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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Instituto de Educação Superior Anísio Teixeira
Licenciatura em Pedagogia
RELAÇÃO FAMÍLIA-ESCOLA: contribuições no processo ensino-aprendizagem em uma escola de Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte
Altamir de Souza
Cíntia Aparecida Carvalho
Thaynara Cláudia Matosinhos dos Santos
Ibirité 
2018
Altamir de Souza
Cíntia Aparecida Carvalho
Thaynara Cláudia Matosinhos dos Santos
RELAÇÃO FAMÍLIA-ESCOLA: contribuições no processo ensino-aprendizagem em uma escola de Educação Infantil da Rede Municipal de Belo Horizonte
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade do Estado de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Licenciado em Pedagogia.
Orientadora: Profa. Msc. Eliane da Silva Machado
Ibirité
2018
Dedicamos este trabalho de conclusão de curso a todos os nossos familiares que entenderam os momentos em que nos afastamos para nos dedicarmos a realização deste.
 Agradecimentos
O nosso sincero agradecimento a Deus e aos nossos familiares que estiveram ao nosso lado durante todo o curso. Agradecemos á professora Ludmila Salomão que nos auxíliou pacientemente durante a realização do projeto de pesquisa e deste trabalho de conclusão de curso.
Ao corpo docente da Universidade do Estado de Minas Gerais Unidade Ibirité que durante estes três anos de curso contribuíram para nossa formação acadêmica e pessoal. Aos amigos que fizemos durante o curso e levaremos para sempre em nossas lembranças. Por fim, agradecemos a todos que de alguma forma contribuíram para a realização deste sonho.
Quando o Senhor trouxe do cativeiro os que voltaram a Sião, estávamos como os que sonham. Então, a nossa boca encheu-se de riso e nossa língua de júbilo. Então se dizia entre os povos: grandes coisas fez o Senhor a estes. Grandes coisas fez o Senhor por nós, e por isso estamos alegres.  [footnoteRef:1] [1: Salmos 126, versos 1, 2 e 3. Bíblia Sagrada Edição Revista e Corrigida, 1995] 
RESUMO
A família e a escola são as principais agências de formação do sujeito, participam de formas diferentes deste processo, porém com objetivos entrelaçados. A família é a mediadora do primeiro contato da criança com a cultura vigente. O que diferencia as atribuições da família para as demais agências reguladoras é a carga afetiva característica das relações por ela desenvolvidas. A escola é a mediadora entre a sociedade e o conhecimento sistematizado e como tal assume ganha notoriedade sobre as demais. Porém, o distanciamento entre as duas instituições, culmina em lacunas irreparáveis para o sujeito. Portanto, mecanismos de interação entre elas fazem-se necessários. É inegável que a escola e a família compreendem a importância da participação e interação das duas para que a educação do sujeito possibilite o desenvolvimento cognitivo, social e afetivo. No entanto, entender como esta relação se consolidará é primordial para a efetivação do projeto educacional. Como a escola propícia a participação dos pais? Como os pais concebem o trabalho realizado pela escola? Estas são questões que somente a observação das especificidades das duas instituições poderá responder. Este trabalho pretende abordar a contribuição da relação família escola para a formação do sujeito levando em consideração os aspectos históricos, sociais e legais de ambas as instituições.
Palavras-chave: Escola. Família. Relação família-escola.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
	ART
	Artigo
	BNCC
	Base Nacional Comum Curricular
	ECA
	Estatuto da Criança e do Adolescente
	EDH
	Educação em Direitos Humanos
	EI
	Educação Infantil
	LDB
	Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
	PNE
	Plano Nacional de Educação
	PPP
	Projeto Político Pedagógico
	UEMG
	Universidade do Estado de Minas Gerais
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO	9
2 FAMÍLIA: A PRIMEIRA AGÊNCIA CULTURAL	14
1.1	Família	14
1.2	Conceito histórico	14
1.3	Contexto social	28
1.4	Contexto Legal	33
3.	CONTEXTO HISTÓRICO, SOCIAL E LEGAL: A EVOLUÇÃO DA ESCOLA COMO REPRESENTANTE DO SABER	43
3.1	Contexto Histórico	43
3.2	Contexto Social: a escola como agente socializador e detentor do saber sistematizado	51
3.3	Contexto legal	58
4.	EDUCAÇÃO INFANTIL	70
5.	INTERAÇÃO FAMÍLIA – ESCOLA	81
6.	PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS	92
7.	ANÁLISE DE DADOS	94
REFERÊNCIAS	106
APÊNDICES	113
Apêndice A- Roteiro de entrevista Gestores	113
Apêndice B – Roteiro de entrevista pais e ou responsáveis	114
INTRODUÇÃO
Não há como pensar a formação e a educação da criança sem lançar um olhar sobre suas raízes, sobre seu primeiro contato com a cultura da qual será mais um integrante. A família é a instituição responsável por esta apresentação. É através dela que a criança será introduzida aos costumes, às regras, aos valores morais e religiosos. Inicialmente não há como fugir aos padrões estabelecidos pelos adultos daquele clã. Intuitivamente a família já responde a sua primeira obrigação social. Para Oliveira e Marinho-Araújo (2010) a família é a primeira agência educacional do ser humano e, como tal, é responsável, principalmente, pela forma como o sujeito se relaciona com o mundo. Portanto, a personalidade, sobretudo dos pequenos, terá características predominantes de seus progenitores, através de relações intrínsecas ao convívio familiar que se desenrolam sem planejamento prévio, mas que indicam a que esfera social aquele núcleo está inserido. Mesmo que pareça ser a esfera mais pessoal da sociedade, a família não irá fugir as características comuns ao seu meio. Até mesmo pelo processo de evolução histórica e social pelo qual vem passando, ela irá influenciar a sociedade da qual participa da mesma forma que trará sobre si as vicissitudes exteriores.
A família, segundo Barbosa (1948) é a célula mater da sociedade, o receptor/produtor dos processos sociais, a interdependência com a sociedade é tamanha que, se analisada a parte, ela não fará sentido. Portanto, reduzir a importância de tal instituição à criação dos filhos apenas ou pensa-la da maneira reducionista da díade nuclear padrão, é ignorar os muitos processos que permearam as transformações das relações familiares/sociais até que o afeto pudesse ser considerado o principal caracterizador da família. Conceber a unidade familiar através das relações de afeto que ocorrem no seio familiar é permitir que muitos outros modelos de família surjam e participem da sociedade, assim como as famílias tidas como tradicionais, respaldada pelos direitos e deveres de todo cidadão.
Porém, apesar de toda a importância e esforço da família, o processo formativo é amplo a ponto de não se limitar apenas aos ensinamentos familiares. Sobretudo nas sociedades mais complexas, o desenvolvimento social impôs a necessidade de uma instituição que fosse capaz de agregar à educação familiar aquilo que esta já não era mais capaz de compartilhar, o conhecimento sistematizado necessário à evolução da sociedade como uma organização divida por classes (LUCKESI,1994). A escola, portanto, surge para atender a uma demanda específica; participar da formação, juntamente com a família, das gerações mais novas, preparando-as para a vida em sociedades.
Para Saviani (1999) a escola é a responsável pelo compartilhamento do saber científico, pelos saberes estruturados empiricamente necessários ao desenvolvimento social e que não podem ser delegados a outras instituições, cabe a escola participar da construção e propagação destes conhecimentos. Porém, assim como a família, a escola também vem passando por inúmeras e profundas transformações, sofrendo, inclusive, impactos contundentes gerados pelas alterações familiares.
Posto isto e estando as duas instituições participando do processo de formação, não há como não desenvolver uma relação de parceria. Essa parceria, família-escola, acompanha as transformações que acontecem no seio dasduas instituições, e vivência estas mudanças ora se aproximado, ora se afastando, mas jamais deixando de existir, até mesmo pelos objetivos de ambas, que são distintos, todavia, se entrelaçam (OLIVEIRA, MARINHO- ARAÚJO, 2010). Entender que a relação entre família escola contribui para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança (POLONIA; DESSEN, 2005) é o pilar para delimitar ações que fortaleçam esse relacionamento e para procurar sanar as muitas lacunas que assolam a educação é fundamental para tornar esta relação efetiva e pertinente aos objetivos.
Diante das especificidades, das semelhanças de propósitos e, ao mesmo tempo, das diferenças entre família e escola, criar mecanismos que aproximem as duas instâncias é uma tarefa latente na contemporaneidade, pois, à medida que há uma interação entre eles, o processo ensino-aprendizagem torna-se amplo abarcando o desenvolvimento cognitivo e a constituição de um sujeito crítico, apto para viver em sociedade.
A partir da observação da importância das duas instituições – família e escola – para o desenvolvimento do sujeito e para a efetivação do projeto educacional,
surgiu o interesse pela analise da relação família escola. Durante o curso, este desejo só fez crescer diante das indagações levantadas em sala de aula e os relatos de colegas de classe e professores sobre o tema, além da predileção por assuntos que abarquem a função social da escola, nos levaram ao seguinte problema de pesquisa: Qual é a importância da relação entre escola e família no processo ensino-aprendizagem da criança? Percebeu-se, também, a necessidade de aprofundamento no tema para que, como futuros profissionais da Educação Infantil, as relações entre a família e a escola sejam valorizadas como mecanismos de formação.
