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Cariologia Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Gerson Lopes Revisão Textual: Prof. Me. Luciano Vieira Francisco Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária • Estabelecer um plano de tratamento considerando os conceitos de risco e atividade de cárie. OBJETIVO DE APRENDIZADO • Introdução; • Modificação dos Fatores da Doença Cárie; • Tratamento Não Invasivo – Remineralização; • Tratamento Minimamente Invasivo; • Tratamentos Restauradores; • Plano de Tratamento. UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária Introdução Tradicionalmente, as lesões de cárie, após serem detectadas durante a consulta odon- tológica, são tratadas, ou seja, a porção cariada é removida e o que foi perdido é substitu- ído através de um tratamento restaurador/protético. Essa postura adotada por anos leva em consideração apenas a lesão – e não a doença cárie e sua multifatoriedade. Tal atitude favorece à criação de um círculo vicioso, em que se fazem restaurações que sequencial- mente precisam ser substituídas, perdendo-se cada vez mais estruturas dentárias. Diante disso, o modelo tradicional, isto é, cirúrgico-restaurador, passou a ser ques- tionado e foi perdendo espaço para um novo conceito, em que se deve levar em conta a doença cárie. Ressalta-se que a atividade, extensão e localização da lesão devem ser consideradas para definir o tratamento, porém, o sucesso do tratamento está relaciona- do ao controle da doença. As ações precisam ser realizadas de forma ampla, com alterações de hábitos alimen- tares e controle do biofilme. Desse modo, no início do século XX surgiu o conceito de mínima intervenção, em que se preconiza o diagnóstico precoce e o controle dos fato- res de risco, possibilitando a paralisação da perda mineral e remineralização da região afetada, evitando até mesmo a necessidade de restaurações (remineralização de man- chas brancas). E, quando necessária a substituição da porção perdida, indica-se o uso de materiais adesivos. O objetivo é preservar o máximo de estrutura dentária sadia e adiar a realização de tratamentos invasivos, possibilitando a manutenção de dentes funcionais ao longo de toda a vida. Lesões cariosas de características similares podem ter diferentes abordagens. Uma técnica menos invasiva pode ser a escolhida para um paciente cujo núcleo familiar é colaborador quanto às medidas de controle dos hábitos de dieta e higiene bucal, bem como ao compa- recimento aos retornos periódicos. Ao contrário, em famílias pouco colaborativas, podem ser necessárias abordagens mais invasivas, pela impossibilidade de acompanhamento do tratamento realizado. Todo paciente deverá, portanto, ser submetido à modificação dos fatores da doença cárie, e quando avaliado quanto às lesões de cárie, classificar conforme a sua caracterís- tica: não invasivos, minimamente invasivos, invasivos. 8 9 Não invasivos Minimamente invasivos Invasivos Não remoção de tecido dentário Controle de dieta, controle de higiene, agentes que potencializam remineralização Perda mínima de tecido dentário Controle de dieta, controle de higiene, selantes e os in�ltrantes resinosos Remoção de tecido dentário Controle de dieta, controle de higiene, restauração Figura 1 Daremos sequência abordando, além das possibilidades de modificação dos fatores da doença cárie como o controle da dieta e higiene, os tipos de tratamento: invasivos, minimamente invasivos e não invasivos. Modificação dos Fatores da Doença Cárie Orientação de Práticas Alimentares A educação alimentar é um processo contínuo, com base sólida, que tem como pro- pósito formar e educar o indivíduo quanto à importância de práticas alimentares mais saudáveis, ocasionando mudança de comportamento relacionada ao padrão alimentar. As orientações dietéticas são instruções objetivas e pontuais relativas a hábitos alimen- tares. Para serem satisfatórias, essas orientações precisam ser concentradas nos proble- mas específicos e de maior destaque do paciente. Para prevenir e controlar a cárie dentária no indivíduo, é essencial um bom diagnós- tico e avaliação de risco à doença cárie. Um recurso interessante para