Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Biologia Molecular Aplicada à Biomedicina Responsável pelo Conteúdo: Profa. Me. Thaís de Oliveira Cardoso Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Revisora Técnica: Prof.ª Dr.ª Gabriela Cavagnolli Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica • Compreender a importância das proteínas nos eventos celulares, de que maneira elas são geradas e como exercem suas funções; • Conhecer a importância da degradação das proteínas e o controle da expressão gênica. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Principais Conceitos sobre o Estudo de Proteínas e sua Estrutura; • Enovelamento Proteico e Modificações Pós-Traducionais; • Endereçamento Proteico; • Complexo Proteossômico e a Necessidade de Degradação Proteica; • Controle da Expressão Gênica. UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Principais Conceitos sobre o Estudo de Proteínas e sua Estrutura As proteínas representam mais da metade da massa total de uma célula e são fundamentais para a manutenção e para o crescimento celular. Do ponto de vista químico, as proteínas são as moléculas estruturalmente mais complexas e funcionalmente mais sofisticadas que conhecemos. A forma de uma proteína é especificada pela sua sequência de aminoácidos e cada um está ligado aos aminoácidos adjacentes, por ligações peptídicas. Existem 20 aminoácidos nas proteínas que são codificadas diretamente no DNA de um organismo, cada um com propriedades químicas diferentes. Uma molécula de proteína consiste em uma longa cadeia não ramificada desses aminoácidos. Classificamos a organização na estrutura de uma proteína em quatro níveis. A sequência de aminoácidos é conhecida como estrutura primária. Os trechos da cadeia polipeptídica que formam α-hélices e folhas-β constituem a estrutura secun- dária da proteína. A conformação tridimensional completa da cadeia polipeptídica pode ser chamada de estrutura terciária e, caso formada por um complexo de mais de uma cadeia polipeptídica, a estrutura completa é designada estrutura quaterná- ria (Figura 1). Estrutura Primária Estrutura Secundária Estrutura Terciária Estrutura Quartenária Sequência de Aminoácido Alfa Hélice Cadeia de Polipeptídeo Complexos de Moléculas de Proteínas L oooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo LLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLL Figura 1 – Estruturas das proteínas Fonte: Adaptado de Getty Images Quando comparamos as estruturas tridimensionais de diversas moléculas de pro- teínas diferentes, torna-se claro que, embora a conformação final de cada proteína seja única, dois padrões de enovelamento são frequentemente encontrados dentro delas, α-hélice e a folha β. Os tipos de folhas β produzem estruturas bastante rígidas, mantidas por ligações de hidrogênio que interligam às ligações peptídicas de cadeias vizinhas. Uma α hélice é formada quando uma única cadeia polipeptídica se enrola sobre si mesma para formar um cilindro rígido. As regiões de α-hélice são abundantes em prote- ínas localizadas nas membranas celulares, como proteínas transportadoras e receptores. 8 9 A estrutura terciária refere-se à forma como a cadeia polipeptí dica está enovelada, resultante das interações entre os grupos R dos aminoácidos que compõem a proteína. A estrutura terciária contém interações hidrofóbicas, nas quais aminoácidos não polares, grupos hidrofóbicos R, juntam-se no interior da proteína, deixando amino- ácidos hidrofílicos no exterior para interagir com as moléculas de água do entorno. Algumas proteínas são constituídas por várias cadeias polipeptídicas, também conhecidas como subunidades. Quando essas subunidades se juntam, dão à proteína sua estrutura quaternária, como, por exemplo, a hemoglobina. Você já se perguntou por que a clara do ovo muda de transparente para opaca quando você frita um ovo? Se sim, essa seção é para você! Disponível em: https://bit.ly/2DXeXAt Estudos da conformação, da função, e da evolução das proteínas, revelaram a impor- tância de um distinto nível de organização estrutural – o domínio proteico, que consiste em uma subestrutura gerada em qualquer parte da cadeia polipeptídica e que pode se enovelar independentemente do resto da proteína em uma estrutura compacta e estável. Os