Para embasamento deste trabalho, que tem como objetivo geral o intuito de analisar a importância da interação família-escola no processo ensino- aprendizagem da criança, optou-se pela observação da relação família escola na Educação Infantil, a partir de uma turma do segmento em uma Escola da Rede Municipal de Belo Horizonte, na qual realizaremos os seguintes procedimentos metodológicos:
Pesquisa qualitativa, com intuito de responder questões particulares, com objetivo de preocupar-se com a realidade que não pode ser quantificada. (OLIVEIRA,2008);
Pesquisa bibliográfica;
Entrevista de campo em uma Escola da Rede Municipal localizada no Município de Belo Horizonte, com realização entrevistas semiestruturada com professores e pais da Rede supracitada;
Observação não participante.
Como suportes para a verificação do objetivo geral serão considerados os seguintes objetivos específicos:
Compreender a participação da família na escola; verificar como a escola trata os pais e quais as expectativas dos pais quanto à escola e identificar as formas de interação entre família-escola.
Não há a pretensão de encerrar aqui os estudos sobre o tema, o que se almeja é a refutação ou constatação dos pressupostos que foram se formando ao longo do curso, ressaltando que estes são concepções primárias que não partiram da analise de bibliografias ou dados de pesquisas, são eles:
A diferença entre os papéis sociais na formação da criança da família e da escola e a latente necessidade de aproximação entre as duas instituições a partir de mecanismos que não sobrecarreguem nenhuma das partes;
A interação entre a família e a escola contribui para a formação cidadã da criança, esta formação contempla, para além do conhecimento acadêmico necessário, a constituição da criticidade do sujeito, preparando-o para a vida em sociedade com um cidadão conhecedor dos seus direitos e deveres;
Nos anos iniciais o eixo norteador é a família, através dela as primeiras noções de vida em sociedade serão apresentadas. O segundo eixo norteador que a criança conhece é a escola. Cada vez mais cedo as crianças estão indo para a escola. Não há explicitamente uma ruptura entre os dois eixos, mas há divergências que dificultam o processo ensino-aprendizagem.
Para o melhor desenvolvimento deste trabalho de conclusão de curso, a seguinte estruturação será realizada:
Do capítulo 1 ao capítulo 5 será apresentado o referencial teórico embasador deste trabalho, serão apresentados quatro temas nos quais buscaremos explanar sobre as condições históricas, sociais e ou legais destes.
Capítulo 2: Família: a primeira agência cultural. Para a compreensão deste conceito de Oliveira; Marinho (2010) será realizado uma pesquisa bibliográfica embasa em autores que se debruçam sobre os aspectos históricos, sociais e legais da família.
Capítulo 3: A evolução da escola como representante do saber. Neste capítulo, será apresentada uma analise bibliográfica do desenvolvimento da escola abordando aspectos históricos, sociais e legais.
Capítulo 4: Educação Infantil. Este capítulo irá arrazoar sobre a importância da Educação Infantil na vida da criança, perpassando as transformações históricas na concepção de infância e os avanços deste segmento da educação no Brasil.
Capitulo 5: A relação família-escola. Neste momento, a analise bibliográfica será destinada ao tema norteador desta pesquisa, as interações família-escola.
Capítulo 6: Procedimentos metodológicos. Apresentação dos procedimentos que foram realizados para a refutação ou constatação dos pressupostos deste trabalho.
Capítulo 7: Analise de dados. Após a apresentação do referencial teórico e a realização dos procedimentos metodológicos, faz-se necessário que os dados destes últimos sejam analisados. Pelo caráter dinâmico do tema, as analises neste capítulo apresentadas serão de ordem qualitativa.
Capítulo 8: Considerações finais. Exposição das considerações elaboradas ao longo da realização deste trabalho.
1 FAMÍLIA: A PRIMEIRA AGÊNCIA CULTURAL
Para o embasamento teórico deste trabalho de conclusão de curso, serão apresentados teóricos que discorrem sobre a família, a escola, a Educação Infantil e a relação família-escola. Os aspectos abordados de cada uma destas instituições serão os históricos, os sociais e os legais. A ordem de apresentação pautou-se no que Oliveira; Marinho-Araújo (2010) classificam como a ordem da educação; a educação familiar é a concebida como a educação primária, por ser a família a primeira agência cultural com a qual o sujeito tem contato e a educação coletiva, aquela praticada pela escola, com a qual a criança tem contato a posteriori. Nesse contexto formativo, a Educação Infantil é inserida por abarcar a fase em que a formação da personalidade está mais em evidência, sendo de fundamental importância as relações afetivas desenvolvidas pela família e a formação formal proposta pela escola (OLIVEIRA, MARINHO-ARAÚJO, 2010).
1.1 Família
A sociedade está acostumada a se dividir em grupos, desde os mais simples como a família, até os mais complexos como os grupos religiosos. Dentre estes grupos o de maior credibilidade e aceitação, do qual parece ser desnecessário falar, por fazer parte da nossa vida diária de forma intrínseca e duradoura, é a família. Como pensar a educação do sujeito sem fazer menção à família? Impossível. Alves (2014) classifica a família como o âmago da sociedade, que precede ao Estado e ao Direito. Porém, compreender as relações familiares não é tão simples quanto parece, mais do que laços sanguíneos, muitos outros processos sociais se desenvolvem através da família. O objetivo deste capítulo é explanar sobre a evolução histórica, social e legal da família, para respaldar a importância desta instituição como parte operante da educação do sujeito, sobretudo nos primeiros anos.
1.2 Conceito histórico
“A família é essencial e sagrada” (Alves, 2014, p.10). Tais definições – essencial e sagrada – conferem à família prestigio social e um aspecto inviolável, incorruptível que a fortalece como âmago da sociedade (Alves, 2014) e induzem ao sentimento moderno de família que é permeado por relações afetivas e laços sanguíneos, no entanto, pouco condizem com a palavra que deu origem ao termo família; Famulus.Expressão latina que significa escravos domésticos, que servia sob a supervisão do patriarca. Apenas um escravo não poderia ser considerado um famulus, desta pluralidade de sujeitos sob a ordem de um senhor surgiu a associação com a ideia de um grupo social formado por pai, mãe e filhos, a família nuclear padrão (PAULO, 2006). A famulus está representada pela autoridade patriarcal, como provedor da casa, mulheres e filhos se submetiam à autoridade masculina, assim como os escravos de um senhor.
Todavia, esse núcleo padrão não pode ser a única concepção de família aceita como universal, as relações familiares sofreram profundas transformações ao longo dos anos e pensa-la de forma tão simplista é rejeitar que, como grupo social, ela interage com as regras sociais do momento. Barbosa (1948) escreve sobre está influencia das relações sociais na família observando que “a família amolda-se às condições do tempo e às exigências sociais do ambiente em que se desenvolve”.
Sendo assim, a construção histórica desta instituição perpassa muitos momentos, desde as eras remotas em que o conceito de família não era significativo por não haver a necessidade de classificações grupais até a contemporaneidade, quando a grande questão que cerca a família é a própria definição do termo família.
Barbosa (1948) aponta que no estado selvagem médio, infância do gênero humano (ENGELS, 1984), a família se limitava a um grupo de mulheres e homens dividindo o mesmo espaço e desenvolvendo relações de promiscuidade sexual. Tal formatação era encontrada entre os polinésios e os australianos e estava associada ao tipo de habitação predominante entre estes povos. Não havia a propriedade privada, portanto, não habitavam em casas, estes povos dominavam espaços abertos e neles se relacionavam. Em Engels (1984) este modelo é denominado de matrimônio por grupo, “de modo que cada mulher pertencia a todos os homens e todos os homens a cada mulher” (LUNA, 2010). Nestas sociedades primitivas, dois conceitos não existiam; o de incesto e o de ciúmes (ENGELS, 1984).
Segundo Engels, neste período a formação familiar era a Família Consanguínea: Neste modelo, os irmãos e irmãs casavam entre si. “Nessa forma de família, os ascendentes e descendentes, os pais e os filhos, são os únicos que, reciprocamente, estão excluídos dos direitos e deveres (poderíamos dizer) do matrimônio” (1984, p.38).
Ainda em Barbosa, tal regime predominou até o período médio da barbaria, “quando o homem começa as construções de casas de madeira, pedras e tijolos, entregando-se também a cultura de plantas alimentícias e à vida pastoril” (1948, p.26). Deste modelo, surge o conceito de propriedade relacionado aos grupos familiares e à restrição cada vez maior dos participantes destes grupos. Ou seja, antes as relações grupais, inclusive sexuais, se desenvolviam sem limitações, homens e mulheres não participavam do sentimento de posse, tudo era comum, neste momento, porém, com a instituição da propriedade privada, as relações íntimas passam a se desenvolver com algumas limitações, restringindo o número de participantes e delimitando funções.
Para Engels (1984) esta é a Família Punaluana: o segundo estágio da evolução familiar consiste na proibição de relação entre irmãos.
Este processo foi infinitamente mais importante que o primeiro e, também mais difícil, dada a maior igualdade nas idades participantes. Foi ocorrendo pouco a pouco, provavelmente começando pela exclusão dos irmãos uterinos, a princípio em casos isolados e depois, gradativamente, como regra geral. (1984, p.38)
A proibição de casamento entre consanguíneos é o primeiro passo para que a família seja consolidada por instituições comuns de ordem social e religiosa (ENGELS, 1984).
Para Barbosa, a construção de casas representa um avanço na organização de famílias sindiásmicas, conceito presente na obra de Engels (1984) que remete a um tipo matriarcal de família, facilmente dissociável no qual os filhos pertenciam às mães. Com as proibições de casamentos consanguíneos, os casamentos pautados no costume e em pares foram consolidados (ENGELS, 1984).