associar a outros métodos é o diagnóstico nutricional. Para o alcance dos dados, é necessário que a avalia- ção de ingestão alimentar seja realizada com métodos técnicos-científicos consolidados. O método mais tradicional para a obtenção de dados de ingestão alimentar é o inqué- rito alimentar recordatório de 24h. Trata-se de um formulário que contém uma lista de bebidas/alimentos cariogênicos, em que o cirurgião-dentista assinala o que o paciente ingeriu e em qual período. O objetivo é calcular a frequência de consumo de açúcar di- ário. Esse recurso tem a vantagem de ser objetivo, uma vez que o paciente recorda com maior facilidade os alimentos ingeridos no dia anterior. Porém, essa técnica apresenta uma desvantagem: o paciente em geral tem a tendência de responder o que normalmen- te consome – e não o que efetivamente consumiu. Diante disto, o profissional precisa explicar a técnica de maneira simples e clara. 9 UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária Na atualidade, o padrão alimentar indica risco de deficiências nutricionais, excesso de peso e doenças crônicas devido à ingestão inadequada de nutrientes, com pouco consumo de alimentos saudáveis, tais como vegetais e frutas, e alta ingestão de alimentos ultraproces- sados ricos em açúcar, gordura e sódio. Diante desta realidade, fica evidente a necessidade de intervenções que priorizem a adoção de hábitos alimentares saudáveis. Sendo assim, as principais orientações para os hábitos alimentares saudáveis, impor- tantes para a promoção de saúde geral e bucal englobam: • Estimular o aleitamento materno exclusivo até os 06 meses de idade e após iniciar a introdução de diversos tipos de alimentos sólidos saudáveis gradualmente; • Introdução de sacarose o mais tardiamente possível, de preferência somente após os 24 meses, para que a criança conheça o sabor natural dos alimentos; • Manter intervalos regulares entre as refeições, possibilitando o retorno do pH sali- var à neutralidade, equilibrando o processo natural de desmineralização e remine- ralização que acontece na superfície dentária. Neste sentido, é fundamental que o cirurgião-dentista exerça seu papel de agente de promoção da saúde, educando para a adoção de práticas saudáveis. E uma das prin- cipais ações a serem adotadas é identificar hábitos alimentares cariogênicos e orientar o paciente sobre a intensidade e frequência de consumo, contribuindo para melhorar a qualidade de vida do paciente. Controle de Higiene Medidas de higiene bucal objetivam a remoção do biofilme dentário em níveis acei- táveis, uma vez que a sua atividade metabólica pode ocasionar a perda de estrutura mineral e o sangramento gengival. Existe uma associação positiva entre a deficiência de higiene bucal e a prevalência da doença cárie. A escovação dentária utilizando escova e fio dental é o recurso mecânico mais ado- tado de controle do biofilme dental em razão do baixo custo, da conveniência e eficácia. E quando associado ao uso de dentifrício fluoretado, torna-se o método mais simples e difundido de administração tópica de fluoretos, sendo um dos principais responsáveis pela redução de cárie dentária dos últimos tempos. Nessa perspectiva, a orientação sobre o controle mecânico do biofilme dental é de extrema importância como estratégia de prevenção e promoção de saúde bucal. Desse modo, escovação dental não pode ser considerada a única medida de prevenção de doenças cárie e periodontal, de modo que a higienização bucal precisa ser vista como um requisito essencial de hábitos saudáveis do indivíduo. Neste cenário, a função do cirurgião-dentista é orientar e motivar o paciente quanto à remoção do biofilme dentário com qualidade. 