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IPH UFRGS Março 2010 01 - Introdução 2 02 - Propriedades e ciclo hidrológico 10 03 - Bacia hidrográfica 15 04 - Água na atmosfera 28 05 - Precipitação 41 06 - Interceptação 68 07 - Infiltração e água no solo 71 08 - Evapotranspiração 78 09 - Água subterrânea 94 10 - Geração de escoamento 106 11 - Hidrograma unitário 113 12 - Escoamento de base 132 13 - Medição de vazão 143 14 - Hidrologia Estatística 169 15 - Regularização de vazões 203 16 - Propagação de vazão em reservatórios 218 17 - Propagação de vazão em rios 225 18 - Vazões máximas com base na chuva 238 19 - Qualidade de água 249 21 - Legislação e gestão 270 24 - Referências 279 Introduzindo hidrologia WALTER COLLISCHONN – IPH UFRGS RUTINÉIA TASSI – IPH UFRGS Capa: Andreas Collischonn Ilustrações: Fernando Dornelles Versão 7 I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 1111 Introdução O conceito de Hidrologia o estudo da Hidrologia nas Engenharias. idrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência, circulação, distribuição espacial, suas propriedades físicas e químicas e sua relação com o ambiente, inclusive com os seres vivos. A Hidrologia é o estudo da água na superfície terrestre, no solo e no sub-solo. De uma forma simplificada pode-se dizer que hidrologia tenta responder à pergunta: O que acontece com a água da chuva? A Hidrologia pode ser tanto uma ciência como um ramo da engenharia e tem muitos aspectos em comum com a meteorologia, geologia, geografia, agronomia, engenharia ambiental e a ecologia. A Hidrologia utiliza como base os conhecimentos de hidráulica, física e estatística. Existem outras ciências que também estudam o comportamento da água em diferentes fases, como a meteorologia, a climatologia, a oceanografia, e a glaciologia. A diferença fundamental é que a Hidrologia estuda os processos do ciclo da água em contato com os continentes. Hidrologia nas Engenharias A humanidade tem se ocupado com a água como uma necessidade vital e como uma ameaça potencial pelo menos desde o tempo em que as primeiras civilizações se desenvolveram às margens dos rios. Primitivos engenheiros construíram canais, diques, barragens, condutos subterrâneos e poços ao longo do rio Indus, no Paquistão, dos rios Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia, do Hwang Ho na China e do Nilo no Egito, há pelo menos 5000 anos. Enquanto a Hidrologia é a ciência que estuda a água na Terra e procura responder à pergunta sobre o que ocorre com a água da chuva uma vez que atinge a superfície, a Engenharia Hidrológica é a aplicação dos conhecimentos da Hidrologia para resolver problemas relacionados aos usos da água. Capítulo 1 H I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 2222 Entre os principais usos humanos da água estão: o abastecimento humano; irrigação; dessedentação animal; geração de energia elétrica; navegação; diluição de efluentes; pesca; recreação e paisagismo. As preocupações com o uso da água aumentam a cada dia porque a demanda por água cresce à medida que a população cresce e as aspirações dos indivíduos aumentam. Estima-se que no ano 2000 o mundo todo usou duas vezes mais água do que em 1960. Enquanto as demandas sobem, o volume de água doce na superfície da terra é relativamente fixo. Isto faz com que certas regiões do mundo já enfrentem situações de escassez. O Brasil é um dos países mais ricos em água, embora existam problemas diversos. A Engenharia Hidrológica também estuda situações em que a água não é exatamente utilizada pelo homem, mas deve ser manejada adequadamente para minimizar prejuízos, como no caso das inundações provocadas por chuvas intensas em áreas urbanas ou pelas cheias dos grandes rios. Relacionados a estes temas estão os estudos de Drenagem Urbana e de Controle de Cheias e Inundações. A água também é importante para a manutenção dos ecossistemas existentes em rios, lagos e ambientes marginais aos corpos d’água, como banhados e planícies sazonalmente inundáveis. Nos últimos anos a Hidrologia e a Engenharia Hidrológica têm se aproximado de ciências ambientais como a limnologia e a ecologia, visando responder questões como: Qual é a quantidade de água que pode ser retirada de um rio sem que haja impactos significativos sobre os seres vivos que habitam este rio? É possível que no futuro a água venha a ter um papel cada vez mais importante, num mundo em que a energia renovável vai ser fundamental: no caso de produção (hidroelétrica, energia de ondas e marés); no caso de armazenamento (para complementar energia de vento ou solar); e no caso de produção de biocombustíveis (irrigação). Usos da água Os usos da água são normalmente classificados em consuntivos e não consuntivos. Usos consuntivos alteram substancialmente a quantidade de água disponível para outros usuários. Usos não-consuntivos alteram pouco a quantidade de água, mas podem alterar sua qualidade. O uso de água para a geração de energia hidrelétrica, por exemplo, é um uso não-consuntivo, uma vez que a água é utilizada para movimentar as turbinas de uma usina, mas sua quantidade não é alterada. Da mesma forma a navegação é um uso não-consuntivo, porque não altera a quantidade de água disponível no rio ou lago. Por outro lado, o uso da água para irrigação é um uso consuntivo, porque apenas uma pequena parte da água aplicada na lavoura retorna na forma de escoamento. A maior parte da água utilizada na irrigação volta para a I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 3333 atmosfera na forma de evapotranspiração. Esta água não está perdida para o ciclo hidrológico global, podendo retornar na forma de precipitação em outro local do planeta, no entanto não está mais disponível para outros usuários de água na mesma região em que estão as lavouras irrigadas. Os usos de água também podem ser divididos de acordo com a necessidade ou não de retirar a água do rio ou lago para que possa ser utilizada. Alguns usos da água que podem ser feitos sem retirar a água de um rio ou lago são a navegação, a geração de energia hidrelétrica, a recreação e os usos paisagísticos. Alguns usos da água que exigem a retirada de água, ainda que parte dela retorne, são o abastecimento humano e industrial, a irrigação e a dessedentação de animais. Os parágrafos que seguem descrevem com um pouco mais de detalhe alguns dos principais usos de água. Abastecimento humano O uso da água para abastecimento humano é considerado o mais nobre, uma vez que o homem depende da água para sua sobrevivência. A água para abastecimento humano é utilizada diretamente como bebida, para o preparo dos alimentos, para a higiene pessoal e para a lavagem de roupas e utensílios. No ambiente doméstico a água também é usada para irrigar jardins, lavar veículos e para recreação. O consumo de água em ambiente doméstico é estimado em 200 litros por habitante por dia. Aproximadamente 80% deste consumo retorna das residências na forma de esgoto doméstico, obviamente com uma qualidade bastante inferior. A apresenta uma estimativa aproximada das quantidades de água em cada um dos usos domésticos. Abastecimento industrial O uso industrial da água está relacionado aos processos de fabricação, ao uso no produto final, a processos de refrigeração, à produção de vapor e à limpeza. A fabricação de diferentes produtos tem diferentes consumos de água. Assim, a indústria de produção de papel, por exemplo, é reconhecidamente uma das que mais consomem água. Irrigação A irrigação é o uso de água mais importante do mundo em termos de quantidade utilizada. A irrigação é utilizada na agricultura para obter melhor produtividade e para que a atividade agrícola esteja menos sujeita aos riscos climáticos. Em algumas regiões áridas, semi-aridas, ou com uma estação seca muito longa, a irrigação é essencial para que possa existir a agricultura. No Brasil o uso de água para irrigação vem aumentandoa cada ano. A quantidade de água utilizada na irrigação depende das características da cultura, do clima e dos solos de uma região, bem como das técnicas utilizadas na irrigação. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 4444 Figura 1. 1: Proporção aproximada dos usos da água em ambiente doméstico (Clarke e King, 2005). Navegação A navegação é um uso não-consuntivo que pode ser bastante atrativo do ponto de vista econômico, principalmente para cargas com baixo valor por tonelada, como minérios e grãos. A navegação requer uma profundidade adequada do corpo d’água e não pode ser praticada em rios com velocidade de água excessiva. Assimilação e transporte de poluentes Os corpos de água são utilizados para transportar e assimilar os despejos neles lançados, como o esgoto doméstico e industrial. Mesmo em regiões em que o esgoto doméstico e industrial é tratado, as concentrações de alguns poluentes podem ser superiores às concentrações encontradas nos rios. Assim, utiliza-se a capacidade de diluição dos rios e lagos para diminuir a concentração dos poluentes. Também utiliza- se os rios para transportar os poluentes e, assim, afastá-los de onde são gerados. A capacidade de assimilação de um corpo d’água é limitada, e quando o lançamento de dejetos é excessivo, a qualidade de água de um rio não é mais suficiente para outros usos, como a recreação e a preservação dos ecossistemas. Recreação Um uso de água não consuntivo realizado no próprio curso d’água é a recreação. Este uso é bastante freqüente em rios com qualidade de água relativamente boa, e inclui atividades de contato direto, como natação e esportes aquáticos como a vela e a I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 5555 canoagem. Também podem existir atividades de recreação de contato indireto, como a pesca esportiva. Preservação de ecossistemas Além de