que animais, sementes, pólen e outros agentes 
biológicos se movem entre os fragmentos (Forman, 
1995). Para que esses movimentos ocorram, as man-
chas devem estar diretamente conectadas umas com 
as outras ou o hábitat do entorno (a matriz) deve ser do 
tipo que possibilite a dispersão (Figura 23.5). Na Aus-
trália, por exemplo, ratos deixam regularmente o meio 
florestal para forragear em plantações de amêndoas de 
macadâmia adjacentes, resultando em maiores perdas 
de produção nas zonas de contato com hábitats flo-
restais do que nas divisas com campos ou outras áreas 
de agricultura (White et al., 1997). Examinaremos essa 
dinâmica entre fragmentos em maior detalhe a seguir.
A heterogeneidade da paisagem é estudada em 
uma ampla abrangência de escalas, embora a maioria 
dos estudos de paisagem seja feita na escala de hecta-
res e a quilômetros quadrados. A questão da escala é 
essencial na ecologia de paisagem, uma vez que a es-
cala selecionada influenciará nas conclusões encontra-
das (Quadro 23.1).
Ecólogos da paisagem descrevem a heterogenei-
dade observada na natureza em termos de composição 
e estrutura. A composição da paisagem se refere aos 
tipos de elementos ou de manchas em uma área natu-
ral, assim como o quanto de cada tipo se faz presente. 
Lago
Areia seca e ácida sem subsolo firme
Areia seca e ácida com subsolo firme
Argila calcárea úmida
Argila ácida úmida
Argila calcárea encharcada
Areia ácida encharcada e lodo
Lago
Área urbana ou pedreira
Floresta decídua de terra firme
Floresta perenifólia de terra firme
Floresta mista decídua/perenifólia
Floresta paludosa
Área úmida sem floresta
Áreas de pastejo ou cultivo
(B) (C)(A)
FIGURA 23.4 A heterogeneidade da paisa-
gem Paisagens podem ser heterogêneas em 
muitos tipos diferentes de elementos, que podem 
ser dispostos de modo independente. (A) Fotografia 
aérea da Península Superior de Michigan. (B) Mapa 
com seis tipos diferentes de solo na mesma área. (C) 
Mapa com sete elementos diferentes de paisagem 
na mesma área. (Conforme Delcourt, 2002.)
Ecologia 529
Esses elementos são definidos pelo investigador e in-
fluenciados pela fonte de dados utilizada (Figura 23.6). 
Em um exemplo do Parque Nacional de Yellowstone, 
pesquisadores designaram cinco diferentes classes etá-
rias de florestas de pinheiro lodgepol utilizando dados 
de campo, imagens aéreas e SIG (Tinker et al., 2003). A 
composição dessa paisagem pode ser quantificada pela 
contagem dos tipos de elementos presentes na área 
mapeada (cinco neste caso), pelo cálculo da proporção 
da área de cobertura de cada elemento na área mapea-
da ou pela medição da diversidade e da dominância de 
diferentes elementos da paisagem de modo semelhan-
te ao feito com as espécies, utilizando medidas como o 
índice de Shannon, por exemplo (ver Capítulo 15).
Na Figura 23.6, tambémpodemos notar variação 
em como as diferentes classes etárias estão distribuí-
das na paisagem. Quando percebemos que uma área 
é mais fragmentada que outra, estamos comparando 
a estrutura da paisagem, ou a configuração física dos 
diferentes elementos constituintes. Podemos ver que, 
em algumas partes da paisagem, existem blocos con-
tínuos de florestas mais antigas (área B), enquanto 
que em outras partes a paisagem é mais fragmenta-
da, apresentando um mosaico de pequenas manchas 
de diferentes classes etárias (área A), principalmente 
devido a episódios de queimadas no passado. Como 
os ecólogos da paisagem quantificam essas diferen-
ças? Centenas de diferentes medições quantitativas 
têm sido desenvolvidas para medir, analisar e interpre-
tar padrões de paisagem, muitas envolvendo análises 
complexas. De modo geral, elas verificam se a paisa-
gem é composta por fragmentos pequenos ou grandes, 
qual o grau de conexão ou de dispersão dos fragmen-
tos, se os fragmentos possuem formatos simples ou re-
cortados e o quão fragmentada é a paisagem (Turner et 
al., 2001). Tinker e colaboradores estavam aptos a utili-
zar as métricas da paisagem que eles elaboraram para 
Yellowstone, para comparar a fragmentação natural 
causada por queimadas e a fragmentação do entorno 
do parque causada pelo corte raso de madeira. Não há 
uma medida simples que congregue todos os aspectos 
da estrutura da paisagem que podem ser aplicados em 
diferentes situações. Seja qual for a medida quantita-
tiva utilizada, essa abordagem nos permite comparar 
uma paisagem com outra e relacionar os padrões da 
paisagem com processos ecológicos e com a dinâmica 
da mudança da paisagem.