10 11 Importante! O controle mecânico do biofilme dental é consequência da influênciade vários fatores, tais como a compreensão sobre as patologias bucais, instrução de higiene bucal, habi- lidade e destreza manual e adequação dos dispositivos de limpeza – por exemplo, as escovas dentais associadas a dentifrícios fluoretados. As escovas dentais são os dispositivos mais habituais e acessíveis usados pelos indiví- duos para a remoção mecânica do biofilme dentário. São constituídas de quatro elemen- tos principais: cabo, haste ou intermediário, cabeça e cerdas. Figura 2 Fonte: Getty Images Cada componente apresenta determinada função que auxiliará na remoção do bio- filme dental. Conforme a Associação Dentária Americana (ADA), a escova dental ideal precisa possuir as seguintes características: • Tufos com o mesmo comprimento de cerdas; • Haste e cabeça localizadas no mesmo eixo; • Cerdas de náilon macias; • Cabeça pequena; • Sejam leves e de fácil higienização; • Impermeáveis à umidade; • Apresentarem baixo custo e serem eficientes e duráveis. Ainda que essas características sejam apropriadas para uma escova “ideal”, no mer- cado existe enorme variedade de marcas e designs. Porém, devemos considerar que o ato de escovação dental não é definido apenas pelo desenho da escova, mas também pela habilidade do usuário, frequência de escovação e duração do uso. 11 UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária Outra opção de remoção mecânica de biofilme dental é a escova elétrica, que apre- senta uma cabeça com cerdas que giram em sentidos diferentes, sendo o principal modo de ação do dispositivo. Entretanto, ainda não há um consenso com relação à maior qualidade de higienização das escovas elétricas quando comparadas ao método de esco- vação manual. Assista ao vídeo disponível em: https://youtu.be/Rgf-_VUgWJE Ademais, para alcançar o sucesso no controle mecânico do biofilme dentário, é pre- ciso motivar o paciente, o que nem sempre é uma tarefa simples conscientizá-lo da necessidade dos cuidados de higiene bucal. A partir desse contexto, o cirurgião-dentista, que é responsável pelos cuidados com a saúde bucal, pode estabelecer metas possíveis e realistas de acordo com cada paciente. Para auxiliar e melhorar o desempenho na escovação dental, diversas técnicas e estratégias foram desenvolvidas por diferentes autores, cada uma com a sua indicação específica, sendo as mais comuns: Técnica de Bass Técnica de Bass modi�cada Técnica de Fones Técnica de Starkey Técnica de Stillman modi�cada Figura 3 A fim de complementar a escovação dental, o uso do fio ou da fita dental tem um papel importante na remoção do biofilme nas faces proximais. A sua utilização requer coordenação e habilidade, pois é necessário que o fio se adapte à curvatura da superfície dental, evitando a desmineralização. Assim como o hábito de escovação, o uso do fio dental deve ser instituído desde cedo. Assista ao vídeo disponível em: https://youtu.be/v3VSd7YC-Tw Em Síntese • Até o momento, não existe uma escova dental apontada como “ideal” para todos os pacientes. A escolha deve levar em consideração as propriedades físicas e parti- cularidades de cada paciente; • Mesmo que as características das escovas representem uma função secundária na qualidade da higienização bucal, elas precisam ser ponderadas para que haja melhor controle do biofilme dentário; • O cirurgião-dentista tem papel essencial como orientador e educador em saúde, introduzindo hábitos saudáveis, procurando melhorar a qualidade da higienização oral por meio de motivação do paciente. 12 13 Entre os critérios específicos para prevenção e controle da cárie dentária, o controle mecânico do biofilme dental representa uma função importante, prevenindo a gengivite e doença cárie, proporcionando fluoreto constante na cavidade bucal e educando o paciente com relação ao autocuidado. Tratamento Não Invasivo – Remineralização Na perspectiva atual, a filosofia dos cuidados odontológicos envolve basicamente a prevenção e o controle da doença cárie com o propósito de preservar ao máximo estru- turas dentais sadias, evitando, por meio de diagnóstico precoce e intervenções não inva- sivas, que a doença avance para estágios de maior gravidade. E stratégias que não incluem remoção de tecido dentário são denominadas não inva- sivas e abrangem o controle do biofilme dental e de dieta cariogênica, além da utilização de agentes potencializadores de remineralização. O emprego de fluoretos é apontado como um método importante não invasivo no controle de lesões de cárie ativas não cavitadas em esmalte. A aplicação tópica de verniz de fluoreto de sódio a 5%, equivalente a 22.600 ppm