Nesse estágio, um homem vive com uma mulher, mas de maneira tal que a poligamia e infidelidade ocasional continuam a ser um direito dos homens, embora a poligamia seja raramente observada, por causas econômicas; ao mesmo tempo exige-se a mais rigorosa fidelidade das mulheres. (ENGELS, 1984, p.48)
Surge destas famílias predominância da forma nuclear padrão; um homem e uma mulher unidos pela afinidade praticando relações íntimas e procriando. Quanto aos filhos, estes deviam ser considerados como comuns, devido á poliandria das mulheres e a poligamia dos homens que ainda não eram consideradas como vergonhosas ou infidelidade conjugal (ENGELS, 1984).
Esta formatação de casal – homem e mulher – avança até o isolamento conjugal, como predomina hoje (ENGELS, 1984). A monogamia, para Barbosa (1948), acompanha a civilização, á medida em que as sociedades se desenvolvem, menos aceitável é que homens e mulheres se dediquem a poligamia. A moral coletiva passa a imperar sobre a ordem privada impondo que a família aconteça dentro das relações matrimoniais entre um homem e uma mulher. Restringida a prática sexual, restringe-se também a posse dos filhos, estes pertencem a seus progenitores somente. Engels (1984) denomina a monogamia como o ápice da virtude.
Família sindiásmica: com as proibições de casamentos consanguíneos, os casamentos pautados no costume e em pares foram consolidados.
Nesse estágio, um homem vive com uma mulher, mas de maneira tal que a poligamia e infidelidade ocasional continuam a ser um direito dos homens, embora a poligamia seja raramente observada, por causas econômicas; ao mesmo tempo exige-se a mais rigorosa fidelidade das mulheres. (ENGELS, 1984, p.48)
Nesse sistema de casamento entre pares, os sentimentos que são associados ao casamento na contemporaneidade não existem, os vínculos eram baseados nas proibições que limitavam o casamento grupal. A união matrimonial ainda se dissolvia facilmente e os filhos pertenceriam às mães. Engels pontua que a origem da monogamia pouco tem a ver com o amor sexual individual (1984). Na família sindiásmica já o grupo havia ficado reduzido à sua última unidade, a sua molécula biatômica: um homem e uma mulher (ENGELS, 1984, p.56).
Da família sindiásmica originou-se a composição mais próxima da estrutura contemporânea; a família monogâmica. Neste modelo, a união entre um homem e uma mulher era mais estável, os laços matrimoniais concediam maior poder aos homens e, em casos de infidelidade, o homem não sofreria sanções, a mulher, porém, poderia ser reprimida e penalizada até mesmo com a morte (ENGELS, 1984).
Os estudos de Engels (1984) sobre a origem da família demonstram muito mais do que a evolução do casamento entre pares como se conhece hoje, lança luz sobre a evolução da sociedade patriarcal que concede aos homens direitos e poderes, haja vista que nas sociedades primitivas o apreço à mulher vigorava. Para ele, um dos grandes erros da filosofia do século XVIII foi induzir ao pensamento de que a mulher era escrava dos homens. A mulher primitiva era livre, o pátrio poder não existia, as uniões, facilmente dissolúvel, concediam às mães o direto sobre os filhos. Isto porque em casamentos grupais sabia-se quem era a mãe, mas não o pai (ENGELS, 1984).
Dentro das casas comunistas as mulheres eram a força, podiam expulsar seus parceiros e cobrar deles a provisão. O autor faz uma observação a cerca do trabalho da mulher nestas sociedades primitivas; em povos nos quais as mulheres eram obrigadas a trabalhar muito mais do que as europeias, era também os que mais valorizavam as mulheres (1984).
Portanto, a visão patriarcal e machista é uma concepção social relativamente nova, o que desmistifica a visão de subalterna das mulheres primitivas. Os parceiros eram muitos, porém sem o uso de força e sim respondendo a uma questão cultural, as casas eram comunistas e o trabalho também, cabendo aos homens prover o sustento, o excesso de trabalhorepresenta as condições disponíveis e não uma obrigação de sustentar os clãs para os homens e, sobretudo, o direito materno; os filhos pertenciam às mães.
Outro relato que valoriza a participação das mulheres na formatação matrimonial das sociedades primitivas é a atribuição da monogamia a elas; a monogamia realizou-se essencialmente graças a elas (ENGELS, 1984). Para este autor, o homem jamais recusaria o direito ao prazer exacerbado do casamento grupal, a mulher, porém, com os avanços econômico e populacional percebe o casamento grupal como uma força opressora e a castidade e o direito a pertencer a um único homem como algo libertador (ENGELS, 1984).
Como, no entanto, houve a evolução para uma sociedade machista que supervaloriza a força masculina e concede ao homem status de provedor e senhor da casa? Para este autor foi a entrada de outras forças sociais no jogo que impulsionaram esta transformação. Nas primeiras sociedades o comunismo era a forma de organização social, os sujeitos se preocupavam com a sobrevivência e lutavam por ela diariamente, sem a necessidade de acumulação de bens. À medida que as relações humanas com os animais e com a natureza sofrem mudanças e os bens de consumo passam a ser acumulados, alteram-se também as relações matrimoniais. “À medida que as riquezas iam aumentando, davam, por um lado, ao homem uma posição mais importante que a mulher na família” (1984, p.59).
As mulheres, antes facilmente arranjadas, passam a ter valor de troca e de compra, a família não se multiplica como o gado e forças de trabalho são necessárias, surge, assim, a necessidade de um verdadeiro pai (ENGELS, 1984). “De acordo com a divisão do trabalho na família de então, cabia ao homem procurar a alimentação e os instrumentos de trabalho necessários para isso” (1984, p.58).
Neste novo cenário econômico, há um ponto a ser vencido para conceder ao homem o destaque que respalda as sociedades patriarcais; o direito materno. Como propriedades das mães, os filhos não tinham direito a herança do pai (ENGELS, 1984). Uma das mudanças mais expressivas e importantes da humanidade foi tomada, segundo Engels, sem que nenhum membro da gens sofresse alteração, bastou uma decisão:
Bastou decidir simplesmente que, de futuro, os descendentes de um membro masculino permaneceriam na gens, mas os descendentes de um membro feminino sairiam dela, passando à gens de seu pai. Assim, foram abolidos a filiação feminina e o direito hereditário materno, sendo substituído pela filiação masculina e o direito hereditário paterno. (ENGELS, 1984, p.59)
Todo este processo de valorização do trabalho masculino refletiu na estrutura familiar; o homem assumiu o controle da casa e dos membros da família, relegando a mulher ao lugar de serva, instrumento de reprodução (ENGELS, 1984). O papel dos filhos também sofreu alteração, como herdeiros da gens masculinas, um número maior de filhos homens representaria a perpetuação do clã e maior governo sobre escravos e propriedades, já as filhas mulheres seguiam o exemplo de desvalorização da mãe. Deste modelo de repressão, as mulheres são tolhidas não só no tocante a seu papel dentro de casa e como mãe, mas também em sua sexualidade. No primeiro momento, a dedicação exclusiva a um único parceiro pareceu libertadora, porém, na família patriarcal, aos homens era concedido o direito à poligamia e à infidelidade. Às mulheres, a repressão sexual e a obrigação de fidelidade conjugal são tão opressoras quanto a promiscuidade de outros tempos. Quando um homem matava uma mulher infiel, não fazia mais do que exercer o seu direito natural de senhor da família (ENGELS, 1984).
O autor é categórico ao afirmar que:
O desmoronamento do direito materno, a grande derrota histórica do sexo feminino em todo o mundo. O homem apoderou-se também da direção da casa; a mulher viu-se degradada, convertida em servidora, em escrava da luxuria do homem, um simples instrumento de reprodução. Essa baixa condição da mulher, manifestada sobretudo entre os gregos dos tempos heroicos e, ainda mais, entre os dos tempos clássicos, tem sido gradualmente retocada, dissimulada e, em certos lugares, até revestida de formas de maior suavidade, mas de maneira alguma suprimida. (1984, p.61)
Deste modelo de família patriarcal com posse de escravos vem a origem romana – famulus – do termo usado para definir o menor, mas não menos importante, grupo social da modernidade: família. Porém, se hoje concebemos a família como o lugar das relações afetivas, na origem da palavra não há a presença de sentimentos ou, como classifica Engels (1984), uma mistura de sentimentalismo e dissensões domésticas. A família paterna romana era o conjunto de escravos de um senhor, como já foi dito. Todo o conceito romano de família é construído em torno do pátrio poder, da dominação dos mais fracos – escravos – e da posse. Não á toa, o núcleo conjugal padrão – homem e mulher – é denominado família. Pois, na família monogâmica a autoridade masculina é sobreposta à mulher, que como mãe perde a posse dos filhos. Não poderia haver dúvidas sobre a paternidade para que os filhos, futuramente, pudessem receber a herança. Os homens tornam-se senhores de suas casas e de seus escravos.
Para Engels a formatação familiar composta por pais e sua prole representa um avanço histórico ao mesmo tempo em que iniciou movimentos sociais de repressão e estruturação das desigualdades. A mulher foi a primeira classe oprimida, o homem o primeiro senhor de outros iguais, a escravidão e o acumulo de riquezas, que só avançaram com o decorrer dos séculos, ganha status a partir da dominação masculina (ENGELS, 1984). Neste ponto, o autor corrobora com Barbosa (1948) que classifica a família como a célula mater da sociedade.