Padrões de paisagem afetam processos 
ecológicos regulando a movimentação de 
elementos e organismos
A configuração espacial dos elementos da paisagem 
exerce importante papel na dinâmica ecológica. Ela 
pode influenciar, por exemplo, se e como os animais se 
Fragmento
(A) (B)
Matriz 1
Matriz 2
Corredor
FIGURA 23.5 Dinâmica entre fragmentos Interações en-
tre elementos adjacentes da paisagem podem ocorrer com fre-
quência (setas largas) ou raramente (setas finas). (A) Trocas entre 
um fragmento e a matriz circundante ocorrem com frequência. 
(B) Trocas entre manchas do mesmo tipo ocorrem frequente-
mente, mas trocas com a matriz raramente ocorrem. (Conforme 
Hersperger, 2006.)
Apenas remanescentes
de florestas mais velhas
permanecem após focos
recentes de incêndio.
Grandes populações de
árvores mais velhas são
encontradas nesta região
sem queimadas.
1–25
Classes etárias
dos bosques
26–158
159–247
248–323
324–560
0 16
km
Lago
Yellowstone
FIGURA 23.6 Composição e estrutura da paisagem Nes-
te mapa da floresta de pinheiro lodgepole (Pinus contorta var. la-
tifolia), no Parque Nacional de Yellowstone, podemos ver que a 
paisagem é composta por cinco tipos diferentes de estágios de 
desenvolvimento. A complexidade estrutural varia na paisagem, 
como pode ser visto no grau de variação da fragmentação natu-
ral. (Conforme Tinker et al., 2003.)
530 Cain, Bowman & Hacker
Considerações sobre escalas não podem ser ignoradas na ecologia 
de paisagem. Uma paisagem pode ser 
heterogênea em uma escala relevante 
para um besouro, mas homogênea 
para um pássaro canoro ou para um 
alce. A escala que escolhemos para es-
tudar uma paisagem determina os re-
sultados que iremos obter. Dessa for-
ma, parte da ecologia de paisagem 
envolve o entendimento das implica-
ções da escala.
Escala, dimensão espacial ou tem-
poral de um objeto ou processo, é ca-
racterizada tanto pelo grânulo quanto 
pela sua extensão. Grânulo é o tama-
nho da menor unidade homogênea 
de um estudo (como o pixel das ima-
gens digitais) e determina a resolução 
na qual vemos a paisagem. A seleção 
do grânulo afetará a quantidade de 
dados que devem ser manipulados 
na análise: usar uma abordagem com 
grânulos grandes pode ser apropriado 
quando se estiver procurando por pa-
drões de escala regional a continental 
(Figuras A-C). Extensão se refere à 
área ou período de tempo envolvido 
pelo estudo. Considere os modos va-
riados pelos quais podemos descre-
ver a composição de um ambiente 
dependendo de como definimos a 
extensão espacial (Figuras D-F). A 
Figura D, por exemplo, mostra muito 
pouco da sucessão final do pinhei-
ro-de-casca-branca, enquanto a Fi-
gura F contém uma considerável área 
dessa espécie (Turner et al., 2001). Po-
dem existir fronteiras antropogênicas 
ou naturais que determinam a exten-
são de um estudo, ou elas podem ser 
definidos por um pesquisador.