de flúor, é simples, rápida e remi- neraliza as lesões, reduzindo a progressão de desmineralização do esmalte. Considera-se como vantagem do método a maior segurança em termos de toxicidade aguda e boa aceitação por parte dos pacientes. A desvantagem é o custo mais elevado do produto. A aplicação do verniz de flúor deve ser realizada preferencialmente após as refeições e recomenda-se uma alimentação leve e líquida, sem escovar os dentes nas 12 horas seguintes, possibilitando melhor aderência da película do verniz. Tratamento Minimamente Invasivo Selante de Fossas e Fissuras São materiais adesivos com base de resina ou cimento de ionômero de vidro que apresentam a capacidade de escoar nas fossas e fissuras, penetrando nas microporosi- dades do esmalte dentário previamente condicionado por um ácido, criando “tags”, que são projeções de resina. Após a polimerização do selante, quando bem adaptado e retido, forma-se uma pe- lícula resistente e contínua, cujo objetivo é proporcionar uma barreira mecânica que dificulte o acúmulo de biofilme dental nas superfícies oclusais dos dentes, facilitando a higienização. Os selantes resinosos são polímeros fluidos de BIS-GMA, com carga, que apresentam maior resistência ao desgaste; ou sem carga, com pouca resistência. São classificados 13 UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária conforme a presença de fluoreto, matizes e podem ser ativados quimicamente ou foto- polimerizados, cuja vantagem é um melhor controle de tempo de trabalho. A utilização do Cimento de Ionômero de Vidro (CIV) como selante foi recomendada na década de 1970, em função da capacidade de liberação de flúor e menor sensibi- lidade do material à umidade, sendo indicado para dentes permanentes parcialmente irrompidos. Porém, apresenta a desvantagem de baixa retenção. Atualmente, os selan- tes ionoméricos modificados por resina têm merecido destaque. O método é eficiente na prevenção de lesões de cárie oclusais em crianças e adoles- centes, apresentando maior relação custo-efetividade quando comparado a outros méto- dos de prevenção à cárie dentária, porém, depende da sua retenção nas fossas e fissuras. Importante! No passado, a aplicação de selantes rotineiramente era recomendada para todos os den- tes posteriores. Porém, segundo estudos mais recentes sobre o início e desenvolvimento de lesões de cárie em superfícies oclusais, houve uma mudança de paradigma, em que se aplicam critérios mais seletivos para o selamento dos dentes. A indicação do selante deve ser individualizada, restringindo-se a indivíduos, dentes e superfícies com alto risco à cárie dentária, vejamos: Quadro 1 Indivíduos • Experiência anterior e/ou atual de cárie dentária; • Crianças com limitações físicas ou intelectuais; • Dieta cariogênica; • Higiene bucal inadequada. Dentes • Macromorfologia dental que favoreça o maior acúmulo e/ou dificuldade de remoção do biofilme dental; • Dentes com hiplopasia ou defeitos de mineralização do esmalte; • Molares permanentes nos primeiros anos após a erupção. Superficies • Superfícies oclusais hígidas (são mais vulneráveis à doença cárie); • Lesão não cavitada em esmalte (condição mais propensa à pro- gressão da cárie dentária). Fonte: Adaptado de MASSARA; RÉDUA, 2017 Sobre a técnica de aplicação do selante resinoso: • Isolamento docampo operatório (absoluto ou resinoso); • Limpeza da superfície coronária; • Condicionamento ácido do esmalte (ácido fosfórico 37%) por 30 segundos; • Lavagem e secagem do dente; • Aplicação do selante nas fossas e fissuras; • Polimerização – quimicamente ativados (de 2 a 3 minutos) e fotoativados (40 segundos); • Verificação do selante; 14 15 • Avaliação e ajuste oclusal. • Aplicação tópica de flúor – flúor fosfato acidulado 1,23% (1 minuto); • Avaliação periódica. A condição mais crítica na técnica de aplicação do selante resinoso de fossas e fissu- ras é o controle de umidade, que resulta em falhas adesivas, comprometendo a retenção do material. Apesar de o uso do isolamento absoluto assegurar um campo operatório sem contaminação, ainda não há evidências científicas que comprovem a sua superiori- dade com relação ao isolamento relativo. Assista ao