todos os usos humanos mais diretos, é do interesse das sociedades que os rios e lagos mantenham sua flora e fauna relativamente bem preservadas. A manutenção dos ecossistemas aquáticos implica na necessidade de que uma parcela da água permaneça no rio, e que a qualidade desta água seja suficiente para a vida aquática. Geração de energia A água é utilizada para a geração de energia elétrica em usinas hidrelétricas que aproveitam a energia potencial existente quando a água passa por um desnível do terreno. A potência de uma usina hidrelétrica é proporcional ao produto da descarga (ou vazão) pela queda. A queda é definida pela diferença de altitude do nível da água a montante (acima) e a jusante (abaixo) da turbina. A descarga em um rio depende das características da bacia hidrográfica, como o clima, a geologia, os solos, a vegetação. Em projetos de centrais hidrelétricas os estudos hidrológicos são necessários para: • Escolha das turbinas adequadas e determinação da potência instalada. • Análise da variação temporal da disponibilidade de energia. • Determinação da energia garantida ou firme. • Estimativa de vazões máximas em eventos extremos para dimensionamento das estruturas extravasoras. • Otimização da operação de sistemas interligados de geração elétrica que incluem hidrelétricas e termoelétricas. • Análise das relações entre o uso da água para geração de energia e outros usos, como irrigação, abastecimento urbano, navegação, preservação do meio ambiente e recreação. No Brasil a geração de energia elétrica está fortemente ligada à hidrologia porque a quase totalidade da energia gerada e consumida é oriunda de usinas hidrelétricas. Considerando os dados da década de 1990, o Brasil é o terceiro maior produtor de energia hidrelétrica do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e do Canadá e a frente da China, da Rússia e da França. Entretanto, a energia hidrelétrica no Brasil corresponde a mais de 97% do total da energia elétrica gerada, enquanto que, na maior parte dos outros países, a energia hidrelétrica corresponde a percentuais muito menores do total, conforme a Tabela 1. 1. Destes países apenas a Noruega apresenta uma dependência semelhante da água no setor de energia, com 99% da energia de origem I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 6666 hidrelétrica. A dependência mundial da energia hidrelétrica é de apenas 20%, conforme pode ser observado na última linha da tabela. Tabela 1. 1: Os dez países maiores produtores de energia hidrelétrica do mundo e a importância relativa da hidreletricidade na energia total produzida (Gleick, 2000). País Capacidade Instalada(MW) Energia Hidrelétrica produzida (GW.hora/ano) Percentual da energia total produzida (%) Estados Unidos 74.860 296.380 10 Canadá 64.770 330.690 62 China 52.180 166.800 18 Brasil 51.100 250.000 97 Rússia 39.990 162.800 27 Noruega 26.000 112.680 99 França 23.100 65.500 15 Japão 21.170 91.300 9 Índia 20.580 72.280 25 Suécia 16.540 63.500 52 Total dos 10 países 390.290 1.611.030 22 Mundo 633.730 2.445.390 20 Mesmo em usinas termelétricas a água tem um papel fundamental e é consumida em quantidades significativas. Neste caso a água é utilizada nos ciclos internos de resfriamento e geração de vapor. Nos Estados Unidos as usinas termelétricas utilizam cerca de 260 bilhões de metros cúbicos por ano, o que corresponde a 47% da utilização total de água neste país. Deve se ressaltar, entretanto, que nem toda esta água é consumida, e grande parte retorna aos rios. Por este motivo, também as usinas termelétricas são construídas junto a fontes abundantes e confiáveis de água, e são necessários estudos hidrológicos para avaliar a sua disponibilidade. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 7777 Propriedades da água e o ciclo hidrológico Os conceitos fundamentais do ciclo hidrológico. água é uma substância com características incomuns. É a substância mais presente na superfície do planeta Terra, cobrindo mais de 70% do globo. O corpo humano é composto por água mais ou menos na mesma proporção. Já um tomate é composto por mais de 90 % de água, assim como muitos outros alimentos. Todas as formas de vida necessitam da água para sobreviver. A água é a única substância na Terra naturalmente presente nas formas líquida, sólida e gasosa. A mesma quantidade de água está presente na Terra atualmente como no tempo em que os dinossauros habitavam o planeta, há milhões de anos atrás. A busca de vida em outros planetas está fortemente relacionada a busca de indícios da presença de água. Propriedades físicas e químicas da água As propriedades físicas e químicas da água são bastante incomuns e estas características condicionam seu comportamento no meio ambiente. Entre as propriedades da água estão sua massa específica, calor específico, calor latente de fusão e vaporização, viscosidade, propriedades moleculares e inter-moleculares. A existência da água na Terra em todas as três fases (vapor, líquido e sólido) é um dos aspectos que torna o planeta único. Massa específica da água A massa específica, ou densidade, é a massa por unidade de volume de uma substância e o peso específico é o peso por unidade de volume. Para a massa específica normalmente é usado o símbolo ρ, e nas unidades do SI é dada em Kg.m-3. O peso específico é simbolizado pela letra grega γ e é dado em unidades de N.m-3. As duas variáveis estão relacionadas pela segunda lei de Newton, usando a aceleração da gravidade (g): Capítulo 2 A W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 8888 g⋅= ργ onde g é a aceleração da gravidade (m.s-2). A variação do valor da massa específica da água com a temperatura é bastante incomum, e tem um importante papel no meio ambiente. Por exemplo, a água líquida a 0oC é mais densa que o gelo. Por outro lado, quando a água líquida a 0oC é aquecida sua densidade inicialmente aumenta até a temperatura de 3,98oC, quando a sua massa específica atinge 1000 Kg.m-3. A partir desta temperatura a densidade da água diminui com o aumentoda temperatura, como acontece com a maior parte das substâncias. A massa específica da água líquida a diferentes temperaturas pode ser estimada pela equação abaixo (Dingman, 2002): 68,1 98,3019549,01000 −⋅−= Tρ onde T é a temperatura em oC e ρ é a massa específica em Kg.m-3. A presença de substâncias dissolvidas ou em suspensão na água pode alterar a sua massa específica. Assim, a água salgada é mais densa do que a água doce, e a água com alta concentração de sedimentos de alguns rios pode ter densidade significativamente diferente da água limpa a mesma temperatura. Calor específico da água A estrutura molecular da água (H2O) é responsável por uma característica fundamental da água que é a sua grande inércia térmica, isto é, a temperatura da água varia de forma lenta. O sol aquece as superfícies de terra e de água do planeta com a mesma energia, entretanto as variações de temperatura são muito menores na água. Em função deste aquecimento diferenciado e do papel regularizador dos oceanos, o clima da Terra tem as características que conhecemos. O calor específico é a propriedade de uma substância que relaciona a variação do conteúdo de energia à variação da sua temperatura. É definido como a quantidade de energia absorvida ou liberada (∆H) por uma massa M de uma substância enquanto sua temperatura aumenta ou diminui por um valor de ∆T. Cada grama de água precisa receber cerca de uma caloria para aumentar sua temperatura em 1 oC. Em unidades do SI o calor específico da água (cp) é de 4216 J.Kg -1.K-1. Isto significa que é necessário fornecer 4216 Joules de energia para cada Kg de água ter sua temperatura aumentada em 1 grau Kelvin. A massa específica da água a 3,98 oC é de 1000 Kg.m-3. A do gelo é de aproximadamente 920 Kg.m-3. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 9999 Calor latente de fusão A quantidade de energia liberada pela água congelada a 0oC durante o processo de fusão é denominada calor latente de fusão. O valor do calor latente de fusão da água é de, aproximadamente, 334 KJ.Kg-1. Calor latente de vaporização A quantidade de energia absorvida pela água na passagem da fase líquida para a gasosa (vapor) é o calor latente de vaporização. A temperaturas abaixo de 100 oC algumas moléculas de água na superfície podem romper as ligações inter-moleculares com as moléculas vizinhas e escapar do meio líquido, vaporizando-se. Assim, a vaporização pode ocorrer a temperaturas inferiores à do ponto de ebulição. A 100 oC o calor latente de vaporização é de 2,261 MJ.Kg-1, o que corresponde a cinco vezes mais energia do que a necessária para aquecer a água de 0 a 100 oC. O calor latente de vaporização decresce com o aumento da temperatura. Esta relação pode ser aproximada pela equação abaixo: T⋅−= 002361,0501,2λ onde λ é o calor latente de vaporização (MJ.Kg-1) e T é a temperatura em oC. A grande capacidade de armazenar calor da água na forma de vapor tem um papel importante no transporte de energia na atmosfera, das regiões mais tropicais para as regiões mais próximas dos pólos. A liberação de energia que ocorre durante a condensação tem um papel fundamental na formação das nuvens e no processo de formação das chuvas. A hidrosfera O termo hidrosfera refere-se a toda a água do mundo, que é estimada em aproximadamente 1,4 . 1015 metros cúbicos. Cerca de 97 % da água do mundo está nos oceanos. Dos 3% restantes, a metade (1,5% do total) está armazenada na forma de geleiras ou bancadas de gelo nas calotas polares. A água doce de rios, lagos e aqüíferos (reservatórios de água no subsolo) corresponde a menos de 1% do total. Em valores totais a água doce existente na Terra e a água que atinge a superfície dos continentes na forma de chuva é suficiente para atender todas as necessidades humanas. Entretanto, grandes problemas surgem com a grande variabilidade temporal e espacial da disponibilidade de água. A América do Sul é, de longe, o continente com a maior disponibilidade de água, porém a precipitação que atinge nosso continente é altamente variável, apresentando na Amazônia altíssimas taxas de precipitação enquanto o deserto de Atacama é conhecido como o lugar mais seco do mundo. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 10101010 Tabela 1. 1: A água na Terra (Gleick, 2000). Percentual água do planeta (%) Percentual da água doce (%) Oceanos/água salgada 97 Gelo permanente 1,7 69 Água subterrânea 0,76 30 Lagos 0,007 0,26 Umidade do solo 0,001 0,05 Água atmosférica 0,001 0,04 Banhados 0,0008 0,03 Rios 0,0002 0,006 Biota 0,0001 0,003 No Brasil a disponibilidade de água é grande, porém existem regiões em que há crescentes conflitos em função da quantidade de água, como na região semi-árida do Nordeste. Mesmo no Rio Grande do Sul, onde a disponibilidade de água pode ser considerada alta, ocorrem anos secos em que a vazão de alguns rios não é suficiente para atender as demandas para abastecimento da população e para irrigação. O ciclo hidrológico O ciclo hidrológico é o conceito central da hidrologia. O ciclo hidrológico está ilustrado na Figura 1. 1. A energia do sol resulta no aquecimento do ar, do solo e da água superficial e resulta na evaporação da água e no movimento das massas de ar. O vapor de ar é transportado pelo ar e pode condensar no ar formando nuvens. Em circunstâncias específicas o vapor do ar condensado nas nuvens pode voltar à superfície da Terra na forma de precipitação. A evaporação dos oceanos é a maior fonte de vapor para a atmosfera e para a posterior precipitação, mas a evaporação de água dos solos, dos rios e lagos e a transpiração da vegetação também contribuem. A precipitação que atinge a superfície pode infiltrar no solo ou escoar por sobre o solo até atingir um curso d’água. A água que infiltra umedece o solo, alimenta os aqüíferos e cria o fluxo de água subterrânea. O ciclo hidrológico é fechado se considerado em escala global. Em escala regional podem existir alguns sub-ciclos. Por exemplo, a água precipitada que está escoando em um rio pode evaporar, condensar e novamente precipitar antes de retornar ao oceano. A energia que movimenta o ciclo hidrológico é fornecida pelo sol. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 11111111 Figura 1. 1: O ciclo hidrológico. A água também sofre alterações de qualidade ao longo das diferentes fases do ciclo hidrológico. A água salgada do mar é transformada em água doce pelo processo de evaporação. A água doce que infiltra no solo dissolve os sais aí encontrados e a água que escoa pelos rios carrega estes sais para os oceanos, bem como um grande número de outras substâncias dissolvidas e em suspensão. Exercícios 1) Mostre que o calor latente de vaporização da água a 100 oC corresponde a mais de cinco vezes a energia necessária para aquecer a água de 0 a 100 oC. 2) Calcule o aumento de temperatura médio da água em uma piscina com 100 m2 de área e 2 m de profundidade devido à absorção de radiação de 7 MJ.dia-1. Considere que a temperatura inicial é de 20 oC, e que não existem perdas de calor na água da piscina. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A Bacia hidrográfica e balanço hídrico o ponto de vista da hidrologia da engenharia, ou da engenharia hidrológica, o ciclo hidrológico é normalmente estudado com maior interesse na fase terrestre, onde o elemento fundamental da análise é a bacia hidrográfica. A bacia hidrográfica é a área de captação natural dos fluxos de água originados a partir da precipitação, que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, denominado exutório. A definição de uma bacia hidrográfica requer a definição de um curso d’água, de um ponto ou seção de referência ao longo deste curso d’água e de informações sobre o relevo da região. Uma bacia hidrográfica pode ser dividida em sub-bacias e cada uma das sub-bacias pode ser considerada uma bacia hidrográfica. A bacia hidrográficapode ser considerada como um sistema físico sujeito a entradas de água (eventos de precipitação) que gera saídas de água (escoamento e evapotranspiração). A bacia hidrográfica transforma uma entrada concentrada no tempo (precipitação) em uma saída relativamente distribuída no tempo (escoamento). As características fundamentais de uma bacia que dependem do relevo são: • Área • Comprimento da drenagem principal • Declividade A área é um dado fundamental para definir a potencialidade hídrica de uma bacia, uma vez que a bacia é a região de captação da água da chuva. Assim, a área da bacia multiplicada pela lâmina precipitada ao longo de um intervalo de tempo define o volume de água recebido ao longo deste intervalo de tempo. A área de uma bacia hidrográfica pode ser estimada a partir da delimitação dos divisores da bacia em um mapa topográfico. Capítulo 3 D I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 13131313 Um exemplo de bacia delimitada é apresentado na Figura 3. 1. A bacia delimitada corresponde à bacia do Arroio Quilombo, próximo a Lomba Grande e Novo Hamburgo, até a seção que corresponde a ponte da estrada vicinal indicada no mapa. O divisor de águas apresentado como uma linha pontilhada separa as regiões do mapa em que a água da chuva vai escoar até a seção da ponte das regiões em que a água da chuva não vai escoar até esta seção. O divisor de águas passa, em geral, pelas regiões mais elevadas do entorno do Arroio Quilombo e de seus afluentes, mas não necessariamente inclui os pontos mais elevados do terreno. O divisor de águas intercepta a rede de drenagem em apenas um ponto, que corresponde ao exutório da bacia (no exemplo é a seção da ponte). Figura 3. 1: Exemplo de uma bacia hidrográfica delimitada sobre um mapa topográfico. A área da bacia pode ser medida através de um instrumento denominado planímetro ou utilizando representações digitais da bacia em CAD ou em Sistemas de Informação Geográfica. Tempo de concentração é o tempo que uma gota de chuva que atinge a região mais remota da bacia leva para atingir o exutório. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 14141414 O comprimento da drenagem principal é uma característica fundamental da bacia hidrográfica porque está relacionado ao tempo de viagem da água ao longo de todo o sistema. O tempo de viagem da gota de água da chuva que atinge a região mais remota da bacia até o momento em que atinge o exutório é chamado de tempo de concentração da bacia. A declividade média da bacia e do curso d’água principal também são características que afetam diretamente o tempo de viagem da água ao longo do sistema. O tempo de concentração de uma bacia diminui com o aumento da declividade. A equação de Kirpich, apresentada abaixo, pode ser utilizada para estimativa do tempo de concentração de pequenas bacias: 385,0 3 57 ∆ ⋅= h L tc onde tc é o tempo de concentração em minutos; L é o comprimento do curso d’água principal em km; e ∆h é a diferença de altitude em metros ao longo do curso d’água principal. A equação de Kirpich, apresentada acima, foi desenvolvida empiricamente a partir de dados de bacias pequenas (menores do que 0,5 Km2). Para estimar o tempo de concentração de bacias maiores pode ser utilizada a equação de Watt e Chow, publicada em 1985 (Dingman, 2002): 79,0 5,0 68,7 ⋅= S L tc onde tc é o tempo de concentração em minutos; L é o comprimento do curso d’água principal em Km; e S é a declividade do rio curso d’água principal (adimensional). Esta equação foi desenvolvida com base em dados de bacias de até 5840 Km2. Outras características importantes da bacia Os tipos de solos, a geologia, a vegetação e o uso do solo são outras características importantes da bacia hidrográfica que não estão diretamente relacionadas ao relevo. Os tipos de solos e a geologia vão determinar em grande parte a quantidade de água precipitada que vai infiltrar no solo e a quantidade que vai escoar superficialmente. A vegetação tem um efeito muito grande sobre a formação do escoamento superficial e sobre a evapotranspiração. O uso do solo pode alterar as características naturais, modificando as quantidades de água que infiltram, que escoam e que evaporam, alterando o comportamento hidrológico de uma bacia. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 15151515 Representação digital de uma bacia hidrográfica Tradicionalmente os estudos de hidrologia estiveram baseados em mapas topográficos para a caracterização de bacias hidrográficas. A partir da década de 1970 a popularização dos computadores permitiu que fossem criadas formas de representar o relevo digitalmente, permitindo a armazenagem e processamento de dados topográficos de uma forma prática para análises hidrológicas. Existem três formas principais de representar o relevo em um computador. Em primeiro lugar, o relevo pode ser representado em um computador utilizando linhas digitalizadas representando as curvas de nível. Esta forma de representação é muito útil para a geração de mapas. Em segundo lugar o relevo pode ser representado utilizando faces triangulares inclinadas formadas a partir de três pontos com cotas e coordenadas conhecidas. Esta forma de representação é muito utilizada para ferramentas de visualização em três dimensões do terreno. A Figura 3. 