Todo este retrospecto sobre a obra de Engels é de fundamental importância para a afirmação de que a família é um constructo social intrinsecamente ligado à sociedade que se desenvolveu acompanhando as transformações coletivas ao mesmo tempo em que participava delas. A obra deste autor explana sobre a constituição da família, do Estado e da propriedade privada e a família contribuiu ativamente para a consolidação destes dois últimos. Portanto, é pertinente a afirmação de que:
Nesse contexto, podemos afirmar que a família passa por profundas transformações, tanto internamente, no que diz respeito a sua composição e as relações estabelecidas entre seus componentes, quanto às normas de sociabilidade externas existentes, fato este que tende a demonstrar seu caráter dinâmico. (OLIVEIRA, 2009, p.23)
Em Ariés (1989), outro autor que vai estudar os meandros da família, há uma descrição das famílias da idade medieval. Assim como nas remotas estudadas por Engels (1984), a presença do sentimentalismo, sem o qual as sociedades modernas não conseguem conceber o seio familiar, não existe. “A família era uma realidade moral e social, mais do que sentimental” (ENGELS 1984, p. 55). Tanto pobres quanto ricos não partilhavam dos sentimentos delegados às famílias contemporâneas. Neste ponto, Engels e Ariés fortalecem a premissa de que a vida social tem impacto sobre as relações intimas. Aos pobres, as muitas mazelas e poucas expectativas restringiam as relações. Aos ricos, os sentimentos de posse e ambição imperavam.
Para Ariés o grande marco nas relações familiares foi a valorização da criança. Sem esta, os elos íntimos se limitavam à linhagem. As crianças eram entregues a outros lares para a aprendizagem (1989). Quando, porém, a escolarização passa a ser realizada em escolas, há uma substancial transformação na família, pois há uma aproximação entre pais e filhos, os primeiros passam a acompanhar o desenvolvimento dos últimos.
Tal fato segue as tendências sociais da época. A preservação da propriedade privada e a efervescência das relações comerciais exigiam que as famílias instruíssem pelo menos um de seus filhos em uma modalidade de ensino que não se limitasse apenas ao ofício pratico, com isso, os pais escolhiam um filho em detrimento de outro, geralmente o mais velho era o escolhido,porque a este seria transmitido os cuidados com a casa e patrimônio na ausência do pai.
Mesmo sendo um constructo dinâmico, algumas características se perpetuam no decorrer dos séculos. Há aqui dois fatos descritos pelos estudos de Engels que surgiram da família monogâmica; o primeiro é quando Engels demonstra como a perda do direito materno aconteceu para que os filhos pudessem pertencer às gens do pai e, assim, ter direito à herança. Futuramente, os pais do século XVII repetiriam os mesmos objetivos ao escolher um dos filhos para ter acesso à escolarização; preservar as posses do grupo familiar e garantir a perpetuação do nome e prestígio deste.
O segundo está no fato de que os filhos escolhidos eram comumente os filhos homens, as filhas não frequentavam a escola e não participavam da administração da herança dos pais, o desapego pelo sexo feminino iniciado com os casamentos monogâmicos foi fortalecido com o preterimento das filhas. Elas permaneceriam servas em suas casas e se casariam, com parceiros escolhidos sem a afeição comum aos casamentos hoje, para a procriação.
Este novo processo de escolarização e aproximação dos filhos contribuiu para o que Ariés (1989, p.238) pontua como o sentimento da família:
Os progressos do sentimento da família seguem os progressos da vida privada, da intimidade doméstica. O sentimento de família não se desenvolve quando a casa está muito aberta para o exterior; ele exige um mínimo de segredo. Por muito tempo, as condições da vida quotidiana não permitiram este entrincheiramento necessário da família, longe do mundo exterior.
Deste sentimento, a vida doméstica ganhou outras nuances e as casas se transformaram em lares; lugar onde as relações familiares aconteciam privadamente, e onde os sentimentos modernos que permeiam a família começaram a se desenvolver e a afirmação do homem como provedor econômico da família se fortalece. Souza; Rodrigues (2007) escrevem que as transformações da idade Média contribuíram para a transformação da família extensa à família nuclear burguesa, e ressaltam a importância da figura masculina como “pai-patrão-professor”.
Adiante com as transformações que impactaram a vida familiar, Souza; Rodrigues (2007, não paginado) lançam luz sobre o século XIX. Para elas:
A família burguesa de meados do século XIX apresenta-se como uma família urbana, com baixo índice de fertilidade e mortalidade, assumindo um padrão diferente de afetividade e privacidade. A responsabilidade do marido era manutenção econômica, sendo este autoridade dominante na família.
Estas famílias burguesas compostas por “comerciantes, banqueiros, lojistas, alguns industriais, proprietários e rentiers, profissionais liberais e funcionário do escalão político” (ANDRADE, 2013, p.64), almejavam condições econômicas favoráveis, diferentemente das famílias da Idade Média que estavam apoiadas na propriedade privada e no direito à herança. No século XIX, as relações comerciais cresciam e o homem foi se afastando cada vez mais de casa, as grandes propriedades rurais já não comportavam de maneira satisfatória a todos, principalmente aos membros das classes desfavorecidas economicamente, que buscavam no novo regime social melhores condições de vida e possibilidade de ascensão social.
Estas novas modalidades de trabalho exigiam dos homens maior tempo fora de casa, para a mulher, no entanto, percebe-se um movimento contrário; ela tem suas funções cada vez mais interiorizadas e relacionadas ao bom andamento da família. Andrade (2013) ressalta que delas não se esperava muito conhecimento, apenas que fossem capazes de zelar para que, ao retornar, os maridos, que podiam ter aventuras extraconjugais, encontrassem tudo em ordem.
Sobre esta família burguesa Andrade (2013) expõe a seguinte contradição; enquanto a sociedade exterior primava pelo individualismo, pela igualdade de direitos e os avanços econômicos, na privacidade das casas ainda imperava a hierarquia aristocrática, representada pela supremacia dos homens e a servidão velada das mulheres que deveriam vestir, alimentar, cuidar de todos e manter a casa sempre em ordem.
Outro ponto obscuro das famílias burguesas e do qual Engels (1989) e Andrade (2013) escrevem são os casamentos por conveniência. Para relatar tal prática, Engels (1989, p. 77) a assemelhava a “mais vil das prostituições”, a diferença estava na forma de entrega da mulher, uma vez que nos casamentos burgueses os pais buscavam esposas para seus filhos dentre os membros da mesma classe, de forma a fortalecer o poder econômico. O autor prossegue dizendo que “nas relações com as mulheres, o amor sexual só pode ser, de fato, uma regra entre as classes oprimidas, quer dizer, em nossos dias, o proletariado, estejam ou não estejam autorizadas oficialmente estas relações” (ENGELS 1989, p. 77).
Andrade (2013) retrata o casamento por conveniência como uma tentação dos burgueses que almejavam tornar-se um aristocrata, associando- se, assim, aos nobres através de suas filhas. Estes últimos podiam ate repugnar o modo de vida burguês, porém, não seu dinheiro e o incontestável avanço do capitalismo. Sobre estes casamentos, Andrade (2013) acrescenta a possibilidade de mobilidade social e o pagamento do dote como um atrativo entre a classe média.
Esta autora analisa que, apesar dos ideais igualitários da sociedade do século XIX, as famílias burguesas reforçaram e exageraram a estrutura patriarcal. Com a ascensão da burguesia, ascende também o proletariado, sobre quem Engels já falou. Tal classe também participou da formatação da base da família moderna, pois, através das necessidades de maior ação do Estado para que estas pessoas pudessem sobreviver com o mínimo de dignidade, acontece o que Santos (2011) chama de interferência do Estado na ordem social, sexual e doméstica. Esse movimento de distinção das classes – burguesia e proletariado – engendrou a interiorização da família, fortalecendo sentimentos como a solidariedade, o companheirismo, o afeto e a qualidade das relações entre os membros que habitavam a mesma casa. Neste período, há um distanciamento do núcleo padrão dos demais parentes e vizinhos. Permitindo, assim, um modo de vida doméstico (SANTOS, 2011).
O crescimento da individualidade no interior da família, bem como, a liberalização de determinadas regras e convenções sociais, ocorreram em consequência do crescimento populacional, da expansão das cidades (urbanização) e da rápida disseminação de novas tecnologias. As transformações, desenvolvimento ou funcionalismo da família passaram a depender da morfologia da própria sociedade. (SANTOS, 2011, não paginado)
No século XX, o fortalecimento do capitalismo regido pelo individualismo representou um enfraquecimento da família, ao mesmo tempo em que procurou divulgar o ideal de família, esta não se pautava na igualdade entre os sujeitos, mas na dependência econômica da mulher sustentada pelo marido trabalhador (SOUZA, RODRIGUES, 2007). Esta busca de resgate da família nuclear padrão está associada às mudanças na estrutura social que vão muito além dos lares, compreende a abertura do mercado de trabalho para as mulheres, a liberdade sexual alcançada com o lançamento da pílula anticoncepcional, assim como a crescente “liberdade da juventude” (SANTOS, 2011).
Neste século, o capitalismo alcança seu ápice, a urbanização e a industrialização dos meios de trabalho desmantelaram as empresas familiares e retiraram a mulher do trabalho doméstico colocando-a, assim como os homens, nos chãos de fabricas. Portanto, a dependência familiar do dinheiro exclusivamente masculino começa a ser vencida, da mesma forma que a educação quase que exclusivamente como função das mães. Vencidos estes entraves históricos, a luta por igualdade de direitos alcança os matrimônios, já não sendo mais a infidelidade algo tão facilmente aceitável e os laços do casamento passaram a ser questionados através do divórcio. Em 1907, o Uruguai foi o primeiro país a aprovar o divórcio, com restrições, obviamente, mas já representando um grande avanço.