vídeo disponível em: https://youtu.be/j2GNT4GRENM Em Síntese Os selantes de fossas e fissuras são efetivos na diminuição da incidência de lesões cario- sas nas superfícies oclusais. Devem ser aplicados e avaliados periodicamente em crian- ças e adolescentes mais vulneráveis à doença cárie. Infiltrantes São baseados nos princípios da Odontologia de mínima intervenção, que preserva ao máximo a estrutura dental, de modo que as abordagens microinvasivas têm se demons- trado eficientes e vantajosas, com destaque para o selamento de microcavidades nas superfícies proximais e lesões de mancha branca, utilizando infiltrante resinoso. A infil- tração em lesões de cárie é uma possibilidade para superfícies não cavitadas reminerali- zadas ou não, objetivando o tratamento precoce das lesões sem a necessidade de preparo cavitário, preservando e protegendo os tecidos sadios em torno das áreas afetadas. O infiltrante Icon (DMG Hamburgo, Alemanha) é um material resinoso com baixa viscosidade, que penetra no interior da lesão de cárie por forças capilares, preenchendo a porosidade formada pela desmineralização. Apresenta resistência de união similar ao esmalte sadio e impede a infiltração e o desenvolvimento de lesões de cáries secundárias. É eficiente na inibição de progressão de cárie dentária na primeira infância e em lesões nas superfícies proximais e de mancha branca em crianças, adolescentes e adultos jovens. Sobre a técnica de aplicação do infiltrante resinoso Icon (DMG Hamburgo, Alemanha), seguindo as instruções do fabricante, temos o seguinte: • Limpeza da superfície coronária; • Condicionamento da superfície do esmalte utilizando Icon Etch (ácido clorídrico 15%) por 2 minutos; • Lavagem e secagem do dente; • Isolamento do campo operatório; 15 UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária • Aplicação do Dry-Icon durante 30 segundos e secagem com seringa tríplice durante 30 segundos; • Aplicação do infiltrante Icon durante 3 minutos; • Fotopolimerização por 40 segundos; • Reaplicação do infiltrante Icon por 1 minuto e fotopolimerização por 40 segundos. Assista ao vídeo disponível em: https://youtu.be/S-DSsdDVmXo Tratamentos Restauradores Tratamento Restaurador Atraumático É um modelo que teve início na África em meados da década de 1980, fundamentado em evidências científicas com a filosofia de mínima intervenção e voltado à atenção de toda a população. Refere-se a uma técnica minimamente invasiva, considerada de baixo custo, que englo ba tanto a preservação de fossas e fissuras com a aplicação de selantes, quanto a restaura- ção de superfícies dentárias com lesões cariosas. Utilizam-se instrumentos manuais para a remoção de tecido cariado e materiais adesivos, sendo o mais comum o cimento de ionômero de vidro, para selar a cavidade. A técnica é baseada na filosofia da Odontologia de mínima intervenção, em que há integração entre prevenção e controle da doença cárie, na qual se preconiza a modifica- ção da flora bucal, educação do paciente, remineralização de lesões em esmalte e den- tina não cavitadas, intervenções mínimas em lesões cavitadas e reparo de restaurações, determinando as necessidades terapêuticas de cada caso. Apresenta como vantagens ser uma técnica simples e de fácil execução, com descon- forto mínimo para o paciente, mínima sensibilidade operatória e pós-operatória, remo- ção apenas do tecido infectado, preservando o tecido dentário sadio. Porém, podemos considerar como desvantagem o método não solucionar as necessidades restauradoras de todos os tipos de cavidades e restaurações extremamente profundas em dentes, apre- sentando pulpite de reversibilidade duvidosa. As indicações para a estratégia de Tratamento Restaurador Atraumático (TRA) são as seguintes: Quadro 2 Restaurações • Dentes decíduos e permanentes com lesões cariosas envolven- do dentina. Selantes • Dentes recém-irrompidos ou que apresentem fossas e fissuras profundas em pacientes de alto risco à cárie dentária. 