diferentes domínios de uma proteína, geralmente, estão associados a dife- rentes funções. Muitas das proteínas atuais podem ser agrupadas em famílias, nas quais cada membro apresenta uma sequência de aminoácidos e uma conformação tridimensional similar a todos os outros membros da família, porém, geralmente, têm funções diferentes. Quais são os tipos de estruturas das proteínas? Quais são os padrões da estrutura secundária? Qual é a diferença entre esses padrões? O que é domínio proteico? Enovelamento Proteico e Modificações Pós-Traducionais No tópico anterior, vimos diferentes conformações das proteínas que didaticamen- te se dividem em: primária, secundária, terciária e quaternária. Portanto, após a síntese da cadeia polipeptídica de aminoácidos, ela sofrerá uma série de interações por meio de forças de Van der Waals, energia livre de Gibbs, liga- ções de hidrogênio e pontes dissulfeto, que levarão ao enovelamento em uma estrutura 3D, sendo que algumas proteínas iniciam seu enovelamento antes mesmo da tradução. Ao se enovelar, as proteínas adquirem a conformação mais energeticamente fa- vorável e, assim, “escondem” a maior parte de seus resíduos hidrofóbicos no interior de sua estrutura tridimensional (Figura 2). 9 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Figura 2 – Como uma proteína se enovela em uma formação compacta Fonte: Adaptado de ALBERTS, 2017, p. 114 A maioria das proteínas possui alta facilidade de se dobrar sozinha, mas, para esse processo, elas contam com as chaperonas (Figura 3): proteínas que auxiliam o dobramento e impedem que ele ocorra incorretamente. No entanto, deve ficar claro que a estrutura tridimensional de uma proteína é determinada por sua sequência de aminoácidos, sendo que as chaperonas apenas tornam esse processo mais fidedigno. Existem diversos tipos de chaperonas e, algumas delas, como última alternativa, ao se ligarem a uma proteína enovelada incorretamente, liberam-na de tal forma que permitem uma nova chance de enovelamento correto. Figura 3 – A família de chaperonas moleculares hsp70 Fonte: Adaptado de ALBERTS, 2017, p. 356 Diversas proteínas são reguladas por modificações covalentes que podem alte- rar seu local no interior da célula. Há algumas principais maneiras descritas pelas quais as proteínas sofrem modificações após a tradução que alteram sua atividade, tais como: fosforilação, adenilação, ubiquitilação, acetilação, metilação, glicosilação e alquilação, entre outras. 10 11 A adição e a remoção de determinados grupamentos como um fosfato, por exem- plo, pode ocorrer de acordo com a necessidade celular, o que é fundamental para a versatilidade de uma célula permitindo, que ela se adapte às diferentes condições e responda de forma rápida ao ambiente. Imagine a dinâmica de como isso acontece de maneira admiravelmente incrível den- tro da célula, com milhares de processos ocorrendo ao mesmo tempo de forma coorde- nada, nos quais uma fosforilação pode ativar uma proteína ou de repente fazer com que mude sua localização e, indo mais fundo, é esse conjunto de interações e modificações que de forma mais complexa possibilitará a movimentação de um músculo, por exemplo! Iremos detalhar um pouco algumas das modificações mais relevantes na maioria das proteínas: • Fosforilação: Adição de um grupo fosfato (PO4) (Figura 4), geralmente, em resí- duos serina, treonina ou tirosina. Enzimas quinases adicionam um grupo fosfato e enzimas fosfatases fazem a desfosforilação. É a principal modificação estuda- da, sendo crucial em muitos processos celulares, muito presenteem receptores e enzimas – efetuando sua ativação ou desativação; • Glicosilação: Adição de cadeias polissacarídeas (Figura 4), ocorrendo em as- paragina, serina e treonina. Entre outras funções, desempenha um importante papel em mecanismos de adesão celular; • Metilação; Adição de um grupo metil (CH3) que ocorre em arginina ou lisina. É amplamente estudada em histonas, apresentando papel fundamental na regu- lação gênica, atuando por mecanismos epigenéticos. Figura 4 – Etapas da criação de uma proteína funcional Fonte: Adaptado de ALBERTS, 201, p. 354 11 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Quais interações químicas levam ao enovelamento em uma estrutura 3D das proteínas? Qual parte