2 apresenta um exemplo de um TIN (Triangular Irregular Network) representando o relevo de uma região. A terceira forma de armazenar dados topográficos é baseada na utilização de uma grade ou matriz em que cada elemento contém um valor que corresponde à altitude local. Esta forma de armazenar dados topográficos, denominada Modelo Digital de Elevação (MDE), é a forma de representação do relevo mais utilizada para extrair informações úteis para estudos hidrológicos. Para a visualização, as altitudes são convertidas em cores, ou níveis de cinza. Um MDE pode ser obtido a partir da digitalização e interpolação de mapas em papel, através da interpolação de dados obtidos em levantamentos topográficos de campo (GPS); ou com sensores remotos, a bordo de aviões ou satélites. Uma característica fundamental de um MDE é sua resolução espacial, que corresponde ao tamanho do elemento em unidades reais do terreno. Um MDE de alta resolução de uma bacia urbana poderia ter uma resolução espacial de 2m. Isto significa que cada célula representaria um quadrado de 2 m por 2 m de extensão. Em grandes bacias rurais não há necessidade de informações tão detalhadas, neste caso um MDE de resolução espacial de 100 m seria, em geral, adequado. Figura 3. 2: Representação digital do terreno através de triângulos (TIN). W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 16161616 Utilizando um MDE é possível identificar, para cada elemento da matriz, qual é a direção preferencial de escoamento. Admite-se que a água deve escoar de uma célula para uma das oito células vizinhas, de acordo com o critério de maior declividade. Este cálculo é repetido para todas as células de uma matriz. O resultado é uma nova matriz em que cada célula recebe um valor que é um código de direção de escoamento. A partir da matriz com os códigos de direção de escoamento é possível definir os divisores de uma bacia hidrográfica automaticamente. Contando o número de células existentes dentro de uma bacia delimitada é possível calcular a área da bacia. A Figura 3. 4 apresenta as direções de escoamento da água sobre um terreno representado na forma de uma grade, ou matriz, com altitudes indicadas em cada célula. Figura 3. 3: Representação do relevo na forma de uma matriz (MDE) com sobreposição de curvas de nível de separadas por 10 m. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 17171717 Figura 3. 4: Determinação das direções de escoamento sobre o relevo representado na forma de uma grade (Modelo Digital de Elevação):a) altitudes; b) códigos utilizados para definir as direções de fluxo; c) grade com direções de fluxo codificadas; d) grade com direções de fluxo indicadas por setas. Supondo que o objetivo da análise seja determinar a área da bacia a montante da célula localizada na penúltima linha e na penúltima coluna, conforme indicado na Figura 3. 5, seria fácil identificar as células que conduzem a água até este local, simplesmente analisado as direções das setas. Este tipo de procedimento pode ser automatizado em um programa de computador, permitindo a análise de bacias muito mais complexas. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 18181818 a) b) Figura 3. 5: Delimitação de uma bacia hidrográfica sobre uma grade com direções de fluxo calculadas a partir do MDE. A figura da esquerda mostra a célula definida como o exutório da bacia. A figura da direita mostra a área da bacia até este exutório. A representação do relevo em grade obviamente resulta numa aproximação da forma real que pode conduzir a erros. A Figura 3. 6 mostra a diferença entre o contorno de uma bacia hidrográfica real e o contorno aproximado para duas resoluções espaciais diferentes. Observa-se que quanto maior a resolução espacial, menores os quadrados e melhor é a aproximação do contorno real da bacia. Figura 3. 6: Aproximação do contorno real de uma bacia hidrográfica sobre uma grade de (a) baixa resolu;cão e (b) alta resolução espacial. (a região hachurada é a área da bacia real e a linha escura apresenta o contorno aproximado sobre a grade regular). Exemplo 1) Determine as direções de escoamento para as células do MDE da figura abaixo, considerando que a resolução espacial é de, aproximadamente, 90 x 90 m e que as altitudes estão em metros. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 19191919 Começamos considerando que as células do contorno drenam para o interior da figura. Assim, para a primeira célula (canto superior esquerdo) é necessário definir qual é a direção de maior declividade. A altitude da primeira célula é de 355 m. A altitude da célula localizada ao leste é de 359m, o que significa que a água não pode escoar para o leste. As duas células localizadas ao sul e a sudeste apresentam altitudes mais baixas. A declividade a partir da primeira célula para o sul pode ser calculada por: 0778,0 90 348355 = − =S A declividade a partir da primeira célula para o sudeste pode ser calculada por (considera-se que a distância no sentido diagonal é igual à resolução vezes a raiz de 2): 0864,0 290 344355 = ⋅ − =S Portanto a direção de fluxo na primeira célula (canto superior esquerdo) é para sudeste. Este procedimento é repetido para cada uma das células. Para as células centrais é preciso calcular a declividade para um número maior de vizinhas antes de escolher a direção de maior declividade. A figura abaixo mostra o MDE original e as direções de fluxo determinadas para todas as células. Num SIG pode-se utilizar a capacidade do computador para representar bacias hidrográficas de forma bastante detalhada. Um modelo digital de elevação obtido durante uma missão do ônibus espacial da NASA está disponível gratuitamente na Internet. Este MDE, denominado SRTM (sigla para Shuttle Radar Topography W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 20202020 Mission), apresenta uma resolução espacial de cerca de 90 m, e pode ser no endereço http://srtm.csi.cgiar.org/. Uma versão deste MDE com alguns produtos derivados para aplicações em hidrologia é denominada Hydrosheds, e é distribuída no sítio http://hydrosheds.cr.usgs.gov/. No Brasil, o Laboratório de Geoprocessamento do Centro de Ecologia da UFRGS (http://www.ecologia.ufrgs.br/labgeo/SRTM_BR.php) disponibiliza um MDE para cada um dos estados brasileiros, obtido a partir do SRTM, previamente analisado e com alguns erros corrigidos. O MDE do SRTM é adequado para a análise de bacias hidrográficas de escala relativamente grande. Para bacias pequenas bacias urbanas a resolução espacial de 90 m obviamente não é adequada. Além disso, o MDE do SRTM apresenta erros devido à presença de prédios, o que inviabiliza sua aplicação em bacias urbanas. Balanço hídrico numa bacia O balanço entre entradas e saídas de água em uma bacia hidrográfica é denominado balanço hídrico. A principal entrada de água de uma bacia é a precipitação. A saída de água da bacia pode ocorrer por evapotranspiração e por escoamento. Estas variáveis podem ser medidas com diferentes graus de precisão. O balanço hídrico de uma bacia exige que seja satisfeita a equação: QEP dt dV −−= ou, num intervalo de tempo finito: QEP t V −−= ∆ ∆ onde ∆V é a variação do volume de água armazenado na bacia (m3); ∆t é o intervalo de tempo considerado (s); P é a precipitação (m3.s-1); E é a evapotranspiração (m3.s-1); e Q é o escoamento (m3.s-1). I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 21212121 Figura 3. 7: Relevo de uma bacia hidrográfica e as entradas e saídas de água: P é a precipitação; ET é a evapotranspiração e Rs é o escoamento (adaptado de Hornberger et al., 1998). Em intervalos de tempo longos, como um ano ou mais, a variação de armazenamento pode ser desprezada na maior parte das bacias, e a equação pode ser reescrita em unidades de mm.ano-1, o que é feito dividindo os volumes pela área da bacia. QEP += onde P é a precipitação em mm.ano-1; E é a evapotranspiração em mm.ano-1 e Q é o escoamento em mm.ano-1. As unidades de mm são mais usuais para a precipitação e para a evapotranspiração. Uma lâmina de 1 mm de chuva corresponde a um litro de água distribuído sobre uma área de 1 m2. O percentual da chuva que se transforma em escoamento é chamado coeficiente de escoamento de longo prazo e é dado por: P Q C = O coeficiente de escoamento tem, teoricamente, valores entre 0 e 1. Na prática os valores vão de 0,05 a 0,5 para a maioria das bacias. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 22222222 A Tabela 3. 1 apresenta dados de balanço hídrico para as grandes bacias brasileiras, de acordo com dados da Agência Nacional da Água (ANA). A região do Rio Grande do Sul está contida nas bacias do rio Uruguai e na bacia do Atlântico Sul, onde a precipitação média é de 1699 e 1481 mm por ano, respectivamente. Na bacia do rio Uruguai o escoamento é de 716 mm por ano, o que corresponde a 4040 m3.s-1 de vazão média nesta bacia, que tem área de 178.000 km2. Na bacia do Atlântico Sul, em que está inserida a bacia do rio Guaíba, o escoamento é de 643 mm por ano, enquanto a evapotranspiração, que completa o balanço, é de 838 mm por ano. O coeficiente de escoamento nas duas bacias é um pouco superior a 40%, o que significa que cerca de 40% da chuva é transformada em vazão, enquanto 60% retorna à atmosfera pelo processo de evapotranspiração. Tabela 3. 1: Características de balanço hídrico das grandes regiões hidrográficas do Brasil (valores em mm correspondem às laminas médias precipitadas, escoadas e evaporadas ao longo de um ano). A tabela mostra que a evapotranspiração tende a ser maior nas bacias mais próximas do Equador. Observa-se também que a disponibilidade de água (vazão em mm por ano) é menor na bacia do rio São Francisco e na bacia Atlântico Leste (1) que inclui as regiões mais secas da região Nordeste do Brasil. Leituras adicionais A representação de bacias hidrográficas em ambiente computacional é um assunto muito explorado em livros sobre Sistemas de Informação Geográfica (SIG). Alguns softwares de SIG apresentam ferramentas poderosas para analisar e extrair I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 23232323 informações úteis em hidrologia a partir de um MDE de uma região. Os manuais destes softwares, como ArcGIS e Idrisi podem ser utilizados como consulta adicional. Exemplos 2) Qual seria a vazão de saída de uma bacia completamente impermeável, com área de 60km2, sobuma chuva constante à taxa de 10 mm.hora-1? Cada mm de chuva sobre a bacia de 60km2 corresponde a um volume total de 60.000 m3 lançados sobre a bacia, o que significa que em uma hora são lançados 600.000 m3 de água sobre esta bacia. Como a bacia é impermeável toda a água deve sair pelo exutório a uma vazão constante de 167 m3.s-1. 