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História das Religiões no Brasil

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Prévia do material em texto

História das 
Religiões no Brasil
Material Teórico
Responsável pelo Conteúdo:
Prof. Dr. Edgar Silva Gomes
Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
• Introdução;
• A Chegada dos Colonizadores Portugueses;
• A Política Missionária e sua Cosmovisão;
• Os Jesuítas e a “Colonização” Indígena;
• Padroado Régio.
 · Entender o processo de colonização e a relação do Estado português 
com a religião cristã missionária.
OBJETIVO DE APRENDIZADO
A Cruz e a Espada
na Terra de Santa Cruz
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem 
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua 
formação acadêmica e atuação profissional, siga 
algumas recomendações básicas:
Assim:
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte 
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e 
horário fixos como seu “momento do estudo”;
Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma 
alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;
No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos 
e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você 
também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão 
sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;
Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o 
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e 
de aprendizagem.
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte 
Mantenha o foco! 
Evite se distrair com 
as redes sociais.
Mantenha o foco! 
Evite se distrair com 
as redes sociais.
Determine um 
horário fixo 
para estudar.
Aproveite as 
indicações 
de Material 
Complementar.
Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma 
Não se esqueça 
de se alimentar 
e de se manter 
hidratado.
Aproveite as 
Conserve seu 
material e local de 
estudos sempre 
organizados.
Procure manter 
contato com seus 
colegas e tutores 
para trocar ideias! 
Isso amplia a 
aprendizagem.
Seja original! 
Nunca plagie 
trabalhos.
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
Introdução
A conquista e evangelização do Continente Americano e, em nosso caso de es-
tudo, a porção de terras que hoje compõe o Brasil, deu-se dentro de um panorama 
de expansão comercial através das novas rotas marítimas que foram sendo explo-
radas a partir da Península Ibérica que durante os séculos XV e XVI fizeram das 
nações que ocupavam essa porção de terras, portugueses e espanhóis, as grandes 
protagonistas da economia e exploração comercial.
A Europa ainda predominantemente rural vinha sofrendo com várias alterações 
políticas em relação à ocupação dos espaços, de modo que durante todo o século 
XIV houve uma série de revoltas de camponeses contra os seus senhores, estagna-
ção da economia, alterações climáticas severas e uma das maiores epidemias que 
se tem notícia na nossa história e que devastou grande parte da população euro-
peia da época, a “peste negra”, que durou quase cinco anos, entre 1347 e 1351.
Todas essas questões parecem não dizer muito ao nosso tema, mas ao contrário, 
isso nos remete muito e este é o motivo pelo qual estamos tratando de tais aconte-
cimentos, que se juntaram a outros, como a formação dos Estados nacionais, que 
durou praticamente três séculos até tomar as características atuais com Espanha, 
Portugal, França e Inglaterra, largando na frente no processo de formação na-
cional e demarcação de fronteiras que são praticamente as existentes ainda hoje 
– tudo isso se deu nesse contexto. Outro fator importante foi, na segunda metade 
do século XIV, a expulsão dos mouros de toda a Península Ibérica, ou seja, de 
Portugal e Espanha, países os quais já estavam praticamente formados territorial e 
politicamente, afinal, viveram uma época de certa estabilidade política, o que deu 
condições para que procurassem expandir as suas fronteiras para além-mar. 
Mas por que buscavam expandir as suas fronteiras por meio das rotas do mar atlântico?
Ex
pl
or
Isto é mais uma das histórias que aconteceram no século XV, especificamente 
no ano de 1453, quando o Império Romano do Oriente, em Constantinopla, caiu 
para os mouros, estes que rebatizaram o País com o nome de Istambul, dominando 
o estreito de Bósforo, importante canal de passagem de mercadorias comercializa-
das pelos grandes mercadores italianos. Portanto, essa região foi se tornando uma 
rota cada vez mais cara, afinal, apesar de os mouros serem os senhores da região, 
o comércio era permitido, mas as taxas ao trânsito marítimo estavam cada vez 
mais caras, o que também encarecia cada produto que era distribuído ao longo da 
Europa, em especial até a Península Ibérica.
Foi a partir daí que começou a saga de portugueses e, em seguida, espanhóis, 
ambos os povos na caça de novas terras e produtos. Porém, como eram reconhe-
cidamente “impérios” ligados ao Papa e aos cristãos, em suas jornadas comerciais 
estava o componente religioso intrinsecamente atrelado à cada conquista.
8
9
A Chegada dos Colonizadores Portugueses 
Portugal iniciou as suas aventuras marítimas em meados do século XIII e 
perpassou todo o século XIV se arriscando no comércio marítimo de longa distância, 
porém, ainda muito aquém dos grandes navegadores italianos, representados 
especialmente por genoveses e venezianos que, de certa forma, ajudaram a 
desenvolver a navegação portuguesa pelo constante contato comercial que faziam.
Ao final do século XV, o pequeno país encravado ao Sul da Península Ibérica já 
concorria de igual para igual com os italianos e se arriscava cada vez mais em suas 
aventuras marítimas rumo à África e ao Oriente, onde alcançou as terras chinesas 
e indianas. Como dito, tal experiência muito se deve ao contato com os italianos 
que durante anos a fio fizeram de Lisboa um entreposto comercial importante ao 
seu próprio comércio. 
Outro fator que, de certa forma, facilitou a expansão marítima portuguesa foi a 
sua posição geográfica, pois assim como a Espanha, ambos em situação privilegiada, 
sendo banhados pelo mar atlântico, este que se “oferece” todo à exploração, de 
modo que Portugal e Espanha se aproveitaram dessa “porta ao novo” e foram se 
arriscando cada vez para mais longe em suas buscas por terras e mercadorias. 
Figura 1
Fonte: Wikimedia Commons
Ao final do século XV, apesar de estar praticamente resolvida cada questão in-
terna em relação às fronteiras e à política, a sociedade passava por um processo de 
estagnação econômica. Foi aí que se juntaram o desejo e a necessidade, ou seja, o 
desejo de expansão para buscar novas formas de acúmulo de bens e mercadorias, 
pois a receita da Coroa estava diminuindo; e a necessidade econômica mercantilis-
ta que, então, entrava no cenário, ditando que um país, para ser considerado rico, 
9
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
necessitava acumular terras, bens e metais preciosos – metalismo –, além de possuir 
matéria-prima, exportar mais e importar menos, protegendo o seu comércio, em es-
pecial o de suas colônias e protetorados ultramarinos. Havia também a necessidade 
de ocupar uma nobreza ociosa e uma população rural com menos o que fazer.
Nesse contexto, Portugal fez como que um “pacto nacional”, onde a maioria 
da sociedade se viu envolvida no projeto de expansão marítima, ficando de fora 
apenas os grandes proprietários de terras, os quais temiam a falta de camponeses 
para tocar os seus negócios.
[...] além de ser uma boa forma de ocupar os nobres e motivo de prestígio; 
para os nobres e os membros da Igreja, servir ao rei ou servir a Deus 
cristianizando “povos bárbaros” resultava em recompensas e em cargos 
cada vez mais difíceis deconseguir, nos estreitos quadros da Metrópole; 
para o povo, lançar-se ao mar significava sobretudo emigrar, tentar uma 
vida melhor, fugir de um sistema de opressão (FAUSTO, 2002, p. 23).
Importante!
Fique atento(a) à frase “[...] servir ao rei ou servir a Deus cristianizando ‘povos bár-
baros’ resultava em recompensas e em cargos [...]”, pois mais adiante retomaremos o 
seu sentido prático.