Examinando questões de escala, 
estudos de ecossistemas e de pai-
sagem também devem determinar 
como processos aumentam ou dimi-
nuem de escala. Por exemplo, uma 
pessoa estudando trocas de carbono 
em nível de paisagem precisa saber 
como medições de CO2 baseadas nas 
folhas mudam aumentando a escala 
para toda a planta, o ecossistema e 
por fim, para o mosaico de ecossiste-
mas que formam a paisagem. Ecólo-
gos têm buscado elucidar princípios 
gerais que possam ser aplicados em 
questões de escala, as consequências 
de se agrupar dados ou simplificar en-
tre os níveis de escala, e como os pa-
drões e os fenômenos em uma dada 
escala afetam aqueles que ocorrem 
abaixo ou acima na hierarquia das es-
calas (Levin, 1992).
Pensando em escalas
QUADRO 23.1
50 x 50 m
10.000
100 x 100 m
2.500
200 x 200 m
625
(A)
(D) (E) (F)
(B) (C)
Não é floresta
Pinheiro lodgepole, sucessão inicial 
(queimado)
Pinheiro lodgepole, sucessão intermediária
Pinheiro lodgepole, sucessão tardia
Pinheiro-de-casca-branca, sucessão inicial 
(queimado)
Pinheiro-de-casca-branca, sucessão 
intermediária
Pinheiro-de-casca-branca, sucessão tardia
Tamanho do pixel:
Número de pixels:
Imagens de A-C são de uma só 
região de 5 x 5 km no Parque 
Nacional de Yellowstone.
À medida que o grânulo 
aumenta de A para C...
... a resolução da imagem piora, 
mas existem menos pixels para 
armazenar e analisar.
 De D a F, o 
tamanho do pixel é 
de 50 x 50 m em 
cada painel.
Efeitos do grânulo e da extensão (A-C) mos-
tram o efeito de aumentar o grânulo; (D-F) mos-
tram o efeito de aumentar a extensão. (Conforme 
Turner et al., 2001.)
Ecologia 531
movimentarão e, portanto, indiretamente, influenciar 
taxas de polinização, dispersão e predação. Na Guiana 
Francesa, Mickael Henry e colaboradores estudaram a 
movimentação de um morcego frugívoro (Rhinophylla 
pumilio) em uma floresta tropical madura seguida de 
fragmentação causada pela construção de uma barra-
gem. Utilizando as métricas da paisagem que quanti-
ficam o grau de conectividade da paisagem em seus 
pontos amostrais, eles concluíram que a conectividade 
era um fator determinante para a densidade de morce-
gos. Fragmentos de hábitat mais isolados tinham me-
nor probabilidade de serem visitados pelos morcegos, 
mesmo se tivessem abundantes estoques de recursos 
(Henry et al., 2007). Assim, a estrutura da paisagem 
afetava o comportamento de forrageio dos morcegos e, 
consequentemente, os padrões de dispersão das plan-
tas das quais se alimentam os morcegos.
Padrões de paisagem também modulam ciclagens 
biogeoquímicas. Ecólogos de ecossistemas têm indica-
do hotspots biogeoquímicos cujas taxas de reações quí-
micas são maiores do que nos ambientes do entorno. 
A água possui um papel fundamental nessa variação, 
uma vez que as interfaces entre os ecossistemas terres-
tres e aquáticos são locais típicos de altas taxas de ro-
tatividade biogeoquímica, mas outros fatores também 
podem influenciar (McClain et al., 2003). Por exemplo, 
Kathleen Weathers e colaboradores constataram que 
acréscimos de enxofre, cálcio e nitrogênio oriundos de 
deposição atmosférica eram maiores nas bordas das 
florestas do que no interior das florestas, basicamente 
em decorrência da maior interceptação de partículas 
aéreas pelas copas mais densas das árvores e da maior 
complexidade física tipicamente encontrada nas bor-
das florestais. Dessa forma, as florestas fragmentadas 
próximasde áreas urbanas podem ser significativa-
mente influenciadas por entradas de poluentes e nu-
trientes – descoberta que tem implicações na dinâmica 
de micro-organismos de solo, no crescimento da vege-
tação herbácea e nas comunidades animais nas bordas 
destes fragmentos (Weathers et al., 2001).