Cabe uma ressalvade que todo esse processo não impediu que o julgamento da sociedade fosse cruel para com as mulheres, inclusive nas questões salariais, as mulheres recebiam salários inferiores aos dos homens e ocupavam cargos na produção. A quebra de paradigmas requer muito mais que abertura legal para igualdade entre os sujeitos, requer uma mudança cultural que ocorreu lentamente no que diz respeito à inserção social da mulher em outros setores que não os lares. Para consolidar os direitos femininos, aconteciam mobilizações feministas que iam às ruas lutar por suas semelhantes.
Quanto aos jovens, a segunda metade do século XX representou a era da emancipação, muito por causa do regime capitalista, que enxergou nestes jovens um mercado em expansão (SANTOS, 2011). A revolução juvenil abarcou muitos dos setores conservadores da sociedade: o mercado de trabalho, a educação, a cultura, a sexualidade e, como não poderia deixar de ser, a família. A “juventude transviada”[footnoteRef:2], como ficou marcada a juventude desta época – principalmente pelos setores conservadores como a Igreja – primou pela liberdade de expressão e pelo direito à sexualidade voltada para o prazer. [2: Titulo de um filme rodado em 1955, que retrata a juventude da década de 1950, abordando os conflitos geracionais e a liberdade desta época 
] 
Neste cenário de efervescentes mudanças, Santos (2011) concebe a família nuclear como uma instituição em xeque, haja vista que as relações homossexuais foram assumidas como forma de família – não no campo legal, mas no direito a escolha do parceiro – além da ampliação do número de pessoas que moravam sozinhas.
Todas as evoluções do conceito de família descritas neste trabalho foram permeadas por duas estruturas que contribuem para a ordem de qualquer sociedade; a econômica e a Igreja. Sobre a primeira este trabalho já trouxe alguns exemplo. Quanto à igreja, durante todo este processo de reformatação da família, a Igreja operou como uma força latente e opressora, indo contra qualquer forma de liberdade que fosse julgada exacerbada, o que incluía o divórcio, uma vez que a Igreja considera os laços matrimoniais indissolúveis, independente do que pudesse levar o casal a se separar.
Outro fato que impactou sobremaneira as relações conjugais foi a criação da pílula anticoncepcional, para as mulheres, até então reprimidas no tocante à sexualidade, tal inventou significou a libertação e as relações conjugais ganharam outro significado para além da reprodução. A pílula proporcionou o domínio do corpo pela própria mulher e abriu espaço para relações sexuais fora do casamento sem o peso de filhos indesejados. A pílula anticoncepcional representava um choque aos objetivos cristãos da relação sexual, a reprodução. As praticas sexuais, principalmente para as mulheres, não poderiam ser sinônimo de prazer. O casamento era uma entidade sagrada e o sexo um ato primitivo para cumprir a ordem sagrada de crescer e multiplicar. Não inconscientemente, a Igreja fechou os olhos para a infidelidade masculina, era comum que as relações sexuais com as esposas fossem praticas e desprovidas de atração, já com as relações extraconjugais, todos os anseios primitivos que remetiam ao prazer eram expostos.
Todo este movimento de luta e valorização feminina reverberou nas famílias contemporâneas. Na família do século XXI não há papéis demarcados. Souza; Rodrigues (2007, não paginado) pensam que:
A família do século XXI está sobre a influência de significativas mudanças e muitas interrogações surgem sobre como ela estará reagindo. Em especial as tensões introduzidas no universo masculino, em relação ao seu lugar na família e na criação dos filhos, espaço muito bem delimitado e estabelecido anteriormente, cria um vasto e interessante campo para pesquisa.
A expressão “vasto e interessante campo de pesquisa” é justificada pelas poucas certezas que se tem sobre esta família, o que se pode afirmar é que as relações são desenvolvidas com base na afetividade, que o domínio do próprio corpo, tanto dos homens quanto das mulheres, impacta na constituição familiar, pois ter filhos ou não ter é uma decisão muitas vezes tomada de forma individual. Pode se afirmar também que em nenhuma outra época o domínio da Igreja foi tão limitado, as ordens sagradas de procriação e manutenção dos laços matrimônios já não pesam sob os cônjuges como em outros tempos.
Outra certeza que se tem sobre a família contemporânea é a de que o núcleo padrão mãe, pai e filhos já não é a única definição, inclusive no campo do Direito, aceita. Outras formatações que levam em consideração as relações afetivas de cuidado e companheirismo desenvolvidas no seio familiar são, também, classificadas como família. Portanto, entender a família moderna ainda não é uma tarefa possível, uma vez que esta ainda está em processo de ressignificação e de reformatação, o que se sabe é que a sociedade como um todo está passando por estes mesmos processos e que isto influenciará de forma incontestável as relações privadas dos membros da família.
Conclui-se, portanto, que Engels, Ariés, Barbosa e muitos outros estudiosos das relações familiares ao afirmarem que a instituição social chamada de família sempre acompanhou as transformações da sociedade, e que o regimento interno dos lares foi dito por fatores externos – como a mudança das formas de sobrevivência e acumulo de riquezas nas sociedades primitivas e a aproximação dos filhos através do ensino nas escolas e não em lares da Idade Média – indicaram o único caminho aceitável para se compreender a importância social desta. Esse movimento de interdependência entre sociedade e família é descrito por Barbosa (1948) classificando a sociedade como um organismo composto, do qual a família é a célula mater, dissociar a família do restante da sociedade é tornar impossível a compreensão sensata tanto de uma quanto da outra.
1.3 Contexto social
No capitulo anterior, foi feito um levantamento histórico das principais fases da família, desde os primórdios da selvageria quando a família era composta por grandes grupos, até a sociedade moderna na qual o entendimento de família vem sofrendo alterações significativas a ponto de não ser mais aceita como definição universal a forma simplista e reducionista da família nuclear padrão. Todas estas fases carregam sobre si as mutações sociais dos seus respectivos tempos históricos, seja a evolução da espécie humana, seja a inconstância de uma sociedade moderna em desenvolvimento.
Dentro deste cenário de interdependência entre a sociedade e a família (BARBOSA, 1948), analisar o contexto social da família é, de certo modo, analisar a sociedade da qual ela participa. Em sua obra sobre “A origem da família”, Barbosa (1948, p. 38), parafraseia Paul Bureau e declara: “mais que célula social, as famílias legitimas são a matriz da própria humanidade, o laboratório sagrado onde se prepara, se forma e se conserva a cada instante a sociedade inteira”. Com viés ideológico-religioso, Barbosa enaltece as qualidades da família e julga inconcebível que a sociedade anarquista impossibilite a paz conjugal e imponha um processo de retrocesso à família. Todavia, alguns trechos desta obra são precisos ao analisar a importância social da família.
A primeira definição que liga a família à sociedade de forma incontestável, que já foi usada neste trabalho, mas que merece ser rememorada, é a de família como célula mater (BARBOSA, 1948). Sendo assim pensada, a família participa dos processos de transformação social, integra e interage com a sociedade, porém, se isolada dos demais setores, perde sua funcionalidade, atrofia e desface, pois, “como elemento, a família é uma sociedade incompleta, que de si mesmo não carrega tudo quanto é necessário” (BARBOSA, 1948, p.37). Resulta desta imperfeição a necessidade nata de convívio com outros integrantes da sociedade (BARBOSA, 1948), o que impede o isolamento social da família.
Como exemplo de relações desenvolvidas naturalmente pela família com as demais instituições sociais, o relacionamento família-escola.Em outro capítulo está interação será melhor trabalhada, o que cabe neste momento é ressaltar que a escola surge de uma incompletude familiar que, a partir de determinado momento, já não mais dava conta de ensinar às novas gerações o conhecimento acumulado necessário para a vida em sociedade (LUCKESI, 1994). Com o passar dos anos essa relação é estreitada e a dependência mútua só faz crescer, evoluindo para a necessidade de se debater sobre o que é função de uma instituição o que é função da outra. O fato de a família ter que buscar apoio para educar seus filhos, fortalece a teoria de Barbosa sobre a incompetência desta primeira instituição, por mais que se esforce, em desempenhar todos os ofícios e realizar todos os processos que se destinam a formação física, moral e intelectual do sujeito.
Barbosa (1948) aponta que os fins da família relacionam-se necessariamente com a natureza humana. É fato que ninguém consegue conceber ao próximo sem pensar que ele vem de uma família, todos os sujeitos precisam do que a família representa para o desenvolvimento pessoal e a vida social. Sobre esta necessidade Melchiori; Rodrigues; Maia (2014, p. 4) alegam que: “O papel da família, de modo geral, é o de fornecer apoio, segurança e afetividade”.
É no seio familiar que se espera que a criança tenha acesso, de forma afetuosa, amigável e solidária às primeiras noções de vida, aprendendo, assim, a como se relacionar com os demais membros da sociedade. Oliveira; Marinho-Araújo (2010) veem a família como um lugar privilegiado para o desenvolvimento humano. Polonia e Dessen (2007) compartilham desta visão da família ao dizer que, assim como a escola, a família é uma instituição fundamental para o para o processo evolutivo da pessoa. Oliveira (2002) apud Oliveira; Marinho-Araújo (2010) aponta que o principal objetivo da instituição familiar é o de participar da educação moral, transmitindo os costumes e valores de determinada época.