Importante!
Seguindo com os “projetos” desse grande pacto nacional em torno do 
envolvimento português na busca de riqueza para além de suas fronteiras europeias, 
podemos nos perguntar sobre o que tinha de tão interessante em outros lugares. 
O que hoje nos parece banal, naquele período tinha uma grande importância para 
uma melhor qualidade de vida dos povos europeus. 
Durante cerca de três séculos [isto é, do século XVI ao XVIII...] a atividade econômica das 
modernas nações europeias esteve vinculada ao sistema mercantilista. Cada nação possuía 
um modo próprio de exercer o seu mercantilismo, de modo que seria arbitrário dizer que ele 
era um sistema exatamente igual em todos os casos. De modo geral, podemos dizer que o 
mercantismo apresentou quatro características:
1. Balança comercial favorável [...];
2. Protecionismo [...];
3. Exclusivo colonial [...];
4. Metalismo: o metalismo consistia na medida utilizada para se saber o quanto uma nação 
estava rica ou não. O acúmulo de metais era sinal dessa riqueza.
Fonte: https://goo.gl/ea1ArP (grifos do autor).
Ex
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or
As especiarias cumpriam vários papéis, indo da sofisticação à conservação dos 
alimentos – comumente, muitas das ervas encontradas em regiões distantes tinham 
função terapêutica –, além, é claro, do tão comentado e cobiçado metal precioso, 
considerando o ouro, a prata e ainda as pedras preciosas. Segundo Fausto (2002, 
10
11
p. 26), a especiaria “[...] provém do latim especia, termo usado pelos médicos para 
designar substância. O termo ganhou depois o sentido de substância muito ativa, 
muito cara, utilizada para vários fins, como condimento [...] remédio ou perfumaria”.
Podemos citar algumas especiarias 
que foram muito caras e raras nesse 
período da Europa e que quando 
chegavam nesse continente assu-
miam valores exorbitantes: noz-mos-
cada, gengibre, canela, cravo e na-
queles tempos, sobretudo, pimenta, 
a ponto de se usar a expressão “caro 
como pimenta”.
As mercadorias eram variadas e o comércio ultramarino se expandia com vigor 
nos séculos XV e XVI. Para além da busca por especiarias que conservavam e 
davam melhor sabor aos alimentos mantidos “longe do frescor” natural, pois em 
razão dos rigorosos invernos, eram salgados ou defumados para durar mais tempo 
e serem consumidos, era costume disfarçar o gosto ruim com essas mercadorias 
advindas de longe e com preço muito alto, daí se deduz também que o consumo foi 
dedicado, em rigor, à elite da época.
Não demorou muito tempo para ocorrer uma variação de ofertas de produtos, 
tais como as sedas do Oriente, ou mesmo especiarias aromáticas extraídas de flo-
res e madeira para diversos fins; de modo que corantes, peixes e drogas medici-
nais se diversificavam com o encontro de culturas e das trocas de conhecimento; 
porém, não demorou muito para que os navegadores ibéricos e, mais tarde, de 
outras nações encontrassem uma mercadoria muito valiosa: seres humanos afri-
canos para suprir a falta de mão de obra, primeiro na Europa e depois nas novas 
colônias que foram fundadas na América a partir do século XVI, principalmente 
em regiões onde não se conseguia escravizar os habitantes autóctones, conheci-
dos como indígenas. 
O encontro entre europeus e africanos foi de suma importância para a implan-
tação do cristianismo nas colônias americanas. Os negros africanos e os indígenas 
americanos eram obrigados, pelos impérios europeus, à aceitação de uma fé que 
lhes era totalmente estranha. O estabelecimento de feitorias na costa africana co-
meçou a comercializar seres humanos a partir do ano de 1441. “Estes foram, no 
começo, encaminhados a Portugal, sendo utilizados em trabalhos domésticos e 
ocupações urbanas” (FAUSTO, 2002, p. 29). Ou seja, os escravizados africanos 
inicialmente exerciam trabalhos domésticos e urbanos. 
Apenas com o estabelecimento da colônia portuguesa na “Terra de Santa Cruz” 
e a falta de mão de obra indígena – povo que se rebelava contra os seus dominado-
res – é que teve início o mais ultrajante tráfico da história da humanidade, em que 
milhões de africanos foram desenraizados, trazidos para terras distantes, maltrata-
dos e ainda receberam a imposição de uma fé estranha à sua cultura.
11
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
Não se trata de juízo de valor sobre a questão da imposição religiosa, mas sim-
plesmente do relato de como se deu a cristianização de milhões de negros – sem 
contar o extermínio e a imposição do cristianismo aos nativos americanos.
Após o percurso que Portugal fez à África e ao Oriente, vejamos a sua chegada 
à América.
Espanha e Portugal sempre disputaram cada palmo de avanço marítimo, de 
modo que antes de chegar à América, ao longo do século XV concorreram por al-
gumas ilhas do Atlântico, tais como Canárias, Madeira, Açores, Cabo Verde e São 
Tomé. Em tais localidades, diferentemente do que ocorria na África e no Oriente, 
estabeleceram-se, ou seja, ocuparam as suas terras e fizeram plantações de cana-
-de-açúcar, inserindo o trabalho escravo de negros africanos, plantando trigo etc. 
Segundo Boris Fausto (2002), essas ocupações entraram em declínio mais tarde 
devido à concorrência com os produtos oferecidos, principalmente, pelo Brasil. 
Ademais, uma curiosidade trágica em relação à ilha de São Tomé é que:
Próxima da Costa Africana, especialmente das feitorias de São Jorge da 
Mina e Axim, a ilha contou com abundante suprimento de escravos. Nela 
existiam engenhos que, segundo uma descrição de 1554, chegavam a ter 
de 150 a 300 cativos. São Tomé foi sempre um entreposto de escravos 
vindos do Continente para serem distribuídos na América e na Europa, e 
esta acabou sendo a atividade principal da ilha, quando no século XVII a 
indústria açucareira atravessou tempos difíceis (FAUSTO, 2002, p. 30).
É importante frisar que, apesar de “descoberto”, o Brasil não causou grande 
comoção na Metrópole; a causa pode ter sido a ansiedade que portugueses e es-
panhóis tinham para encontrar um caminho mais curto às Índias. Nesse intuito, 
partiu de Lisboa uma expedição comandada por Pedro Álvares Cabral, figura um 
tanto obscura na história, mas que carrega o fardo de ter ancorado no Brasil em 
1500 pensando ter encontrado as “Índias”. Segundo Holanda (2003, p. 43): “Le-
vava consigo marinheiros ilustres como Bartolomeu Dias e Nicolau Coelho, além 
de numerosos soldados, perto de mil e quinhentos, e frades de São Francisco, os 
primeiros religiosos mandados de Portugal àqueles lugares”.
Estamos chegando ao ponto principal do início desta nossa discussão sobre a 
“conquista cristã” do Brasil.
Junto aos marinheiros viajavam religiosos que acompanhavam as expedições 
com o intuito de fazer, não apenas, a conquista material aos monarcas portugueses 
– e espanhóis –, mas era preciso conquistar também as almas dos infiéis para si e 
a Deus, em nome do papado, sendo este outro poder constituído naquele contexto 
e com grande influência sobre reis e imperadores, afinal, monarcas e papas tinham 
um compromisso entre si e por escrito – tratavam-se de documentos papais, as bu-
las, conhecidas em conjunto como padroado régio e que trataremos mais adiante. 