Em geral, fragmentos da paisagem variam em qua-
lidade de hábitat e em disponibilidade de recursos. 
Esta variação pode afetar as densidades populacionais 
de espécies habitando cada mancha, o tempo em que 
os animais permanecem forrageando na mancha e o 
deslocamento dos organismos entre manchas. As fron-
teiras das manchas, as conexões entre os fragmentos 
e a matriz entre os fragmentos também podem afetar 
a dinâmica populacional, tanto dentro como entre as 
manchas. Schtickzelle e Baguette, por exemplo, estu-
daram os padrões de deslocamento da borboleta bog 
fritillary (Proclossiana eunomia) entre fragmentos da 
paisagem na Bélgica (Figura 23.7). Onde os fragmen-
tos apropriados de hábitat estavam agregados, as fê-
meas atravessavam prontamente de um fragmento a 
outro. No entanto, onde o hábitat era mais fragmenta-
do e havia uma distância maior de matriz para atraves-
sar, as borboletas hesitaram mais em deixar a mancha 
(Schtickzelle & Baguette, 2003).
O formato e a orientação dos elementos da paisa-
gem também podem ser importantes na interceptação 
física dos organismos e, assim, serem funcionais na 
determinação da composição das espécies. Gutzwiller 
e Anderson concluíram que as aves em época repro-
dutiva na rota migratória para o norte estavam mais 
propensas a nidificar nos fragmentos florestais orienta-
dos em um eixo leste-oeste nas pradarias do Wyoming, 
de tal forma que o fragmento de hábitat viesse a atuar 
efetivamente como uma rede, interceptando as aves 
quando migram para o norte. Eles não verificaram essa 
associação em espécies de pássaros residentes. Nes-
se caso, a estrutura da paisagem determina em parte 
a composição das espécies da comunidade das aves 
(Gutzwiller & Anderson, 1992).
Interações entre padrões da paisagem e processos 
ecológicos são recíprocas. Processos ecológicos são re-
gulados pelos padrões da paisagem, como acabamos 
de ver, mas os padrões da paisagem, por sua vez, po-
dem ser resultados dos processos ecológicos, como 
quando grandes mamíferos pastejadores moldam a 
paisagem na qual vivem. Os efeitos do alce (Alces alces) 
na Ilha Royale no Lago Superior têm sido estudados 
pelo uso de cercas instaladas desde a década de 1940. 
A alta taxa de consumo do alce diminui a produção 
primária líquida do ecossistema, não apenas pela re-
moção direta de biomassa, mas também indiretamente 
FIGURA 23.7 Padrões de deslocamento da borboleta 
bog fritillary Os padrões de deslocamento desta borboleta 
(Proclossiana eunomia) são influenciados pelas características da 
paisagem ao redor. As borboletas hesitam em deixar os fragmen-
tos onde habitam se não houver outro fragmento com hábitat 
apropriado nas cercanias, mas atravessam uma matriz de hábitat 
não apropriado do entorno quando o fragmento seguinte esti-
ver próximo.
532 Cain, Bowman & Hacker
pela alteração das taxas de mineralização do nitrogênio 
e das taxas de decomposição do folhiço. Pastando, o 
alce também modifica a composição das árvores en-
contradas na paisagem em favor do espruce, e o pre-
domínio do espruce por sua vez acaba determinando 
as taxas dos processos biogeoquímicos (Pastor et al., 
1988). Assim, ao mesmo tempo, os alces respondem à 
paisagem e atuam como seus modificadores. Em escala 
mais ampla, padrões da paisagem interagem com dis-
túrbios de larga escala, como veremos adiante.