16 17 A remoção de tecido cariado total ou parcial no TRA ainda gera muitas discussões, porém, vários estudos concluíram que a remoção parcial (dentina infectada) apenas no fundo da cavidade é mais aconselhável em lesões profundas, pois reduz o risco de exposição pulpar. Entretanto, vale ressaltar que é necessária a remoção total do tecido cariado nas paredes circundantes para garantir uma boa adesão e selamento marginal do material restaurador. O material restaurador de escolha para a técnica é o Cimento de Ionômero de Vidro convencional (CIV), pois apresenta como vantagens a liberação e reincorporação de flúor, adesão química ao esmalte e dentina, redução na velocidade de progressão da lesão e biocompatibilidade com a polpa dentária. Importante! O sucesso da técnica de TRA e da remoção parcial do tecido cariado resulta de um sela- mento efetivo e duradouro que promova a redução no número de microrganismos e atividade da lesão de cárie, possibilitando a sua inativação. Com a pandemia de Coronavirus Disease 2019 (Covid-19), reduzir os riscos de transmissão do coronavírus no atendimento odontológico se tornou uma preocupação. Há necessidade de diminuição da produção de aerossóis, e respaldado pelas evidências científicas, o trata- mento de mínima intervenção tem sido considerado como a melhor opção para garantia de biossegurança. Atraumá tico Modificado (ARTm) O ARTm, como já indica o nome, traz alterações na técnica original, porém, man- tendo os princípios biológicos do ART original. Para tanto, são utilizados facilitadores presentes no consultório odontológico para aprimorar a técnica e aumentar a longevi- dade das restaurações. Em comum com o ART convencional, ressaltamos o uso de isolamento relativo, a não necessidade de anestesias, o uso de instrumentos manuais para a remoção de cárie. A remoção da cárie deve ser completa nas paredes da cavidade, porém, na parede pulpar essa remoção é parcial, removendo apenas o tecido amolecido, não resistente à curetagem. A radiografia, o uso da seringa tríplice, sugador, refletor e a possibilidade do uso de rotatórios para facilitar o acesso (utilizado apenas na remoção de esmalte) favorecem melhores resultados. O material de eleição para a restauração das cavidades continua sendo o ionômero vi- dro, pelas suas características de biocompatibilidade, adesividade e liberação de fluoretos. O ARTm abre a possibilidade do uso dos ionômeros modificados por resina. 17 UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária Restaurações Adesivas Conservadoras (RAC) As RAC são aquelas em que a remoção da cárie não é total, apenas a dentina caria- da, amolecida e lesada irreversivelmente é removida; aquela parcialmente desminerali- zada deve ser mantida. Podem ser utilizados nesta técnica tanto instrumentais de remoção mecânica como rotatórios, considerando-se o uso de anestesia e de isolamento absoluto, já que o mate- rial de eleição para as restaurações é a resina, que possui alta sensibilidade à umidade. A maior desvantagem encontra-se na aplicação da técnica em pacientes menorese/ ou especiais, pela necessidade da anestesia e isolamento, o que requer maior adaptação do paciente em relação ao tratamento. Dentística Operatória A remoção de dentina, nas técnicas mais conservadoras, pode ser explicada através do seguinte Quadro: Quadro 3 Remoção completa em uma única sessão • Remoção de toda dentina cariada em uma única consulta. Nesta remoção devem ser utilizados instrumentos rotatórios, com o au- xílio de instrumentos manuais, até que a dentina obtenha uma dureza semelhante à dentina hígida, livre de microrganismos. Tratamento expectante • Remoção da dentina infectada apenas durante a primeira con- sulta: o retorno é agendado para 45 a 60 dias, tempo para que forme dentina terciária; novamente é realizada a escavação até que a dentina obtenha uma dureza semelhante à dentina hígi- da, livre de microrganismos. De todas as técnicas invasivas apresentadas, por evidências científicas, a remoção parcial de dentina cariada com confecção da restauração em sessão única é eleita a mais adequada, por preservar ao máximo a estrutura dental, além de minimizar o risco de exposição pulpar. Quadro 4 – Materiais restauradores Amálgama • Vantagens: baixo custo, facilidade, maior durabilidade em pa- cientes com cárie ativa; • Desvantagens: falta de adesividade, necessidade de preparo para retenção na cavidade, estética. Resina • Vantagens: estética favorável, adesividade, não necessita de pre- paro cavitário, longevidade maior nas resinas mais modernas; • Desvantagens: controle rigoroso da umidade e longevidade das restaurações, porém, com o desenvolvimento da tecnolo- gia deixa de ser uma desvantagem. 