12
13
Os marinheiros atracaram na Costa Brasileira, nas proximidades de Porto Seguro, 
Bahia, momento em que apenas uma costa banhada pelo mar era conhecida e que 
deram o nome de Monte Pascoal – isto devido à proximidade com a Semana Santa, em 
que se comemora a Páscoa católica. À terra inicialmente foi dado o nome de Vera Cruz.
Tentaram fazer contato com a população, de modo que segundo Holanda (2003, 
p. 44): “Alguns homens, pardos e nus, são vistos à beira-mar.Um dos comandan-
tes desce à terra e busca entender-se com eles, mas sem resultado. Finalmente, 
depois de trocados alguns presentes e, por ser tarde, voltam a bordo”.
Esse primeiro contato foi significativamente superficial, enquanto que uma mis-
sa foi celebrada no local do “Descobrimento” no domingo seguinte – atualmente, o 
local é identificado como a baia da Coroa Vermelha. Segundo Holanda: “Armou-se 
ali um dossel, levantou-se altar e celebrou missa Frei Henrique de Coimbra, acolita-
do por outros sacerdotes. Acabando a missa e o sermão, em que o frade se referiu 
ao descobrimento e invocou o sinal da cruz” (HOLANDA, 2003, p. 44).
Observe-se que nos livros de história em geral essa missa é citada, assim como 
temos algumas pinturas “eternizando” tal momento para a história, além de quadros 
posteriores e baseados em relatos; um detalhe, porém, é sempre deixado de lado: 
tratava-se de um costume, quase que uma obrigação, de os religiosos levarem con-
sigo um altar portátil para tais ocasiões, pois não existiam locais apropriados para 
a celebração litúrgica em todos os cantos por onde andavam – adiante figura uma 
ilustração com a explicação do que seria um altar portátil, o qual também pode ser 
visto em diversos museus coloniais pelo Brasil, em especial, nos museus mineiros.
Foi um “descobrimento não intencional”, de acordo com alguns historiadores 
e cronistas portugueses da época; na realidade, a Metrópole deixou as terras des-
cobertas ao léu por mais de três décadas, afinal, para os portugueses aquele lugar 
não parecia tão rentável quanto às suas feitorias na África, China ou Índia. Segun-
do Karnal e Tatsch (2015, p. 10): “Por mais de duzentos anos, o documento que 
temos na conta de preciosíssima certidão de nascimento do Brasil ficou na Torre 
do Tombo, em Portugal, sem que ninguém tivesse um interesse específico por ele”. 
Importante!
A necessidade de reduzir o volume de carga a transportar nas grandes viagens marítimas, 
obrigou a que os sacerdotes possuíssem uma arca como esta, que integrasse todas as 
alfaias litúrgicas necessárias à celebração da missa, quer a bordo das naus, quer nas terras 
onde não existiam ainda locais de culto apropriados. Todos os Domingos e Dias santos, 
era o sacerdote obrigado a celebrar missa. Estas missas tinham a particularidade de não 
ter consagração, não havendo por conseguinte comunhão, porque tal não era permitida 
a bordo. Eram denominadas “missas secas”. Veja a fi gura a seguir: https://goo.gl/4AfPWw
Trocando ideias...
Fonte: https://goo.gl/53VERV
13
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
A chegada e recepção dos portugueses pelos nativos foi algo que, segundo 
conta a história, de início não foi muito traumático. As narrativas de época giram 
sempre em torno das trocas de presentes e da aproximação amigável. Diz-se que no 
primeiro de maio alguns marinheiros saíram do navio, levando consigo a “bandeira 
de Cristo”, onde a intenção era “plantar” a Cruz na terra descoberta, sendo o local 
escolhido uma região próxima ao rio Mutari. “Pregadas as armas reais, erigiu-se o 
cruzeiro em lugar bem visível. Ao lado foi erguido o altar. Frei Henrique celebrou 
então a segunda missa na terra de Vera Cruz. Acabada a cerimônia e findado o 
sermão, distribuíram-se cruzes entre os índios” (HOLANDA, 2003, p. 45).
Os reis católicos de Portugal e Espanha apoiavam-se na instituição religiosa 
como forma de legitimar o próprio poder, de modo que teólogos, desde o século 
XIII, tentavam dar outra interpretação ao poder real contratualista entre reis e 
vassalos que vigorava na Idade Média, onde o rei tirano poderia ser contestado por 
seus súditos. Para evitar a dissolução de reinos católicos, “[...] religiosos e apoiantes 
da Monarquia elaboraram uma teoria rudimentar de absolutismo, que exaltava o 
poder do rei, conferido por Deus, sobre os direitos dos nobres e das outras classes 
dos reinos” (WILLIAMSON, 2012, p. 69). Essas teorias se davam em reação às 
várias revoltas baroniais que ocorriam nesse contexto na Península Ibérica.
Tal concepção teórica de poder real absoluto se iniciou com as mencionadas 
revoltas baroniais, sendo adotadas sucessivamente nos códigos legais dos reinos e 
posteriormente servindo para consolidar a posse e administração das terras conquistadas 
pelos reis católicos em suas aventuras ultramarinas, através de concessões e acordos 
pontifícios e que abordaremos mais adiante; porém, aqui cabe ainda algum exemplo 
sobre esse conceito de soberania forjado por teólogos católicos que estão na gênese 
absolutista: “Este conceito de soberania já surgira em Siete Partidas, o grande código 
legal de Castela, produzido na década de 60 do século XIII sob os auspícios de Afonso 
X, o Sábio, e adotado como Lei da terra em 1348 (WILLIAMSON, 2012, p. 69). Em 
1439, D. João II de Castela reforçou tal conceito, vejamos: 
O conceito em 1348: “Os reis são vicários de Deus, cada um no seu reino, colocados acima 
do povo para preservarem a justiça e verdade nas questões temporais”.
E o mesmo conceito, então reforçado em 1439: “De tal ordem é o poder do rei que todas as leis 
e todos os direitos estão abaixo dele, e esta posição foi-lhe concedida não pelos homens, mas 
por Deus, cujo lugar o rei ocupa no que toca aos assuntos temporais”.
Ex
pl
or
Neste ponto, o nosso conteúdo já deixa clara a vinculação entre a cruz e a 
espada na Terra de Santa Cruz, relação que não foi desfeita em nenhum momento 
de nossa história e em cada contexto a percebemos com nuances diferentes.
Passamos agora a nos dedicar à política missionária, a qual desempenhada 
principalmente pelos jesuítas, mais a cosmovisão religiosa lusitana que direcionou 
e, às vezes, entrou em conflito com os missionários. 
14
15
A Política Missionária e sua Cosmovisão 
No contexto da conquista das terras brasileiras pelos portugueses, que se deu 
efetivamente a partir da instalação do primeiro Governo-Geral na Bahia de Todos 
os Santos, tendo Tomé de Souza como governador-geral nomeado pelo rei, depois 
do fracasso das capitanias hereditárias – instituídas em 1534 por D. João III –, 
houve o acompanhamento dos padres da Companhia de Jesus, estes conhecidos 
como inacianos ou jesuítas. 
Para saber mais sobre as capitanias hereditárias, leia o seguinte capítulo:
PRADO, J. F. de A. O regime das capitanias. In: HOLANDA, S. B. de. História geral da civili-
zação brasileira: do Descobrimento à expansão territorial – a época colonial. t. 1. v. 1. 13. 
ed. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 2003. p. 111-122.