3) A região da bacia hidrográfica do rio Taquari recebe precipitações médias anuais de 1600 mm. Em Muçum (RS) há um local em que são medidas as vazões deste rio e uma análise de uma série de dados diários ao longo de 30 anos revela que a vazão média do rio é de 340 m3.s-1. Considerando que a área da bacia neste local é de 15.000 Km2, qual é a evapotranspiração média anual nesta bacia? Qual é o coeficiente de escoamento de longo prazo? O balanço hídrico de longo prazo de uma bacia é dado por P = E + Q onde P é a chuva média anual; E é a evapotranspiração média anual e Q é o escoamento médio anual. A vazão média de 340 m3.s-1 em uma bacia de 15.000 km2 corresponde ao escoamento anual de uma lâmina dada por: )m.mm(1000 )m(A )ano.s(365243600)s.m(Q )ano/mm(Q 1 2 113 − −− ⋅ ⋅⋅⋅ = ou )km(A 365246,3 )s.m(Q)ano/mm(Q 2 13 ⋅⋅ = − 1 ano.mm715 15000 365246,3 340)ano/mm(Q − ≅ ⋅⋅ ⋅= e a evapotranspiração é dada por E = P – Q =1600 – 715 = 885 mm.ano-1. O coeficiente de escoamento de longo prazo é dado por C = Q/P = 715/1600 = 0,447. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 24242424 Exercícios 1) Uma bacia de 100 km2 recebe 1300 mm de chuva anualmente. Qual é o volume de chuva (em m3) que atinge a bacia por ano? 2) Uma bacia de 1100 km2 recebe anualmente 1750 mm de chuva, e a vazão média corresponde a 18 m3/s. Calcule a evapotranspiração total desta bacia (em mm/ano). 3) A região da bacia hidrográfica do rio Uruguai recebe precipitações médias anuais de 1700 mm. Estudos anteriores mostram que o coeficiente de escoamento de longo prazo é de 0,42 nesta região. Qual é a vazão média esperada em um pequeno afluente do rio Uruguai numa seção em que a área da bacia é de 230 km2. 4) Considera-se para o dimensionamento de estruturas de abastecimento de água que um habitante de uma cidade consome cerca de 200 litros de água por dia. Qual é a área de captação de água da chuva necessária para abastecer uma casa de 4 pessoas em uma cidade com precipitações anuais de 1400 mm, como Porto Alegre? Considere que a área de captação seja completamente impermeável. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A Água e energia na atmosfera fase atmosférica do ciclo hidrológico é responsável pela redistribuição da água em termos globais. A presença de vapor de água na atmosfera também influencia e é influenciada pela radiação solar. O ar atmosférico O ar atmosférico é uma mistura de gases em que predomina o nitrogênio (78%) e o oxigênio (21%). O vapor de água no ar atmosférico varia até um máximo próximo de 4%. Em percentagens menores o ar atmosférico também contém partículas orgânicas e inorgânicas, que têm um papel fundamental no ciclo hidrológico, pois formam os núcleos de condensação do vapor de água nas nuvens. A maior parte do ar atmosférico e do vapor de água encontra-se na camada mais próxima à superfície, chamada troposfera. Esta camada tem uma espessura de 10 a 12 Km. A temperatura do ar na troposfera é maior ao nível do mar e menor no topo da camada. O gradiente de temperatura é de aproximadamente 6,5 oC a cada quilômetro. Assim, se ao nível do mar a temperatura é de 20 oC, no topo da troposfera a temperatura é de, aproximadamente, -45 oC. Vapor de água no ar atmosférico O ar atmosférico é uma mistura de gases entre os quais está o vapor de água. A máxima quantidade de vapor de água que o ar pode conter é limitada, e é denominada concentração de saturação (ou pressão de saturação). De acordo com lei de Dalton cada gás que compõe uma mistura exerce uma pressão parcial, independente da pressão dos outros gases, igual à pressão que exerceria se fosse o único gás a ocupar o volume. Capítulo 4 A W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 26262626 A pressão de saturação de vapor de água no ar varia com a temperatura do ar, como mostra a Figura 4. 1. Este comportamento segue, aproximadamente, a equação 4.1. + ⋅ ⋅= T T es 3,237 27,17 exp611 (4.1) onde es é a pressão de saturação do vapor no ar em Pascal (Pa) e T é a temperatura do ar em oC. A umidade específica, ou concentração de saturação de vapor de água no ar varia de acordo com a temperatura do ar, como mostra a Erro! Fonte de referência não encontrada.. Observa-se que a concentração máxima de vapor de água no ar a 20 oC é de, aproximadamente, 20 g.m-3. A umidade relativa é a medida do conteúdo de vapor de água do ar em relação ao conteúdo de vapor que o ar teria se estivesse saturado (equação 4.2). Assim, ar com umidade relativa de 100% está saturado de vapor, e ar com umidade relativa de 0% está completamente isento de vapor. sw w 100UR ⋅= em % (4.2) onde UR é a umidade relativa; w é a massa de vapor pela massa de ar e ws é a massa de vapor por massa de ar no ponto de saturação. A umidade relativa também pode ser expressa em termos de pressão parcial de vapor. No ponto de saturação a pressão parcial do vapor corresponde à pressão de saturação do vapor no ar, e a equação 4.2 pode ser reescrita como: se e 100UR ⋅= em % (4.3) onde UR é a umidade relativa; e é a Figura 4. 1: Pressão de saturação do vapor da água no ar em função da temperatura do ar. Figura 4. 2: Relação entre o conteúdo de água no ar no ponto de saturação e a temperatura do ar. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 27272727 pressão parcial de vapor no ar e es é pressão de saturação. A temperatura de ponto de orvalho é definida como a temperatura a qual o ar deve ser resfriado para que atinja o ponto de saturação de vapor. Este processo de resfriamento pode ser identificado como uma linha horizontal na Figura 4. 3. Considere o ar a temperatura (T) de pouco mais de 25 oC e com pressão de vapor (e) próxima de 2 KPa (ponto A na Figura 4. 3). A pressão de saturação do ar nesta situação é identificada pelo ponto B, que mantém a mesma temperatura que o ponto A, e mostra a situação em que o ar estaria saturado de vapor de água. A pressão de vapor no ponto B é es, que é a pressão de saturação de vapor para a temperatura T. O ponto C na Figura 4. 3 é a temperatura de ponto de orvalho (Td), pois representa a temperatura na qual o ar inicialmente no ponto A ficaria saturado de vapor se fosse resfriado. Figura 4. 3: Identificação dos pontos que correspondem à temperatura de ponto de orvalho e à pressão de saturação de vapor no ar para uma dada situação de temperatura e umidade (veja texto). Para uma dada pressão de vapor (e) inferior à pressão de saturação (es), a temperatura de ponto de orvalho pode ser calculada pela equação 4.4 (Dingman, 2002): ( ) ( )e e Td ln00421,00708,0 4926,0ln ⋅− + = (4.4) onde Td está em oC e e em KPa. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 28282828 EXEMPLO 1) Medições em uma estação meteorológica indicam que a temperatura do ar é de 25oC e que a umidade relativa é de 60%. Qual é a pressão parcial de vapor da água nesta temperatura? Qual é a pressão de saturação de vapor nesta temperatura? A pressão de saturação pode ser calculada pela equação 4.1 usando a informação da temperatura do ar. = + ⋅ ⋅= + ⋅ ⋅= 253,237 2527,17 exp611 3,237 27,17 exp611 T T es 3,17 KPa e a pressão parcial de vapor pode ser calculada usando a equação 4.3: = ⋅ = ⋅ =→⋅= 100 60 100 100 ss s eeUR e e e UR 1,90 KPa Portanto a pressão parcial de vapor a esta temperatura e umidade relativa é de 1,9 KPa. Observe que esta situação é parecida com a do ponto A na Figura 4. 3. Radiação solar e balançode energia O sol emite radiação como um corpo negro a 6000 K, numa faixa de comprimentos de onda que vai desde ultravioleta até o infravermelho, com um máximo na faixa da radiação visível. Gases existentes na alta atmosfera bloqueiam a radiação solar nos comprimentos de onda mais longos. Assim, a maior quantidade de energia solar que atinge a Terra no topo da atmosfera está na faixa das ondas curtas. Na atmosfera e na superfície terrestre a radiação solar é refletida e sofre transformações, de acordo com a Figura 4. 4. A radiação solar que atinge o topo da atmosfera dividida pela área do círculo definido pela projeção da Terra no plano (1,28.1014 m2) é de cerca de 1367 W.m-2. Em um balanço de energia médio em toda a atmosfera, parte da energia incidente é refletida pelo ar e pelas nuvens (26%) e parte é absorvida pela poeira, pelo ar e pelas nuvens (19%). Parte da energia que chega a superfície é refletida de volta para o espaço ainda sob a forma de ondas curtas (4% do total de enegia incidente no topo da atmosfera). A energia absorvida pela terra e pelos oceanos contribui para o aquecimento destas superfícies que emitem radiação de ondas longas. Além disso, o aquecimento das superfícies contribui para o aquecimento do ar que está em contato, gerando o fluxo de calor sensível (ar quente). A vaporização da água líquida no solo, nas plantas ou na I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 29292929 superfície e a transferência deste vapor para a atmosfera é o chamado fluxo de calor latente (evaporação). Finalmente, a energia absorvida pelo ar, pelas nuvens e a energia dos fluxos de calor latente e sensível pode retornar ao espaço na forma de radiação de onda longa, fechando o balanço de energia. A Figura 4. 