Partindo deste princípio, é inconcebível que algum sujeito possa se desenvolver sem o amparo dos familiares. Barbosa (1948, p.51) justifica a importância da família dizendo que os “bons efeitos emanam naturalmente da boa formação moral e religiosa dos filhos, no ambiente calmo do lar doméstico.” Estes bons efeitos podem ser traduzidos como a vida social regrada pela moral, pela ética e pelos costumes.
A segunda definição de Barbosa (1948) é a atribuição de direitos e deveres recíprocos entre a família e a sociedade. Um dos deveres da família diz respeito ao que Oliveira; Marinho-Araújo (2010, p.100) classificam de “educação primária”. Esta educação, como o próprio termo já esclarece, antecipa às demais e acontece nas interações diárias entre os membros de uma família, sobretudo entre as relações intergeracionais, pois, como esclarece Durkheim (1975) , sem a participação de gerações mais velhas, não há a instrução das mais novas. Sobre este relacionamento entre gerações cabe uma observação para o que Oliveira; Marinho-Araújo (2010, p. 101) consideram família: “Tendo em vista a diversidade de organizações familiares, considera-se que a referência às famílias diz respeito àquelas configurações familiares compostas por, pelo menos, um adulto e uma criança ou adolescente”.
A educação primaria é norteada pela introspecção, por parte da criança ou do adolescente, das normas morais e dos conceitos necessários para a vida em sociedade (Oliveira; Marinho-Araújo, 2010). Polonia e Dessen (2007) sinalizam para a diferença entre esta primeira educação e as demais:
Já, na família, os objetivos, conteúdos e métodos se diferenciam, fomentando o processo de socialização, a proteção, as condições básicas de sobrevivência e o desenvolvimento de seus membros no plano social, cognitivo e afetivo.
A participação da família nos primeiros anos da criança será imprescindível para a consolidação da cultura, haja vista que os progenitores são os principais mediadores entre a sociedade e os infantes (POLONIA; DESSEN, 2007). Portanto, não há como pensar a formação e a educação da criança sem lançar um olhar sobre suas raízes, sobre seu primeiro contato com a cultura da qual será mais um integrante. A família é a instituição responsável por esta apresentação. É através dela que a criança será introduzida aos costumes, às regras, aos valores morais e religiosos. Inicialmente não há como fugir aos padrões estabelecidos pelos adultos daquele clã. A família, portanto, precede à escola na educação. Sendo a sua participação no processo de formação do sujeito diária e contínua.
Polonia e Dessen (2007) fomentam a contribuição familiar na formação da personalidade analisando que as habilidades sociais apreendidas no seio familiar irão repercutir em outros ambientes muito mais amplos que o lar. As relações sociais desenvolvidas pelo sujeito refletem a primeira educação (OLIVEIRA, MARINHO-ARAÚJO, 2010).
Desempenhando os deveres velados que a sociedade atribui à ela, Oliveira; Marinho-Araújo (2010, p.100) categorizam que “a família é a primeira agência educacional do ser humano e é responsável, principalmente, pela forma como o sujeito se relaciona com o mundo, a partir de sua localização na estrutura social”. Portanto, a personalidade, sobretudo dos pequenos, terá características predominantes de seus progenitores, através de relações intrínsecas ao convívio familiar que se desenrolam sem planejamento prévio, mas que indicam a que esfera social aquele núcleo está inserido. Sobre a construção da personalidade, Polonia e Dessen (2007, p. 22) escrevem:
Ela [família] tem, portanto, um impacto significativo e uma forte influência no comportamento dos indivíduos, especialmente dascrianças, que aprendem as diferentes formas de existir, de ver o mundo e construir as suas relações sociais.
Para estas autoras (2007), a família participa da constituição da personalidade da criança através do ensino da língua materna, através da qual o sujeito será imerso na cultura e se socializará.
Mesmo que pareça ser a esfera mais pessoal da sociedade, a família não irá fugir às características comuns ao seu meio. Pelo contrário, ela “está imersa nas condições materiais, históricas e culturais de um dado grupo social” (POLONIA E DESSEN, 2007, p.22). Corroborando com a importância da localização social, Toscano (1975) afirma que como corpo histórico resultante de uma época e de um modelo de sociedade, “a família não existe desligada da estrutura social global e só pode ser entendida como parte integrante desta estrutura”. Portanto, a família irá refletir a sociedade à sua volta, exemplo disto é como aspectos econômicos marcam as taxas de matrimônios e natalidade, os lugares de cada integrante. Sociedades altamente industrializadas impactam na configuração familiar com menos filhos, mulheres que trabalham fora e com a autoridade paterna reduzida à medida que a independência feminina se consolida (TOSCANO, 1975).
Outro dever, que é também uma característica intrínseca ao termo família; é a capacidade de prover condições necessárias ao desenvolvimento dos sujeitos. A família é a instituição socialmente apontada como aquela que tem obrigação de garantir o bem-estar da criança e do adolescente. Quando isso não acontece, outros mecanismos, como o Estado, são acionados, mas, a priori, espera-se que os familiares se responsabilizem pelos que são tidos como incapazes. Essa cobrança justifica-se pelo que se espera dela: garantias de desenvolvimento físico, cognitivo e moral (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010). A legislação vai abarcar esse dever de provisão e irá colocar família e Estado como principais responsáveis pelo menor, portanto, a família participa, em tese, de todos os meandros necessários ao bem-estar da criança.
Dentro do que Barbosa (1948) trata como deveres e direitos comuns à família, pode-se, também, destacar essa relação estreita que liga o desenvolvimento de uma instituição à outra, a saber família e sociedade. Não há como dissociar as transformações sociais, das vicissitudes familiares e vice e versa. Sobre a
interdependência – termo amplamentedivulgado na obra de Barbosa (1948) e já mencionado neste trabalho – Polonia e Dessen (2007, p.22) concluem:
É por meio das interações familiares que se concretizam as transformações nas sociedades que, por sua vez, influenciarão as relações familiares futuras, caracterizando-se por um processo de influências bidirecionais, entre os membros familiares e os diferentes ambientes que compõem os sistemas sociais, dentre eles a escola, constituem fator preponderante para o desenvolvimento da pessoa.
Neste ponto, é pertinente a observação das datas dos trabalhos supracitados – Barbosa na primeira metade do século XX e Polonia e Dessen na primeira metade do século XXI. É certo que os cenários sociais em que as referidas obras foram escritas são totalmente diferentes. O primeiro, em um tempo de abertura global para a ascensão feminina, para a universalização da cultura da juventude. O segundo, em uma sociedade moderna na qual o tema família está em voga e em xeque, por não serem mais aceitas definições que excluam a diversidade de gênero, as muitas formatações e a liberdade entre sujeitos. Porém, ambas as obras são categóricas em afirmar que a família é de suma importância para a formação do sujeito e que respondem a uma determinada sociedade, se colocando como integrante ativa desta, ela participa das questões que constituem esta sociedade, da mesma forma que as vivência. Mais uma vez, a precisão de Barbosa é convincente e necessária; a família é a célula mater da sociedade.
Desta forma, a família é mais do que a soma dos seus membros (LIMA; CHAPADEIRO, 2015). Ela é um sistema complexo em constantes transformações (LIMA; CHAPADEIRO, 2015) que acompanham a gama de relações que constituem uma sociedade. A sociedade, por sua vez, depende da família para sua estruturação, a relação entre sociedade e família é necessária para que ambas as instituições sejam assertivas em seus objetivos.
1.4 Contexto Legal
Nos capítulos anteriores, este trabalho procurou demonstrar a evolução histórica da família, partindo da sociedade selvagem que compreendia como família os grandes grupos de convivência até a sociedade moderna, momento em que a díade homem e mulher, até então aceita como a família nuclear padrão, passa a ser questionada, permitindo assim que outras configurações pautadas nas relações afetivas sejam classificadas de família. Procurou-se, também, abordar a importância da família para a sociedade. Neste aspecto, a obra de Barbosa (1948) foi tomada como referência por sua descrição da relação família e sociedade como um organismo em formação, do qual a família é uma célula que não pode ser analisada a parte da complexidade que é a sociedade, pois, em uma relação de desenvolvimento mútuo, a família contribui para a evolução social e a sociedade, por sua vez, estabelece padrões que serão reproduzidos e aprimorados pela família.
Após estes levantamentos, percebeu-se a necessidade de arrazoar sobre o contexto legal familiar. Segundo Oliveira; Marinho-Araújo (2010) existem muitas formas de compreender a família, sendo as atribuições legais uma delas. Para Barbini (2012) as leis são fundamentais para que se viva melhor. No tocante à família, as leis são importantes para que, como instituição social, ela seja respaldada e encontre no Estado condições de sobrevivência e desenvolvimento. No entanto, Engels (1998) ressalta que a família precede ao Estado e às leis, o que não impede que ela se valha desses para.
Na legislação que versa sobre os direitos da família não há um conceito definido sobre família (CUNHA, 2010), porém, desde a Constituição de 1988 a legislação sofre alterações para acompanhar as necessidades sociais de cada tempo (RODRIGUES, 2009). A Constituição de 1988 representa um marco na ruptura com o modelo único de família pautado no poder patriarcal, ela discorre sobre uma união conjugal que se baseie na igualdade entre os sujeitos e nos direitos mútuos (CUNHA, 2010). Outro destaque desta Constituição é extinção da diferença, no tocante aos direitos, entre os filhos gerados dentro dos casamentos e os filhos de relações extraconjugais.