Ex
pl
or
A administração da Colônia portuguesa, apesar da criação do Governo-Geral 
em 1549, continuou sendo assunto da Metrópole; na realidade, a Colônia era 
tratada como uma extensão do Reino. Assim, questões gerais sobre política eram 
debatidas e decididas pelo rei e por seus conselheiros, estes que integravam o 
Conselho de Estado, de modo que para cada assunto havia um conselho que 
tratava de suas questões, sendo os mais importantes, junto ao Conselho de Estado, 
os de assuntos relativos à justiça, economia e religião. Foi apenas no ano de 1641 
que: “D. João IV criou o Conselho Ultramarino para discutir assuntos coloniais, 
mas a agenda deste conselho tinha frequentes sobreposições com as agendas dos 
restantes” (WILLIAMSON, 2012, p. 191). 
Entre as inúmeras atribuições administrativas para governar essa porção de 
terras portuguesas no ultramar havia ainda a instrução dos “serviços espirituais”, 
pois, segundo Holanda (2003, p. 128): “No esboço do Estado que se ia assim 
instituindo na América Lusitana, eram algumas das peças verdadeiramente essen-
ciais, segundo os critérios traçados pelos interesses e pela experiência ultramarina 
portuguesa”; ou seja, não há conquista sem um fator agregador e a religião era tal 
diferencial na Europa, afinal, ainda naquele contexto era um espaço de sociabilida-
de que os monarcas católicos não abriam mão de usar para os seus fins políticos. 
Durante mais de três séculos, a religião foi instrumentalizada pelos interessesde 
Estado sendo, inclusive, bastante comum ouvir que a Igreja foi um dos braços ad-
ministrativos do Estado durante todo o período colonial, chegando aos primeiros 
anos de País independente, que compreende quase todo o século XIX, ou seja, o 
período monárquico brasileiro. 
Da mesma forma, como não havia dado certo a iniciativa de se constituir uma 
colonização eficiente através da doação de terras para “capitães-hereditários”, o clero 
que estava por aqui também não cumpriu o seu papel evangelizador como se esperava – 
pelo menos é o que podemos admitir segundo correspondência transcrita por Holanda 
(2003), em que o inaciano Manoel da Nobrega se queixava do desregramento do 
15
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
clero colonial. Junta-se ao laxismo religioso a precariedade às condições de missionar 
para aqueles que realmente desejavam evangelizar na Colônia, pois a Coroa não os 
mantinha decentemente, segundo o seu dever de padroado. Nobrega também escreveu 
sobre a falta de compromisso do clero que aqui encontrou: 
“Ca há clérigos”, dizia Nóbrega, em 
carta de abril de 1549, “mas he a es-
coria do que de la vem [...] nom se 
devia consentir embarcar sacerdote 
sem ser sua vida muyto aprovada, 
porque estes destruem quanto se 
edifica”. Já antes disso, tinha dito o se-
guinte: “Dos sacerdotes ouço cousas 
feias” (sic) (HOLANDA, 2003, p. 128).
Apesar de ser destacada uma ordem religiosa, como a dos jesuítas, que tinha 
como missão expandir a fé católica e recuperar o terreno que estavam perdendo na 
Europa aos cristãos reformados, esses religiosos que acompanharam o governador-
geral para instituir, na Colônia, uma administração mais eficiente do que havia sido o 
período anterior, encontraram muitos obstáculos, entre os quais o pequeno número 
de pessoas para cumprir todo o ordenamento jurídico e religioso a que se propunham.
Segundo Holanda (2003, p. 128), “[...] sobre esse caos e miséria tentavam os 
padres e irmãos da Companhia implantar alguma figura de ordem, mas o trabalho 
necessário era muito para tão pouca gente. Reclamava o superior da missão que 
lhe mandassem um vigário-geral [...]”. Os padres precisaram cumprir inúmeras 
funções e, no final do ano de 1549, chegou mais um membro da Companhia para 
ser vigário da igreja de Salvador, o padre Manuel Lourenço. 
Nobrega se desdobrava para aumentar o número de religiosos no Brasil, inclusive, 
partiu desse o pedido para que se instalasse na Colônia um bispado, alegando que em 
outras partes do Império Português esse posto já havia sido instalado e ocupado por 
uma autoridade episcopal. O inaciano, sabendo o que ocorria em algumas partes, 
solicitava um bispo para trabalhar – e não para enriquecer – nessa colônia, alertando 
que não era ao bispo “[...] fazer-se rico, porque a terra é pobre, mas para buscar as 
ovelhas tresmalhadas do rebanho de Jesus Cristo” (HOLANDA, 2003, p. 129). 
O pedido de Nobrega não tardou a ser atendido pelas autoridades da Metró-
pole, e o Brasil ganhou a sua primeira diocese, em São Salvador, em fevereiro 
de 1551, por meio da bula Super Specula Militantis Ecclesiae do Papa Júlio 
III, deixando a Colônia de ser sufragâneo da Diocese de Funchal, esta que 
respondia pelas questões religiosas da Colônia até a criação dessa diocese, 
passando a responder diretamente à Diocese de Lisboa, a partir da chegada do 
primeiro bispo nomeado para assumir as funções no Brasil e que tomou posse 
no ano de 1552. Tratava-se de D. Pedro Fernandes Sardinha. “Com o governo 
eclesiástico, associado, assim, ao temporal completava-se a estrutura adminis-
trativa do Brasil” (HOLANDA, 2003, p. 129). 
16
17
Segundo Fausto (2002, p. 54): “As duas instituições básicas que, por sua natu-
reza, estavam destinadas a organizar a colonização do Brasil foram Estado e Igreja 
Católica. Embora se trate de instituições distintas, naqueles tempos uma estava 
ligada à outra”. Devemos entender também que naqueles tempos os conceitos de 
cidadania e pessoa, com direitos e deveres, simplesmente não existiam, de modo 
que a livre escolha de uma religião era vedada a uma pessoa comum.
Os anos em que o bispo esteve à frente da Diocese de São Salvador da Bahia 
foram de conflitos entre os inacianos, o clero que acompanhava o bispo e D. Pedro 
Sardinha. O bispo veio a falecer no ano de 1556 devido ao ataque de índios. Pelo 
direito de padroado, a nomeação do próximo bispo dependia do monarca portu-
guês. Ademais, esta era a única diocese em território brasileiro naquele momento, 
de modo que: “Além da jurisdição no território de seu próprio bispado, delimitada 
pela bula de criação, D. Pedro Fernandes Sardinha administraria espiritualmente 
as demais terras do Brasil na qualidade de ‘comissário apostólico’ munido de todas 
as faculdades” (MATOS, 2003, p. 164).
Figura 1 – Monumento ao bispo Sardinha, Salvador, BA
Fonte: Wikimedia Commons
Os conflitos entre os jesuítas e o bispo D. Pedro Sardinha se deram especial-
mente pelo modo de catequese que os inacianos adotaram para converter os ín-
dios. A visão de mundo elitizada e nobre do bispo encontrava resistência no seio 
17
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
da catequese dos padres da Companhia de Jesus. Para o bispo, a crença católica 
deveria estar de acordo com a cultura lusitana – e não o contrário. Ainda segundo 
o bispo, os padres faziam muitas concessões à cultura indígena, principalmente nos 
colégios comandados pelos jesuítas, onde estudavam brancos e filhos de índios, 
“[...] assim sendo a única forma de converter o índio era a sua integração total no 
mundo cultural do colonizador. A partir de então, foi essa diretriz vencedora e ado-
tada na tarefa de conversão” (MATOS apud AZZI, 1987). 