O distúrbio tanto cria heterogeneidade da 
paisagem quanto responde a ela
Paisagens são naturalmente dinâmicas. Na natureza, as 
mudanças às vezes chegam aos ecossistemas de modo 
catastrófico – florestas e pradarias são queimadas em 
grandes extensões, e enchentes trazem súbitos acrés-
cimos de sedimento em ecossistemas fluviais – e, em 
outros momentos, de modo vagaroso, como resultado 
da mudança do clima e movimentação dos continen-
tes. Vimos no Capítulo 16 que o distúrbio é um fator 
importante na determinação da composição da comu-
nidade. Ecólogos da paisagem têm perguntado se pa-
drões particulares de paisagem tornam mais lenta ou 
aceleram a disseminação de distúrbios e se aumentam 
ou diminuem a vulnerabilidade dos ecossistemas aos 
distúrbios (Turner, 2005).
Em 1988, um incêndio florestal queimou pratica-
mente um terço dos 900.000 hectares do Parque Na-
cional de Yellowstone. Essa queimada sucedeu décadas 
de supressão antropogênica do fogo e veio num verão 
de seca extrema e de fortes ventos. Nos últimos 10.000 
anos, grandes queimadas como essa parecem ter ocor-
rido no norte das Montanhas Rochosas, em intervalos 
de 100 a 500 anos. O fogo queimou manchas de flo-
restas de diversos estágios de desenvolvimento e com 
diferentes espécies, deixando um complexo mosaico 
de fragmentos queimados em intensidades distintas 
(Figura 23.8). Esse distúrbio de larga escala era parcial-
mente controlado pelas condições florestais existentes 
naquela época e era favorecido pelo vento e pela seca 
de um verão em particular. A queimada de 1988 defini-
rá provavelmente a composição da paisagem durante 
as próximas décadas ou séculos (Turner et al., 2003). 
Aqui, o distúrbio – fogo – era a força primária a mol-
dar o padrão da paisagem do futuro. Ao mesmo tempo, 
também respondia à estrutura da paisagem existente. 
Essa interação recíproca entre paisagem e distúrbio é 
um tanto comum.
Com o aumento da pegada ecológica da humani-
dade, o tipo e a extensão dos níveis de distúrbios na 
paisagem foram alterados. Alguns locais estão mais 
sujeitos aos distúrbios humanos do que outros. Os pri-
meiros povoadores se fixaram e desbravaram áreas com 
os solos mais férteis para a agricultura. Naturalmente 
atraídos para boas localizações portuárias, sujeitaram 
assim os ecossistemas desses locais aos primeiros dis-
túrbios antrópicos. Áreas próximas às aldeias tiveram a 
madeira extraída, foram convertidas em lavouras e so-
freram com a caça mais cedo do que as áreas restantes. 
Esses padrões de distúrbio continuam interferindo na 
biodiversidade atual, mesmo depois dos povoamentos 
terem abandonado as terras e que elas tenham voltado 
a ser floresta (Butzer, 1992).
Tais legados da paisagem moldam as comunidades 
vegetais de maneiras que apenas começamos a enten-
der. Os efeitos dos distúrbios antropogênicos podem 
ser detectados em comunidades ecológicas até mesmo 
séculos após o distúrbio. Na França Central, Etienne 
Dambrine e colaboradores demonstraram que comu-
nidades de plantas florestais em locais onde foram os 
acampamentos dos romanos há 1.600 anos ainda apre-
sentam sinais desses distúrbios. A área de floresta ma-
peada não tinha mudado substancialmente desde 1665 
e foi, provavelmente, mantida como floresta durante 
séculos antes dessa data. Os pesquisadores analisa-
ram a diversidade de plantas na floresta em diferentes 
distâncias dos locais das ruínas romanas recentemente 
desvendadas e constataram que a riqueza de espécies 
aumentou ao redor das ruínas. A análise das proprie-
dades do solo revelou que esse aumento era principal-
mente devido a um pH mais elevado, que parece de-
FIGURA 23.8 Distúrbios podem moldar padrões da paisa-
gem O fogo que queimou aproximadamente um terço do Par-
que Nacional de Yellowstone no verão de 1988 resultou em um 
complexo mosaico de manchas queimadas e não queimadas, 
que moldará a composição da paisagem nas próximas décadas 
ou séculos. Áreas que aparecem em preto nesta vista aérea do 
Cânion Madison foram queimadas por intensas chamas no dos-
sel, e as manchas de cor marrom foram queimadas por intenso 
fogo próximo ao solo; ambos os modos mataram a maior parte 
ou toda a vegetação.