Segundo Cunha (2010, não paginado):
Ao igualar o filho havido por adoção aos filhos de origem sangüínea e reconhecer como família a união decorrente do companheirismo, chamada de união estável, a Constituição Federal de 1988 foi o primeiro dispositivo jurídico brasileiro a reconhecer e igualar o afeto como formador da família, sem distinção aos laços decorrentes do casamento ou de sangue.
Portanto, segundo a Constituição, a assertiva de Trost (1995) apud Oliveira; Marinho-Araújo (2010) que concebe a família como a menor unidade do grupo social, que se forma quando um casal se casa ou passa a viver na mesma casa, ou, ainda, quando um dos pais passa a cuidar dos filhos, mesmo que sozinho, é legalmente respaldada.
Para estas autoras, o termo família abrange relações de carinho e cuidado intergeracionais. Sob essa ótica, o princípio básico para que um grupo de sujeitos seja classificado como família é a afetividade, solidariedade e intimidade (RODRIGUES, 2009, OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010).
Infere-se, da definição de Trost (1995) acerca da família, que se incluem os casais que se constituíram legalmente, mediante casamento civil e/ou religioso, e também os que apenas optaram por morar juntos, considerando, ainda, os casais heterossexuais e homossexuais. (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010,p.100)
Concordando com a analise de Oliveira; Marinho- Araújo (2010), Rodrigues (2009, não paginado) pontua que:
Nesse aspecto, a entidade familiar deve ser entendida, hodiernamente, como grupo social fundado, essencialmente, em laços de afetividade, pois a outra conclusão não se pode chegar, sob análise do texto constitucional. Assim, afirma-se a importância do afeto para a compreensão da própria pessoa humana, integrando o seu “eu”, sendo fundamental compreender a possibilidade de que dele – afeto; decorram efeitos jurídicos diversos.
Neste trecho da obra de Rodrigues percebe-se o que já foi abordado neste trabalho como uma das principais atribuições da família; a contribuição para a formação do sujeito, promovendo condições de desenvolvimento físico, cognitivo e moral (POLONIA, DESSEN, 2007). Rodrigues (2009, não paginado) concorda que esta é a função da família ao apontar, também, que:
Desse modo, a entidade familiar está vocacionada, efetivamente, a promover a dignidade e a realização da personalidade de seus membros, integrando sentimentos, esperanças e valores, sendo alicerce primordial para o alcance da felicidade.
A abrangência do afeto como premissa do seio familiar vai de encontro às necessidades básicas para o cuidado intergeracional mencionado por Oliveira; Marinho- Araújo (2010) e ao proposto pelo Comitê Científico do Núcleo Pela Infância (ABUCHAIM, et al, 2016, p.5):
O cuidado cotidiano de crianças pequenas é fundamental para que elas cresçam e se desenvolvam, para ser fisicamente saudáveis, emocionalmente seguras e respeitadas como sujeitos sociais. No processo de desenvolvimento, a criança necessita de interações positivas e de cuidados adequados, desempenhados por pessoas comprometidas com a sua saúde e bem-estar.
O emprego do termo “pessoas comprometidas” no trabalho publicado pelo Comitê supracitado aponta para a concepção de família que melhor atende ao pensamento contemporâneo, por definir um grupo social que não se prende aos laços sanguíneos, mas, sim, às relações de afeto e ações de cuidado e proteção mútuos (ABUCHAIM, et al, 2016). A família, desde os primórdios, atendeu a estes requisitos básicos; cuidado e proteção entre seus membros. Porém, as muitas transformações sociais que concederam a ela status de unidade econômica (RODRIGUES, 2009) influenciaram o andamento da vida privada, afastando-a da definição que a idealiza a partir destes vínculos afetivos que não são praticados por nenhum outro grupo, permitindo, assim, que outras instituições reguladoras, como o Estado e a Igreja, opinassem e ditassem regras para o andamento das relações privadas.
O Estadopor muito tempo formulou os tramites familiares com base na lei moral da Igreja. Esta, por sua vez, enraizou as diferenças entre homens e mulheres através da soberania masculina como provedor da casa e da mulher como a eterna mãe. O casamento entre pessoas de sexos diferentes é o modelo, historicamente, defendido pela Igreja e os laços matrimoniais são indissolúveis, ainda que os cônjuges não partilhem mais dos laços afetivos (CUNHA, 2010). Ainda na obra de Cunha (2010, não paginado):
A família natural foi adaptada pela Igreja Católica, que transformou o casamento em instituição sacralizada e indissolúvel, e única formadora da família cristã, formada pela união entre duas pessoas de diferentes sexos, unidas através de um ato solene, e por seus descendentes diretos, a qual ultrapassou milênios e predomina até os dias atuais.
Cunha (2010) atribui à Lei Canônica o destaque do sexo nas relações entre nubentes. Tal lei vigorava no período do Império Romano, mas em alguns aspectos, entre eles nas questões relativas ao matrimônio, ainda reflete nas práticas da Igreja Católica. Segundo ele, desse modo, o casamento tornou-se a única permissão para a prática sexual, cumprindo, assim, o mandamento sagrado da procriação. Percebe-se, nesta atrelação do casamento à única possibilidade moralmente aceitável do casal se tornar pais, a associação, ainda que implícita, entre o Estado e a Igreja para a elaboração do ordenamento familiar. Em 1916, no Brasil, o marco histórico para o direito familiar, a Lei n°
3.071 (BARRETO, 2013), evidência a influência do cristianismo na legislação sobre a família.
Para além da impossibilidade de ruptura com os laços matrimoniais, a Lei discorria sobre a capacidade relativa da mulher, a superioridade masculina através da família patriarcal e a discrepância entre os filhos gerados no matrimônio e os tidos fora do casamento (BARRETO, 2013), que recebiam a alcunha de legítimos e ilegítimos, respectivamente. Sobre os filhos ilegítimos, é pertinente a menção à Lei n°888, que tratava do reconhecimento dos filhos de um dos cônjuges fora do casamento. A nova legislação concebia o dever de prover o sustento para o filho bastardo, além de romper com o preconceito perene no qual a Lei 3.071 se apoiou (BARRETO, 2013).
No decorrer das décadas, não apenas o lugar dos filhos bastardos sofreu alteração nos documentos legais, o papel da mulher, atendendo a uma demanda global, também sofreu importantes transformações. Como dito, em 1916, a esposa tinha a sua capacidade colocada constantemente em xeque, cabendo-lhe o lugar secundário no andamento da família (BARRETO, 2013). Foi necessária, em 1962, a promulgação de uma lei para que a mulher tivesse o direito de exercer o poder familiar. Contraditoriamente, em caso de divergência sobre os filhos, a mulher teria que recorrer ao judiciário para se opor à decisão paterna (BARRETO, 2013), o que não impediu que esta Lei representasse um grande avanço no tocante à representatividade feminina.
Todas estas vicissitudes ocorridas no âmbito legal refletiram a busca por uma sociedade democrática de direito. A família, desde sempre concebida como o grupo social mais imponente, para atender a estas demandas igualitárias e solidárias, passa, então, a firmar-se no afeto, sendo considerada uma união pelo amor recíproco (BARRETO, 2013). Para Cunha (2010) o afeto é um motor social presente em todas as relações humanas, principalmente as que são desenvolvidas rotineiramente sob a intimidade do lar. Este autor ressalta ainda que o termo afetividade não aparece explicitamente nos Documentos Oficiais, mas as interpretações dos magistrados a partir das mudanças no Direito, advindas das transformações sociais, permitiram que outros tipos de relações, para além da consanguínea, fossem classificadas de família. Sobre esta centralidade do afeto, Rodrigues (2009, não paginado) escreve que:
Afirmado o afeto como base fundamental do Direito de Família atual, vislumbra-se que, composta a família por seres humanos, decorre, por conseguinte, uma mutabilidade inexorável, apresentando-se sob tantas e diversas formas, quantas sejam as possibilidades de se relacionar e expressar amor, propriamente dito.
Sobre os tipos de família presentes na sociedade moderna, Caniço; Bairrada; Rodríguez; Carvalho (2004) apontam vinte e uma formatações. Sobre as muitas formatações de família, Oliveira; Marinho-Araújo (2010, p. 101) acrescentam que “atualmente há uma diversidade de famílias no que diz respeito à multiplicidade cultural, orientação sexual e composições”.
· Família Díade nuclear;
· Família Grávida;
· Família Nucelar;
· Família Alargada;
· Família com prole extensa;
· Família Reconstruída;
· Família Homossexual;
· Família monoparental;
· Dança a dois;
· Família Unitária;
· Família de Co-habitação;
· Família Comunitária;
· Família Hospedeira;
· Família Adotiva;
· Família Consanguínea;
· Família com dependente;
· Família com fantasma;
· Família com acordeão;
· Família Flutuante;
· Família Descontrolada;
· Família Múltipla
Esta gama de constituições familiares não representa modelos fixos, em alguns destes tipos a principal característica é transitória, os autores explicam que uma família de determinado tipo pode evoluir para outro e preservar características simultâneas de outros tipos (2009). Em sociedades muito desiguais como a brasileira é possível que um tipo de família se transforme em outro tipo rapidamente, da mesma forma em que é possível que a mudança não represente uma evolução, mas, sim, um retrocesso. A inconstância econômica, as transformações culturais e as mudanças sociais podem impor às constituições familiares um ritmo acelerado de transformação, por isso é importante uma legislação abrangente e capaz de resguardar a todos os tipos de família.