Entre as exigências do bispo estava a troca de nome dos curumins, no momento 
do batismo, por um nome português, pois “[...] representava, assim, não só a vitória 
da fé católica sobre as crenças indígenas, mas também a imposição do domínio lusi-
tano na nova terra” (MATOS apud AZZI, 1987). Tal determinação política de forma 
missionária colocava em risco os poucos avanços alcançados pelos inacianos, afinal, 
como impor uma condição de vida totalmente nova para uma cultura muitas vezes 
milenar sem entrar em sérios conflitos, sem o perigo de quebrar o encantamento que 
os nativos tinham com as suas raízes. A árdua tarefa dos padres da Companhia de 
Jesus em converter em cristãos os índios não era facilitada pelo bispo. 
Segundo Thales de Azevedo (1978), houve “choque de mentalidades” entre o 
bispo e os jesuítas, enquanto que Nobrega o reconhecia como um religioso “muito 
zeloso da salvação dos cristãos”. O mundo intelectual e o contexto social do qual o 
bispo foi produto teve como parâmetro de civilizado/civilização o modelo europeu, 
sendo esse o universo que formou a cosmovisão de mundo “culto” a ser disseminado, 
a servir de modelo para a conversão dos “gentios” do “Novo Mundo” e de outras 
partes, tais como África e Ásia, onde o modelo cristão de sociedade, apesar de 
toda a degradação observada pelos próprios europeus, deveria ser seguido, sendo 
a Europa o padrão e o europeu o representante da raça escolhida para converter 
o mundo e, diga-se de passagem, dando preferência ao modelo cristão dos países 
ibéricos, incluindo os seus monarcas “mui católicos”. 
Voltemos nossa atenção ao bispo Sardinha, quem nesse interim se tornou o 
representante da mentalidade europeia culta, de maneira que o seu modo de enxergar 
o mundo deveria prevalecer, afinal: “É na verdade um eclesiástico ilustre, provindo 
da Diocese de Évora, bacharel em Teologia pela Sorbonne, então acreditada 
faculdade de Teologia, onde estivera matriculado no Colégio Santa Bárbara, que 
também frequentara Loyola” (AZEVEDO, 1978, p. 43); nessa universidade, muito 
famosa ainda nos dias atuais, passaram por suas carteiras muitos dos alunos que 
vieram a fundar a Companhia de Jesus, além de outros que foram mandados para 
lá estudar, como intelectuais renomados de seu tempo. 
Como se vê, osjesuítas também são formados nas melhores faculdades; em 
Portugal, temos a Universidade de Coimbra, referência em estudos teológicos e de 
Direito nesse contexto, mas a diferença entre esses e o bispo é que “[...] chocam-se 
com certa veemência as mentalidades que representavam – o bispo, como homem 
da Idade Média, e o jesuíta, culto também e zeloso, orientando-se pelo espírito da 
Contra Reforma [...]”; quer dizer que os inacianos estavam agindo dentro de uma 
nova forma de atuar no mundo, “[...] tanto no sentido da luta contra a heresia 
18
19
luterana quão intransigente na peleja pela ortodoxia católica que daí a anos se 
definiria em Trento [...]”, ou seja, o choque se dava na nova concepção de tratar 
determinados problemas morais e pastorais, uma vez que “[...] ambos trazem uma 
formação marcada pelas mesmas doutrinas filosóficas e teológicas derivadas do 
aristotelismo, sobretudo quanto à natureza dos homens achados pelos europeus 
nos mundos novamente descobertos” (AZEVEDO, 1978, p. 44-45).
Os jesuítas se decepcionaram com os colonos europeus que aqui encontraram 
e durante certo período, sem uma autoridade que lhes coibisse, puderam, de 
certa forma, punir o desregramento dos homens e das mulheres que aqui vivam; 
porém, com a chegada do bispo e do clero secular que o acompanhava, estes 
que apresentavam os mesmos graves defeitos dos colonos que aqui estavam, os 
inacianos não puderam mais usar de sua autoridade moral para coibir os residentes 
que os tinham deixado escandalizados, de modo que “[...] com a crua realidade que 
depararam na antiga Vila do Pereira [...] num processo que escapa à orientação e 
a ordenação da Metrópole e onde tudo favorece a expansão do individualismo na 
luta pela vida, a cobiça sem adequados freios [...]” (AZEVEDO, 1978, p. 45). 
Os jesuítas vieram com a ilusão de encontrar um grupo de colonos já adaptados 
ao meio ambiente, e que pudessem colaborar com a conversão dos gentios que, se-
gundo os mesmos, achavam se tratar de um grupo de seres ingênuos e inocentes. 
Assim, devido à decepção inicial, os padres da Companhia precisaram encontrar 
uma forma de catequizar os gentios sem a colaboração de seus “conterrâneos”, 
porém, o bispo e seus padres foram complacentes aos colonos e isso chocou os 
inacianos – inclusive, o clero secular que aqui chegou começou a constituir aman-
tes, o que também ocorria em Portugal, tanto que, segundo Azevedo (1978, p. 
46): “Em Portugal já grassava o mal, apesar das medidas enérgicas tomadas por 
Gregório VII, séculos antes, para fazer cumprir a antiga Lei eclesiástica do celibato 
clerical”, de modo que o antigo costume português da mancebia clerical não foi 
totalmente reprimido. 
O clero que veio ao Brasil no período anterior aprofundou essa situação amoral. 
No afã de coibir tal condição do clero e dos colonos, os jesuítas restringiram a 
participação desses homens e mulheres aos sacramentos, coisa que com a chegada 
do bispo não seguiu adiante. A tão sonhada “Terra sem males” projetada pelos 
inacianos não se confirmou devido à situação encontrada, como dito, na chegada 
dos religiosos em 1549. Azevedo (1978, p. 47) ressalta que: “Não se quer, com 
isto, dizer que não houvesse padres dignos, piedosos e apostólicos entre os que 
se achavam na Bahia à época, porém, negar a evidência de que agravavam na 
Colônia, as falhas da Metrópole seria recusar o entendimento da realidade”. 
O acordo entre a Santa Sé e os monarcas católicos da Península Ibérica pre-
via o apoio ao clero missionário na conversão de gentios e mouros nas terras 
que conquistassem, de modo que na Colônia esse papel coube aos inacianos, 
“[...] tanto pela decisão do rei quanto pelos entendimentos com o bispo, caberia 
missionar os índios, dos quais esse prelado, talvez por motivo do seu desacordo 
com os métodos daqueles missionários, não se considerava [...] responsável [...]” 
19
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
(AZEVEDO, 1978, p. 49). O conflito se dava no método pastoral adotado pelos 
jesuítas e, para agravar ainda mais a situação, segundo alguns historiadores, havia 
aversão aos nativos brasileiros, daí a sua implicância com Nobrega, quem procurou 
meios de aculturar a sua missão para converter os índios.
O bispo Sardinha esteve comandando a Diocese de Goa, no Oriente, antes 
de ser transferido ao Brasil, e naquele continente, como “bom” funcionário da 
Coroa, segundo Azevedo (1978), justificou todo tipo de arbitrariedade contra as 
comunidades locais, pois a sua cosmovisão estava atrelada à conquista temporal 
implementada pelo monarca português, de quem era funcionário e a quem deveria 
prestar contas, afinal, com o regime de padroado, o bispo devia mais obediência 
ao rei do que à religião.