da proteína fica no interior de sua estrutura tridimensional? Quais modificações após a tradução podem alterar a atividade das proteínas? Endereçamento Proteico Compreendemos o processo de produção de uma proteína, mas, após ser produ- zida, como ela, partindo do ribossomo no citosol, consegue chegar exatamente ao lugar/organela em que precisa atuar? Lembre-se de que a proteína é minúscula diante do tamanho de toda a célula e, algumas vezes, seu destino é extracelular. Agora, pense como seria se jogassem você em uma cidade desconhecida, para chegar a um destino ao qual você nunca foi – você precisaria de alguma coordenada e/ou um mapa para chegar lá. Da mesma forma, as proteínas precisam de coordenadas que indiquem aonde elas devem ir e, nessa tarefa, a célula irá funcionar como um desenvolvido e sofisticado sistema postal, utilizando identificadores e também entregadores especiais. Vamos entender melhor como isso funciona?! As sequências de aminoácidos podem conter sinais de endereçamento – sequência- -sinal, com cerca de 15 a 60 aminoácidos, que direcionam o envio dessas proteínas. Aquelas que não possuem esse sinal podem permanecer no citosol permanente- mente ou terem sinais de endereçamento específico que as direcionem ao Retículo Endoplasmático (RE), às mitocôndrias, aos cloroplastos (reino vegetal), aos peroxis- somos e ao núcleo. Visando a compreender como as proteínas chegam ao seu destino final, precisa- mos detalhar os três principais mecanismos de transporte na célula: • Transporte controlado por comportas: Feito através de complexos de poro nuclear que funcionam como canais seletivos que realizam o transporte ativo de determinadas proteínas ou outras moléculas. É possível, também, a ocorrência de difusão livre no caso de micromoléculas; • Translocação de proteínas: Translocadores de proteínas deslocam determina- das proteínas do citosol para alguma organela, como o retículo endoplasmático, por exemplo; • Transporte vesicular: Vesículas de transporte atuam carregando uma proteína de uma organela a outra que seja topologicamente equivalente, ocorrendo fusão com a membrana da organela de destino. A sequência-sinal é como se fosse um “código postal” que determina o agrupa- mento específico de aminoácidos em uma ordem que fará com que a proteína que possui esse código seja direcionada para uma localização celular específica. 12 13 No caso de proteínas destinadas ao RE, por exemplo, é comum uma sequência sinal que possua cerca de 5 a 10 aminoácidos hidrofóbicos na sua região N-terminal. A sequência sinal é tão fundamental que experimentos demonstraram a alteração de localização celular de forma que uma proteína citosólica modificada por Engenharia Genética colocando uma sequência-sinal de RE faz com que essa proteína seja redire- cionada ao RE. Existem receptores de endereçamento complementares que reconhecem essas sequência-sinal. Destino: Núcleo Há um tráfego intenso de moléculas entre o citosol e o núcleo, que ocorre a partir dos Complexos do Poro Nuclear (NPCs), sendo que pequenas moléculas se difun- dem livremente. Em contrapartida, moléculas grandes necessitam de um transporte ativo. A maio- ria dos sinais de sinalização nuclear devem ser reconhecidos por receptores conheci- dos como importinas para, assim, dar início à importação nuclear. Esses receptores fazem ligação no sinal de localização nuclear da proteína e tam- bém em sequências repetidas de fenilalanina e glicina (FG) presentes no canal de nucleoporinas no centro do poro nuclear. As repetições FG criam uma via de trans- porte alinhando o caminho ao longo dos NPCs. Para que ocorra a importação, necessita-se de um gradiente energético de Ran-GDP/ Ran-GTP, que dirige o transporte nuclear na direção apropriada. Os receptores de importação, a partir das ligações à repetição FG, entram no canal e, atingindo o lado nuclear do complexo do poro, há a ligação de Ran-GTP a eles. Caso os receptores estejam carregando uma proteína, a ligação de Ran-GTP faz com que os receptores de importação liberem a proteína carregada. O descarregamento da proteína só ocorrerá no lado nuclear, pois Ran-GDP no citosol não se liga a receptores de importação e, portanto, a localização nuclear de Ran-GTP direciona o processo de importação. Interessantemente, os sinais de localização nuclear não são removidos e, assim, as proteínas nucleares podem ser repetidamente importadas, como é necessário toda vez que o núcleo se reorganiza após a mitose. Destino: Mitocôndrias As mitocôndrias são organelas que possuem seu próprio DNA. Entretanto, muitas das suas proteínas são codificadas no núcleo celular e importadas do citosol. Sabemos que essas organelas apresentam subcompartimentos. Então, uma ou mais sequências-sinal devem dirigir as proteínas precursoras mitocondriais para o seu subcompartimento adequado. 