18 19 Você Sabia? Restaurações de amálgama em dentes permanentes posteriores apresentam taxas de sobrevivência de 79 a 90% após 10 anos de acompanhamento. Restaurações de resina composta apresentam taxas de sobrevivência de 74 a 90% após 10 anos de acompanhamento (BUSATO; MALTZ, 2014). Plano de Tratamento A uniformização para a escolha do tratamento é de difícil aceitação para uma porcen- tagem dos cirurgiões-dentistas, que consideram a decisão como parte da experiência clí- nica, porém, sabe-se que é imprescindível um embasamento científico atualizado sobre os efeitos das diferentes possibilidades de tratamento. Para ajudar na decisão de tratamento, montaremos um quadro em que levaremos em consideração, como a primeira manifestação da doença, a lesão de mancha branca, por ser o primeiro estágio possível de ser visualizado a olho nu. Quadro 5 – Exame clínico e radiográfi co do paciente Presença de lesão de cárie • Educação em saúde com reforços no controle de dieta, controle de higiene; • Definição do tipo de atividade da lesão, extensão e localização são importantes para os próximos passos. Tratamento expectante • Educação em saúde, com reforços no controle de dieta, controle de higiene. Tabela 1 – Quanto ao tipo de atividade da lesão Inativa Quanto à extensão Esmalte Dentina Quanto à localização Face livre Oclusal Proximal Face livre Oclusal Proximal Tratamento Controle Controle Controle Restauração e controle Selante, restauração e controle Infiltrante, restauração e controle Tabela 2 – Quanto ao tipo de atividade da lesão Ativa Quanto à extensão Esmalte Dentina Quanto à localização Face livre Oclusal Proximal Face livre Oclusal Proximal Tratamento Controle, reminerali- zação Selante e controle Infiltrante e controle Restauração e controle Selante, restauração e controle Infiltrante, restauração e controle 19 UNIDADE Estratégias de Abordagem da Cárie Dentária Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Vídeos Aspectos Gerais da Odontologia de Mínima Intervenção para a Retomada no Contexto da APS https://youtu.be/KlOMT0fycc0 Como Escovar os Dentes com uma Escova Elétrica | Oral-B BR https://youtu.be/Rgf-_VUgWJE DMG ICON – Trattamendo delle White Spot – Protocollo Step by Step https://youtu.be/S-DSsdDVmXo Educação em Saúde Bucal: Técnicas de Escovação https://youtu.be/v3VSd7YC-Tw Selante resinoso https://youtu.be/j2GNT4GRENM WebPalestra: Tratamento Restaurador Atraumático https://youtu.be/fhdMywreXIY Leitura Infiltrante resinoso versus microabrasão no manejo de lesões de mancha branca: relato de caso https://bit.ly/3dGOd5I Dentistas propõem tratar cárie deixando-a intacta https://bit.ly/3dGgycl Tratamento odontológico na atenção básica à saúde de crianças durante a pandemia de Coronavirus Disease 2019 (Covid-19), o que fazer? https://bit.ly/3a8QGVF Tratamento restaurador atraumático: atualidades e perspectivas https://bit.ly/3uvpV5d 20 21 Referências BUSATO, A. L. S.; MALTZ, M. Cariologia: aspectos de dentística restauradora. São Paulo: Artes Médicas, 2014. (Série Abeno: Odontologia Essencial – Parte Clínica). CORRÊA, M. S. N. P. Odontopediatria: na primeira infância. 4. ed. São Paulo: Santos, 2017. FELDENS, C. A.; KRAMER, P. F. Cárie dentária na infância: uma abordagem con- temporânea. São Paulo: Santos, 2013. MAGALHÃES, A. C. et al. Cariologia: da base à clínica. Barueri, SP: Manole, 2021. MALTZ, M. et al. Cariologia: conceitos básicos, diagnóstico e tratamento não restaurador. São Paulo: Artes Médicas, 2016. (Série Abeno: Odontologia Essencial – Parte Clínica). MASSARA, M. L. A.; RÉDUA, P. C. B. Manual de referência para procedimentos clínicos em odontopediatria. São Paulo: Santos, 2017. RAGGIO, D. P.; BONIFÁCIO, C. C.; IMPARATO, J. C. P. Tratamento Restaurador Atraumático (ART): realidades e perspectivas. São Paulo: Santos, 2011. 21
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