No caso de Pero Sardinha é preciso, primeiro, tomar em consideração sua 
experiência na Índia, onde fora bispo da possessão portuguesa de Goa; 
depois, sua formação intelectual e religiosa. No Oriente, as suas disposições 
para com os colonos e o clero se teriam conformado aos costumes 
promovidos pela expansão a outros continentes, com a brutalidade das 
ações bélicas e da ocupação de terras de povos mais fracos, surpreendidos 
pelo aparato militar e pela violência da penetração, com o materialismo 
dos interesses e com a preponderância, sobre os preceitos morais, do 
impulso imperialista. O bispo – subordinado à Coroa e arrestado por esta 
a apoiar e legitimar a arbitrariedade dos conquistadores [...] não escaparia 
à ruptura entre os preceitos que devia fazer cumprir e a atuação concreta 
diante dos fatos irresistíveis (AZEVEDO, 1978, p. 48). 
O bispo estava conectado ao “espírito de seu tempo”, ou seja, dentro da lógica do 
acúmulo mercantilista, da expansão territorial e de riquezas que tornaria seu monarca, 
o rei “mui católico” português, poderoso diante das outras nações europeias. Para 
esse prelado, os métodos de conquista territorial e material, bélico e de exploração, 
nada mais eram do que um sistema de apoio à expansão da fé entre os “infiéis”, de 
modo que a aquisição de “almas” para a Igreja estava dentro do processo de conquista 
e a religião era parte desse sistema. Ao entrar em contato com os métodos dos jesuítas, 
logicamente o estranhamento foi imediato e os conflitos se fizeram presentes. 
Os Jesuítas e a “Colonização” Indígena
Na nova etapa de ocupação da Colônia portuguesa na América, D. João III fez o 
convite oficial aos inacianos para que integrassem o projeto colonizador português em 
sua colônia ultramarina, “[...] na qualidade de missionários oficiais do Reino, os jesuítas 
logicamente se enquadravam no projeto colonial de Portugal. [...] aos olhos do poder 
político, sua obra evangelizadora incluiria necessariamente a colonização dos nativos” 
(MATOS, 2003, p. 116). Essa “obra” teria necessariamente que passar pela conversão 
dos nativos à fé católica e levá-los a reconhecer o monarca português como seu sobera-
no, isso estava indissociável, afinal, a fé do soberano era a de seus súditos, e isto deveria 
20
21
ser indiscutível, caso contrário, o insurgente enfrentaria um processo inquisitório. 
Segundo Matos (2003, p. 117), “[...] não obstante serem fortemente 
condicionados pelos interesses da Metrópole, de minguado conteúdo religioso e 
humanitário, os jesuítas puseram em prática uma admirável obra evangelizadora 
com notáveis efeitos civilizadores”. O projeto português implementado no Oriente, 
de conquista bélica e opressora, com interesses materiais acima dos espirituais, 
estava ainda presente, apesar do modo diferenciado de ocupação do espaço, pois 
aqui houve ocupação do território, enquanto que na grande maioria dos espaços 
da África e Ásia, como visto, deu-se na forma de “feitorias”; porém, a missão 
inaciana entre os indígenas não contou com o mesmo tipo de violência, isso se 
minimizarmos o conceito de violência apenas à ação bélica – pois a conversão 
forçada não deixa de ser uma violência –, porém, naquele contexto a conversão 
não se dava da mesma forma que temos nos diasatuais. 
A cosmovisão que os reis católicos faziam em relação à missão evangelizadora 
se dava como que em um dever de Estado, de modo que podemos conferir, com a 
citação de Matos (2003), onde refere-se a uma provisão régia de 1680, o tipo de 
missão que o monarca acreditava ser o seu dever, que era “[...] dilatar a pregação do 
Santo Evangelho e procurar trazer ao grêmio da Igreja aquela dilatada gentilidade, 
cuja conversão Deus nosso Senhor encarregou aos senhores reis deste reino [...]”; 
continua Matos (2003, p. 116-117) em sua análise deste trecho da provisão 
régia: “Sob edificante linguagem religiosa escondem-se interesses nitidamente 
expansionistas tendo em vista vantagens comerciais para a Metrópole”. 
Sendo, nesse caso, o papel do Estado submeter os gentios sob a força da espada, 
e o da igreja domar esses povos através da “ideologia” da cruz, então associada 
ao Estado, trazendo súditos dóceis ao grêmio da igreja da qual o rei professasse 
a sua fé; da mesma forma não nos esqueçamos que o neocolonialismo do século 
XIX assim também o fez, ou mesmo ainda no final do século XVI, quando países 
protestantes como a Inglaterra e Holanda se lançaram à expansão territorial na 
América, a religião foi novamente motor ideológico de suas conquistas, onde as 
palavras súditos e fiéis se tornaram binômio de obediência à nação e igreja que 
estavam unidas politicamente, assim como faziam os monarcas católicos ibéricos. 
Quando os jesuítas chegaram ao Brasil, encontraram uma situação bastante 
complicada: com a falta de mão de obra europeia na Colônia e a resistência dos indígenas 
em se submeter ao trabalho forçado, os colonos se lançaram às chamadas “guerras 
justas” para aprisionar os nativos e, assim, suprir o déficit operacional. Se era ou não 
legítimo aprisionar nativos, esse foi um embate que durou todo o período colonial, “[...] 
os colonos promoviam verdadeiras caçadas humanas em busca de escravos índios que 
dessa forma passariam a ser possuídos legitimamente [...] a legitimidade ou não da 
escravização dos nativos estará no centro das preocupações” (MATOS, 2003, p. 119).
Os inacianos optaram por fazer uma integração gradual dos nativos ao mundo 
ibérico, afinal, fazia parte do contrato proposto por D. João III com a Companhia 
de Jesus reduzir os nativos à cultura europeia, de modo que deveriam integrar os 
21
UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
indígenas no mundo cultural lusitano; dito de outra forma, a conversão ao cristianismo 
acarretava incutir nos indígenas o modo de vida português que, para a mentalidade 
daquele contexto, correspondia a convencê-los de que as suas práticas e os seus 
mitos, na visão cristã europeia, eram respectivamente ações e entidades demoníacas.
Contudo, os jesuítas acreditavam que para atrai-los ao cristianismo seria neces-
sário respeitar alguns elementos de sua cultura, “[...] esses religiosos apregoavam 
a necessidade de que fossem respeitadas algumas tradições indígenas como a ve-
neração dos mortos, a dança sagrada e os instrumentos musicais” (MATOS, 2003, 
p. 121). Mesmo sendo elementos culturais dos nativos, seriam incorporados ao 
culto católico, ou seja, seria uma forma de atrai-los ao mundo cultural europeu sem 
despi-los totalmente de seu universo cultural. 
Sobre a missão inaciana com os povos indígenas no período colonial, leia Nossa história: 500 
anos de presença da igreja católica no Brasil, do frei Henrique Cristiano José Matos (2003). Ex
pl
or
Para conseguir seus objetivos, os jesuítas tentaram algumas “fórmulas” como, por 
exemplo, catequizar os curumins na intenção de que estes, sendo ainda crianças, 
pudessem mais facilmente assimilar a cultura do colonizador, fixaram também as suas 
residências próximas às populações nativas. Esses dois recursos poderiam dar resultados, 
mas não eram aceitos, nem pela autoridade civil ou pela autoridade eclesiástica, uma 
vez que não demandavam resultados imediatos. Daí surgiram os “aldeamentos” para 
reunir os indígenas em povoados previamente organizados, “[...] com a dupla finalidade 
de catequizá-los mais facilmente e protegê-los contra a exploração dos brancos [...] 
apoiavam os descimentos de índios que do sertão desciam em direção ao litoral, sendo 
colocados sob tutela dos missionários” (MATOS, 2003, p. 122).