13 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica As sequências-sinal são necessárias e suficientes para a localização correta das proteínas. Existem complexos proteicos que atuam como translocadores possibilitando o movimento das proteínas através das membranas mitocondriais. O complexo TOM transfere proteínas através da membrana externa, e dois com- plexos TIM (TIM23 e TIM22) transferem proteínas através da membrana interna. Inicialmente, ele transporta a sequência-sinal dessas proteínas para o espaço inter- membrana e ajuda a inserir proteínas transmembrana na membrana externa. Um dado importante é que as proteínas precursoras mitocondriais não se eno- velam em sua estrutura nativa logo depois de serem sintetizadas, permanecendo desenoveladas por meio de interações com outras proteínas no citosol. Proteínas fundamentais nesse processo são chaperonas pertencentes à família hsp70. O complexo TOM transporta, primeiramente, o sinal de localização mitocondrial através da membrana externa para o espaço intermembrana, onde se liga ao com- plexo TIM, abrindo o canal no complexo. A cadeia polipeptídica é, então, translocada para o espaço da matriz ou inserida na membrana interna. O transporte para a membrana mitocondrial interna e para o espaço intermembrana ocorre por meio de diversas vias. Transporte de proteínas para a mitocôndria. Disponível em: https://youtu.be/dleu35BRIRo O foco desta Unidade é a célula animal, mas você sabia que a célula vegetal também tem proteínas? O transporte dessas proteínas é endereçado para os cloroplastos, que são orga- nelas que possuem seu próprio DNA. Destino: Peroxissomos O sinal de importação de proteínas dos peroxissomos consiste, sobretudo, de uma sequência específica de três aminoácidos (Serina-Lisina-Leucina) localizados na região C-terminal da proteína. Os sinais de importação são primeiro reconhecidos pelos receptores solúveis de proteínas no citosol. Proteínas fundamentais que participam do processo de importação, o qual é movido por hidrólise de ATP, são denominadas peroxinas. Um complexo de pelo menos seis diferentes peroxinas forma uma proteína translocadora na membrana do peroxissomo. Destino: Retículo Endoplasmático Rugoso (RER) A maior parte das proteínas que são secretadas para o exterior celular são envia- das inicialmente ao RER (Figura 5). 14 15 Essa importação parao RER é co-traducional, ocorrendo antes da síntese com- pleta da cadeia polipeptídica. O ribossomo que está sintetizando a proteína está diretamente aderido à mem- brana do RER, permitindo que uma ponta da proteína seja translocada para o RER enquanto o restante da cadeia polipeptídica está sendo sintetizado. Todas as proteínas, apesar do seu subsequente destino, são dirigidas para a mem- brana do RER por uma sequência-sinal do RE, a qual inicia a sua translocação por um mecanismo comum. A sequência-sinal do RE leva à membrana do RE, sobretudo, por dois componen- tes: uma partícula de reconhecimento de sinal (SRP, signal-recognition particle), que circula entre a membrana do RE e o citosol e se liga à sequência-sinal, e um receptor SRP na membrana do RE. Figura 5 – Direcionamento de proteínas no RER e complexo de Golgi Fonte: Adaptado de khan Academy Direcionamento de proteínas: como as marcas moleculares são usados para direcionar pro- teínas para diferentes partes da célula (e para o exterior da célula). Disponível em: https://bit.ly/2ODuhoa Para que locais as proteínas podem ser endereçadas? Através de quais mecanismos de transporte na célula chega ao destino final? Explique como ocorre o transporte das proteínas para o núcleo, mitocôndrias, peroxissomos e retículo endoplasmático rugoso. 