5 apresenta, qualitativamente, a radiação que chega e a que deixa a Terra, de acordo com o comprimento de onda. Espaço Atmosfera Superfície (Terra + Oceanos) R a d ia çã o S o la r in c id e n te 6 re fle tid a pe lo ar 20 re fle tid a p el a s n u ve n s re fle tid a p e la su p e rf íc ie 4 Absorvida na superfície 51 3 Absorvida pelas nuvens Absorvida pelo ar e poeira 16 ondas curtas 21 15 Emitida pela superfície 6 2638 ondas longas Absorvida pelo vapor de H2O e CO2 Fluxo de calor sensível 7 23 Fluxo de calor latente Emitida pelas nuvens Emitida pelo vapor de H2O e CO2 1 0 0 Figura 4. 4: Média global de fluxos de energia na atmosfera da Terra (Dingman, 2002). W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 30303030 5 10 15 20 25 F lu xo d e e n e rg ia Comprimento de onda (µm) Figura 4. 5: Espectro de radiação incidente (entrada) e de saída da Terra (Dingman, 2002). Radiação no topo da atmosfera Devido ao ângulo relativo entre a radiação solar e o plano tangente à Terra, a energia por unidade de área que atinge o topo da atmosfera varia com a latitude e com a época do ano. A Figura 4. 6 apresenta valores de energia recebida por radiação no topo da atmosfera de acordo com a época do ano e a latitude. Os valores são dados em MJ por m2 de área na superfície da Terra, recebidos ao longo de um dia. Observa-se que a energia recebida por unidade de área é maior na região equatorial (latitudes baixas) e menor nas regiões polares (latitudes altas). As regiões escuras mostram a situação em que a Terra não recebe radiação (inverno nas regiões polares). A insolação máxima (horas de sol) em um determinado ponto do planeta, considerando que o céu está sem nuvens, é dada pela equação abaixo. s 24 N ω⋅ π = (4.5) onde N [horas] é a insolação máxima; ωs [radianos] é o ângulo do sol ao nascer (depende da latitude e da época do ano), e é dado por: ( )δ⋅ϕ−=ω tantanarccoss (4.6) onde φ [graus] é a latitude (positiva no hemisfério norte e negativa no hemisfério sul); ωs [radianos] é o ângulo do sol ao nascer; e δ [radianos] é a declinação solar, dada por: −⋅ π⋅ ⋅=δ 405,1J 365 2 sin4093,0 (4.7) I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 31313131 onde δ [radianos] é a declinação solar; J [-] é o dia no calendário Juliano (contado a partir de 1˚ de janeiro). A radiação que atinge o topo da atmosfera também depende da latitude e da época do ano: ( )ssr W TOP sencoscossensend 1000 392,15S ω⋅δ⋅ϕ+δ⋅ϕ⋅ω⋅⋅ λ⋅ρ ⋅= (4.8) onde λ [MJ.kg-1] é o calor latente de vaporização; STOP [MJ.m -2.dia-1] é a radiação no topo da atmosfera; ρW [kg.m -3] é a massa específica da água; δ [radianos] é a declinação solar; φ [graus] é a latitude; ωs [radianos] é o ângulo do sol ao nascer; e dr [-] é a distância relativa da terra ao sol, dada por: ⋅ π⋅ ⋅+= J 365 2 cos033,01d r (4.9) onde J é o dia do calendário Juliano. A equação 4.8 e a apresentam a radiação que atinge o topo da atmosfera, em unidades de energia recebida por dia, por unidade de área da superfície da Terra. EXEMPLO 2) A cidade de Porto Alegre está localizada próxima à latitude 30oS. Use a estimativa do calor latente de vaporização da água, apresentado no capítulo 2, para calcular qual seria a taxa de evaporação diária no mês de agosto nesta cidade se toda a energia incidente no topo da atmosfera fosse utilizada para a evaporação. Na figura anterior pode-se observar que a energia recebida por radiação incidente no topo da atmosfera ao longo de um dia, num local a 30oS, no mês de agosto é de aproximadamente 25 MJ.m-2. Não há uma informação sobre a temperatura em que a água está antes de evaporar, assim, podemos assumir um calor latente de vaporização de 2,53 MJ.Kg-1. Considerando que toda a energia é utilizada para evaporar a água, a taxa de evaporação pode ser calculada por: 2 1 2 .9,9 .53,2 .25 − − − == mKg KgMJ mMJ E Considerando que a massa específica da água é de, aproximadamente, 1 Kg para cada litro, e que 1 litro distribuído sobre 1 m2 corresponde a uma lâmina de 1 mm, a evaporação é de 9,9 mm.dia-1. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 32323232 Figura 4. 6: Energia recebida ao longo de um dia por radiação solar no topo da atmosfera (MJ.m-2) em função da latitude e da época do ano (Dingman, 2002) Radiação através da atmosfera Nem toda a radiação solar que atinge o topo da atmosfera chega até a superfície da Terra. A radiação que atinge o topo da atmosfera é parcialmente refletida pela própria atmosfera, não atingindo a superfície terrestre. As nuvens são as principais responsáveis pela reflexão, e a estimativa da radiação que atinge a superfície terrestre depende da fração de cobertura de nuvens, conforme a abaixo: TOPssSUP S N n baS ⋅ ⋅+= (4.10) I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 33333333 onde N [horas] é a insolação máxima possível numa latitude em certa época do ano; n [horas] é a insolação medida; STOP [MJ.m -2.dia-1] é a radiação no topo da atmosfera; SSUP [MJ.m-2.dia-1] é a radiação na superfície terrestre; as [-] é a fração da radiação que atinge a superfície em dias encobertos (quando n=0); e as + bs [-] é a fração da radiação que atinge a superfície em dias sem nuvens (n=N). Quando não existem dados locais medidos que permitam estimativas mais precisas, são recomendados os valores de 0,25 e 0,50, respectivamente, para os parâmetros as e bs (Shuttleworth, 1993). Balanço de energia na superfície De acordo com a primeira lei da Termodinâmica, a energia recebida por radiação na superfície da Terra deve ser conservada. Pode-se imaginar um volume de controle na superfície da Terra, que envolve a vegetação, como mostra a Figura 4. 7. Neste volume de controle a principal entrada de energia é a radiação líquida (Rn), que é o balanço entre a radiação incidente menos a radiação refletida pela superfície e menos a radiação emitida. As saídas de energia ocorrem na forma de fluxo de calor sensível (H), fluxo de calor latente(E) e fluxo de calor para o solo (G). H λE Rn G S Ao Ai Figura 4. 7: Balanço de energia na superfície Terrestre. A energia solar recebida na forma de radiação (Rn) deve ser igual à soma das energias que deixam o volume de controle e à variação da energia armazenada. A energia líquida disponível para aquecer a superfície, aquecer o ar e vaporizar a água depende da energia irradiada pelo sol, da energia que é refletida ou bloqueada pela atmosfera, da energia que é refletida pela superfície terrestre, da energia que é irradiada pela superfície terrestre e da energia que é transmitida ao solo. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 34343434 A radiação líquida Rn envolve um balanço de radiação de ondas curtas e ondas longas. Nas ondas curtas o balanço é definido pela energia incidente menos refletida, e é normalmente positiva (mais energia entrando do que saindo do volume de controle). Na faixa de ondas longas o balanço de energia é definido pela radiação emitida pela superfície para a atmosfera e pela radiação emitida pela atmosfera para a superfície, e é normalmente negativa (mais energia deixando o volume de controle). Normalmente, as estações climatológicas dispõe de dados de radiação que atinge a superfície terrestre (SSUP), medida com radiômetros, ou do número de horas de insolação (n), medidas com o heliógrafo, ou mesmo da fração de cobertura de nuvens (n/N), estimada por um observador. A estimativa da radiação líquida disponível para evapotranspiração depende do tipo de dados disponível. A situação de estimativa mais simples ocorre quando existem dados medidos de radiação incidente na superfície, normalmente expressos em MJ.m-2.dia-1, ou cal.cm- 2.dia-1. Neste caso, a radiação líquida de ondas curtas é estimada pela equação abaixo: ( )α−⋅= 1SUPnc SR (5.14) onde Rnc [MJ.m -2.s-1] é a radiação líquida de ondas curtas líquida na superfície; SSUP [MJ.m-2.s-1] é a radiação de ondas curtas que atinge a superfície (valor medido ou estimado pela equação 4.10); e α [-] é o albedo, que é a parcela da radiação incidente que é refletida (parâmetro que depende da cobertura vegetal e uso do solo). O albedo de uma superfície depende do tipo de vegetação, do grau de umidade e do ângulo da radiação incidente. Alguns valores aproximados são apresentados na Tabela 4. 1 I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 35353535 Tabela 4. 1: Valores aproximados de albedo de superficies (Brutsaert, 2005). Tipo de superfície Albedo mínimo Albedo máximo Água profunda 0,04 0,08 Solo úmido escuro 0,05 0,15 Solos claros 0,15 0,25 Solos secos 0,20 0,35 Areia branca 0,30 0,40 Grama, vegetação baixa 0,15 0,25 Savana 0,20 0,30 Floresta 0,10 0,25 Neve 0,35 0,90 Quando existem apenas dados de horas de insolação, ou da fração de cobertura de nuvens, a radiação que atinge a superfície terrestre pode ser obtida considerando-a como uma fração da máxima energia, de acordo com a época do ano, a latitude da região, e o tipo de cobertura vegetal ou uso do solo, como mostrado no item anterior. Uma parte da radiação que atinge a superfície terrestre (SSUP) é refletida, conforme já descrito. A maior parte da energia irradiada pelo sol está na faixa de ondas curtas, de 0,3 a 3 µm. O balanço de energia, porém, também inclui uma pequena parcela de radiação de ondas longas, de 3 a 100 µm. O balanço de radiação de ondas longas na superfície terrestre depende, basicamente, de quanta energia é emitida pela superfície terrestre e pela atmosfera. Normalmente, a superfície terrestre é mais quente do que a atmosfera, resultando em um balanço negativo, isto é, há perda de energia na faixa de ondas longas. A equação a seguir descreve a radiação líquida de ondas longas que deixa a superfície terrestre. ( )42,273+⋅⋅⋅= TfRnl σε (5.21) onde Rnl [MJ.m -2.dia-1] é a radiação líquida de ondas longas que deixa a superfície; f [-] é um fator de correção devido à cobertura de nuvens; T [ºC] é a temperatura média do ar a 2 m do solo; ε [-] é a emissividade da superfície; σ [MJ.m-2.