Os resultados foram ambíguos, pois houve boa intenção dos missionários, de acordo 
com o que entendiam ser o projeto de conversão dos gentios, mas atraiu a cobiça dos 
colonos, os quais atacavam os aldeamentos para conseguir os seus escravos entre 
os índios aldeados. Essa política acabou por causar inúmeros atritos entre padres e 
colonos, sendo comum a expulsão dos jesuítas de algumas regiões e, por fim, quando 
os interesses da Coroa se viram ameaçados pelo trabalho dos inacianos, à época do rei 
D. José I e de seu ministro, Pombal, a ordem religiosa foi expulsa do Brasil e de outros 
países, causando a sua extinção temporária no último quartel do século XVIII. 
22
23
Cosmovisão
Cosmo: mundo ou universo + visão: enxergar algo, ver.
Concepção ou visão de mundo. Cada cultura carrega consigo uma forma particular de ver a 
natureza que a rodeia. Os gregos enxergavam o mundo de forma diferente dos persas. Cada 
um tinha uma cosmovisão diferente (fonte: https://goo.gl/EMWwzj).
Cosmovisão cristã: Cosmovisão é um conjunto de suposições e crenças que alguém usa para 
interpretar e formar opiniões acerca da sua humanidade, propósito de vida, deveres no mundo, 
responsabilidades para com a família, interpretação da verdade, questões sociais etc. Um cristão 
deveria ver essas coisas, e todas as demais, guiado pela luz que recebe da Bíblia. A Bíblia tem 
muitas coisas a dizer acerca da natureza humana, do mundo, propósito, verdade e moralidade, 
como também acerca do mundo. Mais frequentemente do que imaginamos, a cosmovisão secu-
lar está em confl ito com a bíblica. Por exemplo: onde o mundo nos mostra um homem desen-
volvido, a Bíblia diz que ele foi criado e é, em última instância responsável diante de Deus. Onde 
o mundo diz que a moral é relativa, a Bíblia diz que ela é absoluta. Onde o mundo diz que não 
há necessidade de salvação e redenção, a Bíblia claramente declara que todas pessoas têm ne-
cessidade de confessar os seus pecados. O contraste é óbvio e profundo. Ambos não podem ser 
verdadeiros ao mesmo tempo. O mundo secular exalta o homem ao ápice do desenvolvimento 
da evolução, o soberano acima de tudo, ele domina, embora sendo apenas outro animal. Deus é 
“relevante” aos sistemas de crença dos supersticiosos e incultos. Visões tão opostas, no fi nal das 
contas, acabarão por se confrontar (fonte: https://goo.gl/JpQGQE).
Ex
pl
or
Padroado Régio
Os reinos católicos ibéricos, em especial, Portugal, devido ao poder de padroado, 
exerceu forte controle sobre a Igreja. “Os monarcas portugueses gozavam de 
direitos de patronagem sobre os assuntos da Igreja, graças ao padroado real, que 
foi concedido pelo Papa em 1551 e que lhes permitia nomear candidatos para 
cargos eclesiásticos no Brasil” (WILLIAMSON, 2012, p. 193).
Além das nomeações para os cargos da hierarquia da Igreja, os monarcas 
católicos podiam, inclusive, interferir em assuntos eclesiásticos, por exemplo, 
“censurando” documentos de ordem doutrinal que pudessem colocar em dúvida 
algum dos poderes do rei; esse direito a chancelar a entrada de um documento para 
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UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
ter validade no império português se chamava placet imperial, de modo que sem 
o placet, o documento não tinha “validade”, ou seja: “Todas as questões relativas 
à organização da Igreja eram decididas em Lisboa, não em Roma, o que fortaleceu 
claramente a autoridade política da Coroa (WILLIAMSON, 2012, p. 193).
Segundo as palavras de Matos (2003, p. 101), padroado é:
Como a expressão sugere, trata-se de uma “proteção”, “tutela” ou 
“apadrinhamento”. Basicamente temos aqui a concessão dos papas a 
monarcas considerados “mui católicos” e profundamente comprometidos 
com osinteresses da Igreja. São investidos de “poderes pontifícios” para 
administrar, nos seus respectivos territórios, a instituição eclesiástica, 
promovendo e sustentando as “obras religiosas”. Estabelece-se, assim, 
um solene compromisso entre o Estado, na pessoa do rei, e a Santa Sé, 
tendo em vista a programação da fé cristã e a consolidação da Igreja.
O padroado está intrinsecamente relacionado ao conceito de cristandade, que 
vem da Antiguidade Cristã, portanto, “[...] o cristianismo na Península Ibérica 
funcionava como autêntica cristandade, na qual interesses políticos, sociais e 
econômicos se fundiam com objetivos especificamente religiosos” (MATOS, 2003, 
p. 99). Essa relação se aprofundou com a expansão marítima e o mercantilismo 
a partir do século XV, contexto em que os Estados nacionais em formação 
estavam cada vez menos sacralizados, mas sem deixar de recorrer à Roma, quem 
“abençoava” as ambições políticas dos monarcas católicos por sentir que, com 
a relação jurídica que se formava – padroado –, o Papa teria aliados políticos 
poderosos para expandir a religião e o Estado, garantindo o trabalho de submissão 
da gentilidade à cultura ibérica, então, impregnada da ideologia religiosa. 
Em Portugal, a concessão do regime de padroado se deu com a extinção da 
Ordem dos templários, no ano de 1312, ou seja, o Estado português fez hábil 
jogada para manter os bens dos templários em território português, criando, em 
1319, a Ordem de Cristo, que passou a ter em cada monarca português a figura 
de “grão mestre”, título que lhe concedia o controle da Ordem; a bula pontifícia 
que confirmou tal direito ao monarca foi dada pelo Papa Júlio III, no ano de 1551, 
tendo em seu corpo associativo nobres leigos, dado que a sua finalidade era militar, 
ao estilo das ordens militares medievais. 
O Papa Calisto III, no ano de 1456, momento em que Portugal se lançava às 
aventuras marítimas, concedeu a Bula Inter Coetera à Ordem de Cristo, dando 
“[...] jurisdição espiritual das conquistas portuguesas [...]. Em sucessivos documentos 
pontifícios esses privilégios são confirmados e ampliados. No decorrer dos anos, a 
Coroa portuguesa toma conta da chefia da Ordem de Cristo” (MATOS, 2003, p. 
101). Tal concessão deu ao monarca português total autoridade sobre os poderes 
temporal e espiritual dentro de seus domínios. Com isso, “[...] o rei de Portugal 
reúne em sua pessoa uma dupla função: é ao mesmo tempo chefe político e superior 
religioso. Investido de ‘poder divino’, sua autoridade não pode ser contestada e seus 
poderes sobre os súditos são absolutos e inquestionáveis” (MATOS, 2003, p. 102).