Ecologia 533
correr da argamassa de cal utilizada nas construções 
romanas e das suas práticas de agricultura. Os níveis de 
fósforo também foram mais altos nas proximidades doslocais de acampamento (Dambrine et al., 2007) (Figura 
23.9). Quantos outros lugares na Terra, depois de serem 
abandonados, devem apresentar as marcas das ativida-
des humanas em suas estruturas de comunidade?
Distúrbio, mesmo se natural ou antrópico, é um 
fator determinante no delineamento da paisagem. Al-
guns distúrbios atuais dos humanos estão tendo efei-
tos ecológicos muito severos, como veremos na próxi-
ma seção.
Fragmentação de hábitat
CONCEITO 23.2
A fragmentação de hábitat diminui a área de hábitat, 
isola populações e altera condições nas bordas dos 
hábitats.
Em 1986, o projeto de uma grande hidrelétrica no 
Rio Caroni em um vale da Venezuela inundou 4.300 
km2 de um terreno acidentado, criando um reservató-
rio conhecido como Lago Guri (Figura 23.10). O resul-
tado foi a formação de várias ilhas de floresta tropical 
circundadas por água, onde antes havia uma floresta 
relativamente intacta. Essa mudança na paisagem deu 
uma oportunidade para John Terborgh e seus alunos 
e colegas estudarem os efeitos da fragmentação em 
um ecossistema de floresta tropical seca. Seus resul-
tados foram inquietantes. As ilhas pequenas e médias 
não tinham mais os predadores de topo encontrados 
na região, principalmente os felinos (onças, pumas, ja-
guatiricas), aves de rapina e grandes serpentes. Dessa 
forma, sem seus predadores, populações de herbívoros 
generalistas, predadores de sementes e predadores de 
invertebrados eram de 10 a 100 vezes mais abundantes 
nas ilhas do que nas florestas intactas. Entre as espé-
cies que tiveram aumento na abundância estão for-
migas-cortadeiras, pássaros, roedores, sapos, aranhas, 
micos-pretos, porcos-espinhos, tartarugas e lagartos. 
O aumento na abundância dessas espécies gerou um 
efeito drástico na vegetação dessas ilhas, pois o recru-
tamento decaiu e a mortalidade das árvores aumentou 
devido à elevada taxa de herbivoria, causada especial-
mente pelas formigas (Figura 23.11). As mudanças que 
a comunidade vegetal sofreu, segundo Terborgh, eram 
FIGURA 23.9 Legados da paisagem Na França Central, o 
legado dos acampamento e das práticas de agricultura dos ro-
manos, abandonado há quase dois milênios, ainda é percebido 
na riqueza das espécies de plantas na floresta que ocupou estes 
locais. (A) Mais espécies foram encontradas próximas ao cen-
tro dos locais dos acampamentos, incluindo mais espécies que 
preferem pH mais elevado. (B) O pH do solo e (C) o fósforo do 
solo também foram mais elevados próximo aos acampamentos. 
(Conforme Dambrine et al., 2007.)
N
úm
er
o 
d
e 
es
pé
ci
es
 d
e 
pl
an
ta
s
–5
–10
0
5
10
15
20
25
30(A)
(B)
(C)
pH
 d
o 
so
lo
–0,5
0
0,5
1,0
1,5
–1,0
Fó
sf
or
o 
d
o 
so
lo
 (m
g/
kg
)
0 100 200 300 400 500
Distância do centro do acampamento (m)
–10
0
10
20
30
40
–20
Roma
Império Romano, 117 d.C.
Área de estudo
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esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual 
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
 
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