ºK-4.dia-1] é uma constante (σ=4,903.10-9 MJ.m-2.ºK-4.dia-1). W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 36363636 A emissividade da superfície pode ser estimada pela equação abaixo. ( )de14,034,0 ⋅−=ε (5.22) onde ed é a pressão parcial de vapor de água no ar [kPa]. O fator de correção da radiação de ondas longas devido à cobertura de nuvens (f) pode ser estimado com base na equação a seguir: N n 9,01,0f ⋅+= (5.23) onde N [horas] é a insolação máxima possível numa latitude em certa época do ano; n [horas] é a insolação medida. Por simplicidade, o fluxo de calor para o solo (G) pode ser considerado nulo. Assim, o balanço de energia na superfície de um dia para outro pode ser dado por : EHRS L −−=∆ (5.24) onde RL é a radiação líquida que entra no volume de controle [MJ.m -2.dia-1]; H é o fluxo de calor sensível [MJ.m-2.dia-1]; E é o fluxo de calor latente [MJ.m-2.dia-1];, e S é a energia armazenada no volume de controle [MJ.m-2]. A radiação líquida total é dada pela radiação líquida de ondas curtas menos a radiação líquida de ondas longas, conforme a equação abaixo: nlncL RRR −= (5.25) O fluxo de calor sensível é o fluxo de calor por convecção, que ocorre porque a superfície se aquece e, assim, aquece o ar atmosférico em contato direto com a superfície. A turbulência provocada pelo vento se encarrega de redistribuir o ar aquecido para camadas mais altas da atmosfera, resultando num fluxo de energia. O fluxo de calor sensível recebe este nome porque está relacionado à temperatura do ar, que pode ser “sentida” (Hornberger et al., 1998). O calor latente é a parte da energia interna que não pode ser “sentida”, ou seja, não está relacionada à temperatura, mas sim ao calor latente de vaporização. O fluxo de calor latente é o fluxo de energia associado ao fluxo de água para camadas mais altas da atmosfera, a partir da superfície. O fluxo de calor latente está, portanto, relacionado ao fluxo de água da superfície para a atmosfera por evapotranspiração. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 37373737 Movimento do ar atmosférico Em conseqüência do aquecimento desigual das diferentes regiões da Terra, gradientes de energia são gerados e provocam o aquecimento diferencial das massas de ar. A ar aquecido tem uma densidade menor e tende a ascender na atmosfera, provocando a circulação das massas de ar (vento). São as massas de ar que transportam a umidade, em grande parte evaporada nos oceanos, para as regiões continentais, onde a precipitação dá início à parte terrestre do ciclo hidrológico. A movimentação do ar atmosférico é o objeto de estudo da Meteorologia e da Climatologia. Leituras adicionais Os capítulos 2 e 3 do livro Handbook of Hydrology apresentam uma visão mais completa sobre a circulação de água e o balanço de energia na atmosfera e na superfície da Terra. A apostila da disciplina de Climatologia, de autoria de Julio Sanchez também aprofunda os processos descritos neste capítulo. O capítulo 3 do livro Physical Hydrology de Dingman (2002) também é excelente. Exercícios 1) Estime a taxa de evaporação da água em mm por dia num local sobre a linha do Equador, no mês de junho, se toda a radiação incidente no topo da atmosfera estivesse disponível para produzir evaporação. 2) Refaça o exercício anterior levando em consideração a atenuação na atmosfera em um dia sem nuvens, e a reflexão da radiação pelo albedo da superfície, mas desprezando o fluxo de calor sensível e o fluxo de calor para o solo e por advecção. 3) Determine a temperatura de ponto de orvalho do ar atmosférico próximo ao nível do mar a 23 C e 70% de umidade relativa. 4) Qual é a diferença percentual da energia incidente no topo da atmosfera na sua cidade no dia de incidência máxima e no dia de incidência mínima ao longo de um ano? I NT R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A Precipitação água da atmosfera que atinge a superfície na forma de chuva, granizo, neve, orvalho, neblina ou geada é denominada precipitação. Na realidade brasileira a chuva é a forma mais importante de precipitação, embora grandes prejuízos possam advir da ocorrência de precipitação na forma de granizo e em alguns locais possa eventualmente ocorrer neve. Importância da precipitação Conforme mencionado quando abordado o assunto balanço hídrico, a precipitação é a única forma de entrada de água em uma bacia hidrográfica. Assim sendo, ela fornece subsídios para a quantificação do abastecimento de água, irrigação, controle de inundações, erosão do solo, etc., e é fundamental para o adequado dimensionamento de obras hidráulicas, entre outros. A chuva é a causa mais importante dos processos hidrológicos de interesse da engenharia e é caracterizada por uma grande aleatoriedade espacial e temporal. Formação das chuvas A água existente na atmosfera está, em sua maior parte, na forma de vapor. A quantidade de vapor que o ar pode conter é limitada. Ar a 20º C pode conter uma quantidade máxima de vapor de, aproximadamente, 20 gramas por metro cúbico. Quantidades de vapor superiores a este limite acabam condensando. A quantidade máxima de vapor que pode ser contida no ar sem condensar é a concentração de saturação. Uma característica muito importante da concentração de saturação é que ela aumenta com o aumento da temperatura do ar. Assim, ar mais Capítulo 5 A I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 39393939 quente pode conter mais vapor do que ar frio. A figura a seguir apresenta a variação da concentração de saturação de vapor no ar com a temperatura. Observa-se que o ar a 10º C pode conter duas vezes mais vapor do que o ar a 0º C. O ar atmosférico apresenta um forte gradiente de temperatura, com temperatura relativamente alta junto à superfície e temperatura baixa em grandes altitudes. O processo de formação das nuvens de chuva está associado ao movimento ascendente de uma massa de ar úmido. Neste processo a temperatura do ar vai diminuindo até que o vapor do ar começa a condensar. Isto ocorre porque a quantidade de água que o ar pode conter sem que ocorra condensação é maior para o ar quente do que para o ar frio. Quando este vapor se condensa, pequenas gotas começam a se formar, permanecendo suspensas no ar por fortes correntes ascendentes e pela turbulência. Porém, em certas condições, as gotas das nuvens crescem, atingindo tamanho e peso suficiente para vencer as correntes de ar que as sustentam. Nestas condições, a água das nuvens se precipita para a superfície da Terra, na forma de chuva. Figura 5. 1: Relação entre a temperatura e o conteúdo de vapor de água no ar na condição de saturação. A formação das nuvens de chuva está, em geral, associada ao movimento ascendente de massas de ar úmido. A causa da ascensão do ar úmido é considerada para diferenciar os principais tipos de chuva: frontais, convectivas ou orográficas. Chuvas frontais As chuvas frontais ocorrem quando se encontram duas grandes massas de ar, de diferente temperatura e umidade. Na frente de contato entre as duas massas o ar mais quente (mais leve e, normalmente, mais úmido) é empurrado para cima, onde atinge W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 40404040 temperaturas mais baixas, resultando na condensação do vapor. As massas de ar que formam as chuvas frontais têm centenas de quilômetros de extensão e movimentam se de forma relativamente lenta, conseqüentemente as chuvas frontais caracterizam-se pela longa duração e por atingirem grandes extensões. No Brasil as chuvas frontais são muito freqüentes na região Sul, atingindo também as regiões Sudeste, Centro Oeste e, por vezes, o Nordeste. Chuvas frontais têm uma intensidade relativamente baixa e uma duração relativamente longa. Am alguns casos as frentes podem ficar estacionárias, e a chuva pode atingir o mesmo local por vários dias seguidos. Figura 5. 2: Tipos de formação de chuvas. Chuvas orográficas As chuvas orográficas ocorrem em regiões em que um grande obstáculo do relevo, como uma cordilheira ou serra muito alta, impede a passagem de ventos quentes e úmidos, que sopram do mar, obrigando o ar a subir. Em maiores altitudes a umidade do ar se condensa, formando nuvens junto aos picos da serra, onde chove com muita freqüência. As chuvas orográficas ocorrem em muitas regiões do Mundo, e no Brasil são especialmente importantes ao longo da Serra do Mar. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 41414141 Chuvas convectivas As chuvas convectivas ocorrem pelo aquecimento de massas de ar, relativamente pequenas, que estão em contato direto com a superfície quente dos continentes e oceanos. O aquecimento do ar pode resultar na sua subida para níveis mais altos da atmosfera onde as baixas temperaturas condensam o vapor, formando nuvens. Este processo pode ou não resultar em chuva, e as chuvas convectivas são caracterizadas pela alta intensidade e pela curta duração. Normalmente, porém, as chuvas convectivas ocorrem de forma concentrada sobre áreas relativamente pequenas. No Brasil há uma predominância de chuvas convectivas, especialmente nas regiões tropicais. Os processos convectivos produzem chuvas de grande intensidade e de duração relativamente curta. Problemas de inundação em áreas urbanas estão, muitas vezes, relacionados às chuvas convectivas. Medição da chuva A chuva é medida utilizando instrumentos chamados pluviômetros que nada mais são do que recipientes para coletar a água precipitada com algumas dimensões padronizadas. O pluviômetro mais utilizado no Brasil tem uma forma cilíndrica com uma área superior de captação da chuva de 400 cm2, de modo que um volume de 40 ml de água acumulado no pluviômetro corresponda a 1 mm de chuva. O pluviômetro é instalado a uma altura padrão de 1,50 m do solo (Figura 5. 