15 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Complexo Proteossômico e a Necessidade de Degradação Proteica Algumas proteínas podem falhar na tentativa de um enovelamento adequado e precisam ser destruídas por mecanismo de proteólise. O reconhecimento de alguma região hidrofóbica anormal na superfície de uma pro- teína a direciona para uma protease complexa denominada proteassomo (Figura 6). Figura 6 – Proteossomo Fonte: Adaptado de ALBERTS, 2017, p. 359 O proteassomo atua quebrando as ligações peptídicas de forma que o substrato só é liberado quando convertido em pequenos peptídeos. A reação de desespiralização, direcionada por hidrólise de ATP, desnatura (ou de- sestrutura) as proteínas-alvo conforme elas se movem através do quepe, expondo-as para as proteases que revestem a região central do proteassomo (Figura 7). Figura 7 – Uma proteína hexamérica de desnaturação Fonte: Adaptado de ALBERTS, 2017, p. 359 Evidentemente, uma enzima tão eficiente e de poder tão destrutivo é altamente regulada para que possa reconhecer entre uma proteína “correta” e uma “inadequada”, de forma que apenas proteínas marcadas por ubiquitinação são destruídas. 16 17 A proteólise compete com o enovelamento. Caso uma proteína seja de enovelamento muito lento, fica vulnerável à maquinaria proteolítica por mais tempo, acarretando que um maior número de moléculas possa ser destruído antes que complete seu enove- lamento adequado, enquanto uma proteína que se enovele rapidamente será pouco exposta à proteólise e apenas poucas moléculas poderão ser atingidas e destruídas. Proteínas que sofreram mutação ou algum erro em seus processos de transcrição, splicing e tradução podem ser incapazes de se enovelar adequadamente. Agora, imagine o que poderia acontecer se essa proteína de conformação inade- quada fosse mantida? Ela não só será incapaz de exercer sua função, como poderá gerar sérios da- nos celulares. Portanto, é crucial que o sistema de degradação proteolítico destrua essas proteí- nas nocivas. Além disso, existe um sistema de vigilância baseado no RE que detecta proteínas que falharam no correto processo de enovelamento ou de associação pro- teica após entrarem no RE e, então, redireciona essas proteínas ao citosol para serem degradadas pelo proteassomo. Moléculas de proteínas nascentes podem ser, eventualmente, destruídas pelo sis- tema ubiquitina-proteassomo, visto que, enquanto ainda não estão completamente enovelada, estarão expostos sinais de degradação. Uma outra atuação desse sistema de degradação proteolítica é de determinar o tempo de vida das proteínas. Vamos pensar, por exemplo, no caso de proteínas do ciclo celular que necessitam de uma atuação rápida e depois precisam ser destruídas para que o ciclo prossiga, sendo rapidamente acionado o sistema de degradação por proteassomo. Alterações de estado de uma célula, reações ao ambiente tudo isso também envol- verá a participação das vias proteolíticas. Um dado muito interessante descoberto é de que as proteínas já possuem em si próprias o sinal que as leva para a destruição, como se carregassem uma bomba autodestruidora consigo. Acontece que 80% das proteínas humanas são acetiladas no resíduo N-terminal e essa modificação, por sua vez, é reconhecida por uma enzima denominada E3 que direciona para a ubiquitinação da proteína e envio ao proteassomo para sua destruição. Parece loucura, certo? Entretanto, é um mecanismo sofisticado de autorregulação, de forma que, quando a proteína está adequadamente enovelada, esta extremidade N-terminal está escondida. Em decorrência desse mecanismo, quando uma proteína sofre danos, mutações ou não consegue se enovelar corretamente, o sinal estará exposto e a proteína será degradada pelo sistema ubiquitina-proteassomo. 