Como exemplo dessa flexibilização de gênero, a Família Grávida que é distinguida pelo estado gestacional da mulher e que pode evoluir para a família nuclear, pois, este tipo é caracterizado pela presença de um único casal na casa e uma única descendência – pais e filhos, tal formatação é também designada de família simples (Caniço et al, 2009).
A família alargada é o oposto da família díade nuclear, uma vez que esta primeira é caracterizada pela coabitação de vários familiares, estando na mesma casa ascendentes, descendentes e/ou colaterais, também pode ser nomeada de família extensa (Caniço et al, 2009). A família díade nuclear é semelhante aos clássicos recém-casados sem filhos, uma união entre um homem e uma mulher sem filhos.
A família com prole extensa é aquela em que há uma variação de idade entre os descendentes, há a presença de crianças e jovens com idades e fases de desenvolvimento muitos distintas, designada também de família numerosa (Caniço et al, 2009). Na atualidade, a modalidade de família reconstruída vem se crescendo cada vez mais e requer, por sua característica principal, o cuidado para que os membros do clã possam se adaptar à nova fase, visto que muitas destas famílias podem ser formadas após relações traumáticas, haja vista que o que difere estas famílias da demais é o fato de um dos seus membros, no passado, já ter tido outra relação conjugal. A família reconstruída, ou família combinada ou recombinada implica a necessidade de adaptação à chegada ou à saída de um dos seus membros (Caniço et al, 2009).
Quando um dos cônjuges possui descendente, esta adaptação requer mais cuidados, pois, para a criança representa a ruptura com dos elos familiares importantes para ela (papai e mamãe) e a inserção de outros nestes lugares antes facilmente identificados. Para a criança o divórcio e um novo casamento dos pais pode significar um trauma. Portanto, sobretudo no processo de adaptação, as famílias reconstruídas necessitam de criar a própria identidade, com reajustes dos papéis familiares individuais e construção de novas relações entre os envolvidos na família, fazendo parte do agregado ou não (Caniço et al, 2009). A família reconstituída pode ser oriunda de falecimento, do divórcio ou de família monoparental delonga data (Caniço et al, 2009).
Se na família díade nuclear há a necessidade de cônjuges do sexo oposto, na família homoafetiva a principal característica é a união entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil, a partir da Resolução n° 175, de 14 de maio de 2013, ficou vedada a recusa, por meio das autoridades competentes, de celebração do casamento civil ou de conversão de união estável entre pessoas do mesmo sexo (BRASIL, 2013). Portanto, desde aquela data, o Brasil regulamentou o casamento homoafetivo, garantindo a estes casais os mesmos direitos que os casais heteroafetivos, entre eles o direito a adoção.
A família monoparental, como o próprio nome já aponta, é composta por um progenitor que co-habita com seus descendentes (Caniço et al, 2009). Uma família monoparental pode ser fruto de muitas situações: divórcio, falecimento, produção independente, abandono. Para Caniço et al (2009) a análise da evolução familiar monoparental é fundamental. Entende-se que muitos dos fatores que resultaram nesta configuração podem representar um trauma para os membros da família.
Na família dança a dois, não há a obrigatoriedade de descendência, diferente da família anterior, pois, para ser classificada como dança a dois só há a necessidade de que duas pessoas co-habitem. Sob o mesmo teto podem habitar tio e sobrinho, avô e neto, primos (Caniço et al, 2009). Segundo Caniço et al (2009) a escolha da nomenclatura dança a dois é devido a relação difícil e conflituosa que pode surgir da atribuição de papéis familiares. A família unitária pode ser a alternativa para pessoas que queiram fugir destas relações conflituosas possíveis no modelo anterior, uma vez que na família unitária a pessoa vive sozinha. Assim como na família monoparental, muitos fatores podem contribuir para que uma pessoa descida morar sozinha, o que não quer dizer, necessariamente, que ela não desenvolva relações afetivas com outras pessoas e que futuramente vá evoluir para outro tipo de família, em muitos casos a família unitária está atrelada à uma fase especifica da vida do sujeito (Caniço et al, 2009).
A família de co-habitação, a priori, pode ser confundida com a família alargada, porém, a principal característica da família de co-habitação é a inexistência de laços familiares e conjugais (Caniço et al, 2009). Neste modelo, pessoas até então desconhecidas co-habitam o mesmo espaço. Como exemplo, as repúblicas estudantis, nas quais estudantes, muitos de localidades diferentes, moram por um período determinado com pessoas desconhecidas e acabam desenvolvendo relações de afeto, solidariedade e amizade. Já na família comunitária, a principal característica é o fato de homens e mulheres e seus descendentes co-habitar em casas separadas, habitualmente próximas (Caniço et al, 2009). Neste modelo, as pessoas moram em comunidades que podem ser formadas levando em consideração uma característica que os uni; comunidades religiosas, por exemplo.
A família hospedeira apenas acolhe, por determinado tempo, algum indivíduo exterior a ela (Caniço et al, 2009). Crianças em situação de vulnerabilidade podem ser acolhidas por famílias desconhecidas até que lhes sejam asseguradas as garantias de retorno à família de origem. As famílias hospedeiras não se parecem com as famílias adotivas, porque, se na hospedeira a permanência da criança é estipulada, na família adotiva a criança se torna um membro legal daquela. Pessoas adotadas são recebidas no seio família permanentemente, passando, inclusive, a possuir os mesmos direitos que os filhos biológicos.
A família consanguínea é aquela em que há relação conjugal consanguínea (Caniço et al, 2009). Ou seja, pessoas com vínculos de parentesco se unem maritalmente. Quando há na família algum elemento que necessite de cuidado dos demais membros, esta é denominada de família com dependente. Casas com pessoas doentes e impossibilitadas de sobreviver sem o auxílio dos outros membros, são exemplos deste tipo de família.
As famílias com fantasma são aquelas em que ocorre o desaparecimento de um dos membros de forma definitiva, ou dificilmente reversível. Porém, mesmo ausente, este membro continua presente na dinâmica familiar, dificultando a reorganização das relações familiares (Caniço et al, 2009). As famílias acordeões diferem da com fantasma pelo fato de que a ausência de um membro é reversível. Como no caso de familiares que se ausentam por motivo de trabalho, ficando uma temporada longe, mas retornando ao termino deste período (Caniço et al, 2009).
As famílias flutuantes são aquelas que vivem constantes mudanças, seja de casa, seja de parceiros. Caracterizam-se pela instabilidade das relações, o que dificulta a criação de vínculos familiares ou extrafamiliares (Caniço et al, 2009). Nas famílias descontroladas existe um membro com problemas crônicos de comportamento, o que vai condicionar a estrutura familiar e gerar dificuldades na hierarquização desta (Caniço et al, 2009). São exemplos de famílias descontroladas: famílias com alcoólatras e outros tipos de vícios, com esquizofrênicos. As famílias múltiplas são aquelas que em sociedades monogâmicas sofrem preconceito pelo fato de um dos seus membros participar de mais de uma família, eventualmente com descendentes nas duas (Caniço et al, 2009). As relações poligâmicas são representantes desta classe de família.
Posto isto, o conceito de família descrito pelo IBGE é atual e condizente com a gama de famílias brasileiras. Em conjunto com os dizeres da Carta Magna de 1988, tal descrição abarca legalmente as variadas constituições ao categorizar família como o “conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, residente na mesma unidade domiciliar, ou pessoa que mora só em uma unidade domiciliar” (BRASIL, 2018). Assim sendo, a família moderna se volta para o seu principal objetivo que é o de proporcionar às novas gerações condições de sobrevivência e desenvolvimento. Para tanto, todo individuo precisa de um ambiente com condições que perpassam a afetividade e as garantias mínimas de provisão.
Dentro desta premissa o grande marco do Direito Familiar, como já foi mencionado, a Constituição destaca-se por atender aos anseios sociais e culturais da sociedade contemporânea possibilitando que todos os seus membros sejam amparados, ora pela afetividade, ora pela imposição da lei. Aqueles que se protegem pelo afeto são os que mais desfrutam do seio familiar, pois, repousam sob os cuidados de forma natural, sem a imposição que muitas vezes é traumática para todos os envolvidos. Seja através de relações de parentescos, seja por vínculos afetivos, de amizade e solidariedade estes escolhem partilhar da vida familiar. Os que são amparados pela lei são os que precisam recorrer a ela para terem resguardos seus direitos e nem sempre vivem relações harmônicas com os outros membros, mas, mesmo assim, recebem legalmente o direto de pertencer a uma família.
2 CONTEXTO HISTÓRICO, SOCIAL E LEGAL: A EVOLUÇÃO DA ESCOLA COMO REPRESENTANTE DO SABER
A evolução das sociedades civilizadas impôs à necessidade de mecanismos que fossem capazes de propagar a ordem coletiva de forma ampla e eficaz. Assim sendo, a transmissão cultural apenas por meio da família já não mais era suficiente (LUCKESI, 1994), até mesmo para a sobreposição dos valores individuais propagados pelo seio familiar. Nesse contexto de destaque da ordem social, a escola emerge como a instituição mais preparada para esta tarefa (TOSCANO, 1975). Como agente que compartilha os valores sociais e opera para a ordem social, a escola não passa incólume às transformações que ocorrem na sociedade, pelo contrário, ela a vivência, sofre com elas, e se altera a partir delas, participando, assim, de um ciclo vicioso necessário para a sua validação como reguladora social. Neste capítulo, o tema será a formulação da escola com agente socializador a partir dos seus aspectos históricos, sociais e legais.
2.1 Contexto Histórico
O homem sempre procurou formas de sobrevivência,

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