3) e a uma certa distância de casas, árvores e outros obstáculos que podem interferir na quantidade de chuva captada. Nos pluviômetros da rede de observação mantida pela Agência Nacional da Água (ANA) no Brasil, a medição da chuva é realizada uma vez por dia, sempre às 7:00 da manhã, por um observador que anota o valor lido em uma caderneta. A ANA tem uma rede de 2473 estações pluviométricas distribuídos em todo o Brasil. Além da ANA existem outras instituições e empresas que mantém pluviômetros, como o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), empresas de geração de energia hidrelétrica e empresas de Figura 5. 3: Características de um pluviômetro de leitura manual. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 42424242 pesquisa agropecuária. No banco de dados da ANA (www.hidroweb.ana.gov.br) estão cadastradas 14189 estações pluviométricas de diversas entidades, mas apenas 8760 estão em atividade atualmente (2007). Existem pluviômetros adaptados para realizar medições de forma automática, registrando os dados medidos em intervalos de tempo inferiores a um dia. São os pluviógrafos, que originalmente eram mecânicos, utilizavam uma balança para pesar o peso da água e um papel para registrar o total precipitado. Os pluviógrafos antigos com registro em papel foram substituídos, nos últimos anos, por pluviógrafos eletrônicos com memória (data-logger). O pluviógrafo mais comum atualmente é o de cubas basculantes, em que a água recolhida é dirigida para um conjunto de duas cubas articuladas por um eixo central. A água é dirigida inicialmente para uma das cubas e quando esta cuba recebe uma quantidade de água equivalente a 20 g, aproximadamente, o conjunto báscula em torno do eixo, a cuba cheia esvazia e a cuba vazia começa a receber água. Cada movimento das cubas basculantes equivale a uma lâmina precipitada (por exemplo 0,25 mm), e o aparelho registra o número de movimentos e o tempo em queocorre cada movimento. A principal vantagem do pluviógrafo sobre o pluviômetro é que permite analisar detalhadamente os eventos de chuva e sua variação ao longo do dia. Além disso, o pluviógrafo eletrônico pode ser acoplado a um sistema de transmissão de dados via rádio ou telefone celular. A chuva também pode ser estimada utilizando radares meteorológicos. A medição de chuva por radar está baseada na emissão de pulsos de radiação eletromagnética que são refletidos pelas partículas de chuva na atmosfera, e na medição do da intensidade do sinal refletido. A relação entre a intensidade do sinal enviado e recebido, denominada refletividade, é correlacionada à intensidade de chuva que está caindo em uma região. A principal vantagem do radar é a possibilidade de fazer estimativas de taxas de precipitação em uma grande região no entorno da antena emissora e receptora, embora existam erros consideráveis quando as estimativas são comparadas com dados de pluviógrafos. No Brasil são poucos os radares para uso meteorológico, com a exceção do Estado de São Paulo em que existem alguns em operação. Em alguns países, como os EUA, a Inglaterra e a Alemanha, já existe uma cobertura completa com sensores de radar para estimativa de chuva. Também é possível fazer estimativas da precipitação a partir de imagens obtidas por sensores instalados em satélites. A temperatura do topo das nuvens, que pode ser estimada a partir de satélites, tem uma boa correlação com a precipitação. Além disso, existem experimentos de radares a bordo de satélites que permitem aprimorar a estimativa baseada em dados de temperatura de topo de nuvem. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 43434343 Análise de dados de chuva As variáveis que caracterizam a chuva são a sua altura (lâmina precipitada), a intensidade, a duração e a freqüência. Duração é o período de tempo durante o qual a chuva cai. Normalmente é medida em minutos ou horas. A altura é a espessura média da lâmina de água que cobriria a região atingida se esta região fosse plana e impermeável. A unidade de medição da altura de chuva é o milímetro de chuva. Um milímetro de chuva corresponde a 1 litro de água distribuído em um metro quadrado. Intensidade é a altura precipitada dividida pela duração da chuva, e é expressa, normalmente, em mm.hora-1. Freqüência é a quantidade de ocorrências de eventos iguais ou superiores ao evento de chuva considerado. Chuvas muito intensas tem freqüência baixa, isto é, ocorrem raramente. Chuvas pouco intensas são mais comuns. A Tabela 5. 1 apresenta a análise de freqüência de ocorrência de chuvas diárias de diferentes intensidades ao longo de um período de 23 anos em uma estação pluviométrica no interior do Paraná. Observa- se que ocorreram 5597 dias sem chuva (P = zero) no período total de 8279 dias, isto é, em 67% dos dias do período não ocorreu chuva. Em pouco mais de 17% dos dias do período ocorreram chuvas com intensidade baixa (menos do que 10 mm). A medida em que aumenta a intensidade da chuva diminui a freqüência de ocorrência. A variável utilizada na hidrologia para avaliar eventos extremos como chuvas muito intensas é o tempo de retorno (TR), dado em anos. O tempo de retorno é uma estimativa do tempo em que um evento é igualado ou superado, em média. Por exemplo, uma chuva com intensidade equivalente ao tempo de retorno de 10 anos é igualada ou superada somente uma vez a cada dez anos, em média. Esta última ressalva “em média” implica que podem, eventualmente, ocorrer duas chuvas de TR 10 anos em dois anos subseqüentes. O Tempo de Retorno é igual ao inverso da probabilidade. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 44444444 Tabela 5. 1: Freqüência de ocorrência de chuvas diárias de diferentes alturas em um posto pluviométrico no interior do Paraná ao longo de um período de, aproximadamente, 23 anos. O tempo de retorno pode, também, ser definido como o inverso da probabilidade de ocorrência de um determinado evento em um ano qualquer. Por exemplo, se a chuva de 130 mm em um dia é igualada ou superada apenas 1 vez a cada 10 anos diz-se que seu Tempo de Retorno é de 10 anos, e que a probabilidade de acontecer um dia com chuva igual ou superior a 130 mm em um ano qualquer é de 10%, ou seja: eobabilidadPr 1 TR = Variabilidade espacial da chuva Os dados de chuva dos pluviômetros e pluviógrafos referem-se a medições executadas em áreas muito restritas (400 cm2), quase pontuais. Porém a chuva caracteriza-se por uma grande variabilidade espacial. Assim, durante um evento de chuva um pluviômetro pode ter registrado 60 mm de chuva enquanto um outro pluviômetro, a 30 km de distância registrou apenas 40 mm para o mesmo evento. Isto ocorre porque Bloco Freqüência P = zero 5597 P < 10 mm 1464 10 < P < 20 mm 459 20 < P < 30 mm 289 30 < P < 40 mm 177 40 < P < 50 mm 111 50 < P < 60 mm 66 60 < P < 70 mm 38 70 < P < 80 mm 28 80 < P < 90 mm 20 90 < P < 100 mm 8 100 < P < 110 mm 7 110 < P < 120 mm 2 120 < P < 130 mm 5 130 < P < 140 mm 2 140 < P < 150 mm 1 150 < P < 160 mm 1 160 < P < 170 mm 1 170 < P < 180 mm 2 180 < P < 190 mm 1 190 < P < 200 mm 0 P > 200 mm 0 Total 8279 I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 45454545 a chuva apresenta uma grande variabilidade espacial, principalmente se é originada por um processo convectivo. A forma de representar a variabilidade espacial da chuva para um evento, para um ano inteiro de dados ou para representar a precipitação média anual ao longo de um período de 30 anos são as linhas de mesma precipitação (isoietas) desenhadas sobre um mapa. As isoietas são obtidas por interpolação dos dados de pluviômetros ou pluviógrafos e podem ser traçadas de forma manual ou automática. A Figura 5. 4 apresenta um mapa de isoietas de chuva média anual do Estado de São Paulo, com base em dados de 1943 a 1988. Observa-se que a chuva média anual sobre a maior parte do Estado é da ordem de 1300 a 1500 mm por ano, mas há uma região próxima ao litoral com chuvas anuais de mais de 3000 mm por ano. As regiões onde as isoietas ficam muito próximas entre si é caracterizada por uma grande variabilidade espacial. Variabilidade sazonal da chuva Um dos aspectos mais importantes do clima e da hidrologia de uma região é a época de ocorrência das chuvas. Existem regiões com grande variabilidade sazonal da chuva, com estações do ano muito secas ou muito úmidas. Na maior parte do Brasil o verão é o período das maiores chuvas. No Rio Grande do Sul, entretanto, a chuva é relativamente bem distribuída ao longo de todo o ano (em média). Isto não impede, entretanto, que em alguns anos ocorram invernos ou verões extremamente secos ou extremamente úmidos. A variabilidade sazonal da chuva é representada por gráficos com a chuva média mensal, como o apresentado na Figura 5. 5 para Porto Alegre e para Cuiabá. Observa- se que no Sul do Brasil existe uma distribuição mais homogênea das chuvas ao longo do ano, enquanto no Centro-Oeste ocorrem verões muito úmidos e invernos muito secos. W . C O L L I S C H O N N – I P H - U F R G S 46464646 Figura 5. 4: Exemplo de representação da variabilidade especial da chuva com um mapa de isoietas. Figura 5. 5: Variabilidade sazonal da chuva em Porto Alegre e Cuiabá, representada pelas chuvas médias mensais no período de 1961 a 1990. I N T R O D U Z I N D O H I D R O L O G I A 47474747 Chuvas médias numa área Os dados de chuva dos pluviômetros e pluviógrafos referem-se a uma área de coleta de 400 cm2, ou seja, quase pontual. Porém, o maior interesse na hidrologia é por chuvas médias que atingem uma região, como a bacia hidrográfica. O cálculo da chuva média em uma bacia pode ser realizado utilizando o método da média aritmética; das Isoietas; dos polígonos de Thiessen ou através de interpolação em Sistemas de Informação Geográfica