17 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Pesquisadores estudam ubiquitina para combater o câncer e prevenir a zika. Disponível em: https://bit.ly/3eHmqAl O que é proteossoma? Por que ocorre a degradação de algumas proteínas? Explique o processo de desnaturação de uma proteína. Controle da Expressão Gênica Uma das grandes indagações que deve ser feita no estudo da Biologia Molecular da célula é o que difere uma célula de outra se ambas possuem o mesmo material genético? Como é determinado que uma célula da orelha não seja uma célula pan- creática produtora de insulina? A diferença está na expressão gênica de cada célula, a qual só irá expressar os genes de acordo com sua função e localização. Claro que células de funções e localizações diferentes também irão compartilhar genes em comum, muitos dos quais são essenciais a todas as células, são os chamados genes de manutenção (housekeeping genes). Entretanto, há moléculas de proteínas e RNAs que são encontradas apenas nas respectivas células especializadas em que atuam e, mesmo com tecnologias sensí- veis, não são encontradas em outros locais. Não há dúvida alguma de que é fundamental o estudo aprofundado de como é controlada essa expressão gênica, os fatores envolvidos e que mecanismos permitem a seletividade da expressão de um gene. As células devem estar prontas para mudanças ambientais repentinas de maneira a responder com uma expressão proteica coerente. Os eucariotos, por exemplo, uti- lizam-se frequentemente da fosforilação do fator de início da tradução eIF2 realizado por proteínas-cinases específicas que respondem às alterações ambientais. Dessa forma, a célula diminui a taxa total de síntese proteica em resposta a situ- ações como a privação de nutrientes, as infecções por vírus e os aumentos súbitos na temperatura. O principal controle, para a grande maioria dos genes, é o controle transcricional, visto que evita que a célula não sintetize intermediários supérfluos. A transcrição de genes pode ser ativada e desativada por reguladores transcri- cionais. 18 19 Regulação da Transcrição Gênica em Procariotos e o Sistema Operon Em procariotos, a partir de um único promotor, a RNA polimerase transcreve mais de um gene em sequência, formando um longo RNA denominado RNA policistrônico. O operon é esse conjunto de genes estruturais organizados em sequência contro- lados por um único promotor. A atividade de um único promotor pode ser regulada por vários reguladores trans- cricionais diferentes. No caso do Operon Lac, há a atuação tanto de um repressor quanto de um ati- vador CAP. Figura 8 – Operon Lac Fonte: Adaptado de WATSON et al., 2015, p. 620 Operon Lac – Regulação gênica. Disponível em: https://youtu.be/7_FrhNHBSW4 A proteína ativadora bacteriana CAP precisa se ligar ao AMP cíclico (cAMP) antes quepossa ligar-se ao DNA. O LacZ é o primeiro gene do operon que codifica a enzima β-galactosidase res- ponsável pela quebra de lactose em galactose e glicose. A glicose é a principal fonte de carbono para as bactérias e, quando ausente, os níveis de cAMP aumentam, por sua vez, CAP aciona a produção de enzimas que digerem fontes alternativas de açúcares – incluindo a lactose. Mas, não faz sentido algum induzir a expressão do operon Lac se não há lac- tose disponível. Na ausência de lactose, existe o repressor Lac que se liga a uma sequência regu- ladora denominada operador Lac, inativando a expressão. Com a presença de lactose, há aumento da concentração de alolactose, a qual se liga ao repressor e libera o operador. Esse mecanismo coordenado permite que o operon somente seja expresso quan- do ocorrem as duas condições: ausência de glicose e a lactose deve estar presente. Todos os reguladores transcricionais – repressores ou ativadores – devem estar ligados ao DNA para exercerem os seus efeitos (Figura 9). 19 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Figura 9 – Expressão dos genes lac Fonte: Adaptado de WATSON et al., 2015, p. 621 Regulação Gênica em Eucariotos Uma célula pode controlar as proteínas que produz. Em eucariotos, a regulação é bem mais complexa devido à estrutura da cromatina. Além disso, existem proteínas contendo múltiplas subunidades denominadas coativadores e correpressores que se associam ao DNA juntamente aos reguladores. Esse controle ocorre em todas as etapas do DNA ao RNA, até a proteína (Figura 10): • Controle transcricional: controlando quando e como um determinado gene é transcrito; • Controle do do processamento de RNA: controlando como o transcrito de RNA é submetido a splicing ou é processado; • Controle do transporte e da localização de RNA: selecionando quais mR- NAs completos são exportados do núcleo para o citoplasma e determinando onde no citoplasma eles ficam localizados; • Controle traducional: selecionando quais mRNAs no citoplasma são traduzi- dos pelos ribossomos; • Controle da degradação do mRNA: desestabilizando seletivamente certas moléculas de mRNA no citoplasma; • Controle da atividade proteica: ativando, inativando, degradando ou comparti- mentalizando seletivamente moléculas de proteína específicas após a sua produção. 