24
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Teoricamente, rei e Papa deveriam atuar em sintonia, porque o rei, considerado 
“fidelíssimo”, título concedido pelo Vaticano aos monarcas católicos, seria uma 
espécie de representante da autoridade do Papa em seus domínios e nas conquistas 
que viesse a agregar. Segundo Matos (2003), o rei é, na realidade, o “Papa efetivo” 
em seus domínios. Essa relação de representante de “Deus” na Terra sempre foi 
uma ambição política dos portugueses, fazendo parte da cultura e cosmovisão que 
foi se formando desde os tempos da gênese de Portugal, por volta do ano de 1139, 
quando uma lenda foi se firmando no seio da sociedade lusitana, tal como podemos 
constatar no seguinte excerto sobre a “cosmovisão” que tinham: de ser um povo 
predestinado a expandir a religião cristã.
O caráter sagrado do monarca se manifesta nos primórdios da nação 
portuguesa. Conta a lenda que o próprio Cristo apareceu, na Batalha 
de Ourique (1139), a fim de confiar a Afonso Henriques (c.1110-1185) 
o trono de Portugal e ao mesmo tempo predestinar o povo português 
para ser o porta-voz da mensagem de fé às diversas nações do mundo 
[...]. Eu Sou o Fundador e Destruidor dos reinos e impérios, e quero em 
ti e teus descendentes fundar para Mim um império; por cujo meio será o 
Meu Nome publicado entre as nações mais estanhas (AZZI apud MATOS, 
2003, p. 103, grifo nosso).
A concessão do regime de padroado criou uma grande dependência do clero e 
de religiosos em relação ao Estado português, haja vista que para estar missionando 
ou trabalhando em uma paróquia dentro do Império, o religioso era obrigado a 
fazer um juramento oficial de submissão às ordens do Estado; na prática, tratava-se 
do juramento de oficialização desses religiosos como funcionários administrativos, 
pois ainda que fossem membros da Igreja, figuravam como burocratas dentro 
do aparelho estatal. Como dito, a criação, em 1532, de um departamento 
administrativo do Estado português denominado Mesa de Consciência e Ordens 
servia para regular os assuntos referentes à Igreja. 
O Estado era responsável pelo pagamento dos eclesiásticos em missão ou 
trabalhando no Reino, como também deveria sustentar e manter tudo o que estava 
relacionado ao culto cristão; porém e na realidade, não arcava com as despesas 
retirando valores do seu tesouro, mas por meio de dízimos, dinheiro que deveria 
arcar com tais gastos. Durante o período colonial, tornou-se conhecida uma lei 
apenas para “inglês ver”, segundo a qual templos e eclesiásticos ficaram “a ver 
navios” na maior parte do tempo, ou porque eram mal pagos ou não recebiam 
remuneração alguma, enquanto os templos ficavam sem a devida manutenção, 
sendo poucos os dignos de receber essa denominação.
Para o financiamento do clero, dos missionários “reais” e das obras da 
Igreja, o rei dispunha dos dízimos eclesiásticos, isto é, uma espécie de 
imposto, oficialmente de 10% sobre as rendas obtidas pelos colonos. 
A realidade é que, frequentemente, os dízimos eram desviados de sua 
finalidade religiosa, sendo o povo com isso duplamente prejudicado 
(MATOS, 2003, p. 106).
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UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
Para finalizar, o padroado, em sua origem, teve o objetivo de desenvolver a 
catequese e implantação da Igreja nos domínios portugueses a partir do século 
XV, porém e na realidade, esse privilégio se degenerou como um instrumento de 
opressão dos monarcas sobre os missionários e eclesiásticos que deveriam executar 
mais a missão de reduzir os gentios à cultura ibérica, deixando, assim, de cumprir 
o seu papel evangelizador no “Novo Mundo”, de modo que as iniciativas pastorais 
autônomas foram sufocadas e os religiosos que persistiram nesse intento tiveram 
o mesmo destino dos inacianos que foram expulsos dos domínios portugueses e 
proibidos de evangelizar. 
O tema que nos interessa é o da cristandade. Pela recuperação do cristianismo para o sistema 
com a “conciliação constantiniana” (LEPELLEY, 1969, p. 54-81) aparecia a primeira manifes-
tação da cristandade na história do cristianismo. Os fatos mais espetaculares da “conciliação” 
foram a Pax Ecclesiae e a passagem do cristianismo a religio licita – Édito de Milão, de 313.
A sua inserção na lista das religiões de Estado da Antiguidade, com Teodósio, em cerca de 
380, criou um novo modelo de relacionamento da Igreja com o Estado, dado que ambos 
passaram a constituir um sistema único de poder e legitimação. A relação bipolar, todavia, 
apenas se mostra significante se levarmos em conta a sociedade como um terceiro elemento 
mais abrangente. Podemos, então, mencionar cristandade como um sistema de afinidades 
da Igreja e do Estado na sociedade. As relações estruturais da Igreja e do Estado medeiam a 
associação de cada uma dessas instituições com a coletividade.
Ademais, o sistema de cristandade apresenta várias modalidades no decorrer da já bimilenar 
história do cristianismo e da Igreja: nas denominadas modalidades “constantinianas” de 
cristandade. Até o século XIX, a Igreja e o Estado constituíram um sistema único respaldado 
em um regime de união e na consideração do cristianismo como religião de Estado.
O Império Cristão – séculos IV e V – foi a primeira modalidade histórica de cristandade “con-
stantiniana” (GOMES, 1997, p. 33-34). Assim, com o novo estatuto de religião oficial do Estado, 
o cristianismo passou a desempenhar um papel inédito, ode sacralizar o poder do Estado, das 
autoridades, em particular do imperador, e os valores dominantes do sistema – as romanitas.
O Império, então em crise, encontrou no cristianismo uma nova forma de legitimação e, na Igreja, 
um novo aparelho de hegemonia. A “conciliação constantiniana” ofereceu a Pax, mas pediu o com-
prometimento com o sistema. A conciliação interessava, pois, ao mesmo tempo à Igreja e ao Estado.
Ex
pl
or
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
 Vídeos
Desmundo (2003) - filme completo legendado
https://youtu.be/oxQe_BeRba0
A Missão
A Mssão. Direção de Roland Joffé.
https://youtu.be/CdQGq7zZgrs
Colonização - Histórias do Brasil (2/10)
Documentário da TV Brasil intitulado Sociedade colonial, com comentários de Mary 
Del Priori, Eduardo Viveiros de Castro, Ronald Raminelli, Alberto da Costa e Silva, 
Ronaldo Vainfas e John Monteiro.
https://youtu.be/zpNr6KKH8d8
1500 a 1822 - História do Brasil - A Colônia
Documentário da TV Brasil intitulado 1500 a 1822 – história do Brasil – a Colônia, 
com comentários de Boris Fausto.
https://youtu.be/Vjnquqt6JN8
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UNIDADE A Cruz e a Espada na Terra de Santa Cruz
Referências
AZEVEDO, Thales de. Igreja e Estado em tensão e crise. São Paulo: Ática, 1978.
AZZI, Riolando. A cristandade colonial: mito e ideologia. Petrópolis, RJ: Vozes, 1987.
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XIX. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. 
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2008. Dissertação (Mestrado)-Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2008. 
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período colonial. 5. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. 
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desafricanização para a reafricanização. Revista de Estudos da Religião da PUC-
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MATOS, Henrique Cristiano José. Nossa história: 500 anos de presença da igreja 
católica no Brasil, período republicano e atualidade. t. 3. São Paulo: Paulinas, 2003.
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Revista USP, São Paulo, n. 67, p. 48-67, set./nov. 2005.
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Protestantismo em Revista, São Leopoldo, RS, n. 26, set./dez. 2011.
WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Lisboa: 70, 2012.
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