20 21 Figura 10 – Seis etapas nas quais a expressão gênica eucariótica pode ser controlada Fonte: Adaptado de ALBERTS, 2017, p. 373 Os reguladores transcricionais em eucariotos normalmente atuam em grupos e reconhecem determinadas sequências que constituem pequenos trechos de DNA denominados sequências reguladoras cis-atuantes. Os ativadores transcricionais eucarióticos usam variados mecanismos, como atrair coativadores incluindo enzimas modificadoras de histonas, complexos de re- modelagem da cromatina dependentes de ATP e chaperonas de histonas, cada um dos quais podendo alterar a estrutura da cromatina dos promotores. Essas alterações fornecem um maior acesso ao DNA, facilitando, consequente- mente, a transcrição. Além disso, mudanças locais da cromatina dirigidas por um regulador transcricional possibilitam a ligação de reguladores adicionais. É de conhecimento que sítios realmente muito distantes podem afetar a RNA- -polimerase no promotor. Como isso é possível? Isso se deve à flexibilidade da hélice do DNA, que pode curvar-se, possibilitando essa interação. As sequências reguladoras cis-atuantes em que se ligam proteínas ativadoras da transcrição eucariótica denominam-se estimuladores (enhancers). Algumas proteínas ativadoras ligam-se em mais de um fator de transcrição geral e aceleram sua associação em um promotor, que foi trazido para a proximidade desse ativador com a estrutura do DNA, curvando-se e formando uma alça de DNA. Um dos coativadores mais prevalentes é o Mediador, grande complexo proteico de tamanho próximo ao da RNA-polimerase, que realiza uma importante atividade mediando a associação no promotor dos ativadores transcricionais ligados ao DNA, RNA-polimerase e fatores de transcrição gerais. O momento e o local no qual cada gene é transcrito, assim como suas taxas de transcrição sob diferentes condições, determina-se pelo conjunto particular de regu- ladores transcricionais que se ligam à região reguladora do gene. 21 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Devemos observar que um único gene eucariótico, normalmente, é controlado por diversos reguladores transcricionais ligados a sequências as quais podem estar localizadas a centenas de milhares de pares de nucleotídeos do promotor. Portanto, a compreensão de todos os fatores atuantes para determinar a expres- são de um determinado gene é algo extremamente complexo repleto de participan- tes e deve ser analisado de forma conjunta. O que é o operon Lac? Em que fases pode ocorrer a regulação gênica em eucariotos? Qual é a função dos ativadores transcricionais? 22 23 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Biologia molecular da célula ALBERTS, B. Biologia molecular da célula. 6.ed. Porto Alegre ArtMed, 2017. Biologia celular e molecular LODISH, H. et al. Biologia celular e molecular. 7.ed. Porto Alegre ArtMed, 2014. Leitura Direcionamento de proteínas Como as marcas moleculares são usadas para direcionar proteínas para diferentes partes da célula (e para o exterior da célula). https://bit.ly/2ODuhoa Introdução ao problema de enovelamento de proteínas: uma abordagem utilizando modelos computacionais simplificados https://bit.ly/3eHd8nX Proteólise ATP-Dependente de proteínas marcadas com Ubiquitina https://bit.ly/3eNyctd Visão geral: regulação gênica em eucariontes Como diferentes genes são expressos em diferentes tipos de células. https://bit.ly/39fS6fc 23 UNIDADE Estrutura das Proteínas e Controle da Expressão Gênica Referências ALBERTS, B. Biologia molecular da célula. 6.ed. Porto Alegre: ArtMed, 2017. DE ROBERTIS, E.M. Biologia celular e molecular. 16.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. LODISH, H. et al. Biologia celular e molecular. 7.ed. Porto Alegre: ArtMed, 2014. WATSON, J. D. et al. Biologia Molecular do Gene 7.ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. ZAHA, A.; FERREIRA, H. B.; PASSAGLIA, L. M. P. Biologia Molecular Básica. 5.ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. 24
Compartilhar